Hebreus a caminhada de fé (10:19—13:25)
Peregrinos Fiéis
(11:13–16)
Nos versículos 13 a 16, desenha-se um retra-
to contendo os traços da pessoa que verdadeira-
mente anda pela fé. Esse andar vai além de um
compromisso com um estilo de vida; é um modo
de viver que resulta numa jornada por fé até o fim
da vida.
“ESTES MORRERAM NA FÉ”
(11:13a, b)
Todos estes morreram na fé, sem ter ob-
13a, b
tido as promessas.
Os indivíduos citados neste contexto “morre-
ram na fé, sem ter obtido as promessas”. Este ver-
sículo especifica que eles morreram “na [kata÷ ,
kata, que significa ‘de acordo com’] fé”, o que é
uma expressão diferente de “por fé”. Eles não re-
ceberam as promessas de Deus, mas todos eles
estavam vivendo “por fé” quando morreram “na
fé”1.
Os indivíduos piedosos citados nos versículos
4 a 11 são classificados com outros que – “vendo
[as promessas], porém, de longe” – mantiveram a
fé até o fim. Não poderia se tratar de uma visão
física; mas a ideia é de que a fé deles nas promes-
sas foi tão forte que o céu tornou-se real para eles.
Pense no que Jesus disse em João 8:56: “Abraão,
vosso pai, alegrou-se por ver o meu dia, viu-o e
regozijou-se”. Quem dera tivéssemos essa fé!
“Estes” é uma referência a Abraão, Sara, Isa-
que e Jacó, bem como a Noé e Abel – mas não a
1 
F. F. Bruce destacou que a mudança do uso anterior
de pistei para kata pistin foi feita “simplesmente por conta
da variação literária” (F. F. Bruce, The Epistle to the Hebrews,
The New International Commentary on the New Testament.
Grand Rapids, Mich.: Wm. B. Eerdmans Publishing Co.,
1964, p. 302, n. 113).
Enoque, visto que ele não morreu. Cada um deles
morreu na fé sem receber as promessas de Deus
na forma de cumprimento. Apesar disso, viver e
morrer na fé produz a bênção mais maravilhosa
que podemos ter.
ELES SAUDARAM AS PROMESSAS
“DE LONGE” (11:13c)
Porém, de longe, e saudando-as.
13c
Pela fé viram as promessas de longe. Alexan-
der Nairne comparou os patriarcas a “nômades a
caminho de uma cidade atravessando o deserto,
os quais avistaram suas torres de longe, mas não
puderam alcançá-la na caminhada daquele dia;
saudaram a vista, mas acamparam mais uma vez
longe”2. Abraão e Jacó disseram que eram mera-
mente “estrangeiros e peregrinos sobre a terra”
(v. 14; Gênesis 23:4; 47:9). “Os que falam desse
modo” (v. 14) (admitindo que este mundo não é o
lar deles) são os que falam continuamente de seu
lar eterno no céu.
As promessas que Deus fez a esses peregrinos
incluíam mais do que bênçãos temporais como
filhos e terra, ou até que Ele seria o Deus deles.
Havia bênçãos espirituais adicionais. Através do
descendente de Abraão, todas as nações seriam
abençoadas (Gênesis 12:3; 22:18). Gálatas 3:16
explica que este “descendente” é Cristo. Abraão
foi assim o pai de duas famílias – uma de carne e
outra de fé. Todo filho de Deus em Cristo é ago-
ra um filho de Abraão no espírito da fé (Gálatas
3:26–29).
Jesus comentou sobre a fé de Abraão, dizen-
Alexander Nairne, The Epistle of Priesthood. Edinburgh:
2 
T. & T. Clark, 1913, p. 396.
1
do que o patriarca viu o Seu dia e alegrou-se com
esse fato (João 8:56–58). Se tivéssemos a atitude
de Abraão para com este mundo, suas ilusões não
nos atrairiam como costumam atrair.
“ERAM ESTRANGEIROS E PREREGRINOS”
(11:13d)
E confessando que eram estrangeiros e pere-
13d
grinos sobre a terra.
Abraão e outros confessaram que eram “es-
trangeiros e peregrinos” (v. 13d). Abraão reco-
nheceu isto próximo ao fim de sua vida (Gênesis
23:4). Ele jamais esteve em casa em Canaã. Jacó
proferiu as mesmas palavras a Faraó em Gênesis
47:9. O uso da mesma linguagem sugere que era
uma expressão comum que os patriarcas usaram
como parte de seu discurso diário. Também deve-
ria ser assim conosco!
Ser um estrangeiro e não ter direitos deve ter
sido difícil para um chefe de clã no deserto como
Abraão, embora ele tenha conseguido bons rela-
cionamentos com o rei Abimeleque (Gênesis 20 e
21). A fé de Abraão tornou-o disposto a seguir em
frente até a presença de Deus no céu.
ELES ASPIRAVAM A “UMA PÁTRIA”
(11:14–16)
Porque os que falam desse modo manifestam
14
estar procurando uma pátria. 15E, se, na verdade,
se lembrassem daquela de onde saíram, teriam
oportunidade de voltar. 16Mas, agora, aspiram
a uma pátria superior, isto é, celestial. Por isso,
Deus não Se envergonha deles, de ser chamado
o seu Deus, porquanto lhes preparou uma cida-
de.
Os patriarcas procuravam “uma pátria”
(patri֧, patris), ou uma terra natal (v. 14). Con-
sequentemente, seguiram Deus aonde Ele os
guiasse. Todos eles “aspira[vam] por uma pátria
superior” (v. 16), uma pátria celestial que fosse
deles (v. 14). Não tinham terra natal, pois parti-
ram de Ur para sempre. Sempre mantinham valo-
res eternos em suas mentes.
Deus tinha orgulho desses patriarcas fiéis que
procuravam em primeiro lugar coisas espirituais,
e Ele “não Se envergonha[va] de ser chamado o
Deus deles” (v. 16; veja Êxodo 3:6). Isto se aplica
até a Jacó, que inicialmente foi fraco3. As palavras
Deus às vezes é chamado “O Deus de Jacó” no Antigo
3 
2
do versículo 16 fazem lembrar Hebreus 2:11 e 12
e a citação de Salmos 22:22, que se aplica a Jesus
chamar Seus discípulos de “irmãos”. Os patriar-
cas, assim como Paulo séculos depois, estavam
dispostos a sofrer a perda de todas as coisas para
obter uma recompensa celestial (veja Filipenses
3:8). Eles não entenderam como Cristo morreria
sendo o sacrifício perfeito que lhes traria salva-
ção, mas criam nas promessas de Deus.
Nessa terra que foi prometida, eles criam
que encontrariam uma “casa não feita por mãos”
(2 Coríntios 5:1). Concentraram-se em Deus, se-
guindo o Seu chamado e não ficaram pensando
na pátria que deixaram para trás (v. 15). Como
nós deveríamos ansiar pelo céu, se nos lembrás-
semos mais dele, em vez de dedicar tanto tempo
às coisas terrenas!
O versículo 16 encerra a conversa sobre a pá-
tria celestial, a pátria que Abraão e sua família
verdadeiramente aguardavam. Eles não conside-
ravam Ur nem Canaã o seu lar. A esperança deles
na pátria celestial livrou-os do desespero quan-
do, por fim, reconheceram que o cumprimento da
cidade esperada não aconteceria nesta vida. “O
autor confirma esta esperança celestial como uma
base para a perseverança e não para o conformis-
mo com a vida terrena.”4
PREGANDO SOBRE HEBREUS
ESTRANGEIROS E PEREGRINOS (11:13)
Ser um estrangeiro muitas vezes significa ser
banido da sociedade. Como cristãos, seremos as-
sim (veja 1 Pedro 1:1; 2:11) e experimentaremos
a animosidade do mundo. Espere mesmo por
isso! É melhor acostumar-se cada vez mais com
a ideia. Por quê? Porque nada temos em comum
com o mundo, com sua vulgaridade, menospre-
zo a Deus, profanação e blasfêmia contra o Seu
nome e Sua vontade. Fomos chamados para fora
do mundo e devemos viver diariamente com esse
fato em mente (João 15:19; 17:14, 16). Os patriar-
cas antigos andaram de um lugar para outro. Os
inimigos atacaram seus poços e eles nunca tive-
ram realmente um lugar que fosse propriedade
deles. Sentir-se fora de lugar numa terra que per-
Testamento.
4 
Craig R. Koester, Hebrews: A New Translation with In-
troduction and Commentary, The Anchor Bible, vol. 36. Nova
York: Doubleday, 2001, p. 498.
tence a outros seria incômodo para a maioria das
pessoas. Mesmo na terra prometida, os patriarcas
falavam de si como “peregrinos” (Gênesis 23:4;
28:4; 47:9). Como precisamos pensar e falar de nós
mesmos dessa maneira! Isto nos faria focar mais
em ser “cidadãos dos céus”.
Ser um indivíduo sem pátria é considerado
pela maioria das pessoas uma tragédia. Os re-
quisitos de passaporte, visto e todos os outros
procedimentos relativos a viagem, emigração e
imigração são impossíveis sem uma cidadania. O
cristão enfrenta exatamente essa situação. A ati-
tude dos primeiros cristãos foi bem descrita num
documento datado do segundo ou terceiro século
da era cristã:
Eles habitam por um tempo em sua terra natal,
mas somente como peregrinos; cumprem em
tudo a sua parcela como cidadãos e suportam to-
das as tribulações como estrangeiros. Todo país
estrangeiro é, para eles, uma pátria e toda pátria,
estrangeira.5
Este paradoxo deveria ser o sentimento e a vi-
são de um santo. Paulo pôde apelar a César para
defender seus direitos de cidadão romano (Atos
25:10), mas, evidentemente, ele nada fez para ma-
nipular algum voto do Senado. Ele já era ativo
antes de sua conversão, numa espécie de esforço
político para eliminar a nova “seita” dos cristãos.
Segundo o parecer de Paulo, a “seita” dos cristãos
era tão destituída de lei e ordem, que ele obteve
autorização legal para prender cristãos, onde quer
que achasse judeus convertidos. Ele os castigava
severamente até a morte (Atos 22:4; 26:10).
TODOS ESTES MORRERAM NA FÉ (11:13)
Os que morrem no Senhor são os mais aben-
çoados (Apocalipse 14:13). A morte contém um
aspecto de finalização terrível para a maioria de
nós; temos medo de deixar nossos amados, talvez
para sempre e tememos o que virá após a mor-
te. Sabemos que nossos corpos físicos, aos quais
somos tão apegados, se desintegrarão; e sabemos
que a Bíblia ensina que viveremos em corpos
espirituais. Nossa fé triunfa em vitória sobre a
morte para nos transformar em verdadeiros ven-
cedores. “Fé é a vitória!” Ela vence o mundo por
nós (1 João 5:4) A palavra “vitória” vem de ni√koß
5 
A Epístola de Mathetes a Diognetus 5:5. “Mathetes” pode
não ser um nome próprio e significar, simplesmente, “um
discípulo”.
(nikos), que deu origem à famosa marca “Nike”.
As tribulações da vida são vencidas pela fé. Na
morte finalmente veremos o que é mais maravi-
lhoso; então essas coisas serão mais claras do que
eram quando iluminadas pela própria fé.
A FASCINAÇÃO DE VIAJAR PARA CASA
(11:13–16)
Quase todo viajante, um dia, acaba se cansan-
do de peregrinar e busca um lar onde possa viver
pelo resto de seus dias. Todos nós devemos procu-
rar por uma “pátria”. Muitos que se mudam para
cidades grandes em busca de trabalho ou fortuna
acabam se aposentando e voltando para a terra
natal. Se os patriarcas estivessem procurando um
lar terreno, certamente teriam retornado a Ur ou
até ao Egito, como fez Abraão por um breve pe-
ríodo. Todavia, eles sabiam que as promessas de
Deus dependiam de seguirem os requisitos deter-
minados por Ele, por isso não tinham a intenção
de retornar.
Quantas vezes falamos de nossas infâncias
felizes e queremos voltar para casa! Obviamente,
nunca poderemos fazer isso. Uma vez que parti-
mos, aquele lugar já não é o mesmo. Os patriar-
cas deram pouca atenção aos seus lares terrenos,
particularmente ao país que haviam deixado
(v. 15). O lar deles – e o nosso – nos aguarda no
céu. Aqueles que fazem do céu o seu alvo não se
preocupam demais com o céu, a ponto de não fa-
zer nada de bom na terra; pelo contrário, eles são
os que têm maior probabilidade de fazer o bem
na terra. São pessoas valiosas em toda comunida-
de, pois suas prioridades estão bem ordenadas.
Deus teve orgulho dos patriarcas e não se enver-
gonhava de ser o Deus deles (Êxodo 3:6). Ele é o
seu Deus? Ele tem motivos para Se envergonhar
de você?
Eu estava todo feliz na minha adolescência,
quando meu pai começou a falar em voltar para
sua terra natal em Arkansas. Ele partira dali em
busca de trabalho quando eu tinha quase dois
anos de idade. Na minha juventude, fazíamos rá-
pidas visitas àquele lugar, sempre que podíamos.
Na época em que se aposentou, meu pai já estava
adaptado a viver no norte do país, com o clima
frio e a neve, mas ele ainda gostava muito de re-
visitar seu estado natal.
Será que o contentamento com esta vida tem
nos deixado menos ansiosos por ver o nosso lar
celestial? Eu realmente gosto muito do lugar onde
3
moro atualmente, mas minha verdadeira alegria
está na minha família – minha esposa, meus fi-
lhos e netos. Sem eles, o lar não seria lar. Toda-
via, à medida que a idade avança, olho cada vez
mais para o céu. Quando vamos envelhecendo e
ficando mais frágeis fisicamente, admitimos mais
plenamente como será maravilhoso o céu.
O que faz o desejo de ir para o céu aumen-
tar? É a capacidade de vermos, pela fé, como as
coisas celestiais são muito mais valiosas do que
as temporárias. Como os patriarcas, “desejamos
uma pátria superior”, a pátria eterna. Pela fé po-
demos entender a superioridade do céu sobre o
que vemos, o que nos compele a ansiar pelo lar
celestial.
Nem Abraão nem algum outro patriarca re-
cebeu o cumprimento de todas as promessas de
Deus nesta vida. Eles “morreram na fé”, sem re-
ceber as promessas, porém viram e saudaram, de
longe, essas promessas (v. 13).
NÃO SE ENVERGONHA DE NÓS (11:16)
Os israelitas se orgulhavam por saber que
Deus não Se envergonhava de os chamarem Seu
povo e que Deus podia corretamente ser chama-
do o “Deus deles”. Todavia, séculos depois, eles
deveriam se envergonhar por recusarem ter fé no
Filho de Deus. Seus amigos e colegas de traba-
lho o deixam envergonhado por pertencer a Deus
publicamente? Pensar que nosso Senhor está dis-
posto a se relacionar conosco deveria arrepiar as
nossas almas. Nós também devemos estar dispos-
tos a nos relacionar com Ele. Fale aos outros de
Jesus sempre que puder. Não permita que o medo
do ostracismo ou da crítica amorteça o seu entu-
siasmo por Cristo.

Autor: Martel Pace

© A Verdade para Hoje, 2016
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