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Rheo Artigo Tramas Final
Rheo Artigo Tramas Final
fluidez das imagens que se fragmentam nas telas. O ambiente de Rheo está
intrinsecamente conectado à sua intensa sonoridade, se estabelecendo uma espécie de
campo sonoro ao redor das telas, que contamina o espaço expositivo.
Figura 2 – Plano técnico de Rheo: 5 horizons (2010-2015), de Ryoichi Kurokawa. Podemos observar a
linha horizontal que atravessa os cinco monitores.
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Informações sobre a instituição cultural: http://www.redbullstation.com.br/
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Informações sobre o prédio: http://www.saopauloantiga.com.br/subestacao-riachuelo/
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O prédio foi tombado como patrimônio histórico pelo Conselho Municipal de Preservação do
Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo: Conpresp, no ano 2000.
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Exposição Adrenalina: http://www.redbullstation.com.br/adrenalina-video/
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contaminava toda a sala do térreo, criando um ambiente nesse local. Durante o contato
com a obra, notamos que a luminosidade solar que vinha do exterior, por vezes,
projetava o meu próprio reflexo sobre determinada tela, o que provocava uma espécie
de diálogo entre o ambiente exterior e o interior. Não sabemos se tal efeito foi ou não
intencional, pensamos que as instalações em determinados lugares podem envolver
interferências dos ambientes externos. O efeito que vivenciei pode ter sido um ruído,
uma interferência na obra, que para olhares mais rígidos talvez não devesse ocorrer. A
inserção da imagem de minha silhueta, misturando-a com as imagens da obra em
momentos pontuais, nos fez refletir sobre uma possível “interação” não intencional, que
pode ocorrer em obras que não são interativas, como é o caso de Rheo. Porém,
buscamos nos concentrar nas imagens e nos sons da obra e esquecer essa interferência
visual; principalmente porque a sonoridade nos absorvia, parecendo instigar nosso
corpo para “dentro” do ambiente artístico, e das imagens fragmentadas que se
apresentavam diante de nosso olhar. Notamos que o lugar do prédio está localizado
próximo a uma área de grande fluxo de pessoas na cidade de São Paulo (terminal
bandeira) e a memória do lugar está relacionada à organização do fluxo de energia
elétrica da época em que era uma estação ativa de energia.
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Entrevista disponível no youtube: https://www.youtube.com/watch?v=_XAK248_apY
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Os softwares constantemente utilizados por Ryoichi são Steinberg nuendo, para áudio, e Max msp
jitter, para vídeo.
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As imagens que se desdobram em Rheo nos remetem às imagens tanto das redes
tecnológicas, entre links e pontos nodais de comunicação, quanto das redes construídas
pela natureza, em sua diversidade de paisagens e seres que se conectam, tal como as
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Rheo também parece remeter a uma forma de “memória das paisagens naturais”;
em um momento da obra, todos os espaços da tela são preenchidos em um fade in
(clareamento das telas por imagens) um pouco mais lento e na parte inferior à linha
horizontal, que atravessa as telas, emergem paisagens de diferentes lugares,
simultaneamente. A disposição vertical das telas rompe com a horizontalidade presente
nas imagens comuns de paisagens, normalmente mostradas em uma única imagem,
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porém, há os cinco horizontes que intitulam a obra. Aparentam ser, da esquerda para a
direita na Figura 5: um riacho em meio às camadas de pedras formando uma “escada”,
as águas de um riacho ou oceano, um riacho em meio a um campo verde, e um lugar
com pedras esbranquiçadas.
c) Sonoridade e relação com a obra: O último suspiro.
O nome Rheo significa12, em grego, fluxo, corrente, riacho, torrente, jato e é
inspirado na famosa expressão: Phanta rhei13, do filósofo grego Heráclito de Éfeso, que
significa “tudo está em estado de fluxo”. E a cidade natal do artista, Osaka, possui uma
baía e dois rios que cruzam a província: Yodo e Yamato. Assim, as referências ao fluxo
das águas no audiovisual são nítidas. O som grave “flutuante” ao aumentar a sua
intensidade junto a outro mais agudo parece “cortar” a paisagem, que se torna mais
fluída e encurva-se, constituindo formas côncavas e convexas, viradas para cima ou para
baixo. A linha horizontal une as paisagens em um todo, que se torna um fluxo quase
“imaterial” de imagens, estas adquirem uma qualidade não fixa, como anteriormente,
quando pudemos referenciá-las em paisagens, mas sua plasticidade torna-se mole,
viscosa, flutuante, líquida. Sublinham-se as qualidades fluídas em detrimento da
referência dos lugares das imagens, que se tornam “ondas” plásticas, visuais. O
movimento dessas formas torna-se mais lento nesse trecho, e a força da gravidade
parece ser suspensa, pois as paisagens, metamorfoseadas, passam a flutuar,
ultrapassando a linha horizontal no centro das telas. E aos poucos oscilam em strobo14 e
desaparecem uma a uma, marcadas por uma textura sonora com um timbre 15 formado
por um ruído processado difícil de descrever, seria como: diversos “pontos cortanto o
espaço, metalizados”, como explica Santaella:
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http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/roma/
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Informações encontradas no site do Festival Cimatics, realizado em Bruxelas:
http://www.cimatics.com/cms_site/news/archive/article.php?id=21
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Um piscar, pulsar rítmico de luzes.
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Segundo Santaella, timbre opõe-se aos atributos quantitativos, por exemplo, altura, duração,
intensidade, sendo “a qualidade mais indefinivelmente qualitativa, dentre todas as qualidades sonoras”.
(SANTAELLA, 2009, p.129).
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momentos os elementos sonoros sucedem-se tão rapidamente que não formam uma
sequência, mas marcam a multitemporalidade. Nossos olhos seguem os movimentos
rápidos das imagens do emaranhado, numa rede de linhas coloridas, onde predomina o
vermelho, ao longo da linha horizontal. E formas semelhantes a esse emaranhado
ocupam a região central horizontal das telas e diversas texturas sonoras, entre elas um
som metálico agudo, simultâneas, parecem “fechar”, diminuir as imagens sobre a linha
horizontal até desaparecerem. Tal efeito visual é semelhante ao de imagens que
desaparecem em televisões antigas de tubo, analógicas, ao serem desligadas. Rheo
relaciona-se com a obra O último suspiro16 (2013-15), de Lucas Bambozzi, presente na
mesma exposição: composta por diversas televisões analógicas dispostas no espaço do
porão, oferecendo um espaço para que o público “as atravesse”. As imagens da obra de
Bambozzi, um último suspiro do analógico, parecem “reviver” por meio do digital em
Rheo.
As formas de “paisagens flutuantes”, esfumaçadas, quase transparentes,
redimensionam-se, expandem-se, em certos momentos até ocupar toda a parte inferior
do quadro, conforme as texturas sonoras mais “duras”, como batidas, também vão se
expandido em intensidade, o que torna mais denso o som na espacialidade do ambiente.
Essas formas parecem ser constituídas de camadas de imagens, como sobreposições de
espaços de imagens com uma coloração acinzentada, azuladas e brancas, compondo
uma imagem total que permanece por um momento, flutuando. Até que rapidamente as
imagens são “cortadas” por uma batida mais forte e misturadas a uma textura sonora
que remete ao som do vento, que provoca quase um “corte seco” nas formas. As
texturas sonoras “cortantes” geram momentos de expectativa e de tensão, em meio a um
sentimento mais meditativo. As linhas vermelhas são associadas a uma textura sonora
pontuada, menos intensa, que aparece e desaparece rapidamente, até as telas
permanecerem escuras. A obra parece nos levar a um estado de meditação estimulado
pela sonoridade contínua e aguda, que produz um ambiente sonoro envolvente, que
convoca o corpo e o olhar do espectador a observarem, principalmente durante as breves
pausas das imagens. Nos momentos em que permanece a linha horizontal avermelhada e
o espaço escuro e vazio das telas, nos remete à observação de um quadro suprematista
de K. Malevitch, ou as esculturas e instalações minimalistas.
As imagens e os sons parecem pensamentos, intensamente plásticos e velozes,
como em trechos rápidos de uma montagem de filmes de S. Eisenstein, lembram o
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http://www.lucasbambozzi.net/projetosprojects/ultimo-suspiro
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Rheo articula uma sinestesia em uma sincronização dos sentidos, por seus
elementos audiovisuais. E as formas visuais simultâneas, podem ser associadas também
às imagens das sinapses e suas ligações, bem como às cognições que aparecem como
flashes em imagens cerebrais.
Como sistema centrado, o rizoma faz conexões sem obedecer a uma ordem
hierárquica ou de filiação. Conecta-se por contato, ou antes, por contágio
mútuo ou aliança, crescendo por todos os lados e em todas direções. As
conexões ou agenciamentos provocam modificações nas linhas conectadas,
imprimindo-lhes novas direções, condicionando, sem determinar conexões
futuras. (KASTRUP, 2013, p.81).
Rheo opera uma montagem vertical, pois suas imagens e sons desenvolvem-se
em simultaneidade, e busca “a igualdade rítmica” (EISENSTEIN, 1990, p.97) entre
áudio e vídeo. Os movimentos sonoros acompanham os movimentos das imagens, estas
induzem os movimentos dos olhos do espectador, mas também possíveis movimentos
corporais que podem ser realizados pelo espectador instigado por luz, cores e uma
sonoridade ao mesmo tempo contínua (grave) e fugaz (aguda, batidas, oscilações),
contida no espaço ambiental audiovisual. As imagens que denominamos formas de
relevos, provenientes das paisagens, estratificam-se em camadas, em movimentos
ondulantes. São formas um tanto mais calmas, que se desdobram e flutuam em
correspondência principalmente com a música aguda contínua e expandindo-se
verticalmente. Já a trama de linhas é inquieta, sendo intensamente manipulada,
descrevendo movimentos ondulatórios e espirais de um lado para outro, como que
modificada por pressões sonoras. Essas linhas correspondem às texturas sonoras mais
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4) Elementos pós-textuais.
b) Abstract
This article analyses the installation Rheo: 5 horizons, de R. Kurokawa, we
observe the artwork in Adrenalina exhibition (2015); Rheo is composed by 5
screens vertically organized, that dialogues with the horizontality found in
the landscapes images. The audiovisual forms are composed by imagetic
anamorphosis digitally produced and metamorphosed in abstract images that
refer to old analog video images, the majority are landscape records of the
homeland of the artist. The images, initially indexical, "dissolve" in the
digital process grasping outer qualities, more fluid, aqueous and random. A
fast audiovisual flow is created, the images cross several areas of the screens,
the biting and meditative sounds "pass by" the viewer body, and spatializes
in order to compose an environment. The forms compress and decompress,
in a syncopated rhythm, permeated by breathes. Such forms seem to be
rizomatic (DELEUZE & GUATARRI), refer to web and human brain
images.
5) Referências bibliográficas
BISHOP, Claire. Installation Art: A Critical History. Londres: Tate, 2005.
LÖW, Martina. O Spatial Turn: para uma sociologia do espaço. In: Tempo Social:
revista de sociologia da USP.V 25, n. 2. São Paulo: USP, 2013.
SHAW, Jeffrey & WEIBEL, Peter. (Org.). Future Cinema: the cinematic imaginary
after film. ZKM/ Center for Art and Media Karlsruhe: The MIT Press, Cambridge,
Massachusetts, 2003.
YOUNGBLOOD, Gene. Expanded Cinema. New York: P. Dutton & Co., 1970.