-Eu só quero ser mais feliz.

-Eu não sei cara, as vezes esse negócio de felicidade parece um fardo, sabe? Muito
superestimada. A gente tá vivendo num período mandatório de felicidade. “A felicidade é a
cura para tudo”, “busque ser feliz”, “pense positivo”. Isso não é natural. Sabe quando alguém
faz você lembrar que você precisa respirar pra viver e você toma consciência e deixa de fazer
no automático pra começar a fazer manual? Ou quando alguém lembra que você tem uma
língua se remexendo dentro da boca, ou que você precisa piscar? Se ninguém ficasse te
lembrando dessas coisas, você passaria a vida numa boa fazendo as coisas sem pensar que tem
que fazer e é assim com a felicidade. Se alguém ficar te lembrando o tempo todo que você
precisa ser feliz, buscar a felicidade, dicas para ser mais feliz, cara, você vai ficar inquieto
pensando “caramba, preciso ser feliz” e vai acabar fazendo alguma coisa que te deixa
desconfortável ou até pior. As vezes tu já é feliz e nem sabe, talvez só não esteja dando valor
pro teto que tem, pra comida, para as amizades, por poder andar, falar, ver, sentir, sabe?

- Caramba.

-A vida precisa de um equilíbrio cara, não dá pra ficar nessa neura de perseguição a um
conceito. Por que a felicidade é um conceito, você sabe né? Vamos supor que você fuja da
regra, veja todos os tutoriais, siga todas as dicas e descubra a fórmula pra ser feliz o tempo
todo, e ai? Felicidade demais é anestesiante. Tudo demais faz mal, na verdade, até as coisas
boas. As coisas boas tem que ter fim, assim como as ruins. Equilíbrio.

- Aposto que você tava esperando por uma oportunidade para performar esse monólogo a sua
vida toda né?

- Você não tem ideia do quanto eu já tinha ensaiado isso na minha cabeça, você acha que ficou
impactante? São pra isso que servem os monólogos né?

- Olha, eu nunca mais vou olhar pra pão com manteiga da mesma maneira, se isso responde a
sua pergunta.