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Lesões e morte por projéteis de

arma de fogo

Eduardo Vasconcellos - 201910106


FAMIPE – Faculdade de Miguel Pereira
Sumário
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 2
DAS PARTICULARIDADES DO PROJÉTIL ......................................................................................... 3
DO DISPARO .................................................................................................................................. 4
ORLAS CAUSADAS PELOS PROJÉTEIS (EQUIMOSE, ENXUGO, ESCORIAÇÃO) ................................ 5
ORLAS CAUSADAS PELO CANO DE DISPERSÃO ............................................................................. 7
CARACTERISTICAS DOS ORIFÍCIOS DE ENTRADA E SAÍDA ............................................................. 7
TIROS COM CANO ENCOSTADO .................................................................................................... 8
LESÕES EM ÓRGÃOS MACIOS ....................................................................................................... 9
ANÁLISE DO TRAJETO NOS DISPAROS DE ARMA DE FOGO......................................................... 10
CONCLUSÃO ............................................................................................................................ 10
INTRODUÇÃO

Com efeito, suposto não haver, ou pouquíssimas são, pessoas que nunca tenham ouvido n’um
noticiário, ou nas folhas públicas, acerca daquele frio assassinato sendo investigado, ou de
violências a mão armada que provocaram lesões às vítimas; penoso é saber, que ao mesmo
passo, poucos seriam capazes de, diante de uma cena de lesão por projéteis de arma de fogo,
identificar as peculiaridades da lesão, e a partir dela deduzir informações concernentes a forma
do disparo, que parecem pairar evidentes, ou pouco implícitas, quando consideradas as noções
científicas elucidadas no campo da medicina legal.

O escopo do presente trabalho é traçar as noções gerais das lesões e mortes por projéteis de
arma de fogo, proponho a análise, desde a anatomia de um cartucho, até as noções
propedêuticas de balística forense e perícia criminal.

Trabalha-se no presente escrito distinções conceituais fundamentais para a compreensão


efetiva das terminologias empregadas no âmbito da medicina – legal, e ainda, as teorias
desenvolvidas ao longo do decurso temporal e histórico, que teceram grande colaboração para
este campo.

Para além de meras conceituações cientificas, são trazidas à baila as distinções práticas que
viabilizam a identificação de lesões típicas de determinadas proedimentações nos disparos;
como as orlas, que permitem identificar lesões de entrada (a partir da orla de enxugo ou anel
de Fish), distância do tiro (a partir da presença de elementos do cano de dispersão), ângulo do
disparo (a partir dos centros das orlas componentes do anel de Fish) e etc; mas, que não se
adiante os sucessos, não é com pura pachorra que se introduz ao tema, e é crendo que preferível
o conteúdo aos cumprimentos preambulares, que passamos ao mesmo subsequentemente.
DAS PARTICULARIDADES DO PROJÉTIL

Projétil de arma de fogo é um instrumento vulnerante, perfuro contundente,


que causa lesão perfuro-contusa, isto é, perfura porque tem ponta, e contunde, pois, animado
por uma energia cinética, quando transferido para o corpo, altera seu estado normal de
funcionamento, causando uma lesão.

Quando se desfere um tiro, é disparado o projetil, contudo, uma análise de sua


estrutura nos revela que o projetil se localiza na parte superior do cartucho, acima da
camisa/estojo, e que dentro da camisa/estojo tem-se o propelente (normalmente a pólvora),
uma substância que entra em combustão, passando do estado sólido para o estado gasoso
n’uma velocidade abissal, e os gases propulsam o projetil para frente, expulsando o projetil do
cano da arma. Na base do estojo tem-se a capsula de espoletamento, que contém uma mistura
iniciadora chamada de “primer”, quando acionado o gatilho da arma, solta-se a mola do retém
do percursor, o percursor toca a capsula de espoletamento, gerando uma centelha, esta que faz
com que o propelente entre em combustão, expandindo os gases, que por sua vez propulsam o
projétil para frente, o projétil sai do cano da arma, sendo disparado, fazendo uma série de
movimentos, assim ocorre, efetivamente, o tiro.

Os projetis podem ser classificados quanto à velocidade, como de baixa


velocidade ( viajam em velocidade inferior à 300 m/s), média velocidade ( viajam em velocidade
entre 300 m/s e 680 m/s), e alta velocidade( viajam em velocidade superior à 680 m/s); importa
dizer que 300m/s é a velocidade do som no ar, e logicamente, 680m/s o dobro do som do ar, o
que significa que ao ouvir o som do disparo do projétil, provavelmente o mesmo já viajou nesta
velocidade, passando pelo ouvinte.

A partir do conhecimento do projetil pode-se calcular sua energia cinética, isto


é, o projetil ao sair do cano da arma carrega consigo uma energia cinética, e para calcular essa
energia cinética, se utiliza a fórmula “Energia Cinética = Massa do Projétil x velocidade ² ”.
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DO DISPARO

Quando efetuado o tiro, é feita expulsão do projétil (elemento primário do tiro)


do cano da arma, e juntamente com ele, elementos do cone de dispersão (elementos
secundários do tiro) que, a depender do calibre e de suas peculiaridades, alcançam determinada
distância, geralmente pequena; o cone de dispersão é formado por pólvora combusta, pólvora
incombusta, micropartículas de metal do cano da arma, vapor super aquecido, e língua de fogo.

A partir destas concepções se torna mais fácil a compreensão das expressões de


literatura médico-legal de balística forense, “ tiros à curta distância” (quando os elementos que
formam o cone de dispersão atingem a vítima), e “tiros à distância” (quando os elementos do
cone de dispersão não atingem a vítima, somente o projétil atinge-a).

 Elementos ou efeitos primários do tiro

Resultam da ação do projétil, tudo aquilo que o projétil causar, característicos


do ponto de impacto, independendo da distância do tiro.

 Efeitos secundários do tiro

São resultantes dos tiros à curta distância, da ação dos gases, seus explosivos,
de resíduos da combustão da pólvora e de micro - projéteis.

 Trajeto e trajetória do projétil

Trajeto é o percurso do projétil dentro do corpo da vítima.

Trajetória é o percurso do projétil fora do corpo da vítima.


ORLAS CAUSADAS PELOS PROJÉTEIS (EQUIMOSE, ENXUGO,
ESCORIAÇÃO)

 Orla de enxugo

Quando é efetuado um disparo, geralmente o projétil disparado irá encontrar a


pele, como primeiro contato que se tem com o corpo, o que ocorre é que o projetil disparado
geralmente está aderido de varias substancias do próprio cone de dispersão, isto significa que
quando o projetil atravessa a pele, deixa na mesma estas substâncias, esta passagem pela pele
faz com que na mesma seja deixada uma primeira orla, chamada de orla de enxugo ou
alimpadura ( justamente porque o projétil se enxuga destas substancias de que veio eivado).

Cabe ratificar que a orla de enxugo/limpadura não está presente nas lesões de
saída, somente nas lesões de entrada, ora, se o projetil sai do cano da arma carregando as
substâncias, e a partir da entrada no corpo o mesmo se limpa, logo, quando sair do corpo, não
deixará orla de enxugo ( formada pelas substancias que o mesmo inicialmente carregava do cano
de dispersão), cumpre destacar, contudo, que embora a orla de enxugo importe em lesão de
entrada, sua ausência não significa ser lesão de saída, por duas essenciais razões, primeiramente
porque o tiro pode ter sido dado com anteparo (por exemplo um travesseiro onde o projétil se
limpa no mesmo, e posteriormente perfura o crânio da vítima), sendo assim, uma lesão de
entrada sem orla de enxugo, a segunda razão é que pode haver 2 entradas no corpo ( o projétil
atravessa alguma parte do corpo primeiro se limpando das substâncias, e depois atravessa
outra, não deixando orla de enxugo).

 Orla de escoriação

Quando passa pela pele, atinge a derme e depois a epiderme. Escoriação tem
por definição o arrancamento traumático da epiderme com exposição da derme sem, contudo,
ultrapassa-la.

Quando o projetil passa ele gerará uma primeira orla, chamada orla de enxugo
conforme supracitado, podendo gerar uma segunda orla, que é a orla de escoriação, ao redor
do orifício de entrada, gerando o arrancamento traumático da epiderme com exposição da
derme sem, contudo, ultrapassa-la, cabendo ratificar que a orla de escoriação não é formada
pela rotação do projétil, podendo estar presentes também quando dos disparos de projéteis
oriundos de armas de alma lisa .
O conjunto destas duas orlas (de enxugo e escoriação) forma o conceito de
anel de fish, que é justamente o somatório das orlas de enxugo e escoriação. Cabendo frisar
que pode haver escoriação na lesão de saída, quando há anteparo inviabilizando a saída do
projétil, mas o anel de fish só estará presente na lesão de entrada, já que a lesão de enxugo
não estará presente na lesão de saída.

 Anel de fish excêntrico e concêntrico

Quando as duas orlas (de enxugo e escoriação) tem o mesmo centro, formam o
anel de fish concêntrico, isto significa, do ponto de vista médico – legal, que o projetil quando
entrou no corpo, formou um ângulo de 90 graus.

Quando as orlas (de enxugo e escoriação) tem centros diferentes, formam o anel
de fish excêntrico, isto significa que o projétil entrou no corpo com determinada inclinação.

O valor médico legal, a partir destas distinções, é justamente identificar a


incidência do disparo, e ainda, como supracitada, denuncia uma lesão de entrada.

 Orla de equimose

A equimose tem por definição, um trauma onde o sangue que fica dentro dos
vasos extravasa e se infiltra nas malhas dos tecidos adjacentes à lesão e é visto e é visto pela
transparência de uma membrana (normalmente a pele).

Quando o projetil passa pela pele rompem-se alguns vasos sanguíneos, na


derme (camada vascularizada da pele) o sangue extravasa, e na orla em torno do orifício se gera
a orla de equimose, pois se da pela infiltração de sangue nas bordas da lesão.
ORLAS CAUSADAS PELO CANO DE DISPERSÃO

As orlas citadas no tópico anterior são causadas pelo projétil, entretanto, é


cediço que quando há o tiro, juntamente com o projetil, saem os elementos do cone de
dispersão, e se a vítima é atingida por estes elementos, em tiros de curta distância ou à queima
roupa, na lesão de entrada surgirão mais três orlas (orla de tatuagem, orla de queimadura, e
orla de esfumaçamento).

CARACTERISTICAS DOS ORIFÍCIOS DE ENTRADA E SAÍDA

O orifício de entrada nas mortes e lesões por projéteis de arma de fogo, tem
borda investida, isto é, a borda da lesão voltada para dentro. Quando o projetil sair, a borda será
evertida, isto é, a borda voltada para fora.

As características da lesão de entrada nos tiros à distância são: bordas regulares,


invertidas, normalmente com orifício de entrada de diâmetro menor do que o calibre do projétil
(pois as fibras elásticas tentam fechar o orifício).
Já nas lesões de saída as bordas são evertidas ( voltadas para fora), e não são
regulares, isto porque quando o projétil faz o trajeto, isto é, entra no corpo, o mesmo se
desestabiliza, gastando mais energia cinética para saída, a desestabilização faz com que as
bordas sejam irregulares.

TIROS COM CANO ENCOSTADO

 Boca de mina de Hofmann

Nos tiros com cano encostado em locais com plano ósseo por baixo, pegando
como exemplo a têmpora ( abóbora craniana), quando é efetuado o disparo, o projetil quebra
os ossos do crânio, e entra no encéfalo, juntamente com o projetil, os elementos do cano de
dispersão batem no osso e explodem à pele para fora, gerando assim uma lesão com bordas
irregulares, evertidas ( voltadas para fora), e um impregnamento centralizado de pólvora, o que
é chamado de sinal de boca de mina de Hoffmann.

 Sinal de Benassi

Sinal de benassi é uma tatuagem de pólvora no osso, quando o cano encostado


no osso, o projetil quebra o osso, os gases explodem a pele para fora, formando a boca de mina
de Hoffmann, e a pólvora que entrou em combustão é decalcada no osso.
 Sinal de Puppe Werkgaertner

Se dá em tiros com cano encostado, em locais sem plano ósseo por baixo, o
projétil sai do cano da arma, a boca do cano da arma causa um impacto na pele, marcando a
boca da arma, a massa de mira, na pele.

 Sinal de Bonett (tronco de cone de Bonett)

Não está ligado a distância do disparo, mas sim a incidência do disparo, isto
é, determinabilidade do trajeto, onde é a lesão de entrada e saída.

O ser humano possui 206 ossos no corpo, alguns ossos possuem duas tábuas
ósseas que se sobrepõem (como é o caso do crânio), em casos de tiros nestes ossos, o projétil
é disparado, seguindo uma trajetória, encontra a primeira tábua óssea causando um orifício,
se desestabilizando, e quando encontra a segunda taboa óssea causa um segundo orifício
maior do que o primeiro, uma vez dentro do crânio, o projetil segue um trajeto, e em sua
saída, encontra a primeira taboa óssea gerando um orifício, desestabiliza-se, e ao encontrar a
segunda taboa óssea causa gera um orifício maior do que o primeiro, assim têm-se dois
troncos e cone, um na lesão de entrada e um na lesão de saída, sendo que este tem a base
maior para fora do crânio, e aquele tem a base maior para dentro do crânio.

LESÕES EM ÓRGÃOS MACIOS

O corpo humano é composto, primeiramente, de células (unidade básica), o


conjunto das células forma o tecido, o conjunto dos tecidos forma o órgão, o conjunto de órgãos
forma um sistema/aparelho, e o conjunto de sistemas/aparelhos, permitem o funcionamento
do organismo. Diante disto, vale frisar que determinados órgãos são mais flexíveis e outros
menos flexíveis, com maior e menor densidade ou rigidez, e de acordo com esta flexibilidade ou
rigidez, a resistência que determinado órgão oferecerá à passagem do projétil será maior ou
menor.

Quando da analise de lesões em órgãos macios, deve-se observar a densidade


destes órgãos, elasticidade, flexibilidade, e maciez, que influenciam na exuberância das lesões.

ANÁLISE DO TRAJETO NOS DISPAROS DE ARMA DE FOGO

O projetil de arma de fogo quando atinge uma parte do corpo, afasta os tecidos,
e “cava um túnel de passagem”, este “túnel de passagem” é chamado cavidade permanente,
logo, pode ser conceituada como um túnel que o projetil faz por dentro dos tecidos ao longo do
seu trajeto. Além da cavidade permanente, existe a cavidade temporária, causada pela onda de
pressão advinda do deslocamento na passagem do projetil.

Esta cavidade temporária, em função da onda de pressão gerada, pode afetar


funcionamento de órgãos, como por exemplo o coração, alterando o equilíbrio hidroeletrolítico,
alterando o controle das contrações musculares, e levando a vítima a óbito.

CONCLUSÃO

Ante todo o supracitado, conclui-se que os mecanismos advindos do campo da medicina legal,
representam subsídio essencial a perícia criminal e a balística forense; decerto, fazem-se
essenciais na carreira do operador do direito, sobretudo aqueles que pretensos à atuação no
Direito Penal, mormente os que anseiam pelas carreiras policiais.

A partir das teorias que foram esposadas, das conceituações e elucidações que permeiam o
presente trabalho, crê-se com veemência que edificara-se novo saber onde antes inerte restava
à ignorância, isto porque, antes de aqui trabalhados estes ensinamentos, foram eles
aprendizados.

Se não se sabia, até então, sobre a efetuação de um disparo, a estrutura anatômica de um


cartucho, as distinções entre trajeto e trajetória, os elementos do cone de dispersão, as
distinções entre as orlas presentes nas lesões e “as denúncias feitas pelas mesmas”, as
características das lesões de entrada e saída, as propriedades dos sinais de boca de mina de
Hoffman, sinal de Bonett, sinal de Benassi, e etc, agora se sabe.

A partir das distinções traçadas até aqui, o efeito médico legal se dá no plano concreto à partir
da identificação em casos práticos das peculiaridades como se deram os disparos, o que pode
ser utilizado não só na alçada investigativa, mas também nas sustentações e defesas nos
processos criminais, na inquisição dos criminosos, e principalmente para a promoção justa e
efetiva das medidas punitivas dos criminosos; por mais Hollywoodiano que possa parecer, a
medicina legal não torna o operador do direito “um Sherlock Holmes”, mas permite-o saber,
que até mesmo o “disparo perfeito”, ainda que não deixe indícios de sua autoria, deixará rastros
da forma com que o mesmo se deu; por fim, espera-se, lucidamente, que o presente trabalho
tenha contribuído para aprendizagem, e aprimoramento daqueles que buscam se aventurar no
campo da Medicina Legal.

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