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Justiça Federal da 1ª Região

PJe - Processo Judicial Eletrônico

13/12/2021

Número: 1066245-58.2021.4.01.3400
Classe: AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL
Órgão julgador: 13ª Vara Federal Cível da SJDF
Última distribuição : 16/09/2021
Valor da causa: R$ 1.000,00
Assuntos: Exercício Profissional
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Procurador/Terceiro vinculado
Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional ALEXANDRE AMARAL DE LIMA LEAL (ADVOGADO)
(AUTOR)
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (REU)
Ministério Público Federal (Procuradoria) (FISCAL DA LEI)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
84353 10/12/2021 17:10 Sentença Tipo A Sentença Tipo A
4059
PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Distrito Federal
13ª Vara Federal Cível da SJDF

SENTENÇA TIPO "A"


PROCESSO: 1066245-58.2021.4.01.3400
CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL (65)
POLO ATIVO: Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional
REPRESENTANTES POLO ATIVO: ALEXANDRE AMARAL DE LIMA LEAL - DF21362
POLO PASSIVO:CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA

SENTENÇA

Cuida-se de Ação Civil Pública, com pedido de liminar, ajuizada pelo


CONSELHO FEDERAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL - COFFITO
, em desfavor do CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA - CFM, objetivando “a
suspensão dos efeitos dos § 2º do art. 14 da Resolução CFM nº 2.297/2021, em sede de
Tutela de Urgência, ante a probabilidade do direito vindicado e a urgência que o caso
requer para evitar maiores prejuízos ao direito coletivo dos profissionais fisioterapeutas e
dos direitos difusos dos litigantes em geral”.

No mérito, requer “DECLARAÇÃO DE NULIDADE do artigo 14, §2º da


Resolução CFM nº 2.297, de 18 de agosto de 2021, pelas inconstitucionalidades
e ilegalidades articuladas na presente peça de ingresso; Em consequência do
reconhecimento da nulidade referida na alínea v, que seja condenado o réu a obrigação
de não fazer consistente em não proceder com qualquer ato relativo à normatização que
impeça o profissional fisioterapeuta ou oponham, a estes, dificuldades, de qualquer
natureza, para a participação como assistente técnico em atos periciais em que
profissionais médicos forem auxiliares do Juízo ou em processos administrativos".

Narra, em apertada síntese, que, “o CFM editou uma Resolução para


buscar obstaculizar a participação do fisioterapeuta na qualidade de assistente
técnico pericial em perícias em que os médicos são designados os peritos”.

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Alega que “a Resolução nº 2.297, traz uma odiosa norma que determina ao
Profissional Médico, sob pena de processo administrativo de natureza ético-
disciplinar, que NÃO participe de perícia em que o assistente técnico escolhido pela
parte seja um profissional fisioterapeuta ou outro profissional da saúde, que não seja
médico”.

Sustenta, assim, violação ao princípio da legalidade.

Requereu o reconhecimento da conexão com os autos de n. 1022804-


32.2018.4.01.3400, em tramitação perante a 8ª Vara desta Seção Judiciária.

Com a inicial vieram procuração e documentos.

Exame da liminar postergado (id. 737325975)

Contestação ofertada sob id. 796268588.

Parecer do Ministério Público Federal (id. 823299100).

A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PERICIAS FISIOTERAPEUTICAS –


ABRAPEFI requereu seu ingresso na condição de amicus curiae (id. 830348054).

Réplica sob id. 843946061.

É o relatório.

Decido.

Da conexão com os autos de n. 1022804-32.2018.4.01.3400

Conforme noticiado nos autos, a Ação Civil Pública n. 1022804-


32.2018.4.01.3400, que tramita perante a 8ª Vara Federal desta Seção Judiciária, objetiva
discutir a legalidade da Resolução COFITO 466/2016.

Bem examinadas as duas peças inaugurais, é de se observar que não se


cuidam de demandas conexas.

O pedido formulado na ação tombada sob o nº 1022804-32.2018.4.01.3400,


manejada pelo CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA em desfavor do CONSELHO
FEDERAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL - COFFITO, tem o seguinte
teor:

“Que conceda a antecipação da tutela pretendida para, liminarmente, determinar a


suspensão da eficácia da Resolução n.º 466/2016, expedida pelo Conselho Federal de
Fisioterapia e Terapia Ocupacional, proibindo o réu de expedir regulamentos que
extrapolem os limites do seu poder regulamentar, notadamente no que se refere à
realização de perícias judiciais, extrajudiciais, judiciais do trabalho, previdenciárias,
securitárias e para pessoas com deficiência física e, ainda atuação de fisioterapeutas como
assistentes técnicos de perícias, ordenando, ainda, que o réu dê ampla publicidade, por
meio de seu sítio eletrônico e demais meios de comunicação institucional quanto ao

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deferimento da suspensão que se pleiteia, fixando, ainda, multa de R$ 100.000,00 (cem mil
reais) por dia, em caso de descumprimento da ordem.

b) Em definitivo, que se reconheça e declare a inconstitucionalidade e ilegalidade, incidenter


tantum, da Resolução n.º 466/2016 do COFFITO, confirmando, assim, a antecipação de
tutela e suas decorrências descritas no item “a””.

Verifica-se, portanto, que o referido tem como causa de pedir e pedido


consubstanciados na ilegalidade da Resolução n.º 466/2016, do Conselho Federal de
Fisioterapia e Terapia Ocupacional, sob o argumento de inovação no mundo jurídico ao
permitir a realização de perícias judiciais por fisioterapeutas.

Por sua vez, a presente demanda, ajuizada pelo CONSELHO FEDERAL


DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL – COFFITO em desfavor do
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA tem como causa de pedir a ilegalidade da
Resolução CFM 2.297/2021, cujo pedido restou assim formulado:

“(ii) O deferimento de medida liminar, inaudita altera pars , para determinar a suspensão
dos efeitos dos § 2º do art. 14 da Resolução CFM nº 2.297/2021, em sede de Tutela de
Urgência, ante a probabilidade do direito vindicado e a urgência que o caso requer para
evitar maiores prejuízos ao direito coletivo dos profissionais fisioterapeutas e dos direitos
difusos dos litigantes em geral, pelas razões adensadas; Ao final, a DECLARAÇÃO DE
NULIDADE do artigo 14, §2º da Resolução CFM nº 2.297, de 18 de agosto de 2021,
pelas inconstitucionalidades e ilegalidades articuladas na presente peça de ingresso”.

Consoante o art. 55 do CPC, “reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações


quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir”. O §3º do artigo supracitado, mais,
estabelece a necessidade de reunião de feitos, mesmo que não haja conexão, se
verificada a possibilidade de decisões conflitantes.

No caso em exame, nada obstante ambas as ações objetivarem a invalidação


de Resolução expedidas pelos referidos Conselhos, a causa de pedir e pedido não são
comuns, eis que cada uma guarda sua devida particularidade.

De igual modo, não restou evidenciado relação de prejudicialidade entre a


ação possivelmente conexa com o presente feito, eis que eventual (des)acolhimento do
pleito formulado não refletirá na tramitação da presente demanda.

Tal o quadro, indefiro o pedido de declínio dos autos em favor da 8ª Vara


deste juízo por conexão com os autos de n. 1022804-32.2018.4.01.3400.

Do Amicus Curiae

Conforme art. 138 do CPC, os critérios para admissão da entidade de classe


exige a demonstração da relevância da matéria, especificidade do tema ou repercussão
social da controvérsia, assim como a representatividade adequada do pretendente.

Ao tratar sobre o tema, o Superior Tribunal Federal assim entendeu:

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSO SUBJETIVO.
PEDIDO DE INGRESSO COMO AMICUS CURIAE. INTERESSE INSTITUCIONAL
COLABORATIVO E DEMOCRÁTICO. INDEFERIMENTO. AUSÊNCIA DE LESIVIDADE
JURÍDICA. IRRECORRIBILIDADE. ART. 138 DO CPC. AGRAVO NÃO CONHECIDO. 1.
Cabe ao amicus oferecer sua opinião sobre a causa, sobretudo nas questões técnico-
jurídicas de maior complexidade. Assim, a tradução literal para “amigo da corte”,
ainda que possa ser insuficiente para expressar o papel que desempenha, bem
sintetiza a razão de ser eminentemente colaborativa do instituto. 2. O instituto do
amicus curiae, historicamente, caracterizava-se pela presunção de neutralidade de sua
manifestação, tanto na experiência romano-germânica, quanto na tradição anglo-saxônica.
3. Aos amicus cabia apresentar elementos de fato e de direito que, por qualquer
razão, escapassem do conhecimento dos juízes, assegurando a paridade de armas
entre as partes, atuando de forma presumidamente imparcial. 4. A experiência norte-
americana demonstra que os amici curiae ao longo do tempo perderam sua presumida
imparcialidade (SORENSON, Nancy Bage, The Ethical Implications of Amicus Briefs, 30 St.
Mary's L.J. 1225-1226. 1999). 5. A Suprema Corte americana alterou sua Rule 37 com o fito
de clarificar quais os aspectos aptos a justificar a atuação da figura, independentemente de
seus eventuais interesses: “1. A manifestação de amicus curiae que chame a atenção do
Tribunal para uma questão relevante que ainda não tenha sido comunicada pelas partes
pode ser de grande ajuda para o Tribunal. A manifestação de amicus curiae que não
sirva a este propósito sobrecarrega o Tribunal, e sua juntada não é recomendável. A
manifestação de amicus curiae pode ser apresentada apenas por um advogado admitido a
praticar perante este Tribunal, conforme previsto na regra 5.” (Rules of The Supreme Court
of The United States. Part VII. Rule 37. Brief for an Amicus Curiae) 6. A doutrina do tema
reconhece que há uma multiplicidade de interesses a orientar a atuação do colaborador da
Corte, o que não macula a ratio essendi da participação. O eventual interesse individual não
pode ser o fundamento a justificar seu ingresso; não se confundindo com o interesse
tipicamente subjetivado das partes, nem com o interesse institucional, de viés colaborativo e
democrático, que constitui o amicus como um representante da sociedade. (SCARPINELLA
BUENO, Cássio. Amicus Curiae no Processo Civil brasileiro: um terceiro enigmático. 2012.
p. 121-122). 7. O amicus curiae presta sua potencial contribuição com a jurisdição, mas não
se submete à sucumbência – nem genérica, nem específica - apta a ensejar o interesse de
recorrer da decisão que, apreciando o pedido de ingresso, não vislumbra aptidão
contributiva suficiente para a participação no caso concreto. A manifestação do amicus não
pode ser imposta à Corte, como um inimigo da Corte. 8. O ingresso do amicus curiae, a
par do enquadramento nos pressupostos legais estabelecidos Código de Processo
Civil – notadamente que a causa seja relevante, o tema bastante específico ou tenha
sido reconhecida a repercussão geral –, pode eventualmente ser obstado em nome do
bom funcionamento da jurisdição, conforme o crivo do relator, mercê não apenas de
o destinatário da colaboração do amicus curiae ser a Corte, mas também das balizas
impostas pelas normas processuais, dentre as quais a de conduzir o processo com
eficiência e celeridade, consoante a análise do binômio necessidade-
representatividade. 9. O legislador expressamente restringiu a recorribilidade do amicus
curiae às hipóteses de oposição de embargos de declaração e da decisão que julgar o
incidente de resolução de demandas repetitivas, conforme explicita o artigo 138 do CPC/15,
ponderados os riscos e custos processuais. 10. É que o amicus curiae não se agrega à
relação processual, por isso não exsurge para ele uma expectativa de resultado ou mesmo
uma lesividade jurídica a ensejar a recorribilidade da denegação de seu ingresso. O status
de amicus encerra-se no momento em que se esgota – ou se afere inexistir – sua
potencialidade de contribuição ou sugestão (COVEY, Frank. Amicus Curiae: Friend of
The Court. 9 DePaul Law Review, nº 30. 1959, p. 30). 11. A irrecorribilidade da decisão do
Relator que denega o ingresso de terceiro na condição de amicus curiae em processo
subjetivo impede a cognoscibilidade do recurso sub examine, máxime porque a
possibilidade de impugnação de decisão negativa em controle subjetivo encontra óbice (i)
na própria ratio essendi da participação do colaborador da Corte; e (ii) na vontade
democrática exposta na legislação processual que disciplina a matéria. 12. Agravo
regimental não conhecido. (RE 602584 AgR, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/
Acórdão: LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 17/10/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO

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DJe-065 DIVULG 19-03-2020 PUBLIC 20-03-2020)

Conclui-se, portanto, que o ingresso de terceiro na qualidade de amicus


curiae é medida excepcional, mostrando-se recomendada apenas em situações
específicas e que demandam alto contexto probatório (STF Rcl 22012 AgR 27/06/2018).

Na hipótese dos autos, entretanto, em pese a relevância dos argumentos


trazidos pela ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PERICIAS FISIOTERAPEUTICAS –
ABRAPEFI, verifica-se que a tese apresentada pela parte Autora encontra-se
suficientemente titularizada e desenvolvida nos autos, de modo a não necessitar de
maiores esclarecimentos para convicção do juízo.

Desse modo, não havendo razão que justifique o ingresso da ASSOCIAÇÃO


BRASILEIRA DE PERICIAS FISIOTERAPEUTICAS – ABRAPEFI na condição de amicus
curiae, INDEFIRO seu pleito.

Do mérito

Não foram suscitadas preliminares.

Verifico que a questão de mérito exige prova documental, não havendo


necessidade de produção de prova em audiência, razão pela qual antecipo o julgamento
da lide, nos termos do disposto no art. 355, I, do Código de Processo Civil.

Consigno que a atuação jurisdicional no controle de atos tipicamente


regulatórios deve observar determinadas balizas.

A propósito da necessária cautela em face da autonomia técnica legalmente


conferida às agências reguladoras, na esteira de orientação jurisprudencial do Superior
Tribunal de Justiça, "o Poder Judiciário, quando instado a se manifestar acerca de algum
ato administrativo, deve agir com cautela, nos estreitos limites da legalidade, mormente
em se tratando de questões concernentes a atos administrativos de agências
reguladoras, cujo âmbito de atuação se dá com fulcro em legislação com ampla
especificidade técnica sobre o mercado regulado" (STJ - AgRg na SS 2727 DF
2014/0183348-0 - CE - CORTE ESPECIAL - Ministro FELIX FISCHER - DJe 16/10/2014).

Importa consignar, nesse contexto, que “(...) a capacidade institucional na


seara regulatória, a qual atrai controvérsias de natureza acentuadamente complexa, que
demandam tratamento especializado e qualificado, revela a reduzida expertise do
Judiciário para o controle jurisdicional das escolhas políticas e técnicas subjacentes à
regulação econômica, bem como de seus efeitos sistêmicos. 2. O dever de deferência
do Judiciário às decisões técnicas adotadas por entidades reguladoras repousa na
(i) falta de expertise e capacidade institucional de tribunais para decidir sobre
intervenções regulatórias, que envolvem questões policêntricas e prognósticos
especializados e (ii) possibilidade de a revisão judicial ensejar efeitos sistêmicos
nocivos à coerência e dinâmica regulatória administrativa. 3. A natureza
prospectiva e multipolar das questões regulatórias se diferencia das demandas
comumente enfrentadas pelo Judiciário, mercê da própria lógica inerente ao
processo judicial” (RE 1083955 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma,
julgado em 28/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-122 DIVULG 06-06-2019

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PUBLIC 07-06-2019).

Dissertando sobre o controle jurisdicional sobre atos administrativos, o


Professor Gustavo Binenbojm consigna o seguinte:

"Com efeito, naqueles campos em que, por sua alta complexidade técnica e dinâmica
específica, faleçam parâmetros objetivos para uma atuação segura do Poder Judiciário, a
intensidade do controle deverá ser tendencialmente menor. Nesses casos, a expertise e a
experiência dos órgãos e entidades da Administração em determinada matéria poderão ser
decisivas na definição da espessura do controle. Há, ainda, situações em que, pelas
circunstâncias específicas de sua configuração,a decisão final deva estar preferencialmente
a cargo do Poder Executivo, seja por seu lastro (direto ou mediato) de legitimação
democrática, seja em deferência à legitimação alcançada após um procedimento amplo e
efetivo de participação dos administrados na decisão.

Os standards básicos a serem levados em conta pelo magistrado, no momento de exercer o


controle jurisdicional sobre atos administrativos, são os seguintes: (i) grau de restrição a
direitos fundamentais (quanto maior, mais intenso o controle); (ii) grau de objetividade
extraível do relato normativo (quanto maior, menos intenso o controle); (iii) grau de
tecnicidade da matéria (quanto maior, menos intenso o controle); (iv) grau de politicidade da
matéria (quanto maior, menos intenso o controle); (v) grau de participação efetiva e
consenso obtido em torno da decisão administrativa (quanto maior, menos intenso o
controle)" (BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo: Direitos
fundamentais, democracia e constitucionalização. Rio de Janeiro: 2008, Renovar. pg. 316).

Deveras, é induvidoso que tais decisões - dado os contornos técnicos de alta densidade e o
amplo alcance de seus efeitos sociais, especialmente se considerada, à luz do princípio da
precaução, a perspectiva de proteção da saúde - devem ter apoio em diversos fundamentos
relacionados à complexa dinâmica de avaliação das questões envolvidas.

Assim é que, analisando os atos praticados por Agências Reguladoras no desempenho de


suas missões típicas, especialmente em casos como o presente, que envolvem alto nível de
tecnicidade e politicidade das medidas de regulação, o Poder Judiciário, observada a
perspectiva das capacidades institucionais, não pode incursionar sobre a essência da opção
política do ente regulador, devendo funcionar como garantidor da legitimidade democrática
das decisões, exercendo controle sobre a adequada motivação do ato (observada a
coerência com a política pública setorial) e sobre a regularidade do procedimento
(verificando se houve regular participação e transparência nos processos decisórios).

A atuação jurisdicional deve ser, portanto, menos substantiva e mais voltada


ao controle procedimental da atividade regulatória.

Fixadas as premissas teóricas gerais, passo ao exame do caso concreto.

A presente controvérsia gravita em torno da legitimidade do estabelecimento,


pelo Réu, via da Resolução CFM 2.297, de requisitos para realização de perícias
médicas.

O Conselho Federal de Medicina, evidentemente, pode e deve exercer o


poder regulamentar legalmente a ele concedido. No exercício desta prerrogativa, no
entanto, deve obediência às leis, não podendo, por certo, inovar no ordenamento jurídico.

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A matéria em questão é regulamentada pela Lei 3.268/57, que assim
prescreveu:

"Art . 2º O conselho Federal e os Conselhos Regionais de Medicina são os órgãos


supervisores da ética profissional em tôda a República e ao mesmo tempo, julgadores e
disciplinadores da classe médica, cabendo-lhes zelar e trabalhar por todos os meios ao seu
alcance, pelo perfeito desempenho ético da medicina e pelo prestígio e bom conceito da
profissão e dos que a exerçam legalmente.

(...)

Art . 5º São atribuições do Conselho Federal:

a) organizar o seu regimento interno;

b) aprovar os regimentos internos organizados pelos Conselhos Regionais;

c) eleger o presidente e o secretária geral do Conselho;

d) votar e alterar o Código de Deontologia Médica, ouvidos os Conselhos Regionais;

e) promover quaisquer diligências ou verificações, relativas ao funcionamento dos


Conselhos de Medicina, nos Estados ou Territórios e Distrito Federel, e adotar, quando
necessárias, providências convenientes a bem da sua eficiência e regularidade, inclusive a
designação de diretoria provisória;

f) propor ao Governo Federal a emenda ou alteração do Regulamento desta lei;

g) expedir as instruções necessárias ao bom funcionamento dos Conselhos Regionais;

h) tomar conhecimento de quaisquer dúvidas suscitadas pelos Conselhos Regionais e


dirimí-las;

i) em grau de recurso por provocação dos Conselhos Regionais, ou de qualquer


interessado, deliberar sôbre admissão de membros aos Conselhos Regionais e sôbre
penalidades impostas aos mesmos pelos referidos Conselhos.

j) fixar e alterar o valor da anuidade única, cobrada aos inscritos nos Conselhos Regionais
de Medicina; e (Incluído pela Lei nº 11.000, de 2004)

l) normatizar a concessão de diárias, jetons e auxílio de representação, fixando o valor


máximo para todos os Conselhos Regionais".

Ao dispor sobre as normas específicas para médicos que atendem o


trabalhador, a Resolução CFM 2.297/2021 prescreveu o seguinte:

"Art . 14. Conforme artigo 465 do Código de Processo Civil, o juiz nomeará perito
especializado no objeto e na natureza da perícia. A perícia com fins de determinação de
nexo causal, avaliação de capacidade laborativa/aptidão, avaliação de sequela/valoração
do dano corporal, requer atestação de saúde e definição do prognóstico referente ao
diagnóstico nosológico, o que é, legalmente, ato privativo do médico.

(...)

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§ 2º É vedado ao médico realizar perícia médica na presença de assistente técnico
não médico. Nesse caso, o médico perito deve suspender a perícia e informar
imediatamente ao magistrado o seu impedimento".

Infere-se da peça de defesa o seguinte teor (id. 796268588):

"EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA RESOLUÇÃO CFM Nº 2.297/2021


A proposta de alteração do Artigo 14 da Resolução nº 2.183/2018 nos foi demandada pelo
Ministério Público do Trabalho, referente à Ação Civil nº002317.2019.10.000/2 demandada
pela Abrapefi.
A perícia médica tem como objeto realizar diagnóstico nosológico referente ao prognóstico e
atestação de saúde, que são atos privativos de médico, consoante a Lei nº12.842/2013.
Dentro dessa lógica talhada pela lei, o assistente técnico em perícia com esse objeto deve
ser médico para elaborar o seu parecer técnico, para confrontar ou para concordar com o
Laudo Médico Pericial.
Nas manifestações do perito em relação aos pareceres dos assistentes técnicos ou
impugnações, não é crível que profissionais travem uma discussão técnica se eles têm
formação diversa. Não é possível nivelar a discussão técnica sob a equivocada justificativa
de se tratar de profissionais de saúde e, portanto,
ainda que possuam conhecimentos congêneres e correlatos, na profundidade do saber
exigido para o desempenho profissional, são diversos da formação de um médico.
Enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas, biomédicos etc. são profissionais de saúde. No
entanto, não podem realizar cirurgia, mas
aprenderam anatomia na graduação; não podem tratar transtornos psiquiátricos, em que
pese terem estudado farmacologia; não podem definir prognóstico referente ao diagnóstico
nosológico. Nesse sentido, também não têm condições de definir diagnósticos diferenciais.
Assim, não podem realizar perícia cujo objeto é a determinação de nexo causal e a
atestação de saúde, por exemplo, por se tratar,na verdade, de perícia médica. Se não
reúnem condições técnicas de realizar perícia médica, por causa de sua formação
profissional, também não reúnem condições técnicas de atuar como assistente
técnico em perícia médica.
De outro lado, o médico também não pode participar de perícias que sejam normatizadas e
privativas de outras profissões regulamentadas em lei; em razão da mesma justificativa.
Observando o limite de atuação de cada profissão, conforme legislação vigente, não há que
se falar em reserva de mercado ou de
cerceamento do livre exercício da profissão, mas sim de respeitar a qualificação profissional
exigida de cada um. Exatamente como determinou o Art. 5º, XIII, da Constituição Federal de
1988.
O texto proposto para alteração foi apreciado pelas Câmaras Técnicas de Medicina Legal e
Perícia Médica e de Medicina do Trabalho, sofreu as alterações apontadas por seus
membros e seguiu para apresentação, discussão e aprovação do Pleno do Conselho
Federal de Medicina".

Por sua vez, colhe-se do parecer ministerial encartado sob id. 823299100 a
seguinte fundamentação, a qual adoto como razões complementares de decidir:

"A perícia fisioterapêutica foi regulamentada pela Resolução n. 466/2016, do Conselho


Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Coffito), que dispõe sobre a atuação do
perito e do assistente técnico.
Referida norma, convém ressaltar, restringe-se à perícia fisioterapêutica e não abrange
questões relativas à perícia médica, dispondo que compete ao fisioterapeuta "no âmbito de
sua expertise, realizar perícias judiciais e assistência técnica em todas as suas formas e
modalidades, nos termos da presente Resolução".
A Resolução Coffito n. 466/2016, desse modo, estabelece regramento que permite ao
fisioterapeuta exercer determinadas condutas - inclusive como assistente pericial - de

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acordo com sua formação e expertise específicas.
O Código de Processo Civil, por sua vez, define o perito como o profissional hábil a auxiliar
o juízo quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico. Estabelece,
ainda, que os peritos serão nomeados entre os profissionais legalmente habilitados, além
dos órgãos técnicos ou científicos devidamente inscritos em cadastro mantido pelo tribunal
ao qual o juiz está vinculado, consoante se depreende dos dispositivos a seguir:

Art. 156. O juiz será assistido por perito quando a prova do fato depender de conhecimento
técnico ou científico.
§ 1o Os peritos serão nomeados entre os profissionais legalmente habilitados e os órgãos
técnicos ou científicos devidamente inscritos em cadastro mantido pelo tribunal ao qual o
juiz está vinculado.
§ 2o Para formação do cadastro, os tribunais devem realizar consulta pública, por meio de
divulgação na rede mundial de computadores ou em jornais de grande circulação, além de
consulta direta a universidades, a conselhos de classe, ao Ministério Público, à Defensoria
Pública e à Ordem dos Advogados do Brasil, para a indicação de profissionais ou de órgãos
técnicos interessados.
§ 3o Os tribunais realizarão avaliações e reavaliações periódicas para manutenção do
cadastro, considerando a formação profissional, a atualização do conhecimento e a
experiência dos peritos interessados.
§ 4o Para verificação de eventual impedimento ou motivo de suspeição, nos termos dos
arts. 148 e 467, o órgão técnico ou científico nomeado para realização da perícia informará
ao juiz os nomes e os dados de qualificação dos profissionais que participarão da atividade.
§ 5o Na localidade onde não houver inscrito no cadastro disponibilizado pelo tribunal, a
nomeação do perito é de livre escolha pelo juiz e deverá recair sobre profissional ou órgão
técnico ou científico comprovadamente detentor do conhecimento necessário à realização
da perícia.

Especificamente sobre a assistência pericial, o CPC estabelece que se trata de indicação de


confiança da parte, sem impor limitações quanto às áreas de conhecimento que podem ser
autorizadas para o acompanhamento das diligências e dos exames a serem realizados em
Juízo:

Art. 466. O perito cumprirá escrupulosamente o encargo que lhe foi cometido,
independentemente de termo de compromisso.
§ 1º Os assistentes técnicos são de confiança da parte e não estão sujeitos a impedimento
ou suspeição.
§ 2º O perito deve assegurar aos assistentes das partes o acesso e o acompanhamento das
diligências e dos exames que realizar, com prévia comunicação, comprovada nos autos,
com antecedência mínima de 5 (cinco) dias.

Sobre o tema da atribuição de profissionais do campo da fisioterapia para atuação como


peritos e assistentes técnicos, o Ministério Público Federal, no parecer lançado no processo
nº 1022804-32.2018.4.01.3400 (id 39488518), explicou que o laudo de exame pericial
consubstancia um documento com conteúdo declaratório, exarado por especialista.
Desse modo, o que se faz cogente é que o profissional subscritor do laudo esteja
devidamente habilitado para se manifestar sobre a matéria em relação à qual exara o
conteúdo declaratório, é dizer, o exame pericial pode ser executado por especialistas de
suas respectivas áreas do conhecimento, não havendo rol extremamente restrito - exclusivo
- de profissões habilitadas.
É o que se extrai do art. 156, § 1º, do CPC, que exige a atuação de "profissionais
legalmente habilitados". Nessa linha, emana do Código o dever de que atue o profissional
que, dentre as várias áreas do conhecimento, comprovadamente detenha conhecimento e
habilitação necessários para a realização do exame técnico exigido no processo específico.
Sobre os limites da Lei nº 12.842/13, vale transcrever elucidativos trechos do parecer
ministerial mencionado acima:
(...)

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O fato de a Lei n. 12.842/2013 atribuir privativamente ao médico a realização de perícia
médica e exames médico-legais, excetuados os exames laboratoriais de análises clínicas,
toxicológicas, genéticas e de biologia molecular (inciso XII do art. 4º), assim como a
atestação médica de condições de saúde, doenças e possíveis sequelas (inciso XII do art.
4º) [rectius, inciso XIII], não exclui a possibilidade de que profissionais de saúde de outras
áreas executem atividades similares no âmbito de sua
respectiva competência.
Ou seja, que realizem perícia e atestação fisioterapêutica, odontológica, psicológica, entre
outros.
Descabido, com efeito, que tais dispositivos sejam interpretados de forma tão restritiva, a
ponto de se compreender que seria ato privativo do médico a execução de qualquer perícia
e atestação em saúde.

A própria redação da norma não permite que se chegue à conclusão defendida na inicial
pelo Conselho Federal de Medicina, uma vez que o art. 4º da Lei n. 12.842/2013 enumera
os atos de perícia médica e atestação médica, indicando, assim, que haveria outros tipos de
perícia e atestação de
condições de saúde que poderiam (e, em alguns casos, deveriam) ser executados por
outros profissionais.
Ora, a possibilidade de que outros profissionais de saúde subscrevam laudos periciais e
executem atestação de condições de saúde é admitida amplamente em nosso ordenamento
jurídico, corroborando o equívoco de se proceder a uma interpretação restritiva da Lei n.
12.842/2013 e que, a rigor, beneficia apenas a classe médica e não o usuário do serviço
pericial de saúde.
(...)
Como exemplo, pode-se citar a Resolução nº 75/2009 do Conselho Nacional de Justiça que,
ao dispor sobre os concursos públicos para ingresso na carreira da magistratura em todos
os ramos do Poder Judiciário nacional, estabelece, em seu art. 60, que o exame
psicotécnico pode ser realizado por médico psiquiatra ou psicólogo. Veja-se (grifos nossos):
Art. 60. O candidato, no ato de apresentação da inscrição definitiva, receberá, da secretaria
do concurso, instruções para submeter-se aos exames de saúde e psicotécnico, por ele
próprio custeados.
§ 1º Os exames de saúde destinam-se a apurar as condições de higidez física e mental do
candidato. O exame psicotécnico avaliará as condições psicológicas do candidato, devendo
ser realizado por médico psiquiatra ou por psicólogo.
§ 2º O candidato fará os exames de saúde e psicotécnico com profissional do próprio
tribunal ou por ele indicado, que encaminhará laudo à Comissão de Concurso.
§ 3º Os exames de que trata o "caput" não poderão ser realizados por profissionais que
tenham parente até o terceiro grau dentre os candidatos.

Adiante, o órgão ministerial pontua, com acerto:

Se os fisioterapeutas, em consonância com a legislação regulamentadora de sua profissão,


detêm formação que os habilita a elaborar diagnóstico físico e funcional, não há motivo para
que sua atuação no campo do exame pericial seja restringida. Tal limitação seria danosa à
própria coletividade, que seria privada de serviços prestados por profissionais qualificados
para tanto.
A legalidade da regulamentação da perícia fisioterapêutica tem respaldo, ainda, na Lei
Brasileira de Inclusão (Lei n. 13.146/2015).
Tal diploma legal previu para a avaliação da deficiência, e para o diagnóstico e intervenção
precoces, não a atuação de médico, mas sim, de equipe multiprofissional e interdisciplinar.
Confira-se:

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas.

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§ 1º A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por
equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:
I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;
II - os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;
III - a limitação no desempenho de atividades; e
IV - a restrição de participação.
§ 2º O Poder Executivo criará instrumentos para avaliação da deficiência.
Art. 18. É assegurada atenção integral à saúde da pessoa com deficiência em
todos os níveis de complexidade, por intermédio do SUS, garantido acesso
universal e igualitário.
(…)
§ 4º As ações e os serviços de saúde pública destinados à pessoa com deficiência devem
assegurar: comunidades, inclusive na zona rural.
2.Os Estados Partes promoverão o desenvolvimento da capacitação inicial e continuada de
profissionais e de equipes que atuam nos serviços de habilitação e reabilitação.
3.Os Estados Partes promoverão a disponibilidade, o conhecimento e o uso de dispositivos
e tecnologias assistivas, projetados para pessoas com deficiência e relacionados com a
habilitação e a reabilitação.
Os dispositivos da Lei Brasileira de Inclusão e da Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência reforçam e necessidade de se regulamentar a perícia fisioterapêutica, uma
vez que tanto a avaliação da deficiência, como o diagnóstico e intervenção precoces,
dependerão de atuação de vários profissionais da saúde.
(...)
Por fim, registre-se que a atuação de profissionais de outras áreas do conhecimento, a
exemplo da fisioterapia, como assistentes periciais, em suas respectivas zonas de expertise,
tem sido aceita na seara trabalhista, conforme se depreende dos entendimentos a seguir
colacionados:

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/14. ACIDENTE


DE TRABALHO. NEXO DE CAUSALIDADE. LAUDO PERICIAL ELABORADO POR
FISIOTERAPEUTA.
VALIDADE.
A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de reconhecer a validade do laudo
pericial elaborado por profissional de fisioterapia, desde que seja comprovadamente
detentor do conhecimento necessário, conforme revelado no acórdão regional. Precedentes.
Incidência do art. 896, § 7º, da
CLT. Recurso de revista de que não se conhece. (RR - 1045- 54.2015.5.06.0282 , Relator
Ministro: Walmir Oliveira da Costa Data de Julgamento: 15/08/2018, 1ª Turma, Data de
Publicação: DEJT 17/08/2018)

VALIDADE. É válido o laudo pericial elaborado por fisioterapeuta para estabelecer o nexo
de causalidade entre o quadro patológico e a atividade laboral, bem assim a extensão do
dano, desde que precedido de diagnóstico médico.

Súmula n. 19 do TRT 13 - PROFISSIONAL FISIOTERAPEUTA. REALIZAÇÃO DE


PERÍCIAS JUDICIAIS. POSSIBILIDADE. Resguardadas as atividades próprias e específicas
do médico, como a de diagnosticar doenças, o profissional fisioterapeuta pode realizar
perícias judiciais, com os seguintes objetivos: a) estabelecer se existe relação de causa e
efeito entre o trabalho na empresa reclamada e o acometimento ou
agravamento da doença do trabalhador, previamente diagnosticada; e/ou b) indicar o grau
de capacidade ou incapacidade funcional, com vistas a apontar competências ou
incompetências laborais (transitórias ou definitivas), mudanças ou adaptações nas
funcionalidades (transitórias ou definitivas) e seus efeitos no desempenho laboral.

Súmula n. 6 do TRT 19: LAUDO PERICIAL. DOENÇA OCUPACIONAL. ELABORAÇÃO


POR FISIOTERAPEUTA. VALIDADE. Não há óbice a que o fisioterapeuta, devidamente
registrado no conselho de classe, atuando como auxiliar do Juízo, examine as condições

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fáticas em que prestado o trabalho, de modo a identificar possível nexo de causalidade,
desde que seja diagnosticada a enfermidade por documentação médica.
Tais razões evidenciam não só a relevância do trabalho exercido por profissionais de outras
áreas da saúde, como fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, mas, sobretudo, que o
dispositivo questionado pelo Coffito cria restrição não prevista na legislação, merecendo,
assim, procedência o pedido de anulação formulado na inicial".

De efeito, os Conselhos Reguladores, como no caso do Conselho Federal de


Medicina, em obediência a legislação de regência, no regular exercício do poder
regulamentar, devem pautar a atuação normativa na edição de atos gerais para
complementar leis e permitir sua efetiva aplicação.

Nada obstante, por possuir natureza secundária, tal poder deve ser exercido
à luz de lei preexistente, sendo vedado, portanto, inovações na ordem jurídica.

No caso dos autos, no ponto que a Resolução CFM 2.297/2021 195/2017


veda “ao médico realizar perícia médica na presença de assistente técnico não médico
(...)”, é forçoso concluir que tal restrição foi editada em descompasso com os limites
impostos pela Lei 3.268/1.957.

Nesse contexto, 'não havendo qualquer comprovação acerca da existência de


limitação técnica atribuída ao fisioterapeuta que realizou a perícia não há de se considerar
a possibilidade de nulidade da prova produzida. Ademais, nenhum dos dispositivos legais
e jurisprudenciais veda a elaboração de laudo pericial por fisioterapeuta" (TST AG
136284.2014.50601-21 11/09/2020).

Daí emerge, pois, a ilegitimidade deste preceito regulamentar, que


inequivocamente impôs limitações não autorizadas pela regra legal.

Tais as razões, JULGO PROCEDENTE os pedidos deduzidos na peça de


ingresso, nos termos do art. 487, I, do CPC, para declarar a nulidade do artigo 14, §2º da
Resolução CFM nº 2.297, de 18 de agosto de 2021, afastando, assim, normativa
que impeça o profissional fisioterapeuta de participação como assistente técnico, nos
atos periciais em que profissionais médicos forem nomeados peritos do Juízo ou mesmo
em processos administrativos.

Custas em ressarcimento pelo Réu, que fica condenado, ainda, ao


pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, devidamente
corrigidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça
Federal, desde o ajuizamento da ação até o efetivo pagamento.

Intimem-se.

Sentença sujeita ao reexame obrigatório.

Brasília, data da assinatura.

(assinado eletronicamente)

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