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METODOLOGIA DA ALFABETIZAÇÃO E DA LÍNGUA PORTUGUESA

1. METODOLOGIA DO ENSINO DE ALFABETIZAÇÃO

Nos últimos anos, as discussões sobre o conhecimento de nossas crianças e


jovens têm se multiplicado. As críticas da sociedade em relação ao que é
ensinado desde a alfabetização dos alunos faz-se presente, principalmente
quando muitos jovens não conseguem se expressar por meio de um texto
escrito ou entender uma escrita quando leem. Algumas empresas têm
dificuldade em seus processos seletivos por não encontrarem pessoas que
apresentem habilidades de leitura e escrita.

Muitos estudiosos, principalmente de outras áreas profissionais, têm criticado


ou mesmo buscado culpados para a dificuldade de nosso país, já que a 14ª
economia do mundo está em 71º lugar em desempenho escolar, numa lista de
121 países, segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação,
Ciência e Cultura (UNESCO)11 A UNESCO aponta o Brasil como um dos doze
países que concentram um grande número de pessoas com idade acima de
quinze anos, ao todo 75%, que não sabem ler e escrever e denuncia que
temos 1,9% dos analfabetos do planeta.

Responsabilizar somente uma nuance da realidade não significa que estamos


perto da solução do problema ou de atingir a tão almejada qualidade de
ensino, portanto, precisamos nos lembrar de que a educação é construída pela
sociedade, num contexto sociopolítico, econômico, histórico e cultural.

Nesse contexto, falaremos sobre a metodologia do ensino de alfabetização, um


dos recortes consideráveis dessa realidade, um dos instrumentos
reconhecidamente fundamental para a inserção da pessoa na cultura letrada
de nossa sociedade.

Alguns questionamentos nos induzem à reflexão sobre a realidade educacional


da alfabetização dos brasileiros, sobre os conhecimentos que adquiriram e sua
atuação na sociedade, a forma como utilizam esses conhecimentos para
reforçar o que existe ou transformar a educação, para melhorar as condições
de vida para todos.

Enfim, o que é uma pessoa alfabetizada? Quando podemos dizer que a pessoa
está alfabetizada? Quais são as ações que o alfabetizador deveria ter para
contribuir com a melhoria da educação?

Algumas crianças copiam textos com uma letra muito bonita, mas não
conseguem ler o que escrevem; outras leem, mas não conseguem escrever;
há as que recitam letras de A a Z, mas não conseguem ler ou escrever, sem
falar no nível de compreensão de um texto.

1
Fonte: ANDES-SN, 14/11/2006.
Será que o ler e o escrever são um ajuntamento de letras? É fazer a
correspondência entre grafemas e fonemas? É fazer cópias ou descrever letras
até memorizá-las? O que garante a alfabetização é a transmissão dos
conteúdos pelos professores? É a cobrança dos conteúdos pelos professores?

Muitos equívocos são cometidos nos anos iniciais da criança na escola. Um


deles é achar que o ensino e a aprendizagem são iguais. O fato de o professor
ensinar, apresentar estratégias modernas, atividades recreativas de conteúdos,
com certeza, não significa que o aluno aprenderá.

O professor tem papel considerável na alfabetização, mas não é o único


responsável. A criança traz experiências, formas de pensar, hipóteses sobre a
realidade. Não é uma pessoa vazia a esperar que coloquemos nossas
impressões e nossos pensamentos.

1.1 O que o professor sabe e pensa do aluno e da alfabetização?

O professor não pode parar de ser um pesquisador. Ele precisa estudar o seu
aluno, saber como a criança pensa e aprende, os conhecimentos que traz, sua
realidade, para que possa atuar nesse contexto. Não há receitas prontas,
fórmulas de sucesso a serem transplantadas numa realidade multifacetada,
rica e diversa da outra, com pessoas distintas e diferentes.

1.1.1 Leitura e escrita

Cócco e Hailer (1996) descrevem a leitura e a escrita como instrumentos


básicos de ingresso e participação do cidadão na sociedade letrada. Portanto,
exercem função social. São ferramentas facilitadoras da compreensão e
realização da comunicação do homem na sociedade contemporânea. É a chave
para a apropriação dos saberes conquistados pela humanidade.

Conforme declaração da UNESCO, em 1958, uma pessoa sabia ler e escrever


quando lia ou escrevia compreensivamente um pequeno enunciado relacionado
a sua vida diária. Tempos depois, adotou outra definição, tendo-a como
funcional; uma pessoa lia e escrevia quando o fazia o suficiente para inserir-se
em seu meio e seu desempenho envolvia tarefas de leitura, escrita e cálculo.

Isabel Cristina Alves da Silva Frade (2001), mestre e doutora em educação


pela UFMG, relata como a concepção do ensino das primeiras letras tem se
modificado ao longo dos tempos. Ressalta que não é suficiente decifrar o
código linguístico, mas é fundamental ter habilidades que possibilitem saberes
envolvidos no ler e escrever, além de participar dos benefícios envolvidos na
cultura escrita, construir atitudes e representações dessa participação. A
autora relaciona a escola como representante da cultura escrita e, portanto,
constitui-se agente de letramento.
A alfabetização, na visão do construtivismo, é vista como um processo de
construção contínua de conceitos que tem início muito antes de a criança ser
escolarizada.

É necessário ter claras as características do sistema de escrita e o uso


funcional da linguagem.

1.1.2 O alfabetizador

• Conhece como a criança aprende a ler e a escrever?

• Precisa trabalhar com grande quantidade de conteúdo para alfabetizar seus


alunos?

• Considera a cartilha indispensável para a aprendizagem da leitura e escrita


de nossas crianças?

• Concebe a leitura como decodificação e a escrita como cópia?

Alguns pesquisadores e estudiosos ajudaram a compreender não só como a


criança pensa, mas como o seu pensamento se desenvolve na aprendizagem
da leitura e da escrita.

Piaget: sua preocupação foi explicar como a criança pensava e interagia com
o mundo, com as pessoas, para adquirir conhecimento. Definiu que o
conhecimento é construído a partir da interação do sujeito com o objeto de
aprendizagem.

As autoras Telma Weisz e Ana Sanches (1999, p. 33) reafirmam a contribuição


de Piaget para a mudança de concepção e de olhar sobre a aprendizagem
existentes até a sua época.

Até o início do século XX, acreditava-se que a crianças eram miniadultos e que
após crescerem é que chegariam ao nível dos adultos, considerados superiores
mentalmente. Acreditava-se também que seus processos cognitivos eram
iguais aos do adulto, mas em proporção menor por serem pequenas. Piaget
concluiu, por meio de suas pesquisas, que as crianças pensavam muito
diferente dos adultos, que o que faltava para elas eram certas habilidades.

Sua contribuição foi explicar a maneira como a criança interage com o mundo
e com as pessoas para chegar ao conhecimento. É, portanto, a interação do
sujeito com o objeto de aprendizagem que produz o conhecimento.

Lev S. Vygotsky: foi professor e pesquisador, contemporâneo de Piaget;


viveu na Rússia até os 37 anos de idade, quando faleceu de tuberculose.
Suas pesquisas apontaram para o papel da linguagem e da aprendizagem no
desenvolvimento do indivíduo, cujo pensamento se constrói num ambiente
histórico-cultural.

Para Vygotsky (2001, p. 127), a relação do homem com o mundo não é direta,
mas mediada . O professor é um mediador entre o aluno que aprende e o
conhecimento.

Vygotsky investigou o desenvolvimento das capacidades intelectuais superiores


do homem e identificou a linguagem como o principal fator do crescimento.
Definia a linguagem como um conjunto de símbolos que mantinha seu caráter
histórico e social.

Emília Ferreiro: discípula de Piaget; desenvolveu teses sobre as hipóteses do


pensamento da criança a respeito da linguagem escrita. Não propõe um
método novo e muito menos uma pedagogia nova, mas esclarece que o que
faz com que a criança reconstrua o código linguístico não é o cumprimento de
tarefas repetitivas ou o fato de conhecer as letras e os símbolos, mas a
compreensão de como funciona o código.

A partir dos estudos e das investigações desses pesquisadores e de outros


educadores, o professor tem condições de saber como ocorre o processo de
alfabetização e o que o aluno pensa ao apropriar-se do conhecimento quando
reconstrói o código linguístico.

Com esses conhecimentos, o professor pode planejar e realizar uma ação


pedagógica baseada no desenvolvimento e na construção da linguagem por
meio de práticas educativas que contenham jogos e atividades que permitam à
criança pensar e dialogar com a linguagem; pode contribuir para que a criança
desenvolva a leitura e a escrita do mundo em que vive.

1.1.3 Contribuições ao educador-alfabetizador

• O conhecimento não está no sujeito (racionalismo).

• O conhecimento não está no objeto (empirismo).

• Adquirir conhecimentos depende das estruturas cognitivas do sujeito e de


sua relação com o ambiente.

• O construtivismo não é um método de ensino porque não diz o que e como o


professor deve dar aula/ensinar. É uma teoria psicológica de aprendizagem
cujo objeto é a psicogênese da inteligência e dos conhecimentos de como o
sujeito aprende.

1.2 Ações do professor alfabetizador

• Saber como a criança pensa: a escrita, os símbolos do mundo.


• Estabelecer um ambiente estimulador na sala de aula, no qual o ler e o
escrever tenham significado e sejam usados no interior de nossa atual
sociedade.

• Planejar práticas educativas com jogos e atividades que permitam à criança


pensar e dialogar sobre a linguagem.

• Trabalhar considerando a leitura de mundo que a criança apresenta.

O percurso que a criança faz quando é alfabetizada é o mesmo do homem ao


longo da história da humanidade:

• pictórico: desenho;

• simbólico: reconstrução do código linguístico.

Os níveis de escrita, segundo a psicogênese da língua escrita:

1.2.1 Ao desenhar, a criança escreve?

Ao desenvolver a linguagem da fala, a criança começa a usar o desenho como


forma de expressão. Primeiramente, o faz de memória: não desenha o que vê,
mas o que conhece de sua realidade. Percebe que alguns traços podem até
lembrar o objeto que desenhou, mas não o percebe como símbolo.

Fonte: Cócco; Hailer, 1996.


Com o tempo, a criança desenha a sua realidade, representa as suas
observações e expressões por meio de representações de sinais simbólicos
abstratos.

Toda essa vivência contribui para o desenvolvimento da escrita da criança.


Segundo Cócco e Hailer (1996), o desenho acompanha a frase, e a fala
permeia o desenho.

A criança percorre o mesmo caminho que a humanidade ao desenvolver seu


conhecimento da escrita. Inicialmente, desenha de memória, depois substitui
traços que lembram o objeto desenhado por sinais indicativos ou figuras e, por
último, utilizase dos signos. Como a humanidade, parte do desenho (pictórico)
para a simbologia (alfabeto).

Muito se trabalha, atualmente, com o método tradicional de alfabetização.


Apesar da contribuição de muitos estudiosos, professores utilizam a cartilha
(método global, silábico, fonético e outros) como forma de ensinar a criança a
ler e a escrever. Todo o processo de alfabetização é organizado pelo adulto, o
professor. O papel do aluno é receber as informações valiosas transmitidas
pelo professor e incorporá-las como sinônimo de aprendizagem. Escreve frases
distantes de sua realidade, sem significados e, por vezes, sem entendê-las;
escreve frases padronizadas e iguais às registradas na cartilha; apresenta
dificuldade na produção de um texto e não relaciona o que aprende na escola
com o seu cotidiano.

Alguns pesquisadores contribuíram para que o foco do trabalho pedagógico não


fosse o professor, mas o aluno e sua relação com o objeto de aprendizagem,
que, nesse caso, é a língua.

Piaget possibilitou a compreensão de que a criança não é um cérebro vazio à


espera do professor colocar-lhe o conhecimento; pelo contrário, o aluno
constrói seu conhecimento quando transforma o real, o mundo e a si mesmo
por meio de suas relações com o meio e com o objeto de sua aprendizagem.
Portanto, não é mais viável que o professor se preocupe apenas com suas
estratégias de ensino, seus conteúdos e métodos, mas sim com o que e como
o aluno aprende como subsídio de suas atuações em sala de aula.

Muitos professores se preocupam com conteúdos, estratégias, planos de aula e


relegam a segundo plano, quando se lembram, o que e como o aluno aprende;
pouco reflete sobre o que pode fazer para que seu aluno tenha condições de
construir o próprio conhecimento.

Antes de passar pela alfabetização propriamente dita, a criança apresenta


hipóteses sobre a leitura, observa, pensa e adquire concepções individuais
acerca dos símbolos linguísticos. Essas concepções são importantes para o
entendimento da criança do valor social da língua.
1.2.2 Concepções que a criança adquire sobre os símbolos linguísticos
antes da alfabetização

Cócco e Hailer (1996) discriminam algumas concepções apresentadas pela


criança antes do período escolar de alfabetização e que apontam para o valor
social da língua. São elas:

• tem consciência da diferença entre leitura silenciosa e a leitura em voz alta;

• reconhece que a leitura de histórias é feita em livros e as notícias são lidas


em jornais;

• percebe que a leitura de uma bula tem a função de orientar o uso do


remédio;

• sabe que as receitas podem ser lidas, compreendidas e utilizadas em algo


concreto;

• compreende que os manuais de brinquedos e jogos servem para orientar o


modo como os brinquedos e jogos devem ser montados e usados;

• verifica que as palavras têm quantidade; que apresentam letras diferentes


uma das outras e que a leitura pode ser feita de cima para baixo e da
esquerda para a direita.

Essas concepções a respeito da leitura são adquiridas na medida em que as


crianças interagem com o meio em que vivem e têm experiências de leitura e
escrita. Elas criam hipóteses sobre a escrita e seus usos porque participam de
situações nas quais os textos e as leituras têm função social.

Numa sala de aula, existem crianças com experiências muito diferentes umas
da outras.

Crianças provenientes de famílias pobres, cujos pais ou responsáveis utilizam-


se pouco da leitura e da escrita, tendem a refletir no espaço escolar seu pouco
repertório com a leitura, porque tiveram poucas oportunidades de participar ou
presenciar situações de leitura e não puderam criar muitas hipóteses.

Para as crianças que vivem em famílias de classe média ou alta, que convivem
com a leitura de vários tipos de textos, que ganham livros e gibis, que
observam os adultos manusearem livros e jornais para buscar informações, e
que presenciam adultos receberem correspondências, o repertório de suas
experiências e hipóteses de leitura é muito maior, porque seus contatos são
frequentes e significativos, com diferentes tipos e utilização de textos, como,
por exemplo, os textos nas marcas de produtos, títulos de histórias, escritos de
placas etc.
São nessas experiências iniciais que encontramos muitas crianças que
acreditam que a palavra está ligada ao tamanho do objeto representado. A
essa reação, chamamos de realismo nominal: quando a criança acredita que
a palavra boi não representa o boi porque é uma palavra pequena. Se a
entregamos uma palavra como formiga, é capaz de relacioná-la ao animal boi
devido ao tamanho da palavra.

A professora pode intervir nessa fase e criar oportunidades para que a criança
atinja o conhecimento do sistema alfabético da escrita e rompa com o realismo
nominal.

Situações como brincadeiras de “faz de conta”, em que um brinquedo


representa determinado objeto. Atividades de adivinhação que utilizem
mímica, desenhos para representar o que pensamos.

Registros de atividades planejadas com o intuito de não esquecermos


compromissos agendados. Anotações por representações da rotina da sala etc.

Após esse período, a criança dá início à leitura por preditibilidade: a leitura


de símbolos e sinais globais em diferentes contextos. A criança aponta para o
símbolo do Danone e fala em voz alta que está escrito Danone; quando
questionada, diz que sabe que é Danone.

Atividades com rótulos de supermercado, em que a criança representa uma


situação de vendas. Atividades de adivinhação pelos rótulos.

1.2.3 Níveis conceituais linguísticos

Se perguntarmos a alguns professores sobre a forma de as crianças adquirirem


a aprendizagem da leitura e da escrita, vários responderão que é pelo
ajuntamento das sílabas até formar as palavras.

Ainda não conseguem entender por que algumas crianças aprendem e outras
não, e permanecem na aprendizagem da cartilha.

Emília Ferreiro e outros pesquisadores contemporâneos contribuíram para a


prática pedagógica quando estudaram as concepções que as crianças
apresentam da escrita e como apresentam fases ou níveis de desenvolvimento
na construção do pensamento em relação à linguagem escrita.

São cinco os níveis conceituais linguísticos:


Nível 1 – Pré-silábico

Fase pictórica: é o registro feito pela criança com garatujas, desenhos sem
figuração e, mais tarde, desenhos com figuração. Inicia-se aos dois anos de
idade se a criança vive num ambiente urbano que a estimula desde cedo ao
uso de caneta e papel.

Fonte: Cócco; Hailer, 1996.

Fase gráfica primitiva: a criança mistura símbolos, pseudoletras com letras,


e números com letras em seus desenhos. Costuma representar o que conhece
do meio e o representa desenhando bolinhas, riscos e pedaços de letras.

Fonte: Cócco; Hailer, 1996.

Fase pré-silábica: a criança começa a diferenciar as letras dos números, os


desenhos dos símbolos e reconhece o papel da letra na escrita. Sabe que as
letras servem para escrever, mas não sabe como ocorre, ainda. Não associa o
fonema com o grafema. A criança acredita que a ordem das letras e as vogais
não têm importância.

Fonte: Cócco; Hailer, 1996.

Nível 2 – Intermediário I

Essa fase é a de conflitos, em que a criança não tem resposta para alguns
questionamentos e diz que “não sabe escrever”. Apresenta e usa alguns
valores sonoros convencionais como, por exemplo, diz que o seu nome começa
com determinada letra e a conhece pelo som, mas não sabe onde fica na
palavra que escreve.

Fonte: Cócco; Hailer, 1996.

Nível 3 – Silábico
A criança conta os “pedaços sonoros” (sílabas) e os associa com um símbolo
(letra). Essa associação pode acontecer com ou sem valor sonoro
convencional. Aceita palavras monossílabas, palavras com uma ou duas letras
com certa hesitação. Escreve uma frase utilizando uma letra para cada
palavra.

Fonte: Cócco; Hailer, 1996.

Nível 4 – Intermediário II ou silábico-alfabético

É mais um momento de conflito entre uma fase e outra em que a criança


precisa desconsiderar o nível silábico para pensar segundo o nível alfabético.
Nessa fase, o professor deve instigar a criança no sentido de reflexão sobre o
sistema linguístico pela observação da escrita alfabética.

Nível 5 – Alfabético

Quando a criança chega nessa fase, já reconstrói o sistema linguístico e


compreende como ele funciona, consegue ler e expressar seus pensamentos e
falas. Forma sílabas e palavras juntando as letras e consegue distinguir letra,
sílaba, palavra e frase. Pode acontecer de a criança dividir a frase não
gramaticalmente, e sim conforme o ritmo frasal.
F

Fonte: Cócco; Hailer, 1996.

O trabalho de alfabetização em sala de aula exige do professor conhecimento,


habilidade e competência para dar condições aos seus alunos para que
construam seus conhecimentos. De forma alguma o professor pode se ater a
transmitir conhecimentos do alfabeto, da junção de letras e palavras, sem
preocupar-se com a função da escrita, sem possibilitar ao aluno o uso da
linguagem escrita.

As teorias pedagógicas, as investigações e as pesquisas científicas dão suporte


ao professor no planejamento e na atuação em sala de aula, quando o ajudam
a conhecer seus alunos, como pensam e suas hipóteses na tentativa de
resolver seus conflitos.

Com o conhecimento científico na área educacional, o professor tem condições


de elaborar aulas de forma a chamar a atenção do aluno, com propostas
significativas, com jogos e atividades que instiguem o aluno a pensar e a
reformular suas hipóteses. Não podemos ignorar o papel do professor em ser o
mediador e o organizador da ação educativa, da construção e reconstrução dos
conhecimentos de seus alunos em sala de aula.
Para atuar, o professor deve conhecer seus alunos, mas também saber o que
eles têm e/ou trazem de conhecimentos. Para essa atividade, o professor pode
utilizar-se da sondagem de seus alunos, a fim de refletir, planejar atividades
e intervir na vida deles.

1.3 Reconstrução do código linguístico da criança

Frente às pesquisas científicas, como o professor pode intervir na reconstrução


do código linguístico da criança? Cócco e Hailer (1996) propõem dois eixos no
trabalho de alfabetização da criança:

1. o trabalho textual, porque permite à criança compreender como funciona


a escrita e como pode ser empregada socialmente;

2. a análise linguística, porque embasa a aquisição do valor sonoro


convencional à criança e a ajuda na reconstrução do código linguístico.

1.3.1 Textos

A maioria das crianças chega à escola com pouca experiência em leitura de


textos diversos, portanto, podemos dizer, sem dúvida, que esse trabalho é
ponto central de uma proposta alfabetizadora.

A sala de aula deve conter grande quantidade e variedade de material escrito,


como livros, jornais, gibis, revistas e cartazes que estimulem a leitura da
criança. Pode, por exemplo, conter várias cestas e cada uma delas com um
tipo de leitura: uma com livros didáticos, outra com histórias, gibis etc. O
professor pode sugerir que, ao término das atividades, as crianças escolham
uma das leituras para lerem e conversarem com os colegas sobre o livro
escolhido e o que contém cada um deles.

Cócco e Hailer (1996) sugerem atividades para três frentes de ação


pedagógica. São elas:

1. jogos para contato com a linguagem escrita:

• caminhada da leitura;
• leitura de obra de arte;
• atividades com rótulos;
• corre-cotia;
• texto coletivo;
• texto memorizado;
• notícias;
• jogos de rimas;
• procura de palavras;
• músicas;
• bilhetes.
2. acesso a textos diversificados:

• textos práticos;
• textos informativos;
• textos literários;
• textos extraverbais.

3. atividades de interpretação de textos.

1.3.2 Jogos de análise linguística

Cócco e Hailer (1996) ressaltam o papel do jogo no cotidiano infantil e o


indicam como um dos principais meios de construção do conhecimento pela
criança, porque, além de a atividade lúdica em si ser prazerosa, o erro é
encarado como algo normal, portanto, pode ser trabalhado pelo professor para
a mudança de atitudes da criança, e a interação com o outro colega contribui
para a autonomia da aprendizagem do aluno.

O trabalho com jogos de análise linguística possibilita à criança corresponder


os sons com as letras e adquirir valores sonoros convencionais. A seguir
exemplificamos algumas atividades sugeridas pelos autores.

Utilizar letras do alfabeto, pintadas e recortadas, numa caixa e sorteá-las


para as diferentes crianças; mostrar e perguntar se conhecem aquela letra. Em
seguida, solicitar sugestões de palavras que começam com aquela letra. O
professor pode fazer cartazes com uma gravura que inicia com a respectiva
letra e com a lista de palavras sugeridas pelas crianças.

Alfabeto ilustrado: pedir para as crianças recortarem de revistas gravuras


cujos nomes comecem com a letra de seu nome.

Alfabeto concreto: solicitar às crianças que separem objetos ou figuras e


classifiquem-nos de acordo com a letra com que começa cada objeto ou figura
coletada.

Listagens na sala: com os alunos, separar palavras, listando-as de acordo


com suas características. Por exemplo: lista de roupas, animais, produtos de
higiene, meios de comunicação, brinquedos. O professor pode registrar na
lousa as indicações das crianças.

Quebra-cabeça: a criança pode brincar com um quebra-cabeça,


confeccionado pelo professor, de nomes dos alunos da sala, de lista de
animais, de objetos da sala, de gravuras e seus respectivos nomes abaixo etc.

1.3.3 Letra cursiva e letra de fôrma

A criança tem maior contato com a letra de fôrma devido ao seu uso frequente
por jornais, revistas, letreiros, informes de supermercado etc. Seu traçado é
fácil e as letras são separadas uma das outras, o que possibilita a identificação
da letra pela criança e a sua percepção das regras de combinação do código
linguístico.

Podemos falar que uma criança é alfabética quando vincula fonema/grafema.


Ela entende que deve escrever como fala: por exemplo, ouve falar boneca e
escreve buneca; casa e escreve caza.

Quando a criança estiver na fase alfabética, o professor pode apresentar outros


tipos de letra, por exemplo, a de fôrma minúscula e cursiva maiúscula e
minúscula. Inicialmente, deve apresentá-la junto com a letra de fôrma, para
depois deixar escrita apenas a cursiva.

O professor não deve esquecer o trabalho com frases e textos, e, aos poucos,
diminuir o trabalho com palavras apenas.

O professor pode fazer cartazes com os tipos de letras, segundo o que


sugerem Cócco e Hailer (1996).

1.3.4 Ortografia e gramática

O ensino da ortografia possibilita à criança o desenvolvimento da fluência na


leitura. Após o entendimento de escrever o que se fala, a criança alfabética
começa a desestruturar suas hipóteses porque não entende algumas regras da
escrita ortográfica.

A ortografia, parte da gramática, apresenta regras como a utilização de “m”


antes de “p” e “b” e outras com aspectos convencionais estipulados a partir do
social-arbitrário. Nesse conhecimento, a criança precisa lembrar-se da palavra
para escrevê-la corretamente. É um processo que envolve a imagem mental; a
consciência do modo como a palavra é escrita está além do plano da
memorização da palavra por meio de repetidas cópias, passíveis de
esquecimento.

1.3.4.1 Correção das palavras do texto

Infelizmente, muitos professores, equivocados com a concepção construtivista


da alfabetização, simplesmente não corrigem os textos escritos de seus alunos
e, consequentemente, não os ajudam na construção correta da imagem mental
das palavras escritas no texto.

1.3.4.2 Autocorreção

É um procedimento de comparação da palavra escrita incorretamente com a


forma ortograficamente correta. O professor pode devolver o texto ao aluno
com as palavras escritas incorretamente grifadas e com a palavra correta no
final do texto, para que a própria criança possa reescrever o texto com as
palavras escritas corretamente, após a comparação das palavras.
O professor também pode grifar as palavras escritas incorretamente e solicitar
que as crianças procurem as palavras corretas num texto jornalístico da
internet, em revistas, livros ou dicionários.

1.3.4.3 Pontuação

Não se fala mais em ensinar pontuação nessa ou naquela série ou ano em que
a criança estuda, mas sim na fase em que se encontra na hipótese linguística.
Ensina-se, portanto, pontuação quando o aluno é alfabético e escreve textos.

O professor pode ler um texto produzido coletivamente em sala de aula,


dramatizando-o como se o texto não tivesse pontuação e, junto com as
crianças, num outro momento, colocar a pontuação necessária para
entendimento do texto, do ponto final, dos parágrafos, das vírgulas etc.
Trabalhar com as crianças a respeito das expressões faciais, a forma como o
corpo se manifesta quando falamos uma história a outras pessoas e que, num
texto, não temos as expressões ou linguagens corporais para que fique clara a
compreensão. No texto, temos a pontuação para que possamos expressar
nossos pensamentos.

1.3.4.4 Escrita ortográfica

O conhecimento da escrita ortográfica é construído num processo de


aprendizagem percorrido ao longo das experiências de leitura e escrita das
pessoas.

A autocorreção e a pontuação de um texto são formas de ampliar e consolidar


os conhecimentos construídos ao longo do processo de alfabetização e
letramento, e não um fim em si mesmo. Ou seja, é necessário que o aluno
escreva corretamente para ser interpretado, expressar suas ideias e opiniões,
não aprendê-las simplesmente para repeti-las em provas e tirar notas boas,
dizer que está alfabetizado porque copia ou escreve sem erros ortográficos;
com certeza, não é repetir frases decoradas e “cartilhescas” sem significado e
sentido para o aluno.

1.4 Avaliar o ensino e a aprendizagem do aluno

A avaliação está relacionada à visão que o professor, os pais, os alunos e a


equipe como um todo têm do mundo, de suas expectativas em relação ao
processo do ensino e da aprendizagem.

1.4.1 Avaliação normativa

A avaliação normativa é pautada em notas e menções realizadas a partir do


número de acertos que o aluno apresenta na prova, e não na verificação de
sua aprendizagem. O professor tem papel de mero transmissor de
conhecimento; cabe ao aluno repetir os conhecimentos que lhe foram passados
por meio de respostas escritas em sua prova.

A prioridade do professor é trabalhar os conteúdos, e não o conhecimento que


o aluno adquiriu.

1.4.2 Avaliação qualitativa

A avaliação qualitativa é fundamentada em critérios.

O professor observa os seus alunos, o aproveitamento de cada um e propõe


atividades desafiadoras ou de fixação de conteúdos, proporcionando-lhes
condições para que construam seus conhecimentos.

Avaliar requer reflexão contínua da prática educativa e dos resultados


alcançados pelos alunos.

1.5 O papel do “erro” no processo educativo e na avaliação

Cócco e Hailer (1996) explicam que o erro costuma ser “desconfortante” para
quem o comete porque é visto como algo negativo, portanto, ninguém deve
cometê-lo. Porém, segundo Piaget, os conceitos são construídos num processo
de autorregulação, quando as pessoas corrigem as ações consideradas erradas
por não alcançarem os objetivos propostos e estabelecidos.

O que deve ser ressaltado é a atitude que se toma a partir do erro: o reforço
de hipóteses equivocadas, não adequadas, ou a construção e o
aperfeiçoamento de novas hipóteses, contribuindo-se para o desenvolvimento
cognitivo do aluno.

O professor, além de diagnosticar o erro do aluno, deve ajudá-lo a reformular


suas hipóteses.

2. METODOLOGIA DO ENSINO DE PORTUGUÊS

Nos últimos anos, apesar do número de estudos e discussões sobre como a


criança aprende a ler e escrever, das contribuições de teóricos na educação,
alguns professores ainda acreditam que a prática pedagógica deve ser
fundamentada em exercícios repetitivos a serem aplicados em sala de aula e
lições a serem feitas em casa. Muitos pensam que essa repetição contribui
para que a criança leia e escreva melhor.

Temos crianças que copiam muito bem um texto, têm a letra bonita, mas nada
do que escrevem tem sentido ou significado. Não fazem uso da leitura e da
escrita habitualmente e nem as têm como instrumento de expressão de suas
ideias e seus sentimentos, ou como uma forma de comunicação com os outros
e de leitura de mundo.
Alguns professores aplicam muitos conteúdos e acreditam estar executando
uma “boa atividade”.

2.1 Como um professor pode promover uma “boa atividade” na sala de


aula?

A “boa atividade” é a que promove a aprendizagem do aluno, a construção de


seu conhecimento. Com certeza, não é aquela aula show, farta em jogos e
brincadeiras, da qual o aluno quer participar, mas a que promove a mudança
de atitudes, procedimentos e conceitos dos alunos.

2.1.1 Características de uma “boa atividade”

Naspolini (1996) aponta que a “boa atividade”, promotora do desenvolvimento


do conhecimento do aluno, pode ser significativa, produtiva e desafiadora.

Atividade significativa: “Quando gera conhecimento útil para a vida do


aluno; quando lhe oferece condições de, tendo consciência do conhecimento
apropriado, vir a utilizá-lo nas diferentes situações de sua vida” (Naspolini,
1996, p.12).

As pesquisas a respeito do baixo rendimento escolar de nossos alunos apontam


para uma de suas dificuldades: a de relacionar o que aprendeu na escola com
o seu dia a dia. Relacionar os textos escritos e aprendidos na escola com a sua
necessidade de ler, escrever, ter conhecimento e interpretar o que lê e
escreve. Cabe a reflexão sobre as atividades aplicadas em sala de aula.

Paulo Freire criticou as cartilhas e as comparou às roupas de tamanho único


que servem para todo mundo e, ao mesmo tempo, para ninguém; as cartilhas
estão longe de abordar a realidade vivida por nossos alunos (Aranha, 1989).

O indício que o trabalho com cartilha nos dá é a compreensão da alfabetização


como a assimilação de habilidades perceptivas, psicomotoras, de discriminação
visual e auditiva e coordenação viso-manual da grafia.

Algumas podem propor a repetição de exercícios e traçados das vogais e


consoantes, a composição de sílabas simples e organizadas em famílias
silábicas. Após essas ações, há a construção de palavras e frases isoladas de
um contexto que a criança conhece e se identifica. Apresentam frases com
uma línguagem irreal, longe da criança.

Adriane Andaló (1996) explica que, apesar de muitas gerações aprenderem


com o método da cartilha, a memorização de letras e o ajuntamento de sílabas
e palavras não garantem a aprendizagem da criança; alguns leem, fazem
cópias, mas não compreendem o que escrevem.

A cartilha apresenta palavras e frases escritas com letra cursiva e minúscula.


De acordo com as pesquisas psicogenéticas, a criança identifica com facilidade
a letra bastão maiúscula por visualizá-la, frequentemente, nas escritas de seu
meio ambiente, e, por conter letras separadas, as crianças percebem as regras
de combinação silábica da língua.

Torna-se necessário, portanto, que a criança leia na sala de aula por meio de
cartazes ou prateleiras com caixas e suas respectivas identificações em latas,
embalagens e rótulos de produtos variados.

O contato com diferentes escritas e textos promove na criança o


reconhecimento e a distinção do desenho (sinal) e da escrita (signo); contribui
para que ela compreenda que escrevemos o que falamos; facilita a
aprendizagem da grafia das letras e a construção de palavras de forma
significativa na prática: lendo e escrevendo.

Adriane Andaló (1996) sugere como atividade significativa de leitura e escrita


as seguintes atividades que objetivam o que denominou de “redes de
significado”:

• trabalhar com o nome dos alunos, identificando palavras, sílabas e letras do


próprio nome da criança e de seus colegas em outras atividades; escrever
listas de palavras do mesmo campo lexical, como, por exemplo, nome de
animais, nome de frutas, nome de brinquedos, compras de supermercado;

• recortar e colar figuras e associá-las com a escrita de letras móveis de


plástico;

• utilizar, em sala de aula, a letra bastão maiúscula até as crianças estarem


alfabéticas;

• montar e desmontar palavras;

• montar quebra-cabeças com palavras e gravuras;

• fornecer palavras e pedir às crianças que as representem por meio de


desenhos.

Atividade produtiva: quando o aluno aprende, constrói o conhecimento e,


além de desenvolvê-lo, o aperfeiçoa nas atividades cotidianas.

Frequentemente, os trabalhos escolares são requeridos pelos professores sem


que estes sintam a necessidade de escrever; simplesmente, os fazem porque o
professor mandou. Torna-se uma atividade que não é produtiva, desvinculada
do contexto da criança, uma escrita mecânica.

Muitos adultos têm dificuldades para escrever um texto ou expressar o que


pensam por intermédio de um texto escrito. Essa dificuldade pode ter relação
com a dicotomia entre o que se escreve na escola e o que realmente precisa
escrever para comunicar-se socialmente.
Adriane Andaló (1996) sugere ao professor que abandone textos mecânicos e
sem significado para o aluno e trabalhe com textos reais, provenientes do meio
em que o aluno vive. Indica ao professor o trabalho com:

• pequenos poemas de ritos populares como “Marcha soldado”, “Batatinha


quando nasce” e “Pombinha branca”, conhecidos pela transmissão oral e
escrita;

• textos da literatura infantil;

• textos escritos em outdoors, placas, avisos, cartazes, revistas, jornais,


televisão;

• textos de comunicação social: cartas, convites, cartões comemorativos,


bilhetes etc.

Atividades desafiadoras: atividades que apresentam dificuldades possíveis


de serem solucionadas pelo aluno, mas que exigem a sua reflexão, análise de
hipóteses, busca de ações possíveis, portanto, contribuem para o
desenvolvimento de sua capacidade cognitiva.

Naspolini (1996) sugere que o professor trabalhe com situações de


aprendizagem desafiadoras, provocativas e instigantes, que devem ser
construídas sobre aspectos conhecidos do aluno anteriormente. Portanto, as
atividades não devem ser tão fáceis que o aluno as desenvolva rapidamente,
mas também não tão difíceis, fazendo com que o aluno desanime por sentir-se
incapaz de executá-las.

Muitos professores entendem que, ao final do período de alfabetização, o aluno


deve estar capacitado a ler e a escrever, encerrando-se assim o período de
aprendizagem da leitura e escrita, o que é um equívoco. Naspolini (1996)
afirma que, nesse momento, a criança apenas adquiriu o código linguístico e
necessita executar vários tipos de atividades para que desenvolva a sua leitura
e escrita.

2.1.2 Tipos de atividades

Atividades de sondagem: estão relacionadas às atividades de avaliação da


atividade do aluno. Visa detectar o conhecimento que a criança construiu e
como esse conhecimento foi construído. A partir do que foi coletado pelo
professor, planejam-se as atividades de ensino e de aprendizagem novas e
específicas ao aluno.

Naspolini (1996) destaca alguns pontos das atividades de sondagem:


• retratam o momento específico da atividade executada pelo aluno: num certo
momento, o aluno apresenta um determinado conhecimento, e, em outro
momento, outro conhecimento;

• as intervenções do professor favorecem a compreensão de como a criança


pensa um determinado conhecimento;

• possibilitam o registro, em fichas, da produção do aluno e podem


fundamentar o planejamento de novas atividades.

As atividades de sondagem e o material utilizado devem ser inéditos, para não


estimular a memorização de como se aplica determinado conhecimento pela
criança. A sondagem é feita periodicamente, e os resultados devem ser
comparados com os resultados da sondagem anterior.

Ao analisar os resultados da sondagem, o professor pode agrupar crianças que


apresentam determinada dificuldade e planejar atividades diversificadas de
ensino e de aprendizagem.

As atividades diversificadas são compostas por jogos e variam conforme a


evolução do conhecimento dos alunos.

Atividades de ensino-aprendizagem: segundo Naspolini (1996), são


atividades que intervêm nos saberes construídos anteriormente pelo aluno e
promovem a aquisição de novos conhecimentos. Como exemplo, cita a
atividade de correspondência título-texto, em que a professora lê um texto em
sala de aula e apresenta vários títulos. Os alunos devem escolher um título que
se adeque à história narrada pela professora.

Atividades de aplicação: são exercícios específicos que visam a aplicação de


conhecimentos apreendidos pela criança por meio das atividades de ensino-
aprendizagem. Naspolini (1996) sugere que devem ser aplicados,
preferencialmente, nos grupos de alunos. A autora distingue dois períodos ou
características das atividades de aplicação: a repetição e a transformação.

A repetição devido ao fato de os conhecimentos adquiridos pelos alunos serem


utilizados repetidas vezes e em momentos diferentes das atividades. A
transformação se refere aos exercícios serem mudados, e não seus objetivos,
que devem ser a aplicação de determinados conhecimentos aprendidos
anteriormente.

O exemplo dado por Naspolini (1996) é que a mesma atividade de


correspondência texto-título pode ser empregada de diferentes formas, como:

• corresponder o texto com a escolha de um título dentre outros;

• corresponder um título com a escolha de um texto dentre outros;


• corresponder os textos com a escolha dos respectivos títulos, dentre outros.

Note que as atividades apresentam a repetição, emparelhar textos e títulos, e


a transformação, com a execução de atividades diferentes entre si.

Atividades de avaliação: o objetivo dessas atividades de avaliação é


diagnosticar o que o aluno é capaz de realizar sozinho, o que o aluno aprendeu
e o que precisa melhorar, e podem ter a finalidade qualitativa ou quantitativa,
segundo Naspolini (1996).

A finalidade qualitativa está ligada ao diagnóstico do conhecimento construído


pelo aluno e subsidia o planejamento do professor na medida em que planeja
futuras atividades de ensino-aprendizagem (sondagem), e a finalidade
quantitativa está ligada ao diagnóstico e à medição do que o aluno construiu
de determinado conteúdo.

2.2 O trabalho com leitura

De acordo com Naspolini (1996), “ler é o processo de construir um significado


a partir do texto”. A leitura será compreendida se houver concordância entre
os conhecimentos prévios do leitor e os elementos textuais.

O ato de ler significa compreender o que está escrito com as letras e o que se
quis dizer com as letras; é muito mais do que decodificar os códigos
linguísticos.

Para entender o texto lido, o leitor utiliza vários esquemas cognitivos, e como
as pessoas têm esquemas cognitivos diferentes, podem entender o mesmo
texto de formas diversas.

As diferentes formas de linguagem de cada leitor, o conhecimento que tem do


mundo, seus propósitos e esquemas conceituais podem ajudar a entender ou
dificultar a compreensão do texto.

2.2.1 Estratégias de leitura

Todo leitor apresenta estratégias, processos cognitivos para facilitar a leitura


compreensiva, rápida e eficaz. São estratégias: a seleção, a predição, a
inferência, o autocontrole e a autocorreção.

Seleção: quando um leitor lê um texto, ele o faz a partir do que é de seu


interesse, do que considera importante para o entendimento da leitura. Ao
selecionar o que quer ler, o leitor despreza algumas partes do texto e acaba
por “pular” alguns aspectos do texto sem comprometer sua compreensão.

Predição: o texto fornece algumas pistas que favorecem a criação de algumas


hipóteses por parte do leitor.
Inferência: quando o leitor conclui aspectos explícitos ou não do texto
baseado em seus conhecimentos prévios.

Autocontrole: quando o leitor valida ou não sua predição, inferência do texto


por meio de sua leitura.

Autocorreção: quando o leitor corrige o que pensou a respeito da leitura


quando o texto não a comprova.

Segundo Naspolini (1996), há uma reciprocidade entre a estratégia de leitura


para entender um texto e a sua interpretação; um não acontece sem o outro.

Naspolini (1996) se refere à pesquisadora francesa Jolibert quando sugere


alguns passos para se questionar um texto. Esses passos podem ser utilizados
em atividades diversificadas, com o intuito de o aluno ler e interpretar o texto:

• De onde e como surgiu o texto?

• Quais são as características físicas do texto?

• Como está diagramado?

• Que informação o texto traz por meio de imagens ou palavras do parágrafo,


frases?

• Existem números, símbolos no texto? Quais são os objetivos que o autor


demonstra com os números e símbolos descritos no texto?

• Quais são os sinais de pontuação apresentados no texto?

• Há palavras desconhecidas?

2.2.2 O trabalho com textos

A leitura e a escrita não devem se restringir ao trabalho com cartilha.

Numa sociedade letrada como a nossa, o professor precisa trabalhar com os


mais variados tipos de textos, com o objetivo de que a criança construa
estruturas cognitivas necessárias à leitura e à escrita de textos variados. Não
significa que o aluno tenha apenas que identificar ou reconhecer as diferentes
modalidades de texto, mas escrevê-las, utilizá-las mediante as suas
necessidades.

Com um fim didático, Naspolini (1996) classificou os textos em práticos,


informativos ou científicos, literários e extraverbais, mas ressaltou que um
único texto pode pertencer a mais de um grupo dos citados.
Textos práticos: são textos comuns em nosso dia a dia. Por exemplo: cartas,
contas de água, luz e telefone, cheques, embalagens de todos os tipos,
manuais de aparelhos eletrônicos, listagens, itinerários, ingressos, passagens,
carnês, bulas de remédio, cardápios, receitas culinárias, notas fiscais, bilhetes,
telegramas. O professor pode utilizar uma data comemorativa, como o dia dos
pais, e desenvolver uma atividade de confecção de uma carta.

Pode abordar algumas questões como:

• A quem escrever?

• Quem é o remetente e/ou destinatário da carta que escreve?

• Qual é o pronome de tratamento adequado?

• Para que e por que escrever uma carta.

• O que pretende abordar na carta à outra pessoa.

• Qual é a estrutura do texto?

• Para finalizar a atividade de ensino e de aprendizagem, os alunos podem


passear numa excursão ao seu bairro e postar a carta em comemoração ao dia
dos pais. Naspolini (1996) sugere os seguintes pontos como elementos
essenciais da carta e que podem ser trabalhados com os alunos para
aprenderem como se faz uma carta:

Após esses elementos serem aplicados na sala, o professor pode incentivar o


seu aluno a se autoavaliar, a fim de analisar os itens cumpridos, os que
precisam melhorar e as possíveis mudanças. Naspolini (1996) sugere o
seguinte quadro para o professor promover a autoavaliação do aluno:
Textos informativos ou científicos: a função dos textos informativos é
trazer conhecimentos novos aos leitores. Por exemplo: jornais, revistas,
enciclopédias, entrevistas, tabelas, gráficos.

Exemplo

Dicas para combater o mosquito e os focos de larvas


Fonte: <http://www.dengue.org.br/dengue_prevenir.html>.

Textos literários: são textos que expressam sentimentos, pensamentos e


fantasias do homem na relação com o mundo a sua volta e consigo mesmo.

Exemplo

Soneto da fidelidade (Vinícius de Moraes)

De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu
canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu
contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de


quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa (me) dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é
chama Mas que seja infinito enquanto dure.

Fonte: <http://www.secrel.com.br/jpoesia/vm2.html#sonetodafidelidade>.

Textos extraverbais: existem textos escritos não com palavras, mas com
outros códigos linguísticos e não linguísticos. Por exemplo, os textos escritos
com figuras, ilustrações, arquitetura, história em quadrinhos, quadro de arte,
música, gesto etc.

Exemplo

O ciclo da água

Fonte:
<http://www.tvcultura.com.br/aloescola/infantis/chuachuagua/ciclo.htm>.

O professor pode trabalhar com vários textos em sala de aula e com três
enfoques diferentes.

Enfoque conteudístico: a partir de um texto, questões são formuladas para


que os alunos respondam segundo as palavras e ideias expostas no texto.
Naspolini (1996) define como o objetivo desse tipo de atividade decodificar a
leitura. Muitos professores costumam utilizar apenas esse tipo de enfoque e
acreditam que, ao responder às questões, os alunos entenderam e
interpretaram o texto.
Enfoque estruturalista: todos os textos apresentam determinadas estruturas
que os identificam e são chamadas de superestrutura esquemática: a
distribuição e a organização da estrutura interna do texto. Exemplos de
estruturas esquemáticas do texto, segundo Naspolini (1996):

Enfoque discursivo: o trabalho com enfoque discursivo tem por objetivo


analisar os efeitos que o texto produziu no leitor. Para essa análise, o professor
pode utilizar questões que considerem processos cognitivos como o de
antecipação, de transformação, inferência, crítica, extrapolação, situação
problema, efeitos, intenções e emoções. Exemplos de questões sugeridas por
Naspolini (1996) de cada processo cognitivo:
2.3 Algumas sugestões para o trabalho com a produção de textos

• Pode-se trabalhar com textos escritos individualmente, em pequenos grupos


ou coletivamente.

• Propor para os alunos a escrita de vários tipos de textos: relatórios, contos,


poesias etc.

• Pedir aos alunos que descrevam fotos e paisagens.

• Solicitar que criem histórias a partir de recortes de gibis, paisagens etc.

• Pedir para entrevistarem conhecidos e descreverem como foi a entrevista.

• Pedir que escrevam jornais da sala, reportagem da escola e outros.

O Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional (INAF), anualmente, aplica


testes em população representativa de quinze a 64 anos para coletar hábitos e
práticas de leitura e escrita em diversos contextos de vivência dos brasileiros.
Apontam, além de habilidades matemáticas, habilidades de leitura e de escrita,
que compreendem a capacidade de processar informações numéricas
presentes no dia a dia, no comércio, no trabalho ou nas páginas dos jornais.

Observe o quadro abaixo:


Fonte: <http://www.reescrevendoaeducacao.com.br/2006/>.

Referências bibliográficas

ANDALÓ, Adriane. Didática de língua portuguesa para o ensino fundamental.


São Paulo: FTD, 1996.

ARANHA, Maria Lúcia A. Filosofia da educação. 1a. ed. São Paulo: Moderna,
1989.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais: 1ª a 4ª série. Brasília: MEC/SEF, 1997.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Ensino


fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos
de idade – mais ano é fundamental. Brasília, 2006.
CÓCCO, Maria Fernandes; HAILER, Marco Antônio. Didática da alfabetização:
decifrar o mundo: alfabetização e socioconstrutivismo. São Paulo: FTD, 1996.

COLL, César; TEBEROSKY, Ana. Aprendendo português: conteúdos essenciais


para o ensino fundamental de 1ª a 4ª série. 1a. ed. São Paulo: Ática, 2000.

FRADE, Isabel Cristina da Silva. Alfabetização hoje: onde estão os métodos?


Revista Presença Pedagógica. v. 9. n. 50. mar./abr., 2003.

KATO, Mary A. A concepção da escrita pela criança. São Paulo: Pontes, 1994.

NASPOLINI, Ana Tereza. Didática de português: tijolo por tijolo: leitura e


produção escrita. São Paulo: FTD, 1996.

TEBEROSKY, Ana; TOLCHINSKY, Liliana (Org.) Além da alfabetização: a


aprendizagem fonológica, ortográfica, textual e matemática. São Paulo: Ática,
2000.

VYGOTSKY, Lev Semionovitch. Psicologia pedagógica. São Paulo: Martins


Fontes, 2001.

WEISZ, Telma; SANCHEZ, Ana. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem.


São Paulo: Ática, 1999.

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