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A FORMAÇÃO DAS MONARQUIAS CENTRALIZADAS NA EUROPA

O reino francês
O processo de centralização do reino francês recebeu um grande impulso na época dos reis da dinastia capetíngia (987-1328).
O capetíngio de destaque nesse processo foi Filipe Augusto (1165-1223), ou Filipe II, que governou entre 1180 e 1223. Usando
como pretexto a necessidade de combater os ingleses que ocupavam a região norte da atual França, Filipe II iniciou a cobrança de
impostos em todo o território francês e organizou um poderoso exército para garantir seu poder monárquico por todo o país.
Após derrotar os ingleses, Filipe Augusto utilizou da mesma força armada para se impor à nobreza. Nomeou fiscais, que percorriam
o reino cobrando impostos e impondo as leis e a justiça real sobre as dos nobres locais. Aliado da burguesia, o rei vendia Cartas de
Franquia aos burgos que quisessem se libertar do controle da nobreza feudal.
Luís IX (1214-1270), que governou entre 1226 e 1270, levou adiante o processo de fortalecimento monárquico, organizando uma
rede de tribunais reais e instituindo uma moeda de circulação nacional.
Mas o reinado que mais contribuiu para a centralização do poder no território francês foi o de Filipe IV, o Belo (1268-1314), que
foi de 1285 a 1314. Herdeiro de um Estado já bastante fortalecido, ele se preocupou com sua legitimação. Em 1302, criou a
assembleia dos Estados Gerais. Essa assembleia era composta de representantes do clero, da nobreza e dos comerciantes. As
camadas pobres da população francesa não participavam da assembleia, cujo caráter era meramente consultivo, ou seja, não tinha
poder de tomar decisões ou de criar leis. Além disso, não se reunia regularmente: era convocada conforme a vontade do monarca.
Apoiado pela assembleia, Filipe IV estabeleceu a taxação sobre os bens da Igreja. Teve início uma grave crise, envolvendo a
participação do papa, que chegou até a ameaçar o rei de excomunhão. Quando o papa morreu, em 1303, Filipe IV interferiu na
escolha de seu sucessor. Impôs o nome do papa Clemente V, e forçou a transferência da sede da Igreja de Roma para a cidade de
Avignon, no sul da atual França. Tal episódio iniciou o período que foi denominado por contemporâneos como Cativeiro de
Avignon (em referência ao texto bíblico do cativeiro dos hebreus da Babilônia do século VI a.C.).
Até 1377, durante cerca de setenta anos, os papas submeteram-se à autoridade do rei da França. Em 1378, foram eleitos dois papas,
um em Roma, o outro em Avignon. Essa divisão ficou conhecida como Cisma do Ocidente e só terminou no começo do século
XV.
Assim, para unificar o poder político, Filipe IV precisou enfrentar o poder local, exercido pelos senhores feudais, e o poder
universal, representado pela Igreja.
A Guerra dos Cem Anos
O processo de formação de um sólido Estado francês centralizado foi temporariamente suspenso em virtude do confronto com a
Coroa inglesa na Guerra dos Cem Anos. Foram os historiadores do século XIX que lhe deram esse nome em razão da longa
duração do conflito (1337-1453), intercalado por vários períodos de paz.
O conflito com a Inglaterra teve início quando Eduardo III, neto de Filipe IV, o Belo, e rei inglês, reivindicou o trono da França.
Por trás dessa reivindicação estava o interesse dos ingleses na próspera região têxtil de Flandres.
Para enfrentar os ingleses novamente, o rei francês precisava ampliar seu exército. Mas não podia fazer isso sem recorrer à nobreza.
Dessa forma, fez certas concessões aos nobres. As primeiras derrotas na guerra, a fome generalizada e a peste negra acentuaram a
crise que piorou as condições de vida no campo.
Foi sob este cenário que os nobres pressionaram os camponeses para o aumento da produção agrícola, mesmo em condição
adversa. Isso provocou revoltas populares lideradas pelos camponeses contrários às decisões da nobreza no norte da França e nas
proximidades de Paris. Essas revoltas ficaram conhecidas como jacqueries (abreviação da expressão francesa jacques bonhomme,
que equivale em português a "joão-ninguém"). A mais importante delas ocorreu em 1358 e ficou marcada pelas invasões de
castelos e pelos assassinatos de senhores. Foram duramente reprimidas pelas forças da ordem, encabeçadas pelo Estado e seus
nobres.
A partir do início do século XV, os franceses obtiveram vitórias decisivas, quando prevaleceu uma forte ofensiva, liderada
principalmente por Joana d'Arc. Filha de camponeses humildes, Joana d'Arc dizia-se enviada por Deus para guiar os franceses na
expulsão do exército inglês. Ela participou decisivamente de diversos combates que resultaram em vitória para os franceses.
Também levou Carlos VII a ser coroado em Reims, segundo as antigas tradições dos francos. Após ter sido aprisionada e capturada
pelos ingleses, em 1430, Joana d'Arc foi acusada de heresia e condenada à morte na fogueira por um tribunal eclesiástico.
A guerra continuou até 1453, quando os franceses expulsaram os ingleses definitivamente de seu território.
O reino inglês
No início do período medieval, a Inglaterra foi ocupada por povos germânicos, principalmente anglos e saxões. Na sucessão do rei
anglo-saxão Eduardo, o Confessor (c. 1003-1066), que não deixou herdeiros, abriu-se uma disputa pelo trono. Em 1066, os
normandos - vindos do norte da atual França - invadiram a Inglaterra. Chefiados por Guilherme, o Conquistador (1028-1087), duque
da Normandia e primo de Eduardo, derrotaram os anglo-saxões na Batalha de Hastings. Guilherme assumiu o trono da Inglaterra,
fundando a dinastia normanda.
Sob essa dinastia, desenvolveu-se um eficiente sistema administrativo para cobrança de impostos e foi criado um forte exército.
Guilherme, que reinou entre 1066 e 1087, dividiu o reino em condados, os shires, controlados pela nobreza e fiscalizados por
funcionários chamados sheriffs.
Em 1154, a dinastia normanda foi substituída pela Plantageneta, cujo primeiro rei foi Henrique II (1154- -1189). Para fortalecer
seu poder, Henrique estabeleceu a justiça real e o Common Law, conjunto de leis a ser aplicado em todo o território.
O sucessor de Henrique II, Ricardo I, ou Ricardo Coração de Leão (governante entre 1189 e 1199), envolveu-se em guerras com a
França e na Terceira Cruzada. Sua constante ausência contribuiu para enfraquecer o poder real na Inglaterra.
A insatisfação da nobreza com a monarquia atingiu seu ponto culminante no reinado do sucessor de Ricardo, seu irmão João Sem-
Terra (1199-1216).
Incapaz de obter o apoio da população, João Sem-Terra enfrentou a revolta da nobreza, que o obrigou a assinar um documento
conhecido como Magna Carta (1215), segundo o qual o rei só poderia criar novos impostos ou alterar leis com a aprovação do
Grande Conselho. O poder real, desse modo, foi fortemente limitado na Inglaterra, retardando o processo de centralização política.
Por décadas, o Grande Conselho ficou sob controle da nobreza e do clero, com a burguesia sendo admitida somente a partir de 1265.
Sua existência e funcionamento podem ser encarados como o embrião do atual Parlamento inglês.
Na Guerra dos Cem Anos, os ingleses obtiveram vitórias iniciais importantes, mas passaram por dificuldades internas durante o
conflito. Assim como na França, a peste negra, as rebeliões camponesas (veja o boxe Leituras a seguir) e o prolongamento da guerra
contribuíram para acirrar os ânimos da população.
No século XV, a Guerra dos Cem Anos mal terminou e desencadeou-se uma sangrenta disputa pela sucessão do trono inglês que
afetaria ainda mais a nobreza. Essa disputa ficou conhecida como a Guerra das Duas Rosas (1455-1485). Ela foi assim chamada
por causa das rosas que faziam parte do brasão das duas famílias envolvidas na disputa, York e Lancaster. O conflito fragilizou a
nobreza e abriu caminho para a centralização política do país.
Portugal e Espanha
Inicialmente povoada por iberos, celtas e lígures, a península Ibérica sofreu a invasão dos árabes no século VIII (veja o boxe
Leituras, p. 256). A formação dos dois Estados na região, Portugal e Espanha, durante a Baixa Idade Média, esteve estreitamente
vinculada à Guerra de Reconquista dos territórios ocupados pelos muçulmanos (veja o mapa ao lado).
Com a invasão islâmica, os cristãos só conseguiram manter reinos independentes no norte da península, na região montanhosa das
Astúrias. Dali partiu o movimento da Reconquista, iniciado no século XI.
Os reinos de Leão, Navarra, Castela e Aragão organizaram-se durante esse processo de Reconquista. Castela e Aragão anexaram os
demais reinos e, em 1479, se uniram por meio do casamento de seus monarcas, Fernando de Aragão (1452-1516) e Isabel de Castela
(1451-1504), que ficaram conhecidos como Reis Católicos.
Essa união real deu origem ao Estado centralizado espanhol, que, no entanto, só se consolidou com a conquista de Granada, último
reduto árabe no sul da península, e a consequente expulsão dos mouros, em 1492.
Quanto a Portugal, suas origens remontam à doação de terras feita pelo rei Afonso VI de Leão (1047-1109) a Henrique de Borgonha
(1035-1074), nobre francês participante da Guerra de Reconquista.
As terras doadas correspondiam ao condado Portucalense. A independência desse feudo em relação ao Reino de Leão foi
conseguida, após muitas disputas familiares, em 1139, sob a liderança de Afonso Henriques (1109-1185), filho de Henrique de
Borgonha.
A dinastia de Borgonha (1139-1383) teve início com a coroação de Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal. Henriques deu
prosseguimento à guerra contra os muçulmanos e expandiu as fronteiras do reino para o sul. À medida que o território se estendia,
a monarquia fazia doações de terras à nobreza guerreira, sem, no entanto, conceder-lhe a posse hereditária. Desse modo, em Portugal
evitou-se a formação de uma nobreza proprietária e autônoma, mantendo-se a hegemonia da autoridade real.
A burguesia mercantil do novo reino, por sua vez, consolidou-se com a transformação de Portugal em ponto de parada da rota
marítima que ligava o Mediterrâneo ao norte da Europa. Essa rota ganhou mais importância a partir do século XIV, quando a
insegurança gerada pela crise europeia, abalada por guerras e pela peste negra, levou à busca de novos entrepostos comerciais.
A dinastia de Avis
Em 1383, a morte de Fernando I, último rei da dinastia de Borgonha, sem herdeiros diretos, desencadeou uma acirrada disputa
sucessória.
Parte da nobreza apoiava a entrega da Coroa portuguesa ao genro de dom Fernando, o rei de Castela, representante de uma política
eminentemente feudal. Contra ela se levantaram os comerciantes, aliados a setores populares, sob a liderança de dom João de Avis.
Após a derrota castelhana na Batalha de Aljubarrota (1385), dom João de Avis foi coroado rei de Portugal. Conhecido como
Revolução de Avis, o movimento garantiu a independência de Portugal e deu origem à dinastia de Avis (1385-1582).
A nova dinastia caracterizou-se pela aproximação entre os interesses da monarquia e os da burguesia mercantil: os comerciantes
pretendiam ampliar seus mercados e o rei desejava se fortalecer por meio da cobrança de impostos sobre o florescente comércio.
Essa aliança de interesses desencadeou o processo conhecido como Expansão Marítima portuguesa, a partir do século XV.

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