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DIREITO CIVIL – DIREITO DAS COISAS

- Da Posse -
Prof. Me. Antônio José Resende1

UNIDADE I – INTRODUÇÃO

1.1 – Conceito e Considerações Gerais sobre o Direito das Coisas

A matéria sobre o direito das coisas, ou direitos reais, está disposta na Parte
Especial, Livro III, e abrange do art. 1.196 ao art. 1.510 do Código Civil (Lei nº 10.406,
de 10 de janeiro de 2002).
Para o estudo deste conteúdo, serão consultados também os artigos 920 a 981
do CPC, (NCPC, art. 554 – 568) para análise da proteção e tutela dos direitos
possessórios e dos reais.
Há, ainda hoje, ampla discussão na doutrina pátria sobre a nomenclatura mais
adequada para nomear o objeto do direito positivado nesta parte do Código Civil, se a
denominação mais pertinente seria “direito das coisas” ou “direitos reais”.
Os civilistas nacionais empregam ambas as expressões, “Direitos das Coisas” e
“Direitos Reais”. Lafayette Rodrigues PEREIRA denominou sua obra Direito das
Coisas, embora não ressalte a distinção entre as expressões, enquanto autores mais
recentes como Caio Mário da Silva PEREIRA, em Instituições de Direito Civil, volume
IV – Direitos Reais, e Orlando GOMES, preferem “Direitos Reais”.
O legislador ao elaborar o Código Civil de 2002 optou por utilizar a denominação
“Direito das Coisas” para o Título do Livro III, que abrange o Título I, “Da Posse” e os
Títulos II ao X, que tratam do direito de propriedade e dos direitos reais limitados,

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Mestre em Filosofia pela UFMG (1999), Advogado e Professor na PUC-GOIAS, FANAP e Instituto
Santa Cruz. Advoga na Área Civil. Especialista em Direito Civil e Processo Civil – PROORDEM/ESA,
Goiânia – GO (Curso em andamento, 2014/2015). Cursou Atualização em Direito Processual Civil
(Centro Educacional de Extensão, Goiânia – GO). Especialista em “O Pensamento Dialético” pela UCG.
Especialista em Filosofia Contemporânea pela UFG. Bacharel em Direito pela PUCGOIAS. Licenciado e
Bacharel em Filosofia pela UFG. Lecionou Filosofia por mais de 25 anos, especialmente Filosofia
moderna e ética. Lecionou na Universidade Federal de Goiás – UFG, como professor substituto (1990) e
na Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO (2002 - 2006). Atualmente leciona as Disciplinas:
Direito Civil e Direito Constitucional. Áreas de interesse: Direito Constitucional e Direito Civil, com
ênfase em obrigações, direitos reais e sucessão. Contatos: Cel. (62) 81510162 E-Mail:
ajresende@yahoo.com.br
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relativos à propriedade. Ressalte-se que o Título II denomina-se “Direitos Reais”, que


apresenta o rol dos direitos reais, excetuando-se o da posse.
Portanto, a denominação “Direito das Coisas” abrange tanto a normatização dos
direitos reais listados no art. 1.225 do Código, quanto à disciplina sobre a posse, arts.
1.196 a 1.224, CC de 2002.
Segundo a clássica definição de Clóvis Bevilácqua, apud Carlos Roberto
Gonçalves (2010: 19), direito das coisas “é o complexo de normas reguladoras das
relações jurídicas referentes às coisas susceptíveis de apropriação pelo homem. Tais
coisas são, ordinariamente, do mundo físico, porque sobre elas é que é possível
exercer o poder de domínio”.
Trata-se do direito real pleno, isto é, da propriedade, tendo por objeto coisa
móvel ou imóvel corpórea, do próprio titular; e dos direitos reais limitados, incidentes
sobre coisa alheia (Código Civil, Livro III).
A doutrina civilista, regra geral, considera que coisa é gênero do qual bem é
espécie. Coisa é tudo aquilo que existe objetivamente, com exclusão do ser humano. O
CC português, art. 202, explicita: “Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objeto de
relações jurídicas”. O CC alemão, art. § 90, e o grego, art. 999, afirmam que, coisas
são bens corpóreos que existem no mundo físico e hão de ser tangíveis pelo homem.
Os bens podem ser corpóreos ou materiais e incorpóreos, tais como, a
propriedade científica, a literária e a artística.

1.2 – Evolução histórica

 Origem do direito civil romano: jus civile, jus gentium e jus naturale.
 Direito comparado do mundo ocidental.
 Surgimento do Estado moderno: racionalização dos direitos fundamentais,
incluindo o de propriedade, como matriz dos direitos reais.
 Nas Revoluções liberais, século XVIII, o direito de propriedade é defendido como
direito de todos.
 Desenvolve-se, inicialmente, o aspecto individualista da propriedade (Direito a
propriedade: CF, art. 5º, caput e XXII e art. 170, II; CC, art. 1.228, caput).
 Com a preponderância, posteriormente, do direito coletivo sobre o individual,
surge uma concepção de função social da propriedade (CF/1988, art. 5º, XXIII e
art. 170, III; CC, art. 1.228, §1º).

1.3 – Conteúdo e classificação

O Código Civil divide a matéria em duas partes: posse e direitos reais.


Os direitos reais, por sua vez, se dividem em:
a) direito de propriedade, enquanto direito real pleno;
b) direito real de aquisição: o direito do promitente comprador do imóvel;
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c) e direitos reais sobre coisas alheias.


O objeto do Livro III consiste nos poderes que se exercem diretamente sobre a
coisa: a) a posse, disciplinada nos arts. 1.196 a 1.224; b) e os direitos reais (numerus
clausus), encontram-se nos arts. 1.225 a 1.510.
O rol dos direitos reais encontra-se no art. 1.225 do CC/2002.
Os direitos reais sobre coisas alheias são:
i) direitos reais de gozo ou fruição sobre coisa alheia, quais sejam: superfície,
servidões, usufruto, uso, habitação;
ii) direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e anticrese.

1.4 – Distinção entre direito real e direito pessoal

Direito real (jus in re): poder jurídico, direto e imediato, do titular sobre a coisa, com
exclusividade e contra todos (erga omnes).
Elementos essenciais: suj. ativo, coisa, relação de poder do suj. ativo sobre a coisa,
chamado domínio, e o suj. passivo que é, em tese, toda a coletividade (universal),
sendo determinado quando denominado ou especificado.

Direito pessoal (jus ad rem): relação jurídica pela qual o suj. ativo pode exigir do suj.
passivo determinada prestação (obrigação).
Elementos essenciais: suj. ativo (credor), suj. passivo (devedor) e a prestação.

Teorias:
a) A teoria unitária realista procura unificar os direitos reais e obrigacionais a
partir do critério do patrimônio, ao considerar que o direito das coisas e o direito
das obrigações fazem parte de uma realidade mais ampla, que é o direito
patrimonial;
b) Conforme a teoria dualista ou clássica, o direito real apresenta características
próprias, que o distinguem dos direitos pessoais. Considera-se mais adequada à
nossa realidade esta teoria.
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DIREITOS REAIS DIREITOS


OBRIGACIONAIS

a) Quanto ao sujeito Há somente sujeito ativo Sujeito determinado ou


(proprietário). Sujeito determinável.
passivo é toda a Sujeito ativo = credor.
comunidade. Oponibilidade
erga omnes. Sujeito passivo = devedor
(solvens).

b) Quanto ao objeto Incidem sobre uma coisa Exigem o cumprimento de


(res). Objeto de determinada prestação.
propriedade. Objeto: Uma obrigação de dar,
material e intelectual, por fazer ou não fazer.
ex., autoria, marca etc.
Há direito de sequela, ex.
art. 1.228, CC.

c) Quanto à duração São perpétuos, não se São transitórios e se


extinguem pelo não uso, extinguem pelo
exceto os casos previstos cumprimento ou por
em lei. Ex.: desapropriação, outros meios, ex. morte.
usucapião etc.
Propriedade: plena e
exclusiva (art. 1.231,
CC/2002).

d) Quanto à Só podem ser criados pela Resultam da vontade das


formação lei, sendo seu número partes, sendo ilimitado o
limitado e regulado por esta número de contratos
(numerus clausus), vide art. inonimados (numerus
1. 225, CC/2002. apertus). Pode resultar
também da lei.

e) Quanto ao São exercidos diretamente Exige uma figura


exercício sobre a coisa, sem intermediária, que é o
necessidade de existência devedor.
de um sujeito passivo.

f) Quanto à ação Pode ser exercida contra A ação pessoal é dirigida


quem quer que detenha a somente contra quem
coisa. figura na relação jurídica
como sujeito passivo.
Oponibilidade intra partes.
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1.5 – Obrigação propter rem: é a que recai sobre uma pessoa, por força de
determinado direito real. Só existe em razão da situação jurídica do obrigado, de titular
do domínio ou de detentor de determinada coisa (Vide art. 1.277, CC/2002).
Exemplos:
1) obrigação imposta aos proprietários e inquilinos de um prédio de não prejudicarem a
segurança, o sossego e a saúde dos vizinhos (CC, art. 1.277);
2) pagamento de despesas de condomínio;
3) a obrigação de o proprietário de um imóvel de indenizar o terceiro que, de boa-fé,
realizou benfeitorias sobre o mesmo etc.

Outras formas de obrigações relativas aos direitos reais:

a) Obrigações de ônus real: penhor, hipoteca e anticrese.

b) Obrigações com eficácia real. Por exemplo: Contrato de locação firmado entre as
partes gera obrigação. Terá eficácia real quando for feita a averbação do contrato no
Cartório de Registro de Imóveis. Ver art. 8º, da Lei nº 8.245/1991; Ver também art. 33,
da mesma Lei, sobre direito de preferência do locatário, no caso da venda do imóvel.

UNIDADE II – POSSE

2.1 – Origem histórica

 A noção de posse tem origem no direito romano.


 Tutela da situação de fato originada pela posse, como reflexo da necessidade de
evitar a violência e promover a defesa da paz social.
 Teoria de Niebuhr, adotada por Savigny: fruição das possessiones (pequenas
propriedades), para a defesa das quais aplicava o interdito possessório. A
reivindicatio era restrita ao titular da propriedade.
 Teoria de Ihering: a posse surgiu do processo reivindicatório, segundo o qual os
interditos possessórios constituíam incidentes preliminares do processo
reivindicatório.

2.2 – Conceito de posse


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O conceito de posse, no direito positivo brasileiro, deve ser compreendido a


partir do art. 1.196 do Código Civil, que considera possuidor “todo aquele que tem de
fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”.
Note-se que a noção de posse é dada a partir da definição de propriedade
apresentada no art. 1.228 do Código.
O conceito de posse torna-se inteligível a partir da noção de possuidor
apresentada no art. 1.196. Portanto, pode-se dizer que posse é o exercício de fato,
pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.
Neste sentido, o exercício da posse não implica que o possuidor seja detentor
do domínio ou da titularidade da coisa. É possível que outras pessoas exerçam sobre a
coisa, um ou alguns dos poderes típicos do proprietário, conforme a previsão do art.
1.228 do Código, sem, no entanto, ser titular desse direito.
Por exemplo, o locatário e o comodatário exercem de fato alguns poderes
inerentes ao proprietário, sem, no entanto, estabelecer com a coisa o vínculo de
propriedade.
Para Ihering, cuja teoria o nosso direito positivo acolheu, posse é conduta de
dono. Sempre que haja o exercício dos poderes de fato inerentes à propriedadeexiste a
posse, a não ser que alguma norma diga que esse exercício configura a detenção e
não posse (Vide arts. 1.198 e 1.208, CC/2002).
 Posse = assegurar o exercício de fato sobre a coisa;
 Evitar a violência e assegurar a paz social;
 Situação de fato que aparenta ser de direito; situação de fato protegida pelo
legislador; direito fundado no fato da posse (possideo quod possideo);
 Proteção contra terceiros (que não possua título ou a melhor posse) e até
mesmo contra o proprietário.
O nosso ordenamento adota a seguinte distinção com relação à noção de posse:
a) Jus possessionis ou posse autônoma: Se alguém se mantem, pacificamente,
em um imóvel, por mais de um ano e dia, cria uma situação possessória, que lhe
proporciona direito à proteção.
b) Jus possidendi ou posse causal: que é a posse titulada. Em ambos os casos, é
assegurado o direito à proteção dessa situação contra atos de violência, para
garantir a paz social.

2.3 – Teorias sobre a posse


Há duas teorias principais sobre a natureza da caracterização da posse, cujas
denominações comumente atribuídas são: teoria subjetiva e a teoria objetiva.

a) TEORIA DE SAVIGNY, denominada pela doutrina “TEORIA SUBJETIVA”, em


Tratado da Posse (Das Rechtdes Besitzes, 1893), afirma o autor que a posse se
constitui de dois elementos:
 Corpus – elemento objetivo que consiste na detenção física da coisa;
“Faculdade real e imediata de dispor fisicamente da coisa, e de defendê-la das
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agressões de quem quer que seja” (Savigny apud Caio Mário da Silva Pereira,
2007: 18).
 Animus – elemento subjetivo, que significa a intenção de ser dono da coisa e
de defendê-la contra a intervenção de outrem (animus domini ou animus REM
sibi habendi). Se não ocorrerem os dois elementos, há, neste caso, mera
detenção.

b) TEORIA DE RUDOLF von IHERING, também denominada “TEORIA


OBJETIVA”, em Teoria Simplificada da Posse, preleciona que o animus já está
contido no corpus, que significa conduta de dono. Esta pode ser analisada
objetivamente, sem a necessidade de verificar a intenção do agente. A posse
consiste na exteriorização da propriedade, na visibilidade do domínio e no uso
econômico da coisa. O CC brasileiro adotou essa teoria (art. 1.196).
Para Savigny, o locatário, o usufrutuário, o arrendatário e o comodatário são
detentores e não possuidores, por isso não têm direito às ações possessórias. Para
Ihering, ao contrário, os mesmos são possuidores (posse direta) e podem utilizar as
ações possessórias.

Desdobramento da posse

Propriedade (Posse plena ou alodial) Posse


Posse indireta Posse direta

Usar, gozar, dispor e reaver Usar e gozar

2.4 – Natureza jurídica da posse

Para Savigny, posse é fato e direito. “Os direitos são os interesses juridicamente
protegidos”. Conforme Ihering, a posse corresponde a um direito. Clóvis Bevilacqua
assinala que a posse é um fato protegido pelo direito, nesse sentido, a posse é um
direito especial (sui generis).
Caráter duplo da posse: considerada em si é um fato; pelos direitos que gera,
entra na esfera do direito.
 Efeito jurídico: as ações reais, por ex., exigem presença do cônjuge na relação
processual concernente ao bem imóvel, outorga uxória ou marital (CPC, art. 10;
NCPC, art. 73).
 A posse não entra no rol taxativo do art. 1.225 do CC/2002.
 Direitos pessoais incorpóreos – utilizam-se as cautelares inominadas. Poder
cautelar geral do juiz (CPC, art. 798; NCPC, art. 297).
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Distinção entre Posse e detenção


O ordenamento jurídico pátrio prevê situações em que uma pessoa não é
considerada possuidora, mesmo exercendo poderes de fato sobre uma coisa. Isto
ocorre quando a lei desqualifica a relação para mera detenção, como previsto nos
artigos 1.198, 1.208 e 1.224, CC/2002.
Portanto, o detentor é distinto do possuidor.
 Somente a posse gera efeitos jurídicos.
 O possuidor exerce o poder de fato em razão de um interesse próprio; o
detentor, no interesse de outrem.
 O detentor, como consequência do dever de vigilância, embora não possa
invocar, em seu nome, a proteção possessória, cabe-lhes, contudo, exercer a
autoproteção do possuidor, quanto às coisas confiadas ao seu cuidado.

Quase posse
Os romanos só consideravam posse a emanada do direito de propriedade. A
exercida nos termos de qualquer direito real menor (iura in re aliena), ou direitos reais
sobre coisas alheias, servidão e usufruto, por ex., eram denominados quase posse, por
ser aplicada aos direitos ou coisas incorpóreas. No direito atual tais situações são
consideradas posse propriamente dita.

Composse
É a situação pela qual duas ou mais pessoas exercem, simultaneamente,
poderes possessórios sobre a mesma coisa (CC, art. 1.199). A composse pode ser:
 Pro diviso – quando exercida simultaneamente e se estabelece uma divisão de
fato entre os compossuidores, quanto a sua utilização;
 Pro indiviso– é aquela em que se exercem, ao mesmo tempo e sobre a
totalidade da coisa, os poderes de utilização ou exploração comum do bem.

2.5 – Classificação da posse

a) Posse direta e posse indireta (CC, art. 1.197)

Posse direta ou imediata: é a daquele que tem a coisa em seu poder,


temporariamente, em virtude de contrato. Por ex., a posse direta do comodatário, que a
exerce por concessão do proprietário do imóvel. O mesmo ocorre com o usufrutuário, o
arrendatário etc.;
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Posse indireta ou mediata: é a posse do proprietário que que cede o uso e gozo do
bem para um terceiro. Por ex. a do proprietário que cede a terra a outro para usufruto;
a do proprietário que empresta o imóvel para terceiro etc.
 O comodatário/proprietário exerce a posse indireta, como consequência de seu
domínio (dono).
 O comodatário exerce a posse direta por concessão do proprietário.
 Dá-se o desdobramento da posse. Uma posse não anula a outra, isto é, ambas
coexistem no tempo e no espaço e são posses jurídicas (jus possidendi) e têm o
mesmo valor, não autônomas, pois implicam o exercício de efetivo direito sobre
a coisa.
 Ambos podem invocar a proteção possessória contra terceiros.
 Não há usucapião para o possuidor direto.

b) Posse justa e posse injusta

Posse justa: Conforme estabelece o art. 1.200 do Código Civil, posse justa é a não
violenta, clandestina ou precária. É a posse adquirida legitimamente ou sem vício
jurídico externo. Ou ainda, aquela que não repugna ao direito, porque adquirida
conforme os modos previstos na lei.

Posse injusta (ou posse viciada): é a que foi adquirida viciosamente, por violência
(violenta) ou clandestinidade (clandestina) ou por abuso do precário (precária), ou seja,
por abuso de confiança.
Ainda que viciada, a posse injusta não deixa de ser posse, visto que a sua
qualificação é feita em face de determinada pessoa. Será injusta em face do legitimo
possuidor; será, porém, justa e suscetível de proteção em relação às demais pessoas
estranhas ao fato.
Nesse sentido, poderá o possuidor de posse injusta em relação ao legítimo
possuidor, propor ação possessória contra um terceiro que tente adquirir injustamente
a sua posse. Neste caso, o possuidor, mesmo que de posse injusta, tem melhor posse,
em relação ao terceiro.
Desse modo, cessada a violência (art. 1.208, CC), que caracteriza esbulho, o
esbulhador será tornado possuidor. Terá posse injusta (viciada), mas será possuidor,
para efeito da proteção possessória.
 Violência – vis absoluta = violência física. Ex. Tomar à força o objeto; expulsar
alguém do imóvel.
 Violência – vis compulsiva = violência moral.
 Clandestina – furta o objeto, ocupa o imóvel às escondidas, sorrateiramente.
 Precária – do locatário, por ex., que tinha a posse justa e passa a ser injusta se
no vencimento do contrato se recusa a devolver o imóvel ao proprietário.
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c) Posse de Boa fé e Posse de Má fé (CC, art. 1.201)

Posse de boa-fé: caracteriza-se a posse de boa-fé quando o possuidor ignora o vício,


ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.
O parág. único do art. 1.201, CC/2002, estabelece presunção de boa-fé em favor
de quem tem justo título. Justo título é o que seria hábil para transmitir o domínio e a
posse se não contivesse nenhum vício impeditivo dessa transmissão.
Caio Mário da Silva Pereira, em Instituições de Direito Civil (2007: 31), classifica
como um tipo de posse a posse com justo título.
Justo título configura-se estado de aparência que permite concluir estar o sujeito
gozando de boa posse. Não significa somente o documento, observa-se, portanto, o
fato gerador do qual a posse deriva. O possuidor tem consciência de que está
amparado numa boa causa que determina a legitimidade da posse.
Há aqui presunção juris tantum, isto é, o ato é passível de desfazer-se com
prova contrária.
Exemplos quanto à presunção do justo título:
1) A companheira tem justo título na posse de bens comuns do casal, quando do
falecimento do companheiro;
2) O herdeiro aparente cujo título e ignorância de outros herdeiros faz presumir ser ele
justo possuidor;
3) Uma escritura de compra e venda, devidamente registrada, é um título hábil para a
transmissão do imóvel. No entanto, se o vendedor não era o verdadeiro dono
(aquisição a non domino) ou se era um menor não assistido por seu representante
legal, a aquisição não se aperfeiçoa e pode ser anulada.

Posse de má-fé: a posse constitui-se de má-fé quando o possuidor tem conhecimento


do vício na aquisição da posse e, portanto, da ilegitimidade de seu direito.
 O art. 1.202, CC/2002, prescreve que a posse de boa-fé se transforma em
posse de má-fé desde o momento em que as circunstancias demonstrem que o
possuidor não mais ignora que possui indevidamente.

d) Posse nova e posse velha (Vide art. 1.211, CC)

Posse nova: é a de menos de ano e dia (Vide art. 924, CPC; NCPC, art. 558).
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 Não se confunde com a ação de força nova, que leva em conta não a duração
temporal da posse, mas o tempo decorrido desde a ocorrência da turbação ou
do esbulho.

Posse velha: é a de ano e dia ou mais.


 Neste caso, também se diferencia da ação de força velha, intentada depois de
ano e dia da turbação ou esbulho.
 Ação tempestiva, no âmbito possessório: menos de “ano e dia” – pleitear
concessão de liminar (NCPC, art. 562).
 Ação de força nova – possessória.
 Ação de força velha – procedimento ordinário/juízo petitório – somente cabe ao
proprietário.

e) Posse natural e posse civil ou jurídica

Posse natural: é a que se constitui pelo exercício de poderes de fatos sobre a coisa.

Posse civil ou jurídica: é considerada aquela que se realiza por força da lei, sem
necessidade de atos físicos ou materiais. È a que se adquire, ou se transmite pelo
título.

f) Posse ad interdicta e posse ad usucapionem

Posse ad interdicta: consiste na posse que pode ser defendida pelos interditos
possessórios ou ações possessórias, quando molestada, mas não conduz à usucapião.

Posse ad usucapionem: é a posse que se prolonga por determinado lapso de tempo


estabelecido na lei, tendo como consequência a aquisição do domínio pelo seu titular.

2.6 – Aquisição e Perda da Posse

2.6.1 – Aquisição da Posse

O art. 1.204, do Código Civil, preconiza que “adquire-se a posse desde o


momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos
poderes inerentes à propriedade”.
A posse pode ser adquirida:
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i) por quem pretenda adquiri-la ou por seu representante;


ii) por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação (art. 1.205, CC/2002).
A aquisição da posse, quanto à sua origem, pode se dar por modo originário ou
derivado. Veja-se breve explanação sobre a aquisição originária e derivada da posse.
 Aquisição originária – ocorre nos casos em que não há relação de causalidade
entre a posse atual e a anterior (não há nexo causal entre a posse atual e a
anterior). O que pode ocorrer em duas hipóteses: 1) ou a coisa não tinha dono
(porque nunca o teve – res nullius, ou porque foi abandonada – res derelicta; 2)
ou porque foi esbulhada (violenta ou clandestina), e o vício, posteriormente,
cessa (posse mansa e pacífica).
No caso da coisa sem dono, a aquisição originária da posse é elemento do
domínio, que é adquirido por ocupação. O sujeito se apodera da coisa, adquire,
por conseguinte, a posse, e ainda se torna proprietário.
 Aquisição derivada – caracteriza-se quando há anuência do antigo possuidor,
como na tradição. A transferência pode ser real (quando o possuidor atual a
entrega ao novo possuidor), simbólica (quando o que se entrega é algo que
simboliza a coisa, como as chaves de uma casa) ou por cláusula contratual (a
cláusula constituti, por meio da qual opera o constituto possessório).
Vide art. 1.203, CC, determina que a posse conserva o mesmo caráter com que
foi adquirida.

a) Modos de aquisição da posse. A posse pode ser adquirida por:

1) Apreensão da coisa. Pode ocorrer em duas hipóteses:


 Ato unilateral – realiza-se pelo exercício de um poder de fato sobre a coisa, no
interesse daquele que o exerce. Coisa sem dono ou abandonada (res derelicta=
derrelicção, que consiste no abandono voluntário da coisa) e quando a coisa não
for de ninguém (res nullius). Quanto ao ato da apreensão, para bens imóveis,
diz-se ocupação; para bens móveis, denomina-se órbita de influência.
 Quando a coisa é retirada de outrem sem a sua permissão. Aquisição da posse
por ato violento ou clandestino. Primitivo possuidor omitir-se, não reagindo
incontinenti em defesa de sua posse ou não a defendendo por meio dos
interditos possessórios.
2) Exercício de direito. Ocorre no caso da servidão, se o dono do prédio serviente
permanecer inerte. Ex.: passagem de um aqueduto por terreno alheio (art. 1.379,
CC/2002).
3) Ato bilateral. A posse é transmitida de um possuidor a outro. É o caso da tradição,
que é modo derivado de apossamento da coisa. Pressupõe o acordo de vontades.
Ocorre mediante o negócio jurídico (vide art. 104, CC/2002). Título: gratuito = doação;
oneroso = compra e venda. Pode ser: real, simbólica ou ficta, como acima descrito.
4) Sucessão na posse (arts. 1.206 e 1.207, CC), ou seja, aquisição a título universal e a
título singular. Nestes casos, a acessão da posse pode ser:
 Por sucessão universal: o herdeiro agrega a sua posse à do falecido.
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 Por sucessão singular: o possuidor pode agregar a sua posse à de seu


antecessor.

2.6.2 – Perda da Posse

A perda da posse, conforme a teoria objetiva de Jhering, adotada pelo


ordenamento jurídico pátrio, ocorre quando o possuidor deixa de agir como age o
proprietário, isto é, perde-se a posse quando não é mais possível o exercício, sobre a
coisa, de poderes inerentes ao domínio.

FÓRMULAS DA PERDA DA POSSE

FÓRMULA GERAL: posse - exercício de poder de domínio = perda da posse

FÓRMULA 1: posse - corpus (ato de proprietário) = perda da posse

FÓRMULA 2: posse - animus (vontade de agir como dono) = perda da posse

Fonte: DONIZETTI, Elpídio; QUINTELLA, Felipe. Curso didático de direito civil. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 700.

São hipóteses de perda da posse:


1) pelo abandono, ou também denominado derrelicção, que significa o abandono
voluntário da coisa.
2) pela tradição (traditio): quando o possuidor transfere voluntariamente a coisa. Pode
ocorrer de três formas:
 real: quando envolve a entrega efetiva e material da coisa;
 simbólica: quando representada por ato que traduz a alienação. Por ex.: a
entrega das chaves de acesso ao imóvel.
 ficta, que pode ser de dois modos:
traditio brevi manu = a pessoa que tem posse direta do bem em razão de
contrato celebrado com o possuidor indireto (arrendador, locador etc.) adquire o
seu domínio, não precisa devolver ao dono, para que este novamente lhe faça a
entrega real da coisa. Basta a demissão voluntária da posse indireta pelo
transmitente, para que se repute efetuada a tradição.
constituto possessório = o proprietário que aliena o imóvel, mas permanece nele
residindo por força de um contrato de locação celebrado com o adquirente,
perde a posse de dono (indireta), mas adquire, pela mencionada cláusula
constituti, a de locatário.
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3) pela perda propriamente dita da coisa. Exemplos: objeto perdido dentro de casa, não
há perda propriamente da coisa; objeto perdido na rua.
4) pela destruição da coisa ou seu desaparecimento. Pode acontecer em diversas
situações, tais como:
 Acontecimento: fato natural. Por ex.: morte de um animal por idade avançada;
caso fortuito. Ex.: animal morto atingido por um raio etc.
 Fato do próprio possuidor: por exemplo, ao provocar a perda total do veículo por
direção perigosa ou imprudente.
 Fato de terceiro: por exemplo, em ato atentatório à propriedade.
 Quando deixa a coisa de ter as qualidades essenciais à sua utilização ou a
perda do valor econômico. Exemplos: terreno invadido pelo mar; nos casos de
confusão, comistão, adjunção e avulsão.
5) pela colocação da coisa fora do comércio, porque se tornou inaproveitável ou
inalienável (extra commercium). Pode ocorrer por razões de: ordem pública,
moralidade, higiene e segurança pública. Por ex.: desapropriação de terras, confisco de
produtos alimentícios por fiscalização sanitária etc.
6) pelo esbulho, isto é, pela posse de outrem.

UNIDADE III – EFEITOS DA POSSE

3.1 – Introdução

A matéria é disciplinada do art. 1.210 ao art. 1.222 do Código Civil de 2002. A


proteção conferida ao possuidor é o principal efeito da posse.
Conforme Carlos Roberto Gonçalves (2010: 129), são precisamente os efeitos
da posse que lhe imprimem cunho jurídico e a distinguem da mera detenção. São os
principais efeitos da posse:
a) a proteção possessória, abrangendo a autodefesa e a invocação dos interditos (arts.
1.210 a 1.213, CC).
b) a percepção dos frutos (arts. 1.214 a 1.216, CC).
c) a responsabilidade pela perda ou deterioração da coisa (arts. 1.217 e 1.218, CC).
d) a indenização pelas benfeitorias e o direito de retenção (arts. 1.219 a 1.222, CC).
e) a usucapião.

3.2 – Proteção possessória (Tutela da posse)


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A proteção da posse, conforme previsão legal a seguir exposta, poderá ser


realizada pelos seguintes meios:
 com o uso da “legítima defesa” (autotutela) (para a manutenção da posse)
 por meio do “desforço imediato” (autotutela) (para retomar imediatamente a
posse perdida)
 Ação de Interdito Proibitório
 Ação de manutenção de posse
 Ação de reintegração de posse.
Explica Gonçalves, que “há uma gradação nos atos perturbadores da posse,
dando origem a três procedimentos possessórios distintos, embora com idêntica
tramitação: ameaça, turbação e esbulho” (2010: 171).
Desta forma, a proteção possessória ocorre através de Interdito Proibitório, Ação
de manutenção de posse, Ação de reintegração de posse, Legítima defesa e Desforço
imediato.
Os interditos possessórios são os meios jurídicos que tem o possuidor à sua
disposição, para a defesa de sua posse contra turbação, esbulho ou ameaça.
Desta forma, o possuidor ameaçado, turbado ou esbulhado tem a faculdade de
utilizar os interditos possessórios, ações com caráter próprio e rito especial. Tais ações
estão disciplinadas nos arts. 920 e seguintes do CPC; NCPC, art. 554 e segs.
Eis a seguir uma breve análise do art. 1.210 do Código Civil brasileiro. Objetiva–
se apresentar a forma dos interditos possessórios e seus efeitos jurídicos no âmbito da
proteção ao direito da posse.

3.2.1 – Análise do artigo 1.210 do Código Civil de 2002

PROTEÇÃO DA POSSE

A) Legítima defesa e desforço imediato (autotutela, autodefesa ou defesa direta) (art.


1.210, CC/2002).
Há, no art. 1.210, descritos três procedimentos distintos:
1) “ser mantido na posse em caso de turbação”. Nessa circunstância o possuidor pode
usar a legítima defesa (§ 1º, art. 1.210, CC-02), semelhante ao previsto no art. 25 do
CP/1940, ou, não o fazendo, deverá o possuidor, conforme a previsão processual,
propor Ação de manutenção de posse, art. 926 segs., CPC; NCPC, art. 560.
Vale ressaltar, que a previsão legal (Lei material) dá ao possuidor o direito de se
valer da autodefesa para se manter ou para reintegrar-se na posse, desde que o faça
logo e que os atos de defesa não ultrapassem o “indispensável à manutenção, ou
restituição da posse” (art. 1.210, §1º, CC/2002).
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OBSERVAÇÕES:

 Turbação é todo ato que causa dano ou embaraça o livre exercício da posse
alheia. Por ex., cortar o arame da cerca que protege a posse alheia; roubar ou
furtar coisas da posse alheia; impedir o acesso do verdadeiro possuidor à sua
posse; jogar lixo no terreno alheio etc.
 Possuidor poderá manter ou restabelecer a situação de fato “por sua própria
força” (§ 1º), isto é, pelos seus próprios recursos, sem apelar para autoridade,
polícia ou justiça;
 Os atos de defesa não podem ir além do indispensável à manutenção da posse
(§ 1º);
 Para que a defesa direta seja legítima, é necessário que: a reação se faça logo,
imediatamente após a agressão; a reação deve-se limitar ao indispensável à
retomada da posse. O excesso configura crime de “exercício arbitrário das
próprias razões”, art. 345, CP.
 Preleciona Carlos R. Gonçalves (2010: 131): “Pode o guardião da coisa exercer
a autodefesa, em benefício do possuidor ou representado. Embora não tenha o
direito de invocar, em seu nome, a proteção possessória, não se lhe recusa,
contudo, o direito de exercer a auto proteção do possuidor, conseqüência natural
de seu dever de vigilância”.

2) “restituído no de esbulho”. Para esse caso o possuidor pode empreender o desforço


imediato, ou seja, “restituir-se por sua própria força” (§ 1º, art. 1.210, CC-02). Não o
fazendo, neste caso, caberá Ação de reintegração de posse, art. 926 segs., conforme
previsão do CPC. NCPC, art. 554 e segs. Ver art. 560, NCPC.
 Esbulho “consiste no ato pelo qual o possuidor se vê privado da posse mediante
violência, clandestinidade ou abuso de confiança. Acarreta, pois, a perda da
posse contra a vontade do possuidor” (Gonçalves, 2010: 153).
 Desforço imediato consiste na faculdade que a lei dá ao possuidor retomar a
posse com o esforço próprio.
 Assim como na turbação, no esbulho o possuidor poderá retomar a sua posse
“por sua própria força”, contando que façalogo, e que os atos de defesa “não
podem ir além do indispensável” à restituição da posse (§ 1º, art. 1.210, CC-02).

3) “segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado”. Esse é o


caso da ameaça. Contra a ameaça não poderá o possuidor empregar a legítima
defesa. Deve-se impetrar Interdito Proibitório (mandado proibitório), com cominatória de
multa (pena pecuniária), caso o réu transgrida o preceito, conforme prevê o art. 932,
CPC; NCPC, arts. 567-568.
 A multa deve ser pedida pelo autor e fixada pelo juiz. O autor indica o valor da
multa pretendida, “em montante razoável, que sirva para desestimular o réu de
transgredir o veto, mas não ultrapasse, excessivamente, o valor do dano que a
transgressão acarretaria ao autor” (Gonçalves, 2010: 173). O juiz pode reduzi-la,
mas não aumentá-la.
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 Depreende-se do art. 933, CPC (NCPC, art. 568), que é concedida liminar em
interdito proibitório.
 Diz a Súmula 228 do STJ: “É inadmissível o interdito proibitório para a proteção
do direito autoral”.

B) Ações Possessórias (Heterotutela)

Para o possuidor recorrer à via judicial, os meios próprios de defesa da posse


estão previstos nos artigos 920 a 933 do CPC (NCPC, arts. 554 a 568).
As ações possessórias em sentido estrito ou também denominadas interditos
possessórios, são as seguintes:
a) Interdito proibitório, art. 932, CPC (NCPC, art. 567) (acima explicitado);
b) Ação de Manutenção de posse, art. 926/927, CPC (NCPC, art. 560/566);
c) Ação de Reintegração de posse, art. 926/927, CPC (NCPC, art. 560/566).
O procedimento nas Ações Possessórias de Imóveis de Pequeno Valor, de
Coisas Móveis e Semoventes, é de competência do Juizado Especial. Vide art. 3º, IV,
da Lei nº 9.099/1995.

Legitimação ativa e passiva para as Ações possessórias

Legitimidade ativa:
1) Exige-se a condição de possuidor para a propositura dos interditos – art. 926, CPC
(NCPC, art. 560), mesmo que não tenha título (possideo quod possideo).
2) Art. 927, CPC (NCPC, art. 561): “Incumbe ao autor provar: I- a sua posse; II- a
turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III- a data da turbação ou do esbulho; IV- a
continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na
ação de reintegração”.
3) O detentor, por não ser possuidor, não tem essa faculdade.
4) Não basta ser proprietário ou titular de outro direito real. Se somente tem o direito,
mas não a posse correspondente, o agente terá de valer-se da via petitória, não da
possessória, a não ser que se trate de sucessor de quem detinha a posse e foi
molestado. Vide art. 1.207, CC/2002.
5) “Ao sucessor a título singular é facultado unir a sua posse à do antecessor, para os
efeitos legais. Desse modo, se este tinha posse e foi esbulhado, àquele será facultado
assumir sua posição, para o fim de ajuizar a competente ação possessória contra o
terceiro.” (Gonçalves, 2010: 133).
6) O nascituro não é possuidor. Não é titular de direitos subjetivos.
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7) Possuidores diretos e indiretos têm ação possessória contra terceiros, e também um


contra o outro. Vide parte final do art. 1.197, CC-02 e Art. 932, CPC (NCPC, art. 567).

Legitimidade passiva:
1) O autor da ameaça, turbação ou esbulho (CPC, art. 927, II e 932; NCPC, art. 561, II
e art. 567), assim como do “terceiro que recebeu a coisa esbulhada, sabendo que o
era”, isto é, de má-fé, como expressamente dispõe o art. 1.212, CC-02.
2) Contra o terceiro que recebeu a coisa de boa-fé não cabe ação de reintegração de
posse, pela interpretação a contrario sensu do citado dispositivo legal.
3) Curador, pai ou tutor, responde por autoria moral, se, tendo conhecimento do ato,
não tiver recolocado as coisas no status quo ante, voluntariamente, ou por culpa in
vigilando – em caso de turbação ou esbulho praticados por pessoa privada de
discernimento ou menor incapaz de entender o valor ético da sua ação.
4) A ação pode ser proposta tanto contra o autor do ato molestador como contra quem
ordenou a sua prática. Também contra o representante legal. A este cabe se defender
com o recurso de nomeação à autoria (art. 62, CPC; NCPC, art. 339/338).
5) O herdeiro a título universal ou mortis causa (CC, art. 1.207). Para Sucessor a título
singular – vide art. 1.212, CC-02 (má-fé).
6) Pessoa jurídica de direito privado autora do ato molestador, não o seu gerente,
administrador ou diretor, se estes não agiram em nome próprio.
7) Pessoas jurídicas de direito público, contra as quais pode até ser deferida medida
liminar, desde que sejam previamente ouvidos os seus representantes legais (CPC, art.
928, parágrafo único; NCPC, art. 562, parág. único).
8) No caso de preposto – cabe nomeação à autoria. Se o demandado é simples
detentor (CC, art. 1.198), nomeia à autoria (CPC, art. 62; NCPC, art. 339); se é
possuidor direto apenas (CC, art. 1.197), denuncia da lide ao possuidor indireto (CPC,
art. 70, III; NCPC, art. 125).

Procedimento
 Ação de força nova (menos de ano e dia). Admite-se o deferimento da tutela
antecipatória (liminar), com base no art. 927, do CPC; NCPC, art. 562. O
procedimento é especial. A cognição é sumária (inaudita altera pars).
 Ação de força velha (mais de ano e dia do início da turbação ou do esbulho). O
procedimento é ordinário. Admite-se antecipação de tutela se preenchidos os
requisitos do art. 273, CPC; NCPC, art. 298.

Conversão de ação possessória em ação de indenização


 Art. 921, I (NCPC, art. 555) – ação possessória e cumulação de pedido de
indenização.
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 Perecimento ou deterioração considerável da coisa – pedido de indenização.


 Art. 462, CPC; NCPC, art. 493 – juiz deve considerar fato novo.
 Danos emergentes e lucros cessantes (CC, arts. 402/403).
 Se a perda tiver lugar depois da sentença, mas antes de sua execução, deve
aplicar-se, por analogia, o disposto no art. 627 do CPC; NCPC, art. 809.

3.3 – Considerações procedimentais acerca das ações possessórias

a) Possibilidade de concessão de liminar


A previsão processual determina que quando o procedimento de manutenção e
de reintegração de posse for ajuizado dentro de ano e dia da manutenção ou do
esbulho, é possível a concessão de liminar (CPC, art. 928; NCPC, art. 562).
Caso a ação seja ajuizada em prazo superior a esse, segue-se o rito ordinário,
não perdendo a ação, contudo, o caráter possessório.

b) Fungibilidade das ações possessórias

O princípio da fungibilidade ou da conversibilidade significa que a propositura de


uma ação possessória em vez de outra não obsta ao conhecimento, conforme
determina o art. 920, do CPC; NCPC, art. 554.
A propositura de uma ação possessória em vez de outra não impedirá que o juiz
conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela, cujos requisitos
estejam provados.
Assim, se cabível for ação de manutenção de posse e o autor ingressar com
ação de reintegração, ou vice-versa, o juiz determinará a expedição do mandado aos
requisitos provados.
 Expedição de mandado adequado.
 Parte expõe o fato e as provas cabíveis e necessárias e o juiz aplica o direito.
 Binômio: “ofensa à posse – proteção possessória”.
 Princípio dispositivo: art. 2º, CPC; NCPC, art. 2º.
 Não fere previsão do art. 460, CPC; NCPC, art. 492.
 Art. 300, CPC; NCPC, art. 336 – da contestação.

b) Natureza dúplice das ações possessórias (actio duplex)

É possível que o réu alegue, em contestação, ter sofrido ofensa em sua posse,
pleiteando a tutela possessória em face do autor.
 Fundamento legal: arts. 922, 278, § 1º e 273, todos do CPC; NCPC, art. 556 e
arts. 298 e segs.
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 Não se faz necessário pedido reconvencional (Ação de Reconvenção), art. 315,


CPC; NCPC, art. 343.
 É licito ao réu, com efeito, na contestação, alegando que foi ofendido em sua
posse, demandar a proteção possessória e a indenização devida pelos prejuízos
resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor.
 Juiz decide qual deles tem melhor posse.

c) Exceção de domínio

Não é possível a discussão acerca do domínio em ação possessória (art. 1.210,


§2º, do CC), a menos que ambas as partes disputem a posse com base no domínio
(Súmula 487, STF). Ver NCPC, art. 557.
Faz-se aqui a distinção entre juízo possessório e juízo petitório:
 ius possessionis = posse autônoma ou formal; e
 ius possidendi = posse causal.

d) Cumulação de pedidos

Prevê o art. 921, do CPC (NCPC, art. 555), que além da proteção possessória,
pode o autor pleitear a condenação do réu em perdas e danos, cominação de pena
pecuniária ou desfazimento da construção ou plantação realizada, quando da
ocupação possessória.

e) Manutenção provisória na posse daquele que tiver a coisa, se não estiver manifesto
que o obteve de alguma das outras pessoas por meio vicioso (art. 1.211, CC/2002).

f) Admite-se o ajuizamento da ação possessória em face do terceiro que obteve a coisa


do esbulhador, ciente do esbulho (art. 1.212, CC/2002).

g) Nomeação à autoria, no caso de a ação possessória ter sido ajuizada em face do


detentor.

3.4 – Outras ações relacionadas com as ações possessórias

Tais ações são consideradas afins aos interditos possessórios ou ações


possessórias atípicas.
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a) Ação de nunciação de obra nova (arts. 934 a 940, CPC)

OBSERVAÇÃO: Artigos sem correspondência no CPC/2015.

Ver também: art. 1.299, CC (direitos dos vizinhos); arts. 1.300 a 1.302, CC.
Autor (Sujeito ativo): Proprietário ou possuidor (arrendatário, locatário etc.).
Objeto: impedir a continuação da obra que prejudique prédio vizinho ou esteja em
desacordo com os regulamentos administrativos.
Pressupostos:
1) Obra nova;
2) Prédios vizinhos.
Petição Inicial: Embargos de obra (suspensão); pena de multa e perdas e danos (arts.
282 e 936, do CPC).
Art. 940, CPC, o nunciado pode requerer prosseguimento:
1) Alegando prejuízo;
2) Prestar caução;
3) Salvo, se infringir regulamento administrativo. Neste caso, não há prosseguimento
da obra, até a sua devida regularização.

b) Ação de dano infecto

Esta ação é manejada em caso de prédio velho que ameaça cair, bem como
para andaimes de construção que ameaçam desabar. Pode ser utilizada também para
proteção dos vizinhos quando há excesso em caso de ruídos.
Tem caráter preventivo e cominatório (c/ multa). Pode ser oposta quando haja
fundado receio de perigo iminente, em razão de ruína do prédio vizinho ou vício na sua
construção (art. 1.280, CC/02). Cabe também nos casos de mau uso da propriedade
vizinha. Ex. Fundação de prédio, tapume ou andaime que ameaça cair, poluição sonora
etc.

c) Ação de imissão de posse

Não há previsão legal para esta ação no atual Código Civil, nem mesmo no
CPC. Estava prevista no art. 381, CC de 1939 e foi repetida no CC de 1973.
Dec.-Lei nº 1.075, de 22-1-1970 (Imissão de Posse).
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Ação cabível para o caso do proprietário de coisa não possuidor, ou seja,


recebeu do alienante só o domínio, pela escritura, mas nunca teve a posse. Haver
coisa pela primeira vez em face de quem a transmitiu.
Não é o caso da reinvindicação (reaver a propriedade, ou “reaver a posse
perdida”, art. 1.228, CC), mas imissão na posse (consolidar a propriedade). Jus
possidendi (juízo petitório).

Cabimento:
1) Promessa de compra e venda com cláusula de prazo para a imissão na posse;
2) Promessa de compra e venda, locação e comodato (direitos obrigacionais; cláusula
contratual que traduza uma imediata transmissão de posse).

Não cabimento:
1) Constituto possessório;
2) Sucessão causa mortis.

d) Ação Negatória

É cabível quando o domínio do autor, por um ato injusto, esteja sofrendo alguma
restrição por alguém que se julgue com direito de servidão sobre o imóvel. Ou seja,
quando atos praticados por terceiro restringem ou limitam o exercício do domínio.

e) Embargos de terceiro (arts. 1.046 seg., CPC; art. 1.048, CPC – Prazo; NCPC, arts.
674 e segs.)

3.5 – Percepção dos frutos (arts. 1.214 a 1.216, CC)

O possuidor de boa fé tem direito aos frutos percebidos e às despesas de


produção e custeio dos pendentes e dos colhidos com antecipação.
O possuidor de má fé não tem direito aos frutos, mas tem direito às despesas de
produção e custeio.

3.6 – Responsabilidade por perda ou deterioração da coisa (arts. 1.217 e 1.218, CC)
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O possuidor de boa fé não é responsável pela perda ou deterioração que não


deu causa.
O possuidor de má fé responde pela perda ou deterioração, ainda que acidental,
salvo se provar que o dano ocorreria ainda que a coisa estivesse com o dono.

3.7 – Benfeitorias e direito de retenção (arts. 1.219 a 1.222, CC)

O possuidor de boa fé tem direito de ser indenizado pelo que gastou com as
benfeitorias necessárias e úteis. Com relação a elas tem direito de retenção. Tem
direito de retirar as voluptuárias.
O possuidor de má fé tem direito de ser indenizado pelo que gastou com as
benfeitorias necessárias. Não tem direito às úteis. Não pode levantar as voluptuárias.
Não tem direito de retenção.

Referências:

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. São Paulo: Saraiva.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva.

FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Lumen Juris.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva.

RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. São Paulo: Saraiva.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: parte geral. São Paulo: Atlas.

WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva.

Link do Texto: TARTUCE, Flávio. A função social da posse e da propriedade e o direito civil
constitucional. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 900, 20 dez. 2005. Disponível em:
http://jus.com.br/revista/texto/7719
Link do Vídeo: Sonho Real História da Desocupação do Parque Oeste Industrial:
http://www.youtube.com/watch?v=Ai5S9nkV1WM

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