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HISTÓRIA E TEORIA
DA ARQUITETURA E
DA CIDADE I
MÓDULO 2
TÓPICO 2

PROFESSORA MESTRA MARTA MARIA BURNIER


GANIMI
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INTRODUÇÃO

Na Arquitetura Bizantina, se destacam as características plásticas, com o uso de


elementos gregos e romanos a horizontalidade, os cheios sobre vazados, o aspecto
pesado. São os materiais e sistemas construtivos mais usados a abóbada de aresta,
abóbada de berço, abóbada em barrete de clérigo, abóbada sobre pendentes com ou sem
trompas, a cúpula, os arcos.
Nas basílicas, os elementos básicos arquitetônicos da igreja bizantina eram a
construção de abóbadas múltiplas, a cúpula e o plano centralizado. O plano da basílica,
longo e retangular, era inadequado a um ato litúrgico que ocupava somente a área central
da igreja. Os construtores eclesiásticos bizantinos pouco a pouco foram adotando um
esquema mais compacto e apropriado, que em geral tomava a forma de uma cruz grega.
O mais significativo modelo da arquitetura bizantina é a Basílica de Santa Sofia ou Hagia
Sofia.
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Módulo II – Período Paleocristão, Bizantino E


Românico
Tópico 2 - Período Bizantino
O Império Bizantino (fim do século IV ao século XV) foi uma continuação do
Império Romano do Oriente que conseguiu se manter forte, diferentemente do Império
Romano do Ocidente que foi enfraquecido por constantes ataques e invasões. O Império
Bizantino tinha sua capital em Bizâncio (atual Istambul - Turquia), nome que precedeu o
nome Constantinopla, em homenagem ao imperador romano Constantino, que a fundou
como segunda sede do Império Romano, enquanto este chegava à sua decadência.
Tornou-se, desde a queda de Roma, a maior cidade do mundo por cerca de quatrocentos
anos. Após a queda de Roma, Constantinopla foi a capital do império que mais resistiu,
por um milênio, entre os séculos V e XV, enquanto a Europa ocidental vivia o período da
Idade Média.

Catedral de Santa Sofia


Fonte: https://concretoemcurva.files.wordpress.com/2016/03/hagia-sophia.jpg?w=1024&h=390&crop=1

Segundo GOMBRICH, Essa questão da finalidade apropriada da arte em igrejas


provou ser de imensa importância para toda a história da Europa, pois constituiu uma das
principais questões que levaram as regiões orientais, de fala grega, do Império Romano,
cuja capital era Bizâncio ou Constantinopla, a recusarem a chefia do Papa latino, Uma
parte era contra todas as imagens de natureza religiosa. Eram os chamados iconoclastas,
ou "destruidores de imagens". Em 745, levaram a melhor e toda a arte religiosa foi
proibida na Igreja oriental. Mas seus adversários estavam ainda menos de acordo com as
idéias do Papa eles, as imagens não eram apenas úteis, eram sagradas. Os argumentos
com que procuraram justificar esse ponto de vista eram tão sutis quanto os usados pela
outra parte "Se Deus, em sua misericórdia, pôde decidir revelar-Se aos olhos dos mortais
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na natureza humana do Cristo", argumentavam eles, opor que não estaria Ele também
disposto a manifestar-se em imagens visíveis? Não adoramos essas imagens em si
mesmas, como fizeram os pagãos. Adoramos Deus e os Santos através de suas imagens
e para além delas.' Seja o que for que pensamos sobre a lógica dessa tese, a sua
importância para a história da arte foi tremenda. Pois quando esse partido retornou ao
poder, após um século de repressão, as pinturas numa igreja não mais puderam ser
encaradas como meras ilustrações para uso daqueles que não sabiam ler. Eram vistas
como reflexos misteriosos do mundo sobrenatural. Portanto. a Igreja oriental não pôde
continuar permitindo ao artista que seguisse, a sua fantasia na criação dessas obras. Por
certo, não era qualquer bela pintura de uma mãe com seu filho pequeno que poderia ser
aceita como verdadeira imagem sacra ou ―ícone" da Mãe de Deus, mas apenas aqueles
tipos consagrados por uma de séculos.
Assim os bizantinos passaram a insistir quase tão rigorosamente quanto os
egípcios observância das tradições. Mas essa questão tinha dois aspectos
diametralmente opostos. Ao exigir dos artistas que pintavam imagens sagradas que
respeitassem estritamente os modelos antigos, a Igreja Bizantina ajudou a preservar as
ideias e realizações da arte grega nos tipos usados para roupagens, faces ou gestos. Se
observarmos um retábulo bizantino da Santa Virgem, talvez nos pareça muito distante das
realizações da arte grega. No entanto, como as pregas do manto se desdobram do corpo
e irradiam em redor dos cotovelos e joelhos, o método de modelar a face e as mãos
acentuando as sombras, e mesmo a amplidão circular do próprio trono da Virgem, teriam
sido impossíveis sem as conquistas da pintura grega e helenística. Apesar de uma certa
rigidez, a arte bizantina manteve-se, portanto, mais próxima da natureza do que a arte do
Ocidente em períodos subsequentes. Por outro lado, a ênfase sobre a tradição e a
necessidade de respeitar certos modos permitidos de representar o Cristo ou a Virgem
tornaram difícil aos artistas bizantinos desenvolverem seus dotes pessoais. Mas esse
conservantismo desenvolveu-se apenas gradualmente e é um erro imaginar que os
artistas do período não tinham qualquer amplitude criativa. Foram eles, de fato, que
transformaram as simples ilustrações da arte cristã primitiva em grandes ciclos de
grandes e. solenes imagens que dominam o interior das igrejas bizantinas. Se
observarmos os mosaicos feitos por esses artistas gregos nos Bálcãs e na Itália, durante
a Idade Média, vemos que esse império oriental tinha conseguido, de fato, ressuscitar
algo da grandeza e majestade da antiga arte oriental e usá-la para glorificação do Cristo e
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Seu poder. A fig. 89 dá uma idéia de como essa arte podia ser impressionante, Mostra a
abside da igreja de Monreale, na Sicília, que foi decorada por artífices bizantinos pouco
antes de 1190. A própria Sicília pertencia à Igreja Ocidental ou Latina, o que explica o fato
de entre os Santos dispostos de cada lado da janela encontrarmos uma das mais antigas
representações de S. Tomás Becket, as notícias de cujo assassinato, uns vinte anos
antes, tinham ressoado por toda a Europa. Mas, pondo de lado a sua seleção de santos,
os artistas mantiveram-se próximos de sua tradição bizantina nativa: Os fiéis reunidos na
igreja ver-se-iam face a face com a majestosa figura do Cristo, representado como o
Senhor do Universo, Sua mão direita erguida no gesto de bênção. Por baixo está a
Virgem, entronizada como Imperatriz e ladeada por dois arcanjos e a fila solene de
santos. (GOMBRICH)
Imagens como estas, olhando-nos desde o alto de paredes douradas e refulgentes,
poderiam ser símbolos tão perfeitos da Verdade Sagrada que nem parecia haver
necessidade alguma de nos desviarmos delas. Assim, elas continuaram dominando em
todos os países governados pela Igreja Oriental. As imagens sacras ou "ícones" dos
russos ainda refletem essas grandes criações dos artistas bizantinos. (GOMBRICH)
A arquitetura bizantina caracteriza-se fortemente por mosaicos vitrificados e pelos
ícones, que eram pinturas sacras feitas normalmente sobre madeira. O estilo bizantino
também tinha como destaque técnicas de construção inovadoras para a época, em
especial, as voltadas para a construção de cúpulas, que surgiram por volta do século VI.
O Mosaico foi um tipo de arte muito difundido no Império Bizantino, principalmente
durante o reinado do imperador Justiniano de 526 a 565. As imagens em mosaico eram
formadas a partir de pequenos pedaços de pedra coloridos, colados nas paredes.

Mosaico na catedral de Santa Sofia.


Fonte:http://www.estilosarquitetonicos.com.br/imagens/jesus-cristo-hagia-sophia.jpg
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Como boa parte da arquitetura antiga, também a bizantina caracterizava-se pelas


obras de cunho religioso. A Catedral de Santa Sofia tornou-se o maior símbolo desse
estilo arquitetônico. Outros exemplos das primeiras obras bizantinas são a basílica de São
João e a basílica dos Santos Sérgio e Baco.
Um importante fato ajuda a entender melhor estes dois períodos tão próximos e
com uma grande identidade.
Segundo MIDLEJ (2014), o termo bizantino designa a arte do Império Romano
Oriental, sua cultura específica e seu estilo, indissociáveis da corte imperial de
Constantinopla, atual Istambul, não havendo uma linha clara de separação geográfica ou
cronológica entre a arte paleocristã (a arte cristã ocidental) e a arte bizantina (a cristã
oriental) até o século VI, quando as diferenças políticas e religiosas entre o Ocidente e o
Oriente levaram também a divisões artísticas, ), das quais o ícone religioso era uma das
maiores expressões dessas diferenças. Ícone deriva da palavra grega eikon, que significa
―imagem‖, tinha normalmente as figuras de Cristo, da Madona entronizada ou de santos
como assuntos principais, eram objetos de veneração pública e de culto pessoal, pois a
eles eram atribuídos o poder de interceder em benefício dos crentes e de possuírem
milagrosas propriedades de cura.
A arte romana ocidental e a arte romana oriental - ou, como alguns especialistas
preferem chamar-lhes, cristã oriental e cristã ocidental - não se distinguem especialmente
até ao século VI. Até então, as duas áreas geográficas contribuíram de igual modo para o
desenvolvimento da arte paleocristã. Porém, à medida que o Império do Ocidente entrou
em declínio, a liderança cultural pendeu a favor do Império do Oriente, um processo que
culminou durante o reinado de Justiniano, que governou o Império do Oriente de 527 a
565.
Sob o patrocínio de Justiniano, Constantinopla tornou-se a capital artística e
política do Império. O próprio Justiniano era um homem de forte orientação latina, e
esteve perto do êxito nas suas tentativas de retomar o domínio unificado de Constantino.
As diferenças políticas e religiosas entre o Oriente e o Ocidente levaram também a
divisões artísticas. Na Europa Ocidental, os povos celtas e germânicos herdaram a
civilização da Antiguidade Tardia, na qual fizera parte a arte paleocristã, mas
transformaram-na radicalmente.
A Antiguidade Tardia é uma periodização aproximada (cerca de 300 a 476 d.C.)
usada por historiadores e outros eruditos para descrever o intervalo entre a Antiguidade
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clássica greco-romana e a Idade Média, tanto na Europa continental quanto no mundo


Mediterrâneo: geralmente, entre a declínio do Império Romano do Ocidente do século III
em diante, até a conquista islâmica, e a refundação da Europa Oriental sob o comando do
Império Bizantino. O Oriente, pelo contrário, não conheceu uma tal ruptura. A Antiguidade
Tardia prosseguiu sem perturbações no Império Bizantino, embora elementos gregos e de
outras regiões do Mediterrâneo oriental tenham ganho em preponderância, em detrimento
do património artístico romano. Mesmo assim, a ideia de tradição desempenhou um papel
central no desenvolvimento da arte bizantina.
Os bizantinos desenvolveram a técnica da cúpula, possibilitando suas construções
em plantas quadradas através de um sistema de arcos, a cúpula sobre pendentes. Sobre
as paredes, erguiam-se quatro arcos, os espaços entre eles formavam triângulos
curvilíneos, que juntos promoviam a base circular necessária para a construção da cúpula
arredondada.

Imagem de uma cúpula sobre pendentes.


Fonte: https://concretoemcurva.files.wordpress.com/2016/03/volta-cupola-pennacchi.jpg?w=450&h=191&crop=1

Outra variação desta técnica era a que utilizava um tambor entre a base circular e a
cúpula, o que garantia as construções maior verticalidade, como mostra a figura.
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Fonte: https://concretoemcurva.files.wordpress.com/2016/03/cc3bapula-bizantina-blog-concreto-em-curva.jpg?w=768

Segundo ARGAN, Vasari foi o primeiro a observar que a cúpula de Santa Maria del
Fiore não devia ser relacionada apenas ao espaço da catedral e respectivos volumes,
mas ao espaço de toda a cidade, ou seja, a um horizonte circular, precisamente ao perfil
das colinas em torno de Florença: "Vendo-se ela elevar-se em tamanha altura, que os
montes ao redor de Florença parecem semelhantes a ela." portanto, também está
relacionada ao céu que domina aquele horizonte de colinas e contra o qual "parece que
realmente combata" na verdade, parece que o céu dela tenha inveja, pois sem cessar os
raios todos os dias a procuram". Na época de Vasari, era frequente o tema retórico da
inveja da natureza em relação à arte que a emula e supera; mas essa história dos raios
que todos os dias batem nela, se é que pode ter algum fundamento nos fatos, trai a
tradição popular, que, de um lado, elogia a resistência material da cúpula e, de outro, faz
referência a seu sentido ou significado cósmico, Esta não é a única referência, de resto
nem um pouco surpreendente, a um simbolismo cósmico e religioso da cúpula.
Quando entre 1435 e 1436, Alberti dedicava a Brunelleschi a versão em língua
vulgar do Tratado da Pintura, a cúpula havia sido fechada há pouco e ainda faltava a
lanterna. Apesar de os florentinos acompanharem com extremo interesse as vicissitudes
da construção, certamente ainda não poderia ter se formado uma lenda da cúpula. No
entanto, Alberti deu uma descrição interpretativa surpreendente da grande calota que
havia aparecido (quase que por milagre, mas por um milagre da inteligência humana) no
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céu de Florença. Dizer que a cúpula "erguia-se acima dos céus" era sem dúvida uma
figura literária, mas não um contrassenso; ao contrário, era dizer exatamente a mesma
coisa que um século depois Vasari dirá. Falar de céus, em vez de céu, eras para um
literato leitor de Dante, como Alberti, mais do que natural; contudo, isso não exclui o fato
de que, no plural, céus compreenda, se não propriamente as esferas da escolástica, o
céu físico e o céu metafísico. Urna vez que este último não tem limites, erguer-se acima
dele, delinear um limite visível para o infinito, significa compreendê-lo, defini-lo,
representá-lo e, já que o céu metafísico compreendia o físico, representar o espaço em
sua totalidade. (ARGAN)
Nos anos em que se escrevia o Tratado da pintura e o De Statua (que não é em
absoluto tardio, mas estritamente relacionado com o primeiro), Alberti refletia a fundo
sobre o terna da representação. Distinguia ele pelo menos dois modos de representação-
ficção: a pintura (e, por afinidade de problema, o baixo-relevo), que representa através da
projeção perspéctica de uma realidade em três dimensões no plano de duas dimensões; a
escultura, que representa um objeto de três dimensões com outro objeto tridimensional.
(ARGAN)

Fonte: http://www.estilosarquitetonicos.com.br/imagens/catedral-hagia-sophia.jpg

O edifício da Catedral de Santa Sofia é resultado da união dos vários estilos das
grandes construções romanas. A estrutura se assemelha a uma basílica romana, com
uma forma retangular. (ARGAN)
Levou apenas cinco anos para ficar pronta, de 532 a 537 d.C, e chamou atenção
pela sua cúpula projetada pelos cientistas gregos Isidoro de Mileto, um médico, e Antêmio
de Trales, um matemático, e por seu interior repleto de mosaicos. A basílica de Hagia
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Sofia, passou por várias reconstruções ao longo da história, devido aos danos que sofreu
por terremotos, mas em 1453, após a invasão do Império Otomano em Constantinopla
que a basílica se tornou uma mesquita, situação que durou até 1931. Neste período
grande parte de seus mosaicos foram caiados, além dos minaretes implantados à sua
volta. Só em 1931 que começaram o processo de recuperação desses mosaicos, e em
1935 ela foi inaugurada como museu, funcionando como tal até os dias de hoje. (ARGAN)
Além da dimensão, o seu grandioso domo central, que é aqui pela primeira vez
utilizado, torna-se um dos mais impressionantes atrativos e fica como símbolo maior da
arquitetura bizantina. Quatro arcos formam um quadrado que sustenta pendentes de
abóbadas esféricas, que, por sua vez, apoiam o imenso domo. A base deste domo é
vazada por quarenta janelas em arco que permitem a entrada da luz, dando leveza à
estrutura e oferecendo a ilusão de um halo celestial. (ARGAN)

http://www.estilosarquitetonicos.com.br/imagens/igreja-de-panaghia-Kapnikarea.jpg

Aquela grande forma representativa (e não puramente simbólica) do espaço


universal, que surgiu quase por milagre intelectual bem no meio de Florença, acima dos
telhados das casas e em relação direta com o horizonte visível das colinas e com a
abóbada dos céus, não é uma massa ou algo fechado e pesado, mas uma forma
estrutural. A composição de elementos portantes foram combinados de maneira a
suportar pesos muito maiores que o da própria estrutura e a exercer um empuxo, não
apenas transmitindo ao solo o peso da construção. A estrutura não apenas se auto
sustenta, mas exerce uma força que leva para cima. Podiam certamente ser consideradas
estruturas, a rigor, os cimbres1 de madeira que sustentavam a cúpula até o fechamento;
mas Brunelleschi descartara precisamente essas armações e estruturas portantes. Ao

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Cimbre é uma armação de madeira ou metal, que serve de molde durante a construção de um arco, abóboda, ou
cúpula em alvenaria. Esta estrutura provisória suporta os vários elementos durante a construção até à colocação do
fecho ou consolidação do elemento arquitetônico.
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falar a respeito delas, o tom de Alberti torna-se ligeiramente desdenhoso: em relação à


estrutura as armações eram apenas "vigamentos e abundância de madeira". Aquela
primeiríssima utilização da palavra "estrutura" para dizer arquitetura completa refere-se
decerto à eliminação daquela mistura de elementos decorativos góticos que o próprio
Alberti condenará em ―De re aedificatoria”, mas implica também urna experiência bastante
aprofundada da arquitetura gótica — e, talvez, não só da italiana, em que a estrutura
portante, com seu jogo de tensões e de impulsos, é claramente visível. Brunelleschi,
parece dizer Alberti, não jogou fora as estruturas que "ajudavam" a construção em sua
execução; ele as integrou à construção e, assim, a estrutura, que era um meio, um fator
funcional, identificou-se com a construção. Mas justamente a arquitetura dos dois séculos
precedentes, em seus aspectos mais autênticos e não superficialmente decorativos, era
uma arquitetura profundamente estrutural. A estrutura da cúpula, todavia, é
manifestamente uma estrutura não apenas portante, mas perspéctica ou representativa,
cujas nervuras convergem para um ponto. Esse ponto é representativo do infinito, de
modo que a estrutura arquitetônica é a própria estrutura do espaço. A cúpula, em certo
sentido, pode ser considerada como um aparato perspéctico e experimental, o terceiro
depois dos dois primeiros descritos pelo biógrafo. (ARGAN)
A arte bizantina era uma arte cristã, de caráter eminentemente cerimonial e
decorativo, em que a harmonia das formas – fundamental na arte grega – foi substituída
pela imponência e riqueza dos materiais e dos detalhes. Ela desconhecia perspectiva,
volume ou profundidade do espaço, e empregava em profusão as superfícies planas,
onde sobressaíam melhor os ornamentos luxuosos e complicados que acompanhavam as
figuras. (COELHO; BRUNO)
A religião ortodoxa, além de inspiradora, funcionava também como censora. Assim,
ao artista cabia apenas a representação, segundo os padrões religiosos, pouco
importando a riqueza de sua imaginação ou a expressão de seus sentimentos em relação
à determinada personagem ou doutrina sacra, ou mesmo ao soberano onipotente. Essa
rigidez explica o caráter convencional e certa uniformidade de estilo constante no
desenvolvimento da arte bizantina.
No momento de sua máxima expansão, o Império Bizantino englobava, na Europa,
os territórios balcânicos limitados pelos rios Danúbio, Drina e Sava, e parte da península
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Itálica (Exarcado2 de Ravena); a Ásia Menor, Síria e Palestina, na Ásia; o Egito e as


regiões que hoje formam a Líbia e a Tunísia, na África. Por outro lado, Constantinopla se
erguia no entroncamento das rotas comerciais entre a Ásia e a Europa mediterrânea. A
população do império compreendia, pois, nacionalidades diversas, sobretudo gregos.
Inspirada e guiada pela religião, a arquitetura alcançou sua expressão mais perfeita
na construção de igrejas. E foi precisamente nas edificações religiosas que se
manifestaram as diversas influências absorvidas pela arte bizantina. Houve um
afastamento da tradição greco-romana, sendo criadas, sob influência da arquitetura
persa, novas formas de templos, diferentes dos ocidentais.
Foi nessa época que se iniciou a construção das igrejas de planta de cruz grega,
coberta por cúpulas em forma de pendentes, conseguindo-se assim fechar espaços
quadrados com teto de base circular. As características predominantes seriam a cúpula
(parte superior e côncava dos edifícios) e a planta de eixo central, também chamada de
planta de cruz grega (quatro braços iguais). A cúpula procurava reproduzir a abóbada
celeste. Esse sistema, que parece já ter sido utilizado na Jordânia em séculos anteriores
e inclusive na Roma Antiga, se transformou no símbolo do poderio bizantino.
A cúpula possuía um significado místico. Ela não é apenas um elemento
arquitetônico decorativo. O sentido da cúpula está naquilo que ela representa: a abóbada
celeste. Há todo um simbolismo cosmológico dessa arquitetura em toda a sua extensão.
A cúpula representa o céu e sua base a terra. Lembramos que a cúpula não é, uma
invenção bizantina. Sua origem remonta um longo passado, tanto no mediterrâneo
oriental quanto no ocidental. Apesar de existirem construções cupuladas no oriente,
desde vários milênios antes de Cristo, a exemplo das cúpulas da Mesopotâmia, ou
mesmo as cúpulas ovulares de Khirokitia em Chipre, assim como também na arte
helenística, é contudo em Roma, onde esta forma arquitetônica alcançará sua maior
expressão.
Segundo ARGAN (2014) a cúpula é uma representação porque visualiza o espaço,
que por certo é real ainda que não seja visível; mas ela é justamente a representação do
espaço em sua totalidade e não de algo que acontece numa porção de espaço. Em De re
aedificatoria, Alberti dirá que os edifícios são objetos que estão num espaço cheio de

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O exarco ou exarca era a autoridade bizantina que governava a península Itálica ou a África, na qualidade de
representante do imperador do Oriente, após a queda do Império Romano do Ocidente. O cargo foi instituído pelo
imperador Maurício I, em fins do século VI, como uma reação ao enfraquecimento da autoridade imperial em regiões
mais distantes do poder central, e unificava as funções civis e militares do governo da província numa mesma pessoa.
O território governado pelo exarca chamava-se exarcado. Os bizantinos instituíram dois exarcados, o de Ravena e o de
Cartago.
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outros objetos e que, como tais, não são muito diferentes das estátuas, tanto assim que a
palavra "monumento" vale tanto para certas arquiteturas como para certas estátuas, ou
esculturas em relevo pleno, contanto que tenham um certo conteúdo histórico-ideológico.
Como objeto arquitetônico, a cúpula não tem um interesse particular, segundo Alberti, que
sequer diz que se trata da catedral florentina e de Seu acabamento — e que, para dizer
"cúpula", diz, ao contrário, estrutura. Em suma, a extraordinária invenção de Brunelleschi,
não é, no modo de ver de Alberti, um objeto arquitetônico, mas um imenso objeto
espacial, vale dizer, um espaço objetivado, isto é, representado, pois cada representação
é uma objetivação e cada objetivação é perspéctica porque dá uma imagem unitária e não
fragmentária, o que implica uma distância ou uma distinção, bem como uma simetria,
entre objeto e sujeito, de forma que a representação não é a cópia do objeto, mas a
configuração da coisa real enquanto pensada por um sujeito.
Sem dúvida, a construção mais característica e monumental por suas dimensões, é
o Panteon de Agripa, primeira construção com cúpula autoportante, que descansa sobre
um tambor cilíndrico. Este templo se identifica com uma linha arquitetônica que prefere as
abóbadas cilíndricas, ou com naves circulares, e grandes cúpulas, que, havendo herdado
muitos elementos do Oriente, passou por transformações, tornando-se modelo para os
edifícios paleocristãos e bizantinos.

Panteon de Agripa
Fonte: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/originals/f9/84/5d/f9845d55a4c8eeff5d86fefd4a85aebb.jpg
Fonte: http://4.bp.blogspot.com/-
raxTYVDOQLM/VHSvkVZde8I/AAAAAAAACdI/KdZZ44WXg5c/s1600/1922200_719691728075358_435920423_n.jpg
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Panteon de Agripa
Fonte: https://www.101viajes.com/sites/default/files/panteon-roma-exterior.jpg

Os arquitetos bizantinos conseguiram opor a uma construção quadrada uma cúpula


arredondada, com o uso do sistema de pendentes, ―triângulos‖ curvilíneos formados dos
intervalos entre os arcos e que constituíam a base sobre a qual era colocado o tambor.
A planta de eixo central, ou de cruz grega (quatro braços iguais), se impôs como
consequência natural da utilização da cúpula. Os pesos e forças que se distribuíam por
igual na cúpula, exigiam elementos de sustentação também distribuídos por igual, e essa
disposição ocorria menos facilmente na planta retangular ou de cruz latina, com braços
desiguais.
Os arquitetos orientais, da escola ocidental, herdaram os princípios da arquitetura
romana dando-lhe um matiz inteiramente próprio, de acordo com suas próprias
necessidades litúrgicas ou estéticas. Os edifícios cupulados bizantinos podem ser
divididos em três tipos:
1. Cúpula sobre plano circular, forma similar ao Panteon de Agripa
2. Cúpula sobre plano octogonal, como San Vitale en Ravenna, que é um
desenvolvimento do terceiro tipo.
3. Cúpula sobre plano quadrado, solução que se pode encontrar já no século VI e
que permanece até os nossos dias. A este último gênero, pertence, por exemplo, a
Catedral de Edessa.
Para passar desde a forma quadrada a circular, se utilizam quatro triângulos
semiesféricos que se situam em cada ângulo do cubo: são as conchas. Esta solução já
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era conhecida no Império Romano. Bizâncio, entretanto, não o copia servilmente, o


assume criativamente como uma referência que irá moldar ao seu estilo particular.
A difusão desta solução que combina as plantas centrais cupulada e basilical no
tempo e no espaço, demonstra o enorme êxito destas novas formas arquitetônicas. Em
torno do mar Egeu, Grécia, Ásia Menor, Trácia e Armênia, se focalizará o primeiro grande
núcleo desta difusão.
Durante a dinastia dos Comnenos3 (1057-1204) se introduzirá inovações que
enriquecerão o estilo bizantino. Entre elas, podemos destacar, a redução do diâmetro das
cúpulas, que ganham em altura e afinam sua silhueta. Enquanto isso, se multiplicam a
quantidade de cúpulas em cada edifício. Mostra, no Peloponeso, construída entre os
séculos XIII e XV, representa um particular desenvolvimento das formas arquitetônicas
bizantinas, combinando a planta basilical com a central, a cúpula e a trichora (três
absides).

Sitio Arqueologico de Mystras


Fonte: http://www.turismogrecia.info/images/blog/post/blog-GR-mystras-pantanassa-kirche-aussen.jpg
Fonte:
http://static.greturviajes.com:9999/images/phocagallery/Grecia/Peloponeso/thumbs/phoca_thumb_l_mystrasesparta_174
2240_800x600.jpg

Em todas as construções derivadas da arquitetura bizantina, além das inovações –


ampliação das cúpulas, multiplicação destas e das naves, entre outras – é possível
descobrir sua origem na combinação das plantas basilical e central. Assim a cúpula é
sempre o elemento característico.
Segundo SOARES, Ravena é hoje o principal local de preservação dos mosaicos
da Antiguidade Tardia e, especialmente, do período de Justiniano. A diminuição da
importância de Ravena a partir da Idade Média, acabou por conservar a cidade. Segundo
SAS-ZALOZIECKY, Ravena, como "centro político-administrativo do Estado, foi

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A dinastia Comnena ou dos Comnenos desempenhou um papel importante na história do Império Romano do Oriente
( Império Bizantino ), e interrompeu o declínio político do império a partir de 1081 até o ano de 1185, tanto assim que os
historiadores chamaram esse período de "renascimento do império".
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promovida a baluarte artístico em oposição às correntes dissolventes que se


manifestavam em sua volta" Ora, uma pergunta chama a atenção. Por que Ravena? Na
busca de uma possível resposta, é necessário observar a situação da capital como lugar
simbólico de onde emanava o poder do Império, não mais como lugar de fundação, como
no caso de Roma. Para os romanos, a forma e a sede do poder confundiam-se, razão
pela qual mudar uma capital significaria esquecer instituições e tradições que faziam parte
de outro tempo.
GOMBRICH nos revela que, tratamos da história da arte ocidental até ao período
de Constantino e aos séculos em que ela se adaptou ao preceito do Papa Gregório, o
Grande, de que as imagens São úteis para ensinar aos leigos a palavra sagrada. O
período que se seguiu a essa era cristã primitiva, o período que sobreveio à derrocada do
Império Romano, é geralmente conhecido pelo nada lisonjeiro epíteto de Idade das
Trevas. Foi assim chamado para significar, em parte, que as pessoas que viveram
durante esses séculos de migrações, guerras e sublevações, estavam mergulhadas em
escuridão e tinham poucos conhecimentos para guiá-las, mas também para assinalar que
pouco sabemos a respeito desses séculos confusos e desconcertantes que se seguiram
ao declínio do mundo antigo e precederam o surgimento dos países europeus na
configuração geográfica em que mais ou menos os conhecemos hoje. Não existem, é
claro, limites fixados para o período, mas; para os nossos propósitos, poderemos dizer
que durou quase quinhentos anos, aproximadamente de 500 a 1000 d.C. Quinhentos
anos é um longo período em que muita coisa pode mudar e muita coisa, de fato, mudou.
Mas o que mais nos interessa é que todos esses anos não viram o surgimento de
qualquer estilo claro e uniforme, e sim o conflito de um grande número de estilos
diferentes que só começaram a se fundir já em fins desse período. Para os que conhecem
algo da história da ―Idade das Trevas‖, isso dificilmente surpreenderá. Não foi apenas um
período tenebroso; foi também desigual e variegado, com tremendas diferenças entre
vários povos e classes, Ao longo desses cinco séculos existiram homens e mulheres,
sobretudo nos mosteiros e conventos, que amavam o saber e a arte, e tinham uma
grande admiração por aquelas obras do mundo antigo que haviam sido preservadas em
bibliotecas e depósitos. Por vezes, esses monges cultos e educados ocupavam posições
de poder e influência nas cortes dos poderosos, e tentavam ressuscitar as artes que tanto
admiravam. Mas, com frequência, seu trabalho era reduzido a zero por causa de novas
guerras e invasões por incursores vindos do norte, cujas opiniões acerca da arte eram, de
17

fato, muito diferentes. As várias tribos teutônicas, os godos, vândalos, saxões, suevos e
Vikings, que assolavam a Europa, destruindo e pilhando, eram considerados bárbaros por
aqueles que apreciavam as realizações gregas e romanas na literatura e na arte. Numa
acepção, essas tribos eram certamente bárbaras, mas isso não significa necessariamente
que não possuíssem um sentimento do belo nem uma arte própria.

Igreja de Earls Barton. Uma torre saxônica imitando uma estrutura de madeira, Condado de Northampton, Reino Unido.
Construída cerca do ano 1000. Fonte:https://s-media-cache-
ak0.pinimg.com/originals/41/97/df/4197df821c33afdb932ec3b652d719c5.jpg

Tinham artífices habilidosos e experimentados em trabalhos de metal finamente


lavrado, e excelentes entalhadores, comparáveis aos dos maoris da Nova Zelândia.
Gostavam de complicados padrões que incluíam os corpos contorcidos de dragões, ou
aves misteriosamente entrelaçadas, Ignoramos exatamente onde esses padrões se
originaram no século VII ou o que significavam, mas não é improvável que as idéias
dessas tribos teutônicas sobre arte se assemelhassem às idéias das tribos primitivas em
toda parte. Há razões para crer que também elas concebessem essas imagens como um
meio de realizar práticas de magia e exorcizar espíritos malignos, As figuras esculpidas
de dragões provenientes de trenós e navios dos Vikings dão uma boa ideia do caráter
dessa arte.
18

Cabeça em madeira entalhada de dragão. Encontrada em Oseberg (Noruega). Cerca do ano de 820. Oslo.
Fonte: GOMBRICH

Pode-se perfeitamente imaginar que essas cabeças ameaçadoras de monstros


eram algo mais do que inocentes decorações. De fato, sabemos que existiam leis entre os
Vikings noruegueses que impunham ao capitão de navio retirar essas carrancas antes de
entrar em seu porto de origem. "'para não assustar os espíritos da Terra".
Os monges e missionários da Irlanda céltica e da Inglaterra saxônia tentaram
aplicar as tradições desses artífices nórdicos às tarefas da arte cristã. Construíram igrejas
e campanários em pedra imitando as estruturas de madeira usadas por artífices locais,
mas os monumentos mais surpreendentes ao êxito deles são alguns dos manuscritos
feitos na Inglaterra e Irlanda durante os séculos VII e VIII. A fig. 105 é uma página do
famoso Evangelho de Lindisfarne, feito em Nortúmbria pouco antes de 700 d.C. Mostra a
cruz composta de incrivelmente rico de (dragões ou serpentes entrelaçados, contra um
fundo de um padrão ainda mais complexo.
É excitante procurarmos abrir caminho através desse espantoso labirinto de formas
sinuosas e acompanhar as espirais desses corpos inextricavelmente entretecidos. É ainda
mais espantoso constatar que o resultado não é confusão e que os vários padrões se
correspondem rigorosa e mutuamente para formar uma complexa harmonia de desenho e
cor. É difícil imaginar como pode alguém ter pensado em tal trama e tido a paciência e
perseverança para levá-la a termo. Os artistas que adotaram essa tradição nativa não
careciam por certo de habilidade nem de técnica.
É ainda mais surpreendente observar o modo como as figuras humanas foram
representadas por esses artistas nos manuscritos iluminados da Inglaterra e Irlanda. Não
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parecem verdadeiras figuras humanas, mas estranhos padrões compostos de formas


humanas.

São lucas de um evangelho manuscrito, pintado por volta de 750. St. Gallen, Stiftsbibliothek. Fonte: GOMBRICH.

Podemos ver que o artista utilizou algum exemplo que encontrara numa velha
Bíblia e o transformou de acordo com seu gosto pessoal. Mudou as dobras da vestimenta
para algo como faixas entrançadas, as madeixas de cabelo e até as orelhas para rolos, e
a face toda converteu-se numa máscara rígida. Essas figuras de evangelistas e santos
parecem quase tão hirtas e exóticas quanto os ídolos primitivos. Mostram que os artistas
que se haviam criado na tradição de sua arte nativa tiveram dificuldade em adaptar-se às
novas exigências dos livros cristãos. Entretanto, seria um erro considerar tais ilustrações
meramente rudimentares. O treinamento de mão e olho que o artista recebera, e que o
capacitara a realizar um belo padrão na página, ajudara-o a trazer um novo elemento para
a arte ocidental. Sem essa influência, a arte ocidental ter-se-ia possivelmente
desenvolvido numa direção semelhante à da arte de Bizâncio. Graças ao choque de duas
tradições, a clássica e a dos artistas nativos, algo inteiramente novo começou a crescer
na Europa Ocidental. Na verdade, o conhecimento das realizações anteriores da arte
clássica não se perdera inteiramente, de forma alguma. Na corte de Carlos Magno, que
20

se considerava o sucessor dos imperadores romanos, a tradição artesanal romana foi


pressurosamente revivida. A igreja que Carlos Magno mandara construir por volta de 800
d.C. em sua residência de Aix-la-Chapelle é uma cópia bastante próxima de uma famosa
igreja que fora construída em Ravena trezentos anos antes. (GOMBRICH)

Interior e Fachada Capela Palatina Aix-la-Chapelle


Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/3/37/Aix_dom_int_vue_cote.jpg/220px-
Aix_dom_int_vue_cote.jpg
Fonte: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/originals/9c/7a/bf/9c7abf9529ef1b07f407bd9a6732d940.jpg

A partir da era moderna o artista é valorizado quando é original, mas não é o que
ocorreu no passado. Um mestre egípcio, chinês ou bizantino ficaria imensamente
perplexo se lhe exigissem tal coisa. Tampouco artista medieval da Europa Ocidental teria
entendido por que haveria de inventar novos métodos de planejar uma igreja, de
desenhar um cálice ou de representar a História Sagrada, quando os antigos métodos
serviam tão bem a esses fins. O piedoso devoto que queria dedicar um novo sacrário para
uma relíquia de seu santo padroeiro não só tentava obter o mais precioso material que
estivesse ao seu alcance, mas desejaria também dotar o mestre com um antigo e
venerável exemplo de como a lenda do santo devia ser corretamente representada. Nem
O artista se sentia embaraçado por esse tipo de encomenda. Ainda lhe restava campo
suficiente para mostrar se era um mestre ou um charlatão. (GOMBRICH)
Talvez possamos entender melhor essa atitude se pensarmos em nosso próprio
enloque da música. Se pedirmos a um músico para locar num casamento, não esperamos
que ele componha algo novo para a ocasião, assim como o mecenas medieval não
21

esperava uma nova invenção quando encomendava uma pintura sobre a Natividade. E,
assim como dois músicos, igualmente grandes podem interpretar a mesma peça de
modos muito diferentes, também dois grandes mestres medievais podiam criar obras de
arte muito diferentes sobre o mesmo tema e até a partir do mesmo modelo antigo.
(GOMBRICH)

Cristo lavando pés dos apóstolos. Do livro dos Evangelhos de oto III, iluminado por volta de 1000. Munique,
Staatsbibliothek, Alemanha. Fonte: GOMBRICH

Era costume em livros gregos e romanos de terem o retrato do autor representado


no frontispício. A imagem do evangelista escrevendo, deve ser uma cópia
extraordinariamente fiel desse tipo de retrato. O modo como o santo está envolto em sua
toga, à melhor maneira clássica, a forma como sua cabeça está modelada em muitas
tonalidades de luz e cor, convence-nos de que o artista medieval se empenhou de corpo e
alma para dar uma versão acurada e meritória de um modelo venerado. O próprio
tratamento da túnica e do fundo dá a impressão de ter sido feito de intensa excitação.
Creio que essa impressão se deve, em parte, à evidente satisfação com que o artista
aproveitava todas as oportunidades para desenhar linhas sinuosas, onduladas, e pregas
em zigue-zague. É possível que houvesse algo no original para sugerir esse tratamento,
mas o mais provável é que tenha seduzido o artista medieval por lhe recordarem aquelas
22

faixas e linhas entrelaçadas que tinham sido a realização suprema da arte nórdica. Em
quadros como esses, vemos o surgimento de um novo estilo medieval que possibilitou à
arte fazer algo que nem a antiga arte oriental nem a clássica tinham feito. Os egípcios
tinham desenhado preponderantemente o que sabiam existir, os gregos o que viam, na
Idade Média, o artista aprendeu a expressar também na sua obra o que sentia.
(GOMBRICH)
Segundo GOMBRICH, não se pode fazer jus a qualquer obra de arte medieval sem
ter em mente esse propósito. Pois esses artistas não pretendiam criar uma semelhança
convincente com a natureza ou realizar belas coisas: queriam comunicar a seus irmãos
de fé o conteúdo e a mensagem da História Sagrada. E nisso talvez tenham sido mais
bem-sucedidos do que a maioria dos artistas de épocas anteriores ou posteriores. A figura
anterior é reproduzida de um livro dos evangelhos que foi ilustrado (ou, como se diz,
"iluminado") na Alemanha mais de um século depois, por volta do ano 1000. Representa o
incidente contado no Evangelho de S. João (XIII, 4-9), quando o Cristo, depois da Última
Ceia, lavou os pés dos discípulos: Disse-lhe Pedro: "Nunca me lavarás os pés."
Respondeu-lhe Jesus: "Se eu não te lavar, não tens parte comigo." Simão Pedro lhe
pediu então: ' 'Senhor, não somente os meus pés, mas também as mãos e a cabeça."
Somente este diálogo importava ao artista. Não viu razão alguma para representar
a sala em que a cena ocorreu; isso poderia meramente ter desviado as atenções do
significado interior do evento. Preferiu colocar principais figuras diante de um fundo
dourado, plano e luminoso, sobre o os gestos dos interlocutores se destacam como uma
solene inscrição: o movimento implorativo de Pedro, o gesto de sereno ensinamento do
Cristo. Um discípulo à direita descalça as sandálias, outro traz uma bacia, os demais
amontoam-se por trás de Pedro. Todos os olhos estão rigorosamente voltados centro da
cena e dão-nos assim a sensação de que alguma coisa de infinita significação está aí
acontecendo. Que importa se a bacia não é uniformemente redonda, e se o pintor teve
que torcer para cima a perna de S. Pedro, o joelho algo jogado para a frente, a fim de que
seu pé se mostre nitidamente fora da água? Ele estava preocupado com a mensagem de
humildade divina — e isso ele transmitiu. (GOMBRICH)
Lembremos o ensinamento do Papa Gregório, o Grande, de que ―a pintura pode
fazer pelo analfabeto o que a escrita faz pelos que sabem ler.‖ Essa busca de clareza
destaca-se não só nas iluminuras, mas também nas obras de escultura, como a almofada
23

de um portal de bronze que foi encomendada para a igreja alemã de Hildesheim pouco
depois do ano 1000.

Fonte: GOMBRICH

Mostra o Senhor acercando-se de Adão e Eva após a queda. Uma vez, nada existe
nesse relevo que não pertença estritamente à história. Mas essa concentração nas coisas
que importam faz com que as figuras se muito mais nitidamente contra o fundo
despretensioso — e quase podemos ler o que seus gestos dizem: Deus aponta para
Adão, Adão para Eva, e Eva para a serpente no chão. A transferência sucessiva de culpa
e a origem do pecado expressam-se com tamanho vigor e clareza que não tardamos em
esquecer que as proporções das figuras talvez não estejam rigorosamente corretas e que
os corpos de Adão e Eva não são belos, pelos nossos padrões. (GOMBRICH)
Não devemos imaginar, porém, que toda a arte nesse período existiu
exclusivamente para servir idéias religiosas. Não apenas igrejas foram construídas na
Idade Média, mas castelos também, e os barões e senhores feudais a quem os castelos
pertenciam empregavam ocasionalmente artistas. A razão pela qual somos propensos a
esquecer essas obras quando falamos da arte do início da Idade Média é simples: os
castelos eram frequentemente destruídos, enquanto, que as igrejas eram poupadas. A
arte religiosa era, de um modo geral, tratada com maior respeito, e cuidada com mais zelo
do que meras decorações de aposentos privados. Quando estas se tornavam antiquadas,
eram removidas jogadas fora tal como acontece hoje em dia. Mas, felizmente, um grande
exemplo deste último tipo de arte chegou até nós — e isso porque foi preservado numa
igreja. É a famosa Tapeçaria de Bayeux, a história Conquista Normanda. Ignoramos
exatamente essa tapeçaria foi fabricada, mas a maior parte dos estudiosos concordo que
isso aconteceu no âmbito da memória viva das cenas que ilustra talvez por volta de 1080.
A tapeçaria é uma crônica pictórica do gênero que conhecemos da antiga arte oriental e
24

romana— a história de uma vitória. Conta a sua história com maravilhosa vivacidade.
(GOMBRICH)

4
Na figura vemos como Haroldo presta juramento a Guilherme.
Fonte: GOMBRICH

Nesta outra figura mostra como ele regressa à Inglaterra.


Fonte: GOMBRICH

Nada poderia ser mais claro que o modo como a história é contada: vemos
Guilherme em seu trono observando Haroldo no momento em que este coloca a mão
sobre as relíquias sagradas para jurar vassalagem; foi esse juramento que serviu a de
pretexto para suas pretensões ao trono inglês. Na cena seguinte, há um homem no
balcão, com uma das mãos sobre os olhos para espiar o barco de Haroldo, em sua
chegada do mar largo. É verdade que seus braços e dedos têm um aspecto algo singular

4
Haroldo II (1022 a 1066) foi o rei dos anglo-saxões que prestou esse juramento de fidelidade a Guilherme, o
conquistador (27 a 1087), e que por este seria vencido e morto na Batalha de Hastings. (GOMBRICH)
25

e que todas as figuras da história são estranhos homúnculos que não foram desenhados
com a segurança dos cronistas assírios ou romanos. Quando o artista medieval desse
período não tinha modelo para copiar, desenhava um pouco como uma criança. É fácil
sorrir dele, mas é muitíssimo mais difícil fazer o que ele fez. Conta-nos a epopeia com
imensa economia de meios e enorme concentração no que lhe parecia ser importante, e o
resultado final permanece mais memorável do que as descrições realistas dos nossos
correspondentes de guerra e cinegrafistas. (GOMBRICH)

Referências
SOARES, F. Mosaicos em Procissão: A política de imagens de Justiniano em
Ravena (527 — 565 a.D ). Universidade de Brasília,UnB. Dissertação Mestrado, 2006.
Brasilia.

COELHO, G., BRUNO, F. História e Teoria da Arquitetura I -


http://simplexos.blogspot.com.br/2010_05_01_archive.html. UNIGRANRIO - Acesso em:
21/10/2016.

ABIKO, A., ALMEIDA, M.A., BARREIROS, M.A. Urbanismo: história e


desenvolvimento. Escola Politécnica Da Universidade De São Paulo. Departamento De
Engenharia De Construção Civil. USP, São Paulo. ARTIGO.1995

FLORES, M. História ilustrada do espaço sagrado. EDIPUCRS. Porto Alegre, 1999.

Midlej, D. “Bizantinices” e ressignificações de imagens na arte baiana. 23º Encontro


da ANPAP. UFRB. Belo Horizonte. ARTIGO. 2014

MATEUS, C. A Arte da Idade Média/ Arte Medieval: A Arte Bizantina (Arquitectura,


Escultura, Pintura e Mosaico). http://umolharsobreaart.blogspot.com.br/2014/04/82-arte-
da-idade-media-arte-medieval.html.Publicado 12 de Abril de 2014. Acesso em
20/10/2016.

JANSON, H. W. A Nova História de Janson, 9ª Edição, Fundação Calouste Gulbenkian.


Portugal, 2010
26

JANSON, H. W. História da Arte. Fundação Calouste Gulbenkian. Portugal, 2010.

CAMBOTAS, De MEIRELES, F. História da Cultura e das Artes. 11º Ano, 2ª Parte.


Porto Editora. Portugal, 2012

TUR, J.R. Tesouros Artísticos do Mundo - Entre o Oriente e o Ocidente (O Bizantino


e o Pré-Românico), Volume III. Ediclube. Portugal, 1997.

GOMBRICH, E. H. A história da arte. Rio de Janeiro: LTC Livros Técnicos e Científicos,


1995.

Atividades Comentadas

1 – Sobre a Arquitetura Paleocristã, verifique quais as afirmações abaixo são


verdadeiras.
I – O batistério externamente é um edifício simples, revestido por tijolos cozidos, e
sua característica essencial é um cubo por cima da pequena cúpula central
II - As necrópoles cristãs ou catacumbas merecem uma menção especial uma vez
que nelas se criaram as primeiras formas de arte cristã.
III – A catedral tem seu exterior imponente e profusamente decorado. O interior é
amplo, elevado e luminoso, de formas arquitetônicas graciosas e leves, quase sem peso.

A) I e II B) I, II, e III C) II e III D) Somente I Somente II


Comentário: Cada estilo arquitetônico tem algumas características. É bom estudar
o contexto para não se confundir com a grande quantidade de estilos existentes.
Resposta: A
2 - A igreja cristã primitiva adotou um prédio comum em Roma, usado para diversos fins,
que era a basílica, após a conversão de Constantino ao cristianismo. Tanto os gregos
como os romanos, adotavam um modelo de edifício, denominado "basílica", administrada
pela figura do Basileu, que seria mais ou menos como um Juiz nos dias de hoje, lugar civil
27

destinado ao comércio e assuntos judiciais, que depois passam a ser usadas para fins
religiosos, por causa do tamanho e por poder abrigar um número alto de fiéis.
A planta basilical tinha:
A) forma quadrada, com duas ou três naves, arcadas e colunatas cobertas por tetos
armados com madeira.
B) a forma centrada, de influência oriental, com três ou cinco naves, arcadas e colunatas
cobertas por tetos armados com madeira.
C) a forma de cruz grega, com três ou cinco naves, arcadas e colunatas cobertas por
tetos armados com madeira.
D) formas circular, com duas ou três naves, arcadas e colunatas cobertas por tetos
armados com madeira.
E) a forma de cruz latina, com três ou cinco naves, arcadas e colunatas cobertas por tetos
armados com madeira.
Comentário: Muito importante é o estudo das plantas e elementos construtivos de
cada período. Eles influenciam no resultado estético final dando singularidade aos
edifícios.
Resposta: E

3 - A basílica de Hagia Sofia, Santa Sofia, levou apenas cinco anos para ficar
pronta, de 532 a 537 d.C, e chamou atenção pela sua cúpula projetada pelos cientistas
gregos Isidoro de Mileto, um médico, e Antêmio de Trales, um matemático, e por seu
interior repleto de mosaicos. Passou por várias reconstruções ao longo da história. Só em
1931 que começaram o processo de recuperação desses mosaicos, e em 1935 ela foi
inaugurada como museu, funcionando como tal até os dias de hoje. Ela é um dos
monumentos mais marcantes do Período Bizantino. Porque:
A) Além da dimensão, o seu minúsculo domo central, que é aqui pela primeira vez
utilizado. Oito arcos formam um quadrado que sustenta pendentes de abóbadas
esféricas, que, por sua vez, apoiam o imenso domo. A base deste domo é
vazada por quarenta janelas em arco que permitem a entrada da luz.
B) Além da dimensão, o seu minúsculo domo central, que é aqui pela primeira vez
utilizado. Quatro arcos formam um quadrado que sustenta pendentes de
abóbadas esféricas, que, por sua vez, apoiam o imenso domo. A base deste
domo é vazada por quarenta janelas em arco que permitem a entrada da luz.
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C) Além da dimensão, o seu grandioso domo central, que é aqui pela primeira vez
utilizado. Oito arcos formam um quadrado que sustenta pendentes de abóbadas
esféricas, que, por sua vez, apoiam o imenso domo. A base deste domo é
vazada por quarenta janelas em arco que permitem a entrada da luz.
D) Além da dimensão, o seu grandioso domo central, que é aqui pela primeira vez
utilizado. Quatro arcos formam um quadrado que sustenta pendentes de
abóbadas esféricas, que, por sua vez, apoiam o imenso domo. A base deste
domo é vazada por quarenta janelas em arco que permitem a entrada da luz.
E) Além da dimensão, o seu grandioso domo central, que é aqui pela primeira vez
utilizado. Oito arcos formam um quadrado que sustenta pendentes de abóbadas
esféricas, que, por sua vez, apoiam o imenso domo. A base deste domo é
vazada por quarenta janelas em arco que permitem a entrada da luz.

Comentário:
Resposta: D

4 - Os bizantinos desenvolveram a técnica da cúpula, a cúpula sobre pendentes.


Ela permitia que suas construções pudessem ter plantas quadradas. Em relação a este
sistema É correto afirmar:

Imagem de uma cúpula sobre pendentes.

I) O sistema era de arcos sobre as paredes, erguiam-se quatro arcos, os espaços


entre eles formavam triângulos curvilíneos, que juntos promoviam a base circular
necessária para a construção da cúpula arredondada.
II) O sistema era arcos sobre pilares, erguiam-se quatro arcos, os espaços entre eles
formavam triângulos curvilíneos, que juntos promoviam a base circular necessária
para a construção da cúpula arredondada.
29

III) Esta técnica tinha uma variação que utilizava um tambor entre a base circular e a
cúpula, o que garantia as construções maior verticalidade.
IV) Esta técnica tinha uma variação que utilizava um tambor entre a base quadrada e a
cúpula, o que garantia as construções maior verticalidade.

A) I, III B) I e III C) Somente I D) I e IV E) Somente II


Comentário: A cúpula possuía um significado místico. Ela não é apenas um
elemento arquitetônico decorativo. O sentido da cúpula está naquilo que ela representa: a
abóbada celeste. Segundo ARGAN (2014) a cúpula é uma representação porque
visualiza o espaço, que por certo é real ainda que não seja visível; mas ela é justamente a
representação do espaço em sua totalidade e não de algo que acontece numa porção de
espaço.
Resposta: B

5 – Uma cidade é o principal local de preservação dos mosaicos da Arquitetura


Paleocristã e Bizantina na Antiguidade Tardia e, especialmente, do período de Justiniano.
A partir da Idade Média, houve uma diminuição de sua importância, o que acabou por
conservar a cidade. Ela chegou a ser o "centro político-administrativo do Estado, foi
promovida a baluarte artístico em oposição às correntes dissolventes que se
manifestavam em sua volta". Qual cidade era esta?
A. Santa Sofia
B. Roma
C. Ravena
D. Agripa
E. Placídia

Comentário: Por que Ravena? Na busca de uma possível resposta, é necessário


observar a situação da capital como lugar simbólico de onde emanava o poder do
Império, não mais como lugar de fundação, como no caso de Roma. Para os romanos, a
forma e a sede do poder confundiam-se, razão pela qual mudar uma capital significaria
esquecer instituições e tradições que faziam parte de outro tempo.
Resposta: C
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Pesquisa

Uma boa idéia é explorar um pouco mais o assunto é procurar o porquê destas as
obras que mais marcam o período, como Santa Sofia (Hagia Sophia), a sagrada
sabedoria.
Com mais de 30 metros de um lado ao outro e 53 metros de altura, o interior
abobadado ultrapassava em tamanho todas as igrejas da Europa. Edificada por Justiniano
em 537, foi por nove séculos o centro que comandou o mundo ortodoxo cristão, dela os
missionários propagavam a cultura bizantina em toda a Europa Oriental e na Rússia até a
tomada de Constantinopla pelos turcos em 1453 que converteu a igreja em mesquita.
Vamos conhece-la melhor?

Passeios Virtuais
Escolha alguns dos Passeios virtuais pelos vídeos. Seria bom pesquisarmos um
pouco e pesquisar sobre os locais dos passeios escolhidos.

Passeio virtual pela Arquitetura Bizantina


VIDEO 1 _Arquitetura Bizantina, Islâmica e Gótica!
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=MBce8ER9ga0
VIDEO 2 _ Construindo um Império: Bizâncio (Dublado)
Documentário
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=NodK1I07GJA
VIDEO 3 _ Você conhece a Basílica De Santa Sofia? (Dublado)
Documentário
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=U7CsNfKUUhw

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