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E L L E N D O S S A N TO S O L I V E I R A

ORGANIZADORA

TÍTULO
subtítulo
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129

P22
Estudos em Cas@: linguagens, educação e ensino [livro eletrônico] /
1.ed.
organização Ellen dos Santos Oliveira
– 1.ed. – Curitiba-PR: Editora Bagai, 2021.
E-Book.

Bibliografia.
ISBN: 978-65-81368-96-8 

1. Educação. 2. Ensino. 3. Linguagem. I. Oliveira, Ellen dos Santos.

07-2021/76 CDD 400

Índice para catálogo sistemático:


1. Ensino e linguística 400

https://doi.org/10.37008/978-65-81368-96-8.25.11.21

ISBN 978-65-81368-96-8

9 786581 368968 >

Este livro foi composto pela Editora Bagai.

www.editorabagai.com.br /editorabagai

/editorabagai contato@editorabagai.com.br
ELLEN DOS SANTOS OLIVEIRA
organizadora

ESTUDOS EM CAS@:
Linguagens, Educação e Ensino
1.ª Edição - Copyright© 2021 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Bagai.
O conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade do(s) seu(s) respectivo(s)
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Dr. Thiago Perez Bernardes de Moraes – UNIANDRADE/UK-ARGENTINA
Dr. Tomás Raúl Gómez Hernández – UCLV e CUM - CUBA
Dr. Willian Douglas Guilherme – UFT
Dr. Yoisell López Bestard- SEDUCRS
SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 - CONHECIMENTO ESTÁTICO E


CIRCULAR NA PESQUISA: ÂMBITO INDIVIDUAL
E INSTITUCIONAL........................................................................10
Marcelo Pamplona Baccino

CAPÍTULO 2 -A INTERDISCIPLINARIDADE NA
INSERÇÃO DA INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO:
RELATO DE EXPERIÊNCIA CONTEXTUALIZADO
ANTES DA PANDEMIA...............................................................23
Ellen dos Santos Oliveira

CAPÍTULO 3 -ENSINO REMOTO EMERGENCIAL


E O ATUAL CENÁRIO EDUCACIONAL
BRASILEIRO......................................................................................34
Leonardo Rodrigo Soares

CAPÍTULO 4 -AS DEMANDAS DO PROFESSOR


DURANTE A PANDEMIA DA COVID-19:
CONSIDERAÇÕES ACERCA DO TRABALHO
REMOTO...............................................................................................49
Alessandra Ribeiro Queiroz | Brenda Mourão Pricinoti | João Vítor Sampaio de Moura |
Lucélia Cristina Brant Mariz Sá | Stefanne Almeida Teixeira

CAPÍTULO 5 -COMPETÊNCIAS DIGITAIS E


PESQUISAS NA INTERNET: UMA ANÁLISE DO
PERFIL DE ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO.....63
Amanda D. C. Schiassi | Ketilin Mayra. Pedro

CAPÍTULO 6 -GÊNEROS DIGITAIS NO CONTEXTO


DO LIVRO DIDÁTICO: UMA ANÁLISE COM BASE
NA BNCC...............................................................................................77
Maria Dayane da Costa Coelho | Bárbara Olímpia de Melo | Shirlei Marly Alves

CAPÍTULO 7 -LEITURA NA SALA DE AULA...............91


Maria de Fátima de Mello

CAPÍTULO 8 -MEDIAÇÃO VIRTUAL NO ENSINO


REMOTO E A PRODUÇÃO DE VIDEOPOEMAS..... 103
Andréia Mendonça dos Santos Lima | Carolaine Aparecida De Souza Barros |
Geovânia de Souza Andrade Maciel | Natália Da Silva Fernandes | Stefany Louheny Oliveira De Paula
CAPÍTULO 9 -A REPRESENTAÇÃO DO NEGRO
NA LITERATURA NO ENSINO MÉDIO NA
PANDEMIA: UMA ANÁLISE DO PLANO DE
ENSINO TUTORADO DE MINAS GERAIS................. 117
Stefanne Almeida Teixeira | Brenda Mourão Pricinoti | João Vítor Sampaio de Moura

CAPÍTULO 10 -O PAPEL DA CULTURA NA


CRIAÇÃO DE FRASEOLOGISMOS NO CONTO
CAPITOA DE HÉLIO SEREJO.............................................. 131
Joseane Aparecida de Souza Francisco | Luciene Cristina Paredes Müller |
Giselle Vasconcelos dos Santos Ferreira | Tânia Mara de Souza

CAPÍTULO 11 -UMA REFLEXÃO SOBRE O USO


A LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA COMO
FERRAMENTA PEDAGÓGICA........................................... 141
Gabriel Batista Mota | Gabriela das Graças Oliveira Leal

CAPÍTULO 12 -FERRAMENTAS DIGITAIS DE


ESCRITA: O USO DO PADLET EM AULAS DE
LÍNGUA INGLESA........................................................................ 153
Felipe Ridalgo Silvestre Soares | Larisse Carvalho de Oliveira | Shalatiel Bernardo Martins |
Guilherme Mariano Martins da Silva | Aline Rodrigues Nogueira | Fernando Gledson dos Santos Lima

CAPÍTULO 13 -EXAME NACIONAL DO ENSINO


MÉDIO: UM OLHAR NA PERSPECTIVA DA
LINGUÍSTICA TEXTUAL........................................................164
Aluízio Moreira de Oliveira Filho | Eurico Rosa da Silva Júnior | Sidney Washington de Lima Melquiades

CAPÍTULO 14 -MUDANÇAS CURRICULARES À


VISTA: CONTRIBUIÇÕES DE UMA EXPERIÊNCIA
PRÁTICA PARA O PAPEL DO PROFESSOR EM
ADMINISTRAÇÃO....................................................................... 186
Camilla Rodrigues Netto da Costa Rocha | Rodrigo Guimarães Motta

SOBRE A ORGANIZADORA.................................................200
ÍNDICE REMISSIVO...................................................................201
APRESENTAÇÃO

Desde março de 2020 que a COVID – 19 foi caracterizada pela


OMS como uma pandemia, devido à acelerada disseminação mundial
do vírus SARS – COV – 2, descoberto no dia 31 de dezembro de 2019.
Nesse contexto, o isolamento social foi adotado como uma das medidas
de prevenção e contenção em todo globo terrestre. Este cenário caótico,
impôs desafios à humanidade que precisou reunir forças heroicas ao
enfrentamento e à superação das consequências decorrentes da pandemia,
tanto no saneamento básico, como na saúde e na educação. No que diz
respeito ao âmbito educacional e ao sistema de ensino, a inserção dos
recursos tecnológicos tem contribuído sobremaneira, conforme pode-se
constatar nos artigos que compõe este livro.
No Capítulo 1, Marcelo Pamplona Baccino apresenta um estudo
introdutório sobre questões relacionadas ao conhecimento estático e
circular na pesquisa, seja no âmbito individual e/ou institucional, com
ênfase ao conceito de interdisciplinaridade no ensino-aprendizagem,
que tem uma importância atemporal no âmbito educacional.
No capítulo 2, Ellen dos Santos Oliveira apresenta um relato de
experiência contextualizado antes da pandemia, retomando uma reflexão
sobre a questão da interdisciplinaridade na inserção da informática da
educação.
No capítulo 3, Leonardo Rodrigo Soares propõe uma refexão
crítico-teórica e metodológica sobre o ensino remoto emergencia e o
atual cenário brasileiro em face à urgência do uso das tecnologias digitais
no processo de ensino aprendizagem.
No capítulo 4, Alessandra Ribeiro Queiroz, Brenda Mourão
Pricinoti, João Vítor Sampaio de Moura, Lucélia Cristina Brant Mariz
Sá e Stefanne Almeida Teixeira apresentam algumas questões impor-
tantes sobre o trabalho remoto e as demandas do professor durante a
pandemia do COVID – 19.
No capítulo 5, Amanda D. C. Schiassi e Ketilin Mayra. Pedro
propõem uma reflexão crítica sobre questões relacionadas às competên-
cias digitais e às pesquisas na internet, com ênfase voltada à análise do
perfil dos estudantes do Ensino Médio no uso das Tecnologias Digitais
da Informação e Comunicação (TDIC)
No capítulo 6, Maria Dayane da Costa Coelho, Bárbara Olímpia
de Melo e Shirlei Marly Alves, a partir da análise da Base Nacional
Comum Curricular (BNCC), e pensando a formação de leitores capazes
de interagir dialogicamente na sociedade, apresenta um debate crítico
sobre a relação dos gêneros digitais no livro didático.
No capítulo 7, Maria de Fátima de Mello propõe uma discussão
pertinente sobre questões relacionadas à leitura na escola, tais como
valorização de conhecimento prévio, motivações e estratégias de leitura
eficazes no desenvolvimento de competência de compreensão de textos,
e ainda, retomando a BNCC.
No capítulo 8, Andréia Mendonça dos Santos Lima, Carolaine
Aparecida De Souza Barros, Geovânia de Souza Andrade Maciel,
Natália Da Silva Fernandes e Stefany Louheny Oliveira De Paula, apre-
sentam uma reflexão sobre a mediação virtual do ensino e a produção
de videopoemas.
No capítulo 9, Stefanne Almeida Teixeira, Brenda Mourão Pri-
cinoti e João Vítor Sampaio de Moura apresenta uma plano de ensino
tutorado de Minas Gerais, voltado para o ensino e a representação do
negro na literatura em tempos de pandemia.
No capítulo 10, Joseane Aparecida de Souza Francisco, Luciene
Cristina Paredes Müller, Giselle Vasconcelos dos Santos Ferreira e Tânia
Mara de Souza analisam o papel da cultura no processo de criação de
fraseologismos no conto Capitoa do sul-mato-grossense Hélio Serejo.
No capítulo 11, Gabriel Batista Mota e Gabriela das Graças
Oliveira Leal recomendam uma reflexão favorável em relação ao uso
da linguagem cinematográfica como uma eficaz ferramenta pedagógica
devido ao seu grande potencial educativo.
No capítulo 12, Felipe Ridalgo Silvestre Soares, Larisse Carvalho
de Oliveira, Shalatiel Bernardo Martins, Guilherme Mariano Martins
da Silva, Aline Rodrigues Nogueira e Fernando Gledson dos Santos
Lima em defesa do uso das ferramentas digitais da escrita, propõe o uso
do PADLET nas aulas de língua inglesa.
No capítulo 13, Aluízio Moreira de Oliveira Filho, Eurico Rosa
da Silva Júnior e Sidney Washington de Lima Melquiades propõe uma
análise reflexiva sobre o ENEM – Exame Nacional de Ensino Médio,
sob a ótica crítico-teórica da Línguística Textual.
No capítulo 14, Camilla Rodrigues Netto da Costa Rocha e
Rodrigo Guimarães Mota, propõem mudanças curriculares na forma-
ção docente do professor na área de administração, partindo de uma
análise de experiência prática, e permitindo pensar a formação docente
de forma interdisciplinar, pois, de algum modo, o professor também é
um administrador do processo de ensino-aprendizagem.
Pretende-se com este livro contribuir para reflexões críticas sobre
a educação, linguagem e ensino, e servir como guia no processo de
ensino aprendizagem.
Ellen dos Santos Oliveira
CAPÍTULO 1 - CONHECIMENTO
ESTÁTICO E CIRCULAR NA PESQUISA:
ÂMBITO INDIVIDUAL E INSTITUCIONAL

Marcelo Pamplona Baccino1

INTRODUÇÃO

As reflexões iniciais contidas nesse primeiro capítulo foram desen-


volvidas no decorrer de leituras e estudos feitos em busca de informações
diferenciadas do modo de pensar ocidentalizado, positivista e estático.
Conhecimentos importantes e pouco aproveitados foram apresenta-
dos nas obras encontradas e aqui citadas. Valendo-se do ambiente de
aprendizado de uma instituição pública federal de ensino, no que diz
respeito as facilidades de leituras e de discussões sobre diversos artigos
e livros. Dessa forma aproveitou-se a oportunidade de escrever o atual
texto dentro da temática “Práticas de ensino, pesquisa e extensão”, dando
destaque à prática da pesquisa.
Logo no início do artigo é tratado sobre a história da ciência
com ênfase na interdisciplinaridade. Em seguida a própria interdisci-
plinaridade é o destaque do capítulo. Continuando o trabalho, o tema
passa a ser as interfaces entre disciplinas, pluralidade de saberes e uma
abordagem sobre o ser e fazer individual e institucional para ocorrer
uma aproximação com o interdisciplinar. O texto segue ao mostrar a
lógica linear em um capítulo e no seguinte o conhecimento não-linear.
Apresentando diversas ilustrações nesses breves capítulos.
Já finalizando o presente capítulo é expresso a construção alterna-
tiva de pensamento e raciocínio, principalmente, através do que propaga
o sociólogo Niklas Luhmann. Por fim, ocorrem as considerações finais
em síntese e comentários de análise e reflexão.

1 
Doutorando em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido (UFPA).
CV: http://lattes.cnpq.br/6707072949061006
10
Estudos em Cas@

HISTÓRIA DA CIÊNCIA E A
INTERDISCIPLINARIDADE

Na História da Ciência mostra que a interdisciplinaridade é pre-


sente no Ocidente desde os gregos, passando pelos romanos, doutrinas
do multissecular período medieval e Renascimento. Tudo feito de forma
elitista, mas com os Jesuítas o conhecimento torna-se mais abrangente
(GUSDORF, 1977). Na modernidade proposições surgem para substi-
tuir o humanismo tradicional dos colégios jesuítas (GUSDORF, 1977).
Com a Revolução Industrial (século XVII) destaca-se ainda mais a
racionalidade científica disciplinar. Ali ocorre uma ruptura que implicou
outra concepção de saber, por conta da novidade do método instituído.
Destacam-se novas técnicas em busca da verdade que se utilizam dos
métodos da observação, pesquisa e experiência (MARTINS, SOLDÁ,
PEREIRA, 2017).
Essa concepção de fazer ciência tem como marco da natureza uni-
versal do método científico o acréscimo do empirismo de Francis Bacon
(com a obra intitulada “Novum Organum” de 1620) da seguinte forma:
“é possível, portanto, falar da realidade que nos rodeia sem renunciar a
certeza de atingir o nível de veracidade que os matemáticos garantem”.
Uma ambição que será a bandeira do empirismo lógico, florescendo até
meados do século passado - século XX (MARRADI, 2002).
Dando continuidade a narrativa sobre a história da ciência, pode-se
expressar que primeiro na tradição filosófica ocidental, Descartes pro-
clama o papel central do método2 na atividade intelectual (publicando o
livro “Discurso sobre o Método” de 1637). Já definindo o método como
“regras que levam ao verdadeiro conhecimento” (MARRADI, 2002).
A convicção de que este é o único método possível para a ciência tem
sido amplamente defendida até mesmo nas ciências humanas.
No século XIX ocorre um declínio na esperança interdisciplinar.
O positivismo e o cientificismo fecham e isolam cada disciplina (GUS-

2 
Aqui trata-se do método com o seguinte conceito: forma (ou modo; ou meio) eleita
com relação a como ocorrerá a investigação científica.
11
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

DORF, 1977). A partir da crise da ciência no modelo clássico - exata,


objetiva, quantificável, verdadeira, neutra, pragmática, ou seja, na pers-
pectiva positivista - que emerge a discussão sobre a interdisciplinaridade.
Na modernidade próxima outro destaque ocorre com a transição das
matrizes mecânicas para microeletrônicas, desprendendo-se ainda mais
do natural e trazendo mudanças no pensar, no manusear e na elabo-
ração da própria ciência. Com a pós-modernidade mais um destaque
ocorre. É o que conhecemos como tecnociência (MARTINS, SOLDÁ,
PEREIRA, 2017). Vê-se que a interdisciplinaridade é a própria evolução
da ciência e da humanidade.
No final dos anos 60 do século passado (século XX) firmam-se na
Europa movimentos científicos e acadêmicos pela interdisciplinaridade
(MALLARINO, 2012).
O movimento em prol da interdisciplinaridade surge com respaldo
de agências internacionais, como a OCDE3 e a UNESCO4, em torno
das questões do ensino superior e o papel das ciências sociais. Quatro
acadêmicos foram fundamentais em sua gestação: Edgar Morin, Basa-
rab Nicolescu, Erich Jantsch e Jean Piaget. Movidos por uma profunda
preocupação com a fragmentação do conhecimento e percebendo o
quanto isso traria efeitos terríveis e nefastos para o futuro da humanidade
(MALLARINO, 2012).

INTERDISCIPLINARIDADE

A visão de interdisciplinaridade que busca-se aqui expressar


aproxima-se da propagada por Georges Gusdorf (1977). O mesmo diz
que é a reunião da aproximação de inteligibilidade de acordo com a
multiplicidade de vocações individuais, e a diversidade de perspectivas
da cultura mundial. Um politeísmo epistemológico, respeitador das
divergências e descontinuidades.

3 
OCDE é uma organização econômica intergovernamental. A sigla diz “Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico”.
4 
UNESCO significa “Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência
e a Cultura” – ela é uma agência especializada das Nações Unidas (ONU).
12
Estudos em Cas@

Nessa situação podemos indagar o que as seguintes descobertas


do século passado têm em comum: a estrutura do DNA 5, ressonância
magnética, o lêiser6 para cirurgia ocular, radar e genoma humano,
podemos responder que todos foram desenvolvidos a partir de um
trabalho colaborativo entre pesquisadores de várias disciplinas e foram
fruto de um grande número de equipes que investigaram em conjunto
e não de indivíduos trabalhando isoladamente. Esses desenvolvimentos
foram originados em centros, institutos e laboratórios; localizados em
instituições acadêmicas, em centros nacionais e internacionais de pes-
quisas e, também, em indústrias interessadas em propostas de inovação
(MALLARINO, 2012).
Vê-se então a interdisciplinaridade como um processo de resolução
de problemas ou abordagem de temas que, por serem muito complexos,
não podem ser trabalhados por uma única disciplina (LEIS, 2013). Uma
visão integradora e um salto cognitivo.
Não existe uma metodologia única para a pesquisa interdiscipli-
nar, como não há uma definição única autorizada para isso. As equipes
que são treinadas para isso devem trabalhar, ad hoc, em uma construção
coletiva. Por esse motivo, a pesquisa interdisciplinar é um caminho mais
longo, mais difícil e muitas vezes mais caro do que a pesquisa disciplinar.
Envolve superar os problemas da diversidade de perspectivas. Mas é
certamente o caminho mais produtivo (MALLARINO, 2012).
A prática interdisciplinar não se decreta. Ela não se estabelece
espontaneamente pela mera aproximação de disciplinas diferentes. Ela
se constrói metodicamente (RAYNAUT, 2014). A flexibilidade das
estruturas universitárias para promover o encontro de disciplinas e o
estabelecimento de algumas práticas são essenciais para abrir um espaço
de pesquisa interdisciplinar. Isso inclui o recrutamento e promoção de
professores, os processos de organização orçamentária e até espaços de
reunião promovidos pela planta física (MALLARINO, 2012).

5 
ADN, em português: ácido desoxirribonucleico; ou DNA, em inglês: deoxyribonu-
cleic acid.
6 
Proveniente do inglês “laser”.
13
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

FAZENDO INTERFACES ENTRE DISCIPLINAS

A explosão de áreas especializadas do conhecimento é evidente


em sua classificação taxonômica. Na classificação feita pelo UNESCO
em 1988, por meio da “Nomenclatura Padrão Internacional dos Campos
de Ciência e Tecnologia”, o conhecimento é classificado em campos,
disciplinas e subdisciplinas. Nesta nomenclatura existem 24 campos
da ciência e tecnologia, 249 disciplinas e o impressionante número de
mais de mil subdisciplinas (MALLARINO, 2012).
Em uma variedade tão grande de tipos de conhecimentos classi-
ficados fica mais evidente o quanto é importante a interdisciplinaridade
para melhor representar e entender a realidade atual. Assim como existir
a possibilidade de uma só linguagem para todas os saberes e a melhor
consideração por saberes colonizados (indígenas, autóctones etc) para
deixarem de ser subalternos a seja lá o que se apresente como hegemônico
(MALLARINO, 2012).
A forma cartesiana de ser e fazer encontra-se favorável à padro-
nização, uma estratégia de decisão que, pelo que se pode observar,
tem seus perigos a partir do momento em que pode induzir ao erro de
formato potencializado, já que permite favorecer que uns se aproveitem
do fato de que os demais se orientem pela padronização e se atenham
a determinadas regras do jogo, enquanto outros utilizem essa forma de
jogo de decisão para seus próprios fins (LUHMANN, 2011).
Provavelmente, as barreiras mais difíceis de superar são as men-
tais e as culturais. As condições pessoais que ajudam a disposição para
a interdisciplinaridade incluem mente aberta, flexibilidade, fluidez,
respeito às diferenças e ética (MALLARINO, 2012).
Outra necessidade é a modificação do atual sistema das univer-
sidades e de seus status com práticas que geram, entre outras coisas,
educação continuada, aquisição de conhecimento de uma forma útil,
estudo autodidata, avaliação prática e composição individual do currículo
de cada estudante (JANTSCH, 1979).

14
Estudos em Cas@

Ao examinar as estruturas universitárias destaca-se a forma como


se concretiza nas unidades (faculdades, departamentos etc) uma visão
epistemológica da organização de conhecimento. Isso leva à reprodução
dessa ordem linear, uma vez que os alunos são treinados neste paradigma
e certificados nesta estrutura (MALLARINO, 2012).

A LÓGICA LINEAR

A possibilidade pode ser indicada de forma mais clara após mostrar a


situação predominante no que diz respeito ao ser e fazer ciência atualmente.
Trata-se de uma lógica linear, nessa lógica a pesquisa é realizada
de forma sequencial, o que na prática significa realizar uma etapa passo
a passo, sempre seguindo uma direção e operando de forma parecida -
definição do objeto, formulação de hipóteses, criação de variáveis, coleta
de dados, interpretação, verificação/refutação (VIDAL, 2017).
Diante de um problema complexo, o pensamento linear explica
um aspecto particular do problema, uma vez que alguns detalhes foram
anteriormente removidos ou delimitados do/no problema. É evidente que
este tipo de pensamento lógico observacional tem vantagens (velocidade,
confiabilidade e precisão), mas também acarreta uma série de desvantagens,
uma vez que ela apenas pode operar dentro de um determinado paradigma
e está sujeita a um programa ou conjunto de regras (VIDAL, 2017).
O pensamento linear é o de disciplinas isoladas, uma forma de
ser e fazer que não consegue mais lidar com a realidade pós-moderna,
essa vem se desenvolvendo desde as últimas décadas do século XX. Para
ilustrar o pensamento linear e suas restrições pode-se imaginar uma
pessoa de formação positivista retratada com um gaveteiro no lugar da
cabeça, sendo cada gaveta uma disciplina que se fecha em si e não gera
interações com as outras. Tal pessoa mostra o quanto a lógica linear
dificulta a relação entre conhecimentos. Importante expressar que no
mundo de hoje saber relacionar e aplicar as informações é tão importante
quanto acumular o conhecimento.
O pensamento linear dificulta a pesquisa interdisciplinar, atrapalha
o diálogo entre as disciplinas. Força o encaixe entre pensamentos. Já
15
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

a teoria sistêmica7 é produto de um conjunto de conceitos procedentes


de diferentes teorias, é uma teoria construtiva que permite que não seja
necessária uma hipótese inicial e sim a sua construção durante a pesquisa.
Percebe-se a lógica circular8 como observar um problema de milhares de
ângulos e formas diferentes que se relacionam entre si e assim concebe
milhares de maneiras de resolvê-los. A possibilidade que se apresenta é
diferente da lógica predominante na atualidade. Trata-se de algo mais
amplo em suas maneiras de enxergar o objeto e consequentemente a
realidade. Uma forma diferente de entender e organizar o raciocínio.
Eric Jantsch (1979) inicia um de seus textos tratando sobre a ciência
e o propósito do ser humano. Expressa sobre o professor Piaget9 que
corajosamente se declara contra o positivismo predominante nas ciências.
O autor diz que este pensamento é fascinante porque estende o conceito
de sistemas – o qual parece ainda mais rico do que as “estruturas” do
Professor Piaget - dos domínios biológico e social às ciências em geral.
Paralelo a esta noção de ciência, como sistema, emite a hipótese de que a
objetividade não reside nos fatos, mas nos relacionamentos encontrados
na realidade. Esta é também a base sobre a qual está a teoria dos sistemas.
O elogio a Jean Piaget ocorre devido o construtivismo ser algo sempre
em construção assim como a teoria sistêmica.

7 
Sistema é um conjunto de partes coordenadas e não relacionadas, formando um todo.
Uma abordagem de sistemas considera, acima de tudo, a ciência, educação e inovação
como exemplos gerais de atividades humanas orientadas para objetivos e cuja interação
dinâmica exerce uma influência dominante no desenvolvimento da sociedade e de seu
meio ambiente (JANTSCH, 1979, p. 2).
8 
O raciocínio circular aplicado a pesquisa científica pode ser exemplificado nas
seguintes etapas que inicia em identificação e seleção do problema; análise do pro-
blema; geração de soluções em potencial; seleção e planejamento da solução; aplicação
da solução; avaliação; e em ciclo e em retroalimentação reinicia com a identificação e
seleção do problema e assim circularmente acontece (VIDAL, 2017, p. 6).
9 
Jean William Fritz Piaget nasceu em 1896 e faleceu em 1980, foi um psicólogo
suíço que dedicou-se a responder como origina-se e desenvolve-se o conhecimento.
Expressa que o conhecimento é gerado a partir da interação do sujeito com o meio,
concluindo que o desenvolvimento cognitivo faz a base do conhecimento e o mesmo
ocorre por meio de assimilação e acomodação de esquemas ou moldes mentais em
constante construção.
16
Estudos em Cas@

CONHECIMENTO NÃO-LINEAR

A ordem estática positivista é preambulo de morte, pois a vida é


movimento! Muito mais do que uma simples linha na horizontal ou vertical
(representação da lógica linear) com hierarquias e preconcepções o conheci-
mento não-linear nega a hierarquização, é múltiplo, híbrido, interdisciplinar,
encontra-se em construção (movimento), traz a relação e a inter-relação.
As figuras número dois, três e quatro buscam mostrar essa dife-
rença de circulação e vida entre os dois tipos de raciocínio. A número
dois refere-se ao modo predominante de pensar na humanidade, já as
outras tratam do pensamento circular e sistêmico.
Figura 1 - O estático positivismo.

Fonte - Fonte do autor.

Figura 2 - Vida e movimento em construção.

Fonte - Fonte do autor.

17
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Figura 3 - Múltiplas relações e inter-relações.

Fonte - https://www.ime.usp.br/~pf/algoritmos_para_grafos/aulas/large-examples.html

A forma como as ciências sociais e a sociologia adquirem conhe-


cimento encontra-se em um período de profundas transformações. O
pensamento que consideramos clássico apresenta limitações para a obser-
vação da complexidade dos fenômenos e da sociedade atual. Para alguns
cientistas sociais esse pensamento linear não é fecundo para a análise
dos fenômenos. Nos últimos anos, na epistemologia das ciências sociais
e na sociologia, tem-se desenvolvido duas estratégias com implicações
diretas e profundas na forma de obtenção de conhecimentos e com a
lógica da observação dos fenómenos, assim como da realidade. As pro-
postas tradicionais baseiam-se na assimetria derivada da verificabilidade
e falseabilidade. Estas são “teorias assimétricas”, ou pensamento analítico
(cujo os fundamentos remontam a Galileu, Newton e Descartes). Destas
teorias surgem outros tipos de meta-epistemologias, conhecidas como
“teorias circulares” e que se baseiam em contribuições mais recentes -
Prigonine, Morin, Kratz e Krahn, Luhmann (VIDAL, 2017).

18
Estudos em Cas@

CONSTRUÇÃO ALTERNATIVA

O objetivo é simplesmente expor as possibilidades de construção


heurística10 como outra forma de construção lógica do conhecimento
(VIDAL, 2017). Para tanto o expresso por Niklas Luhmann será exposto
no decorrer do capítulo.
Profundamente original e dificilmente classificável o sociólogo
alemão Niklas Luhmann (1927-1998), desenvolveu uma teoria ambiciosa
e coerente na qual descreve a sociedade moderna como um sistema.
Constituída, não tanto por indivíduos, mas pela comunicação, difere
em subsistemas funcionais fechados por meio de códigos especializados:
sistemas políticos, econômico, religioso, artístico ou legal. Inspirado por
autores, teorias e disciplinas muito diferentes, Luhmman construiu uma
das obras mais férteis e exclusivas do século XX (URTEAGA, 2010).
A intenção de Luhmann a respeito do pensamento e das meto-
dologias consideradas clássicas é a seguinte: “quebra da continuidade
do pensamento clássico já que ele não é mais fecundo para a análise
de fenômenos”. Sua proposta mostra a preocupação em redirecionar as
teorias lineares inspiradas no princípio cartesiano, para construir uma
nova teoria baseada na circularidade e no paradoxo (VIDAL, 2017).
A teoria de Luhmann proclama o esgotamento das categorias
herdadas da modernidade, em particular suas categorias normativas, e
oferece um diagnóstico pessimista de uma sociedade que não tem pos-
sibilidade de modificar sua trajetória, levando-a ao desastre ecológico
(URTEAGA, 2010).
Segundo Luhmann, como “complexidade” se quer dizer que
sempre existem mais possibilidades do que se pode realizar. Por con-
tingencia entendemos o fato de que as possibilidades apontadas para as
demais experiências poderiam ser diferentes das esperadas. Portanto,
complexidade significa a imperiosa necessidade de se escolher, dentre

10 
Conhecimento heurístico é um tipo especial de conhecimento usado para resolver
problemas complexos (VIDAL, 2017, p. 8).
19
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

as mais variadas possibilidades que o ser pode eleger, aquela adequada


(TRINDADE, 2008).
O termo “complexidade” pode se parecer com as expressões com-
plicada, confusa, intrincada, difícil e trabalhoso, mas não são esses sen-
tidos a serem empregados, a intensão é utilizar o significado originário
do latim “complexus”. Essa definição traz a ideia de tecido, com muitos
elementos complementando-se em uma imensa trama de relações entre
si e com o todo e o mesmo com todas as partes em complemento e,
também, em antagonismo.
A maneira mais acessível de entender a complexidade é pensar,
primeiramente, no número das possíveis relações, dos possíveis aconte-
cimentos e dos possíveis processos. Imediatamente, compreender-se-á
que cada organismo, máquina e formação social, tem sempre um meio
que é mais complexo, e oferece mais possibilidades do que aquelas que
o sistema pode aceitar, processar ou legitimar (LUHMANN, 2011).
Outras formas de entender a realidade existem, exemplo disso é
a Teoria Autopoiética de Luhmann. A mesma apresenta um método de
observação social que em sua aplicação aos sistemas sociais representa
uma grande mudança epistemológica, evidenciando que no processo
de observação científica o conhecer do objeto ou da problemática pode
ocorrer avaliando sua colocação no todo, ou seja, essa teoria observa o
objeto pela interação entre variados elementos em suas relações no(s)
sistema(s).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decorrer do capítulo a interdisciplinaridade foi posta como


possibilidade de superação do conhecimento que ainda é fragmentado.
O texto expressa que todo conhecimento deve dialogar e ser passível
de confirmação e de negação. Conhecimento que poderá ser questio-
nado, complementado e ampliado de e por diferentes aspectos. Ou seja,
salientar as interfaces entre as disciplinas e não o confronto entre elas.
Ocorrendo num contexto de debilidade da comunidade acadêmica e da
sociedade em geral ao tentar interpretar a realidade. De tal cenário se

20
Estudos em Cas@

pode dizer que a forma linear de pensamento supria razoavelmente as


exigências do capitalismo clássico em obter lucro, o máximo possível,
aumentar a produção, e diminuir os custos não importando se tais
atitudes acarretarão na destruição dos ecossistemas naturais, extinção
de espécies vegetais e animais, degeneração de culturas tradicionais
multimilenárias, corrupção de governos inteiros por multinacionais em
megacorporações monopolizadoras.
A falência das ideias de que todos os indivíduos são iguais e livres,
juntamente com a evidente incompetência de solucionar problemas
advindos de tal concepção somando ao desenvolvimento da ciência,
ocasiona o surgimento de outras demandas na sociedade. Para suprir tais
necessidades a forma cartesiana de ser e fazer apresenta-se insuficiente,
ineficaz e ineficiente.
Claro que passar do ser e fazer por meio do raciocínio linear
para o circular (sistêmico, heurístico, complexo etc) exige uma transição
composta por processos teóricos e práticos e transformações do próprio
ser e fazer individual, coletivo e institucional.
Nesse contexto de mudança, grandes benefícios poderão ocorrer
para instituições de ensino, em destaque para as universidades federais
e institutos federais, pois os mesmos são uns dos protagonistas no tripé
ensino, pesquisa e extensão no Brasil e América Latina. Entre essas
benesses cita-se, em destaque, a maior integração entre pesquisadores
e com isso a formação de equipes multifacetadas capazes de resolverem
mais facilmente problemas técnico-materiais, sociais, ambientais, entre
muitos outros que se apresentam em nossa realidade local, regional,
nacional e mundial; e o aumento das interfaces entre disciplinas nas
práticas de ensino e aprendizado.
A lógica circular tem como obstáculo a vida efêmera do ser humano
frente ao universo e as fraquezas e fragilidades de cada indivíduo (egoísmo,
individualismo, centrismos, entre muitos outros ismos). Dentre as pedras
no caminho encontram-se também uma sociedade monolítica, o des-
respeito ao pluralismo, as diferenças regionais (Norte e Sul do Brasil,
por exemplo), o departamentalismo, o corporativismo, a burocracia, a

21
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

estrutura física, a imposição epistemológica, a gestão falha etc, mas tudo


será superado cedo ou tarde; uma certeza e um acerto igual a simples
e franca afirmação de que duas cabeças juntas pensam melhor do que
uma e dez pensam melhor que duas.

REFERÊNCIAS
BACON, Francis. Novo órganon: Instauratio Magna, 1561-1626. São Paulo: EDIPRO, 2014.

DESCARTES, René. Discurso do Método. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

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en las universidades. Cidade do México, México: ANUIES, 1979, p. 110-141.

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de Filosofía, Málaga, Espanha, v. 15, p. 301-317, 2010.

VIDAL, Josep Pont. Observación de la realidad mediante sistemas no-lineales: la


investigación heurística. Belém: NAEA-UFPA, 2017.

22
CAPÍTULO 2 -A INTERDISCIPLINARIDADE
NA INSERÇÃO DA INFORMÁTICA NA
EDUCAÇÃO: RELATO DE EXPERIÊNCIA
CONTEXTUALIZADO ANTES
DA PANDEMIA

Ellen dos Santos Oliveira11

INTRODUÇÃO

Neste capítulo propõe-se uma reflexão sobre a interdisciplinari-


dade na inserção da informática na educação, entendendo que o uso das
tecnologias na educação é uma exigência contemporânea que já vinha
sendo colocado em debates educacionais antes mesmo das exigências
da pandemia, com o isolamento social e o uso dos ambientes virtuais da
aprendizagem, mediados pelo computados, mas que teve sua utilidade
reeinvindicada com ampla urgência nas aulas e eventos educacionais na
modalidade de ensino remoto.
Sendo assim, para a primeira reflexão, propomos primeiramente,
uma reflexão retrospectiva, no sentido de voltar ao passado para refletir
sobre a atualidade e fazer pensar o futuro pós-pandemia, cuja a inserção
da informática na educação continuará sendo um necessidade para o pro-
fessor nesse cenário atual imposto. Nossa proposta, consiste em apresentar
uma reflexão crítico-teórica partindo de uma experiência vivenciada
em uma escola pública antes da pandemia. Nesse sentido, o objetivo é
verificar como se dá a interdisciplinaridade em ambiente virtual. Essa
discussão adotará duas abordagens: a teórica e a pratica. Entendendo
ambas como um processo indissociável e complementar. Está dividida
em duas partes: a primeira comporta a parte teórica dessa discussão; a
segunda apresenta uma reflexão sobre a prática da interdisciplinaridade
em aulas ministradas em um laboratório de informática de uma escola
pública de Sergipe. Pretende-se com ele contribuir com as discussões
11 
Doutora em Letras (UFS). CV: http://lattes.cnpq.br/0243081448488165
23
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

contemporâneas sobre a inserção da informática na educação e sobre a


interdisciplinaridade propiciada nesse processo.
Para Fazenda (2008), pensar a interdisciplinaridade apenas como
junção de disciplinas, limitaria a pensar o currículo meramente como
formatação de sua grade. No entanto, se compreendermos a interdis-
ciplinaridade como uma atitude de ousadia na busca incansável pelo
conhecimento, é importante refletir sobre os aspectos que envolvem a
cultura do lugar onde acontece a formação dos professores.
Nessa perspectiva, Fazenda (2008) defende a ideia de que o debate
sobre a interdisciplinaridade, como uma atitude de ousadia na busca do
conhecimento, deve-se iniciar na universidade e ampliar-se às preocu-
pações das diversas esferas da sociedade (FAZENDA, 2008, p. 20). Ou
seja, é preciso que haja uma união entre a teoria, em especial àquelas
apreendidas na universidade, e a prática docente, quando ocorre a apli-
cação dessas teorias nos contextos sociais em que as propostas teóricas
se inserem. Buscando, com essa união entre teoria e prática, senão sanar
as necessidades e mazelas no sistema de ensino, ao menos amenizar e
criar novas possibilidades para mudanças.
Seguindo essa linha de raciocínio, em que ao se pensar a inter-
disciplinaridade na inserção da informática na educação, esse trabalho
está dividido em duas partes: a primeira comporta a parte teórica dessa
discussão, sobre a inserção da informática na educação e sobre a inter-
disciplinaridade como uma metodologia nesse processo; a segunda
apresenta uma discussão sobre a prática da interdisciplinaridade em
aulas ministradas em um laboratório de informática de uma escola
pública de Sergipe.
Procura-se com este trabalho contribuir com as discussões con-
temporâneas sobre a inserção da informática na educação e sobre a
interdisciplinaridade propiciada nesse processo.

24
Estudos em Cas@

INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO

Informática na educação consiste na inclusão da informática no


processo de aprendizagem dos conteúdos curriculares da educação, con-
forme analisa José Armando Valente. Ou seja, pode-se dizer de forma
simplificada, mas esclarecedora, que esse termo se refere à inserção do
computador no processo de ensino- –aprendizagem de conteúdos cur-
riculares de todos os níveis e modalidades da educação (VALENTE,
1999, p. 1).
Assim sendo, o computador pode ser utilizado tanto para trans-
mitir a informação ao aluno, como também dando condições para que
ele construa seu próprio conhecimento, e o uso desse equipamento pos-
sibilita novas técnicas de ensino, pois, diferente de uma aula tradicional,
onde se abordaria apenas um único conceito sobre determinado tema,
a tecnologia proporciona aos professores e alunos variados conteúdos,
teorias, imagens, vídeos e etc., facilitando a contextualização do assunto
e também a interdisciplinaridade.
O prof. Claudiano Soares de Santana enfatiza que, contextua-
lizando o tema tratado, o discente assimilará melhor o conteúdo, pro-
piciando um aprendizado mais amplo (SANTANA, 2010). Através
do uso da internet o computador transmite informações ao aluno, para
que este crie, a partir delas, seu próprio conhecimento. De acordo com
Débora Marques citada por
José Demísio, coordenador de graduação da Faculdade IBTA:
O papel da escola deixa de ser apenas o de provedora de
conhecimento. O próprio aluno traz informações para
dentro da sala de aula. O educador deve incentivar o
estudante a buscar informações, mas deve ser acima
de tudo um orientador do conteúdo e das fontes de
referência (DEMÍSIO, 2007, p. 19).

Por isso é importante a frisar que inserir essa tecnologia em uma


escola, e utilizar a informática no ensino, não significa apenas implantar
computadores em uma sala e deixar que os alunos o utilizem sem uma

25
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

devida orientação educacional, pois nesse processo a orientação do pro-


fessor é crucial para guiar o aluno na busca do conhecimento.
Assim sendo, para que a escola o inclua como um recurso didático
é necessário que os professores estejam devidamente capacitados para
utilizar de forma eficaz a nova tecnologia. Nesse sentido, Pais, enfatiza
que a disponibilidade física dos recursos tecnológicos, no meio escolar,
por si mesma, não traz nenhuma garantia de ocorrer transformações
significativas na Educação. Todo entendimento nesse sentido deve ser
corrigido para não reduzir a importância do trabalho docente (PAIS,
2008, pág. 10).
É importante observar se, de fato, o uso do computador está
criando possibilidades para que haja aprendizagem, pois se acredita que
o processo de aprendizagem está interligado à formação de conceitos,
envolvendo articulações, rupturas e a superação de obstáculos para a
elaboração do conhecimento, tanto em um plano individual ou social.
Assim sendo, uma experiência cognitiva sempre incorpora um elemento
novo em relação aos conhecimentos anteriores. Por esse motivo, a criati-
vidade e as outras habilidades envolvidas formam uma via de acesso para
uma aprendizagem significativa, compatível com a era da informática.
Essa via não é um espaço exclusivo das ciências e envolve todas as áreas
(PAIS, 2008, pág. 27), proporcionando o que chamamos de interdis-
ciplinaridade, assunto que será abordado mais adiante nessa discussão.

A INTERDISCIPLINARIDADE

O conceito de interdisciplinaridade compreendido neste trabalho


fundamenta-se no conceito sintetizado por Lenoir (1998), basendo-se
em Germain (1991) e Petrie (1992), acreditando que tal conceito tem
seu sentido em um contexto disciplinar, pois a interdisciplinaridade
pressupõe, no mínimo, a existência de duas disciplinas e, também, a
presença de uma ação recíproca. Acreditando, ainda conforme a autora,
que a perspectiva disciplinar não é contrária à perspectiva disciplinar,
e ambas se complementam. Por esse motivo, percebe-se que há uma
ligação entre a interdisciplinaridade e a didática (LENOIR, 1998, p. 46).

26
Estudos em Cas@

A autora faz uma diferenciação entre disciplina científica e dis-


ciplina escolar. A interdisciplinaridade escolar trata especificamente
das “matérias escolares”, e não de disciplinas científicas. E as matérias
escolares são organizadas segundo um dispositivo que, sem ser idên-
tico, é similar ou análogo àquele das disciplinas científicas, mas: suas
finalidades, seus objetos, suas modalidades de aplicação são diferentes
e seus referenciais são diferentes.
No entanto, o que une esses dois tipos de disciplina, a científica e a
escolar, é o fato de que elas compartilham uma lógica científica (LENOIR,
1998, p. 47). Assim, quando falamos sobre interdisciplinaridade, estamos
relacionando-a à noção de disciplina enquanto disciplina escolar.
A interdisciplinaridade está relacionada à competência do pro-
fessor em sala de aula. Ser interdisciplinar é uma exigência intrínseca e
não uma circunstância aleatória. Ou seja, a prática interdisciplinar do
saber é a face subjetiva da coletividade política dos sujeitos. Em todas as
esferas de sua prática, os homens atuam como sujeitos coletivos. Por isso
mesmo, o saber, como expressão da prática simbolizadora dos homens,
só será considerado autenticamente humano e autenticamente saber
quando esse se efetue interdisciplinarmente (SEVERINO, 1998, p. 40).

UM DESAFIO NA FORMAÇÃO DOCENTE: DA


TEORIA À PRÁTICA

Durante as aulas da disciplina “Tecnologias da Educação”, minis-


trada pela profa. Cristiane Tavares, do curso de graduação em Letras
da Faculdade São Luís de França, são abordadas questões teóricas e
práticas sobre o uso da informática na educação. Durante uma dessas
aulas, a professora sugeriu uma atividade, que foi encarada pelos alunos
como um desafio. Tal atividade consistiu em visitar um laboratório de
informática de uma das escolas públicas da rede estadual de ensino para
compreender como ocorre a aprendizagem em um ambiente virtual.
Diante do desafio, os formandos deslocaram-se até um laboratório
de informática de uma escola. E a escola visitada foi o “Colégio Esta-
dual Presidente Costa e Silva”, escola pública localizada em Aracaju/

27
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

SE. O objetivo da visita ao laboratório de informática desta escola foi


vivenciar nas práticas educacionais como se efetiva a inserção da infor-
mática na educação e compreender como se processa a aprendizagem
neste ambiente virtual.
Baseando-se em um questionário foi preciso observar algumas
questões, tais como: quantos computadores existem no laboratório de
informática da escola visitada?
• Estão conectados à internet? E por que meio?
• Quais as disciplinas que utilizam o laboratório de informática?
Quantos alunos por mês utilizam os computadores?
• Quais os softwares utilizados?
• Existe software educacional específico?
• Existe interdisciplinaridade no uso da tecnologia?
• Escolha uma aula para assistir neste laboratório. O que você
percebeu? Como era a reação dos alunos?
• Como se processava a aprendizagem?
• Quais os objetivos da(s) disciplina(s) que utilizam o laboratório?
Com as respostas obtidas e com a experiência vivenciada foi
possível levantar questões cruciais sobre a utilização da informática no
processo de aprendizagem dos conteúdos curriculares da educação, e
assim compreender como o computador pode ser utilizado tanto para
transmitir a informação ao aluno como também cria condições para que
ele construa seu próprio conhecimento, e a importância da interdisci-
plinaridade nesse processo.

SOBRE A ESCOLA VISITADA

A escola visitada foi o “Colégio Estadual Presidente Costa e


Silva”, localizado na Avenida Augusto Franco s/n, no Bairro Getúlio
Vargas, com CEP: 49055-080, situado na cidade de Aracaju/SE, tendo
como diretora responsável, na época da visita, Cristina Maria Campos
Giansante. Em geral, a escola oferece ensino fundamental e médio.

28
Estudos em Cas@

Nesse contexto, foi observado que no laboratório possuía 28


computadores instalados e disponíveis para os alunos. Destes e 1(um)
está com defeito no CPU, 7 (sete) possuem defeito no mouse, e somente
20(vinte) estão em perfeito estado. Todos estão conectados à internet.
Praticamente quase todos os professores, de diversas disciplinas,
utilizam o laboratório de informática para pesquisa com seus alunos. Para
fazer uso do laboratório o professor interessado deve fazer um agenda-
mento com antecedência, devido a grande demanda de solicitações. Ao
analisar uma lista de disciplinas que agendam suas aulas no ambiente
informatizado, foi observado que as disciplinas que fazem uso do setor
com mais frequência são: Literatura, Redação, Biologia, Química,
Artes e Educação Física. As outras, como: Física, Sociologia, História,
Geografia, Filosofia, Português e Cultura Sergipana, utilizam-no com
menos frequência.
Parece que os únicos professores que não requerem o uso do setor
são os da disciplina de Matemática, mas a professora responsável pelo
setor relata que já conversou com os professores da disciplina, sobre a
importância de utilizar o computador como ferramenta de aprendizagem,
e afirma que os docentes já estão elaborando um projeto pedagógico para
incluir a nova tecnologia na grade curricular.
De acordo com o que foi informado pela professora, e ao observar
as listagens de presença assinada pelos alunos da instituição de ensino
que utilizam o laboratório, todos os dias são agendada por turno quatro
aulas, tendo em cada aula aproximadamente 30(trinta) alunos no turno
matinal, 25(vinte e cinco) no turno vespertino e 20(vinte) no horário
noturno, que equivalem a 300(trezentos) alunos por dia. Há ainda
outros que utilizam o laboratório para diversas pesquisas, nos horários
de intervalos, que são aproximadamente 180(cento e oitenta) estudantes
por dias, incluindo os três turnos. Feita estas observações, são 480(qua-
trocentos e oitenta) alunos que utilizam o laboratório por dia e estima-se
que aproximadamente 14 400(quatorze mil e quatrocentos) discentes da
instituição utilizam o laboratório por mês.

29
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Alguns computadores ainda têm o Windows, porém, nos mais


recentes havia sido instalado o Linux. Ressalta que através de softwares
específicos, pode ser estimulado as habilidades específicas do ser humano,
considerando as sete competências intelectuais autônomas apresentada
por Gardner apud. Tajra 2001, e exemplifica que os softwares de textos
“é possível desenvolver diversas atividades que estimulam as atividades
linguísticas, tais como escrita e a leitura, promovendo diferentes tipos de
produção”, outro exemplo são os softwares de simulação e de programação
“que permitem o aprimoramento das habilidades de lógica, matemática
e de resolução de problemas” e ainda cita que “por meio dos softwares,
é possível estimular o desenvolvimento da habilidades pictóricas” pois
esses apresentam vários recursos que facilita a criação de desenho e
representações artísticas. (GARDNER apud. TAJRA 2001, pág. 18-19)
Está sendo implantado o Linux Educacional. Em algumas máqui-
nas já tem o programa, outras ele ainda será instalado, é um software
educativo voltado, principalmente, para escolas. Apresenta o BrOffice,
nele estão instalados o Impress, o Base, Draw, o Calc e o Writer. Vem
com um programa denominado Wine, que permite ao usuário utili-
zar programas que funcionam no Sistema Operacional Windows. No
painel Edukativo há instalado os pacotes educativos do MEC e outros
softwares educacionais.
As obras do MEC compreendem os hinos, as obras literárias e os
vídeos da TV Escola. Observa-se abaixo, os programas educativos do
Linux educacional, quais sejam: Linguagem Logo; Tabela periódica dos
elementos; Planetário Virtual; Treinamento em Geografia; Aprender
Alfabeto; Estudo das Formas Verbais do Espanhol; Revisor de latim;
Tutor de Digitação; Desenho de funções matemáticas; Exercício com
frações; Exercícios de porcentagens; Geometria Interativa (Klg); Editor
de Testes e exames; Jogo Simon Diz; Treinador de vocabulário.

30
Estudos em Cas@

SOBRE A INTERDISCIPLINARIDADE NA
INSERÇÃO DA INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO

A informática estimula a interdisciplinaridade. Por esse motivo


e tão importante utilizá-la na construção do conhecimento dos alunos.
Ela pode ocorrer, quando inserindo a informática na educação e inte-
ragindo com outras disciplinas, como foi percebido durante a visita ao
laboratório de informática da escola pública.
Nessa visita, alguns professores de disciplinas diferentes traba-
lham juntos, com a mesma turma no laboratório de Informática, a fim
de tratar do mesmo tema. Conforme relata uma professora de língua
Portuguesa e Redação, muitas vezes já houve interdisciplinaridade em
suas aulas, e cita como exemplo uma aula de Redação que foi ministrada
concomitantemente com uma professora de Biologia, sobre os Alimentos
Transgênicos, no laboratório de informática. Durante essa aula, conta
a professora, que os alunos pesquisaram sobre o assunto na internet e
em seguida fizeram uma dissertação sobre o tema.
A professora relata ainda que foram três disciplinas que se tra-
balharam o mesmo assunto (alimentos transgênicos): Informática, pois
os alunos aprendem a utilizar o computador; Biologia, pois aprendem
pesquisando o assunto na internet; Redação, pois é proposto que a partir
de tudo que pesquisaram eles façam uma dissertação.
Ainda durante a visita ao laboratório, uma das aulas assistidas foi
a de Educação Física, ministrada pelo Professor Sérgio com uma turma
do 1°ano do ensino médio, onde ele instruiu os alunos a pesquisar no site
do Google(www.google.com.br) sobre o tema Calorias. Foi observado
que o método que utilizado pelo docente é adotado por quase todos os
professores da instituição, onde ele instrui o aluno na pesquisa, orien-
tando a visitar vários sites sobre o tema, em seguida fazendo anotações no
caderno, e no fim da aula o professor vista o caderno de todos. Ou seja,
observa-se que naquela época o as atividades ocorriam na escola, com
a atuação presente do professor em corpo físico, e, naquele momento, o
professor passou uma pesquisa, mas essa foi feita na escola, na sala de
informática, evitando que os alunos a fizessem em casa eu em lan houses.
31
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

No contexto de ensino considerado normal, quando o ambiente


de ensino aprendizagem ocorre de forma presencial, na instituição de
ensino, enfatiza-se a importância em ter um laboratório de informática
na escola e principalmente em haver professores capacitados e treinados
para orientar o aluno na utilização dos recursos informatizados. Pois
nesse processo, os professores, que utilizam o laboratório de informática,
majoritariamente, objetivam proporcionar aos alunos a vivência com
o mundo tecnológico, que está se expandindo a cada dia, e ao mesmo
tempo trabalhar os assuntos das disciplinas curriculares. Essa interdis-
ciplinaridade entre a informática e a(s) disciplina(s) conduz o discente
a um conhecimento mais amplo, como cita a professora da instituição
Ângela Maria (professora de Língua portuguesa e Redação), que utilizava
o laboratório com o objetivo de “proporcionar aos alunos acessibilidade
às novas tecnologias, buscando através de pesquisa a ampliação dos
conhecimentos”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se que a inclusão da informática na escola é de funda-


mental importância para conduzir o aluno na busca pelo conhecimento,
considerando o avanço e a ampliação dos recursos tecnológicos na con-
temporaneidade. Nesse contexto, o papel do professor torna-se indispen-
sável, pois este é o orientador que deverá conduzir o aluno. Para tanto,
o docente precisa estar capacitado para utilizar a informática atrelada
a objetivos específicos e de forma a favorecer a interdisciplinaridade.
Na visita ao laboratório de informática da escola pública, foi
constatado que o computador utilizado como ferramenta de ensino
– aprendizagem, proporciona um conhecimento interdisciplinar, con-
textualizado com a vivência de uma experiência, pois o computador
produz curiosidade nos alunos, que diante da tecnologia, sentem-se
motivados a buscar conhecimento, contribuindo assim para a construção
do próprio saber.

32
Estudos em Cas@

REFERÊNCIAS
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Paulo: Editora Cortez, 4. ed., 2009.

FAZENDA, Ivani. Interdisciplinaridade-Transdisciplinaridade: visões culturais e epis-


temológicas. In. FAZENDA, Ivani (org.). O Que é interdisciplinaridade? São Paulo:
Cortez, 2008, p. 17-29.

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sores e estabelece novos paradigmas para o ensino e a aprendizagem. Educação, ano 10,
n.117, p. 18-21, jan. 2007.

PAIS, luiz Carlos. Educação escolar e as tecnologias da Informática. 1. Ed., 2. Reimp.


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-SE,26 maio 2010.

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o saber como intencionalização da prática. In. Fazenda, Ivani CA. Didática e interdis-
ciplinaridade. Campinas, SP: Papirus, 1998, p. 31-45.

TAJRA, Sanmy Feitosa. Informática na Educação: novas ferramentas pedagógicas para


o professor na atualidade. 3.ed.rev.,atual. E ampl. São Paulo: Érica, 2001.

VALENTE, José Armando. Informática na Educação no Brasil. In. VALENTE, José


Armando. O computador na sociedade do conhecimento. Campinas, SP: UNICAMP/
NIED, 1999.

NOTA: Este trabalho, com ajustes no título, foi publicado nos Anais do VIII Colóquio
Internacional Educação e Contemporaneidade.

33
CAPÍTULO 3 -ENSINO REMOTO
EMERGENCIAL E O ATUAL CENÁRIO
EDUCACIONAL BRASILEIRO

Leonardo Rodrigo Soares12

O ENSINO REMOTO EMERGENCIAL

A etimologia da palavra remoto deriva do latim remotus e significa


afastado, longínquo, distanciado, longe no tempo ou no espaço. Já a
palavra emergencial, significa situação crítica e imprevista, algo urgente,
inadiável, improrrogável. Então, a partir dessas definições encontradas
em dicionários on-line, podemos buscar uma definição, ainda que mais
superficial, para o Ensino Remoto Emergencial (ERE). Ele pode ser
definido como uma forma de ensino de caráter urgente, que não pode
ser adiado e que pode ser realizado em qualquer lugar, por meio do uso
de tecnologias digitais (computador, smartphone, tablet, notebook), exceto
no espaço físico da escola.
Portanto, é preciso salientar que o ensino remoto é uma modalidade
educacional que já existe desde o final do século XIX, “fundamentado
por diferentes estratégias didáticas e meios tecnológicos em distintos con-
textos espaço-temporais”. (SENHORAS, 2021, p. 13) Ainda segundo a
autora, ele “adquiriu papel estratégico para dar continuidade às estratégias
de ensino-aprendizagem por meio de um amplo esforço institucional e
de docentes e estudantes durante a vigência de medidas de isolamento
social diante da pandemia da COVID-19”. (SENHORAS, 2021, p. 13)
Dentro dessa perspectiva, vale salientar que o ERE não pode ser
considerado uma modalidade de ensino, mas sim uma solução tempo-
rária, rápida e acessível, que foi aprovada pelo MEC (Parecer CNE/CP

Doutorando em Estudos Linguísticos (UFMG). Professor do Magistério Superior


12 

(UFT). CV: http://lattes.cnpq.br/5087038970616086


34
Estudos em Cas@

nº 5/2020)13, onde o ensino presencial tem sido aplicado por meio de


ferramentas digitais, tais como: Zoom, Google Meet, Google Classroom,
WhatsApp, mediadas por dispositivos digitais (smartphones, notebooks,
tablets), emergindo “novas-velhas interações pedagógicas”14.
Concomitante a isso, não podemos esquecer que, segundo Ribeiro
(2021), a pandemia ocasionou uma separação da educação e do espaço
escolar, onde fomos obrigados a repensar a educação em espaços fora do
ambiente escolar e reavaliar questões relacionadas a tempo, currículo,
espaço. Neste sentido, os alunos e docentes ficaram impossibilitados de
se socializarem nesse ambiente tão prestigiado e legitimado, a escola, e
tiveram que (re)arquitetar outros espaços, isto é, ambientes virtuais, para
tentarem se proteger do contágio pelo coronavírus e dar continuidade
às atividades escolares. Além do que, no ensino remoto emergencial,
com a nova gestão de tempo, todos os envolvidos no processo de ensino
e aprendizado tiveram que adotar em sua rotina escolar dois termos: o
síncrono e o assíncrono.
O síncrono se refere a algo que acontece simultaneamente, ou
seja, as aulas virtuais acontecem nos mesmos horários do cronograma
das disciplinas presenciais, onde acredita-se que possa haver a interação
aluno-professor e aluno-aluno. Dessa forma, “em atividades síncronas,
as pessoas precisam estar juntas num link, pelas mesmas horas. Não
estão, é certo, no mesmo território, mas precisam estar presentes e em
interação [...]”. (RIBEIRO, 2021, p. 35)
O assíncrono se refere à comunicação atemporal, isto é, os alunos
gerenciam o seu tempo e decidem o horário que vão acessar o material
disponibilizado para estudo e realizar as atividades propostas, porém
respeitando o cronograma definido pelo professor. Além disso, “podem
produzir em tempos diferidos, desde que tenham informações essenciais

13 
Fo nt e : ht t p s : //p e s q u i s a . i n . g o v. b r / i m p r e n s a / j s p / v i s u a l i z a / i n d e x .
jsp?data=01/06/2020&jornal=515&pagina=3
14 
Termo utilizado por Mendonça (2021) em seu artigo intitulado: Aula de língua(s)
no ensino emergencial remoto: práticas e percepções iniciais de professores. Disponível
em: https://pedroejoaoeditores.com.br/site/docencia-pandemica-praticas-de-professo-
res-de-linguas-no- ensino-emergencial-remoto/.
35
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

para que tudo funcione bem: instruções claras, prazos estipulados, horário
e esquema de entrega”. (RIBEIRO, 2021, p. 35-36).
A noção de síncrono e assíncrono foi bem relembrado por Ribeiro
(2021), quando ela afirma que esses termos já eram conhecidos no meio
acadêmico e que muitos professores já os utilizavam na modalidade
presencial quando tinham que administrar o tempo em relação às ati-
vidades escolares, ou seja, atividades a serem desenvolvidas no espaço
escolar ou em sala de aula e fora dele (“deveres de casa”).
O tópico a seguir traz um panorama do atual cenário educa-
cional brasileiro e suas respectivas legislações sobre o Ensino Remoto
Emergencial.

O ATUAL CENÁRIO EDUCACIONAL BRASILEIRO


NA PANDEMIA

Em dezembro de 2019, a população mundial foi notificada com


a presença de um vírus, chamado novo coronavírus ( S A R S -
-COV-2), que foi identificado, primeiramente, em Wuhan, na China
e, posteriormente, se espalhou para todo o mundo. Dessa forma, desde
que chegou ao Brasil, ele tem se espalhado de forma muito rápida e
impactado o cenário educacional brasileiro.
Em Minas Gerais, cabe salientar que, em 15 de março de 2020,
com a disseminação da COVID-19, as aulas presenciais em escolas
da rede estadual foram suspensas pelo governador de Minas Gerais,
Romeu Zema, que publicou um decreto determinando o trabalho remoto
emergencial dos servidores públicos, entre eles, os professores da rede
estadual. Assim, o Comitê Extraordinário da COVID-19, suspendeu
as aulas presenciais da rede estadual, inicialmente, de 18 a 22 de março,
e posteriormente estendido sem previsão de retorno, sob recomendação
do comitê da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES/
MG). Nessa época, o Brasil já registrava 4.683 casos de Covid-19 em
todo o país, com 167 óbitos.15 Enquanto isso, no cenário educacional,

15 
Dados obtidos no site: https://www.gov.br/inep/pt-br/assuntos/noticias/institucional/
estatisticas-revelam-os- impactos-da-pandemia-na-educacao.
36
Estudos em Cas@

segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais


Anísio Teixeira (INEP), em julho de 2021, divulgou os resultados da
pesquisa intitulada “Resposta Educacional à Pandemia de COVID-19
no Brasil”, que foi realizada no período entre fevereiro e maio de 2021,
durante a 2ª etapa do Censo Escolar 2020, por meio de um questionário
suplementar no Sistema Educacenso. A pesquisa foi respondida pelo
gestor(a) da escola cadastrada nesse sistema.
Essa investigação levantou informações de como os estudantes, as
escolas e as redes de ensino reagiram aos desafios impostos pela pandemia
no ano letivo de 2020, no que tange ao calendário escolar e à adoção
de medidas pedagógicas e sanitárias. Cabe destacar que 94% (168.739)
das escolas participaram da pesquisa, correspondendo 97,2% (134.606)
às escolas da rede pública e 83,2% (34.133) às da rede privada. Diante
desses dados, observou-se que 99,3% das escolas no Brasil suspenderam
suas atividades presenciais devido à pandemia5. Ainda segundo os dados,
88,1% das escolas brasileiras adotaram estratégias de ensino remoto no
ano letivo de 2020, sendo 98,4% a nível federal; 97,5% municipal; 85,9%
estadual; e 70,9% privada.
Em relação às estratégias adotadas pela escola/secretaria de edu-
cação junto aos professores a fim de se dar continuidade às atividades de
ensino e aprendizagem, em 202016, o censo escolar mostrou que 97,1%
das escolas estaduais e 85,8% das escolas municipais realizaram reuniões
virtuais de planejamento, coordenação e monitoramento das atividades;
92,6% e 89,9% reorganizaram/adaptaram o planejamento/plano de aula
com priorização de habilidades e conteúdo específicos; 79,9% e 53,7%
fizeram treinamento para o uso de métodos/materiais dos programas de
ensino não presencial; 43,4% e 19,7% disponibilizaram equipamentos para
os professores (computador, notebook, tablets, smartphones etc.); e 15,9%
e 2,2% tiveram acesso gratuito ou subsidiado à internet em domicílio.
Já em 18 de março de 2020, as redes de ensino retornaram às
aulas, por meio de uma publicação no Diário Oficial do Estado no dia
17 de março, adotando o regime de estudo não presencial, ou seja, o

16 
Fonte: https://bityli.com/Zos4G8 (INEP/Censo Escolar 2020)
37
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

ERE, implementado pela Secretaria de Estado de Educação de Minas


Gerais (SEE/MG), de forma improvisada e com elaboração de materiais
às pressas a fim de que os alunos pudessem estudar em casa e assim
garantir o seu direito público de estudar. De acordo com o Censo Esco-
lar 2020, foram adotadas no ERE, nas escolas estaduais e municipais
respectivamente, as seguintes estratégias e ferramentas a nível nacio-
nal: disponibilização de materiais de ensino-aprendizagem impressos
(livros didáticos impressos, apostilas, atividades em folha etc.) para
retirada na escola pelos alunos ou responsáveis e/ou entrega em domicílio
(95,3%/94,1%); disponibilização de materiais de ensino aprendizagem
na internet (vídeos, podcasts, publicações em redes sociais, plataformas
virtuais, aplicativos para celular (88,2%/ 74,2%); realização de avaliações
e testes, remotamente, pela internet ou com envio/devolução de material
físico (85%/ 58,6%); atendimento virtual ou presencial escalonado com
os alunos, seus pais ou responsáveis (77,2%/55,3%); suporte aos alunos,
seus pais ou responsáveis para a elaboração e o desenvolvimento de pla-
nos de estudos/estudos dirigidos (68,8%/50,3%); realização de aulas ao
vivo (síncronas) mediadas pela internet e com possibilidade de interação
direta entre os alunos e o professor (63,3%/27,4); disponibilização de
aulas previamente gravadas (assíncronas) pela internet (61,3%)/48%;
transmissão de aulas ao vivo (síncronas) pela internet (54,4%/18,4%);
treinamento junto aos pais e alunos para uso de métodos/materiais dos
programas de ensino não presencial (43,8%/18,1%); transmissão de
aulas previamente gravadas (assíncronas) por TV ou rádio (31,9%/9,4%);
transmissão de aulas ao vivo (síncronas) por TV ou rádio (24,5%/4,1%).
Ainda segundo o Censo 2020, as escolas estaduais e municipais
utilizaram diferentes ferramentas digitais com o propósito de promove-
rem a interação entre alunos e professores e garantir o desenvolvimento
das atividades de ensino e aprendizagem: aplicativos ou ferramentas
para realização de videoconferências (WhatsApp, Zoom, Youtube etc.)
(90,1%/84,3%); Google Classroom (73,5%/24%); plataforma desenvolvida
especificamente para a secretaria de educação municipal ou estadual ou
para a escola (55,6%/23,9%); Microsoft Teams for Education (25,8%/5,4%);
Blackboard Learn/Blackboard Unite (1,5%/0,2%).
38
Estudos em Cas@

No dia 9 de abril de 2020, o Comitê Extraordinário da COVID-


19 determinou o retorno às atividades para os diretores, vice-diretores,
assistentes técnicos da educação, analistas e auxiliares da educação básica.
Essa resolução de retorno, de número 4.310, foi publicada apenas no dia
18 de abril de 2020, excluindo os servidores com mais de 60 anos e do
grupo de risco. O quadro a seguir apresenta um resumo dos decretos e
deliberações no Sistema Estadual de Educação de Minas Gerais.
Quadro 1- Decretos e Deliberações no Sistema
Estadual de Educação de Minas Gerais
DECRETO/
INFORMAÇÕES
DELIBERAÇÃO
Foi declarada emergência em Saúde Pública no Estado
Decreto NE n° 113 – 12 de março de Minas Gerais em razão da Covid-19 e criadas medidas
de 2020 para seu enfrentamento, previstas na Lei Federal nº 13.979,
de 6 de fevereiro de 2020.

Dispõe sobre medidas de prevenção ao contágio pelo


Coronavírus e de enfrentamento e contingenciamento,
onde as empresas controladas direta ou indiretamente
pelo Estado poderão aderir ao disposto neste decreto.
Decreto n° 47.886 – 15 de
março de 2020
É instituído o Comitê Gestor do Plano de Prevenção e
Contingenciamento em Saúde do COVID-19 a fim de
acompanhar a evolução do vírus e adotar e fixar medidas
de saúde pública necessárias.
Deliberação do Comitê Dispõe sobre a suspensão das aulas nos estabelecimentos
Extraordinário COVID-19 n° 1 – 15 de ensino da rede pública estadual no período de 18 a 22
de março de 2020 de março de 2020.
Dispõe sobre o regime especial de teletrabalho como
medida temporária de prevenção, enfrentamento e
Deliberação do Comitê
contingenciamento do COVID-19, onde o servidor
Extraordinário COVID-19 n° 2 –
público executará parte ou a totalidade de suas atribui-
16 de março de 2020
ções fora das
dependências físicas do seu trabalho.
Institui o regime especial de teletrabalho para os seguintes
D e l i b e r a ç ã o d o C o m i t ê servidores públicos: possuir idade igual ou superior a
Extraordinário COVID-19 n° 4 – sessenta anos; portar doença crônica (diabetes,
17 de março de 2020 hipertensão, cardiopatias, doença respiratória, pacientes
oncológicos e imunossuprimidos; gestante ou lactante.

39
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Determina ponto facultativo no âmbito da Cidade


Deliberação do Comitê
Administrativa Presidente Tancredo de Almeida Neves,
Extraordinário COVID-19 n° 5 –
entre os dias 18 e 20 de março de 2020, em razão da
17 de março de 2020
grande aglomeração de pessoas em suas instalações.

Dispõe sobre a suspensão das atividades educacionais,


por tempo indeterminado, as atividades de educação
Deliberação do Comitê
escolar básica na rede estadual de ensino; as atividades de
Extraordinário COVID-19 n° 15
educação superior que integram a administração pública
– 20 de março de 2020
estadual; e a suspensão também se estende às instituições
privadas de ensino e às redes de ensino municipais.

Dispõe sobre medidas emergenciais de restrição e aces-


D e l i b e r a ç ã o d o C o m i t ê sibilidade a determinados serviços e bens públicos e pri-
Extraordinário COVID-19 n° 17 vados cotidianos, enquanto durar o estado de
– 22 de março de 2020 calamidade pública decorrente da pandemia COVID-19
em todo o território do Estado de Minas Gerais.
Dispõe sobre o regime de teletrabalho no âmbito do
Sistema Estadual de Educação, enquanto durar o estado
de calamidade pública em decorrência da COVID-19, em
todo o território do Estado. Dessa forma, a partir de 14
Deliberação do Comitê
de abril de 2020 fica determinado o retorno às atividades
Extraordinário COVID-19 n° 26
para os seguintes servidores: Diretor e Secretário de
– 8 de abril de 2020
Escola; Vice-Diretor e Coordenador de Escola; Assistente
Técnico de Educação Básica; Auxiliares de Serviços; e
Inspetor
Escolar.

Fonte: adaptado do site https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/legislacoes-publicacoes

Com a retomada das atividades presenciais, foi elaborado um


documento intitulado Orientações Pedagógicas para as Escolas Esta-
duais Mineiras, com data de 21 de junho 2021, que trata da reabertura
das escolas conforme o modelo de “Ensino Híbrido” e as premissas para
tal reabertura. Por outro lado, os discentes e seus pais podem optar em
não retornar às atividades presenciais, de forma escalonada, e continuar
estudando em casa de forma remota, pois “as únicas formas válidas de
computar a carga horária obrigatória permanecem sendo os PETs e
as atividades complementares”, tanto para os alunos que optarem pelo
ensino presencial quanto para os alunos do ensino remoto. (ORIEN-

40
Estudos em Cas@

TAÇÕES PEDAGÓGICAS PARA A RETOMADA DAS AULAS


PRESENCIAIS, 2021, p. 9)
Contudo, deverão fazer uma declaração de autorização de retorno,
escrita a próprio punho ou impressa, conforme modelo disponibilizado
no site do estude em casa; e entregar antecipadamente ou no 1° dia do
retorno do estudante às aulas presenciais, que será arquivada posterior-
mente na pasta individual do discente. Se a prefeitura de determinado
município não autorizar a abertura das escolas, elas não poderão ser
reabertas.
Esse novo planejamento das aulas foi denominado como “Ensino
Híbrido”, na tentativa de buscar um alinhamento entre as atividades
remotas e as presenciais. Para isso, no presencial, as atividades pedagógicas
buscarão fortalecer o processo de aprendizagem dos alunos juntamente
com suas necessidades e demandas; já no remoto, os alunos utilizarão os
PETs e as atividades complementares como apoio. De qualquer modo,
os PETs também serão utilizados no presencial e as aulas presenciais
acontecerão de forma alternada, isto é, em uma semana elas aconte-
cerão nas escolas e na outra remotamente, onde os alunos utilizarão o
aplicativo Conexão Escola, as aulas do Se Liga na Educação e outros
materiais já supracitados.
Segundo o protocolo sanitário da Secretaria de Estado de Saúde
(SEE), n° 4.506, de 26 de fevereiro de 2021, artigo 6°, O ensino híbrido
será iniciado por meio de aulas optativas para os estudantes, organizadas
conforme os seguintes critérios:
I) a escola permanecerá aberta para atendimento aos
estudantes durante uma semana e permanecerá fechada
para atendimento aos estudantes na semana seguinte,
observando a constante alternância entre as semanas
de abertura e fechamento;
II) a presença nas aulas optativas não será considerada
no cômputo da carga horária obrigatória;
III) o retorno será facultativo aos estudantes que assim
o desejarem;

41
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

IV) estudantes do grupo de risco, definidos conforme


critérios estabelecidos pela Secretaria de Estado de
Saúde, permanecerão realizando apenas atividades
não presenciais;
V) cada escola deverá organizar o atendimento às tur-
mas observando-se o distanciamento previsto pelo
protocolo sanitário da Secretaria de Estado de Saúde
de Minas Gerais, devendo o Gestor Escolar organi-
zar revezamento dos estudantes de maneira que cada
grupo possa participar do mesmo número de aulas por
componente curricular. (ORIENTAÇÕES PEDA-
GÓGICAS PARA A RETOMADA DAS AULAS
PRESENCIAIS, 2021, p. 4-5)
Além dos critérios mencionados acima, os alunos com deficiên-
cia poderão retomar às suas atividades normalmente, caso queiram. Se
optarem pelo não retorno, será necessário que os profissionais do Aten-
dimento Educacional Especializado façam adaptações das atividades e
dos materiais, bem como os atendimentos educacionais especializados.
Além do que, se os discentes em geral e servidores tiverem qualquer
sintoma gripal ou de doença infecciosa viral respiratória e compatível
com os do COVID-19 ou contato com outras pessoas nessa situação,
deverão comunicar ao gestor escolar e não comparecerem à escola.
O gestor escolar ficará responsável em elaborar o cronograma das
aulas, respeitando o escalonamento, com todas as informações sobre:
dias; horários; orientações sobre a participação dos alunos nas ativida-
des presenciais e remotas (por exemplo, tempo diário de dedicação às
atividades propostas); data limite de entrega e escala de recebimento dos
PETs e atividades complementares.
Em relação ao trabalho docente, esses profissionais deverão seguir
as seguintes orientações17:

17 
Adaptado das orientações pedagógicas para a retomada das aulas presenciais, 2021,
p. 11-12. Site: encurtador.com.br/nzQST.
42
Estudos em Cas@

a) Professores cujos anos de escolaridade já retornaram às


atividades presenciais
-Nas semanas 1 e 3: o professor deverá estar na escola durante todo
o seu horário de trabalho; não precisará atender às questões enviadas
pelo aplicativo; deverá trabalhar as habilidades essenciais presentes nos
PETs e necessárias para o aprendizado efetivo do aluno;
-Nas semanas 2 e 4: o professor deverá trabalhar apenas no ensino
remoto; retomar o atendimento por meio do aplicativo Conexão Escola;
corrigir os PETs, atividades complementares e/ou outras atividades ine-
rentes ao ensino remoto em consonância com o Memorando-Circular
nº 34/2020/SEE/SG;
-Para os dias que estiverem presencialmente na escola: os profes-
sores deverão planejar as aulas em acordo com os PETs, possibilitando
a consolidação das atividades realizadas pelos estudantes no Regime
Especial de Atividades Não Presenciais (REANP).
b) Professores cujos anos de escolaridade já retornaram às
atividadespresenciais e os que estão em atividade não presencial
-Nas semanas 1 e 3: o professor deverá estar na escola durante
todo o seu horário de trabalho; não deverá prestar nenhum suporte aos
alunos do ensino remoto; nos horários em que não estiver lecionando
presencialmente, deverá ficar disponível para atendimento por meio
do aplicativo Conexão Escola; deverá corrigir os PETs, as atividades
complementares e/ou outras atividades inerentes ao ensino remoto em
consonância com o Memorando-Circular nº 34/2020/SEE/SG;
-Nas semanas 2 e 4: o professor deverá trabalhar apenas no ensino
remoto, retomando o atendimento por meio do aplicativo Conexão
Escola; fazer a correção dos PETs, das atividades complementares e
outras atividades inerentes ao ensino remoto em consonância com o
Memorando-Circular nº 34/2020/SEE/SG;
-Para os dias que estiverem presencialmente na escola: os profes-
sores deverão planejar as aulas em acordo com os PETs, possibilitando
a consolidação das atividades realizadas pelos estudantes no Regime de
Estudos não Presenciais (REANP).
43
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

c) Professores que atuam no Atendimento Educacional Espe-


cializado (AEE): Professor de Apoio à Comunicação, Linguagem
e Tecnologia Assistivas (ACLTA), Professor da Sala de Recursos,
Tradutor Intérprete de Libras (TILS), Guia-Intérprete (GI)
-Se retornarem ao presencial, os atendimentos educacionais espe-
cializados na forma de apoio deverão ser ofertados no momento da
escolarização para acesso do estudante ao currículo;
-Também deverá ser ofertado, no contraturno da escolarização,
o atendimento complementar em sala de recursos;
-Nas semanas 1 e 3: o professor que atua no atendimento educa-
cional especializado deverá estar na escola de acordo com o seu horário
de trabalho; se não comparecer nenhum aluno da educação especial,
ele deverá oferecer suporte na adaptação dos PETs e das Atividades
Complementares dos alunos da educação especial;
-Nas semanas 2 e 4: o professor que atua no atendimento educa-
cional especializado deverá trabalhar apenas no ensino remoto, na ade-
quação das atividades e dos materiais dos alunos da educação especial, de
acordo com o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI); o professor
que atua na sala de recursos deverá também organizar cronograma de
atendimento, no contraturno da escolarização do estudante, caso seja
opção do responsável o atendimento remoto.
Quanto às atividades avaliativas formais no ano de 2021, elas
serão organizadas ao longo de cada bimestre e realizadas remotamente,
porém os estudantes que não conseguirem realizá-las dessa maneira,
poderá fazê-la presencialmente, na escola.
A resolução da SEE mencionada anteriormente seguirá as orien-
tações do Comitê Extraordinário COVID-19 para a reabertura das
escolas, incialmente para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental (1°
ao 5° ano), seguindo as etapas abaixo:
I. Convocação e Acolhimento das Equipes Escolares.
II. Divulgação remota, pela gestão escolar, das orien-
tações/planejamento para retomada das atividades
presenciais do Ensino Híbrido à comunidade escolar.

44
Estudos em Cas@

III. Retorno gradual dos estudantes das Escolas Esta-


duais de Educação Básica de Minas Gerais. (ORIEN-
TAÇÕES PEDAGÓGICAS PARA A RETOMADA
DAS AULAS PRESENCIAIS, 2021, p. 6)
É importante salientar que a possibilidade de retorno dos demais
anos às escolas será avaliada pela SEE/MG, de forma periódica, res-
peitando a evolução dos indicadores de saúde pública e orientações da
Secretaria de Estado de Saúde (SES). Além do que, se a demanda de
alunos dos Anos Iniciais do Fundamental favoráveis ao retorno presen-
cial for superior, o gestor escolar poderá dividir a turma e se necessário,
contratar profissionais para lecionar. Para isso, é também necessário
que haja espaço disponível na escola para efetuar as divisões de turmas.
Então, para o retorno das aulas presenciais, foram elaborados os seguintes
documentos orientadores18:
1. Protocolo sanitário de retorno às atividades escolares presen-
ciais no contexto da pandemia da COVID-19: Orientações
sobre o Protocolo sanitário de retorno às atividades escolares
presenciais no contexto da pandemia; condições gerais e
ações de promoção à saúde e prevenção para reabertura das
escolas; informações sobre medidas sanitárias; orientações
sobre prevenção à Transmissão da COVID-19; identificação
de casos suspeitos, surtos e suspensão das aulas; metragem de
referência para organização das atividades escolares; orien-
tação para gestores, professores e funcionários; organização
do ambiente escolar; organização da sala de aula; orientações
para pais, responsáveis e estudantes; orientação para educação
especial; cuidados com a saúde mental; Programa Saúde na
Escola; orientações de limpeza, higienização e preparo dos
alimentos; orientações para Transporte Escolar.
2. Protocolo sanitário de retorno às atividades escolares presen-
ciais no contexto da pandemia da COVID-19 (4ª versão): Pro-
grama Saúde na Escola (PSE): articulação entre instituições
de ensino e a atenção primária à saúde; covid-19 em crianças
18 
Site: https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/retomada-atividades
45
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

e adolescentes; covid-19 e estratégias gerais para prevenir e


reduzir; transmissão nas instituições de ensino; vacinação de
adolescentes em Minas Gerais; variante delta; organização
dos espaços e objetos das instituições de ensino (em todos os
espaços da instituição de ensino, salas de aulas, bibliotecas,
brinquedotecas e objetos de uso coletivo, fraldário e berçários,
sanitários, refeitórios e cantinas, bebedouros de água); orientações para
atividades presenciais nas instituições de ensino de minas gerais; orien-
tações para a comunidade escolar; orientações para educação especial;
orientações sobre transporte escolar; ProgramaSaúde na Escola (PSE)
no contexto da pandemia de covid-19; identificação decasos suspeitos,
surtos e suspensão das aulas; fluxo de informações de casos confirmados,
suspeitos e contatos de covid-19 nas unidades educacionais;investigação
do vínculo epidemiológico pelo sistema de saúde municipal.
1. Guia prático de acolhimento: para além do Reanp, nos modelos
híbridos e presenciais: O que entendemos por acolhimento
(escrita ativa, cuidado e equidade); preparando a escola para
receber a comunidade escolar; composição da equipe de aco-
lhimento; rede de proteção social e grupos de apoio; acolhi-
mento (dos professores e demais servidores, das famílias, dos
estudantes).
2. Protocolo sanitário de retorno às atividades escolares presen-
ciais no contexto da pandemia da COVID-19 – auxiliar de
serviços de educação básica: preparação para a reabertura;
orientações quanto ao uso de EPIs; orientações de higieni-
zação e desinfecção de áreas, bancadas e pisos; orientações
de higienização e desinfecção de banheiros; manuseio e pre-
paração de alimentos.
3. Cartilha de saúde mental e atenção psicossocial frente à pan-
demia do coronavírus no âmbito escolar: orientações para a
comunidade escolar em geral; orientações para os estudantes;
orientações para os pais e responsáveis.

46
Estudos em Cas@

4. Cartilha para o Grupo de Trabalho Intersetorial (GTI-M)


no contexto da pandemia de COVID-19: busca a prática
cotidiana da intersetorialidade nos campos da gestão, do
planejamento, dos compromissos dos setores envolvidos e da
abordagem nos territórios onde se encontram as instituições
de ensino e as equipes de APS.
5. Retomada de atividades presenciais – resolução SEE n° 4.506
(26 de fevereiro de 2021): institui o ensino híbrido como
modelo educacional para o ciclo dos anos letivos de 2020
-2021 e revoga dispositivos da Resolução SEE no 4.310, de
17 de abril de 2020 e da Resolução SEE no 4.329, de 15 de
maio de 2020.
Portanto, os documentos orientadores foram elaborados com o
objetivo de instituir diretrizes para a retomada das atividades escolares
presenciais no Estado de Minas Gerais, que deverão ser seguidas pelos
municípios e pelas instituições escolares da rede pública estadual.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No Brasil, as adaptações ao mundo digital na rede pública e


privada, que têm acontecido desde o início da pandemia, em março
de 2020, tem sido um grande desafio aos educadores, que além de não
terem a formação adequada para o trabalho remoto e nem treinamento
prévio, tiveram que lidar com uma certa imprevisibilidade e (re)apren-
der a ensinar de novas maneiras. Diante desse novo cenário, docentes e
discentes tiveram que se adaptarem rapidamente a esse novo contexto
digitalizado de ensino-aprendizagem, que requer organização, dedicação
e planejamento. Neste sentido, o ambiente de ensino-aprendizagem
via web tem se tornado cada vez mais uma realidade e tem exigido dos
educadores o desenvolvimento e apropriação de novas habilidades para
o desenvolvimento pessoal e inserção nesse novo contexto digital.
É importante destacar que a pandemia da Covid-19 vem trazendo
grandes desafios para a Educação no Brasil e nota-se que a revolução
provocada pelo uso das tecnologias digitais impactou, e tem impactado,

47
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

os modos de aprender como também a maneira pela qual os docentes


e discentes interagem e intercambiam conhecimentos. Neste sentido, é
importante frisar que o ensino remoto pode dar uma importante solução
emergencial, porém tem limitações e não atende a todos os alunos da
mesma forma. Assim, essa pesquisa teve como objetivo fazer uma docu-
mentação sobre o Ensino Remoto Emergencial no que tange a decretos
e deliberações no Sistema Estadual de Educação de Minas Gerais, além
das medidas pedagógicas e sanitárias adotadas.

REFERÊNCIAS
Orientações pedagógicas para a retomada das aulas presenciais, 2021. Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1oUSUeIQxSCPT8ififOCNv8REVgXw4Fc0/view.
Acesso em: 13 out. 2021.

SENHORAS, E. M. (Org.). Ensino Remoto e a Pandemia de COVID-19. Boa Vista:


Editora Iole, 2021.

RIBEIRO, A. E. Frestas e fissuras na relação educação, escola e TDIC. In: MEN-


DONÇA, M.; ANDREATTA, E.; SCHLUDE, V. (Orgs.). Docência pandêmica:
práticas de professores de língua(s) no ensino emergencial remoto. São Carlos: Pedro
& João Editores, 2021, p. 26-39.

48
CAPÍTULO 4 -AS DEMANDAS DO
PROFESSOR DURANTE A PANDEMIA DA
COVID-19: CONSIDERAÇÕES ACERCA DO
TRABALHO REMOTO

Alessandra Ribeiro Queiroz19


Brenda Mourão Pricinoti 20
João Vítor Sampaio de Moura 21
Lucélia Cristina Brant Mariz Sá 22
Stefanne Almeida Teixeira 23

INTRODUÇÃO

Nos últimos meses do ano de 2019 e início de 2020, o mundo se


viu em uma situação pandêmica crítica e assustadora gerada por uma
doença infecciosa causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), a
COVID-19. O vírus tem como principais sintomas febre, cansaço e tosse
seca. Algumas pessoas são infectadas, mas apresentam apenas sintomas
muito leves, outras ficam gravemente doentes e desenvolvem dificuldade
de respirar, podendo levar à morte (OPAS, 2021). Dessa forma, com a
pandemia da COVID-19 chegando ao Brasil, a sociedade foi afetada
em todas as áreas, especialmente a saúde, a economia e a educação. Algo
que iniciou com a perspectiva de ser passageiro, perdurou ao longo de
2020 e de 2021, sendo que ainda permanecemos desbravando estratégias
para conter o vírus e superar a pandemia do novo coronavírus.

19 
Mestranda em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/3630538635188160
20 
Mestranda em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/1727697477231852
21 
Mestrando em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/4179011639506808
22 
Doutoranda em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/1482111292177695
23 
Mestranda em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/4389832049522456
49
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Nesta pesquisa, daremos foco ao campo educacional, a fim de


refletir sobre as mudanças provocadas no cotidiano escolar, bem como a
complexidade das demandas dos professores surgidas durante o período
da pandemia. Nesse período, vivenciamos um cenário de isolamento
social, como medida de contingenciamento do vírus. Com o desloca-
mento limitado das pessoas, o recurso utilizado para a continuidade do
processo educacional foi o ensino remoto. Para Mendes e Oliveira (2000),
o momento de isolamento social, trouxe um dos maio-
res desafios enfrentados pela sociedade mundial, que
modificou o sistema educacional atual impossibilitando
a realização das aulas presenciais. Neste contexto, os
professores estão buscando novas metodologias e alter-
nativas para que o ensino de continuidade, muitas vezes
reinventando e ressignificando suas práticas frente às
novas demandas tecnológicas (MENDES E OLI-
VEIRA, 2000, p. 1).

O ensino remoto trouxe impactos emocionais e cognitivos para


os estudantes, os educadores e os familiares, expondo as fragilidades
históricas das instituições escolares brasileiras, dando ênfase às desigual-
dades sociais. Nesse sentido, objetivamos refletir sobre as demandas dos
profissionais da educação durante a pandemia e quais estratégias usadas
para reinventar o ensino.
Para atingir o objetivo da pesquisa, utilizamos a análise do dis-
curso para estudar as “relações entre o sujeito, a língua e a história”
(ORLANDI, 2005, p. 11). Assim sendo, ao enunciar, o sujeito revela
mais do que uma língua ou um sistema virtual, mas também uma his-
tória, uma ideologia. Para analisar os discursos pedagógicos no período
da pandemia, ao que tange às demandas dos professores, analisamos
uma charge retirada do site “Contornos - Educação e Pesquisa”24 e uma
reportagem publicada no “Jornal Correio”, com o título “‘Preciso parar

24 
MACHADO, Djeison. As tecnologias digitais e o ensino em tempos de pandemia.
Contornos - Educação e Pesquisa, Florianópolis, 2020. Disponível em: <http://www.
contornospesquisa.org/2020/12/as-tecnologias-digitais-e-o-ensino-em.html>. Acesso
em: 04 nov. 2021.
50
Estudos em Cas@

para vomitar’: professores revelam bastidores de educação a distância”25.


Ambas se constituíram como corpus do nosso trabalho.
Utilizamos a pesquisa qualitativa interpretativa pela sua caracte-
rística que percorre “entre observação, reflexão e interpretação” (GIL,
2002, p. 90) o que faz com que a pesquisa se manifeste de forma mais
complexa. Para o autor, “a análise qualitativa depende de muitos fatores,
tais como a natureza dos dados coletados, a extensão da amostra, os
instrumentos de pesquisa e os pressupostos teóricos que nortearam a
investigação” (GIL, 2002, p. 133). Dessa forma, a pesquisa qualitativa
interpreta os discursos dos sujeitos e analisa as relações produzidas. Para
fundamentar e dar consistência à pesquisa, utilizaremos, como arcabouço
teórico, os estudos de Mendes e Oliveira (2000), Orlandi (2005; 2019),
Pires (2002), dentre outros.
Por fim, dividimos esse capítulo em cinco partes. Na primeira,
que é introdução, justificamos e contextualizamos a escolha do tema da
pesquisa, relacionado com as demandas dos professores durante a pan-
demia. Apresentamos, ainda, os objetivos, a metodologia e o arcabouço
teórico utilizados na pesquisa. Na segunda parte, traremos a seção “A
análise do discurso na linguagem humana” para conceitualizar a teoria
utilizada para análise dos corpora. Na terceira parte, intitulada “A aná-
lise do discurso no gênero discursivo charge”, analisamos os discursos
não verbais imbricados em uma charge criada no período da pandemia.
Na quarta parte discorremos a seção “Educação à distância: demandas
durante o trabalho remoto”, em que analisamos os discursos dos edu-
cadores entrevistados na reportagem de Priscila Natividade, publicada
no Jornal Correio, intitulada “‘Preciso parar para vomitar’: professores
revelam bastidores de educação a distância”. Na quinta e última parte,
“Considerações finais”, apontamos nossas interpretações acerca dos
corpora analisados e conclusões parciais acerca dos assuntos abordados.

25 
NATIVIDADE, Priscila. ‘Preciso parar para vomitar’: professores revelam basti-
dores de educação a distância. Correio. 10 de Julho de 2020. Disponível em: <https://
www.correio24horas.com.br/noticia/nid/preciso-parar-para-vomitar-professores-re-
velam-bastidores-de-educacao-a-distancia/?f bclid=IwAR2kt6rnVlD9f POjjbq5f-
dXKG32Z-dSh5Su4kHk-z6upLCKo_Wa4Ih-iO4o>. Acesso em: 04 Abr. 2021.
51
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Vale salientar que não temos a pretensão de finalizar o assunto ou expor


alternativas para os possíveis problemas, mas contribuir com a análise
dos discursos implícitos e explícitos no trabalho dos educadores.

A ANÁLISE DO DISCURSO NA LINGUAGEM


HUMANA

A fim de conceitualizar a teoria utilizada para análise dos corpora


da pesquisa, faz-se necessário versar sobre a Análise do Discurso (AD),
que é um campo de estudo da área de humanas, especificamente da
Linguística. A AD surgiu por volta dos anos 70 com Michel Pêcheux.
Orlandi (2019) discorre sobre a transformação na ciência da linguagem,
que aconteceu nesta época e ainda relata que o marco do surgimento
da área foi o livro de Pêcheux (1969), intitulado “A Análise do discurso
é possível?”.
No século XX, a preocupação dos linguistas era a de matematizar
a língua, de formalizá-la, deixá-la “palpável, visível, perceptível, por meio
de papéis, documentos e outros procedimentos formais.” (ORLANDI,
2019, p. 140) e, então, analisá-la como uma área objetiva. Apesar de
perceptível, a subjetividade na linguagem era deixada de lado, mencio-
nada, mas ignorada. Por esta razão,
Com suas reflexões, Pêcheux, vai mostrar que esta
forma de considerar a relação língua/fala faz com que a
operação de exclusão da fala, feita por Saussure, mesmo
que ele não tenha querido explicitamente, autoriza
o “reaparecimento triunfal do sujeito falante como
subjetividade em ato, uma unidade ativa de intenções
que se realizam pelos meios postos à sua disposição
(ORLANDI, 2019, p. 145).

Dessarte, a AD passa a estudar o sujeito “esquecido” e, a partir


disso, ele emerge. Tal análise mostra que “a língua é ‘um sistema virtual
que só se atualiza na e pela fala’. Sendo a fala um ‘ato individual’, ele
se opõe ‘ao caráter social’ da língua.” (ORLANDI, 2019, p. 145). A
língua passa então a ser concebida como um fenômeno social ligado ao
sujeito falante.

52
Estudos em Cas@

Orlandi afirma que o discurso é “definido como efeito de sentidos


entre locutores” (ORLANDI, 2019, p. 145). Dessa forma, as formações
imaginárias e a ideologia dos falantes entram em jogo no momento de
enunciação. Esta área analisa, portanto, esse imaginário, o que se deixa
revelar pela fala e o que tenta se esconder. O não-dito também diz muita
coisa. Por isso, “não precisa pensar só a língua (mecanismos formais)
e o discurso (tipo de discurso de acordo com as circunstâncias), mas já
o processo discursivo (paráfrase, metáfora, substituição, formação dis-
cursiva). Algo aí já se articulou.” (ORLANDI, 2019, p. 147). Portanto,
é impossível analisar um discurso como um texto, isto
é, como uma sequência linguística fechada sobre ela
mesma, mas é preciso referi-la ao conjunto de discursos
possíveis a partir de um estado definido das condi-
ções de produção”. Além, claro, de levar em conta as
posições-sujeito – constituídas pela projeção, através
de formações imaginárias, da situação, do lugar do
sujeito, no discurso – observando sempre as relações
de força, as de sentido e a antecipação. (PECHÊUX
apud ORLANDI, 2019, p. 150).

Outra questão relevante abordada é que o sujeito que fala não


se separa do político. Ao enunciar (ou não enunciar), ele revela como
pensa. A AD permite, então, entender como se simbolizam e se signi-
ficam as relações de poder. Ela mostra, pois, que ao enunciar deixamos
revelar nossas crenças, nossa ideologia, nossa história e transparecemos
o que acreditamos. Somos sujeitos históricos e, como tal, desvelamos
a nossa cultura.
A AD mais do que analisa textos, ela discorre sobre sentidos.
Assim, “de tal maneira que, em consequência, toda descrição ‘está exposta
ao equívoco da língua: todo enunciado é intrinsecamente suscetível de
tornar-se outro, diferente de si mesmo, se deslocar discursivamente de
seu sentido para derivar para um outro’” (PÊCHEUX, 1983, p. 53 apud
ORLANDI, 2005, p. 11). A língua é de natureza social, “a linguagem é
uma prática social cotidiana que envolve a experiência do relacionamento
entre sujeitos. Essa experiência é parte integrante do sentido do dizer.”
(PIRES, 2002, p. 36).

53
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Nesse sentido, analisando a língua como uma prática social,


ela transmite opiniões subjetivas, visões de mundo. Dessa forma, a
linguagem se converte em local de conflitos ideológicos. A palavra, por
sua vez, traz valores culturais, os quais se apresentam em discordância
de opiniões e nas contradições sociais. Corroborando a ideia Bakhtin,
citada por Pires (2002), que dispõe que “a palavra está sempre carregada
de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que
compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam
em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida.” (BAKHTIN,
1929, p. 95 apud PIRES, 2002, p. 38). Nesse sentido podemos inferir que
a sociedade é, portanto, “um palco de conflitos” (PIRES, 2002, p. 37).
Vale ressaltar que a língua, mais do que um conjunto de regras,
efetiva-se na fala dos indivíduos, os quais utilizam as palavras e as regras
para fazer sentido no contexto político, social e/ou histórico. Contudo,
outros meios podem ser manuseados para manifestar seus sentimentos
e crenças. Na próxima seção, realizaremos uma análise de um discurso
implícito no gênero discursivo “charge”.

A ANÁLISE DO DISCURSO NO GÊNERO


DISCURSIVO CHARGE

A charge do cartunista Luís Cardoso26 foi elaborada no dia 11


de abril de 2020, período do início da pandemia da COVID-19. Dessa
forma, utilizamo-la como corpus de análise deste estudo, já que retrata
a realidade de muitos professores. A imagem apresentada na charge
demonstra uma professora de óculos que está sentada em frente a alguns
aparelhos eletrônicos, como televisão e computadores. Essa professora
é representada com seis mãos, o que indica que ela está fazendo tudo
ao mesmo tempo. Na primeira mão, ela aponta o controle para a tele-
visão, em que está escrito “Tele-Escola”, enquanto as outras mãos estão
ocupadas com os computadores. Em um deles, está ocorrendo uma aula
síncrona com uma aluna mostrando a “ficha de trabalho”, nos outros há
os escritos: E-mails, SGE e Microsoft Teams. Logo abaixo, a sexta, e

26 
Luís Cardoso é professor e exerce a sua atividade de cartonista desde 2008.
54
Estudos em Cas@

última mão, está alimentando um bebê com uma mamadeira. Além


da ocupação das mãos, o pé esquerdo está com uma caneta escrevendo
em um caderno que se encontra no chão, já o direito está esfregando o
chão ao lado de um balde.
A partir da descrição da charge, podemos observar que o artista,
Luís Cardoso, ilustrou as várias demandas que o professor, principal-
mente a mulher, teve com o trabalho no formato remoto, pois precisaram
cuidar da casa, dos filhos e ainda lecionar. Dessa forma, historicamente
a mulher foi, por meio de uma sociedade patriarcal e machista, ensinada
desde criança que precisam desempenhar os afazeres domésticos; como
cuidar da casa, do marido e dos filhos. Diante desse contexto, além da
profissão, é preciso desempenhar as outras funções que são atribuídas a
ela, isso, por sua vez, demonstra o quanto são sobrecarregadas de ativi-
dades, uma vez que a casa, com a pandemia da COVID-19, tornou-se
o seu próprio ambiente de trabalho.
Além disso, os professores são cobrados pela sociedade para que
consigam ensinar de forma motivadora aos estudantes e, apesar de todas
as dificuldades encontradas, é preciso que estejam felizes, empolgados,
tranquilos e que amem sua profissão. Logo, podemos observar que o
professor precisa ser um “trabalhador altamente qualificado, versátil,
flexível, capaz de atuar nas mais diferentes áreas, de acordo com a neces-
sidade do mercado e, acima de tudo, capaz de solucionar problemas”
(RUIZ, 2013, p. 302 apud BRITO e GUILHERME, 2017, p. 121).
No entanto, durante a pandemia, para conseguir “dar conta de tudo”,
o professor precisou se reinventar, desdobrar-se em diversas atividades,
além de estudar para aprender a manusear as tecnologias existentes e
lecionar de forma online, para que a aprendizagem acontecesse mesmo
de forma remota.
Sobre isso, entendemos que, “agora com a urgência dessa ‘nova
educação’ criada pela pandemia, os docentes relatam um aumento ainda
maior da carga horária de trabalho” (HANZELMANN, et al., 2020
apud MENDES e OLIVEIRA, 2020, p. 3). Assim, percebemos que
o aumento dessa carga horária se deve às várias demandas diante da

55
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

urgência em continuar o processo de ensino e de aprendizagem no for-


mato remoto. Sobre esse contexto, em uma das telas dos computadores
da charge, há escrito “Microsoft teams”, que é uma plataforma utilizada
para realização de aulas virtuais, em que o professor consegue lecionar
de forma gratuita.
A partir disso, observamos que muitos aplicativos e ferramentas
gratuitas foram utilizadas pelas escolas. Isso, porque visavam que todos
tivessem acesso aos conteúdos pedagógicos, e os professores precisaram
ministrar aulas no formato online, com a oferta de materiais impressos e
digitais. Além disso, há ainda uma plataforma de comunicação, no qual
pode ser enviado o link das aulas para tirar dúvidas com os estudantes
e os familiares e para disponibilizar horários para que as aulas sejam
ministradas.
Outrossim, muitos profissionais da educação precisaram ofertar
a modalidade de aula síncrona – as quais são transmitidas ao vivo com
a participação dos alunos por meio de uma plataforma –, e ainda dis-
ponibiliza a gravação de aulas assíncronas – que são as aulas gravadas
que os alunos podem assistir em outro momento. Em alguns estados, o
governo também criou um programa de teleaulas, que são “atividades
fazem parte da iniciativa Escola em Casa, não são obrigatórias, tampouco
contam como dias letivos, mas servem para oferecer conteúdo aos estu-
dantes enquanto as aulas não voltam.” (LISBOA, 2020). Nesse sentido,
Os cursos universitários na modalidade não presen-
cial ocupam ainda um lugar à margem, às vezes com
pouca visibilidade inclusive nas instituições em que
são desenvolvidos. Dessa forma, falar/enunciar sobre a
formação em EaD é evocar um imaginário de um lugar
(virtual?) ‘sem fronteiras’ (que dá poderes ao sujeito),
mas, ao mesmo tempo, ‘com restrições’ (que submete o
sujeito ao olhar e aprovação do outro). Assim, o sujeito
estabelece uma relação de alteridade com sua forma-
ção em EaD de forma tensa e conflituosa, que o faz
enunciar por mecanismos de contradição. (BRITO e
GUILHERME, 2017, p. 128).

56
Estudos em Cas@

Antes da pandemia, os cursos de Educação a Distância (EAD)


como citado por Brito e Guilherme (2017) “ocupavam um lugar à mar-
gem”, pois são cursos que sofrem desprestígio socialmente. Entretanto,
com a nova situação, a única maneira de se escolarizar é de forma remota,
por meio do online. Dessa forma, os estudantes e seus familiares tive-
ram que aceitar estar nesse lugar, que é caracterizado por muitos como
conflituoso e de não prestígio, para então conseguir estudar e aprender.
No entanto, no contexto do ensino remoto, é um tanto confli-
tuoso, uma vez que nas séries iniciais os alunos ainda não dispõem de
autonomia, pois ainda estão em processo de desenvolvimento. Além
de o professor ser aquele que cobra incessantemente para que a família
impulsione o infante a estar presente nas aulas online e a realizarem as
atividades propostas. Dessa forma, muitas vezes os professores encon-
tram-se em um contexto sobre:
A utilização de ferramentas digitais é uma crescente na
prática docente e que demanda tempo e dedicação dos
professores que, muitas vezes, estão sobrecarregados.
Com isso, o ensino acaba sendo uma reprodução do
modelo presencial tradicional se tornando desinteres-
sante, passivo e repetitivo aos alunos. (MENDES e
OLIVEIRA, 2020, p. 2).

Sob essa perspectiva, devido aos professores estarem sobrecar-


regados com o excesso de trabalho, eles acabam transmitindo apenas o
conteúdo e não desenvolvem uma aula mais atrativa para os alunos. Logo,
observamos que a aula remota é uma nova maneira de ensino, caracteri-
zada por muitos como aquela que sobrecarrega os professores e em que
os alunos não conseguem se fazer presente. Isso, porque muitas famílias
são compostas por mães solteiras que precisam trabalhar durante todo o
dia para prover seus filhos de recursos básicos, por isso não conseguem
acompanhar as suas crianças durante as aulas, e não contam com um
espaço físico para deixá-las enquanto trabalham; devendo então confiar
e oferecer total autonomia ao estudante.
Além desse empecilho, ainda existe a questão da tecnologia,
pois muitas famílias não possuem aparelhos tecnológicos, enquanto

57
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

outros possuem apenas um computador e contam com vários filhos


para acessarem um mesmo aparelho e, como as aulas são ministradas
nos mesmos horários, torna-se difícil a frequência dos alunos em todas
as disciplinas. Nesse sentido, ainda há a questão da internet, já que
muitas famílias são carentes digitalmente, pois não têm condições de
pagar pelo acesso à internet. Isso faz com que seja impossível com que
os alunos frequentem as aulas e aumenta ainda mais a desigualdade
social e educacional no país.
Para amenizar tal exclusão digital, o que os professores podem
fazer? Muitos imprimem materiais e levam para as crianças, mas infeliz-
mente não conseguem atender a todos os estudantes igualmente. Após
discutirmos sobre as várias demandas do professor no ensino remoto,
analisaremos, na próxima seção, uma reportagem publicada no jornal
Correio com discursos de professores sobre o ensino remoto durante
a pandemia.

DISCURSOS SOBRE A EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA E


DEMANDAS DURANTE O TRABALHO REMOTO

A charge de Luís Cardoso pode ser bem ilustrada na reportagem


publicada no jornal Correio, com o título: “Preciso parar para vomitar:
professores revelam bastidores de educação a distância”, já que, nessa repor-
tagem, há relatos de professores da rede pública e privada no estado da
Bahia, os quais narram as dificuldades que encontraram nas aulas online
e essas realidades não são divulgadas pelas escolas. Dessa forma, para
Authier-Revuz (2004), “o sentido de um texto não está, pois, jamais
pronto, uma vez que ele se produz nas situações dialógicas ilimitadas
que constituem suas leituras possíveis: pensa-se evidentemente na ‘leitura
plural’.” (AUTHIER-REVUZ, 2004, p. 26).
Nessa perspectiva, relacionando a reportagem e a charge com as
discussões propostas por Authier-Revuz, os sentidos empregados pelos
textos não estão “prontos”, pois é na leitura do texto que os sentidos se
produzem e na relação dialógica que os sentidos são empregados.

58
Estudos em Cas@

O discurso (como qualquer signo, em geral) é interin-


dividual. [...] não se pode atribuir o discurso somente
ao locutor [...]. Cada enunciado tem sempre um des-
tinatário [...] e o autor da obra verbal procura e ante-
cipa a compreensão responsiva. (Bakhtin escrito em
1959-1961 e citado por Todorov, 1981, p. 83 e 170 apud
AUTHIER-REVUZ, 2004, p. 42).
Na reportagem, encontramos no subtítulo a seguinte informa-
ção: “Metade dos docentes baianos têm impactos na saúde emocional
durante pandemia, revela pesquisa que ouviu quase 10 mil profissionais
no país; confira relatos”. (NATIVIDADE, 2020). Diante disso, a charge
do cartunista Luís Cardoso relaciona-se bem com essa informação, já
que os professores devem se desdobrar para “dar conta de tudo”. Como
são seres humanos e possuem necessidades emocionais, psicológicas,
materiais e afetivas; acabam se sobrecarregando e afetando sua saúde,
não apenas fisicamente, mas também emocionalmente.
Na reportagem, encontram-se explicações sobre os problemas
enfrentados pelos professores durante a pandemia, como os psicológicos
que podem ser identificados no relato da professora que se identificou
como Tânia: “Tenho tido ansiedade, picos de pressão. Já dei aula parando
para vomitar por conta da hipertensão, dores de cabeça e das náuseas
que tenho tido regularmente. Muita pressão de todos os lados. Já che-
guei a gravar oito vídeos por dia. Sinto-me usada” (NATIVIDADE,
2020). Além disso, há também os impasses financeiros, como relatado
pela professora Ana: “Meu salário diminuiu para R$221. A escola tem
feito da gente o que quer, porque precisamos do nosso trabalho”; e os
dos abusos a que eles são submetidos: “Tenho me sentido escravizada”
(NATIVIDADE, 2020).
Diante dos relatos na reportagem, podemos observar que “o outro
é o lugar estranho, de onde emana todo discurso: lugar da família, da
lei, do pai, na teoria freudiana, elo da história e das posições sociais,
lugar a que é remetida toda subjetividade...” (AUTHIER-REVUZ,
2004, p. 64). Depreende-se que, na educação, existem vários discursos
dos professores, dentre eles: aqueles que ocupam lugar de atuação e
que revelam os bastidores desse cenário; e também aqueles que agem
59
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

como atores, encenando como estivesse tudo bem, dizendo que não está
cansado, que está recebendo um salário adequado e se desdobra para
conseguir levar conhecimento aos seus alunos.
Ao aprofundarmos nossa análise sobre os discursos na reportagem,
relembramos uma fala do ex-ministro da Educação, Cid Gomes, no ano
de 2011, durante evento na cidade de Natal, o qual disse que “Quem
quer dar aula faz isso por gosto e não pelo salário”27. Tal declaração é
o que a sociedade espera dos educadores, que amem seus trabalhos,
que cumpram todas as demandas e nunca reclamem de seus salários.
Diante disso, ao trazer a reportagem do jornal Correio, percebemos que
os professores denunciam a verdadeira face da educação a distância e os
problemas que estão enfrentando, como os abusos salariais e as pressões
psicológicas, sendo submetidos ao receio de perder o emprego, já que
precisam do salário para sobreviver e comprar os itens essenciais para
a manutenção da vida.
Logo, esse texto pode ser considerado um apelo, para que os
professores sejam vistos e suas dores e vivências sejam expostas, já que
revelam os bastidores de como realmente ocorre a educação. Entretanto,
de certa forma, com a pandemia da COVID-19, os professores mesmo
com tantas mudanças cumprem o seu papel e se esforçam com muito
estudo para preparar as aulas, lecionar utilizando a tecnologia, conversar
e aproximar dos pais e dos alunos, dentre várias outras novas atribui-
ções. Ademais, mesmo com o ensino tradicional sendo revolucionado
há bastante tempo e com as teorias trazendo novas formas de ensinar,
na prática, em muitas instituições escolares, a docência se mantém da
mesma forma. Isso é algo que amplia a exclusão social, visto que nem
todos os estudantes conseguem acompanhar ou, até mesmo, suportar
as aulas. Diante disso, apesar das dificuldades encontradas durante a
pandemia, Mendes e Oliveira (2020, p. 2) entendem que “a educação
precisa de novas maneiras de ensinar e educar, e o momento atual de
pandemia que se coloca como desafiador pode se tornar revolucionário”.
27 
Disponível em: https://www20.opovo.com.br/app/opovo/politica/2011/08/23/
noticiasjornalpolitica,2284204/frase-atribuida-a-cid-causa-polemica-com-professores.
shtml Acesso em: 27 de jun. de 2021.
60
Estudos em Cas@

Dessa forma, podemos observar que, embora a educação se encontre em


maiores dificuldades durante o ensino remoto do que o usual, é possível
que sejam criadas novas possibilidades para renovar a ensino brasileiro.

CONSIDERAÇÕES

Com a pandemia da COVID-19, a educação teve que passar


por algumas mudanças e utilizou-se das tecnologias para continuar
o processo de ensino e aprendizagem, o que, para muitos professores,
foi uma mudança drástica na forma de lecionar, ocasionando impacto
principalmente na saúde emocional e na financeira. Para tanto, buscamos
analisar alguns discursos pedagógicos que percorrem as mídias sociais,
dentre elas uma charge de Luís Cardoso e uma reportagem do jornal
Correio abordando as demandas dos professores na pandemia.
A partir da análise, pudemos observar o quanto os professores
tiveram que se reinventar para atender às demandas no ensino remoto.
Embora fosse muito desvalorizada, essa modalidade foi ampliada, prin-
cipalmente pela pandemia, já que os professores que não tinham com-
putador precisaram comprar para as aulas online, precisaram aprender
sobre as novas tecnologias e utilizar esses meios para manter contato
com os alunos e famílias, ocasionando trabalho de extra se comparado
ao ensino presencial, portanto, ficaram bem sobrecarregados.
Portanto, o que muitos já sabem, mas aqui reafirmamos, é que o
trabalho do professor, de fato, é desvalorizado, mas com a pandemia da
COVID-19 foi bastante conturbado, devido às várias jornadas de trabalho
e falta de capacitação e incentivos para aprender sobre as demandas do
momento, trazendo a verdadeira face da educação com os problemas
que enfrentam para “darem conta” de tudo sem reclamar.

REFERÊNCIAS
AUTHIER-REVUZ, J. Entre a transparência e a opacidade: um estudo enunciativo
do sentido. Apresentação Marlene Teixeira; revisão técnica da tradução: Leci Borges
Barbisan e Valdir do Nascimento Flores. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.

61
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

BRITO, C. C. P.; GUILHERME, M. F. F. A constituição do professor de Inglês


pré-serviço em um Curso de Letras EaD: representações sobre formação, ensino-
-aprendizagem e tecnologia. Linguagem em (Dis)curso – LemD, Tubarão, SC, v. 17,
n. 1, p. 117-136, jan./abr. 2017. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/ld/a/5jcVy9kF-
GbwXc3FLDDS3TRg/?lang=pt&format=pdf>. Acesso em 09 nov. 2021.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

LISBOA, A. P. Programa de teleaulas da rede pública é oferecido durante a pandemia.


Correio Braziliense. 06 de abril de 2020. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.
com.br/app/noticia/eu-estudante/ensino_educacaobasica/2020/04/06/interna-educa-
caobasica-2019,842598/programa-de-teleaulas-da-rede-publica-e-oferecido-durante-
-a-pandemia.shtml>. Acesso em: 04 nov. 2021.

MACHADO, D. As tecnologias digitais e o ensino em tempos de pandemia. Contornos


- Educação e Pesquisa, Florianópolis, 2020. Disponível em: <http://www.contornospes-
quisa.org/2020/12/as-tecnologias-digitais-e-o-ensino-em.html>. Acesso em: 04 nov. 2021.

MENDES, M. C.; OLIVEIRA, S. S. Ensino remoto em tempos de pandemia: o perfil


e as demandas educacionais e sociais dos professores. Anais VII CONEDU - Edi-
ção Online. 2020. Campina Grande: Realize Editora, 2020. Disponível em: <https://
editorarealize.com.br/editora/anais/conedu/2020/TRABALHO_EV140_MD1_SA5_
ID5537_01092020140707.pdf>. Acesso em: 04 nov. 2021.

NATIVIDADE, P. ‘Preciso parar para vomitar’: professores revelam bastidores de


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62
CAPÍTULO 5 -COMPETÊNCIAS DIGITAIS
E PESQUISAS NA INTERNET: UMA
ANÁLISE DO PERFIL DE ESTUDANTES
DO ENSINO MÉDIO28

Amanda D. C. Schiassi 29
Ketilin Mayra. Pedro30

INTRODUÇÃO

A globalização está diretamente ligada às transformações do


mundo contemporâneo. A partir da Terceira Revolução Industrial,
começaram a ser feitas mudanças significativas em vários setores da
sociedade, impulsionados justamente, pelo desenvolvimento tecnológico.
A partir deste momento, surge a urgência do domínio de conhecimentos
e técnicas voltados ao desenvolvimento do futuro cidadão e trabalhador
urbano. Assim, inicia-se a utilização dos computadores e começa o pro-
cessamento da internet, o que amplia ainda mais as possibilidades de
produção de informação e conhecimento. Pode-se observar isso diante
das atuais inquietações em todas as áreas da sociedade, em especial no
meio educacional. Neste sentido, pretende-se dar mais ênfase e abertura
ao diálogo e entendimento de Tecnologias Digitais da Informação e
Comunicação (TDIC) e sua relação com a produção de conhecimento
na sociedade, afinal, ela remete a um novo código de linguagem, a
linguagem digital.
De acordo com Castells (1999), essas tecnologias são a transforma-
ção de nossa cultura material pelos mecanismos de um novo paradigma

28 
Apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecno-
lógico (CNPQ ).
29 
Graduanda em Pedagogia (UNISAGRADO).
CV: http://lattes.cnpq.br/3359161778526513
30 
Doutora em Educação (UNESP). Docente (UNISAGRADO). Professora Cola-
boradora (UNESP). CV: http://lattes.cnpq.br/0991868156805558

63
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

tecnológico, que se organiza em torno da tecnologia da informação, na


qual o fluxo de informações é contínuo e o conhecimento flutuante e
flexível. Essa concepção é retratada mediante o conceito de sociedade
da informação. Assim, existe um processo constante de mudanças por
conta da circulação e manipulação das informações. O propósito dessa
nova organização social, a princípio, seria a democratização do conhe-
cimento em virtude dos novos espaços de busca, compartilhamento e
distribuição das informações.
Contudo, entende-se que aptidão à produção de conhecimento
depende da capacidade de adaptação às mudanças do indivíduo, pois,
assim, o sujeito aprende de maneira autônoma e contínua, aplicando os
conhecimentos adquiridos de maneira crítica mesmo depois dos anos
formais de escolaridade. Essa capacidade pode ser entendida como a
habilidade que permite buscar, selecionar e processar de maneira crítica
as informações extraídas da internet, deste modo, entendidas como
competências digitais.
Lueg (2014) define competência digital como a mobilização de
habilidades que permitem buscar, selecionar criticamente e processar
a informação; capacidade de se comunicar, usando diferentes suportes
tecnológicos e digitais; atuar com responsabilidade, respeitando as nor-
mas estabelecidas e aproveitando essas ferramentas para informar-se,
aprender, resolver problemas e comunicar-se. A competência digital
possibilita que o usuário vá além da utilização técnica e instrumental
das TDIC, porém, seja capaz de aproveitar todo o potencial informativo
que elas oferecem.
No que diz respeito ao tratamento da informação, as competências
digitais implicam a necessidade de acessar a informação de maneira
eficiente, avaliá-las criticamente e utilizá-las de forma positiva e criativa.
Segundo Pedro (2018), para que os estudantes consigam desenvolver as
competências digitais é preciso que sejam instrumentalizados e mediados
na adoção das TDIC, além do conhecimento básico da utilização de
hardwares e softwares.

64
Estudos em Cas@

A propósito das habilidades necessárias para selecionar informações


relevantes, Palfrey e Gasser (2011, p. 204) afirmam que, quando apren-
dem essas habilidades, os estudantes “ficam mais capacitados a avaliar
as informações, tanto online quanto offline. Não precisamos ensinar-lhes
nada fundamentalmente novo. Mas a necessidade do pensamento crítico
é ainda maior agora do que era 20 anos atrás”.
A aprendizagem dos estudantes sofre o impacto do grande número
de informações às quais estamos expostos, que nos leva a refletir como
a cultura digital e o ciberespaço favorecem ou deveriam favorecer o
processo de ensino-aprendizagem de estudantes de todos os níveis de
ensino, de forma que o acesso à informação é rápido e imediato para
aqueles que possuem dispositivos conectados à internet.
Os estudantes do século XXI vivem a superficialidade do saber,
uma vez que estes têm acesso a inúmeros conteúdos e, muitas vezes, não
possuem competências digitais e tempo hábil para processar toda a infor-
mação; assim, temos a falsa impressão de que estamos bem-informados
ou de que conhecemos um tema profundamente, mas, na verdade, temos
apenas um conhecimento superficial, o qual, na maioria das vezes, pode
estar embasado em fontes não seguras. Nessa perspectiva, é necessário
desenvolver competências digitais para fazer uso adequado das infor-
mações a que temos acesso e para saber selecionar entre as informações
disponíveis (CRUZ, 2008).
Quanto à realização de pesquisas na internet, Monereo e Fuentes
(2010) apresentam três perfis de buscadores : passivo – aquele que encontra
a informação de maneira acidental, não faz nenhum planejamento para
execução da pesquisa, encontra o que procura navegando sem rumo na
internet; ativo – realiza a pesquisa de modo intencional, mas usa sem-
pre as mesmas fontes de busca, como a Wikipédia; seletivo – tem um
objetivo claro de sua pesquisa e preocupa-se com aspectos relacionados
à confiabilidade e qualidade.
Os impactos causados pela era digital atingem diretamente o setor
educacional, pois o acesso às TDIC são cada vez maiores, por parte dos
estudantes, os quais passam a maior parte do tempo conectados e se

65
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

relacionam e interagem com conteúdos de uma maneira diferenciada


de seus professores e familiares. Sobre isso, Gómez (2015) pondera que
temos uma escola presa a uma estrutura e ideais do século XIX, que
não está atenta às modificações e desafios requeridos pelo século XXI.
Mediante o exposto, surgem grandes desafios para a educação:
como instruir os indivíduos do século XXI a passar de mero detentor
de informações para um incorporador de saberes? Como desenvolver
as competências digitais nos estudantes, para que assim sejam capazes
de resolver problemas de maneira autônoma, crítica e criativa? Como
os estudantes pesquisam e o que fazem com as informações coletadas?
Diante das indagações apresentadas elaboramos o objetivo geral desta
pesquisa que consistiu em analisar o perfil de pesquisa na internet de
estudantes do ensino médio. Especificamente pretendeu-se: 1. Identi-
ficar como estudantes do ensino médio realizam pesquisas na internet;
2. Categorizar o perfil de pesquisa na internet de estudantes do ensino
médio; 3. Compreender as competências digitais, relacionadas ao tra-
tamento da informação, de estudantes do ensino médio.

DESENVOLVIMENTO

Tratou-se de uma pesquisa descritiva e exploratória. Para a reali-


zação da coleta de dados foi elaborado um questionário31 com o objetivo
de identificar como estudantes do ensino médio realizavam pesquisas e
demais atividades na internet, dessa maneira foram elaboradas 11 questões
que implicavam em conhecer brevemente o aluno e questões relacio-
nadas às competências digitais. O referido questionário foi elaborado
na plataforma Google Forms, por conta da chegada do novo coronavírus
responsável pela pandemia da COVID-19.
O questionário online foi divulgado nas redes sociais32, como Insta-
gram, Facebook e Whatsapp a partir da rede de contato das pesquisadoras.
Foram elaborados vídeos e materiais informativos para acompanhar o
31 
Realizamos uma aplicação piloto do instrumento para analisar a aplicabilidade do
mesmo e dar continuidade na coleta de dados.
32 
Informamos que a divulgação do questionário aconteceu de 18 de fevereiro de 2021
a 1 de julho de 2021.
66
Estudos em Cas@

link do questionário e engajar o maior número de participantes possível.


Alguns professores da Educação Básica também auxiliaram na divulgação
do instrumento ao compartilhá-lo em suas redes de contato.
Sobre os procedimentos éticos adotados, informamos que o referido
projeto de pesquisa foi aprovado pelo parecer de nº 3.908.704. Sendo que
todos os participantes da pesquisa (e seus respectivos responsáveis) foram
informados dos objetivos do estudo e concordaram com a participação.
Obtivemos as respostas de 164 estudantes da rede estadual e parti-
cular de ensino. Em relação ao nível de ensino, a maioria dos estudantes
estavam matriculados no primeiro ano do ensino médio (Figura 01).
Figura 1 – Ano em que o estudante está matriculado.

Fonte: elaboração própria.

Perguntamos aos participantes, na primeira questão, a frequência


com que eles acessavam a internet para realizar pesquisas. Os dados
evidenciaram que 59,4% dos participantes realizavam pesquisas na
internet todos os dias, enquanto 29,7% disseram pesquisar na internet
apenas algumas vezes na semana, 11,5% só utilizavam a internet como
meio de busca quando precisavam realizar algum trabalho escolar, e por
fim 2,4% dos participantes disseram pesquisar raramente na internet.
Na questão 2, visava-se obter informações sobre qual o meio de
acesso que os alunos mais utilizavam para navegar na internet, de modo
que o recurso mais utilizado foi o celular, com 60% das indicações,
enquanto em segundo lugar ficou o computador com 10% de indicações,
nenhum estudante apontou o uso de tablet ou outros recursos.
67
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Os dados de pesquisa e os achados da literatura indicam que o uso


frequente da internet por parte dos jovens é um traço característico da
geração nascida na era digital, os intitulados nativos digitais. Eles estão
frequentemente na internet e um dos recursos que mais utilizam para
navegar na rede é o smartphone. Palfrey e Gasser (2011, p. 11) carac-
terizam os nativos digitais como aqueles que, “[...] nasceram depois de
1980, quando as tecnologias digitais, como a Usenet e os Bulletin Board
Systems, chegaram online. Todos eles têm acesso às tecnologias digitais.
E todos têm habilidades para usar essas tecnologias”.
Vale destacar que esta definição se aplica mais ao contexto norte
americano e europeu, diante da realidade brasileira é preciso levar em
consideração a exclusão digital que ocorre principalmente por conta da
acentuada desigualdade social do nosso país. A dimensão social implica
em como a população desfavorecida é incluída e tem novas oportunidades
de acesso às inovações organizacionais, aos recursos e ferramentas digitais,
enfim, ao acesso às TDIC. Promover o acesso universal à informação
é o básico para que os estudantes dessa geração, potencializem suas
competências digitais e exerçam a cidadania digital.
Nesse sentido, de acordo com o Censo de 2019 do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre o Acesso à Internet
e à televisão, quanto ao que diz respeito a utilização da Internet cons-
tatou-se que,
Quando se considera a rede de ensino, observam-se
importantes diferenças no uso da Internet dos estu-
dantes. Enquanto 98,4% dos estudantes da rede privada
utilizaram a Internet em 2019, este percentual entre
os estudantes da rede pública de ensino foi de 83,7%.
As diferenças regionais no uso da Internet são mais
marcadas entre os estudantes da rede pública (IBGE,
2019, n. p).

Assim, os dados demonstraram que existe uma certa defasagem


quanto ao uso da internet entre estudantes da rede privada e pública de
ensino, pode-se dizer que um dos motivos disso se dá pela diferença
de renda das famílias desses estudantes. Afinal é inegável que a rede
privada de ensino possui mais acesso quanto a recursos e materiais,
68
Estudos em Cas@

possibilitando formas de aprendizado com metodologias “inovadoras”


em ambientes diferentes, o que nem sempre é possível proporcionar na
rede pública de ensino.
Deste modo, entende-se que a desigualdade social é marcada
pela condição desses estudantes e pelas oportunidades de experiências
e aprendizados. Entendemos que é a partir do acesso desses estudan-
tes as TDIC que, não somente os jovens, mas como toda a população
brasileira, poderá participar efetivamente e contribuir com o avanço da
sociedade da informação e do conhecimento.
Diante disso, é primordial entender a Sociedade da Informação
como uma sociedade do conhecimento e aprendizagem também, afinal,
os processos de ensino-aprendizagem não se limitam apenas ao espaço
tradicional, agora o ambiente virtual se torna um aliado para o desenvol-
vimento de habilidades, para as relações e a comunicação, mas aqui, em
especial, para a educação. É a extensão da vida, do aprendizado e das rela-
ções humanas por meio de plataformas digitais (SANTAELLA, 2014).
Vale destacar que é inegável a crescente popularização da internet
e dos meios de comunicação, uma vez que boa parcela da população já
tem acesso a esses aparelhos eletrônicos e os manuseiam com maestria.
Em vista disso, pode-se constatar que, mesmo diante do período pandê-
mico em que a população brasileira vive, foi possível manter as aulas de
maneira remota com encontros síncronos e assíncronos, atividades online
utilizando das mais diferentes ferramentas como forma de aprendizagem
e avaliação (RONDINI; PEDRO; DUARTE, 2020).
As transformações ocasionadas pelo período pandêmico con-
firmaram a capacidade de adaptação da educação para acompanhar as
necessidades da população, fato consumado que se constata quando
observamos o quão diferente esses adolescentes se comportam (HOD-
GES et al., 2020). Eles estudam, se relacionam, escrevem e interagem
uns com os outros de formas novas, criativas e por diversos recursos.
Eles leem notícias em páginas no Instagram ao em vez de jornais, se
informam por redes sociais. Com frequência, se conhecem online, antes
mesmo de se conhecerem pessoalmente. Se expressam e aprendem de

69
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

maneiras diversas, tendo a interatividade como um aspecto importante


para a utilização de diferentes recursos.
A questão 3 buscava compreender o passo a passo que os
estudantes realizavam ao fazer pesquisas na internet. Os dados
apontaram que, no geral, os alunos sintetizavam suas dúvi-
das em palavras-chave, tendo sempre os mesmos primeiros sites
como instrumento de busca e confirmação de suas hipóteses.
A questão 4 sintetizou os sites mais utilizados para realizar
pesquisas na internet. Os dados apontaram que os sites mais usados são
respectivamente o Google 35,7%, o Youtube 24,8%, Brasil Escola 23,1%,
Wikipédia 13,8% e por fim o Google Acadêmico 4,8%. Sites como Brainly,
BBC, Toda matéria, Enem.com, Infoescola, Mundo educação e outros
também foram citados. Vale destacar, que os estudantes identificaram o
Google como uma fonte de pesquisa, quando na verdade trata-se de um
portal de busca de informações, tal constatação revela uma dificuldade
em reconhecer o que é uma fonte de pesquisa.
Deve-se questionar quanto aos sites que são recomendados pelo
Google tendo em vista que é preciso reconhecer que existe um algoritmo
e, consequentemente, uma inteligência artificial envolvida por trás destes
sites e redes. Existem também aspectos publicitários que influenciam nas
pesquisas do Google, principalmente levando em consideração que é uma
empresa privada que possui como uma das maiores fontes de renda, a
publicidade. Sendo assim, geralmente quem aparece em primeiro lugar
nas pesquisas são as propagandas de empresas patrocinadoras. Portanto,
é possível afirmar que confiar apenas nas informações apresentadas pre-
viamente nesses sites de buscas é no mínimo uma incerteza. É preciso
questionar, buscar e debater quanto às pesquisas que são realizadas no
ambiente virtual, assim como em qualquer outro ambiente (BUIM
ARENA, 2015).
A questão 5 apontou que 86,1% dos estudantes conferem se a
informação é verdadeira pesquisando em mais de um site, enquanto
13.9% não. Já a questão 6 indagava quais conteúdos eles mais acessavam
para se informar. A plataforma mais utilizada foi o Youtube, compondo

70
Estudos em Cas@

62,4% das indicações, e em seguida os textos com 27,9%, também foram


citados podcasts, fórum de discussões, artigos científicos e jogos (Figura 2).
Figura 2 – Tipo de conteúdo mais acessado.

Fonte: elaboração própria.

Diante do exposto, é possível afirmar que a maioria dos estudantes


têm um perfil de pesquisa mais ativo, mas apesar de realizar a pesquisa
e questionar as informações em mais de um site, eles costumam realizar
suas buscas apenas no Google, confirmando as informações abrindo os
dois primeiros sites apresentados. Também é possível observar que o
tipo de conteúdo que eles mais consomem é por meio da plataforma
Youtube, o que também expõe um perfil mais passivo de aprendizado.
Sendo assim, quanto à competência do tratamento da informação,
muitos dos estudantes mostraram-se preocupados com a informação
que chega até eles.
Nesse sentido, a questão 7 questionava o que eles faziam para
certificar-se se as informações acessadas eram verdadeiras. Novamente,
a maioria dos estudantes afirmou que buscam em mais de um site para
comparar as informações. Cerca de 84,15% dos estudantes de alguma
forma, questionavam as informações encontradas, seja pesquisando
em mais de um site, ou contestando as fontes/referências, os autores ou
mesmo o conteúdo apresentado. Enquanto 15,85% afirmaram confiar
nas informações encontradas sem muitos questionamentos, isso se dá
pois muitos certificaram ser fontes confiáveis, isto é, os sites que são
mais citados em suas redes sociais.

71
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Desta maneira, surge um importante questionamento: como o


jovem julga se uma fonte é ou não confiável? Diante dos dados coletados,
é possível afirmar que existem incongruências quanto à competência do
tratamento da informação de alguns estudantes. Essa defasagem pode
ser discutida a partir do âmbito das Fake News, levando em consideração
que os jovens são os usuários mais ativos da internet, traço característico
dessa nova geração e dos nativos digitais, e pensando também na flui-
dez e interatividade do mundo digital, pode-se dizer que eles também
são os que menos checam a informação, justamente por essa sede do
“novo” a todo momento. Como afirma Cardoso (2021 p. 619), “se para
os pequenos a Fake News podem causar grandes problemas, para os
jovens com idade do ensino médio pode ser mais perigoso ainda, pois
além deles mesmos sofrerem, eles podem ser agentes propagadores de
notícias falsas.”
A questão 8 indagava sobre as ferramentas de comunicação, apli-
cativos e serviços online utilizados pelos estudantes. Como já era espe-
rado, as redes sociais estão em primeiro lugar como os aplicativos mais
utilizados. Assim, obtivemos a seguinte distribuição de acordo com a
preferência dos estudantes: Instagram 32,4%, Whatsapp 29,5%, Twitter
13,1%, Facebook 10,2%, Youtube 10,2% e Tik Tok 4,6%.
Também foram citados aplicativos de entretenimento e compras
online, como Amazon, Netflix, Ifood, Spotify, Shopee, Discord, Mercado
Livre, Americanas e algumas plataformas de streaming como a Twitch.
Na questão 9 foi possível categorizar essas plataformas digitais,
sendo divididas em três categorias: estudos (32,4%), lazer (32,9%) e redes
sociais (34,7%). Com a evolução dos recursos tecnológicos, também
se expressa a imposição de uma revolução nos relacionamentos. O ser
humano, aqui entendido como um ser social, só foi capaz de sobreviver e
evoluir a partir da convivência, o que proporcionou ambientes de comu-
nicação e principalmente de colaboração. Diante do mundo conectado
o qual vivemos, os relacionamentos passam a acontecer e se desenvolver
por intermédio da internet.

72
Estudos em Cas@

Na questão 10 pretendia-se sintetizar quais as ferramentas que


eles mais utilizavam para a produção de conteúdo, entre os mais citados
tivemos 70,7% que indicaram utilizar o Pacote Office (uso do aplicativo
Microsoft Office Word principalmente), 22% utilizavam os diferentes
aplicativos disponibilizados pelo Google, 6,1% indicaram não usar fer-
ramentas deste tipo e 1,2% utilizavam outros tipos de ferramentas como
Canvas e Iwork.
A questão 11 questionava se os estudantes costumavam verificar,
com certa frequência, as configurações de segurança do computador,
56,9% disseram que não, 34,75% responderam sim, 3,4% disseram que
somente às vezes e 5,4% indicaram não possuir computador. Na questão
12, buscou-se compreender o que o estudante fazia caso seus aparelhos
eletrônicos apresentassem algum problema técnico, assim obtivemos as
seguintes respostas 56,9% dos estudantes buscavam resolver sozinho
por meio de pesquisas na internet, 37,19% buscavam auxílio de algum
especialista e 6% indicaram não fazer nada.
A questão 8 e 9 se referiam às ferramentas de comunicação que
esses estudantes utilizavam, as mais citadas foram as redes sociais.
Deste modo, foi possível observar que eles a utilizavam de acordo com
seus vontades e necessidades, incluindo-as no funcionamento de suas
relações, nas suas maneiras de externar pensamentos e seus padrões de
comportamento. Neste sentindo, verificou-se que a comunicação entre
os jovens se dá quase que inteiramente pela internet, compartilhando,
curtindo ou se expressando de outras formas.
Para fazer parte da sociedade da informação e do conhecimento é
preciso ter competências digitais, a comunicação é marcada como uma
das mais importantes e necessárias para navegar na internet. Saber se
expressar no contexto digital é saber produzir conteúdo e textos, de acordo
com a questão 10, em suma os estudantes usam como ferramenta para
produção de seus textos apenas recursos do pacote Office.
Vale ressaltar que para ser um cidadão digital é preciso ter noções
sobre segurança na internet, sendo assim, na questão 11 e 12 foi ques-
tionado quanto a verificação das configurações do computador, bem

73
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

como o que eles fazem no caso de algum recurso dar problema, quase
60% dos participantes não verificavam as configurações de segurança
do computador, mas quase 60% dos participantes também buscavam
resolver problemas técnicos sozinhos.
Com base nos dados apresentados, compreendemos que ser com-
petente digitalmente quer dizer ter aptidão para ser um cidadão digital,
usar a internet com segurança, com responsabilidade e cuidado, saber
expor seus pensamentos por meio de textos de maneira clara e coesa.
Acreditamos que para usufruir ao máximo do potencial da internet é
preciso estar em uma constante busca de informações, porém é preciso
dispor de competências digitais para refletir sobre as informações encon-
tradas nos sites de busca, assim transformando-as em conhecimento. Ser
competente digitalmente também é ser questionador e curioso, entender e
refletir sobre suas práticas no ambiente virtual de maneira segura e clara.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de uma nova configuração social, imposta pela tecnologia


e com o agravante da pandemia do Coronavírus, a educação passa por
um momento de transformação. Os jovens precisam ser capazes de apri-
morar habilidades e competências para além das questões disciplinares,
pensar na qualidade emocional das suas relações, ser hábil para colaborar
e ajudar a construir ativamente uma nova organização, eles precisam
confrontar situações complexas, ter conhecimentos multidisciplinar, e
tudo isso pode ser desenvolvido principalmente, com o auxílio das TDIC.
Diante disso, ao analisar o perfil de pesquisa na internet de
estudantes do Ensino Médio, os dados de pesquisa indicaram algumas
características apontadas na literatura, que possibilitaram a identificação
de como esses estudantes realizavam pesquisas na internet. Os dados da
presente pesquisa corroboraram com a literatura, ao demonstrar que a
geração nascida na era digital utiliza da internet como fonte primária
para busca de informações, tem preferência pelo uso de smartphones e
buscam por conteúdos interativos como vídeos quando estão em rede.
Finalmente, conclui-se que, apesar das dificuldades enfrentadas

74
Estudos em Cas@

no período pandêmico, as competências digitais, tanto relacionadas ao


tratamento da informação, quanto à segurança na internet e capaci-
dade de comunicação desses jovens ainda passam por um processo de
transformação de um perfil passivo para ativo. Em relação aos hábitos
de pesquisa, as competências envolvendo o tratamento da informação,
segurança digital e uso responsável da tecnologia como meio de comu-
nicação podem ser aprimoradas. Assim, destacamos a importância de
incorporar a temática das competências digitais nos currículos da edu-
cação básica, atendendo aos pressupostos presentes na Base Nacional
Comum Curricular, para que possamos instrumentalizar nossos jovens
estudantes para um uso crítico, produtivo e seguro das TDIC.

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76
CAPÍTULO 6 -GÊNEROS DIGITAIS NO
CONTEXTO DO LIVRO DIDÁTICO: UMA
ANÁLISE COM BASE NA BNCC

Maria Dayane da Costa Coelho33


Bárbara Olímpia de Melo34
Shirlei Marly Alves35

INTRODUÇÃO

Há muito tempo, nota-se um embate entre professores e dis-


positivos tecnológicos usados em sala de aula por alunos, o que pode
ser denominado de “batalha por atenção”. Esse e outros fatos apontam
para novos cenários sociais do mundo que se firmaram e precisam ser
considerados e assimilados pelo contexto educacional. Um deles é o
surgimento e ascensão de uma cultura digital que promove novas formas
de comunicação e, em consequência, de novos gêneros textuais. Nesse
sentido, de acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
“ao aproveitar o potencial de comunicação do universo digital, a escola
pode instituir novos modos de promover a aprendizagem, a interação
e o compartilhamento de significados entre professores e estudantes.”
(BRASIL, 2018, p. 57).
No ensino de língua portuguesa, percebe-se que a presença de
gêneros textuais provenientes do contexto digital é limitada, sendo que,
quando se abordam aqueles com os quais os alunos têm maior contato,
eles se sentem mais motivados e, consequentemente, aderem melhor às
atividades propostas. Nesse contexto, cientes da necessidade de formar
33 
Mestranda em Letras (UESPI). Professora da rede municipal de ensino.
CV: http://lattes.cnpq.br/0832169541018408
34 
Doutora em Linguística (UFC). Professora do curso de Letras/Português e do
Mestrado Profissional em Letras – ProfLetras (UESPI).
CV: http://lattes.cnpq.br/2014480730656031
35 
Doutora em Linguística (UFPE). Professora do curso de Letras/Português (UESPI).
Coordenadora do Mestrado Profissional em Letras (PROFLETRAS) e do programa
Residência Pedagógica. CV: http://lattes.cnpq.br/7828918779492971
77
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

leitores capazes de interagir dialogicamente com textos de diferentes


gêneros e, ainda, de que o livro didático é o principal recurso nas aulas
de língua portuguesa, fez-se pertinente buscar respostas para o seguinte
problema: como os gêneros digitais são tratados pelo livro didático?
Partindo desse questionamento, a pesquisa adquire relevância
teórica à medida que contribui com a produção de conhecimento acerca
dos gêneros digitais, assumindo uma perspectiva de análise pautada
na BNCC, ponto de vista pouco explorado na literatura. Ressalta-se
também que, tomando o livro didático como objeto de estudo, este
trabalho pode ajudar professores a encontrar alternativas para o ensino
de gêneros digitais, de modo que estes passem a ser mais presentes nas
aulas de língua portuguesa.
Objetivou-se, portanto, analisar o tratamento dado aos gêneros
digitais em livros didáticos do 6º ao 9º ano, considerando-se as dimensões
leitoras propostas pela BNCC. Dessa maneira, faz-se, primeiramente,
algumas considerações sobre os gêneros digitais, adentrando, por con-
seguinte, a relação da cultura digital com as novas práticas leitoras e as
dimensões da BNCC para o eixo de leitura. Por fim, apresenta-se uma
análise descritiva da abordagem dos gêneros digitais na coleção “Tecendo
Linguagens”, de Oliveira e Araújo (IBEP, 2018).

GÊNEROS DIGITAIS E NOVAS PRÁTICAS


LEITORAS

A pandemia desencadeada pelo novo coronavírus, em 2020, con-


tribuiu para o exacerbamento das relações interpessoais mediadas pelas
tecnologias de comunicação, em função do isolamento a que grande
parte das populações precisaram adotar como medida de segurança
sanitária. Nessa esteira, em função das restrições impostas, também
a escola precisou se reorganizar para continuar desempenhando suas
funções em modo remoto, via artefatos digitais. Em consequência, foi
necessário assimilar os gêneros digitais para dar conta da nova demanda.
Arrisca-se a dizer, porém, que, em termos estruturais e de supor-
tes didáticos, boa parte das escolas públicas brasileiras não possui um

78
Estudos em Cas@

ambiente favorável ao trabalho com gêneros digitais. Dados do Censo


Escolar (BRASIL, 2020) mostram, com relação aos recursos tecnoló-
gicos disponíveis nas escolas do ensino fundamental, que apenas 23,8%
dispõem de internet para os alunos, e apenas 33,5% contam com internet
destinada ao ensino aprendizagem. Além disso, os dados evidenciam
que 38,3% e 23,8% das escolas ofertam computador de mesa e portátil
aos alunos, respectivamente. Com esse cenário, como fazer com que,
na escola, os alunos adentrem os espaços onde os gêneros digitais são
constituídos se não há recursos disponíveis para fazê-lo?
As práticas de leitura contemporâneas são resultado de mudanças
sociais que reconfiguraram suportes, produção, apresentação do texto
(design) e, em decorrência, os modos de ler e o papel do leitor. Para Rojo
(2013), as mudanças relativas aos meios de comunicação e à circulação
da informação, bem como o surgimento e a ampliação de acessos às
tecnologias digitais intensificaram e diversificaram a circulação da
informação, implicando em novas situações de leitura-autoria. Nesse
sentido, é a partir dessas situações que são gerados os gêneros digitais.
Marcuschi e Xavier (2010) apontam que os gêneros que emergem
do âmbito digital são relativamente variados, manifestando aspectos
inerentes ao contexto impresso e oral, sendo vistos como formas híbridas
que evocam diversas esferas de comunicação humana, moldando-se ao
ambiente virtual e exigindo dos indivíduos novas habilidades de escrita
e leitura.
Em consonância, Rojo e Moura (2019) fazem menção a um termo
que caracteriza o leitor contemporâneo: “lautor”, neologismo que indica
que o leitor não desempenha apenas a função de ler, visto que age sobre
o texto, tornando-se, também, um autor. Há, ainda, um tipo de leitor
mais atual, denominado por Santaella (2013) como ubíquo, que emerge
nos espaços de hipermobilidade das redes sociais e está continuamente
situado nas interfaces de duas presenças simultâneas, a física e a virtual.
A ideia de ubiquidade, mencionada pela autora, abrange a possibilidade
de o leitor ir de um lugar a outro em qualquer tempo, o que também é
facilitado pela hiperlinkagem que caracteriza o ambiente da web.

79
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Santaella (2013) aponta para o fato de que a relação do ensino com


o contexto digital exige uma programação complexa e integrativa. Mas
como, dentro do contexto da escola pública, que é o que nos interessa,
isso poderia acontecer? Antes de tudo, é preciso considerar as novas
linguagens (hibridizadas, reconfiguradas) e as formas de ler, uma vez
que já fazem parte do dia a dia da maior parte dos alunos, sendo que essa
“consideração” adentra a escola por meio do currículo e dos materiais
didáticos, vide o exemplo da BNCC e do último ciclo do Programa
Nacional do Livro Didático (BRASIL, 2018).
A BNCC, aliás, considera que a inclusão de práticas contempo-
râneas de linguagem (frisam-se aqui as digitais) é um fator importante
de acesso às esferas da vida pública, do trabalho e pessoal (BRASIL,
2018). Deve haver, portanto, uma preocupação com o modo como os
gêneros advindos do contexto digital são trabalhados em sala de aula
e nos livros didáticos, de forma a evitar uma análise superficial. Nesse
sentido, conforme a BNCC, no eixo leitura estão todas as práticas de
linguagem decorrentes da interação leitor-ouvinte-espectador, por meio
de textos escritos, orais ou multissemióticos.
Sendo assim, são consideradas sete dimensões principais que se
associam a ações específicas de leitura (BRASIL, 2018). Na dimensão
“condições de produção e recepção de textos”, estão a relação do texto
com suas condições de produção e seu
contexto sócio-histórico de circulação; análise de usos e funções
do gênero textual; reflexão sobre novos gêneros e linguagens próprios
da cultura digital; apreciação e valorações éticas, políticas ideológicas;
análise de diferentes formas de manifestação da réplica ativa36 dos textos
que circulam nas redes sociais.
Já na dimensão “dialogia e relação entre textos”, estão a identifi-
cação e reflexão sobre as diferentes perspectivas ou vozes presentes no
texto, incluindo a atividade de relacionar intertextualidade e interdiscur-
sividade. Por sua vez, em “reconstrução da textualidade”, encontram-se

36 
A réplica ativa demonstra que o leitor não se restringe à observação, como coloca
Rojo (2007), ele contrapõe ao enunciado alheio a própria voz, que dialoga com o outro.
80
Estudos em Cas@

as relações que podem ser estabelecidas entre as partes do texto, iden-


tificando repetições e substituições, por exemplo, bem com as relações
lógico-discursivas variadas. Complementar a essas duas práticas, há a
seleção e hierarquização de informações.
À “reflexão crítica sobre as temáticas e validade das informações”
associa-se a reflexão crítica sobre a fidedignidade das informações,
assumindo posicionamento. No aspecto “efeitos de sentido e recursos
estilísticos e multissemióticos”, têm-se a identificação dos implícitos
e dos efeitos de sentido decorrentes de usos específicos da linguagem,
da escolha e formatação de imagens, da escolha de volumes, timbres,
intensidade, pausas e ritmos.
A dimensão “estratégias e procedimentos de leitura” apresenta
o maior número de práticas em comparação às outras, para esse ponto
são mobilizadas ações como as de seleção de procedimentos de leitura
adequados a diferentes objetivos e interesses, consideração dos objeti-
vos de leitura, relação entre o texto e conhecimentos prévios, dentre
outras. Por fim, tem-se a dimensão “adesão às práticas de leitura”, em
que é necessário demonstrar interesse e envolver-se pela leitura de livros
literários, textos de divulgação científica e os da esfera jornalística que
circulam em várias mídias; ter receptividade com textos que rompam
seu universo de expectativas, que representem desafio em relação as suas
experiências anteriores de leitura.
Tão logo se deu a homologação da Base, em dezembro de 2017, os
livros didáticos começaram a incorporar suas diretrizes, modificando-se
em diversos aspectos, com vistas a desenvolver nos alunos as habilidades
propostas. Tendo isso em vista, investigamos as dimensões consideradas
pela BNCC com foco no eixo leitura, procurando averiguar até que
ponto o livro didático atende ao que consta no documento no que diz
respeito aos gêneros digitais.

METODOLOGIA

O objeto deste estudo são os gêneros digitais presentes nos livros


coleção “Tecendo linguagens”, do 6º ao 9º do ensino fundamental. Para

81
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

a escolha do material, levou-se em consideração o fato de ser integrante


do último ciclo do PNLD (2017-2020) e ser adotado na escola municipal
Hildo Oliveira Rocha, situada em Cantanhede -MA, onde uma das
autoras desenvolve suas atividades.
A pesquisa adota uma abordagem qualitativa, que, conforme
Correa (2008), é uma técnica de pesquisa que busca entender a dinâmica
de um objeto de estudo, sem preocupações relacionadas a números e a
quantidades. Baseado no proposto por Gil (2002) com relação ao método
quantitativo, foram definidas sequências de atividades que envolvem a
redução de dados, categorização desses dados e sua interpretação.
Do ponto de vista de seus objetivos, trata-se de uma pesquisa
descritiva, pois o objetivo foi descrever o modo como se conduz a lei-
tura dos gêneros digitais nos livros didáticos. Correa (2008) ressalta
que o método descritivo considera o conhecimento prévio acerca desse
objeto e sua contextualização. Com base nos procedimentos técnicos, a
pesquisa se classifica como documental, pois vale-se de livros didáticos
como recurso para a investigação. Nesse sentido, Gil (2002) lembra que
a pesquisa documental parte de materiais que não receberam ainda um
tratamento analítico, ou que podem ser reelaborados de acordo com os
objetos da pesquisa.
Inicialmente, procedeu-se à leitura e análise das dimensões refe-
rentes às práticas leitoras propostas pela BNCC, uma vez que elas foram
utilizadas para averiguar como os gêneros digitais são abordados, tendo
em vista o eixo da leitura. Dessa forma, procedeu-se à análise do sumário
dos volumes, considerando os gêneros dispostos na seção “Prática de
leitura”. Os dados foram organizados em quadros para cada ano/série,
de modo a se visualizar mais sistematicamente os gêneros trabalhados
por capítulo.
Depois de identificados quantos e quais gêneros digitais estão
presentes na coleção, nas seções assinaladas, analisou-se como o gênero
digital foi abordado e as atividades associadas a ele.

82
Estudos em Cas@

ANÁLISE DOS DADOS

Os livros investigados são os volumes do 6º ao 9º do ensino fun-


damental pertencentes à coleção “Tecendo linguagens”, de Tania Amaral
Oliveira e Lucy Aparecida Melo Araújo, Editora IBEP, referentes à 5ª
edição, ano 2018. As obras integram, portanto, o último ciclo do Pro-
grama Nacional do Livro Didático (PNLD). Conforme exposto pelas
autoras no manual do professor, a coleção objetiva “oferecer condições
para o aluno compreender a complexidade da realidade, aprimorar sua
capacidade comunicativa e ampliar, significativamente, sua inserção no
espaço em que vive.” (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2018, p. 8).
Os livros são organizados em doze seções, sendo os conteúdos
dispostos ao longo de quatro unidades, cada uma composta por dois
capítulos. Com base no foco deste trabalho, analisou-se a seção denomi-
nada “Prática de leitura”, que se subdivide em duas seções: “Por dentro
do texto” e “Linguagem do texto”.
De modo a se ter uma visão geral dos gêneros trabalhados em
cada ano/série e de averiguar aqueles próprios do contexto digital, foi
realizado um levantamento de todos os gêneros textuais apontados
no sumário. A partir disso, percebeu-se a presença de poucos gêneros
do contexto digital no rol de conteúdos adotado na coleção, o que faz
com que se questione o “não espaço” ocupado por esses gêneros, em
específico. O gênero digital identificado no capítulo 2 do volume 6º
ano foi o ciberpoema. Já as “mensagens instantâneas” estão presentes
no capítulo 1 do volume 7º ano, sendo que os demais volumes (8º e 9º)
não apresentam nenhum gênero digital.
Apesar de as autoras afirmarem, nos pressupostos teórico-meto-
dológicos da coleção, que os livros oferecem uma diversidade de textos
interessantes de variados gêneros, o que se percebe é a preferência por
aqueles vinculados à cultura impressa, sendo que, dentre os mais utilizados
ao longo das obras estão a reportagem, a notícia e o romance, gêneros
típicos da esfera jornalística e literária e que dispõem de prestígio social.
Outro ponto importante é que as autoras explicitam assumir a
concepção de leitura proposta pela BNCC, compreendendo-a como uma
83
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

prática que “não diz respeito somente ao texto escrito, mas também a
imagens estáticas ou em movimentos e ao som, que acompanha e cos-
significa em muitos gêneros digitais”. (BRASIL, 2018, p. 70). Como
visto, embora reconheçam o destaque e a necessidade do trabalho com
gêneros digitais pela própria concepção de leitura assumida, poucos são
os gêneros desse contexto trabalhados pela coleção. Nesse sentido, cabe
destacar que, apesar de entenderem que o ato de ler vai além do escrito,
acabam por organizar um currículo com grande destaque para gêneros
preponderantemente escritos, em que o verbal é o foco.
Além disso, as autoras afirmam que, “quanto mais próximos os
elementos textuais estiverem do conhecimento do aluno, maior será a
chance de êxito na leitura.” (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2018, p. 14). Não
cabe aqui discutir os graus de importância de um gênero em relação a
outro, no entanto, é notável a discrepância entre o assumido teorica-
mente e o exposto curricularmente, visto que alguns gêneros, inclusive,
são trabalhados exaustivamente e repetidos em outras unidades de um
mesmo volume ou em volumes posteriores, como é o caso da notícia,
por exemplo. Complementar a isso, tem-se o fato de alguns gêneros
trabalhados serem menos comuns ao dia a dia do aluno e, portanto, mais
distantes de seu conhecimento, todavia são priorizados em detrimento
de gêneros digitais mais populares entre jovens/adolescentes. A título
de exemplo, destaca-se a opção das autoras pelo “diário íntimo” quando
poderiam utilizar os “vlogs”.
Rojo (2013) sugere que se busque formular uma pedagogia voltada
para os multiletramentos, devendo-se considerar a aprendizagem de
leitura que incorpore outras linguagens, compreendendo que conteúdos
significativos também são construídos nas práticas sociais de linguagem
que circulam no ambiente digital. A referida autora atenta para o fato
de que esses novos letramentos são menos centrados na materialidade
textual, menos individualizados e menos autorais que os letramentos
tradicionais.
O ciberpoema, que aparece na página 63 do volume 6º ano,
apresenta-se associado ao poema visual, não havendo um destaque para

84
Estudos em Cas@

o gênero digital em si, apenas uma menção, colocando-o como uma


possibilidade de acontecimento do poema visual e, na verdade, pode ser
entendido assim, pois, como afirmam Marcuschi e Xavier (2010), alguns
gêneros digitais são transmutações de outros tradicionais.
Observou-se que a única característica mencionada a respeito do
ciberpoema foi a interação estabelecida com o leitor, esclarecendo-se,
por conseguinte, que o computador é o “espaço” onde esse gênero se
concretiza, o que não é suficiente para deixar claro o contexto em que ele
surge. Conforme Marcuschi e Xavier (2010) o computador é a máquina
que fornece os recursos para que se construa o gênero digital, no entanto,
os ambientes virtuais vão além da máquina em si. Nessa perspectiva, o
termo mais adequado seria “ambiente web”.
Percebe-se a presença da dimensão “dialogia e relação entre tex-
tos” quando as autoras estabelecem uma conexão entre os gêneros, mas
que poderia ter sido aprofundada, expandindo a dimensão “condições
de produção e recepção de textos”, principalmente no que se refere ao
ciberpoema. Nesse sentido, suas características poderiam ter sido mais
bem explicitadas, assim como seu contexto de produção, que acabou
sendo resumido ao instrumento (computador).
Observa-se, também, que a dimensão “adesão às práticas de leitura”
poderia ter sido estimulada através de links ou atividades complementares
que levassem o aluno a se aprofundar no ciberpoema. Por outro lado,
compreende-se a falta das dimensões mencionadas, tendo em vista que
o foco não era o gênero digital. Com relação a isso, cabe lembrar que
uma das principais inovações da BNCC foi justamente o destaque para
as práticas contemporâneas de linguagem e para os gêneros digitais, em
que boa parte dessas práticas acontecem. Na contramão disso, percebe-se
que o gênero digital é tido como um “pretexto” para que se possa afirmar
que o material didático está de acordo com as proposições da Base.
Ao contrário do ciberpoema, o gênero “mensagem instantânea”,
presente no volume referente ao 7º ano, obteve mais destaque e profun-
didade na seção. O contexto do capítulo em que o gênero foi inserido
é apropriado, já que aborda a “comunicação em diferentes linguagens”.

85
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

As autoras optaram por deixar as mensagens instantâneas como um


dos últimos tópicos do capítulo, justamente, para construir uma linha
do tempo que vai de práticas mais rudimentares até as mais modernas.
O assunto é introduzido por duas perguntas, de forma a ativar o
conhecimento prévio do aluno, aspecto que é englobado pela dimensão
“estratégias e procedimentos de leitura”. São preservadas, na mostra do
gênero, as características típicas do contexto de produção e percebe-se,
pelo layout, que se trata de mensagens enviadas a partir de um celular.
As perguntas a, b e c da 1ª questão (página 36), levam o aluno a
localizar informações no texto e fazer inferências, pontos que também
são relacionados à dimensão “estratégias e procedimentos de leitura”.
Dentro dessa mesma dimensão tem-se ainda as questões 6ª e 7ª (página
38), que procuram evidenciar os recursos não verbais utilizados no
gênero. Ao longo da página 37, observa-se que na 3ª questão, ao tratar de
algumas onomatopeias típicas de mensagens instantâneas, trabalha-se a
dimensão “efeitos de sentido e recursos linguísticos e multissemióticos”.
Percebe-se que o conceito do gênero somente é apresentado na
4ª questão, na qual é enfatizado o uso das expressões reduzidas. Outro
ponto interessante é que as autoras parecem ter optado por trabalhar as
características do gênero de maneira espaçada ao longo das perguntas, o
que requer uma boa capacidade de observação do aluno. Acredita-se que
a dimensão “condições de produção e recepção dos textos” poderia ter
sido melhor enfatizada, em especial no que diz respeito à circulação, uso
e função das mensagens instantâneas. Na mesma esteira, aproveitando
o contexto da unidade, poderia ter sido promovida uma reflexão sobre
como as formas de se comunicar se modificaram ao longo do tempo e
foram impactadas pela tecnologia, o que estaria de acordo, também,
com a dimensão “reflexão crítica sobre as temáticas tratadas e validade
das informações”.
A dimensão “dialogia e relação entre textos” está presente na 5ª
questão, na qual as autoras destacam um outro gênero digital, denomi-
nado “gif ”, bastante utilizado em mensagens instantâneas. Dessa forma,
fica evidente que no volume referente ao 7º ano, o gênero digital foi

86
Estudos em Cas@

tratado com mais profundidade, tendo em vista que a maior parte das
dimensões relacionadas à leitura foram contempladas.
Cabe evidenciar que, posteriormente ao trabalho com as mensa-
gens instantâneas, ainda no mesmo capítulo, as autoras consideraram
como gênero digital o e-mail. Esse gênero não foi destacado no rol de
conteúdos das unidades, talvez porque ele foi inserido como um gênero
complementar à carta pessoal, objetivando estabelecer um paralelo entre
os dois, no entanto, cabe colocar a necessidade de inseri-lo na lista de
conteúdo, tendo em vista que ele compõe uma das seções do livro.
Nota-se que o e-mail foi trabalhado de modo semelhante às mensa-
gens instantâneas, no entanto, a dimensão “dialogia e relação entre textos”
teve ênfase maior. Semelhante ao realizado com o gênero mensagem
instantânea, as autoras iniciam com a dimensão “estratégias e procedi-
mentos de leitura”, fazendo uso de questões que promovem a inferência
e o levantamento de hipóteses. Observa-se, também, a apresentação do
conceito de maneira antecipada e resumida, e a preservação do contexto
em que o e-mail circula, representando-o de modo fidedigno.
Alguns elementos da estrutura do e-mail são apresentados na
5ª questão (página 44), sendo que, posteriormente, na 7ª questão, são
dispostas algumas de suas características em contraponto às da carta
pessoal. De acordo com Marcuschi e Xavier (2010), quanto ao formato
textual, é normal compará-lo com uma carta, um bilhete ou um recado.
Percebe-se que o foco, no entanto, é a intencionalidade e a lin-
guagem aplicadas ao e-mail, aspectos que se encaixam na dimensão
“condições de produção e recepção de textos”. Como houve essa ênfase no
quesito linguagem, teria sido apropriado o encaixe da dimensão “recons-
trução da textualidade”, tendo em vista a progressão da mensagem, as
partes do texto semelhantes às da carta pessoal e como elas podem ser
empregadas no e-mail. Nesse sentido, outros aspectos poderiam ter sido
destacados, como a possibilidade de anexar documentos com indicação
automática ao receptor, inserção de carinhas, desenhos e até mesmo de
voz, corpo da mensagem com ou sem vocativo, texto e assinatura e o

87
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

encadeamento de turnos, que corresponde a uma sequência de e-mails


(MARCUSCHI; XAVIER, 2010).
Já a 8ª questão (página 45) abrange a dimensão “reflexão crítica
sobre as temáticas tratadas e validade das informações”, ao promover
uma discussão sobre o direito à privacidade das mensagens e corres-
pondências. Atenta-se para o fato de as autoras considerarem o e-mail
como gênero textual, o que fica evidente ao afirmarem nas orientações
ao professor que as atividades da seção “Conversa entre textos”, em que o
e-mail aparece, “têm como objetivo promover a comparação de gêneros
textuais diferentes.” (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2018, p. 43). Essa visão
está de acordo com a de Marcuschi e Xavier (2010, p. 92) ao entende-
rem que “o meio de transmissão de mensagens eletrônicas e-mail gerou
um novo gênero textual, também denominado e-mail que gera textos
diversos que se distinguem dos demais textos”.
Por outro lado, pontos de vista teóricos mais recentes concebem
o e-mail como um suporte e não como gênero, como aponta Bezerra
(2017) ao afirmar que, no suporte instanciam-se textos em diversos
gêneros dotados de variados propósitos comunicativos. Apesar de ser um
ponto de divergências, acredita-se que esses questionamentos deviam ser
suscitados ao professor ao longo das orientações, justamente para que
ele tenha ciência daquilo que está sendo debatido em torno do assunto
e possa construir seu próprio entendimento, o que evitaria uma possível
confusão ao considerar, por analogia, suportes como gêneros textuais.

RESULTADOS

A partir da análise, ficou evidente que, apesar de o livro didá-


tico estar, em tese, adaptado às proposições da BNCC, a inserção de
gêneros digitais ainda é tímida e deficiente com relação àqueles da
cultura impressa. Dessa forma, ainda que a BNCC deixe claro que a
leitura ultrapassa o limite do verbal, atentando para a importância da
multissemiose, o livro didático acaba privilegiando gêneros predomi-
nantemente impressos, em que o verbo é o foco. Além disso, percebe-se

88
Estudos em Cas@

que os gêneros mais trabalhados são aqueles consolidados socialmente


e que recebem um prestígio maior na escola.
Mesmo assumindo nos pressupostos teórico-metodológicos que a
leitura é mais eficaz quando está mais próxima à realidade do aluno, o
material didático dá preferência a gêneros mais formais e menos populares
no contexto juvenil, como a carta de reclamação e a declaração legal. Nesse
sentido, o tratamento dado pelo livro didático aos gêneros digitais, assim
como o espaço fornecido a eles nem sempre são suficientes e adequados,
sendo reduzidos a recurso de comparação (caso do ciberpoema), o que
não permite que seu lugar, seu contexto social e histórico, bem como
suas características sejam devidamente compreendidos.
Por outro lado, ao obter destaque no material didático, os gêneros
digitais mostram grande potencial exploratório, vide que ao abordar o
gênero mensagens instantâneas, boa parte das dimensões relacionadas
à prática leitora foi abrangida. Por fim, em alguns momentos, sente-se
a necessidade de melhor aproveitamento do gênero no quesito leitura,
deixando mais claro e explicado seu conceito e caracterização, assim
como o estabelecimento de links com o real (a situação de uso), para
que a análise proposta pelo livro não se restrinja ao campo da abstração.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base no levantamento bibliográfico e na análise de dados,


percebeu-se que, apesar de não ser uma temática nova, os gêneros digi-
tais ainda encontram certa resistência para que sejam assumidos como
conteúdo nos livros didáticos de português. Por outro lado, já se percebe
um movimento favorável no sentido de tornar o ambiente escolar mais
democrático, uma vez que se tem buscado, ao menos curricularmente,
integrar outras formas de linguagens e gêneros mais próximos da rea-
lidade contemporânea e discente. Juntam-se ao exposto as mudanças
com relação à leitura, ficando evidente que o ato de ler ganhou uma
perspectiva interativa, que deve ser considerada tanto nos materiais
didáticos quanto na metodologia docente. Além disso, constatou-se que
o papel do leitor é remodelado, uma vez que ganha mais autonomia e

89
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

dispõe de ferramentas para intervir diretamente no texto. Sendo assim,


mostra-se a necessidade de se atentar para as práticas de ensino, ana-
lisando e questionando teorias e materiais didáticos, além de procurar
aproximá-las desse novo contexto digital, marcado por atividades mais
autônomas e democráticas.

REFERÊNCIAS
BEZERRA, Benedito Gomes. Gêneros textuais no contexto brasileiro: questões (meta)
teóricas e conceituais. São Paulo: Parábola Editorial, 2017.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.

BRASIL. Ministério da Educação. Censo escolar 2020: divulgação de resultados.


Brasília, 2020.

CORREA, Luiz Nilton. Metodologia científica: para trabalhos acadêmicos e artigos


científicos. Florianópolis: Do autor, 2008.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projeto de pesquisa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

MARCUSCHI, Luiz Antônio; XAVIER, Antonio Carlos (org.). Hipertexto e gêneros


digitais: novas formas de construção de sentido. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

OLIVEIRA, Tânia Amaral; ARAÚJO, Lucy Aparecida Melo. Tecendo linguagens:


língua portuguesa, 6º ano. 5. ed. São Paulo: IBEP, 2018.

OLIVEIRA, Tânia Amaral; ARAÚJO, Lucy Aparecida Melo. Tecendo linguagens:


língua portuguesa, 7º ano. 5. ed. São Paulo: IBEP, 2018.

ROJO, Roxane (org.). Escol@ conectada: os multiletramentos e as TICs. São Paulo:


Parábola, 2013.

ROJO, Roxane. Letramentos digitais – a leitura como réplica ativa. Trab. Ling. Aplic.,
Campinas, v. 46, n. 1, 2007.

ROJO, Roxane; MOURA, Eduardo. Letramentos, mídias, linguagens. São Paulo:


Parábola, 2019.

SANTAELLA, Lúcia. Comunicação Ubíqua: repercussão na cultura e na educação.


São Paulo: Editora Paulus, 2013.

90
CAPÍTULO 7 -LEITURA NA SALA DE AULA

Maria de Fátima de Mello37

INTRODUÇÃO

Este capítulo visa fazer algumas reflexões sobre o ensino de leitura


na Educação Básica e está dividido em quatro seções: a primeira, essa
introdução que está sendo feita. Em seguida abordaremos o ensino de
leitura. Na terceira seção, trataremos da leitura e o processo inferencial.
Na quarta seção, leitura e BNCC e, em seguida, as considerações finais.
Alguns problemas que contribuem para a falta de motivação para
a leitura por parte dos alunos podem estar relacionados à concepção de
leitura como tarefa de decifração de vocábulos, leituras obrigatórias como
requisito parcial para aprovação, exercícios de identificação de hiatos,
ditongos etc. Muito tem sido feito para eliminar a prática de leitura
como avaliação, tendo em vista que já foi comprovado que essa prática
não contribui para a efetiva formação de leitores, pois a atividade passa
a ser considerada um dever e não um prazer.
 A leitura prescritiva também reduz e empobrece porque acaba se
tornando uma interpretação autorizada, uma leitura autoritária, colocando
em cena somente uma resposta única e incontestável apontada pelo
professor com base na resposta do livro didático. Ademais, a experiên-
cia dos alunos e seus pontos de vista são descartados, considerando-se
leitura proficiente aquela com a boa interpretação que fica mais próxima
da autorizada, indo na direção oposta do que se espera do ensino e da
prática da leitura na qual a experiência do leitor é indispensável para
construir o sentido. “Não há leituras autorizadas num sentido absoluto,
mas apenas reconstruções de significados”. (KLEIMAN, 2012, p. 34).
De acordo com Santos e Souza (2011), o ensino de leitura na escola
ainda parece ocorrer com base em ensaio e erro. Concordamos com esse
pensamento e entendemos que falta uma disciplina específica sobre o

37 
Doutoranda em Linguística (UFU). CV: http://lattes.cnpq.br/7882774726573500
91
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

ensino de leitura, com uma proposta pedagógica clara e definida, com


embasamento teórico guiando a prática do ensino de leitura. 
Outro ponto que deve ser salientado é que sem propósito, sem
objetivo, a leitura é realizada com desmotivação, o aluno não amplia
seus conhecimentos enciclopédicos e a aprendizagem fica comprometida.
Faz-se necessário evitar que essa atividade se torne mecânica, de simples
passagem de olhos sobre linhas de um texto, com ausência de /engaja-
mento e uso do conhecimento prévio, pois assim não há possibilidade
de apreensão efetiva dos sentidos do texto. Com base nesses aspectos
e em nossa experiência em sala de aula, acreditamos que o processo de
ensino de leitura por meio da instrução de estratégias pode auxiliar o
aluno a perceber suas próprias ações. 
O Solé (1998, p. 18) destaca que a “leitura decorrente de processo
de ensino não é apostar em um método único, fechado, que pode ser
aplicado a qualquer caso, contexto ou aluno”. Pelo contrário, a meto-
dologia deve levar em consideração o indivíduo, seus conhecimentos
prévios, seus objetivos e suas condições. Kleiman (2002, p. 51) também
segue nessa linha de pensamento:
[...] o ensino e modelagem de estratégias de leitura
não consiste em modelar um ou dois procedimentos,
mas em tentar reproduzir as condições que dão a esse
leitor proficiente essa flexibilidade e independência,
indicativas de uma riqueza de recursos disponíveis.

Para essas autoras, a leitura é uma atividade que necessita de


instrução explícita e sistemática, mas o aluno deve ter a oportunidade
de construir seus conhecimentos e aprimorar suas competências com o
próprio trabalho, tendo independência em relação à ação docente.
Boruchovitch (2001, p. 20-21), aponta que é possível ensinar os
alunos a fazer notas de aulas, a sublinhar pontos importantes de um
texto, a monitorar a compreensão na hora da leitura, usar técnicas de
memorização, fazer resumos, planejar, estabelecer metas, entre outras
estratégias. Isso significa que eles vão adquirir um metaconhecimento
compreendendo como e quando usar essas estratégias.

92
Estudos em Cas@

Solé (1998), também chama a atenção para o fato de que o ensino


e a prática de leitura não devem ser restritos às atividades de leitura em
voz alta, de leitura de fragmentos, interrupções, atividades descontex-
tualizadas e eventualmente, a compreensão da leitura. Nesse aspecto,
há que destacar o papel do professor em relação ao acesso à escrita e
aos discursos que se organizam a partir dela e para ser realizado com
efetividade, deve contar com instrução, visto que ler é um comporta-
mento aprendido e, por isso, os procedimentos e estratégias devem ser
ensinados. (BRITO, 1997).

O ENSINO DE LEITURA

Diversos autores defendem que para o ensino da leitura, é necessá-


rio abordar o texto estrategicamente e realizar a leitura com o propósito de
produzir sentidos. Há que se considerar o ensino de estratégias de leitura,
pois desenvolve habilidades linguísticas características do bom leitor. 
A compreensão é ativada a partir do comportamento verbal e não
verbal do leitor, o que nos remete à relação que o leitor estabelece com
o texto, por exemplo, com as perguntas que ele faz, o tipo de respostas
que ele dá, dos resumos e paráfrases feitas por ele, bem como pela forma
como ele manipula o texto: se sublinha, se apenas folheia sem se deter
em parte alguma, se passa os olhos rapidamente, se relê o texto etc.
Importa ressaltar conforme explica Solé (1998) que, antes da
seleção das estratégias é preciso considerar:
1.  o objetivo da atividade de leitura específica;
2.  a natureza e a propriedade do texto;
3.  a situação e a condição de leitura (espaço, tempo e estado
físico e emocional do leitor);
4. os conhecimentos prévios relevantes de que se dispõe para o
efetivo contato com o material escrito específico;
5. a competência em leitura, ou seja quanto e como se lê.
Santos e Souza (2011) destacam que o professor pode mostrar para
os alunos como ele utiliza o seu conhecimento prévio nos textos que lê,

93
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

ensiná-los a fazer conexões entre suas experiências, seus conhecimentos


sobre o mundo e suas leituras anteriores, relacionar o que eles já sabem
com a nova informação sobre o texto lido e assim contribuir para que
os estudantes percebam como ter entendimento sobre o texto.
Ademais, quando o aluno tem uma experiência semelhante àquela
do personagem da história, ele está mais apto a entender os motivos,
pensamentos e sentimentos do personagem. Portanto, o professor, ao
ensinar leitura, deve levar o aluno a perceber que nesta atividade, seus
conhecimentos prévios são ativados sendo esta uma oportunidade de
eles aprenderem aspectos relevantes sobre o texto.
Pelo exposto até aqui, entende-se que é necessário promover
estratégias específicas e treino regular para aprimorar a competência
em compreensão de texto e que as estratégias devem ser uma indicação,
não devem ser prescritivas, nem tão detalhadas a ponto de delimitarem
o caminho a ser seguido pelo aluno. Assim, o ensino de leitura deve
contar com o ensino de estratégias adequadas para compreensão e isso
requer uma intervenção explicitamente dirigida. Além disso, é bom
lembrar que é o professor o mediador nesse processo. Lembramos o
que o aluno precisa da informação, do apoio, do incentivo e dos desafios
proporcionados pelo professor.
De acordo com Solé (1998, p. 18) “é necessário dotar de conteúdo
o próprio processo de mediação, assentá-lo em bases conceituais sólidas
e repensar constantemente o ensino dessa atividade”. Concordamos
com a autora quando ela chama atenção para o fato de a leitura ser uma
“questão de escola, de projeto curricular e de todas as matérias, não sendo
exclusividade da disciplina de Língua Portuguesa. Isso significa que o
processo de ensino de leitura deve ser estendido permanentemente, ao
longo de toda a escolaridade. As atividades de leitura devem ser plane-
jadas e organizadas e o professor pode orientar os alunos a acionarem
o conhecimento prévio nos níveis linguístico, textual e enciclopédico
ajudando-os a se orientarem por pistas, previsões e inferências diante da
leitura de textos de gêneros diversos. Assim, quanto mais conhecimento

94
Estudos em Cas@

textual o leitor tiver e quanto maior a exposição a todo tipo de texto,


mais efetiva será a compreensão.
Importa destacar ainda que a pré-leitura é uma forma de desper-
tar o interesse do aluno para o texto, mostrando quais os objetivos da
leitura e assim ele ter a possibilidade de lançar mão de procedimentos
e estratégias relevantes no processo inferencial.

LEITURA E PROCESSO INFERENCIAL

 Vimos que a leitura é uma atividade cognitiva altamente sofisticada


que envolve habilidades e procedimentos cognitivos múltiplos, como
compreensão, memória, atenção e valorização do conhecimento prévio.
Ainda de acordo com Silveira (2005), estão envolvidas nessa atividade
as estratégias cognitivas e metacognitivas que auxiliam o leitor no ato
de ler e a compreender o que lê.
Abordar a leitura nos leva à questão da produção de sentidos
constituídos no contexto de interação recíproca entre autor e leitor via
texto, os quais se expressam diferentemente, de acordo com a subjeti-
vidade de ambos, seus conhecimentos, suas experiências e seus valores.
Nesse aspecto, podemos inferir que o texto se constrói a cada leitura,
não trazendo em si um sentido preestabelecido pelo seu autor, mas uma
demarcação para os sentidos possíveis. Portanto, a compreensão não está
baseada apenas na informação linguística, mas na informação obtida
por meio da decodificação, fundada tanto nos elementos linguísticos
quanto na informação gerada a partir do conteúdo semântico do texto
ou de outros processos cognitivos que o leitor/ouvinte executa ao buscar
o(s) sentido(s) do texto. 
Considerando que a comunicação humana, oral ou escrita, é
eminentemente inferencial e que grande parte do conteúdo de um
texto deve ser inferido por meio de operações sociocognitivas, com base
tanto no conhecimento de mundo que o leitor/ouvinte detém em sua
memória, como no conhecimento que tem da língua, inferir é um ato
que requer um reconhecimento de proposições dadas que, associadas

95
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

às novas, permitem ao leitor estabelecer novos sentidos sobre um dado


novo(MARCUSHI, 1985).
Assim sendo, a leitura realizada por meio de um processo inferen-
cial permite o diálogo com outros textos e com outros leitores em outros
momentos de interação pela linguagem. De acordo com Koch (1993,
p.400), as “inferências podem ser vistas como processos cognitivos através
dos quais o ouvinte/leitor, partindo da informação textual explicitamente
veiculada e levando em conta o contexto, constrói novas representações
semânticas”. Isso significa que as inferências ocorrem sempre a partir
das informações presentes na base textual e com acréscimo de dados,
levando em conta o contexto. Dessa maneira, observa-se que há uma
variedade de inferências na leitura de um texto por leitores variados e
por um mesmo leitor em momentos distintos de leitura.
 Em relação às inferências, Marcuschi (1985), destaca dois tipos:
dedutiva – que reúne duas ou mais informações textuais que funcionam
como premissas para chegar a outra informação logicamente, e indutiva
– tomada de várias informações textuais para chegar a uma conclusão
com valor de probabilidade de acordo com o grau de verdade das pre-
missas. Para esse autor, o texto representa o elemento estimulador da
intermediação entre autor e leitor. 
O autor nos chama a atenção para uma espécie de encontro entre
os mundos do leitor e do autor no processo de compreensão de texto e
destaca o papel de ambos na elaboração de inferências. Para ele, há os
enganos da compreensão quando o leitor é guiado apenas pelos seus
conhecimentos de mundo em detrimento daquilo que o texto aponta.
Portanto, o leitor desempenha sempre um papel ativo na busca dos
sentidos e significados do texto e nesse processo aparecem as inferências
como componentes cognitivos relevantes para a leitura e compreensão
do que se lê. 
Por conseguinte, para uma leitura significativa do texto, quanto
mais conhecimentos forem partilhados entre autor e leitor, maior será a
possibilidade de compreensão das intenções do autor e do aproveitamento
das informações textuais. Entende-se que os processos inferenciais têm

96
Estudos em Cas@

relevância didática e podendo auxiliar o professor no ensino de leitura,


pois é importante que o aluno tenha a noção de texto como unidade
linguística de natureza comunicativa, afastando a ideia de que o texto
é algo pronto quanto ao sentido.
Assim, para Marcuschi (1985), o professor em sala de aula pode
trabalhar o texto dentro de perspectivas mais abrangentes desenvolvendo
exercícios que possibilitem ao aluno entender o implícito e as intenções
subjacentes do autor, propondo ao aluno olhar o texto de forma mais
ampla, observar as inferências como resultado da compreensão texto,
percebendo que essa compreensão vai refletir sobre o material lido.
 Para finalizar essa seção, lembramos o que nos diz Solé (1998), a
respeito do que é um leitor proficiente, aquele que não só compreende,
mas também sabe identificar suas incompreensões e realiza ações que
lhe permitem preencher lacunas de compreensão. 

LEITURA E BNCC

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é o documento


que define as aprendizagens comuns a serem desenvolvidas por todos os
alunos no decorrer da Educação Básica (BRASIL, p. 7, 2017) e aponta
para o desenvolvimento da leitura para e o aluno possa construir sentidos
coerentes em textos orais e escritos, produzir textos adequados às diversas
situações de interação e apropriar-se de conhecimentos e recursos linguís-
ticos que contribuam para o uso adequado da língua. Numa avaliação geral
da BNCC, observa-se uma concepção de linguagem e de subjetividade
já assumida em meados da década de 1990 pelos PCN, qual seja, a de
entender a linguagem como interação social. Assim, o ensino de Língua
Portuguesa está centrado na leitura, reflexão e produção de diversos gêneros
textuais contextualizado e articulado ao uso social da língua. 
Nos PCNs, a disciplina de Língua Portuguesa se organizava em
três grandes blocos de conteúdo: Língua Oral, Língua Escrita e Análise
e Reflexão sobre a língua. Na BNCC, as habilidades estão agrupadas em
quatro diferentes práticas de linguagem: Leitura, Produção de Textos,
Oralidade e Análise Linguística/Semiótica. Essa última se refere ao

97
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

estudo de textos em múltiplas linguagens, incluindo as digitais: como


os memes, os gifs, as produções de youtubers etc. 
Sabe-se que a Língua Portuguesa é um componente curricular
de extrema importância, pois está ligada ao pensamento, ao desenvol-
vimento da linguagem e dos multiletramentos e contribui efetivamente
para a formação do estudante. 
A BNCC enfatiza a formação do aluno leitor a partir dos campos
de atuação e das diferentes práticas de linguagem. Importa ressaltar que
para cada eixo, há um quadro que explicita como se relacionam as prá-
ticas de uso e de reflexão da língua. As habilidades de leitura aparecem
integradas aos campos de atuação, uma vez que a língua é estudada
sempre em relação ao seu uso social. Os campos de atuação são as áreas
de uso da linguagem, que aparecem organizados levando em consideração
os gêneros textuais produzidos na vida cotidiana, na vida pública, nas
práticas de estudo e pesquisa e no campo artístico/literário. Todas essas
práticas se dão nas diferentes esferas da comunicação social, traduzidas
na expressão “campos de atuação”. Assim, o documento destaca que a
atuação dos sujeitos ocorre pela leitura, escuta e produção (oral e escrita)
de textos, bem como pela reflexão sobre os recursos mobilizados nesses
textos, que se dá no eixo análise linguística.
 O documento considera que os textos são unidades concretas
dos gêneros praticados em cada um destes campos: os gêneros do dia a
dia (recados, bilhetes, diálogos, conversas, leituras de receitas, instru-
ções etc.); a produção artístico-literária em sua diversidade de gêneros;
os discursos das esferas públicas: jornalísticos, publicitários, políticos,
jurídicos, reivindicatórios etc.; os gêneros próprios da comunicação aca-
dêmica, em geral a distância, tais como relatórios, ensaios, projetos etc.;
e, por fim, os gêneros discursivos que circulam no mundo do trabalho. 
Além das práticas de linguagem, o ensino é centrado nos Multiletra-
mentos com as Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação des-
tacando dimensões ética, estética e política na produção de conhecimento.
A pandemia de Covid-19 que assolou o mundo em 2020 trouxe
reflexões para que a educação fosse repensada de inúmeras formas, desde

98
Estudos em Cas@

os meios e as ferramentas utilizadas à compreensão da relevância de cada


objeto do conhecimento nesse contexto, pois o acesso à informação é
um diferencial na vida do indivíduo.
Percebe-se que o documento enfatiza o papel da Língua Por-
tuguesa, quando informações são compartilhadas por diversos meios
mostrando-se a relevância do desenvolvimento de um leitor crítico capaz
de perceber as nuances ideológicas por trás de cada discurso produzido
e de verificar as fontes de informações que recebe comparando-as com
outras em um processo de curadoria e atento aos diferentes papéis sociais
deixando de ser consumidor apenas, mas ser um potencial produtor de
conhecimento e consciente da responsabilidade que isso suscita. 
Sobre a atividade de leitura, a BNCC (BRASIL, 2017) destaca:
(...) Que as práticas de compreensão e de produção
de texto são constitutivas da experiência de aprender e,
portanto, presentes em todas as áreas. Por isso, cabe à
área de Linguagens assegurar o direito à formação de
sujeitos leitores e produtores de textos que transitem com
confiança pelas formas de registro dos diversos compo-
nentes curriculares, salvaguardando suas singularidades,
e pelas práticas de linguagem que se dão no espaço
escolar, tais como: participar em debates, opinar
criticamente sobre um documentário ou uma pintura,
interagir com hipertextos da Web, buscar soluções para
um problema ambiental no seu entorno, dentre outras e
inúmeras possibilidades. (BRASIL, 2017, p. 30).

Cabe ressaltar que a leitura está presente em todos os componentes


curriculares, mas é ao professor de Língua Portuguesa que cabe trabalhar
com os gêneros e temas que são próprios a essa disciplina, desenvolvendo
com os estudantes os inúmeros gêneros pertinentes a essa área. Lem-
bramos que o documento aborda 10 competências: 
1. Conhecimento- valorizar e utilizar os conhecimentos histo-
ricamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e
digital para que o aluno possa entender e explicar a realidade,
continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma
sociedade justa, democrática e inclusiva.

99
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

2. Pensamento científico, crítico e criativo - exercitar a curiosi-


dade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências,
incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a ima-
ginação e a criatividade para que o estudante possa investigar
causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver pro-
blemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos
conhecimentos das diferentes áreas.
3. Repertório cultural - valorizar e fruir as diversas manifesta-
ções artísticas e culturais, das locais às mundiais para que o
aluno possa participar e entender práticas diversificadas da
produção artístico-cultural.
4. Comunicação- Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou
visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora
e digital, bem como o conhecimentos das linguagens artística,
matemática e científica para que ele tenha a possibilidade de
e expressar e partilhar informações, experiências, ideias e
sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que
levem ao entendimento mútuo.
5. Cultura digital - compreender, utilizar e criar tecnologias digi-
tais de informação e comunicação de forma crítica, significativa,
reflexiva e ética nas diversas práticas sociais para que o estudante
tenha a oportunidade de se comunicar, acessar e disseminar
informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e
exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.
6. Trabalho e projeto de vida- Valorizar a diversidade de saberes
e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e expe-
riências a fim de entender as relações próprias do mundo do
trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e
ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência
crítica e responsabilidade.
7. Argumentação - Argumentar com base em fatos, dados e
informações confiáveis e assim ter a possibilidade de formular,
negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns

100
Estudos em Cas@

que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência


socioambiental e o consumo responsável em âmbito local,
regional e global, com posicionamento ético em relação ao
cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.
8. Autoconhecimento e autocuidado- conhecer-se, apreciar-se
e cuidar de sua saúde física e emocional para compreender-se
na diversidade humana e reconhecer suas emoções e as dos
outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas.
9. Empatia e cooperação- exercitar a empatia, o diálogo, a reso-
lução de conflitos e a cooperação para fazer-se respeitar e
promover o respeito ao outro e aos direitos humanos, com
acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de
grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencia-
lidades, sem preconceitos de qualquer natureza.
10. Responsabilidade e cidadania - agir pessoal e coletivamente
com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e
determinação para tomar decisões com base em princípios
éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.
O documento apresenta diversas habilidades ligadas a cada compo-
nente curricular indicando a aprendizagem necessária a ser desenvolvida
em cada ano, com ênfase no uso significativo da língua, ou seja, a uma
prática de linguagem. Portanto, mais do que compreender e dominar
conteúdos, conceitos e processos descritos pelas habilidades, a BNCC
aponta a necessidade de se ter clareza de como estes se relacionam e se
aplicam, por exemplo, nos diversos textos usados em diferentes campos de
atuação: na vida cotidiana, na imprensa, nos espaços de debate público etc. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fica claro pela leitura da BNCC que a escola é o lugar onde


serão desenvolvidas estratégias envolvendo os níveis linguístico, textual
e discursivo para que o estudante, por meio da atividade de leitura, tor-
ne-se um usuário proficiente da língua. Ademais, o documento destaca
as habilidades que devem ser enfatizadas, o que muito contribui para o
101
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

trabalho do professor em sala de aula. Nesse aspecto, a BNCC mostra a


relevância de os professores repensarem constantemente a prática peda-
gógica examinando teorias e participando de formações continuadas. 
Portanto, o documento destaca que o aluno deve ser capaz de ler,
escutar e produzir textos orais, escritos e multissemióticos que circulam
em diferentes campos de atuação e mídias, com compreensão, autonomia,
fluência e criticidade de modo a se expressar e partilhar conhecimento,
experiências, ideias e sentimentos reconhecendo o texto como lugar de
manifestação e negociação dos sentidos, valores e ideologias.
Importa refletir que a leitura na escola não deve ser tratada apenas
como atividade de decodificação, para efeitos avaliativos, ou pano de
fundo para realização de tarefas escolares, como por exemplo, o emprego
da pontuação ou conhecimento do aluno sobre o léxico, pois essa visão
é muito empobrecedora que inibe o leitor e não promove sua formação
nem contribui para ela. 

REFERÊNCIAS
BORUCHOVITCH, Evely. Algumas estratégias de compreensão em leitura de
alunos do ensino fundamental. Psicologia escolar e educacional, Campinas, v. 5, n. 1,
jun. 2001. p. 19-25. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/pee/v5n1/v5n1a03.pdf >.
Acesso em: 14 maio 2015.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília.Ministério


da Educação, 2017.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Introdução. Ensino Fundamental.


Brasília: MEC/SEF, 1998. 

BRITTO, Luiz Percival Leme. A sombra do caos. Campinas: Mercado das Letras, 1997
KLEIMAN, A. Oficina de leitura: teoria e prática. 14. ed. São Paulo: Editora Pontes, 2012.

KOCH. A produção de inferências e sua contribuição na construção do sentido.


DELTA, 9, p.399-416 (nº especial). 1993.

MARCUSCHI . Leitura como processo inferencial num universo cultural cognitivo.


Leitura, Teoria e Prática. 1985. 

SANTOS, A.M.M.C.; SOUZA,R.J. Andersen e as estratégias de leitura. Atividades


práticas no cotidiano escolar.Campinas: Mercado das letras, 2011.

SOLÉ, I. Estratégias de leitura, Porto Alegre: Editora Artmed, 1998.

102
CAPÍTULO 8 -MEDIAÇÃO VIRTUAL NO
ENSINO REMOTO E A PRODUÇÃO DE
VIDEOPOEMAS

Andréia Mendonça dos Santos Lima38


Carolaine Aparecida De Souza Barros39
Geovânia de Souza Andrade Maciel40
Natália Da Silva Fernandes41
Stefany Louheny Oliveira De Paula42

INTRODUÇÃO

Nos últimos tempos, o espaço tecnológico vem sofrendo e ocasio-


nando diversas mudanças em todos os segmentos sociais. Ao decorrer,
principalmente do último século, os eletrônicos - como a televisão, o
computador pessoal e o telefone - ficaram cada vez mais modernos e
eficientes, e assim entrelaçados com a internet ocasionaram ainda mais
transformações nas relações, envolvendo troca de informações e possibi-
lidades de compartilhamento de conhecimento. As mais diversas áreas
têm buscado suporte nas mídias digitais e eletrônicas para alavancar
sucesso em seu desenvolvimento, e na educação não tem sido diferente: as
TDICS - Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação - passam
a ser cada dia mais incorporadas pedagogicamente nas salas de aula, no
intuito de inovar e auxiliar no processo de ensinar e aprender.
De tal forma, sob a ótica de Kenski (2007):
As novas tecnologias de comunicação (TICs), sobretudo
a televisão e o computador, movimentaram a educação

38 
Mestre em Estudos Literários (UNIR). Professora de Língua Inglesa (IFRO).
CV: http://lattes.cnpq.br/0308570865801085
39 
Estudante do Curso Técnico em Informática Integrado ao Ensino Médio (IFRO).
40 
Mestre em Letras (UNIR). Professora de Língua Portuguesa (IFRO).
CV: http://lattes.cnpq.br/4854501636346902
41 
Estudante do Curso Técnico em Informática Integrado ao Ensino Médio (IFRO).
42 
Estudante do Curso Técnico em Informática Integrado ao Ensino Médio (IFRO).
103
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

e provocaram novas mediações entre a abordagem do


professor, a compreensão do aluno e o conteúdo veicu-
lado. (...). Quando bem utilizadas, provocam a alteração
dos comportamentos de professores e alunos, levando-os
ao melhor conhecimento e maior aprofundamento do
conteúdo estudado. (KENSKI, 2007, p. 45)
O uso da tecnologia nas escolas é uma necessidade cada vez
mais imprescindível, já que grande parte dos alunos da educação básica
de hoje nasceram conectados ao mundo virtual. Os métodos de ensino
convencionais não os desafiam e entretém, assim a introdução de uma
metodologia inovadora que consiga transformar tecnologias em ferra-
mentas pedagógicas, passa a ser a busca do professor contemporâneo.
A inserção cada vez maior da tecnologia como ferramenta de ensino se
tornou uma necessidade imperiosa nesse período pandêmico, procurando
auxiliar de forma célere e assertiva o ensino-aprendizado dos estudantes.
O presente trabalho retrata a experiência da aplicação de atividades
de ensino online, com base no conteúdo da disciplina de Língua Portu-
guesa e Literatura Brasileira, que foram desenvolvidas em 3 turmas de
2º ano de Ensino Médio Técnico nas áreas de informática e química, de
uma escola pública do Estado de Rondônia. Discorre sobre a contribuição
de 3 alunas, no papel de mediadoras virtuais, prestada aos estudantes
por meio do WhatsApp como ferramenta utilizada na disponibilidade
de materiais e orientações no percurso do ensino-aprendizagem; e deta-
lha como progrediu a atividade de elaboração e compartilhamento de
videopoemas que exploraram produções pertencentes às gerações de
poetas do Romantismo brasileiro, dando ênfase a formação do leitor
(multi)literário juvenil.

DESENVOLVIMENTO

Diante do contexto pandêmico foi necessário repensar novas


estratégias de ensino:
• Como as atividades aplicadas no formato presencial poderiam
ser transmutadas para o formato remoto?

104
Estudos em Cas@

• Como efetivar uma prática literária no formato on-line, de


maneira a proporcionar ao estudante o encontro com a poesia
Romântica em prol de sua formação literária?
Diante desses questionamentos surgiu a ideia de produção de
videopoemas, de modo a substituir o café literário com declamação de
poemas que já estava sendo organizado no formato presencial. A proposta
de produção de videopoemas recorrendo às poesias das três Gerações
Românticas foi uma oportunidade para que os estudantes pudessem
efetivar a leitura, a oralidade e também escrita poética, mesmo em for-
mato remoto e ainda realizassem o compartilhamento de suas criações
com os demais estudantes.
Segundo Ferreira (2004, p. 38) videopoema pode ser definido como:
a tendência da videoarte que apresenta preocupação
poético-literária como definidora de seus procedimen-
tos. Pode-se considerar videopoema desde a leitura
performática de um poema, exibida em vídeo até expe-
rimentos que não apresentam o signo verbal enquanto
elemento gráfico na tela.

A produção de videopoemas permitiu aos alunos ousarem em


criatividade, trabalhando tanto com o texto impresso literário como
também com imagens diversas que foram sendo selecionadas e orga-
nizadas diversificadamente; além da exploração e uso de plataformas e
aplicativos para o emprego fecundo de formas e fontes de letras, cores,
montagens, sobreposições, colagens, fundo musical, entre outros recursos
utilizados pelos estudantes no momento da criação dos videopoemas.
Assim, foi possível planejar uma sequência didática em que se
priorizou o conhecimento da literatura pelo contato com o texto literário
(COSSON, 2016), tal como preconiza o letramento literário. E dando um
passo a mais, a partir dos videopoemas produzidos e compartilhados pelas
turmas, oportunizou-se também o contato com os recursos multimodais,
priorizando a prática do multiletramento literário que segundo Maciel
(2020, p. 223) “consiste em relacionar o ensino da literatura canônica
com o hibridismo dos gêneros da hipermodernidade”.

105
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

POEMAS DO ROMANTISMO NUMA PERSPECTIVA


CONTEMPORÂNEA

Diante dos objetivos das atividades realizadas, fundamentamos a


organização da sequência didática na perspectiva do letramento literário,
conforme propõem Paulino (2001; 2004), Cosson (2016) e Zappone
(2008); levamos igualmente em consideração Rojo (2009, 2013) que
apresentou os estudos do Grupo de Nova Londres a respeito dos Mul-
tiletramentos; além de Maciel (2020) que preconizou o Multiletramento
Literário.
Tais estudos se complementam na medida que surgem com a
finalidade de acompanhar as novas demandas da sociedade em prol de
satisfazer com êxito as urgências das instituições escolares quanto a um
ensino da literatura mais significativo.
Reconhecer que o desinteresse pelo literário advém dos descami-
nhos no ensino da literatura, que priorizam muito mais a categorização
e a historização literária, já é um itinerário elucidado por Todorov em
sua obra A Literatura em perigo, notadamente em seu capítulo A literatura
reduzida ao absurdo (TODOROV, 2020, p. 25-33). Sem dúvida, refletir
a prática literária sob o prisma desse autor é um passo importante para
oportunizar um ensino literário mais apreciável pelos estudantes do
Ensino Médio. De natureza similar, Maciel (2020, p. 130) assevera que
“pensar em uma prática literária mais condizente com as exigências do
tempo hipermoderno” é propor uma leitura sem amarras que propor-
cione aos estudantes irem “além do contato estabelecido entre o leitor
e a obra literária” (MACIEL, 2020, p. 136), permitindo consequente,
reconstrução de sentidos.
Sob essa ótica, procurou-se desenvolver as atividades de leitura e
produção literária, reproduzindo criativamente, por meio das multifaces
da hipermídia43, alguns dos poemas pertencentes às três gerações do

43 
O conceito de hipermídia é utilizado na linguagem do ciberespaço e da cultura
em constante transformação (FRANÇA, 2009, p. 58) que se ampara no hibridismo
de linguagens e mídias a dispor da sociedade na construção de textos audiovisuais
(uma mistura de textos, sons e imagens) em prol de uma comunicação mais dinâmica.
106
Estudos em Cas@

Romantismo brasileiro. Após a exposição de modelos de videopoemas,


sugestões do uso de aplicativos44 para a produção dos vídeos e orientações
nos percursos produtivos, obtivemos como resultado final 68 videopoemas
que com o uso das ferramentas midiáticas motivaram os estudantes a
ler, interpretar e ressignificar os poemas da geração romântica sob uma
perspectiva contemporânea, reduzindo o distanciamento entre literatura
e leitor juvenil.
A atividade, inicialmente preparada em contexto presencial, con-
sistiu em separar cada turma em três grupos de acordo com as gerações
Românticas. Cada grupo ficou responsável por efetivar uma pesquisa
aprofundada sobre a geração de poetas que alcançaria seu auge com um
Café Literário. Os grupos se subdividiram entre si, propondo a escolha
de poemas específicos que seriam declamados para a turma (primando
para que não ocorressem repetições), de maneira a esclarecer melhor
as principais características do autor e sua obra após cada declamação
efetivada.
Quadro 1: Separação dos grupos

Fonte: Produzido pelas pesquisadoras (2021)

Cabe enfatizar que a atividade foi proposta em momento pre-


sencial e tão logo, foi necessário pensar a adaptação da atividade para o
modelo remoto. Assim, surgiu a ideia de que cada aluno, após escolher
o poema do respectivo autor representante da geração incumbida ao
seu grupo, deveria produzir um videopoema para ser compartilhado
44 
Dentre as infinidades de aplicativos sugeriu-se para edição em celular os editores
KineMaster, VideoShow e InkShot; para edição em computador indicou-se Movie Maker
e Filmora. Professoras e mediadoras virtuais estiveram à disposição para auxiliar os
estudantes que apresentassem dificuldades nesse processo de produção e edição.
107
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

com a turma. Para melhor identificação e explicação da sequência das


atividades, doravante serão usados os termos: turma 1, turma 2 e turma
3. Basicamente as três turmas seguiram programação bem similar, que
foi desenvolvido por cada mediadora virtual de acordo com o ritmo de
cada sala.
Quadro 2: Programação de atividade das mediadoras

Fonte: As pesquisadoras a partir dos Planos de atividades apresentados a PROEN/


IFRO (2020)

Os videopoemas foram todos entregues pelos estudantes no


Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA). Na sequência foram baixados
e hospedados no canal do YouTube criado por uma das professoras. Os
links de acesso aos vídeos foram disponibilizados para que as mediadoras
virtuais organizassem o compartilhamento no grupo de Whatsapp das
respectivas turmas.

108
Estudos em Cas@

Para a turma 1, a mediadora virtual se organizou de modo a


compartilhar os videopoemas produzidos pelos colegas da turma, todas
as segundas e terças-feiras. Ainda pelo Whatsapp, comentários inter-
pretativos eram estimulados pela aluna bolsista e após as reflexões/
comentários dos colegas de turma, o conteúdo era ligeiramente refinado
pela professora orientadora.
Ilustração 1: Apresentação de um dos videopoemas compartilhado
no Whatsapp

Fonte: Mediadora virtual 1(2020)

Atendimentos para sanar dúvidas eram agendados e realizados


pela plataforma google meet. Essa organização da mediadora seguiu
até o final do compartilhamento de todos os trabalhos desenvolvidos
na classe. Foram expostos um total de 21 videopoemas produzidos
pela turma.
Na turma 2, o mesmo projeto de mediação virtual foi desenvolvido
e igualmente teve o intuito de compartilhar os videopoemas da 1ª, 2ª e
3ª geração do Romantismo no Brasil. A mediadora virtual, assim, pode
elaborar os cronogramas semanais das atividades da turma, para organi-
zação dos estudos no período de aulas remotas e ofereceu atendimentos
individuais aos alunos com maiores dificuldades.
Por meio do Google Meet, WhatsApp e outras redes sociais, a aluna
mediadora 2 ajudou seus colegas na realização de várias atividades, seja
109
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

tirando dúvidas ou explicando ao máximo o que havia entendido sobre


diversos conteúdos. Conforme relato exposto pela aluna bolsista:
Auxiliei desde as matérias do núcleo básico até as
matérias específicas do curso técnico, em que alguns
colegas sentiam mais dificuldades, como Linguagem
de Programação, Programação Orientada a Objetos,
Fundamentos em Análises de Sistemas e Banco de
Dados 1. (Mediadora virtual 2)

Nesta turma, de maneira similar a turma 1, utilizou a ferramenta


do WhatsApp não apenas para o compartilhamento dos videopoemas: os
alunos usaram para compartilhar críticas positivas e construtivas sobre
os videopoemas produzidos pela turma; para passar alguns informes
gerais; distribuir arquivos úteis - como links de livros para os colegas
lerem, promovendo uma terapia de leitura ocupacional nesse período
em que deveriam permanecer em casa - entre outras finalidades. Foram
compartilhados um total de 31 videopoemas nessa turma.
Por fim, na turma 3, o mesmo esquema de trabalho entre o
professor orientador, aluno mediador e demais estudantes foi seguido,
havendo o compartilhamento dos videopoemas produzidos pela turma
no grupo de WhatsApp criado para tal propósito. As postagens eram
feitas todas segundas-feiras e terças-feiras, a fim de promover a apren-
dizagem do conteúdo literário proposto. Após o envio de cada vídeo,
era feito o estímulo para despertar a interação grupal, a fruição poética
e interpretação sobre o poema, o conhecimento do autor e também a
relação da obra em um contexto histórico e contemporâneo.
Além disso, nas 3 turmas, foi trabalhada como primeira ação a
temática do Cyberbullying - devido ao desenvolvimento do projeto ser
feito no espaço virtual que, da mesma maneira do espaço presencial,
exige o uso de empatia e respeito ao próximo. A temática foi trabalhada
com base no vídeo Cyberbullying: violência virtual machuca45.

45 
Link de acesso ao vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=mWQoikd72A4
110
Estudos em Cas@

Ilustração 2: Apresentação de um dos videopoemas compartilhado


no Whatsapp

Fonte: Mediadora virtual 3 (2020)

A respeito do desenvolver das atividades do projeto, a mediadora


virtual 3 esclareceu em relato que:
Além dos videopoemas, eram disponibilizados, todas
as sextas-feiras no grupo do WhatsApp, cronogramas
semanais com o objetivo de ajudar os alunos a orga-
nizarem seu tempo de estudo, pois no cenário pan-
dêmico vivido, era preciso conciliar o estudo e a vida
pessoal. Esses cronogramas, continham a descrição
da disciplina, o tempo estipulado para seu estudo, o
que deveria ser feito e estudado e o prazo final para
a entrega da lição avaliativa atribuída àquela matéria.
(Mediadora virtual 3).

O grupo do WhatsApp nesta turma, além de servir para as posta-


gens dos videopoemas e cronograma semanal, era também utilizado como
um lugar para tirar dúvidas - relacionadas principalmente à disciplina
de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira. Isso proporcionou aos
alunos uma fonte de informação e uma ponte para o diálogo aberto entre
professor-aluno e os alunos entre si. Foram produzidos e compartilhados
16 videopoemas nessa turma.

111
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Vale enfatizar que dos 68 videopoemas produzidos, tivemos poucas


repetições46, de maneira que por intermédio das produções compartilha-
das foi possível apreender as peculiaridades de cada geração romântica e
conhecer os vários poetas desse período, sem ter que utilizar a estratégia
de repetir a historicidade e biografia de forma esvaziada, uma vez que
isso já era exposto despropositadamente nos trabalhos produzidos. Por-
tanto, a prioridade foi o contato com o literário, despertando o prazer
pela leitura e pela reconstrução de sentidos em prol da formação de um
leitor multiliterário juvenil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base nas atividades descritas foi possível perceber que as


tecnologias digitais são ferramentas estimulantes para a realização da
atividade pedagógica com o gênero poesia. Deve-se considerar também
que por ser a poesia um gênero textual presente de subjetividade, contri-
buiu para que os estudantes pudessem expressar sentimentos diversos,
transitando entre o sensível (bastante presente nas poesias da primeira e
segunda geração) e o crítico (presente especialmente nas poesias da ter-
ceira geração, com temáticas abolicionistas) através de seus videopoemas
produzidos e compartilhados.
Assim, a produção e disponibilização dos videopoemas despertou
nos alunos o espírito de inventividade, bem como, atingiu seu propósito
principal, já que grande parte dos estudantes afirmaram que o trabalho
diferenciado estimulou a criatividade e interesse pelo literário, além
de tornar a atividade promissora, a partir do momento que propôs aos
estudantes que produzissem os videopoemas utilizando as ferramentas
tecnológicas que já fazem parte do convívio de muitos estudantes.
Pode-se afirmar, também, que a poesia foi uma ferramenta poten-
cializadora para que o grupo de estudantes pudesse ser mais solidário,
eliminando alguns transtornos ocasionados pelo isolamento social e
possibilitando, simultaneamente, desenvolver senso do coletivo, com-

46 
Ver apêndice ao término do capítulo que traz a relação dos videopoemas escolhidos
livremente pelos estudantes da turma para produção e compartilhamento.
112
Estudos em Cas@

promisso e responsabilidade, além de agregar maior conhecimentos


literários nos estudantes do ensino médio.
Por fim, a atividade de produção e compartilhamento de video-
poemas contribuiu para o ensino da literatura, fomentando a formação
Multiliterária do estudante juvenil, pois a atividade possibilitou não
somente o contato entre o estudante leitor e a poesia romântica, mas
também a prática multiliterária favoreceu o contato com outras múltiplas
facetas da hipermídia.

AGRADECIMENTOS
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia (IFRO), por intermédio
da Pró-Reitoria de Ensino - PROEN, Edital 03/2020.

IFRO Campus Ji-Paraná, por intermédio do Departamento de Pesquisa, Inovação e


Pós-Graduação - DEPESP, Edital 34/2021.

REFERÊNCIAS
COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. 2ª ed., 6ª impressão. São
Paulo: Contexto, 2016.

FRANÇA, George. Os ambientes de aprendizagem na época da hipermídia e da educa-


ção a Distância. Perspect. Ciênc. Inf., Belo Horizonte, v. 14, n 1, p. 55-65, abril 2009. Dis-
ponível em < https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-99362009000100005&script=-
sci_arttext&tlng=pt > Acesso em 19 abr 2021.

FERREIRA, Ana Paula. Videopoesia: uma poética da Intersemiose. Em tese, v. 8, p


37-45, dez 2004. Disponível em < http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/
emtese/article/view/3582/3571 > Acesso e, 22 mar. 2021.

KENSKI, Vani Moreira. Tecnologias também servem para fazer educação. In Educação
e tecnologias: o ritmo da informação. Campinas, São Paulo: Papirus, 2007.

MACIEL, Geovânia de Souza Andrade Maciel. Multiletramento Literário no Livro


didático: caminhos epistemológicos da hipermodernidade. 1º ed. Porto Velho: Temá-
tica Editora, 2020.

PAULINO, Graça. Deslocamentos e configurações do letramento literário na escola.


Scripta, [S.I], p. 67-78, mar. 2004. ISSN 2358-3428. Disponível em: < http://periodicos.
pucminas.br/index.php/scripta/article/view/12543 >. Acesso em: 05 mar. 2021.

113
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

PAULINO, Graça. Letramento literário: por vielas e alamedas. Revista da Faced, n.


5. Salvador: Faced/UFBA, 2001. Disponível em: < https://portalseer.ufba.br/index.php/
entreideias/article/view/2842/2018 > Acesso em: 11 fev. 2019.

ROJO, Roxane. [Org.] Escol@ conectada: Os Multiletramentos e as TIC’S. 1. Ed.


São Paulo: Parábola, 2013.

ROJO, Roxane. Letramentos múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo: Parábola
Editorial, 2009. 128 p.

TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo! Trad. Caio Meira. 12ª ed. Rio de Janeiro:
DIFEL, 2020. 98p.

ZAPPONE, Mirian Hisae Yaegashi. Modelos de letramento literário e ensino da


literatura: problemas e perspectivas. Rev. Teoria e Prática da Educação, v. 11, n. 01, p.
49-60. Jan./abr 2008.

Nota: As atividades aqui relatadas fizeram parte do Projeto de Mediação Virtual - PRO-
BEN MEDVIRTUAL - executável no ano de 2020 pelo Edital n. 03/2020, por meio
da Pró-Reitoria de Ensino - PROEN - no âmbito do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia de Rondônia - IFRO. O edital forneceu bolsas para seleção de
alunos que seriam mediadores virtuais de atividades educativas no ensino remoto, com
o intuito de sanar problemáticas causadas pela Pandemia da Covid-19.

APÊNDICE

Lista do poema e respectivo autor escolhido pelos alunos para a


produção dos videopoemas:
Turma 1 Turma 2 Turma 3
1 A lagartixa – Álvares de A canção do africano – Juca Pirama – Gonçalves
Azevedo Castro Alves Dias
2 Navio Negreiro – Castro Se eu Morresse amanhã –
As duas flores - Castro Alves
Alves Álvares de Azevedo
3 Último Soneto – Álvares Horas de saudade – Castro Leito de Folhas Verdes –
de Azevedo Alves Gonçalves Dias
4 Canção do exílio, Canção
do Tamoio, Como eu te
Leito de Folhas verdes- Ca nç ã o d o E x í l io –
Amo e A concha e a vir-
Gonçalves Dias Gonçalves Dias
gem –
Gonçalves Dias
5 As duas flores – Castro Meus oito anos – Castro Visões da Noite - Fagundes
Alves Alves Varela

114
Estudos em Cas@

6 Vi s õ e s d a N o i t e - Não me deixes – Gonçalves As duas f lores – Castro


Fagundes Varela Dias Alves
7 Como Eu te A mo - Porque mentias – Álvares A Escravidão - Tobias
Gonçalves Dias de Azevedo Barreto
8 Beijo Eterno – Castro
Dama Negra – Castro Alves Adormecida – Castro Alves
Alves
9 Canção do Tamoio – Sempre Ela – Gonçalves A Lagartixa – Álvares de
Gonçalves Dias Dias Azevedo
10 A Escravidão – Tobias Meu Sonho – Álvares de Navio Negreiro – Castro
Barreto Azevedo Alves
11 Harpas de Ouro Fábula o Pássaro e a flor –
Pedido – Gonçalves Dias
– Souzândrade Castro Alves
12 Minha Terra – Gonçalves S ol id ão – Á lv a re s de Q ue m imo! – Tobias
Dias Azevedo Barreto
13 O que é Simpat ia - C a n ç ã o d o E x í l i o – Canção do Violeiro –
Casimiro de Abreu Gonçalves Dias Castro Alves
14 Amar e ser amado – Como eu te amo – Gonçalves A Cruz na estrada – Castro
Castro Alves Dias Alves
15 Dois de Julho – Tobias Meu Anjo – Álvares de O Gondoleiro do Amor-
Barreto Azevedo Castro Alves
16 Leito de Folhas Verdes - Se eu Morresse amanhã - A Canção do Africano –
Gonçalves Dias Álvares de Azevedo Castro Alves
17 Adormecida – Castro Lembranças de Morrer -
Alves Álvares de Azevedo
18 A Lagartixa – Álvares de
Boa Noite – Castro Alves
Azevedo
19 Uma taça de um crânio
Humano – Lord Byron Se se morre de amor –
– traduzido por Castro Gonçalves Dias
Alves
20 Seus olhos - Ainda uma vez, Adeus –
Gonçalves Dias Gonçalves Dias

21 A mor – Á lv a re s de
Juca Pirama – Gonçalves
Azevedo
Dias

22 Amar e ser amado – Castro


Alves
23 O lenço dela – Álvares de
Azevedo

115
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

24 Visões da Noite – Fagundes


Varela
25 Se te a mo, não sei –
Gonçalves Dias
26 Seus olhos, tão negros, tão
belos, tão puros – Gonçalves
Dias
27 Visões da Noite – Fagundes
Varela
28 Ca nção do Ta moio –
Gonçalves Dias
29 O lenço dela – Alvares de
Azevedo
30 Amor – Alvares de azevedo

31 Canção do Tamoio (trecho)


Gonçalves Dia
total
21 31 16
68

116
CAPÍTULO 9 -A REPRESENTAÇÃO DO
NEGRO NA LITERATURA NO ENSINO
MÉDIO NA PANDEMIA: UMA ANÁLISE
DO PLANO DE ENSINO TUTORADO DE
MINAS GERAIS

Stefanne Almeida Teixeira47


Brenda Mourão Pricinoti48
João Vítor Sampaio de Moura49

INTRODUÇÃO

A Análise do Discurso (AD) é um campo que tem como objeto


de estudo o discurso, que é materializado pela língua, que, é o elemento
constitutivo do discurso. A esse respeito, Orlandi (2020), define a AD
da seguinte maneira:
A Análise de Discurso, como seu próprio nome indica,
não trata da língua, não trata da gramática, embora todas
essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a
palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia
de curso, de percurso, de correr por, de movimento.
O discurso é assim palavra em movimento, prática
de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o
homem falando (ORLANDI, 2020, p. 15).

Com base nos estudos do discurso, visamos analisar os materiais


disponibilizados pelo Governo de Minas Gerais para as aulas remotas de
escolas públicas, os Planos de Estudos Tutorados (PET). Esses materiais
foram elaborados devido a não possibilidade de ensino presencial no
ano de 2020 em virtude da pandemia da COVID-19. Dessa forma, a

47 
Mestranda em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/4389832049522456
48 
Mestranda em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/1727697477231852
49 
Mestrando em Estudos Linguísticos (UFU).
CV: http://lattes.cnpq.br/4179011639506808
117
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

maneira encontrada para continuar o ano letivo foi o ensino remoto, o


qual utiliza de plataformas digitais para a transmissão das aulas. Sendo
assim, iremos analisar, no presente trabalho, os discursos presentes na
semana 1 da seção de Língua Portuguesa do volume III do 2º ano do
ensino médio.
Nesse sentido, com base na Lei 10.639/03 – a qual prevê que o
ensino da história e da cultura afro-brasileira e africana ao longo dos
anos escolares em todas as instituições brasileiras (púbicas e privadas)
e propõe que os professores devem ressaltar a importância dessa popu-
lação para a formação cultural e identitária do Brasil –, e alicerçado à
perspectiva dialógica da língua(gem), fundamentado em Bakhtin (2003,
2011 e 2017) e por meio das teorias de, principalmente, Authier-Revuz
(2004), Orlandi (2020) e Brito (2012); buscamos verificar se as atividades
propostas contemplam as habilidades que desejam ser desenvolvidas e
se a reflexão sobre a representação do negro na literatura promove um
ensino crítico aos alunos por meio dos exercícios propostos nele.
Para a análise, dedicamos a próxima seção à literatura que funda-
menta nossas observações sobre o material disponibilizado para o ensino
remoto de Minas Gerais. Posteriormente, apresentamos nosso corpus
e, na próxima seção, fizemos a análise dele. Por fim, finalizamos com
algumas considerações finais e as referências utilizadas neste capítulo.

DESENVOLVIMENTO

Orlandi (2020) afirma que “a linguagem só faz sentido porque se


inscreve na história.” (p. 25). Dessa forma, compreendemos que os PET
e o programa “Estude em Casa” do Governo de Minas Gerais têm seus
usos e sua significação atrelados ao contexto em que foram lançados: a
pandemia do novo coronavírus. Sob esse prisma, essa decisão é amparada
pela necessidade do distanciamento social que impede o acontecimento
das aulas de forma presencial. A ideia era que os alunos se mantivessem
ativos para quando as aulas presenciais retornassem, o que se esperava,

118
Estudos em Cas@

naquele momento, que fosse em pouco tempo, mas que só retornaram


após 20 meses da implementação do regime remoto50.
No entanto, concordamos com Orlandi (2020), a qual defende que
Na educação, o ensino da língua, em particular, e da
linguagem em geral, poderia, se bem praticado como
processo formador do indivíduo na sua relação com o
social e o trabalho, dar condições para que este sujeito
compreendesse sua relação com a interpretação, com as
consequências históricas, que isto implica, sendo capaz
de dimensionar o efeito de sua intervenção (trabalho) nas
formas sociais. O que a capacitação não faz. (Orlandi,
2020, p. 73).

A educação não pode ser vista como um mero instrumento capa-


citador, mas sim como um processo formador do indivíduo como um
sujeito crítico e capacitado para transitar entre as diversas situações
comunicativas na sociedade. Isso, pois, para a AD, o sujeito é situado
pela história, afetado pela ideologia e pelo inconsciente.
Nesse sentido, a dispersão, a contradição, a incomple-
tude, a falha, o equívoco constituem o real da língua
e tanto o imaginário quanto o real são intermediados
pelo simbólico. O real é aquilo que não pode ser dito
pela língua (pelo sistema), mas é apreendido pela dis-
cursividade, isto é, pela ordem do simbólico; esta é
a representação do real da língua pela linguagem; o
real se opõe ao simbólico e vice-versa. (CAZARIN,
2006, p. 300).

Dessa forma, o discurso se constitui no e pelo sujeito, que, por


sua vez, se inscreve na história e pelo dito, concebendo dizeres outros
(BRITO, 2012). Sendo assim, “o sentido de um texto não está, pois,
jamais pronto, uma vez que ele se produz nas situações dialógicas ili-
mitadas que constituem suas leituras possíveis: pensa-se evidentemente
na ‘leitura plural’.” (REVUZ, 2004, p. 26). Desse modo, ao enunciar, o
sujeito entende que o já dito e o que está sendo enunciado estão associa-

50 
Decisão noticiada no portal G1, disponível em: https://g1.globo.com/mg/minas-
-gerais/noticia/2021/10/22/aulas-presenciais-serao-obrigatorias-na-rede-estadual-de-
-educacao-em-minas-gerais.ghtml Acesso em: 25 de outubro de 2021.
119
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

dos em uma cadeia de sentido a qual ele se filia (ORLANDI, 2020). A


esse respeito, Bakhtin (2011) defende que o objeto de estudo que será
enunciado pelo sujeito-falante já foi, anteriormente, pensado, avaliado,
contestado e refletido, isso posto, considera-se, junto ao discurso, o
contexto em que este está inserido. Dessarte, “discurso é um fenômeno
social em todas as esferas de sua existência” (BAKHTIN, 2011, p. 71),
pois está presente em todas as esferas sociais, envolvendo-se por meio
de diferentes sentidos e enunciados.
Sob esse prisma, para Bakhtin (2003), “quando falamos ou escre-
vemos, temos em vista um interlocutor, com um intuito (querer dizer)
discursivo” (p.263). Isso pois a linguagem “serve de expressão a um em
relação ao outro” (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2017, p. 115), isto é,
um processo de expressão centrado na relação entre os indivíduos, mas
não simplesmente para os indivíduos. Dessa forma, a linguagem passa
pelo indivíduo, levando em conta suas vivências e suas experiências
pessoais na formação do discurso, para, então, tornar-se social, ou seja,
materializar-se em um dado contexto enunciativo. Assim, todo texto/
discurso prevê um interlocutor possível, uma vez que “a exterioridade
está no interior do sujeito, em seu discurso está o ‘outro’, compreendido
com exterioridade social” (FERNANDES apud BRITO, 2012, p. 140).
Dessa maneira, a compreensão do discurso sempre se dá por meio da
linguagem, perpassando o interlocutor para só então se significar.
A esse respeito, Furquim (2020) defende que o ensino de língua
materna só se dá após de compreendermos o aluno e professor como
“sujeitos dotados de um corpo que constrói conhecimento não apenas
pelo intelecto e também pelas emoções pelos movimentos, olhares e
gestos, de um modo geral” (p. 6). Desse modo, ao constituir um material
de ensino, devemos considerar não somente o conteúdo que deve ser
trabalhado, mas também – e principalmente – os sujeitos envolvidos
nesse processo. Nesse sentido, o autor ainda postula que
Se temos um corpo (dotado de múltiplas identidades)
e o Ensino de Literatura deve dialogar com os nossos
corpos (mesmo que em alteridade), temos que pensar em
metodologias que incluam a todos ao invés de excluir

120
Estudos em Cas@

uns e outros, pois como propôs hooks (2013), a edu-


cação como prática de liberdade deve atingir a todos.
(FURQUIM, 2020, p. 6).
A partir disso, iremos analisar, nas próximas seções, as atividades
propostas pelo material complementar disponibilizado pelo Governo de
Minas Gerais, além de verificar os discursos que atravessam essa apostila.

REGIME DE ESTUDO NÃO PRESENCIAL E OS


PLANOS DE ESTUDOS TUTORADOS

O “Regime de Estudo não Presencial”, que entrou em vigor em


13/05/2020, quase dois meses após a suspensão das aulas presenciais,
ocorrida em 18/03/2020, é um programa elaborado pelo Governo de
Minas Gerais para garantir a continuidade do ensino. No lançamento
do programa, a secretária de estado de Educação de Minas Gerais, Júlia
Sant’Anna, informou que o objetivo do projeto é “garantir a continuidade
dos estudos de nossas crianças e jovens mineiros da melhor forma possí-
vel” (G1, 2020). O programa conta com três ferramentas de estudo: um
programa televisivo, “Se Liga na Educação”, um aplicativo para celular,
“Conexão escola” e os Planos de Estudos Tutorados (PETs).
O “Se Liga na Educação” reproduz aulas de conteúdos que os
alunos têm mais dificuldade e é separado por áreas de conhecimento. É
exibido de segunda a sexta, em dias úteis, pela manhã, na Rede Minas,
emissora presente em 186 municípios. Após as aulas do dia, há uma
aula síncrona em que os alunos podem enviar suas dúvidas a respeito
da área do dia. Já o aplicativo “Conexão Escola” foi desenvolvido para
que os alunos possam localizar os materiais com mais facilidade, além
de encontrar as aulas exibidas pelo programa e, também, interagir com
professores e outros alunos nas salas virtuais. Por fim, os PET são apos-
tilas de conteúdo e exercícios de cada disciplina ofertada pela escola.
O material, que inicialmente era semanal, conta para a carga horária
estudantil e serve como um apoio ao conteúdo escolar, além disso os
professores devem combinar como serão feitas as correções e como irão
cobrá-lo em aula. Para o presente trabalho, iremos nos ater à análise
somente da terceira ferramenta.
121
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Cada volume do PET é composto por quatro capítulos em cada


unidade, que representa cada uma das 11 disciplinas ofertadas pela grade
curricular (Língua Portuguesa, Matemática, Biologia, Química, Física,
Geografia, História, Filosofia, Língua Inglesa, Arte e Educação Física).
Cada capítulo é correspondente a uma semana de aula, e pode ser divi-
dido de acordo com as aulas do professor de línguas. No início de cada
unidade, há um cabeçalho para identificação do componente curricular
da unidade, o ano escolar correspondente; espaço para preenchimento
do nome do aluno, nome da escola, turma e turno; total de semanas
comtempladas pelo PET e total de aulas semanais e mensais daquela
disciplina. Logo abaixo, há as “orientações aos pais e responsáveis”,
“dica para o aluno” e uma seção de “quer saber mais”, que mudam a
cada volume.
Já na primeira página de cada capítulo, há uma tabela dividida
em: “Eixo temático”, “Tópico” que será abordado no capítulo, “Habi-
lidade” que será desenvolvida pelo tópico e “Conteúdos relacionados”.
Após essa tabela, o conteúdo da semana é iniciado. Não há um padrão
para esses conteúdos, uma vez que, em alguns PETs, há uma explicação
teórica do tópico e depois algumas atividades, e outros já se iniciam
com as atividades.

O (NÃO) ENSINO DA LÍNGUA COMO


INSTRUMENTO PARA REFLEXÃO

O PET III do 2º Ano do Ensino Médio é composto, na seção


de Língua Portuguesa, por quatro semanas. A primeira, objeto da
nossa análise, tem como foco o tema “O Negro na literatura brasileira”;
a segunda, “Formas diferentes de representação do Negro: Contextos
Históricos e Literários diferentes”; a terceira é destinada aos “Gêneros
– Charges e Tirinhas” e, por fim, a quarta com a “Textualização do
Discurso Poético”.
Na Semana cujo tema é “O Negro na literatura brasileira”, os
objetivos são

122
Estudos em Cas@

Imagem 1 – Tabela explicativa da Semana 1

Fonte: Planos de Estudos Tutorados, 2º Ano do Ensino Médio, Volume III, p. 2.

Logo após a tabela, a unidade já começa pelas atividades, com


uma breve contextualização do porquê estudar a representação do negro
na literatura. Essa contextualização, no entanto, não aprofunda nem
problematiza questões importantes para as percepções identitárias e de
representatividade étnicas.
A literatura produzida por escritores e escritoras negras
pode vir a apresentar uma especificidade, se consi-
derarmos sua produção como uma representação da
identidade desses sujeitos que apresentam seus contex-
tos de produção, bem como suas trajetórias pessoais e
coletivas, a representação de uma comunidade negra em
luta por conquista e manutenção de direitos, além de
um recorte interessante na produção literária brasileira,
cujos cânones são parte de um modelo étnico-normativo
e padrão, da sociedade brasileira. (MINAS GERAIS,
2020, p. 2).

Após essa explicação, tem o primeiro exercício, que trabalha com


o poema “Vozes-Mulheres”, de Conceição Evaristo (Imagem 2).

123
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Imagem 2 – Atividade 1

Fonte: Planos de Estudos Tutorados, 2º Ano do Ensino Médio, Volume III, p. 3.

Para nós, utilizar um exercício que objetiva somente uma inter-


pretação instrumentalizada. Isso, pois utiliza o poema para uma inter-
pretação simplória do texto e não promove uma reflexão crítica acerca
de como o Negro é representado na literatura. Nesse sentido, ao propor
uma atividade que pede ao aluno a identificação dos lugares onde as
vozes narrativas ecoam, o material não aprofunda nas questões relativas
ao pensamento crítico, ainda mais em alunos que estão encaminhando
para o final do período escolar.
A esse respeito, Castilho (2004) defende que “a preocupação
que se deve ter está na necessidade de incorporar outras perspectivas
de leituras que rompam com os silenciamentos e preconceitos raciais
existentes nas literaturas tradicionais” (CASTILHO, 2004, p. 112),
sem, no entanto, abandonar a postura crítica na seleção e ensino dentro
124
Estudos em Cas@

de sala. Nesse sentido, acreditamos que propor uma atividade reflexiva


seria uma melhor escolha para relacionar aos conteúdos propostos no
início da seção, a saber
1. Valorizar a leitura literária como forma de compreensão
do mundo e de si mesmo.
2. Caracterizar, a partir da leitura de textos literários,
formas de representação do imaginário brasileiro.
3. Relacionar formas diferentes de representação do negro
em contextos históricos e literários diferentes.
4. Estabelecer relações intertextuais entre um texto literário
e uma outra manifestação cultural de/sobre negro. (MINAS
GERAIS, 2020, p. 2.) (Grifos nossos).
Assim, entendemos que esses pontos não são contemplados pela
atividade. Dessarte, Cosson (2009, p. 65) defende o letramento literário
como a melhor forma para se ter sujeitos-leitores críticos e, para isso,
a leitura escolar, com direcionamento e intermediação do professor é
imprescindível. Nesse sentido, o autor postula que
na escola é preciso compartilhar a interpretação e ampliar
os sentidos construídos individualmente. A razão disso é
que, por meio do compartilhamento de suas interpreta-
ções, os leitores ganham consciência de que são membros
de uma coletividade e de que essa coletividade fortalece
e amplia seus horizontes de leitura. (p. 65).

Dessa forma, o ideal seria uma proposta em que o aluno pudesse


refletir sobre as vozes que ecoam no poema, relacionando-as ao regime
escravocrata vivenciado no Brasil até o ano de 1888. Outrossim, seria
possível, ainda, buscar os ditos e não ditos que interpelam o sujeito-aluno
e o fazem se identificar com o poema, visto que, após a atividade, há um
pequeno texto bibliográfico sobre a autora, Conceição Evaristo, que poderia
ser relacionado ao exercício, propondo uma relação da autora aos alunos.
A segunda atividade da seção trabalha a intertextualidade de
duas produções, “Irene no Céu”, de Manuel Bandeira; e “O que não
dizia o poeminha de Manuel”, de Mário Barbosa. Logo no enunciado
já direcionam a leitura do aluno à ironia que o segundo poema faz em
relação ao primeiro.
125
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Pensando em como os diálogos entre os tempos his-


tóricos podem ocorrer, apresentamos duas poesias que
conversam entre si, marcando olhares distintos de uma
mesma situação, em função da diferença do pertenci-
mento étnico dos autores. Perceba a ironia contida nos
textos em diálogo.
Irene no Céu
Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor.
Imagino Irene entrando no céu:
– Licença, meu branco!
E São Pedro bonachão:
– Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.
BANDEIRA, Manuel. Estrela da Manhã, 1936. Dis-
ponível em: http: //www.jornaldepoesia.jor.br/manuel-
bandeira02.html#irene. Acesso em: 10 de julho de 2020.

O Que Não Dizia o Poeminha do Manuel:


Irene preta!
Boa Irene um amor
mas nem sempre Irene
está de bom humor
Se existisse mesmo o Céu
imagino Irene à porta:
– Pela entrada de serviço – diz S. Pedro
dedo em riste
– Pro inferno, seu racista – ela corta.
Irene não dá bandeira
ela não é de brincadeira
BARBOSA, Márcio. Cadernos Negros 15. p. 64.
Disponível em: http://www.letras.ufmg.br/literafro/
autores/11-textos-dos-autores/305-marcio-barbosa-
-textos-selecionados. Acesso em: 10 de julho de 2020.
(MINAS GERAIS, 2020, p. 4.)

126
Estudos em Cas@

Após isso, há uma nota de reflexão sobre os textos que propõe uma
observação sobre a relação do gênero poema e a paródia que Barbosa
faz do poema de Bandeira:
Reflexão sobre os textos: É importante saber que
a poética é uma forma de narração do mundo, mas
também é — talvez acima de tudo — uma revelação
do desejo utópico de construir um outro mundo. Se
narramos o mundo através da poética, mas ao mesmo
tempo almejamos outro, estamos desvelando o nosso
descontentamento com este mundo presente. Queremos
transgredir a ordem estabelecida. Não queremos mais
olhar no espelho comum, modificamos assim a visão
através do espelho da paródia. (MINAS GERAIS,
2020, p. 4.)

Após essa reflexão, tem-se cinco perguntas sobre a relação dos


poemas. A saber:
a) Quais diferenças você consegue perceber entre os
dois poemas, quanto à linguagem utilizada?
b) Márcio Barbosa utiliza-se da poesia para dar um
recado de toda população negra a São Pedro. Qual é
esse recado?
c) Você sabe quem foi Manuel Bandeira? Cite, pelo
menos 3 Livros que ele escreveu.
d) Márcio Barbosa publicou seu texto como parte de
uma “Coletânea de Poemas do Grupo Quilombo Hoje”,
que atuava em São Paulo, nos anos de 1990 e 2000
(primeira década). Busque saber mais detalhes sobre
a atuação desse coletivo e responda em que medida a
poesia e a literatura tornam-se instrumento através do
qual compreendemos melhor a nós mesmos e ao outro.
e) Você concorda que a poesia só existe a partir do
momento que utiliza como matéria-prima as vivências
e convivências fundamentais de cada um de nós? Por
quê? (MINAS GERAIS, 2020, p. 4-5.)

De modo geral, percebemos que houve uma tentativa de explorar


melhor os textos escolhidos, propondo aos alunos uma reflexão sobre os
127
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

autores, sobre as relações identitárias que os interpela e sobre a forma


como isso transparece nos discursos dos poemas. No entanto, entendemos
que a terceira pergunta, que explora somente a biografia de Manuel Ban-
deira, poderia ter explorado melhor como o contexto histórico do autor
constrói o discurso do “bom negro” ou do negro “domesticado”. A esse
respeito, Castilho (2004), parafraseando Brookshaw (1983), afirma que
a presença do negro na literatura brasileira, ao longo da
história, foi marcada ou pelo silêncio, como no período
anterior à abolição, ou pela afirmação de sua inferiori-
dade, tanto biológica como cultural, a qual, dependendo
do autor, varia de grau. No modernismo, o negro era
visto como uma preocupação, devido ao entrave que
ele representaria à instituição de uma “nação brasileira
civilizada”. (CASTILHO, 2004, p. 107).

Assim, ao comparar os dois poemas, é evidente o silenciamento e


a tentativa de se construir uma identidade subserviente dos Negros, que
só se enquadrariam na sociedade se fossem dóceis. O que não acontece
no segundo poema, que descreve Irene como uma pessoa que tem todos
os nuances de humor referentes a um indivíduo social, independente de
cor. Por fim, compreendemos que isso deveria ter sido melhor explorado
para garantir as habilidades propostas.
A seção termina com esses exercícios, sem maiores teorias ou
problematizações. Não há nenhum recado ou provocação para que o
aluno aprofunde as questões levantadas nas atividades. Enfim, a temática
continua com “O Negro na Literatura Brasileira” na semana seguinte
do material.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomando Orlandi (2020), é precípuo que a escola seja um


ambiente formador de um indivíduo crítico, que auxilie o aluno em
seu processo de formação, não só o capacite, mas o instigue a buscar o
conhecimento. Nesse sentido, o material analisado não cumpre com o
propósito da formação individual. Nos exercícios, os textos são usados

128
Estudos em Cas@

de maneira instrumental, sem se preocupar em provocar a criticidade


do discente.
Além disso, o sentido de um texto não está jamais pronto, pois o
discurso se constitui no/pelo sujeito que, por sua vez, é interpelado pela
história e pelos (já) ditos antes dele (BRITO, 2012). Dessa forma, as
atividades não possuem um discurso pronto, este deve ser trabalhado e
construído em sala. Entretanto, os PETs foram elaborados para serem
feitos pelos alunos em casa, sem orientação/supervisão docente, o qual deve
combinar com os alunos somente a correção dos exercícios propostos. A
esse respeito, Orlandi (1987) defende a mediação como estratégia de ensino,
“não pensamos essa mediação no sentido de colocar a linguagem como
instrumento, mas pensamos, antes, a mediação como relação constitutiva,
ação que modifica, que transforma” (p. 25). Fazemos coro à ideia defendida
por Orlandi, essa falta de mediação, para nós, torna esse material exíguo.
Assim, entendemos que as atividades não foram suficientes para
contemplar as habilidades objetivadas pelo PET, as quais, segundo o
material, pretendiam desenvolver “a compreensão do mundo e de si
mesmo”; caracterizar as “formas de representação do imaginário brasi-
leiro”; relacionar a representação do Negro aos “contextos históricos e
literários diferentes” e relacionar de forma intertextual “um texto literário
e uma outra manifestação cultural de/sobre negro” (MINAS GERAIS,
2020, p. 4-5.). Contudo, o material não só não cumpriu esse objetivo,
como também não se mostrou eficiente para garantir um ensino de
Língua Portuguesa para os alunos de escola pública de Minas Gerais.
Por fim, esperamos que este capítulo contribua para o desenvolvi-
mento e para outras pesquisas analíticas do ensino e aprendizagem das
escolas brasileiras. Desejamos, ainda, que as reflexões propostas neste
trabalho inspirem a busca por mudanças no processo de ensino-apren-
dizagem nesse período sombrio para todos os brasileiros.

REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal.
São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 263-306.

129
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

BAKHTIN, M. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2011.

BRASIL. Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003. D.O.U. de 10 de janeiro de 2003.

BRITO, C.C.P. Diários reflexivos de professores de língua inglesa em formação


inicial: o outro que (me) confessa. In: SILVA, W. R. (Org.). Letramento do professor
em formação inicial: interdisciplinaridade no estágio supervisionado da licenciatura.
Campinas: Pontes, 2012. p. 139-163.

BROOKSHAW, D. Raça e cor na literatura brasileira. Porto Alegre: Mercado


Aberto, 1983.

CASTILHO, S.D. A Representação do Negro na Literatura Brasileira: Novas Pers-


pectivas. Olhar de professor, Ponta Grossa, 7(1): 103-113, 2004.

CAZARIN, E. A. A leitura: uma prática discursiva. Linguagem em (Dis)curso, v. 6,


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COSSON, R. Letramento Literário: Teoria e Prática. São Paulo: Editora Contexto, 2009.

EVARISTO, C. Da grafia desenho de minha mãe, um dos lugares. In: MARCOS,


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FURQUIM, C.H.B. O Ensino de Literatura Negra nas aulas de Língua Portuguesa:


(re)pensando o currículo e o papel do professor através da Linguística Aplicada Trans-
gressiva. Ouro Preto: Mescla, 2020, v. 1, ed. 1. Disponível em: https://periodicos.ufop.
br/mescla/article/view/4815 (acesso em: 18/06/2021).

G1 Minas. Aulas online na rede estadual de Minas Gerais começam na próxima


segunda-feira, diz SEE. Belo Horizonte. 13 de maio de 2020. Disponível em: https://
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nas-gerais-comecam-na-proxima-segunda-feira-diz-see.ghtml (acesso em 18/06/2021).

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Tutorado: 2º Ano do Ensino Médio Regular Diurno. Belo Horizonte: SEE, 2020.
Disponível em: https://estudeemcasa.educacao.mg.gov.br/pets (acesso em: 25/05/2021)

ORLANDI, E.P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. 13ª edição. Cam-


pinas: Pontes, 2020.

ORLANDI, E.P. A Linguagem e seu Funcionamento: as formas do discurso. 2 ed.


Campinas, SP: Pontes, 1987.

VOLÓCHINOV, V.N. Marxismo e Filosofia da Linguagem: Problemas fundamentais


do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução de Sheila Grillo e Ekaterina
Vólkova Américo. São Paulo: Editora 34, 2017.

130
CAPÍTULO 10 -O PAPEL DA CULTURA
NA CRIAÇÃO DE FRASEOLOGISMOS NO
CONTO CAPITOA DE HÉLIO SEREJO

Joseane Aparecida de Souza Francisco51


Luciene Cristina Paredes Müller52
Giselle Vasconcelos dos Santos Ferreira 53
Tânia Mara de Souza 54

INTRODUÇÃO

Este trabalho está amparado nos estudos da fraseologia, dessa


forma, partindo do pressuposto de que a cultura influencia na criação de
fraseologismos, propõe-se analisar o conto Capitoa do sul-mato-grossense
Hélio Serejo, com o intuito de inventariar as unidades fraseológicas usadas
pelo autor, fazendo um recorte de colocações que se referem à personagem
principal (uma mulher que foge do senso comum, no início do século
XX). A partir desse levantamento, investigar no dicionário geral Aulete,
quais as unidades fraseológicas registradas ou se foram inventadas pelo
autor. Dessa forma, realizar uma descrição léxico-semântica, observando
se há marcas da cultura fronteiriça nesses termos fraseológicos. Para isso,
tem-se como base teórica Corpas Pastor (1996), Durán e Pozas (1998),
Mendonça (2008), Aragão (2016), dentre outros teóricos.
O conto Capitoa, do autor Hélio Serejo, escrito em 1939, faz parte
da coletânea de contos Contos Crioulos, publicado pela Editora da UFMS
em 1998. Obra de caráter regionalista, onde a trama é construída na
região fronteiriça de Mato Grosso do Sul, na época ainda Mato Grosso.
51 
Mestra em Letras (UEMS). Professora de Língua Portuguesa e Literatura (Campo
Grande – MS). CV: http://lattes.cnpq.br/1484339777409880
52 
Mestra em Letras (UEMS). Professora de Língua Portuguesa e Literatura (Campo
Grande – MS). CV: http://lattes.cnpq.br/1138346009274059
53 
Mestra em Letras (UEMS). Professora de Língua Estrangeira Moderna Inglês
(Campo Grande – MS). CV: http://lattes.cnpq.br/3126710339246151
54 
Professora de Língua Portuguesa e Literatura (Campo Grande – MS). Escritora.
CV: http://lattes.cnpq.br/0281077086306282
131
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Maria Aparecida Belmonte, protagonista da história, luta na


Revolução do Gumercindo Saraiva em 1893 no Rio Grande do Sul, junto
com seu esposo capitão Belmonte que morreu na guerra. Após esse fato,
vem para Mato Grosso, na região de Nioaque, junto com alguns dos
homens que batalharam com seu marido. Trajada da farda que foi do
capitão Belmonte, uma espada e um revólver 44 do cabo preto, Capitoa
circulava pela região de Bela Vista e Campo Grande com seu bando,
ora travando lutas com os bandidos da região, ora apenas organizando
bailes para se alegrar.
Moreti (2008) no ensaio “A representação feminina em 4 contos
de Hélio Serejo’’ faz uma análise dessa narrativa evidenciando que essa
personagem marcada pelo pecado, mistérios, erotismo e diabrice foi
construída em um contexto no qual o machismo e o preconceito contra
a mulher eram latentes.
Segundo Mendonça (2008), Hélio Serejo nasceu em 1º de junho
de 1812, no município de Nioaque, na Fazenda São João, mas passou a
residir em Ponta Porã aos dois anos de idade. Considerado um profundo
conhecedor da história e dos costumes da região de fronteira, Ponta
Porã-Paraguai, Serejo relata em forma de narrativas suas experiências
na fronteira, documentando e transformando em ficção a paisagem
geográfica e humana da fronteira e de Mato Grosso do Sul.
De acordo com Aragão (2016), no estudo da língua, as variações
podem ter como determinantes, os aspectos socioculturais nos quais ela
está inserida. Ainda dentro dessa perspectiva, ao se referir ao léxico, a
autora supracitada salienta que “No caso específico do léxico, essa afir-
mação é ainda mais verdadeira, pois, toda a visão de mundo, a ideologia,
os sistemas de valores e as práticas socioculturais das comunidades
humanas são refletidas em seu léxico.” Assim, por meio do léxico, uma
cultura pode ser descrita, refletindo o pensamento de uma sociedade,
suas ideologias, lutas e preconceitos.
Compreendendo as unidades fraseológicas, objeto de estudo da
fraseologia, conforme Corpas Pastor (1996) como unidades léxicas, que
apresentam mais de duas palavras em sua composição, há uma frequência

132
Estudos em Cas@

de uso pela comunidade de fala, apresentam estabilidade, idiomatici-


dade, variação e gradação, o presente trabalho propõe uma análise do
conto Capitoa de Hélio Serejo. O intuito é inventariar os fraseologismos
usados pelo autor, fazendo um recorte de colocações que se referem à
personagem protagonista Maria Aparecida Belmonte. A partir desse
levantamento e de sua descrição léxico-semântica, investigar quais
lexemas são registrados nos dicionários gerais, ou se foram inventados
pelo autor, com marcas da cultura fronteiriça.

BREVE DISCUSSÃO SOBRE FRASEOLOGIA E


UNIDADES FRASEOLÓGICAS COM ENFOQUE NA
COLOCAÇÃO

De acordo com Tristá (1998) numa situação de comunicação,


o indivíduo utiliza em seu repertório vocabular palavras, que juntas,
formam ideias e se constituem em combinações livres ou fixas. Zava-
glia (2012) comungando desse pensamento, confirma que esse acervo
é composto por unidades lexicais simples (sol) compostas (guarda-sol) e
complexas (bater as botas). Diante disso, cabe a reflexão de que algumas
formas fixas são compreendidas, seja por um falante nativo da língua
ou por um falante não nativo, a partir de uma modificação semântica
dessa estrutura, observando os aspectos socioculturais em que estas
foram criadas, os falantes e onde circulam. Assim, cabe a Fraseologia,
o estudo destas unidades complexas.
Monteiro-Plantin (2014) em sua obra “Fraseologia: era uma vez
um patinho feio no ensino da língua materna” apresenta um breve his-
tórico da fraseologia. Segundo a autora, os primeiros estudos sobre a
“fraseologia teórica” foram iniciados pelo russo Michail V. Lomonósov
(1711-1765) ao incluir parêmias e modismos em sua gramática e fazer
uma análise entre a palavra e a frase. No século XIX Bréal (1897 [1924])
na obra Essai de Sémantique apresenta a distinção entre fórmulas, locuções
e grupos articulados.
Conforme a autora supracitada, ainda que em sua obra o enfoque
não fosse o estudo das unidades fraseológicas, Saussure (1857-1913)

133
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

aponta que a existência das combinações sintagmáticas não poderiam


ser improvisadas por serem estruturas cristalizadas pelo uso da língua.
Além de Saussure, Bally (1865-1947), no início do século XX “utiliza
o termo fraseologia no sentido de disciplina científica” (MONTEI-
RO-PLANTIN, 2014, p. 27), porém, foi o russo Vinogradóv (1946)
que iniciou sistematicamente os estudos específicos, como a primeira
classificação das unidades fraseológicas.
Diante disso, percebe-se que a inserção da Fraseologia como dis-
ciplina da linguística considerado recente e de acordo com Montoro del
Arco (2006) tem gerado muitas discussões pelos especialistas em várias
questões. Neste sentido, destaca que não há consenso sobre a questão
de a Fraseologia fazer parte da Lexicologia ou não pertencer a uma
disciplina específica. Segundo o autor, um entendimento nessa questão
pode ser o entendimento da Fraseologia no sentido mais amplo, como
ramo da Linguística ou mais restrito, como uma disciplina que estuda
fenômenos linguísticos como as unidades fraseológicas.
Em relação às unidades fraseológicas Sabino (2011) diz:
Ao consultar a literatura específica, é possível perceber
que não há limites rígidos capazes de estabelecerem e
delimitarem, com precisão, a diversidade de fraseolo-
gismos existentes. Fica evidente que ainda não há muito
consenso sobre quais unidades são objetos de estudos
da fraseologia, nem tampouco sobre as denominações
que elas devem receber, quer dizer, não há uma con-
cordância de ideias entre os teóricos no que diz respeito
aos termos genéricos que nomeiam os diversos tipos
de combinações de palavras. (SABINO, 2011, p. 385)

Mesmo diante das divergências apresentadas por Sabino (2011), o


presente trabalho não pretende entrar nesse campo de discussão, mas sim,
apresentar em quais teóricos está amparado, ao se referir à fraseologia,
unidades fraseológicas, com destaque para a colocação. Em relação a
delimitação do que pode ser considerado unidade fraseológica, Corpas
Pastor (1996) apresenta algumas características que as combinações
de palavras devem ter: serem formadas por várias palavras; terem usos
frequentes pela comunidade de fala; possuírem estabilidade, ou seja,

134
Estudos em Cas@

apresentar formas que se repetem; apresentarem algumas particularida-


des semânticas ou sintáticas; ser passível de modificações nos elementos
que as integram.
Apoiada nas ideias de Casares (1950) a autora supracitada propõe
uma taxionomia das unidades fraseológicas que será utilizada neste
trabalho. Dessa forma Corpas Pastor (1996, p. 270) divide os fraseolo-
gismos em três esferas distintas:
• Esfera I: Colocações;
• Esfera II: Locuções;
• Esfera III: Enunciados Fraseológicos.
Assim, partindo do princípio que um dos objetivos do traba-
lho é inventariar as colocações do conto Capitoa de Hélio Serejo, fica
delimitado a definição de apenas este fraseologismo. Nesse sentido,
Cansanção (2015) apresenta o conceito de colocação, segundo Corpas
Pastor (2016) “como unidades fraseológicas completamente livres, do
ponto de vista do sistema da língua, mas que, ao mesmo tempo, apre-
sentam certo grau de restrição combinatória determinada pelo uso, isto
é, certa fixação interna.” Tais colocações podem ser compostas de:
• V + (prep. +) S (objeto) = colocar para funcionar
• Adj. / S+ S = momento crucial
• Adj. + Adv. = diametralmente oposto
• S + prep. + S = banco de dados
• V + adv = negar veementemente
• V + S = correr um boato

CULTURA E FRASEOLOGISMO

De acordo com Barbosa (1981) “Língua, sociedade e cultura são


indissociáveis, interagem continuamente, constituem, na verdade, um
único processo complexo[...]”. Nessa perspectiva, Aragão (2016) acres-
centa que ao tratar do léxico, essa afirmação é ainda mais fácil notar,
pois “toda a visão de mundo, a ideologia, os sistemas de valores e as

135
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

práticas socioculturais das comunidades humanas são refletidos em seu


léxico.” Segundo a autora, para que se possa ter a compreensão, explicar
e descrever a “visão de mundo” de um determinado grupo, inserido em
uma determinada sociedade, cultura, com seus aspectos linguísticos ou
grupos de especialistas/ profissionais, as unidades lexicais e sua relação
com o contexto que são os objetos de estudo.
Nesse viés, Marques e Isquerdo (2019) no artigo “Locuções no
universo lexical pantaneiro: em busca de marcas de idiomaticidade” ana-
lisa as locuções que estão relacionadas ao léxico do universo pantaneiro
(flora, folclore, animal, comportamento animal, meio de transporte).
Assim, conclui que:
a natureza semântica das locuções analisadas e as rela-
ções estabelecidas com a realidade a que se reportam
deram mostras de que, também no âmbito dos fraseolo-
gismos, o léxico traduz a maneira de um grupo social ver
e interpretar a realidade que o cerca, ou seja, as formas
de percepção desse “cosmos”, organizado segundo “leis”
que ordenam e classificam o universo físico-cultural.
(MARQUES, 2019, p. 188)

Durán e Pozas (1998) ao escrever sobre o papel da cultura na


criação de fraseologismos, apontam que há unidades fraseológicas em
que “a motivação provém da observação direta de fenômenos naturais
com alusão a fatos históricos, lendas, mitos nacionais ou culturas, tam-
bém de crenças, ritos, cerimônias.” Para analisar esse amplo espectro,
dividiram em quatro tópicos: a) bíblicos; b) clássicos; c) nacionais; d)
raciais, preconceito. Ao explanar sobre o tópico racial, preconceito,
salientam que existem numerosas expressões relacionadas a minorias
étnicas, mulheres e grupos marginalizados, ainda que nas sociedades
contemporâneas têm-se feito um grande esforço para evitá-las ou desen-
terrá-las do idioma.

OBJETIVOS

A pesquisa do conto regional Capitoa de Hélio Serejo teve uma


série de objetivos específicos:

136
Estudos em Cas@

a) Inventariar os fraseologismos usados pelo autor, fazendo um


recorte de colocações que se referem à personagem principal (uma mulher
que foge do senso comum, no início do século XX);
b) Investigar no dicionário geral Aulete, quais as unidades fra-
seológicas registradas ou se foram inventadas pelo autor;
c) Realizar uma descrição léxico-semântica, observando se há
marcas da cultura fronteiriça nesses termos fraseológicos.

METODOLOGIA E APRESENTAÇÃODE DADOS

O levantamento das colocações do conto Capitoa de Hélio Serejo,


apresentadas neste trabalho, foi realizado de forma manual. Para este
estudo, selecionou-se 8 colocações, cujo lexema mulher se junta com
outros termos (combinações de dois léxicos) para se referir à Capitoa no
decorrer do conto. As colocações selecionadas foram submetidas a um
corpus de controle composto pelo dicionário de língua geral (AULETE
2014/online) a fim investigar quais as unidades fraseológicas registradas
ou se foram inventadas pelo autor. Assim, os fraseologismos (organizados
pela ordem em que surgem no texto) foram:
• Mulher bestial
• Mulher monstro
• Mulher pantera
• Mulher fera
• Mulher estranha

APRESENTAÇÃO DE DADOS

O conto Capitoa tem o princípio da narrativa no Rio Grande do


Sul em um contexto de guerra (Revolução do Gumercindo Saraiva).
Neste primeiro momento, o autor Hélio Serejo se refere à protagonista
como Maria Aparecida Belmonte, a esposa companheira do capitão
Belmonte que luta com ele na guerra até a sua morte.
A partir deste fato, inicia-se o processo de constituição da Capitoa
que será consolidado na região de Nioaque, região de fronteira de Mato
137
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Grosso do Sul. Nesse sentido, descreve sua nova forma de se vestir, com
a farda do falecido; suas indumentárias, armas, hábitos e desejos. Ao
retratar o gosto que a personagem tinha por “acariciar mocinhas despon-
tando para a perigosa fase fisiológica” (SEREJO, 1998, p. 84) refere-se
a ela como “mulher bestial”, esta combinação de substantivo + adjetivo,
possui o sentido de caracterizá-la como uma selvagem, grotesca, doente.
Na sequência, ao surgir na narrativa, uma personagem desafiando
Capitoa. Um moço de Minas Gerais que percorre a região, não confor-
mado com os seus feitos, insulta-a, utiliza-se a colocação (substantivo
+ adjetivo) “mulher monstro”, com o intuito de desmoralizá-la. “Com
a sua horrorosa feiura vive matando as crianças de susto” (SEREJO,
1998, p. 84).
Capitoa ao tomar conhecimento de tal desaforo, prepara uma
emboscada para se vingar do rapaz bonito, robusto e simpático. Com seu
bando, começa persegui-lo até conseguir o momento exato de sequestrá-
-lo, levando para seu rancho. Como punição pelo que disse, o mineiro
passou a ser seu amante. Nesta fase em que ela está apaixonada pelo
seu inimigo, o autor a intitula de “mulher pantera”. Tal locução (subs-
tantivo + adjetivo) não está relacionada ao fato de a mulher ser bonita,
atraente, mas ao fato de amante considerá-la agressiva, “um monstrengo”
(SEREJO, 1998, p. 87).
A trama vai sendo construída e a protagonista após perder o
amante pela guerra, tendo em vista que Marcos preferiu participar da
Revolta do Gomes, do que continuar com ela, conhece outro homem e
este o torna seu novo amante. Porém, o encontro entre Pedro e Anita,
moça fugitiva do Paraguai por causa de seu marido violento, encerra o
período de lealdade que ele dispensava a Maria Aparecida Belmonte.
Esta, ao saber que ele planejava fugir com sua nova amada, pede
aos homens de seu bando que os dessem uma surra nele, para aprender
uma lição, mas termina em tragédia. Seus homens acabam baleando o
rapaz que morre sob seus cuidados. Hélio Serejo retrata esse momento
evidenciando o lado mais humano da personagem, contudo, na locução
(substantivo + adjetivo), “mulher fera” (SEREJO, 1998, p. 89) ainda é

138
Estudos em Cas@

latente a carga negativa atribuída a ela, mesmo em situações em que se


desvencilha do ser Capitoa para se tornar Maria Aparecida Belmonte.
Já no desfecho do conto, Capitoa recebe um aviso do tenente
Gomes de que não poderia mais se vestir como homem, como resposta
disse “que era dona de seu nariz e naqueles rincões não recebia ordens
de ninguém” (SEREJO, 1998, 93). Gomes para provar que não estava
blefando, captura-a, toma suas armas, suas vestes masculinas e raspa
sua cabeça. Diante dessa imagem, a protagonista se envereda para os
arredores de Campo Grande. O autor neste trecho a denomina como
“mulher estranha”, tal locução (substantivo + adjetivo) remete a trans-
formação física que ela teve.

COSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise léxico-semântica das colocações do conto


Capitoa, leva a concluir que combinação do lexema mulher (substantivo)
tornou-se a base e a parte que a caracterizava (os adjetivos), o colocado,
ao se referir à protagonista. Em relação ao significado de cada locução
pesquisada no dicionário geral Aulete (2014), constatou-se que nenhuma
delas o dicionário fazia referência, sendo assim, Hélio Serejo, ao combi-
nar as lexias, utilizando a estrutura (substantivo + adjetivo) no sentido
conotativo, atribui um significado próprio.
Esse novo sentido remete à cultura fronteiriça, pois ao se referir
à Capitoa como “mulher pantera” e “mulher fera” traz à tona o animal
mais temido, feroz e selvagem de nossas matas, a onça. A protagonista vai
ocupando seu espaço em um cenário marcado por uma sociedade em que
as mulheres eram submissas e reduzia suas vidas em rotinas domésticas.
Assim, Hélio Serejo, ao mencionar as façanhas desta personagem que
comanda um bando, usa roupas masculinas, possui vários amantes, gosta
de organizar bailes e de acariciar meninas, utiliza locuções ou colocações
com carga de preconceito como em “mulher monstro”, “mulher bestial”,
“mulher estranha”. Tal postura aponta para o papel da cultura na criação
de fraseologismos, tendo como motivação as crenças, valores, o ambiente,

139
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

os conflitos da região de fronteira Nioaque e arredores, como cenário


para a obra Capitoa.

REFERÊNCIAS
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et Linguística, v. 25, p. 21-28, 2020.

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de Souza Silva Costa; Dayme Rosane Bençal. (Org.). Nos Caminhos do Léxico. 1ºed.
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CANSANÇÃO, J. As locuções: uma breve discussão sobre o seu lugar na Fraseolo-


gia. Domínios de Lingu@gem, v. 9, n. 5, p. 336-352, 28 ago. 2015.

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VES, A. V.; GÓIS, M. L. de S. Ciências da Linguagem: o fazer científico? Campinas:
Mercado de Letras, 2012. p. 231-264.

140
CAPÍTULO 11 -UMA REFLEXÃO SOBRE O
USO A LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA
COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA

Gabriel Batista Mota 55


Gabriela das Graças Oliveira Leal 56

INTRODUÇÃO

A Comunicação, e suas muitas variantes, tem como uma de


suas características a capacidade de auxiliar a Educação, pois oportu-
niza a inserção de ferramentas pouco habituais ao método pedagógico
tradicional.
Dentre esses recursos, a linguagem cinematográfica, que trabalha
com imagens detalhadas e até simplificadas, já foi alvo de estudos para
avaliar sua capacidade de desempenho na Educação, pois sua performance
imagética consegue comunicar com o estudante o assunto sugerido.
Esta relação entre cinema e educação é debatida há décadas e,
com a prática do audiovisual, fortaleceu-se no contexto escolar, levando
em consideração que o cinema colabora com a formação cultural da
sociedade. Duarte (2009, p. 70) comenta que “[...] embora valorizado,
o cinema ainda não é visto pelos meios educacionais como fonte de
conhecimento”.
Assim, o presente capítulo debate uma proposta de inserção desta
linguagem na escola, como ferramenta pedagógica, a partir de apre-
ciações bibliográficas e do relato de uma oficina audiovisual produzida
com crianças de 10 e 11 anos de uma escola periférica da rede pública
de um município do interior sudoeste paulista.

Mestrando em Educação (UNESP). CV: http://lattes.cnpq.br/1058264641736979


55 

Especialista em Docência e Gestão na Educação Superior (UNOESTE).


56 

CV: http://lattes.cnpq.br/3584650855079065
141
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

O CINEMA NO AMBIENTE ESCOLAR: DO FILME


DE ANIMAÇÃO AO STOP MOTION

O nascimento do cinema se baseia nos estudos e experimenta-


ções de vários profissionais, como o fotógrafo Muybridge57 e Georges
Meliès58. A criação desta arte da forma como a conhecemos hoje, no
sentido de produção e exposição de longas e curtas-metragens, é atribuída
aos irmãos franceses Louis e Auguste Lumière, que apresentaram o
primeiro longa-metragem, que se tem conhecimento, em dezembro de
1895. Este acontecimento ocorreu no salão do Gran Café, no nº 14 do
Boulevard des Capucines, em Paris, e teve com a audiência de 33 pessoas
(NAPOLITANO, 2006, p. 68-69).
O surgimento do Cinema ocorreu devido a suas intenções acadê-
micas, uma vez que ele pode dar uma ajuda ao aprendizado dos teles-
pectadores de suas produções e permite, se conhecer sua a linguagem,
melhorar a forma com que consumimos os produtos fílmicos, já no Brasil
este conceito só chegou em 1986 (DUARTE, 2009).
Embora as companhias percursoras da produção fílmica com
objetivo acadêmico aconteceram na Alemanha e França, entre os séculos
XIX e XX, e era destinada ao ensino da Medicina, no Brasil, também
houve algo parecido em 1907 quando o cirurgião Chapot-Prevost 59
separou, e filmou, duas irmãs xipófogas na cidade do Rio de Janeiro
(PFROMM NETTO, 2011).
Discutindo ainda a capacidade instrutiva do cinema, Pfromm
Netto (2011, p. 109) aponta psicólogos e educadores já analisavam os
filmes desde o cinema mudo. Almeida, Falcão e Citelli (2012, p. 1)
57 
Eadweard James Muybridge foi um fotógrafo conhecido por suas experiências com
várias câmeras. Tinha como objetivo captar os movimentos imperceptíveis na visão
normal (FABRIS, 2004, p. 52).
58 
Marie Georges Jean Méliès nasceu em Paris, em 1861 e faleceu em 1938. Jovem,
aprendeu truques de mágica, que também é chamada de ilusionismo. Méliès é consi-
derado o “[...] pai dos efeitos especiais [...]” (ANTÔNIO, 2012).
59 
Eduardo Chapot-Prevost nasceu em 25 de junho de 1864 e morreu em 19 de outubro
de 1907. Também foi o pioneiro no ensino de histologia e da cirurgia. Ficou famoso
como professor e cirurgião em 1900 pela operação da primeira separação de pacientes
xipófagas (FERREIRA, 1989, p. 52).
142
Estudos em Cas@

também acrescentam que no mundo contemporâneo e tecnológico atual


o Cinema e a Educação estão intrinsecamente ligados.
Para oficializar a exibição do cinema no ambiente escolar, foi
criado o Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE) e, como
lembram Bacco e Lima (2012, p. 5), este ato aconteceu em 1936, mas é
importante estar alerta de que a linguagem audiovisual apenas por si só
não está encarregada de todo o conteúdo, pois, como apontam as autoras
(2012, p. 13), “[...] o cinema como simples representação ou ilustração do
passado ou como pretexto para as demais atividades não vai contribuir
para a formação do cidadão-crítico do século XXI”.
Entre as linhas de atuação prática do cinema que conseguem
auxiliar a Educação está o filme de animação, um gênero muito popular
entre as crianças principalmente por ser a base dos desenhos infantis de
animação, que por ser do convívio destes jovens pode ser selecionado para
a produção de trabalhos ou experiências cinematográficas em sala de aula.

O FILME DE ANIMAÇÃO

Esta vertente do cinema foi criada no século XVIII pelo cien-


tista holandês Pieter van Musschenbroek60, mas só recebeu o nome de
animação – derivada do latim animare (“dar vida a”) – no século XX e
a primeira exibição de um filme animado aconteceu em 1891 quando os
cientistas Thomas Edison61 e William Dickson62 criaram o kinetoscópio,
um objeto que permitia as pessoas de observarem individualmente filmes
de animação de cerca de 30 segundos, já o primeiro desenho animado

60 
Pieter van Musschenbroek o foi responsável em produzir a ilusão de movimento,
em 1736, ano da primeira exibição animada (FOSSATTI, 2009).
61 
Thomas Alva Edison patenteou o desenvolvimento de diversos dispositivos de
grande interesse industrial, como baterias, luzes e energia elétrica, toca-discos e
gravação de sons, cimento, mineração, imagens em movimento, telégrafos e telefones
(BARKSDALE, 2012).
62 
William Kennedy Laurie Dickson foi um dos inventores do kinetoscópio, que
era um aparelho que permitia a observação de apenas uma pessoa por vez, não sendo
destinado à projeção (LUCENA JÚNIOR, 2011).
143
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

da história foi o Fantasmagorie 63 (1908) de Émile Cohl64 (LUCENA


JÚNIOR, 2011).
Por seu grande potencial na esfera educativa, além de sua relação
com as crianças por meios dos desenhos infantis, os filmes de animação
evoluíram de forma relativamente rápida para os padrões da época, já
que em meados de 1970 já que nesta época já havia películas animadas
em 2D e 3D (LUCENA JÚNIOR, 2011). Entre as evoluções houve
também o crescimento de uma sub vertente dos filmes de animação
que foi o stop motion, técnica que é a base dos filmes de animação e dos
desenhos infantis por se resumir na organização sequencial de imagens
e que, postas em rápida velocidade, dão a ilusão de movimento.

A TÉCNICA DO STOP MOTION

Assim como o filme de animação é uma vertente da linguagem


audiovisual, a técnica do stop motion pode ser utilizada em qualquer
perspectiva cinematográfica.
O processo consiste em fotografar uma pessoa ou objeto, quadro a
quadro, e em seguida posicionar estas imagens em sequência e em rápida
velocidade, dando assim a sensação de movimento (NISIO, 2011), além
disso, visto que para cada segundo é preciso 24 fotos, é necessário cuidado
com a disposição dos elementos – cenários e bonecos – já que qualquer
movimento pode causar defeitos no resultado (MAGALHÃES, 2015).
O stop motion conta com quatro recursos chamados Claymation,
Pixilation, Claypainting e Time-lapse, sendo que o primeiro é o mais
popular por usar materiais flexíveis como barro e massa de modelar;
o segundo, por sua vez, é uma variação de seu antecessor e se baseia
nas técnicas de animação de barro, tradicional e de recortes; o terceiro
resume-se na fotografia de seres humanos ao invés de objetos e o último,

63 
Vídeo disponível no YouTube em: https://www.youtube.com/watch?v=aEAObel8yIE.
64 
Émile Eugène Jean Louis Courtet, popularmente conhecido como Émile Cohl,
é considerado o “[...] pai do desenho animado [..]”, por ser o pioneiro na produção do
gênero (CANTO, 2016, p. 80).
144
Estudos em Cas@

o Time-lapse, é uma modificação distante da técnica e é usado quando o


objetivo é dar velocidade às imagens (NISIO, 2011, p. 20).
Deste modo, compreendo as inter-relações entre o Cinema e a
Educação, o filme de animação e a técnica de stop motion, a investiga-
ção que precedeu o capítulo em questão propôs, como oficina prática,
a produção de curtas-metragens em stop motion em uma sala de aula da
rede pública do interior do estado de São Paulo. A ação intitulada como
“Oficina animAÇÃO” foi um projeto piloto que teve como enfoque o
ensino básico público no interior brasileiro e que objetivava a discussão
e o estudo da inserção cinematográfica no contexto escolar (MOTA et
al., 2016).

O PROJETO “OFICINA animAÇÃO”

A Oficina animAÇÃO foi um projeto piloto que partiu do enten-


dimento do cinema, enquanto ferramenta pedagógica, voltada para o
ensino básico paulista e foi intitulada como animAÇÃO por harmonizar
o gênero animação com a necessidade de ter um projeto mais intensifi-
cado com as crianças no contexto escolar.
Sem desvalorizar a função predominante do docente, a oficina
objetivou agregar ao cenário educacional uma visão diferenciada sobre
a linguagem cinematográfica e foi aplicada em uma sala de 5º ano de
uma escola periférica de um município de médio porte paulista, de
aproximadamente 300 mil habitantes.
A turma de crianças, na época do projeto, era composta por 29
crianças, sendo 17 meninos (58%) e 12 meninas (42%). A faixa etária
era de 10 (28%) e 11 anos (72%) (MOTA et al., 2016).
Após apresentar a oficina na escola e a fim de introduzir a docente
da sala selecionada no ambiente cinematográfico, foi produzida uma
animação em stop motion exclusivamente com a professora em questão,
que contava, basicamente, o significado do cinema. É indispensável que
o docente compreenda sobre o recurso audiovisual, pois “[...] não precisa
ser crítico profissional de cinema para trabalhar com filmes na sala de
aula. Mas o conhecimento de alguns elementos de linguagem cinema-
145
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

tográfica vai acrescentar qualidade ao trabalho” (NAPOLITANTO,


2006, p. 57).
Para compor o material didático que ajudaria na oficina e, poste-
riormente, seria deixado na instituição à disposição do corpo docente,
produziu-se uma cartilha e seis videoaulas. A cartilha auxiliou objetivou
a fixação dos conteúdos e, também, orientar o(s) docente(s) sobre o pro-
cesso de produção de um audiovisual. Já as videoaulas contextualizam
o cinema, o gênero animação e a técnica do stop motion.
Vale lembrar que, antes do início da oficina, os estudantes foram
levados até o cinema local, na ocasião assistiram ao filme “Procurando
Dory”65, para conhecer o ambiente cinematográfico.
Nos dias seguintes após conhecerem o cinema, foi exibido o
curta produzido pela professora e, com isso, iniciou-se a oficina com as
crianças. Com o auxílio da docente, cinco equipes foram formadas e
cada uma deveria escolher, de acordo com o conteúdo programático da
escola, um tema e o nome que daria ao grupo.
A próxima etapa consistiu em desenvolver a oficina mediante três
etapas que compõem a produção de um audiovisual: a pré-produção,
produção e pós-produção.

ETAPAS DA PRODUÇÃO DOS CURTAS EM STOP


MOTION

A oficina animAÇÃO foi desenvolvida e realizada por meio de


três etapas: a pré-produção, produção e pós-produção.
A fase de pré-produção teve seu início com a formulação do tema
ou assunto que foi apresentado no trabalho. Com o tema escolhido, todas
as equipes formadas tiveram a orientação, tanto da professora quanto
pelos pesquisadores.

65 
O filme narra a história de uma peixe azul que possui perda de memória e tenta
reencontrar seus pais (PROCURANDO DORY, 2016).
146
Estudos em Cas@

Com o objetivo de estruturar as ideias os grupos produziram um


storyboard66, já que a “[...] idéia [...] precisa ser a mestra; a técnica deve se
submeter a ela” (WATTS, 1999, p. 22). Nesta etapa, o produtor é o único
responsável pela confecção da ideia, porque é imprescindível pensar “[...]
naquilo que realmente lhe interessa e você terá chance de ter uma idéia
de produção que seja atraente às outras pessoas” (WATTS, 1999, p. 23).
A fase de produção consistiu em colocar em prática as ideias
formadas anteriormente, por meio da fotografia e iluminação, o que per-
mitiu que as figuras formassem a história planejada na pré-produção. As
equipes produziram manualmente todo o material físico e, em seguida,
com a orientação dos pesquisadores, tiraram fotos de suas animações
em stop motion utilizando um tripé artesanal (feito com garrafa pet)67
e uma câmera fotográfica semiprofissional que, certamente, pode ser
substituída por um aparelho celular.
A pós-produção, última etapa que compõe o processo de construção
de um audiovisual, foi realizada a partir da junção de todo o conteúdo
produzido e recebeu ajustes necessários por meio de softwares de edição.
A Oficina animAÇÃO obteve como resultado cinco curtas-metra-
gens, e todas as etapas estão disponíveis ao público em sua página oficial
no Facebook68. Após a conclusão das etapas explanadas anteriormente,
e com o objetivo de debater, comentar, opinar e propor melhorias para
as produções audiovisuais futuras, foi realizado um diálogo entre as
crianças em formado de roda de conversa.

66 
Na Oficina animAÇÃO os estudantes, durante a fase de pré-produção, desenharam
a história que iriam contar quadro por quadro, para saber quais imagens produzir e em
que ordem elas seriam postas para a fotografia na fase de produção.
67 
O vídeo com uma das formas de se construir um tripé artesanal pode ser assistido
no YouTube pelo link: youtube.com/watch?v=HQNkJs2DUxY&feature=iv&src_vid=-
qu5gvQEzh-4&annotation_id=video%3A3b85511a-cf19-4d05-8a18-168c21f b2f10.
68 
Disponível em: www.facebook.com/animacaooficina.
147
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

RODA DE CONVERSA SOBRE AS ANIMAÇÕES

Para a roda de conversa, todos os discentes que estavam presentes


em sala de aula se sentaram em forma de “U” para que, após a exibição
dos curtas produzidos, uma discussão sobre os vídeos fosse efetuada.
Os curtas, produzidos pelas crianças, intitulados “A regra do três
(Grupo “Super Animação”), “A história do basquete” (Grupo “Heróis
do Basquete”), “As Cores Super D+” (Grupo “Super D+), “Bob, o cão-
zinho” (Grupo “Diversão”), “O Tubarão Branco” (Grupo “Combate”)
foram exibidos nesta ordem. A sala permaneceu quieta, era notável que
as crianças estavam interessadas ao ver os curtas finalizados.
Com o objetivo de debater, os pesquisadores fizeram algumas
perguntas sobre o material exibido e os grupos tiveram a possibilidade de
abordar as principais dificuldades que tiveram ao produzirem os curtas.
A equipe “Diversão” explanou que fotografar requer bastante
atenção e concentração “[...] porque não podia mexer se não a foto iria
sair ‘faiscada’” (FRANCISCO, 2016)69. O estudante João Paulo Mar-
tins (2016)70, relatou que seu maior obstáculo foi gravar o áudio, que
foi utilizado como off, “[...] eu até gostei, mas me atrapalhei na hora de
gravar o áudio”.
O grupo “Super D+” mencionou que houve dificuldade para esbo-
çar as imagens e recortá-las. Já as equipes “Super Animação”, “Combate”,
“Heróis do Basquete” declarou que produzir o roteiro e gravar o texto
foram as atividades mais complexas, pois, conforme eles, a leitura é uma
tarefa complicada, além do esforço para confeccionar os desenhos maiores.
Vale ressaltar que todos os grupos participantes conseguiram
assimilar o tema dos curtas-metragens exibidos.
A orientadora pedagógica da escola, Jaqueline Leite Oliveira
Silva Macedo, e a professora da sala, Roberta Paraizo Orosco Barcellos,
concluíram que é pertinente continuar projetos como este e sugeriram
69 
Entrevista com Silvia Francisco, estudante da Escola Municipal Profa. Odette Duarte
da Costa. Entrevista sobre a oficina. Concedida a João Pedro Rossini. 30 set. 2016.
70 
Entrevista com João Paulo Martins, estudante da Escola Municipal Profa. Odette
Duarte da Costa. Entrevista sobre a oficina. Concedida a Gabriela Leal. 30 set. 2016.
148
Estudos em Cas@

que poderiam “[...] fazer outros stop motion e aí talvez poderíamos fazer
com turmas de 3º e 4º ano, pois essas turmas estariam mais um ano na
escola, pelo menos. Um aluno passaria ao outro” (MACEDO, 2016)71,
ainda segundo Macedo, era visível a mudança de comportamento e
desempenho dos discentes em sala de aula, “[...] têm crianças, por exemplo,
que tem um sério problema sério de comportamento, mas em questão
de leitura melhorou bastante [...] então foi muito válido”.
A docente Roberta afirmou que delimitar o tema ou assunto
auxilia no processo da produção audiovisual, pois “[...] pode até ser vários
temas, mas espalhar durante o ano, cada bimestre um tema. Uma coisa
mais pontual” (BARCELLOS, 2016)72.
Todavia, a forma de preparação e elaboração dos audiovisuais em
stop motion possibilitou discussões, além da linguagem cinematográfica,
de diversos temas que costumeiramente não são discutidos em sala de
aula e contribuiu para o trabalho em equipe, o senso crítico e estético
dos discentes envolvidos, e por meio da roda de conversa obteve-se esse
feedback.

O “FESTIVAL ANIMAÇÃO”

O 1º Festival de curtas-metragens da referida escola ocorreu dia


11 de novembro de 2016 – durante a mostra pedagógica da instituição. O
evento foi idealizado pelos graduandos a fim de exibir para toda a comu-
nidade, discentes, docentes e a gestão escolar, os cinco curtas-metragens
produzidos pelas crianças participantes do projeto. Na oportunidade, os
audiovisuais foram apresentados e exibidos ao público presente.
A diretora, orientadora pedagógica e professora da sala da ins-
tituição expuseram sobre a importância de projetos audiovisuais como
esse, além de corroborar a relevância de continuar com a aplicação deste
tipo de trabalho.
71 
Entrevista com Jaqueline Macedo, orientadora pedagógica da Escola Municipal
Profa. Odette Duarte da Costa. Entrevista sobre a oficina. Concedida a Gabriela
Leal. 28 set. 2016.
72 
Entrevista com Roberta Barcellos, professora da Escola Municipal Profa. Odette
Duarte da Costa. Entrevista sobre a oficina. Concedida a Gabriel Mota. 28 set. 2016.
149
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

A secretária municipal do referido município interiorano paulista,


que também estava presente no evento, após a apresentação dos vídeos
dos discentes, discorreu sobre a evolução das crianças no quesito leitura e
interpretação. “O fato de conseguirem motivar as crianças para que elas
possam aprender mais e muito mais, porque vocês viram como elas vão
ficando mais desenvoltas, vão lendo melhor, interpretando melhor, elas
vão, inclusive, tendo uma autoestima desenvolvida” (GERBASI, 2016)73.
No término do evento, os autores do projeto entregaram um
DVD, contendo todos os curtas-metragens desenvolvidos, às gestoras
da escola, à professora e aos discentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A linguagem cinematográfica chegou à Europa por meio dos


irmãos Lumière, porém não se tinha proporção do potencial pedagó-
gico que esta arte continha. De acordo com Pfromm Netto (2011), o
audiovisual possui uma base para a aprendizagem, principalmente, em
relação ao ensino rápido e em massa, além de influenciar o aprendizado
e ampliar de forma fácil os conhecimentos.
Com a experiência da oficina, os pesquisadores acreditam que é
possível utilizar a película de animação enquanto ferramenta pedagógica.
Trabalhos externos, como este, possibilitam auxílio à educação. Contudo,
é importante capacitar os envolvidos antes de executar o projeto, pois
compreender sobre a construção de um audiovisual é primordial a fim
de aproveitar tudo que é abordado.
A Oficina animAÇÃO foi um projeto piloto sobre o uso do
cinema no contexto educacional e propõe que novas experiências sejam
fomentadas no âmbito acadêmico, pois a Comunicação pode promover
ferramentas e recursos contemporâneos à prática pedagógica, uma vez
que a linguagem audiovisual é meio de comunicação universal e aces-
sível a todos.

73 
Entrevista com Ondina Barbosa Gerbasi, secretária da Educação. Entrevista sobre
o 1º Festival de curtas-metragens na E. M. Profa. Odette Duarte da Costa. Concedida
a Isabelle Garcia. 11 nov. 2016.
150
Estudos em Cas@

Cabe ressaltar que trabalhar com temas que sejam de interesse


do público-alvo é essencial para obter um bom resultado. Sendo assim,
os pesquisadores concluem que é de extrema importância discutir as
relações entre a Comunicação e a Educação, com o objetivo de instaurar
práticas no ambiente escolar, viabilizando a reflexão sobre a linguagem
cinematográfica e a prática audiovisual na sociedade moderna, além de
incitar a introdução desta ação nas políticas públicas brasileiras e no
âmbito educacional.

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152
CAPÍTULO 12 -FERRAMENTAS DIGITAIS
DE ESCRITA: O USO DO PADLET EM
AULAS DE LÍNGUA INGLESA

Felipe Ridalgo Silvestre Soares74


Larisse Carvalho de Oliveira75
Shalatiel Bernardo Martins76
Guilherme Mariano Martins da Silva77
Aline Rodrigues Nogueira78
Fernando Gledson dos Santos Lima79

INTRODUÇÃO

Devido a disseminação desenfreada do Sars Covid 19 (coronavírus)


e do reconhecimento da epidemia como uma pandemia, pela Organização
Mundial da Saúde (OMS), em março de 2020, governantes de vários
países e estados decidiram tomar medidas sanitárias de confinamento
para tentar frear a contaminação da população. No estado do Ceará,
o governo, por meio do decreto 33.510 de 16 de março de 2020, sus-
pendeu as atividades presenciais nas instituições de ensino do estado.
Dessa forma, a comunidade estudantil e acadêmica passou a utilizar a
modalidade de ensino remoto emergencial (ERE), por meio de recursos
e ferramentas digitais em formato síncrono e assíncrono.

74 
Especialista em Ensino de Língua Inglesa (URCA). Docente auxiliar do Curso
de Letras (URCA). CV: http://lattes.cnpq.br/5206171381109433
75 
Doutora em Linguística (UFC). Docente do Curso de Letras (URCA).
CV: http://lattes.cnpq.br/2794064875697662
76 
Mestre em Linguagem e Ensino (UFCG). Docente do Curso de Letras (URCA).
CV: http://lattes.cnpq.br/620535012535572
77 
Doutor em Teoria da Literatura (UNESP). Docente do Curso de Letras (URCA).
CV: http://lattes.cnpq.br/0575853650983402
78 
Doutora em Linguística (UFC). Docente do Curso de Letras (URCA).
CV: http://lattes.cnpq.br/9559489937223838
79 
Especialista em Ensino de Língua Inglesa (URCA). Docente (SEDUC-CE).
CV: http://lattes.cnpq.br/2122690328295223
153
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Apesar de ser confundida com a educação a distância (EAD),


o ERE nasceu de uma necessidade, sem planejamento e documentos
oficiais que auxiliassem a sua prática (CARMO; CARMO, 2020),
diferentemente daquele. No entanto, com a permanência dessa forma de
ensino portarias - 343, 345, 544, 1.038 - foram instauradas para respal-
dar e organizar as atividades e interações possíveis no ERE (BRASIL,
2020, a, b, c, d).
Com esse cenário sanitário, o ensino de línguas estrangeiras, que
geralmente tem como principal foco desenvolver habilidades comunica-
tivas, orais e escritas por meio de interação contínua entre os estudantes,
passou a acontecer em plataformas digitais como o Google Meet, Google
Classroom e Youtube, aplicativos como o WhatsApp e/ou outras ferramentas
digitais de fácil acesso.
Frente à essas adversidades, objetivamos com este estudo investigar
de que maneira a plataforma de compartilhamento é capaz de fomentar
a aprendizagem de escrita em língua inglesa, em componentes curri-
culares do curso de Letras Inglês, da Universidade Regional do Cariri
(URCA), no estado do Ceará.
Justificamos a importância de nosso trabalho pelo seu teor mul-
timodal e de letramento digital, características que devem compor o
arsenal da maioria dos docentes que pretendem implementar metodo-
logias ativas que prezem por uma maior interação entre seus pares e
uma educação significativa e de qualidade. Além disso, ressaltamos que
estudiosos das áreas de Tecnologias Digitais da Informação e Comuni-
cação (TDIC), multimodalidade e multiletramentos podem vir a utilizar
nossa experiência como um exemplo de ponto de partida para modificar
suas vivências pedagógicas.
Nas seções seguintes, abordaremos as contribuições das tecnologias
para o ensino e aprendizagem de línguas e discorreremos sobre o Padlet
como recurso pedagógico. Na sequência, apresentaremos os percursos
metodológicos e os resultados da pesquisa.

154
Estudos em Cas@

TECNOLOGIAS DIGITAIS E O ENSINO DE


LÍNGUAS

Com o advento da tecnologia, novas formas de comunicação e


interação social surgiram, influenciando mudanças em diversos aspectos
sociais. Com isso em vista, percebemos novos instrumentos de práticas
sociais de leitura e escrita que retomam discussões acerca do conceito
de letramento e sua aplicação (SOARES, 2002). Isso pois, “os concei-
tos de leitura e escrita foram se redimensionando, e por conseguinte, a
ideia de letramento deixou de ser singular e passou a abarcar os (multi)
letramentos” (DUARTE; DIAS; FERREIRA, 2016, p. 2).
Dessa maneira, percebemos que a tecnologia trouxe variadas
opções de ferramentas que auxiliam no processo de ensino e aprendiza-
gem. Então, considerando o acesso constante à tecnologia por parte dos
alunos e educadores, seria indispensável trazê-la ao âmbito educacional
e utilizá-la como ferramenta facilitadora de ensino.
Como resultado do contexto pandêmico e com a necessidade de
se pensar o ensino de forma remota, professores de diversas áreas têm
recorrido a tecnologias digitais para continuarem promovendo aprendi-
zagem de forma colaborativa e evitando prejuízos maiores no contexto
da educação.
Entendemos como TDIC ferramentas capazes de aglutinarem
várias tecnologias em uma só, a exemplo do celular, principalmente os
smartphones (VALENTE, 2007; FRAGA, 2013). O uso dessas tec-
nologias tem sido constante no contexto de ensino e aprendizagem de
línguas, especialmente em contexto remoto.
Professores de língua inglesa têm repensado e buscado formas de
integrar o ensino das quatro habilidades em suas salas de aula virtuais
durante a pandemia. No entanto, todo esse planejamento requer que os
professores, antes de tudo, possuam letramento digital. De acordo com
Xavier (2005, p. 2)
Ser letrado digital pressupõe assumir mudanças no
modo de ler e escrever os códigos e sinais verbais e não
verbais, como imagens e desenhos, sem compararmos

155
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

às formas de leitura e escritas feitas no livro, até porque


o suporte sobre o qual estão os textos digitais é a tela,
também digital.
Ainda sobre o letramento digital, corroboramos com Ribeiro;
Coscarelli (2010, p. 12) quando destacam que “a busca de informações
na internet também implica saber encontrar textos e compreendê-los,
o que pressupõe selecionar as informações pertinentes e avaliar sua
credibilidade”.
Sendo assim, inserir tecnologias digitais no contexto educacional,
e mais precisamente, no contexto de ensino de línguas, requer que ambos
professores e estudantes sejam letrados digitais. Destaca-se que prin-
cipalmente o professor deve assumir o papel de selecionar informações
de forma cuidadosa nessa dinâmica. Além disso, saber como utilizar
essas ferramentas de forma didática e associá-las ao ensino das quatro
habilidades é imprescindível para que a aprendizagem seja significativa
e o ambiente seja convidativo e motivador para o aluno.

O PADLET COMO RECURSO PEDAGÓGICO

Ao tratarmos do ensino de Línguas Estrangeiras (LE), entende-


mos que a comunicação é o principal objetivo dos aprendizes e que ela
norteia diversos aspectos da interação humana. Portanto, ao lecionar o
inglês como segunda língua, o professor intenta aprimorar nos alunos
as quatro habilidades da língua: Reading, Listening, Speaking e Writing
(leitura, escuta, fala e escrita).
E, diante de estudos sobre o ensino de inglês como segunda lín-
gua (ESL), entendemos a escrita como a habilidade mais importante
dentro do processo de ensino e aprendizagem, corroborando com Jong
e Kim Hua (2021). Além de representar a habilidade mais difícil de ser
aprendida e ensinada, o ensino dessa habilidade está geralmente ligado
às formas monótonas e desinteressantes como a escrita é trabalhada em
sala de aula, o que ocasiona baixo interesse dos alunos, e resulta num
baixo rendimento (SAEPULOH e SALSABILA, 2020).

156
Estudos em Cas@

Dessa forma, o uso de estratégias e ferramentas que fujam do


ensino tradicional e possibilite metodologias ativas e maior engajamento
dos alunos nas atividades de escrita podem contribuir positivamente para
o processo de aprendizagem dessa habilidade. Uma dessas ferramentas
é o Padlet.
O Padlet é uma plataforma virtual que fornece possibilidades
de compartilhamento de ideias, discussões, textos, imagens, hiperlinks
e vídeos, por meio da criação de murais, que podem ser visualizados e
comentados por qualquer usuário que tenha acesso ao link ou endereço
do mural específico (PAIVA, 2019; RASHID; YUNUS; WAHI, 2019).
Pode-se destacar, como uma das características principais do
Padlet, a versatilidade de usos e a facilidade com que pode ser utilizado
pedagogicamente em sala de aula. Os possíveis usos do Padlet, de acordo
com Paiva (2019, p. 15), são:
murais temáticos, avaliações de disciplinas pelos alu-
nos, responder perguntas, fazer brainstorm sobre um
tópico, postar vídeos e fazer comentários, portfolios
de alunos, diários de aprendizagem online, calendário
de atividades, criação de banco de imagens, postar
mensagens em datas festivas, curadoria de recursos
para aprendizagem.

Além da versatilidade e de todas as possibilidades descritas acima,


podemos destacar a acessibilidade da ferramenta, que pode ser encontrada
em seus formatos de página da web e aplicativo, podendo ser acessada
de computadores e smartphones, desde que haja conexão de internet.
Os usuários podem acessar facilmente a plataforma após criar
uma conta, com base em contas já existentes (Google, Facebook, Micro-
soft) devendo fazer login, caso pretendam criar novos murais ou apenas
clicando nos links disponibilizados pelos criadores de conteúdo, caso
queiram interagir ou apenas visualizar murais específicos.
A integração do Padlet em contextos de sala de aula, sejam pre-
senciais ou virtuais, promove um ambiente confortável para diferentes
tipos de atividades colaborativas (TAUFIKUROHMAN, 2018). Essa
colaboração entre os aprendizes de língua inglesa é fundamental para

157
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

manter o ritmo de aprendizagem e a motivação necessária para o desen-


volvimento das habilidades linguísticas e comunicativas na língua alvo.

PERCURSO METODOLÓGICO

No que toca ao percurso metodológico, podemos classificar esse


estudo como de natureza bibliográfica e qualitativa, com nuances investi-
gativas (GIL, 2008; LEFFA, 1988). Primeiramente, a plataforma Padlet
foi apresentada aos estudantes da unidade curricular Língua Inglesa II,
como recurso avaliativo e de interação extrassala para as atividades de
escrita e leitura durante o período remoto.
O referido componente faz parte de um conjunto de disciplinas que
abordam as habilidades escritas e orais em língua inglesa, além de aspec-
tos culturais de países falantes dessa língua. Nesse momento do curso, é
esperado que os alunos tenham um nível intermediário de competências
linguísticas para que sejam considerados aptos a produzir textos curtos
que abordem temáticas diversas e que incluam aspectos gramaticais.
As atividades propostas foram realizadas nos períodos letivos de
2020.1 e 2020.2, em três turmas do curso de Letras/ Inglês da URCA
e faziam parte do processo avaliativo da disciplina de Língua Inglesa
II. Ao todo, 27 discentes participaram das atividades requisitadas.
Cada grupo realizou três atividades diversas durante o semestre que
consistiam em escrever sobre: literatura e cinema; música; e descrever
uma pessoa famosa.
Além da tarefa de escrever um texto sobre os temas citados acima,
as atividades possuíam regras que envolviam prazos de entrega, número
mínimo de palavras e a inserção de algum componente gramatical
trabalhado em aula, como a utilização de determinado tempo verbal
ou de alguma função comunicativa, como atribuir a relação de posse
usando-se dos pronomes e adjetivos possessivos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Antes de apresentarmos os resultados, é importante ressaltarmos


que durante o período de pandemia, os dias letivos de cada semestre
158
Estudos em Cas@

foram reduzidos nas universidades estaduais do Ceará, incluindo a


URCA. Dessa forma, cada semestre letivo foi comprimido em um
período de três meses.
Pensando nas dificuldades enfrentadas pelos corpos docente e discente
da universidade em concluir suas unidades curriculares em um período
curto de tempo, optamos por atribuir uma atividade de escrita em cada mês,
uma vez que essas atividades eram apenas parte do processo avaliativo da
disciplina de Língua Inglesa II e que deveria haver tempo para que todas
as etapas do processo de escrita, desde o esboço inicial, até a reescrita, após
o feedback do professor, fossem realizadas de forma adequada.
A ferramenta Padlet foi escolhida por sua versatilidade e possibili-
dades de alocar recursos multimodais, em sua página, como vídeos, fotos,
entre outros. Tais recursos são necessários para a construção de um texto,
viabilizando a colaboração entre os discentes e facilitando o gerenciamento
das informações pelos docentes (PAIVA, 2019; JONG e TAN, 2021).
Inicialmente, como primeira atividade proposta, solicitamos aos
discentes que escrevessem textos curtos, com no mínimo 100 palavras,
que envolvessem a temática da música. Com o título “Music to my ears”,
a atividade consistia em instigar os alunos a escrever sobre seus gostos
musicais, artistas, bandas, canções e gêneros favoritos e ao final, eles
deveriam recomendar uma música aos colegas, como pode ser notado
na imagem abaixo:
Figura 2 – Padlet: segunda atividade proposta.

Fonte: Extraído da Plataforma Padlet. 80

80 
Disponível em: https://pt-br.padlet.com/feliperidalgo4181/ba2o9y7p2tc1ncx6
159
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

A segunda proposta de atividade consistiu em solicitar aos alunos


que discorressem sobre o tema Literatura, Cinema e TV. Dentro das
possibilidades propostas, eles poderiam escrever sobre seus filmes, livros,
programas televisivos, animes favoritos ou qualquer outro gênero dentro
do universo proposto. Para isso, eles deveriam escrever um texto de no
mínimo 150 palavras e inserir pelo menos duas orações utilizando o
passado simples, como pode ser observado na imagem:
Figura 3 – Padlet: terceira atividade proposta.

Fonte: Extraído da plataforma Padlet. 81

O pouco tempo para se trabalhar aspectos inerentes à escrita,


gramática e vocabulário, além do pouco contato que tiveram com a
língua inglesa ao longo dos anos, fez com que os alunos encontrassem
vários obstáculos ao escreverem seus textos. No entanto, a possibilidade
de inserir recursos audiovisuais e multimodais e de interagir por meio de
comentários nos textos dos seus pares promoveu um desenvolvimento
satisfatório das habilidades de leitura e escrita dos estudantes.
Se por um lado, a maioria dos alunos conseguiu desenvolver as
atividades sem muitos empecilhos com a ferramenta, pois já estavam
acostumados a utilizar ferramentas digitais, por outro, a falta de letra-
mento digital fez com que alguns deles levassem um pouco mais de
tempo para realizar as tarefas.
Apesar das dificuldades iniciais, a utilização do Padlet como recurso
de aprendizagem e ferramenta de avaliação do processo de escrita nas
aulas de língua inglesa trouxe contribuições no tocante à motivação dos

81 
Disponível em: https://pt-br.padlet.com/feliperidalgo4181/cswbpslpl2pfglwu
160
Estudos em Cas@

estudantes durante o período de ensino remoto, em um contexto em que


a evasão tem aumentado de forma significativa (NUNES, 2021) e que
sentimentos como ansiedade, frustração, incertezas e problemas de diver-
sos tipos têm prejudicado a concentração dos discentes (COSTA, 2020).
Ademais, o Padlet proporcionou um ambiente interativo e cola-
borativo para os discentes, em contextos assíncronos, algo bastante
complicado de alcançar até mesmo em momentos síncronos (PAIVA,
2019; RASHID, YUNUS e WAHI, 2020; JONG e TAN, 2021).
A possibilidade de se utilizar o formato de aplicativo possibilitou
maior acessibilidade aos estudantes, apesar do pouco letramento digital
de parte deles. Tendo em vista que grande parte dos discentes utilizam
seus smartphones como único recurso disponível para acessar as atividades,
o acesso ao aplicativo forneceu mais oportunidades de desenvolver o
letramento digital e de interagir em momentos assíncronos, a qualquer
momento e de qualquer lugar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar da carga negativa trazida pela pandemia em diversos con-


textos, incluindo o educacional, a utilização do ensino remoto emergen-
cial, embora que de maneira drástica e repentina, trouxe contribuições
no sentido de promover o letramento digital de muitos professores e
estudantes, que ainda não haviam ponderado sobre o uso de recursos
tecnológicos em sala de aula.
Na eminência do retorno às atividades presenciais nas escolas e
universidades brasileiras, espera-se que a experiência com o ensino remoto,
ainda que negativa em vários aspectos, tenha não apenas estimulado
professores a inserir progressivamente novos recursos tecnológicos em
suas aulas, mas tenha promovido, também, uma reflexão crítica sobre o
futuro do ensino de línguas no Brasil.
Assim, é possível concluir que ao utilizarmos ferramentas que
promovam interação e colaboração através de elementos multimodais,
tecnologias digitais e que sejam de fácil acesso, estamos promovendo
um ambiente de aprendizagem motivador e que contribui de forma
161
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

significativa para o desenvolvimento das habilidades dos nossos alunos,


sejam elas escritas ou orais, de forma interativa e colaborativa.

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163
CAPÍTULO 13 -EXAME NACIONAL
DO ENSINO MÉDIO: UM OLHAR NA
PERSPECTIVA DA LINGUÍSTICA TEXTUAL

Aluízio Moreira de Oliveira Filho82


Eurico Rosa da Silva Júnior83
Sidney Washington de Lima Melquiades84

INTRODUÇÃO

A linguística, nas palavras de Marcuschi (2008), evoluiu a par-


tir do século XX em duas vertentes distintas: por um lado podemos
descrever a linguística do polo formalista, analisando a língua em sua
imanência e fora de seu contexto de uso, e do outro lado, temos o polo
funcionalista, com propostas para trazer a língua ao seu contexto de uso,
em seus aspectos socioculturais, partindo da interação. É neste segundo
polo que encontramos a linguística textual, cerne de nossa discussão.
A linguística textual (LT), por assim dizer, é um ramo da lin-
guística relativamente novo. Tem na sua origem grande relação com a
análise do discurso, tendo em ambas o texto como centralidade dos seus
estudos. Ela surgiu na Europa em meados de 1960, com o intuito de
sanar as inquietações quanto às perspectivas vigentes que tentavam dar
conta da análise do texto e da frase. Koch (1997) destaca que 
[...] nestes últimos anos, a questão da tipologia textual,
que, após ter sido, no momento da elaboração das gramá-
ticas textuais, objeto de grande preocupação, parecia ter
caído no esquecimento, volta a ocupar, agora sob outras
luzes - isto é, sob o enfoque dos gêneros textuais - lugar

82 
Mestrando em Linguística e Ensino (UFPB). Professor de língua portuguesa da
educação básica. CV: http://lattes.cnpq.br/4060317483961842
83 
Mestrando em Linguística e Ensino (UFPB). Professor da educação básica (São
José do Egito - PE e Tabira – PE). CV: http://lattes.cnpq.br/1417394158108828
84 
Mestrando em Linguística e Ensino (UFPB). Professor e técnico pedagógico
(SEDUC/Morada Nova – CE). Formador de professores na Idade Certa (MAISPAIC).
Tutor (IFPE). CV: http://lattes.cnpq.br/7129040181714788
164
Estudos em Cas@

de destaque nas pesquisas sobre o texto, revelando - se


um terreno bastante promissor. (KOCH, 1997, p. 74-75)
Para Marquesi et al (2017, p. 15), “todo texto é, tanto na produção
quanto na leitura, objeto de um trabalho de reconstrução de sua estrutura;
essa estrutura é muito mais do que uma soma de ideias, ela constitui o
plano do texto e reflete o seu conteúdo global”. Assim, este capítulo tem
por objetivo realizar uma análise crítica no caderno de questões aplicado
no ENEM referente ao ano de 2020 - que só aconteceu em 2021 devido
a pandemia do novo coronavírus - elaborado pelo INEP, com vistas
à abordagem da linguística textual e como ela se aplica nas questões
direcionadas à área de linguagens, códigos e suas tecnologias, mais espe-
cificamente à língua portuguesa, sendo num total de quarenta questões.
Nossa abordagem tem um viés bibliográfico e interpretativista, ao passo
que analisaremos cada questão em que se aplica a noção de linguística de
texto. Para esta abordagem, levamos em consideração o que nos apresenta
Marcuschi (2008), quando aborda que “as noções de língua, texto, gênero,
compreensão e sentido, bem como o enfoque geral da abordagem, situam-se
na perspectiva da visão sociointerativa da língua. [...] aqui a língua é vista
como um conjunto de atividades e uma forma de ação” (p. 16).
As questões escolhidas como amostragem, serão expostas quanto
ao critério de textualidade apresentado por Marcuschi (2008) no âmbito
da situação comunicativa que envolve o conhecimento de mundo do
candidato e os aspectos extra-textuais.
Após explanação, baseados em Alyrio (2009), Oliveira (2008),
Paiva (2019), dos materiais e metodologia que foram alicerces do presente
trabalho, apresentaremos a discussão e os critérios utilizados ao analisar
as questões de Língua Portuguesa no referido exame alicerçados pelos
autores Oliveira (2008), Antunes (2009), Marcuschi (2008) e outros que
trouxeram recursos para o debate como a BNCC (2018). 

MATERIAIS E MÉTODOS

Esta pesquisa utilizou-se da metodologia bibliográfica como


método de investigação, ao que Alyrio (2009, p. 1) define como sendo

165
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

“a investigação em material teórico sobre o assunto de interesse. Ela


precede o reconhecimento do problema ou do questionamento que
funcionará como delimitador do tema de estudo”. Macedo (1994, p. 13)
apud Paiva (2019, p. 60) corrobora ao dizer que a pesquisa bibliográfica
“é a busca de informações bibliográficas, seleção de documentos que se
relacionam com o problema de pesquisa [...] e o respectivo fichamento
das referências para serem posteriormente utilizadas”. Nesse sentido,
será realizado inicialmente uma discussão teórica com resgate histórico
referente à Linguística Textual e suas interfaces com o ensino de língua
portuguesa, bem como a introdução da noção de gêneros textuais e os
aspectos da textualização (Marcuschi, 2008). Para este fim, levaremos
em consideração os postulados de Oliveira (2008) e Antunes (2009)
quanto à linguística textual e nos baseamos em Travaglia (1991), Bakhtin
(1992), Marcuschi (2003, 2011) e Hemais; Biase-Rodrigues (2005)
para tratarmos dos gêneros textuais e Marcuschi (2008) no que tange
os aspectos da textualização.
No viés prático, utilizaremos o caderno de questões do Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM) 2020 – prova de linguagens,
códigos e suas tecnologias. Para tanto, observamos quais teorias linguís-
ticas foram utilizadas como aporte teórico para cada questão aplicada
demonstrando o total de questões para cada teoria observada. Após a
análise do aporte teórico no caderno de questão, passaremos ao enfoque
na Linguística Textual no que concerne aos gêneros textuais e quais
aspectos da textualidade foram utilizados em cada questão avaliada com
a qual responderemos nossos objetivos propostos.

DISCUSSÃO E CRITÉRIOS DE ANÁLISE

Nas palavras de Oliveira (2008), a linguística textual “toma como


unidade de foco analítico o texto” e, diferente de outras abordagens
linguísticas, que também utilizam-se do texto em seus estudos na lin-
guística de texto, “o que está em jogo agora é a observação das relações
textuais em seus variados matizes e intersecções” (p. 193). Assim, é
interessante frisar o uso do texto como centralidade de seus estudos,

166
Estudos em Cas@

bem como os elementos que o compõem para a interação entre leitor,


autor, texto e contexto.
Os estudos nessa vertente tiveram início na Europa no século
XX, mais precisamente nos anos de 1960. No Brasil, temos diversos
expoentes desta vertente, entre eles estão Ingedore Koch, Leonor Fávero,
Luiz Antônio Marcuschi, Luiz Carlos Travaglia e Hudinilson Urbano
(OLIVEIRA, 2008). A LT traz à tona a necessidade de superação da
clássica análise das unidades menores dentro do texto como unidade
desprovida de sentido e coloca o texto como unidade central dos estudos
linguísticos para a abordagem de que “as relações textuais são muito mais
do que um somatório de itens ou sintagmas” (OLIVEIRA, 2008, p. 193).
A linguística textual traz como centralidade de seus estudos a
definição de texto. Oliveira (2008) define este termo como sendo “a
unidade comunicativa básica, aquilo que as pessoas têm a declarar umas
às outras” (p. 194). No mesmo caminho, Antunes (2009) o define como
“o resultado de uma atividade exercida por dois ou mais sujeitos, que,
numa determinada situação social, interagem; produzem juntos uma peça
de comunicação”. Koch (2020, p. 19) contribui ao afirmar que “o texto é
resultado, portanto, de um ‘múltiplo referenciamento’, daí a definição de
texto como uma sucessão de unidades linguísticas constituída mediante
uma concatenação pronominal ininterrupta”.
Na atualidade, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
no componente de Língua portuguesa, “assume a centralidade do texto
como unidade de trabalho e as perspectivas enunciativo-discursivas na
abordagem, de forma a sempre relacionar os textos a seus contextos de
produção” (BRASIL, 2018, p. 67). Assim o texto é tido como todos os
gêneros pelos quais usamos como ferramenta de comunicação de nossas
ideias. Nesse sentido, Antunes (2009) nos aponta um aspecto inerente
ao texto na perspectiva da LT: a textualidade. Nessa perspectiva, “se
pretende considerar a condição que têm as línguas de somente ocorrerem
sob a forma de texto e as propriedades que um conjunto de palavras deve
apresentar para poder funcionar comunicativamente” (p. 50). Desta

167
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

forma, o texto surge como aparato real da comunicação humana e o


usa nas mais diversas situações diárias, sejam elas escritas ou faladas.
O primeiro autor que mostra uma base teórica sobre os gêneros é
Bakhtin (1992). Para ele, os gêneros textuais ou do discurso (como ele
se refere em seu texto) são “tipos relativamente estáveis de enunciados”
(1992, p. 64), pois, enunciados refletem as condições específicas e as
finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático)
e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais,
fraseológicos e gramaticais da língua, mas acima de tudo, por sua cons-
trução composicional (BAKHTIN, 1992). Na realidade, para Bakhtin
os gêneros surgem num contexto social e não aleatoriamente. Os textos
servem às ocasiões sociais, das quais seus contextos, participantes e
propósitos comunicativos estão diretamente ligados e afetam os textos
produzidos nessas situações.
O mesmo pensa Swales (1990) apud Hemais e Biase-Rodrigues
(2005, p. 109-110). De acordo com as autoras, o linguista Swales entende
que “o texto deve ser visto em seu contexto e não pode ser completamente
entendido e interpretado apenas por meio de uma análise de elementos
linguísticos”. Assim, para Swales (1990) a definição de gênero é a seguinte:
Um gênero compreende uma classe de eventos comu-
nicativos, cujos exemplares compartilham os mesmos
propósitos comunicativos. Esses propósitos são reconhe-
cidos pelos membros mais experientes da comunidade
discursiva original e, portanto, constituem a razão do
gênero. A razão subjacente dá o contorno da estrutura
esquemática do discurso e influência e restringe as esco-
lhas de conteúdo e estilo. O propósito comunicativo é o
critério que é privilegiado e que faz com que o escopo do
gênero se mantenha enfocado estreitamente numa deter-
minada ação retórica compatível com o gênero. Além
do propósito, os exemplares do gênero demonstram
padrões semelhantes, mas com variações em termos
de estrutura, estilo, conteúdo e público-alvo. Se forem
realizadas todas as expectativas em relação àquilo que
é altamente provável para o gênero, o exemplar será
visto pela comunidade discursiva original como um
protótipo. Os gêneros têm nomes que são herdados e

168
Estudos em Cas@

produzidos pelas comunidades discursivas e importados


por outras comunidades. Esses nomes constituem uma
comunicação etnográfica valiosa, porém tipicamente
precisam de validação adicional (apud HEMAIS; BIA-
SE-RODRIGUES, 2005, p. 5).
Assim, podemos dizer que os textos produzidos pelas pessoas
são determinados por suas posições nas instituições em que cada um
ocupa, por sua posição em determinados discursos e pelos seus lugares na
junção de certos grupos de discursos, em outras palavras, os textos que
produzimos são determinados pela história discursiva de cada um de nós.
Marcuschi (2003) nos chama atenção ao informar que os gêne-
ros surgem conforme a evolução e necessidades da vivência social. Ele
também concorda com Bakhtin ao dizer que os gêneros “são entidades
sócio-discursivas e formas de ação social incontornáveis em qualquer
situação comunicativa” (p.19). E vai mais além, ao dizer que eles estão
surgindo em grandes quantidades para poderem acompanhar a evolução
da tecnologia. Aliás, ele pondera que os gêneros são caracterizados muito
mais por uma função/finalidade do que por sua formação estrutural.
Tanto é que na visão marcuschiana:
Os Gêneros Textuais surgem, situam-se e integram-se
funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem.
Caracterizam-se muito mais por suas funções comu-
nicativas, cognitivas e institucionais do que por suas
peculiaridades linguísticas e estruturais (ibidem, p. 20). 

Os Gêneros Textuais se caracterizam por desempenhar uma função


social específica. Essas funções sociais são percebidas e vivenciadas pelos
usuários. Ou seja, de acordo com sua função social, sabemos intuiti-
vamente que gênero usar em um determinado momento de interação
(TRAVAGLIA, 1991, p. 03).
Os gêneros textuais estão presentes no nosso dia a dia em sua
diversidade, exigindo que bons leitores e autores sejam versáteis, capazes
de interagir com os gêneros através da compreensão e interpretação dos
diversos objetivos comunicativos que veiculam em cada suporte. Assim,
torna-se imprescindível que o ensino de leitura proporcione aos estu-
dantes o contato eficaz com os textos, mediante sua compreensão em
169
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

sua totalidade e em seu meio de circulação, mesmo porque, de acordo


com a BNCC (2018, p. 71), o eixo leitura “compreende as práticas de
linguagem que decorrem da interação ativa do leitor/ouvinte/espectador
com os textos escritos, orais e multissemióticos e de sua interpretação”.
Marcuschi (2011) relata sobre os gêneros textuais
Na realidade, o estudo dos gêneros textuais é uma
fértil área interdisciplinar, com atenção especial para o
funcionamento da língua e para as atividades culturais
e sociais. Desde que não concebemos os gêneros como
modelos estanques, nem como estruturas rígidas, mas
como formas culturais e cognitivas de ação social cor-
porificadas de modo particular na linguagem, temos
de ver os gêneros como entidades dinâmicas. (MAR-
CUSCHI, 2011, p. 18)

 Assim, os gêneros apresentam-se como formas de comunicação,


indo ao encontro das necessidades de nossa expressão, com moldes de
acordo com o contexto histórico e social em cada esfera da comunicação
humana. O autor nos faz referência aos gêneros que, em seu sentido real,
são estruturas dinâmicas, mutáveis, que permitem ao indivíduo utilizar-
-se de competências linguísticas para moldá-los conforme os discursos.
Ainda para Marcuschi (2011), os gêneros textuais “são forma-
ções interativas, multimodalizadas e flexíveis de organização social e
de produção de sentidos. Assim, um aspecto importante na análise do
gênero é o fato de ele não ser estático nem puro” (p. 20). Nesse sentido,
podemos notar que os gêneros são elementos dinâmicos e permeiam o
dia a dia social e que tem a finalidade de produção de sentidos no meio
em que circulam.
Trazendo à tona a necessidade de trabalhar o texto com centra-
lidade do ensino, o INEP aborda em sua matriz de referência para o
ENEM na competência da área 5 “analisar, interpretar e aplicar recursos
expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos,
mediante a natureza, função, organização, estrutura das manifestações,
de acordo com as condições de produção e recepção” (BRASIL, 2021,
p. 03). E na habilidade 15 temos: “estabelecer relações entre o texto

170
Estudos em Cas@

literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto


histórico, social e político” (BRASIL, 2021, p. 03).
Assim o trabalho com o texto deve perpassar o sentido de objeto
estável e desprovido de significado para o leitor. Nas palavras de Antu-
nes (2009),
Isso se evidenciaria pelo cuidado do professor em ensinar
o aluno a ultrapassar a matéria linguística do texto e a
ter em conta os interlocutores envolvidos - quem fala,
quem escreve e para quem. Isto é, o texto precisa ser
visto como uma intervenção histórica de determinado
sujeito para outro ou outros. (ANTUNES, 2009, p. 88)

Após análise do material – prova do ENEM 2020, constatou-se


a presença das seguintes vertentes linguísticas: gramática tradicional,
funcionalismo, sociolinguística, pragmática, linguística textual e análise
do discurso, (ver tabela 1) sendo que a linguística textual, foco princi-
pal desta análise, apareceu em 25 questões das 40 dispostas no exame,
apresentando, portanto, um total de 62,5%. Cabe ressaltar que duas
ou mais vertentes linguísticas podem perpassar uma mesma questão.
Para efeito desta análise, levamos em consideração a vertente que mais
se destaca ou se sobrepõe para a compreensão do avaliado. Partindo
da observação do material analisado, pode-se perceber que as questões
da área de linguagens e códigos – língua portuguesa que fizeram uso
da Linguística Textual sendo utilizados os critérios da textualidade
defendidos por Marcuschi (2008).
Tabela 1 – teorias presentes no caderno de aplicação ENEM 2020
– linguagens
Questões
Teorias Linguísticas
analisadas

Gramática Linguística Análise do


Funcionalismo Sociolinguística Pragmática
Tradicional textual discurso

40 03 05 05 01 25 01

Fonte: Elaboração própria.

171
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

A partir da análise do caderno de questões do ENEM 2020,


observamos a presença dos gêneros textuais descritos a seguir:
Tabela 2 - Questões do ENEM 2020 e gêneros textuais aplicados
GÊNERO QUESTÕES
Anúncio publicitário 01
Artigo de opinião 01
Cartaz de campanha de conscientização sobre assédio 01
Cartaz de campanha publicitária 02
Cartaz de filme 01
Conto 05
Crônica 01
Decreto 01
Descrição de grupo artístico 01
Descrição de obra musical 01
Descrição de projeto 01
Imagem da internet 01
Letra de canção 03
Letra de Hino 01
Matéria de revista 02
Notícia 06
Obra de arte 02
Poema 02
Propaganda 01
Relato/ Relato de viagem 02
Texto científico 03
Texto didático 01
Trecho de artigo 01
Trecho de música 01
Trecho de Romance 02
Verbete de dicionário 01

Fonte: Elaboração própria

Para que o texto exista e se materialize como tal, é preciso que


ele tenha significado. Esta significação depende da interpretação do leitor

172
Estudos em Cas@

associada ao conhecimento de mundo que esse sujeito tenha, isto é, o


leitor faz uso de seu conhecimento prévio e de seus recursos cognitivos
“para estabelecer antecipações sobre o conteúdo do texto”, como aponta
Solé (1998). Marquesi et al (2017, p. 14) destaca que o texto “constitui
uma construção organizada de forma estrutural cuja finalidade é cumprir
os propósitos comunicativos do gênero que ele materializa”, ou seja, ao
ler um texto faz-se necessário saber a finalidade do que está sendo dito
e qual a estrutura para a construção dele, bem como as estruturas de
circulação.
Marcuschi (2008, p. 95), apresenta os critérios de textualidade
relacionados à configuração linguística e a situação comunicativa e frisa
que “não se pode imaginar o texto como se tivesse um dentro (cotex-
tualidade) e um fora (contextualidade)”. Os critérios que são analisados
no nível da cotextualidade são a coesão e a coerência, enquanto os que
estão no nível da contextualidade são a aceitabilidade, a informativi-
dade, a situacionalidade, a intertextualidade e a intencionalidade. Na
sequência, é mostrado o esquema com os critérios gerais da textualidade
apresentado por Marcuschi (2008, p. 96):
Figura 1 – Esquema de textualização

Fonte: MARCUSCHI (2008, p. 96)

173
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Dos enunciados focados em linguística textual analisadas na


prova do Enem 2020, destacamos os seguintes critérios de textualização:
Tabela 3 - Aspectos da textualização nas questões do ENEM 2020
Critério Total de questões
Aceitabilidade 04
Coerência 01
Informatividade 02
Intencionalidade 12
Intertextualidade 03
Situacionalidade 03
Fonte: Elaboração própria

Todas as 25 (vinte e cinco) questões seguiram os critérios da tex-


tualização. Cabe ressaltar que, nas análises realizadas, grande parte das
questões apresentavam mais de um critério de textualidade relacionadas
a situação comunicativa, isto é, analisamos os critérios contextuais, no
entanto, optamos por assinalar aqueles que mais predominaram para
corroborar no entendimento da questão pelo avaliado. Desta forma,
passaremos a análise destacando uma questão para cada critério ligado
ao conhecimento de mundo e aos aspectos extra-textuais informado
anteriormente observando os gêneros textuais apresentados no exame.
O critério da aceitabilidade, nas palavras de Marcuschi (2008, p.
128), “diz respeito à atitude do receptor do texto (é um critério centrado
no alocutário), que recebe o texto como uma configuração aceitável,
tendo-o como coerente e coeso, ou seja, interpretável e significativo”.
Nessa perspectiva, este critério leva em consideração o quanto o texto
torna-se aceitável ao leitor em todos os seus sentidos. A construção
textual que segue, retirado do ENEM 2020, demonstra construções
gramaticalmente aceitas, bem como os sentidos completos.

174
Estudos em Cas@

Figura 2 – Questão 37 - Prova do ENEM 2020 – Linguagens e


Códigos e suas Tecnologias.

Fonte: ENEM, 2021. Caderno Azul.

Antunes (2005, p. 176) nos aponta que a coerência textual “é uma


propriedade que tem a ver com as possibilidades de o texto funcionar
como uma peça comunicativa, como um meio de interação verbal”. No
mesmo caminho, Marcuschi (2008, p. 121) traz a definição de que a
coerência é “uma relação de sentido que se manifesta entre enunciados,
em geral de maneira global e não localizada. Na verdade, a coerência
providencia a continuidade de sentido no texto e a ligação dos próprios
tópicos discursivos”, assim observamos que o texto não é uma arrumação

175
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

aleatória, traz uma carga de sentidos em cada frase, em cada período,


levando o leitor a uma construção do que é significativo para ele, como
é observado na questão 31 disposto a seguir.
Figura 3 – Questão 31 - Prova do ENEM 2020 – Linguagens e
Códigos e suas Tecnologias.

Fonte: ENEM, 2021. Caderno Azul.

176
Estudos em Cas@

O critério da informatividade diz respeito ao grau de informações


que o leitor pode discernir do texto mediante a leitura em sua totalidade,
podendo distinguir o que é principal do que é secundário no texto lido
para poder extrair a informação que o autor pretende transmitir, assim
“o essencial deste princípio é postular que num texto deve ser possível
distinguir entre o que ele quer transmitir e o que é possível extrair dele,
e o que não é pretendido. Ser informativo significa, pois, ser capaz de
dirimir incertezas” (MARCUSCHI, 2008, p. 132).
Na questão 17 do caderno de cor azul do Exame Nacional do
Ensino Médio 2020, é possível perceber a informatividade acerca de
aptidão física relacionada à saúde.
Figura 4 – Questão 17 - Prova do ENEM 2020 – Linguagens e
Códigos e suas Tecnologias.

Fonte: ENEM, 2021. Caderno Azul.

177
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Na questão 29, o eu-lírico, no penúltimo verso, após apresentar


a sua configuração familiar, sente-se confuso, pois “já nem sabe mais
quem é”. No último verso, ele reforça o humor na situação apresentada,
supondo que o garoto ao mesmo tempo é seu neto e cunhado, e ainda
pode assumir outro parentesco, sendo seu avô. No comando da questão,
percebemos que o produtor do texto tem uma intenção, utilizando-se
de vários recursos linguísticos e discursivos a partir do gênero e da
sua finalidade comunicativa. Para Marcuschi (2008), no texto encon-
tram-se objetivos ou finalidades que devem ser percebidos pelo leitor,
evidenciando:
[...] a intencionalidade, no sentido estrito, é a intenção
do locutor de produzir uma manifestação linguística
coesiva e coerente, ainda que essa intenção nem sempre
se realize na sua totalidade, especialmente na conver-
sação usual. (FÁVERO, 1986 apud MARCUSCHI,
2008, p. 127).

Este critério, basicamente, está centrado no produtor do texto


e revela sua intenção, o seu propósito, pois quem fala, fala algo para
alguém com algum intuito, pois, como afirma Gouvêa et al apud Mar-
quesi et al (2017, p. 51), “não é suficiente ler e identificar as palavras,
reconhecendo-lhes o significado, é imprescindível alcançar a intenção
do texto atribuindo-lhe sentido”.

178
Estudos em Cas@

Figura 5 – Questão 29 - Prova do ENEM 2020 – Linguagens e


Códigos e suas Tecnologias.

Fonte: ENEM, 2021. Caderno Azul.

Ao analisarmos a questão 12 do referido exame, percebemos niti-


damente o critério da intertextualidade presente nos textos apresentados.
No texto I, tem-se um trecho da canção “Águas de março” composta por
Tom Jobim. No texto II, há uma informação de como surgiu a canção
citada anteriormente, informando que o compositor da canção no Texto I
inspirou-se em outros textos já existentes, fazendo uso até mesmo de parte
deles para construir a sua obra que é conhecida internacionalmente. Para
Antunes (2009, p. 164), a “inserção explícita de determinado texto em

179
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

outro” é a definição do critério de textualidade chamado intertextualidade,


ou seja, é a relação entre textos. A autora afirma ainda que este critério
de textualidade “é uma condição das ações discursivas, segundo a qual a
linguagem é uma atividade que se constitui na retomada de outras expe-
riências de linguagem anteriores” (ANTUNES, 2017, p. 117). Marcuschi
(2008, p.130) corrobora ao dizer que a intertextualidade é uma “proprie-
dade constitutiva de qualquer texto e o conjunto das relações explícitas
ou implícitas que um texto ou um grupo de textos determinado mantém
com outros textos”, como pode ser observado a seguir.
Figura 6 – Questão 12 - Prova do ENEM 2020 – Linguagens e
Códigos e suas Tecnologias.

Fonte: ENEM, 2021. Caderno Azul.

180
Estudos em Cas@

O último critério de textualidade que apresentamos no presente


estudo é o da situacionalidade. De acordo com Marcuschi (2008), este
é um critério estratégico, visto que
[...] refere-se ao fato de relacionarmos o evento textual
à situação (social, cultural, ambiente etc.) em que ele
ocorre (cf. Beaugrande, 1997: 15). A situacionalidade
não só serve para interpretar e relacionar o texto ao
seu contexto interpretativo, mas também para orientar
a própria produção. (MARCUSCHI, 2008, p. 128)

Partindo desse pressuposto, percebemos que a situacionalidade


acontece em diversas questões, porém, enfatizamos a questão 15 ao ser
apresentado um conjunto multissemiótico contendo informações de
cunho social e cultural ao expor a diferença salarial entre esportistas de
gêneros diferentes, mostrando que o homem ganha mais que a mulher,
mesmo exercendo a mesma função levando o candidato a refletir sobre
esta situação contemporânea na sociedade. Neste aspecto da textualidade
presente no caderno de questões, o estudante deve relacionar os gêneros
selecionados para este item de acordo com situações do seu contexto
diário. Assim prioriza-se texto de íntima relação com o público-alvo
deste tipo de exame, aproximando ainda mais o texto do leitor.

181
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

Figura 7 – Questão 15 - Prova do ENEM 2020 – Linguagens e


Códigos e suas Tecnologias.

Fonte: ENEM, 2021. Caderno Azul.

182
Estudos em Cas@

Parafraseando Marcuschi (2008), o texto só se completa com a


participação do leitor/ouvinte, pois ele é uma proposta de sentido que
é dado a partir dos conhecimentos prévios de quem lê/escuta, como
também de sua relação social para que haja uma significação a partir
do texto (escrito ou oral).

CONSIDERAÇÕES

Partindo das análises realizadas, percebemos a presença da linguís-


tica textual na maioria das questões aplicadas na prova do ENEM 2020,
no entanto, vale salientar que mais de uma teoria ou vertente linguística
pode estar presente nas questões analisadas. A partir da observação das
teorias, houve a constatação de que as questões do ENEM levam em
consideração a noção de texto enquanto constructo real do dia a dia do
estudante e que permeia todas as atividades humanas.
Percebeu-se também a importância de o(a) candidato(a) deste
tipo de exame estar atento às informações que o cercam para que possa
construir o sentido relacionado ao texto apresentado na prova. O conhe-
cimento prévio consistente faz-se necessário para melhor entendimento
e resolução das questões contidas no ENEM.
Outro destaque se dá na presença dos gêneros textuais, os quais
foram retirados de seus suportes originais, mantendo ainda mais a
proximidade do gênero com o leitor, uma vez que em todas as questões
constata-se a noção de texto que “permeia toda e qualquer atividade
de nossa atuação social” (ANTUNES, 2005, p.40). No que tange a
análise nos critérios da textualidade, observamos a presença de todos
os critérios, embora para tal análise foi elencado aquele que mais se
destacou no quesito ou mesmo aquele que teve maior ênfase para levar
o(a) candidato(a) à resposta correta de cada questão. 
Acreditamos que faz-se necessário que essa discussão prossiga, pois
verificamos que há outras possibilidades a serem exploradas no âmbito da
Linguística Textual, visto que é um conceito considerado recente e que
poderão contribuir para futuras pesquisas através dos dados coletados
e de poderem ser exploradas outras concepções teóricas.

183
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

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185
CAPÍTULO 14 -MUDANÇAS CURRICULARES
À VISTA: CONTRIBUIÇÕES DE UMA
EXPERIÊNCIA PRÁTICA PARA O PAPEL DO
PROFESSOR EM ADMINISTRAÇÃO

Camilla Rodrigues Netto da Costa Rocha85


Rodrigo Guimarães Motta86

INTRODUÇÃO

Buscando atender as constantes e aceleradas mudanças que vêm


impactando o processo de ensino e aprendizagem principalmente em
decorrência da evolução da tecnologia, o Conselho Nacional de Edu-
cação (CNE) do Ministério da Educação (MEC) aprovou, no dia 10
de julho de 2020, o texto das novas Diretrizes Curriculares Nacionais
(DCNs) para os cursos de bacharelado em Administração (BRASIL,
2021). Após aprovação unânime, o texto segue para revisão do CNE e
homologação do Ministério da Educação.
O foco das novas diretrizes está na formação por competências e
na transformação da prática profissional em obrigatória e supervisionada,
buscando aproximar cada vez mais a teoria à realidade dos estudantes.
As Instituições de Ensino Superior (IES) terão maior liberdade para
criação dos seus projetos pedagógicos na medida em que as diretrizes
são menos assertivas quanto a quais conteúdos elas devem seguir. O
documento prioriza a definição de quais são as competências a serem
obrigatoriamente desenvolvidas, deixando que as IES adicionem outras
que sejam compatíveis com os objetivos dos seus cursos.
Quando as DCNs focam no desenvolvimento de competências
e encorajam a prática profissional durante o curso de graduação em

85 
Pós-doutoranda em Administração (UFBA). Professora e pesquisadora na Escola
Germinare. CV: http://lattes.cnpq.br/9255429600924119
86 
Doutor em Administração (PUC-SP). Diretor na Escola Germinare.
CV: http://lattes.cnpq.br/5632584195439565
186
Estudos em Cas@

Administração, elas aproximam-se das contribuições teóricas dos Estu-


dos Baseados na Prática (EBP). Isso porque essa vertente dos estudos
organizacionais tem a prática enquanto lugar central para a aprendizagem
organizacional (BISPO, 2013; DURANTE et al., 2019; GHERARDI;
STRATI, 2014; LOHMAN, 2000; SOUZA-SILVA; DAVEL, 2007).
No caso do processo de ensino e aprendizagem em Administração, foco
deste capítulo, a prática possibilita que a aprendizagem seja situada e con-
textualizada, além de trazer como resultado o desenvolvimento das com-
petências necessárias na futura inserção do jovem no mercado de trabalho.
As mudanças introduzidas no currículo de Administração visam
a acompanhar um mundo cada vez mais digitalizado, cujos impactos são
sentidos no mercado de trabalho – novos modelos de negócio e outras
competências profissionais sendo demandadas são alguns exemplos.
Diante disso, o processo de ensino e aprendizagem deve fazer frente a
essa nova realidade, preparando os estudantes para este mundo digital,
complexo e em constante transformação.
Assim, por meio da metodologia Estudo de Caso (CESAR, 2005;
VENTURA, 2007), o presente capítulo busca analisar quais as possí-
veis contribuições do processo de ensino e aprendizagem de uma escola
técnica de São Paulo, a Escola Germinare (que proporciona formação
no Ensino Básico e Técnico em Administração ao final do 3º ano do
Ensino Médio), cujo projeto pedagógico está alinhado às proposições
das DCNs. A escolha dessa escola se justifica por suas diretrizes cur-
riculares já privilegiarem uma estrutura curricular híbrida, oferecendo
sólida formação acadêmica e profissional aos seus estudantes.
Frisa-se que, para além da formação disciplinar nas áreas de
conhecimento do MEC (Linguagens, Ciências da Natureza, Ciências
Humanas e Sociais, e Matemática), em paralelo ao currículo de gestão,
o projeto pedagógico da Escola Germinare prevê a formação profissional
pela Rota Formadora, que consiste no seguinte: no 9º ano do Ensino
Fundamental, o aluno dedica-se à experiência profissional de líder de
vendas no varejo; nos 1º e 2º anos do Ensino Médio, à de vendedor de

187
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

bens de consumo não duráveis; nos 2º e 3º anos do Ensino Médio, à de


gerente de loja no varejo; finalmente, no 3º ano, à de supervisor de vendas.
Portanto, iniciando-se a Rota Formadora no 9º ano do Ensino
Fundamental com um estágio no varejo (líder de vendas), prossegue-se
para um estágio na área comercial (vendedor) e para outro estágio no
varejo (gerente de loja) posteriormente, podendo-se culminar no cargo
de supervisão de vendas no 3º ano do Ensino Médio.
O universo desta pesquisa é composto por 25 estudantes do 2º ano
do Ensino Médio que, na qualidade de vendedores de duas marcas de bens
de consumo não duráveis (uma do setor alimentício e outra de higiene e
beleza), são supervisionados por cinco professores desenvolvedores e por
15 supervisores de vendas (cinco estudantes do 2º ano do Ensino Médio e
dez egressos), por sua vez supervisionados pelos mesmos cinco professores
desenvolvedores. Os programas são desenhados para atender ao objetivo
do projeto pedagógico da escola de formar “tocadores de negócios”, e suas
especificidades buscam garantir uma aprendizagem que, calcada na prática,
possa ser significativa e que priorize o desenvolvimento de competências.
O formato e o universo da Rota Formadora consistem em pro-
gramas: o de estágio em vendas, para o 2º ano do Ensino Médio e com
equipe de 25 estagiários estudantes e cinco professores desenvolvedores,
cujo formato constitui-se em gestão e execução da carteira de clientes
com metas a serem batidas mensalmente, check de metas (isto é, encontros
para acompanhamento da performance e feedbacks), acompanhamento
mensal da rota pelos professores desenvolvedores no campo, pílulas
quinzenais de conteúdos em Comercial, e treinamentos mensais sobre
temáticas em Comercial que sejam relevantes para o desenvolvimento
pessoal e profissional; e o de supervisão em vendas, para o 3º ano do
Ensino Médio e egressos e com equipe de cinco supervisores estudan-
tes, dez supervisores egressos e cinco professores desenvolvedores, cujo
formato se dá em gestão e execução de uma equipe de vendedores com
metas a serem batidas mensalmente, um check de metas, e treinamentos
mensais sobre temáticas correlatas a Comercial e Liderança relevantes
para o desenvolvimento pessoal e profissional de todos.

188
Estudos em Cas@

Tanto o grupo de 25 estagiários quanto o grupo de 15 supervisores


de vendas têm uma linha condutora por parte da Escola, qual seja o de
conferir à sua trajetória acadêmica a formação como “tocador de negócio”.
Essa formação passa pela experiência de ensino e aprendizagem na área
comercial, iniciada com estágio em vendas e com prosseguimento na
supervisão de vendas; tanto em uma quanto em outra experiência os desa-
fios de gestão são reais. Assim, os estagiários têm metas a serem batidas,
bem como os têm os supervisores de vendas, que, inclusive, carregam
o desafio extra de exercer a liderança e de fazer com que o time deles,
de vendedores, consiga atingir os resultados almejados pelo negócio.
Para este capítulo importa considerar o papel desempenhado por
cinco professores desenvolvedores, que organizam e conduzem o dia a
dia desses jovens proporcionando momentos de interação tanto para
suscitar aportes teóricos que possam melhorar a prática (treinamentos
e pílulas de conteúdo) quanto para acompanhar a prática e os resultados
(check de metas e acompanhamento da rota).
Portanto, a importância dessa Rota Formadora para a presente
reflexão está no papel do professor de Administração, que, na Escola
Germinare, é chamado de “professor desenvolvedor”. É neste contexto
que o artigo busca refletir sobre qual é o papel do professor de Admi-
nistração quando diante de um processo de ensino e aprendizagem que
toma a prática como o seu elemento central. Para isso, elegeu-se como
objeto de reflexão um processo de ensino e aprendizagem que, embora
tenha lugar no Ensino Básico, também forma administradores e que já
tem a sua proposta pedagógica fundamentada em uma aprendizagem
baseada na prática. Assim emerge a contribuição deste capítulo no
sentido de refletir sobre qual é o papel do professor de Administração
diante desse novo cenário proposto pelas DCNs.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A Rota Formadora, objeto de estudo deste capítulo e que tem


lugar na Escola Germinare, está calcada em uma educação que prioriza
o desenvolvimento de competências gerenciais e de liderança, preten-

189
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

dendo desenvolver um futuro gestor de negócio. A prática é intrínseca ao


desenvolvimento de competências, pois adquirir uma competência passa
por “enfrentar os problemas e os desafios que a requeiram” (KÜLLER;
RODRIGO, 2012, p. 5).
Nesse mesmo sentido, Perrenoud (1999) registra que a competência
é uma forma eficaz de enfrentar situações de modo a articular consciência
e recursos cognitivos com saberes, capacidades, atitudes, informações e
valores, tudo de maneira rápida, criativa e conexa. O autor enfatiza que
competências não são objetivos, nem indicadores de desempenho, tampouco
potencialidades da mente humana: as competências só se desenvolvem e
se manifestam por meio da aprendizagem – ou seja, competências são
construídas e adquiridas pela prática.
Em síntese, pode-se concluir que competências “são requeridas
de todo cidadão e profissional, mesmo que elas sejam designadas com
outros nomes, tais como conhecimentos, saberes, aptidões, destrezas,
capacidades ou, ainda, aprendizagens, atributos, características ou qua-
lidades” (AUR, 2015, p. 117).
Os Estudos Baseados na Prática (EBP), que surgem como uma
crítica ao racionalismo e ao cognitivismo, priorizam o desenvolvimento
das competências dentro de uma organização. Isso resulta em uma
aprendizagem que necessariamente toma a prática como sua base central
(GHERARDI; STRATI, 2014). A aprendizagem ganha relevância
para além do espaço formal, realizando-se informalmente no exercício
mesmo da profissão e permitindo, a partir daí, que o “aprendizado [seja]
realizado de forma mais intuitiva por meio de vivências pessoais e cole-
tivas que ocorrem paulatinamente” (MOTTA; CORÁ, 2019, p. 97).
A prática traz, de fato, uma série de atividades que exige uma
participação ativa daqueles que a realizam. Em seu exemplo sobre
engenheiros, que aprendem a sê-lo enquanto aprendem as práticas do
canteiro de obras, Gherardi e Nicolini (2014) referem-se à questão da
identidade quanto a pertencer a certa comunidade de prática: os enge-
nheiros e os mestres de obras aprendem por meio de práticas distintas e
distinguem-se a partir daquilo que aprendem. Assim, todos – engenheiros

190
Estudos em Cas@

e mestres – passam a reconhecer esta participação ativa em determinada


atividade como competência.
Enquanto os engenheiros aprendem práticas do can-
teiro de obras, eles aprendem a ser engenheiros. Eles
desenvolvem uma identidade como engenheiros da coo-
perativa X e refinam um vocabulário de engenharia de
modo que, ao lidar com problemas práticos, eles possam
falar sobre suas práticas com outros engenheiros [...].
Em todas as comunidades de prática, a prática é um
contexto para a negociação de significados: ou seja, as
ações não atingem seus significados de si mesmas nem
em si mesmas (GHERARDI; NICOLINI, 2014, p. 86).

O processo de ensino e aprendizagem em Administração já vem


colocando a prática no centro do debate quando o assunto é o planeja-
mento acadêmico. Os docentes dos cursos superiores, inclusive, dire-
cionam suas atenções para métodos de ensino que sejam inovadores e
voltados para a ação (SILVA; DIAS JÚNIOR; CANÓS-DARÓS, 2019).
Muitos estudos se debruçam sobre métodos ativos de ensino e
aprendizagem – as chamadas metodologias ativas (BACICH; MORAN,
2018; BENDER, 2014; DAVID, 2008; MOTTA; LACERDA; WAN-
DERLEY; SANTOS, 2019; ROCHA, 2021). Nessas reflexões, o que
se verifica em comum é a relevância que ganha a aprendizagem baseada
na prática. Isso porque é pressuposto desta abordagem partir da cone-
xão com o mundo real do estudante para desenvolver a sua jornada de
aprendizagem. Entre os métodos mais comuns atualmente, destacam-se
o estudo de caso, o caso de ensino e a aprendizagem baseada em projeto.
Bender (2014) demonstra os ganhos obtidos quando adotada
uma metodologia ativa, apartada do ensino conteudista formal ainda
tão dominante na realidade da educação brasileira, ao compilar diversas
pesquisas que demonstram a eficácia e as vantagens de uma abordagem
de ensino com foco voltado à autonomia e à conexão do estudante com
o mundo real.
A primeira vantagem que se destaca é o fato de haver um aumento
na motivação e no interesse dos alunos, o que se traduz como maior
engajamento em razão de tratar-se de “cenários do mundo real, e essa
191
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

ênfase tende a tornar o ensino mais relevante para as vidas dos alunos”
(BENDER, 2014, p. 33). Além disso, merece destaque o fato de que
a primeira vantagem faz emergir a segunda, qual seja a melhora do
desempenho: “uma metanálise sintetizou um grande corpo de pesquisa
e indicou que os alunos podem ter melhoria de até 30% na compreensão
dos conceitos como resultado da aprendizagem baseada em projetos”
(BENDER, 2014, p. 33-34).
Além dos métodos de ensino “ativos”, existe a preocupação com
os ambientes de aprendizagem para que sejam motivadores. Isso porque
ambientes de aprendizagem que sejam dinâmicos favorecem a aprendi-
zagem, pois dão lugar para a necessária interação entre conhecimento e
as situações sociais “reais” (SILVA; SILVA; COELHO, 2019).
Quando as novas diretrizes curriculares para os cursos superiores
de Administração trazem o foco para o desenvolvimento de competên-
cias e almejam tornar a prática profissional obrigatória e supervisionada,
dialoga-se com o movimento que já vem acontecendo no processo de
ensino e aprendizagem, qual seja o de tornar a jornada do estudante sig-
nificativa. Trata-se de uma jornada que realmente o habilite a construir
o seu projeto de vida e que facilite a sua inserção e o seu desenvolvimento
profissional neste mundo cada vez mais complexo, dinâmico e conectado.
O papel do professor nesse processo é de suma importância, uma
vez que ele “é considerado um mediador de conflitos, aproximando alunos
e instituição de ensino, como se fosse uma espécie de tecelão de signifi-
cados, que articula conteúdo e contextos, orienta caminhos, narrativas
e projetos pessoais” (SOUZA et al., 2021, p. 110). Daí a intenção deste
capítulo de refletir sobre qual é o papel do professor de Administração
diante desse novo cenário proposto pelas DCNs, partindo de uma expe-
riência de ensino que tem na prática o ponto de partida para a formação
de tocadores de negócios conectados com o seu tempo.

METODOLOGIA

Adotou-se, neste capítulo, uma abordagem de pesquisa quali-


tativa com reflexões teóricas, apoiando-se no método do Estudo de

192
Estudos em Cas@

Caso (CESAR, 2005) para compreender, a partir da Rota Formadora,


empreendida com os estudantes dos 2º e 3º anos do Ensino Médio da
Escola Germinare, de que maneira essa iniciativa permite uma articu-
lação da prática com o desenvolvimento de competências e, ainda, se e
como contribui tanto para a aprendizagem quanto para a construção de
projetos de vida significativos por parte dos alunos.
Não seria apropriada a adoção de qualquer outro recurso meto-
dológico, uma vez que a situação de pesquisa se evidencia como aquela
tão bem descrita por Yin (2002, p. 13), segundo quem “os limites entre
o fenômeno e o contexto não são claros e o pesquisador tem pouco
controle sobre o fenômeno e o contexto”. Em consonância com o autor,
o caso proporciona que os investigadores indaguem “como” ou “por
quê” o fenômeno analisado acontece, tal como se pretende neste estudo.
A investigação da Rota Formadora apoia-se em três pesquisas
mistas realizadas em março de 2021, a partir de questionários elabora-
dos na plataforma on-line Survey Monkey, e direcionadas para: (i) os 25
alunos que fazem estágio em vendas (total de dez questões, sendo sete
fechadas e três abertas); (ii) os 15 alunos que integram a supervisão de
vendas (total de dez questões, sendo sete fechadas e três abertas); e (iii)
os cinco professores desenvolvedores (total de onze questões, sendo oito
fechadas e três abertas).

ANÁLISE DOS RESULTADOS

Esta pesquisa qualitativa utilizou-se de três questionários elabora-


dos na plataforma on-line Survey Monkey, como descrito anteriormente.
A este capítulo, então, interessou analisar os resultados obtidos junto
aos entrevistados – 25 estagiários, 15 supervisores e cinco professores
desenvolvedores – com relação à pergunta que, nos três questionários,
buscava investigar o papel do professor desenvolvedor.
Aos 25 estagiários do Grupo 1 e aos 15 supervisores do Grupo 2,
perguntou-se se achavam que as contribuições do professor desenvolve-
dor enriqueciam a sua construção profissional. Aos cinco professores do
Grupo 3, questionou-se se acreditavam que as suas contribuições como

193
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

professores desenvolvedores enriqueciam a construção profissional dos


estagiários e supervisores.

PAPEL DO PROFESSOR DESENVOLVEDOR

A figura do professor desenvolvedor e o papel que desempenha


são percebidos como relevantes para os respondentes de ambos os gru-
pos. No Grupo 1, de estagiários, 100% concordam que as contribuições
do professor desenvolvedor enriquecem a sua construção profissional,
enquanto no Grupo 2, de supervisores, a concordância atinge 93%,
conforme demonstram os gráficos 1 e 2:
Gráfico 1 – Professor desenvolvedor (Grupo 1).

Fonte: Os autores, 2021.

Gráfico 2 – Professor desenvolvedor (Grupo 2).

Fonte: Os autores, 2021.

194
Estudos em Cas@

Os depoimentos dos Grupos 1 e 2 reafirmam o levantamento


quantitativo e trazem a dimensão da relevância que a figura do professor
desenvolvedor tem no processo de ensino e aprendizagem e em suas
construções pessoais e profissionais:
“O acompanhamento que está sendo feito a partir desse ano
é de extrema importância. O apoio dos responsáveis pelo
programa e dos professores de campo ajuda muito.” (Grupo 2)
“O programa de estágio vem ajudando positivamente a
todos. Não só o conteúdo desenvolvido, como os profissionais
que orientam estão agregando em nossa rotina de vende-
dores.” (Grupo 1)
“O acompanhamento do professor junto com os treina-
mentos ajudou muito a entender pontos que não vemos
de primeira na rota e ajuda no nosso desenvolvimento no
estágio.” (Grupo 1)
“O acompanhamento ajuda muito a melhorar o desenvol-
vimento no estágio, podendo tirar mais proveito das ati-
vidades.” (Grupo 1)
“Ele [professor desenvolvedor] está contribuindo na hora de
lidar com os problemas com os clientes e aplicar a matéria
ensinada.” (Grupo 1)
Os dois grupos percebem benefícios no acompanhamento e
destacam a contribuição do professor para a aprendizagem comercial e
para seu desenvolvimento profissional.
Ademais, 100% dos professores concordam que o papel deles
favorece a construção de um ambiente de aprendizagem para além da
sala de aula. Os depoimentos dos professores corroboram essa percepção:
“É uma ótima oportunidade de desenvolvimento pessoal e
profissional.” (Grupo 3)
“Tem sido um espaço ideal para desenvolvimento profissional
(e pessoal) dos estudantes (também estagiários em vendas) da
Escola Germinare. A Academia Seara estruturou um pro-
grama consistente que permite aos estagiários se construírem
e se desenvolverem profissionalmente com acompanhamento
focado e muito dedicado.” (Grupo 3)

195
Ellen dos Santos Oliveira (org.)

“O programa de estágio me permite aprender diariamente


e isso considero a essência da profissão do próprio professor
bem como requisito básico para qualquer um que almeja se
desenvolver como pessoa e profissional.” (Grupo 3)
As percepções dos Grupos 1, 2 e 3 (estagiários, supervisores
e professores desenvolvedores, respectivamente) quanto ao papel do
professor desenvolvedor convergem no mesmo sentido, qual seja o da
relevância deste profissional na trajetória do que vem sendo realizado
neste projeto pedagógico, e comprovam ainda que tal importância existe
em função da oportunidade de vivenciar situações reais e aprender a
partir da prática (GHERARDI; STRATI, 2014; SOUZA et al., 2021).
O professor desenvolvedor cria um ambiente de aprendizagem que
favorece o desenvolvimento de competências ao apresentar e guiar os
estudantes nas situações reais – e necessárias – para a formação de um
administrador (SILVA; SILVA; COELHO, 2019).

CONSIDERAÇÕES

Ao investigar a percepção dos integrantes da Rota Formadora,


especialmente nas etapas dos 2º e 3º anos do Ensino Médio, quando
os estudantes assumem os cargos de vendedores e de supervisores de
vendas, compreendeu-se o impacto que essa iniciativa tem na formação
dos estudantes em Administração.
Destacam-se, nesse processo, as contribuições do professor desen-
volvedor, que guia os estudantes diante dos problemas que surgem com
a aprendizagem prática e que também localiza a teoria na realidade
vivida dos alunos.
Assim, ao garantir preponderância à prática e ao desenvolvimento
de competências, a Rota Formadora tem a sua força nos professores
desenvolvedores, pois são quem contribuem para a construção de pro-
jetos de vida significativos dos alunos, permitindo a sua inserção nessa
realidade cada vez mais complexa e conectada.
Quando o processo de ensino e aprendizagem é proposto a partir
da prática, toma-se como pressuposto que o profissional se desenvolverá,
enquanto tal, praticando – daí a íntima conexão entre aprendizagem
196
Estudos em Cas@

prática e desenvolvimento de competências. No entanto, como explo-


rado neste capítulo, inúmeros são os desafios: a aprendizagem prática e
localizada no contexto profissional requer estratégias de ensino ativas,
ambientes de aprendizagem inovadores e, comum aos dois requisitos,
engajamento dos estudantes.
O desenho da Rota Formadora localiza o professor desenvolve-
dor como peça-chave desse processo. A prática, que emerge da própria
atividade profissional (estágio e supervisão em vendas), é localizada na
aprendizagem dos alunos pelo professor desenvolvedor que amarra as
teorias, identificando sua importância, e também que auxilia o estudante
nos dilemas enfrentados diante de situações reais e complexas impostas
enquanto ele aprende a ser um tocador de negócio.
Por fim, percebe-se um esforço das novas diretrizes curriculares
para os cursos de Administração no sentido de preparar melhor os seus
estudantes tanto para que os seus aprendizados tenham sentido ao longo
da jornada do curso quanto para que eles estejam preparados para os
desafios que exigirão diversas competências uma vez no mercado de
trabalho. Neste sentido, para futuras reflexões, sugere-se que sejam
exploradas, por meio de um estudo qualitativo, quais as competências
que os docentes pensam que podem desenvolver para fazer frente às
competências que devem auxiliar a desenvolver em seus estudantes,
seguindo-se com um estudo quantitativo com um maior número de
profissionais.

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199
SOBRE A ORGANIZADORA

ELLEN DOS SANTOS OLIVEIRA

É professora, poetisa, contista, cronista, romancista e escritora.


Doutora em Letras pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Mestra
em Letras pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Especialista
em Cultura e Literatura pelo Centro Universitário Barão de Mauá
(CUBM). Especialização em andamento em Literatura Infanto Juvenil,
pela Faculdade Única. Especialização em andamento em Psicanálise, pela
Faculdade Única. Graduada em Letras Português e suas respectivas Lite-
raturas pela Faculdade São Luís de França (FSLF). Membro do Centro
Internacional e Multidisciplinar de Estudos Épicos da UFS (CIMEEP/
UFS). Foi membro do NEC – Núcleo de Estudos de Cultura da UFS.

CV: http://lattes.cnpq.br/0243081448488165
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-4728-5766
E-mail: profa.ellen.oliveira@live.com

200
ÍNDICE REMISSIVO ciências da natureza 187
ciências humanas 11, 22, 187
A ciências sociais 12, 18
alemanha 142 cientificismo 11
alunos 15, 25, 27-29, 31-33, 35, 38, 40-45, cinema 141-143, 145-146, 150-152, 158, 160
48, 56-58, 60-61, 67, 70, 77, 79-81, 91-94, claymation 144
97, 102, 104-105, 109-112, 114, 118, 121, claypainting 144
124-125, 127, 129, 152, 155-160, 162, 191- colégios jesuítas 11
193, 196-197 comitê extraordinário da covid-19 36, 39
ambiente virtual 23, 27-28, 69-70, 74, 79, 108 competências 7, 30, 64-66, 68, 73-75, 92,
análise do discurso (ad) 52, 117 99, 158, 170, 186-190, 192-193, 196-198
aplicativos 38, 56, 72-73, 105, 107, 154 computador 25-26, 28-29, 31-34, 37, 58, 61,
argumentação 100 67, 73-74, 79, 85, 103, 107
artes 29 comunicação 8, 19, 35, 44, 56, 63, 69, 72-73,
audiovisual 141, 143-147, 149-151 75, 77-79, 85, 90, 95, 98, 100, 103, 106, 133,
aulete 131, 137, 139-140 141, 150-151, 154-156, 162, 167-170
autoconhecimento 101 conceição evaristo 123, 125
autor 4, 16-17, 51, 59, 79, 90, 95-97, 106-107, construtivismo 16
110, 114, 120, 125, 128, 131, 133-134, 137- coronavírus 35-36, 46, 49, 66, 74, 78,
139, 167-168, 170, 177, 190, 193 118, 153, 165
B covid-19 5, 34, 36-37, 39, 42, 44-49, 54-55,
base 5, 8, 16, 30, 74-75, 77, 81-83, 85, 89-92, 60-62, 66, 76, 98, 114, 117, 162
95-97, 100-102, 104, 110, 112, 117-118, 131, cpu 29
139, 143-144, 150, 157, 167-168, 184, 190 crianças 45, 57-58, 121, 138, 141, 143-150
biologia 29, 31, 122 cultura digital 65, 77-78, 80, 100
boulevard des capucines 142 cultura mundial 12
brasil 21, 33, 36-37, 47, 49, 70, 75, 77, 79-80, cultura sergipana 29
84, 90, 97, 99, 102, 109, 118, 125, 130, 140, cyberbullying 110
142, 151-152, 154, 161-162, 167, 170-171, D
184, 186, 198 democratização 64
broffice 30 didática 26, 33, 97, 105-106, 156
bulletin board 68 disciplinas 10, 13-15, 19-22, 24, 26-29,
C 31-32, 35, 58, 122, 157-158
café literário 105, 107 diversidade humana 101
calc 30 docente 9, 24, 26-27, 31-32, 42, 57, 63, 75-76,
cantanhede -ma 82 89, 92, 129, 145-146, 149, 153, 159
capitoa 6, 8, 131-133, 135-140 draw 30
casa 31, 36, 38, 40-41, 55-56, 110, 118, 129 dvd 150, 152
ceará 153-154, 159, 162 E
censo escolar 37-38, 79, 90 educação 5, 7, 9, 12, 14, 16, 23-29, 31, 33,
charges 122 35, 37-39, 41, 44-51, 56-63, 66-67, 69-70,
ciberpoema 83-85, 89 74-76, 90-91, 97-98, 102-104, 113-114, 119,
cidadania 68, 100-101

201
121-122, 130, 141, 143, 145, 150-151, 154- fantasmagorie 144
155, 162, 164, 184, 186, 189, 191, 197-198 feedback 149, 159
educação a distância (ead) 57, 154 filosofia 29, 122, 130
educação continuada 14 física 13, 22, 26, 29, 31, 79, 101, 122, 139, 177
educação física 29, 31, 122 frança 27, 106, 113, 142, 200
edukativo 30 fraseologia 131-134, 140
eletrônicos 54, 69, 73, 103 fraseológicas 131-137
e-mail 87-88, 200 fraseológicos 131, 135, 137, 168
e-mails 54, 88 G
emergencial 5, 34-36, 48, 76, 153, 161-162 gêneros digitais 8, 78-79, 81-82, 84-85, 88-90
empirismo lógico 11 gêneros textuais 77, 83, 88, 90, 97-98, 164,
ensino 2, 5-10, 12, 21, 23-25, 27-29, 31-38, 166, 168-170, 172, 174, 183-184
40-41, 43-48, 50, 56-58, 60-63, 65-69, 72, geografia 29-30, 68, 122
74, 76-81, 83, 90-94, 97-98, 102-106, 113- gif 86
114, 117-124, 129-130, 133, 140, 142, 145, google 31, 35, 38, 48, 66, 70-71, 73,
150, 152-157, 161-164, 166, 169-170, 177, 109, 154, 157
184-189, 191-193, 195-199 google classroom 35, 38, 154
ensino remoto 5, 7, 23, 34-37, 40, 43-44, google meet 35, 109, 154
48, 50, 57-58, 61-62, 76, 103, 114, 118, grade curricular 29, 122
153, 161-162 gran café 142
escola 8, 23-28, 30-35, 37-38, 41-46, 48, 56, H
59, 66, 70, 75, 77-80, 82, 89, 91, 94, 101- hardwares 64
102, 104, 113-114, 121-122, 125, 128-129, hélio serejo 6, 8, 131-133, 135-140
141, 145-146, 148-150, 152, 184, 186-189, heurística 19, 22
193, 195, 198 hierarquização 17, 81
escola em casa 56 história 10-11, 29, 50, 53, 59, 94, 118-119,
esperança 11 122, 128-129, 132, 144, 146-148, 151-
estudo de caso 187, 191-192, 198-199 152, 169, 197
estudos 10, 34, 37-38, 43, 49, 51, 62, 72, 103, história da ciência 10-11
106, 109, 117, 121, 123-124, 131, 133-134, humanismo tradicional 11
141-142, 156, 164, 166-167, 184-185, 187, I
190-191, 197-198, 200 impress 30
europa 12, 150, 164, 167 inep 36-37, 165, 170, 184
exame nacional do ensino médio (enem) 166 informática na educação 5, 23-25,
experiência 5-7, 9, 11, 23, 26, 28, 32, 53, 27-28, 31, 33
91-92, 94, 99, 104, 150, 154, 161, 186- inovação 13, 16, 22, 113
187, 189, 192 instagram 66, 69, 72
extensão 10, 21, 51, 69 interdisciplinar 9-11, 13, 15, 17, 27,
F 32, 170, 197
facebook 66, 72, 147, 157 interdisciplinaridade 5, 7, 10-14, 20, 22-28,
fake news 72, 75 31-33, 130
falseabilidade 18

202
internet 5, 8, 25, 28-29, 31, 33, 37-38, 58, matemática 29-30, 100, 122, 187
63-70, 72-75, 79, 103, 156-157 mato grosso do sul 131-132, 137
irene no céu 125-126 mec 30, 34, 75, 102, 184, 186-187
isolamento social 7, 23, 34, 50, 112 memes 98
K método científico 11
kinetoscópio 143 métodos 11, 37-38, 104, 165, 184,
L 191-192, 198
laboratório 23-24, 27-29, 31-32 microeletrônicas 12
lan houses 31 microsoft teams 38, 54, 56
leitor 79-80, 85, 89, 91-93, 95-99, 102, minas gerais 6, 8, 36, 38-39, 42, 45-48, 117-
104, 106-107, 112-113, 167, 170-174, 176- 118, 121, 123, 125-127, 129-130, 138
178, 181, 183 modelo clássico 12
leitura 8, 30, 58, 78-99, 101-102, 105-106, multiletramento literário 105-106, 113
110, 112, 119, 125, 130, 148-150, 155-156, multiletramentos 84, 90, 98, 106, 114, 154
158, 160, 163, 165, 169-170, 177, 185 multissecular 11
let ra mento l iterá r io 105-10 6, 113- N
114, 125, 130 negro 6, 8, 117-118, 122-125, 128-130
letramentos 84, 90, 114, 155 notebook 34, 37
letras 23, 27, 62, 77, 102-103, 105, 113, 126, O
131, 140, 153-154, 158, 162, 200 ocidente 11
língua escrita 97 office 73
linguagem 6, 8-9, 14, 30, 44, 51-54, 62-63, offline 65
80-81, 83-85, 87, 96-99, 101, 106, 110, 117- oficina animação 145-147, 150
120, 127, 129-130, 140-145, 149-151, 153, online 55-58, 61-62, 65-66, 68-69, 72, 75,
168, 170, 180 104, 130, 137, 157, 162
linguagens 78, 80-81, 83-85, 89-90, 98-100, P
106, 165-166, 170-171, 175-177, 179-180, padlet 6, 9, 153-154, 156-163
182, 184, 187 pandemia 5-8, 23, 34-37, 45-51, 54-55,
língua oral 97 57-62, 66, 74, 76, 78, 98, 114, 117-118, 153,
língua portuguesa 31-32, 77-78, 90, 94, 155, 158, 161, 165
97-99, 103-104, 111, 118, 122, 129-131, pcns 97
164-167, 171 período medieval 11
ling uística text ual 6, 164-167, 171, pesquisa 5, 7, 10-11, 13, 15-16, 21, 29, 31-32,
174, 183-185 35, 37, 48, 50-52, 59, 62, 65-68, 70-71, 74-75,
link 35, 56, 67, 110, 147, 157 78, 82, 90, 98, 107, 113, 136, 154, 162, 165-
literatura 6, 8, 29, 68, 74, 78, 104-107, 111, 166, 184-185, 188, 192-193, 198-199
113-114, 117-118, 120, 122-124, 127-128, pixilation 144
130-131, 134, 153, 158, 160, 200 plano de desenvolvimento individual (pdi) 44
literatura brasileira 104, 111, 122, 128, 130 planos de estudos tutorados (pet) 117
M poema visual 84-85
manuel bandeira 125, 127-128 português 13, 29, 77, 89, 185, 200
mário barbosa 125 positivismo 11, 16-17

203
pós-modernidade 12 tecnologia 14, 22, 25-26, 28-29, 32-33, 44,
prática pedagógica 22, 102, 150 57, 60, 62, 64, 74-75, 86, 104, 113-114, 152,
práticas de ensino 10, 21, 90 155, 169, 186
procurando dory 146, 152 tecnologias na educação 23
programa nacional do livro didático 80, 83 tele-escola 54
Q teoria autopoiética 20
química 29, 104, 122 teoria sistêmica 16
R time-lapse 144-145
rádio 38 tirinhas 122
redação 29, 31-32 tv 30, 38, 160
redes sociais 38, 66, 69, 71-73, 79-80, 109 U
remoto 5, 7, 23, 34-37, 40-41, 43-44, 47-51, unesco 12, 14
55-58, 61-62, 76, 78, 103-105, 107, 114, 118- universidade 24, 152, 154, 159, 162, 200
119, 153, 155, 158, 161-162 usenet 68
remotus 34 V
renascimento 11 verificabilidade 18
responsabilidade 4, 64, 74, 99-101, 113 vida cotidiana 98, 101
revolução industrial 11, 63 videoconferências 38
rio grande do sul 132, 137, 162 videopoema 105, 107
S violência virtual machuca 110
saberes 10, 14, 66, 100-101, 190 vlogs 84
sala de aula 5, 25, 27, 36, 45, 77, 80, 91-92, vozes-mulheres 123
97, 102, 143, 145, 148-149, 152, 156- W
157, 161, 195 web 47, 79, 85, 99, 157
sars-cov-2 36, 49 whatsapp 35, 38, 66, 72, 104, 108-111, 154
saúde física 101 wikipédia 65, 70
sergipe 23-24, 200 windows 30
sge 54 wine 30
smartphone 34, 68 writer 30
sociais 12, 18, 20-21, 24, 38, 50, 54, 59, Y
61-62, 66, 69, 71-73, 77, 79-80, 84, 99-101, youtube 38, 70-72, 108, 110, 144, 147, 154
103, 109, 119-120, 155, 168-170, 187, 192 youtubers 98
sociedade moderna 19, 151 Z
sociologia 18, 29 zoom 35, 38
softwares 28, 30, 64, 147
stop motion 142, 144-147, 149, 152
storyboard 147
systems 68
T
tablet 34, 67
tdic 8, 48, 63-65, 68-69, 74-75, 154-155
tecnociência 12

204
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