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Resumo: Este artigo tem como objetivo analisar o discurso do jornal O Liberal sobre as
transformações tecnológicas que impactam nos processos jornalísticos da organização noticiosa.
De abordagem qualitativa, esta investigação se fundamenta em elementos da análise do discurso
da linha francesa (BENETTI, 2008, 2010; ORLANDI, 1988, 1996, 2005 e PECHÊUX, 1978,
1988). O corpus é constituído por 10 matérias - voltadas para assuntos sobre processos
jornalísticos e tecnologia – da Edição Especial em comemoração aos 73 anos do periódico.
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Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Linguagens e Cultura (PPGCLC) da
Universidade da Amazônia (UNAMA). Graduada em Jornalismo pela Universidade da Amazônia
(UNAMA). É membro do Grupo de Pesquisa “Ubiquidade da Comunicação - UBICOM” (UNAMA). E-
mail: giovannamfigueiredo@gmail.com
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Docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Linguagens e Cultura (PPGCLC) e dos
cursos de Comunicação Social da Universidade da Amazônia (UNAMA). Pós-doutoranda do Programa
de Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia da Universidade Federal do Pará
(PPGCOM/UFPA). Doutora em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (PPGCOM/UFRGS). É coordenadora do Grupo de Pesquisa “Ubiquidade da Comunicação -
UBICOM” (UNAMA) e membro dos Grupos de Pesquisa "Inovação e Convergência na Comunicação" -
InovaCom (UFPA/CNPq) e "Laboratório de Edição, Cultura & Design - LEAD" (UFRGS/CNPq). E-
mail: maira.evangelistadesousa@gmail.com
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3 a 6 de Novembro de 2020
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1. Introdução
Os usos e as apropriações de mídias sociais e tecnologias digitais nos
processos jornalísticos transformam os modos de produção de sentidos dos discursos de
veículos noticiosos tradicionais, como o jornal impresso (RIBEIRO, 2020). Até então, o
status de uma organização jornalística estava relacionado à construção de um discurso –
próprio – que a tratava como superior, detentora da verdade e definidora da realidade
(BRITTOS; GASTALDO, 2006). Entretanto, essa realidade vem se transformando,
especialmente, a partir da popularização de plataformas digitais de comunicação, como
as mídias sociais (BRAMBILLA, 2013). Diante desse cenário, há um aumento
gradativo do discurso autorreferencial, que é quando os veículos noticiosos tradicionais
fazem referência “a si próprios”, como estratégia para garantir o reconhecimento por
parte da sociedade, enquanto mediadores da informação (RIBEIRO, 2010).
Com o objetivo de analisar o discurso do jornal O Liberal sobre as
transformações tecnológicas que impactam nos processos jornalísticos da instituição,
essa pesquisa se fundamenta em elementos da análise do discurso da linha francesa,
proposta por Pechêux (1978, 1988) e discutida no Brasil, dentre outros autores, por
Orlandi (1988, 1996, 2005) e por Benetti - que enfoca no Jornalismo (2008 e 2010).
Para tanto, faremos uso, metodologicamente, de uma abordagem do tipo qualitativa da
Análise do Discurso, com fundamentação no modelo apresentado por Benetti (2010).
A análise será realizada a partir da seleção de dez matérias publicadas na Edição
Especial Nº 36.282, de 23 e 24 de novembro de 2019, em comemoração aos 73 anos do
jornal O Liberal. O periódico tem sede em Belém (PA), região Norte do Brasil.
2. Discurso e jornalismo
Para produzir uma análise do discurso, se torna indispensável entender o que é o
discurso em si, por isso, apresentamos definições basilares e complementares do
conceito. O discurso é onde se pode observar a relação entre linguagem e ideologia,
sendo que esta última é entendida como o imaginário em que estão inseridas as relações
sociais (ORLANDI, 1996). Ele pode ser definido também como efeito e produtor de
sentido entre locutores (ORLANDI, 2005). Assim, até mesmo o silêncio pode ser
considerado uma forma de discurso (BENETTI; JACKS, 2001).
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que haja discurso, mesmo que não seja efetiva ou concreta, mas é necessário que a troca
de lugar possa ser imaginada (BENETTI, 2008).
Diante da introdução sobre as noções do que é um discurso e os principais
aspectos a serem discutidos, nos debruçaremos no discurso institucional do jornalismo
para compreender o objeto empírico a ser analisado. Nesse sentido, Benetti e Hagen
(2010) afirmam:
Orienta-se pelo interesse público, e não pelo interesse privado dos
veículos; é capaz de identificar a relevância e a irrelevância dos fatos;
narra o que importa saber sobre o presente social; faz uso das fontes
mais aptas e confiáveis; conhece as necessidades e os interesses do
leitor. São basicamente essas crenças que permitem ao jornalismo
estabelecer, no contrato de comunicação, suas finalidades. É também
no horizonte dessas crenças que se pode compreender “quem diz”
(BENETTI; HAGEN, 2010, p.125).
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que se diz” e “em que condições se diz” e internos - referem-se a “como se diz”. Sendo
que a condição de finalidade (“para quê se diz”) norteia as demais.
A renovação contínua desse contrato é realizada por conteúdos autorreferenciais,
nos quais jornalistas constroem significados sobre sua função social, seus valores e suas
rotinas produtivas (BENETTI; GADRET, 2017). Segundo as autoras, esses conteúdos
autorreferenciais produzem representações sobre o enunciador que são efeitos de
verdade.
Charaudeau (2012) diferencia valor de verdade (ser verdadeiro) e efeito de
verdade (acreditar ser verdadeiro). O segundo valor, que surge da subjetividade do
sujeito, pode ser associado ao jornalismo e se estrutura sobre uma crença construída,
baseada na convicção. Nesse sentido, se faz necessário convencer o interlocutor, além
de que a narrativa corresponde à “verdade”, mas que possui credibilidade e que o
veículo de comunicação possui o “direito à palavra” validado. Assim, os discursos
institucionais da organização jornalística possuem uma intenção peculiar
(PALMERSTON, 2011).
A instituição jornalística conquistou legitimidade social para produzir uma
reconstrução discursiva do mundo baseada em valores como seriedade, credibilidade e
fidelidade do relato (BENETTI, 2008). O jornalismo, então, segundo a autora, se tornou
uma prática autorizada a narrar a realidade. Desse modo, a produção de conteúdos
autorreferenciais se faz importante para a renovação contínua do contrato de
comunicação.
Um dos aspectos relacionados a essa afirmação é o ethos prévio do jornalismo,
isto é, a imagem que já existe sobre o locutor, ou seja, um conjunto de representações
anteriores do coenunciador sobre o enunciador (MAINGUENEAU, 2014). “O ethos é
fundamentalmente um processo interativo de influência sobre o outro”
(MAINGUENEAU, 2014, p. 17). Nesse sentido, dificilmente, segundo Benetti (2008),
um usuário se insere em uma cena discursiva sem algum conhecimento ou expectativa
sobre o orador, por isso, a importância de um ethos prévio. Para Maingueneau (2008, p.
99), “o universo de sentido propiciado pelo discurso impõe-se tanto pelo ethos como
pelas ideias que transmite”, que seriam os sentidos produzidos pelo discurso. Assim,
diante desses conceitos, a análise do discurso possibilitará debater como o discurso
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3. Análise do Discurso
Considerada um campo extenso de investigação, a Análise do Discurso tem
origem e aplicação em diferentes disciplinas do conhecimento, por isso, é intitulada
como um instrumento teórico e metodológico interdisciplinar (COELHO; GODOY,
2010), a qual permite a compreensão dos discursos de diferentes atores.
É uma teoria complexa e pode se consolidar como um caminho a ser percorrido
na busca do entendimento das questões do campo jornalístico, inclusive pelo fato de não
haver jornalismo sem aquilo que compreendemos como sendo “exterior”: os fatos, as
relações de poder, os contextos sociais, as decisões políticas, os interesses econômicos,
as crenças religiosas, as concepções estéticas, dentre outros fatores. Tudo o que os
profissionais acreditam deixar “fora” do discurso, na verdade o constitui (ORLANDI,
2005).
É importante observar que a Análise do Discurso não se debruça,
especificamente, sobre um objeto propriamente dito, mas sobre o processo discursivo
em que ele está inserido, a fim de compreender o seu modo de significar. Por isso, não
pode ser constituída apenas pela Linguística, mas sim pela relação entre essa com as
Ciências Sociais, de modo que não sejam apenas a aplicação de uma sobre a outra, mas
uma possibilidade de gerar conhecimento (ORLANDI, 2005).
No “terreno da linguagem, a luta de classes é uma luta pelo sentido das palavras,
expressões e frases” (PÊCHEUX, 1978, p. 266), o que envolve processos de reprodução
ideológica, por isso, a teoria da Análise do Discurso (PÊCHEUX, 1988) destaca o papel
da ideologia, que engloba o sentido e a constituição do sujeito nesse contexto. Assim,
segundo Orlandi (1988, p. 10), o sujeito é retirado do centro do poder para “integrá-lo
no funcionamento dos enunciados, dos textos, cujas condições de possibilidades são
sistematicamente articuladas sobre formações ideológicas”.
Nesse contexto do sujeito, “ por evidenciar a relação entre o indivíduo
enunciador, enquanto produtor de discursos, e seu contexto sócio-histórico cultural, ou
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novembro de 1946, quando o jornal circulou pela primeira vez e trouxe – dentre outras
coisas – uma série de reportagens sobre as transformações tecnológicas ocorridas no
veículo jornalístico.
Para analisar o discurso do jornal O Liberal sobre as transformações
tecnológicas que impactam nos processos jornalísticos da instituição serão examinadas
as seguintes matérias:
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em sua ideia final afirmar que mesmo com o avanço das mídias, o jornalista continua
sendo importante e necessário. A partir das transformações tecnológicas, há, na prática,
um novo modelo de trabalho, com uma nova distribuição de tarefas e uma nova forma
de aproveitar o conteúdo em diversos formatos. Se antes um jornalista produzia
conteúdo exclusivamente para um determinado veículo, agora este mesmo conteúdo
deve ser aproveitado em mais de um formato, o que, consequentemente, reflete em mais
de um veículo, cada um com sua linguagem, o que mudou a rotina dos jornalistas.
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5. Considerações finais
Com o objetivo de analisar o discurso do jornal O Liberal sobre as
transformações tecnológicas que impactam nos processos jornalísticos da instituição,
esta pesquisa, de abordagem qualitativa, utilizou a Análise do Discurso, enquanto
técnica metodológica, fundamentada no modelo de Benetti (2010), com bases na linha
francesa de análise.
Na investigação, indicamos identificamos três formações discursivas
autorreferenciais do jornal impresso O Liberal (inovação, qualidade e credibilidade),
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2010.
ORLANDI, Eni Pulccinelli. Discurso e leitura. São Paulo: Ed. Unicamp; Cortez, 1988.
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PÊCHEUX, Michel. Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do óbvio. Campinas, SP:
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Cultura e do Diário do Pará. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Comunicação
Social – Jornalismo). Faculdade de Comunicação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2008.
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