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DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
Montes Claros/MG
2018
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
Montes Claros/MG
2018
Dedico a todas a garotas “endiabradas e irrequietas” do século XXI.
AGRADECIMENTOS
A minha orientadora Dr.ª Ivete Batista da Silva Almeida, que acreditou no meu
trabalho, me auxiliou e me ensinou da melhor maneira possível, foi compreensiva e
paciente, sempre respeitando as minhas dificuldades e limitações.
A minha família, que não mediu esforços para que eu tivesse a oportunidade de
receber a melhor educação possível, e pelo apoio durante esses quatro anos de curso.
Aos meus pais, pelo amor, incentivo е apoio incondicional.
A minha banca de avaliação, composta pelas professoras Dr.ª Regina Célia Lima
Caleiro e M.ª Barbara Figueiredo Souto, que são incríveis professoras e pesquisadoras.
Aos amigos e colegas Lucas, Pedro, Ana, Ramon, Nathalia e Patrícia pelo
incentivo, pelos trabalhos em grupo, pelas risadas e por tudo que pude aprender com
vocês nesses quatro anos. Espero que essa amizade seja duradoura e sempre presente
em minha vida.
INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 6
1. HISTÓRIA, SOCIEDADE E IMPRENSA BRASILEIRA NOS ANOS 1930-1950 ..... 10
1.1 O Brasil na Segunda Guerra Mundial ............................................................ 11
1.2 “Os anos dourados” ....................................................................................... 12
1.3 A imprensa e as Revistas ilustradas ............................................................. 15
1.4 A Revista O Cruzeiro ...................................................................................... 17
2. MULHER, JUVENTUDE E MODA NOS ANOS DOURADOS BRASILEIROS ........ 21
2.1 As mulheres nos anos 1950 ........................................................................... 21
2.2 A juventude-problema .................................................................................... 26
2.3 A moda nas décadas de 1940 e 1950 ................................................................. 28
3. ALCEU E AS GAROTAS, AS GAROTAS E ALCEU .............................................. 32
3.1 Garotas, moda e comportamento .................................................................. 36
CONCLUSÃO ................................................................................................................ 44
REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 46
INTRODUÇÃO
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moda ou assiste à TV em busca de uma orientação do que deve ou não ser
usado. (STEFANI, 2005, p.72)
Nos anos 50, as garotas foram apreciadas por alguns, consideradas tolices
por outros, independentemente de sexo. Como ocorre com muitos
personagens de desenhos, elas parecem ter adquirido vida própria. Seus
vestidos e penteados foram copiados, suas poses e atitudes chegaram a ser
imitadas. Saíram das páginas da revista e foram parar em cadernos “de
recordação”, corte e costura e economia doméstica de algumas meninas, ou
nos sonhos e expectativas afetivas de certos rapazes. Assim, pode-se dizer
que os desenhos de Alceu Penna propagaram modos e modas.
(BASSANEZI; URSINI, 1995, s/n)
7
Assim como as moças da época se inspiravam na “Garotas” para se vestir
e se comportar, as “Garotas” buscavam compreender a atualidade, e suas roupas,
cenários, falas e atitudes mostravam que podiam ter uma certa liberdade no meio em
que viviam. De um modo cativante e humorístico elas ganharam a atenção dos leitores
com suas histórias, suas gafes, seus truques e seu jeitinho feminino.
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É importante estudar a história da moda brasileira, pois é uma moda
recente e atualmente começou a ganhar lugar nas passarelas internacionais.
Entender o que é a moda nacional1, nos faz criar um sentido de pertencimento, o
mesmo sentido desejado pelo Estado Novo. A mulher brasileira tem seu jeito único, e
o país tem seu clima tropical, suas paisagens, seus rios, cachoeiras, praias, seus
diferentes movimentos culturais que são a inspiração principal para roupas com a
“cara” do Brasil.
1 Nesse trabalho usaremos moda nacional entendendo que nesse período a moda passa a inserir
elementos da brasilidade a uma moda ditada pela Europa. A mesma pode ser uma adaptação da moda
internacional para os corpos das mulheres brasileiras e para clima tropical do Brasil.
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1. HISTÓRIA, SOCIEDADE E IMPRENSA BRASILEIRA NOS ANOS 1930-1950
O Estado Novo foi implantado por Vargas em um regime autoritário que não
representou um corte radical com as medidas governamentais anteriores. Foi pautado
no objetivo de promover a industrialização e se caracteriza por controlar a opinião
pública e buscar forma-la a seu favor, censurando os meios de comunicação
elaborando a sua própria versão para as notícias e histórias da fase em que viviam
(VELOSO, 1982).
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Entendemos que a identidade brasileira não é fixa e nem homogenia, e que ainda hoje não podemos
falar em uma identidade única ou completamente definida.
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O governo Vargas buscava transformar elementos da cultura popular em uma
cultura nacional, como podemos perceber com o samba e o carnaval, por exemplo,
desfiles de escolas de samba com temáticas da cultura brasileira, ascensão do rádio
consagrando o samba como representante oficial da música brasileira. É importante
ressaltar que em 1936 também a Capoeira foi elevada a esporte e símbolo nacional.
Revistas e mais tarde a televisão, foram instrumentos de divulgação e enaltecimento
dessa concepção nacionalista.
Não apenas para a política externa, mas sobretudo para a imprensa, que é o
nosso principal interesse, a participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial trouxe
consigo grande agitações. O Governo brasileiro, sob a ditadura de Vargas, oscilou no
apoio a ambas as partes na primeira fase da guerra. Mas após sofrer ataques
alemães, decidem se aliar aos Estados Unidos, ganhando muitas vantagens em troca,
como auxílios financeiros. A Força Expedicionária Brasileira (FEB) e a Força Aérea
Brasileira (FAB) enviaram diversos soldados para os campos de batalha. Além disso,
o Brasil ofereceu matérias primas e bases militares aéreas e navais, tendo como
principal base a cidade de Natal (RN). Segundo Mary Del Priore e Renato Pinto
Venâncio
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um modelo de nação que se ansiava construir no Brasil. Esses princípios nacionalistas
foram inseridos na Juventude Brasileira.
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Getúlio precisava ao mesmo tempo ter que atender as reivindicações dos
trabalhadores e ainda agir para controlar a inflação. Incentivou o sindicalismo, mas
não conseguiu o controle total do mundo do trabalho, e a alta do custo de vida causou
várias greves. Seus discursos chocavam com os interesses dos conservadores, optou
por adotar uma linha econômica nacionalista, pois para ele o capital estrangeiro era o
grande problema da economia brasileira, assim investindo em indústrias nacionais,
criando assim a Petrobras e a Eletrobrás.
Após uma conturbada campanha eleitoral e uma forte oposição a sua posse,
em 1955 entra Juscelino Kubitschek, eleito o novo presidente do Brasil. Passadas
essas conturbações, seu governo foi conhecido pela estabilidade política. Com seu
Plano de Metas e o lema de “Cinquenta anos em cinco”, JK visava o rápido
desenvolvimento do país, um governo otimista, para retirar o Brasil do atraso e
construir uma nação realmente independente, atingindo cinquenta anos de progresso
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somente nos cinco anos de seu mandato. Segundo Fausto (1999, p. 425), o Programa
de Metas abrangia 31 objetivos, distribuídos em 6 grupos “energia, transportes,
alimentação, indústrias de base, educação e a construção de Brasília, chamada de
meta-síntese.” O governo criou órgãos paralelos ao governo central para ajudar a
dirigir e alcançar essas metas.
Segundo Fausto (1999), o governo de JK, o plano de metas pode ser definido
como nacional-desenvolvimentista de política econômica.
Por isso mesmo que o campo de acção da revista é mais vasto, a sua
interpretação dos acontecimentos deve subordinar-se a um criterio muito
menos particularista do que o do jornal. Um jornal póde ser um órgão de um
partido, de uma facção, de uma doutrina. Uma revista é um instrumento de
educação e de cultura: onde se mostrar a virtude, animá-la; onde se ostentar a
belleza, admirá-la; onde se revelar o talento, applaudi-lo; onde se empenhar o
progresso, secundá-lo. O jornal dá-nos da vida a sua versão realista, no bem e
no mal. A revista redu-la á sua expressão educativa e esthetica. O concurso da
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imagem é nella um elemento preponderante. A cooperação da gravura e do
texto concede á revista o privilegio de poder tornar-se obra de arte. (Editorial
de apresentação da revista O Cruzeiro, 1928)3
As revistas ilustradas são para nós historiadores uma rica fonte de pesquisa
para escrever uma História por meio da imprensa. Segundo Tania de Luca (2005),
essa explosão no mundo dos impressos periódicos tem sido um objeto histórico de
3 As citações utilizadas nesse trabalho buscaram manter a grafia original das obras citadas.
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reflexão especifica. “A ilustração, com ou sem fins comerciais, tornou-se parte
indissociável dos jornais e revistas e os historiadores incumbiram-se de transformá-la
em outro fértil veio de pesquisa.” (LUCA, 2005, p. 123). E eis aqui a importância da
ilustração, nosso foco nesse trabalho.
Sua primeira edição não decepcionou o público. Sua capa chamou atenção
(FIGURA 1).
(...) uma capa vistosa, com o rosto pintado de uma linda mulher fazendo
‘biquinho’ e que parecia ter saído de Hollywood, com um olhar sensual. Era
impressa em quatro cores sobre o fundo prata. O título em vermelho, com
letras tipo clássico, fora impresso ao lado do cruzeiro do Sul, com estrelas em
branco. Foi, sim, um sucesso instantâneo (...). (JUNIOR, 2011, p.39)
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Figura 1: Capa da Primeira edição da revista O Cruzeiro
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O Cruzeiro surgiu em um momento muito importante para a imprensa do Rio
de Janeiro, nascendo juntamente com o jornalismo explicitamente sensacionalista e
com o surgimento dos primeiros conglomerados de imprensa, como os Diários
Associados. As grandes empresas de comunicação buscavam cada vez mais armas
para conquistar seu público. O Cruzeiro tinha o objetivo de ser a principal revista
semanal ilustrada do século XX, trazendo novas possibilidades de leitura para os seus
leitores. Criaram novas estratégias de publicação, novos gêneros textuais e novas
formulas de edição, moldando assim as práticas de leitura.
Porque é a mais nova, Cruzeiro é a mais moderna das revistas. É este o título
que, entre todos, se empenhará por merecer e conservar: ser sempre a mais
moderna num paiz que cada dia se renova, em que o dia de hontem já mal
conhece o dia de amanhã; ser o espelho em que se reflectirá, em periodos
semanaes, a civilisação ascensional do Brasil, em todas as suas
manifestações; ser o commentario multiplo, instantaneo e fiel dessa viagem de
uma nação para o seu grandioso porvir; ser o documento registrador, o vasto
annuncio illustrado, o film de cada sete dias de um povo, eis o programma de
Cruzeiro.
É pelo habito de modelar o barro que se chega a bem esculpir o marmore. Esta
revista será mais perfeita, mais completa, mais moderna amanhã do que é
hoje. (Editorial de apresentação da revista O Cruzeiro, 1928)
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2. MULHER, JUVENTUDE E MODA NOS ANOS DOURADOS BRASILEIROS
Vamos falar um pouco sobre as mulheres, sobre a história das mulheres. Não
só as que foram grandes heroínas e revolucionárias e ganharam destaque nos livros
de História, mas aquelas que em seu dia-a-dia fizeram História. A História das
mulheres pode estabelecer relações com os mais diversos ramos de estudo,
passando a ser fundamental para compreender a história da civilização no geral.
Esses estudos nos proporcionam uma nova análise dos já estudados documentos,
que agora observados a partir de uma nova abordagem nos dizem muito mais do que
já foi escrito, e tudo o que foi sufocado pela figura masculina, fazendo com que o papel
da figura feminina fosse esquecida. Segundo Mary Del Priore (2004), devemos
escrever, falar e ler a História das mulheres sem preconceito, devemos falar qual foi,
qual é, e qual será o lugar das mulheres na sociedade.
4 “Estilo de vida Americano”, expressão utilizada para mostrar a influência do estilo de vida
estadunidense pelo mundo.
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mulheres marcados pelas diferenças de gênero. Ancorada no espírito
científico e racional, a modernidade trouxe consigo novas formas de governar
as cidades, os espaços, a vida das pessoas, seus corpos e seus movimentos.
(MAIA, 2001, p. 4)
– Não se deve irritar o homem com ciúmes e dúvidas. (Jornal das Moças,
1957)
– Se desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar seu
carinho e provas de afeto. (Revista Claudia, 1962)
– A desordem em um banheiro desperta no marido a vontade de ir tomar
banho fora de casa. (Jornal das Moças, 1945)
– A mulher deve fazer o marido descansar nas horas vagas, nada de
incomodá-lo com serviços domésticos. (Jornal das Moças, 1959)
– A esposa deve vestir-se depois de casada com a mesma elegância de
solteira, pois é preciso lembrar-se de que a caça já foi feita, mas é preciso
mantê-la bem presa. (Jornal das Moças, 1955)
– Se o seu marido fuma, não arrume briga pelo simples fato de cair cinzas no
tapete. Tenha cinzeiros espalhados por toda casa. (Jornal das Moças, 1957)
– A mulher deve estar ciente de que dificilmente um homem pode perdoar
uma mulher por não ter resistido às experiências pré-nupciais, mostrando que
era perfeita e única, exatamente como ele a idealizara. (Revista Claudia,
1962)
– Mesmo que um homem consiga divertir-se com sua namorada ou noiva, na
verdade ele não irá gostar de ver que ela cedeu. (Revista Querida,1954)
– O noivado longo é um perigo. (Revista Querida, 1953)
– É fundamental manter sempre a aparência impecável diante do marido.
(Jornal da Moças, 1957)
– O lugar de mulher é no lar. O trabalho fora de casa masculiniza. (Revista
Querida, 1955) (A mulher no mundo machista: Revistas femininas nos anos
50 e 60, disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/ult528u42.shtml )
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As revistas ilustradas femininas como, por exemplo, o Jornal das Moças (1914-
1968), traziam várias matérias sobre o comportamento feminino e sobre a
responsabilidade da mulher na família. Existiam até colunas onde moças poderiam
mandar suas histórias ou suas dúvidas, que eram analisadas e respondidas por
especialistas no assunto (BASSANEZI,2014). A revista O Cruzeiro também trazia
sessões especiais para as mulheres, como as sessões de moda e de comportamento,
além do apelo expresso nas propagandas, que traziam produtos sendo mostrados por
belas mulheres, incentivando o consumo de produtos tanto para a casa quanto para
a beleza. (Imagens 1 e 2). Algumas das principais sessões era a “Modas”, que trazia
para as brasileiras notícias dos principais desfiles e dos estilistas franceses, e a “Carta
de Mulher”, que trazia correspondências com dúvidas das leitoras.
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Vale a pena ressaltar que o modelo de família tradicional adotado pelas fontes
de informação era a família branca, de classe média, hierarquizada, respeitando
papeis tradicionais bem definidos. Como a televisão ainda não era objeto
completamente popular entre os brasileiros, as revistas influenciavam e até ditavam
os comportamentos, interferindo na vida das pessoas que viveram aquela época.
A mulher trabalhar também era uma vergonha para o homem, pois significava
que ela não tinha condições financeiras suficientes para manter a sua família e por
isso necessitava de ajuda. Era condenado pela sociedade a mulher que trabalhava
para o seu próprio bem-estar, ou para manter suas vaidades. Era tido como perda da
feminilidade, do respeito, da proteção e do sustento. (BASSANEZI,2004)
As mulheres dos anos dourados eram cercadas pelo medo de não arrumar um
casamento, de ficar “pra titia”, encalhadas ou solteironas, por esse motivo seguiam os
conselhos para arrumar um bom casamento, o que significava que deveriam “se dar
ao respeito”. As mulheres solteironas não eram vistas de uma forma positiva pela
sociedade, as que escolhiam o celibato eram olhadas como pessoas infelizes,
egoístas, tristes ou até mesmo invejosas e rancorosas, em oposição a casada, amada
pelo marido e pelos filhos e feliz.
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Se, em outros contextos históricos, “solteira” era apenas um status jurídico
ou uma condição de desprestígio social, com o discurso científico-moral –
sobretudo, do segundo quartel do século XIX e primeira metade do XX –
“solteirona” passou a ser um desvio da natureza, uma anomalia social, um
ser desprezível e risível, a figura da diferença. (MAIA,2001, p. 3)
As “Moças de família” não podiam flertar com os rapazes, pois essa era uma
atitude masculina, mas poderiam usar seu charme como artifício para os atrair, como
saber conversar, mas sem permitir grandes toques físicos. Não deveriam namorar
somente por namorar, ou namorar qualquer rapaz. Como deveriam pensar no
casamento, o tipo de homem perfeito para namorar seria um bom rapaz que teria
condição de sustentar a família, não deveria ser um namoro passageiro e só por
diversão. A influência familiar era muito importante nessa questão, os pais já não
escolhiam e obrigavam as moças a se casarem com um determinado rapaz, mas as
orientavam a escolher o “melhor partido”. Em geral as mulheres se casavam muito
novas, a partir dos 18 anos já eram tidas como preparadas para assumir as obrigações
do matrimônio, e se ainda não tivessem arrumado um casamento até os 25 já eram
consideradas encalhadas. (BASSANEZI,2004)
As levianas eram aquelas com que os rapazes namoram mas não casam.
Deveriam, inclusive, ser evitadas pelas boas moças para que essas não
fossem atingidas por sua má fama e seus maus exemplos. Já as garotas que
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se comportassem como moça de família seriam respeitadas pelos rapazes e
teriam muito mais chances de conseguir um bom casamento. (BASSANEZI,
2004, p.612)
2.2 A juventude-problema
Mas em meio a uma sociedade tradicional surgiu uma juventude rebelde que
preocupava o mundo adulto. Meninos e meninas que se vestiam de modo diferente e
rebelde, que saem e bebem em bares e passavam noites em festas e não eram tidos
como futuros maridos e esposas capazes de formar um lar modelo padrão dos anos
1950.
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Cruzeiro, já tinham lugares específicos que frequentavam constantemente em sua
vida agitada (PENNA, 2007).
A juventude dos anos dourados adotou o rock and roll como estilo musical e
elegeu grandes ídolos como, por exemplo, o maior deles, Elvis Presley. A
nova música com um contratempo acentuado e um ritmo dançante afirmava
ainda mais essa rebeldia surgida na década e trazia uma atitude mais
revolucionária. Era uma música rebelde para uma juventude rebelde. Elvis
Presley se tornou um dos maiores ídolos da juventude, sendo mundialmente
denominado como o Rei do Rock. (TRINDADE e SOBRINHO, 2009, p. 5)
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O cinema trouxe uma representação da cultura teen dos EUA, na pele de
artistas como Marlon Brando e Marilyn Monroe, que representavam uma juventude
rebelde e não compreendida pelos mais velhos. Passavam a imagem de jovens
ousados que desafiavam a sociedade e não eram vistos com bons olhos pela
sociedade brasileira da época, pois não eram bons exemplos para sua juventude.
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Durante as décadas de 1940 e 1950, esse período de tantas mudanças, a moda
também estava em pleno desenvolvimento. Durante a Segunda Guerra Mundial as
roupas passaram a ser mais versáteis e modernas, devido a situação em que se
encontravam. Em 1941 o compra e consumo de roupas era controlado por cupons,
porem Paris, o berço da moda, mesmo em meio a tantas restrições, conseguiu fazer
resistir sua alta costura, baseada em modelos extravagantes e extremamente
elegantes. Com o fim da guerra os países estavam se adaptando economicamente e
a moda acompanhava esse crescimento. Com o fim da ocupação Alemã, Paris voltou
a ocupar seu lugar como a capital oficial da moda. No fim de 1946, Dior abriu sua casa
de costura e em 1947 lançou o seu “New Look” (Imagem 5), que mais uma vez
mostrava o poder da alta costura parisiense.
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a alta costura parisiense era uma produção voltada para as elites, os Estados Unidos
começaram a se voltar para a confecção em massa, a produção em série. Essa
confecção ia em direção dos excluídos da moda, que estavam confinados a se vestir
de maneira uniforme, como o vestuário de operários e camponeses. Segundo Baudot
(2002, p. 140-141) “Berço da democracia, mas também da sociedade de consumo, os
Estados Unidos impõem seu modelo a Europa, em 1945. Este vai acelerar a
padronização das tendências.”
Ao contrário do que podemos pensar, todos esses avanços fizeram com que
os valores conservadores retornassem. Principalmente para as mulheres dos anos
50, que deveriam se vestir “adequadamente”, combinando roupas, chapéu e carteiras
e estar sempre maquiadas seguindo as dicas de postura impostas pelas matérias e
colunas das revistas e pelos programas e propagandas da tão recente e inovadora
televisão.
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jaquetas de couro, e mesmo se mostrando contrários a ditadura da moda,
desenvolveram assim seu estilo próprio, que foi e ainda é muito utilizado como
tendência.
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3. ALCEU E AS GAROTAS, AS GAROTAS E ALCEU
Ao se mudar para o Rio de Janeiro aos dezessete anos Alceu foi morar com
seus tios, porem quis trabalhar para ter sua própria renda, assim decidiu juntar seus
desenhos e criações em um portfólio e assim aproveitar as oportunidades que a então
capital da República poderia oferecer. Foi atrás das redações dos jornais e revistas
ilustradas para mostrar seu trabalho. Inicialmente conseguiu um trabalho no
“Suplemento Infantil” de “o Jornal”, que foi onde conheceu seu amigo de longa data e
padrinho Antonio Accioly Neto, secretário de redação da revista “O Cruzeiro”, que
chamou Alceu para colaborar nessa revista e assim as portas começaram a se abrir
para ele. Na Biografia de Alceu Penna, “Alceu Penna e as garotas do Brasil: moda e
imprensa (1933-1975)”, Gonçalo Junior conta
Alceu lembraria depois o primeiro contato com o amigo. Certa tarde, tomou
coragem e foi a redação de O Cruzeiro para lhe mostrar uma série de
ilustrações que criara especialmente para a capa da revista, de acordo com
o padrão estabelecido pela publicação. Eram desenhos de pin-ups inspirados
em magazines americanos que ele tinha acesso no cavalete (espécie de varal
onde eram pendurados jornais e revistas para leitura de todos) da redação
de O Jornal. Para a sua alegria, o secretário recebeu o seu trabalho com
entusiasmo. (JUNIOR, 2011, p. 53)
Durante toda a sua vida Alceu apenas colaborou em diversas revistas, sendo a
de maior duração com O Cruzeiro. Por isso foi em busca de uma renda mais fixa,
assim conheceu o mundo dos Cassinos. Começou no Cassino da Urca, onde criou
cenários e figurinos para os espetáculos durante dez anos, conseguiu esse emprego
graças a grande influência que obteve em suas colaborações para O Cruzeiro, onde
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começou a ficar conhecido pelos seus desenhos bem criados a partir de seu traço
único e maduro, mesmo sendo ainda bem jovem. (JUNIOR,2011)
Após quatro anos Alceu desistiu da faculdade, pois só estava no curso porque
promete a seu pai, e não via sentido em continuar em algo que não era sua paixão.
Outros aspectos como período político conturbado fez com que a educação brasileira
fosse prejudicada, assim como o curso de Alceu na Universidade do Rio de Janeiro,
o que causou um desanimo nele, assim como em seus colegas.
Alceu chegou ao Rio no ano em que a política pegava fogo, com pressões
por mudanças e disputas de poder dentro dos próprios governistas. Uma crise
que resultaria na Revolução Constitucionalista de São Paulo de 1932. Um
período de instabilidade que logo chegou a universidade.Constantes
intervenções do governo e paralisações no sistema educacional fizeram com
que alguns semestres fossem concluídos por meio de decretos do Ministério
da Educação. Ou seja, os alunos muitas vezes não tinham o número
completo de aulas e até nem faziam provas ou cursavam as disciplinas, mas
eram automaticamente aprovados. (JUNIOR, 2011, p.67-68)
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Assim então Alceu cria um grupo de Garotas bonitas, espertas e divertidas que
ganhariam o carinho, prestígio e admiração do público tanto feminino como masculino.
Assim nasceram as “Garotas do Alceu”.
As famosas garotas não tinham nomes, pois não eram personagens fixas. Mas
o traço de Alceu as definia de um modo único: jovens, magras, cinturas finas e seios
pequenos. Podiam ser loiras, morenas, ruivas, com cabelos curtos ou longos, presos
ou soltos, porém estavam sempre vestidas de acordo com a última moda. Inspiradas
nas garotas cariocas, objeto de observação de Alceu, as moças eram inspiradas na
cidade, na praia, no estilo de vida carioca, como os lugares em frequentavam e
programas típicos dos jovens na cidade maravilhosa. “Na capital da República,
afirmava ele, as moças eram chiques, bem-vestidas, interessantes de serem
conhecidas e levavam a vida sem perder a oportunidade de aproveitar os prazeres
das praias, dos esportes, das festas, do teatro etc. (JUNIOR, 2011, p.94). Vemos isso
principalmente se tratando da praia, as garotas podiam ter a pele bronzeada e inovar
nos “maiôs de duas peças”.
Levavam um estilo de vida jovem, porém eram diferentes das mulheres de sua
década ao preferirem se divertir e paquerar do que casar e se prender em tarefas
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domésticas. Carregavam um espírito independente, ousado e moderno, assim como
foram anunciadas, e assim também se tornaram um incentivo para que as mulheres
se modernizassem também. As garotas poderiam tratar dos mais diversos assuntos,
incluindo temas comportamentais, mostrando suas atitudes nos mais diversos
lugares.
O produtor viajou para a América Latina com o pretexto de lançar seu mais
recente desenho animado, Fantasia. Extraoficialmente, no entanto,
representava o governo americano numa viajem que incluía ainda Buenos
Aires e Santiago do Chile. Disney admitiria durante a viagem que veio colher
subsídios para a criação de personagens relacionados a região que pretendia
usar em dois longa-metragens – Você já foi a Bahia? e Alô Amigos! Os filmes
seriam produzidos e lançados em 1944 e 1945, respectivamente, com
recursos do Departamento de Guerra Americano. (JUNIOR, 2011, p.123-124)
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Em seus primeiros anos de produção, as “Garotas” foram sempre
encantadoras, sensuais, maliciosas e bem-humoradas. Porém elas se transformaram
com o tempo, e uma das principais influencias foi principalmente a temporada que
Alceu passou nos Estados Unidos. Sua primeira e principal influência para a criação
de suas garotas, havia sido as pin-ups5 americanas. Porém mesmo assim, ele acabou
criando um traço único, que seria reconhecido com dele em diversas publicações até
a atualidade. Alceu também inovou ao ser o primeiro a adotar textos-legendas para
suas lindas ilustrações. (JUNIOR,2011)
Garotas não era uma coluna de moda, mas sim uma coluna de humor presente
semanalmente em o Cruzeiro, contando as aventuras das belas personagens criadas
pelo desenhista e estilista Alceu Penna. Sua influência na moda brasileira foi muito
grande, pois suas personagens foram criadas por alguém que entendia de moda e
também escrevia sobre moda na própria revista O Cruzeiro. Alceu criava os modelos
e utilizava em suas garotas, que sempre bem vestidas na última moda, influenciando
assim as moças da época. Segundo Junior (2011) muitas moças recortavam as
páginas da revista com o modelo desejado e levavam para as costureiras para copiar
os modelos usados pelas garotas.
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Pin-ups são as famosas “Garota de Calendário” norte-americano, muito difundidas no período da
Segunda Grande Guerra, nos bolsos dos soldados ou nas revistas masculinas. Eram desenhadas com
formas e poses sensuais, porem não chegavam a ser consideradas vulgares ou pornográficas.
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ocasiões. Lembrando que a inspiração para Alceu eram as garotas cariocas, que
frequentavam as festas em da alta sociedade do Rio de Janeiro, as praias, as
lanchonetes, bares, sorveterias, teatros e cinemas mais famosos da cidade
maravilhosa.
O tema Garotas isto cai! Esteve na edição número 0029 de 1952 de O Cruzeiro.
Nessa edição Alceu e A.Ladino, como sempre, de uma maneira bem-humorada,
tratam da nova moda entre as Garotas, os tops e vestidos tomara que caia. Podemos
perceber que Alceu trata com cuidado dos detalhes das roupas das Garotas, como as
estampas, as cores e os acessórios, dando destaque ao colo e costas as mostra
devido ao conhecido tomara-que-caia. A expressão das garotas mostra uma certa
sensualidade, se portam como se estivessem se divertindo em uma festa.
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Imagem 7: Garotas de fita no cabelo, O Cruzeiro, 1958
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Imagem 8: Verão e Garotas, O Cruzeiro, 1958
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Imagem 9: Garotas e calças compridas, O Cruzeiro, 1958
A calça comprida também virou moda entre as garotas, pois traziam conforto e
mobilidade, mesmo que ainda não muito aceitas pela sociedade da época, tanto que
ganharam um tema na coluna de O Cruzeiro. Ilustradas por Alceu as calças vinham
de várias cores e estampas alegres e sofisticadas. Eram utilizadas principalmente na
época mais fria, porém segundo Maria Luiza, as garotas achavam desapropriado usar
a calça em certas ocasiões como para fazer visitas ou ir ao cinema.
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Imagem 10: Garotas vão na onda, O Cruzeiro, 1952
A relação das Garotas com a praia era de grande intimidade, pois o Rio de
Janeiro, calor e praia combinavam a aponto de criar o estilo praiano das garotas
cariocas de Alceu. A praia sempre esteve presente como tema na coluna das garotas.
A pele bronzeada6, os óculos de sol e os maios e biquínis mostravam que as garotas
se importavam em estar sempre bonitas e na moda para os banhos de mar e de sol.
Alceu sempre buscava levar os mais diversos modelos de roupas de banho, deixando
as garotas sempre elegantes. Os biquínis de duas peças começaram a ser usados
pelas brasileiras na década de 1950 eram uma grande novidade da moda e tomaram
conta das praias nos anos seguintes.
6A pele bronzeada é um ponto muito importante para a moda e as mulheres brasileiras, pois substitui
um modelo de pele branca europeia, pelo modelo de pele morena, mestiça brasileira.
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Imagem 11: Chegou a hora, garotas! O Cruzeiro, 1950
Os bailes de Carnaval típicos do Rio de Janeiro não podiam faltar na vida das
garotas. Alceu que como estilista também escrevia matérias sobre o Carnaval e
desenhava modelos de fantasias, não hesitou a fazer isso também com suas garotas.
As páginas de O Cruzeiro em fevereiro vinham sempre recheadas de matérias sobre
o Carnaval. Na edição 0018 de 1950, Chegou a hora, garotas! Alceu as desenha com
diversas fantasias, felizes e animadas em um baile de carnaval. As fantasias poderiam
influenciar garotas a se vestir assim como as da revista. As fantasias ricas em
detalhes, assessórios, bordados, penas, cores dão um ar brasileiro as criações, uma
das principais preocupações de Alceu, desenhar mulheres brasileiras para as
mulheres brasileiras.
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Imagem 12: Atributos das Garotas, O Cruzeiro, 1957
O corpo das Garotas cariocas desenhadas por Alceu era sempre escultural.
Altas, cintura fina, seios moderados, pernas longas, pele bronzeada, o ideal de beleza
dos anos 1950. De um modo padronizado as garotas estampavam toda semana uma
página dupla de O Cruzeiro, sempre vestidas na última moda, finas, elegantes e
sensuais. Nessa edição de 1957, vemos as garotas em poses sensuais, como se
estivessem posando para algum fotógrafo. Os modelos utilizados por elas são bem
elaborados nos detalhes, cores estampas, sempre combinando, como podemos
perceber é um traço marcante do desenho de Alceu.
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CONCLUSÃO
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Em seus 26 anos presentes em O Cruzeiro, as garotas viram e se adaptaram
a várias mudanças. O pós-guerra, a explosão dos cassinos, teatros e cinema, a
mudança e a valorização da moda pelos veículos de comunicação, a chegada da
televisão e os anos dourados do rádio, onde as próprias ganharam vozes em um
programa só para elas na Rádio Tupy.
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REFERÊNCIAS
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