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11UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS


DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA

AVALIAÇÃO DOS EFEITOS AMBIENTAIS DA VEGETAÇÃO URBANA


SOBRE A QUALIDADE DE VIDA EM GOIÂNIA

OSMAR PIRES MARTINS JUNIOR

Goiânia, agosto de 2001


ii

TERMO DE CIÊNCIA E DE AUTORIZAÇÃO PARA DISPONIBILIZAR


VERSÕES ELETRÔNICAS DE TESES E DISSERTAÇÕES
NA BIBLIOTECA DIGITAL DA UFG

Na qualidade de titular dos direitos de autor, autorizo a Universidade Federal de


Goiás (UFG) a disponibilizar, gratuitamente, por meio da Biblioteca Digital de Teses e
Dissertações (BDTD/UFG), regulamentada pela Resolução CEPEC nº 832/2007, sem
ressarcimento dos direitos autorais, de acordo com a Lei nº 9610/98, o documento
conforme permissões assinaladas abaixo, para fins de leitura, impressão e/ou download,
a título de divulgação da produção científica brasileira, a partir desta data.1

1. Identificação do material bibliográfico:

[ x ] Dissertação [ ] Tese

2. Identificação da Tese ou Dissertação:

Nome completo do autor: OSMAR PIRES MARTINS JUNIOR

Título do trabalho: AVALIAÇÃO DOS EFEITOS AMBIENTAIS DA VEGETAÇÃO URBANA


SOBRE A QUALIDADE DE VIDA EM GOIÂNIA.

3. Informações de acesso ao documento:

Concorda com a liberação total do documento [ x ] SIM [ ] NÃO1

Assinatura do autor2:

Data: 10 /11/2021

1 Neste caso o documento será embargado por até um ano a partir da data de defesa. A extensão
deste prazo suscita justificativa junto à coordenação do curso. Os dados do documento não serão
disponibilizados durante o período de embargo.
Casos de embargo:
- Solicitação de registro de patente;
- Submissão de artigo em revista científica;
- Publicação como capítulo de livro;
- Publicação da dissertação/tese em livro.
2 A assinatura deve ser escaneada.
Versão atualizada em setembro de 2017.
iii

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS


INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA

AVALIAÇÃO DOS EFEITOS AMBIENTAIS DA VEGETAÇÃO URBANA


SOBRE A QUALIDADE DE VIDA EM GOIÂNIA

OSMAR PIRES MARTINS JUNIOR

Orientador: Prof. Dr. Divino Brandão/ICB


Co-orientador: Profa. M.Sc. Patrícia de Araújo Romão/IESA

Dissertação apresentada ao Instituto de


Ciências Biológicas, da Universidade Federal
de Goiás, para a obtenção do título de Mestre
em Biologia, área de concentração Ecologia.

Goiânia, agosto de 2001


iv

Copyright © 2001 by Osmar Pires Martins Junior

Ilustração, programação visual e diagramação: Engº. Agrº. Paulo Roberto Del Rey Reis

CIP - Brasil. Catalogação na Fonte


BIBLIOTECA PÚBLICA ESTADUAL PIO VARGAS

MAR Martins Junior, Osmar Pires


ava Avaliação dos efeitos ambientais da vegetação urbana sobre a
qualidade de vida em Goiânia [manuscrito] / Osmar Pires Martins Junior.
- 2001.

296 f.: il.

Orientador: Prof. Dr. Divino Brandão.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Goiás, Instituto de


Ciências Biológicas (ICB), 2001.
Bibliografia.

1. Urbanismo. 2. Meio ambiente. 3. Ecologia Humana. 4. Qualidade


de vida I. Título.

CDU: 792.22 (817.3)

Índice para catálogo sistemático:


Proteção da Natureza Ecologia Humana
CDU: 792.22 (817.3)
v
vi

[...] As raízes do fenômeno de fixação do homem à terra - até chegarmos às


cidades de hoje - remontam a tempos imemoriais (...).
O período paleolítico é marcado pela não fixação do homem, pelo nomadismo
enfim. Contudo, as suas primeiras manifestações de interesse em relacionar com algum
lugar são deste período. Segundo o autor Mumford, podemos reconhecê-lo por dois fatos:
primeiro, pela respeitosa atenção que o homem paleolítico tinha com seus mortos,
preocupando-se com que eles tivessem um lugar (...); segundo, a relação com a caverna,
embora não constituísse uma moradia fixa para ele, era um abrigo e tinha um significado
muito grande. (...)
Se a ‘semente’ fora lançada durante o paleolítico, é efetivamente no período
seguinte, mesolítico, que se realiza a primeira condição para o surgimento das cidades: a
existência de um melhor suprimento de alimentos (iniciado) há cerca de l5 mil anos (...)
através de um processo muito lento (...) de plantio e reprodução de vegetais comestíveis e
de domesticação e criação de animais. (...)
Esses primeiros seres sedentários por certo assombrar-se-iam se tivessem a
chance de conhecer as cidades atuais e seus habitantes modernos. ‘A poesia concreta de
suas esquinas ... a negra fumaça que sobe apagando as estrelas’ (...). Florestas extintas,
edificações desmedidas, trânsito ensandecido, crescimento urbano desordenado,
habitantes nas vias públicas, a elite que ilusoriamente se ‘protege’ em condomínios
fechados; rios vítimas de poluições diversas e ‘anéis viários’; a flora e fauna sacrificadas
no altar do pseudo-desenvolvimento. (...)
Assim, entre o destino e os desatinos do urbanismo, a Constituição Federal
conferiu ao Ministério Público, tarefas por demais relevantes e, dentre elas, destaca-se a
defesa do Patrimônio Público.
Não resta dúvida, pois, da plena legitimidade do Ministério Público para o
aforamento de ação civil pública com vistas a anular ato administrativo lesivo ao
patrimônio público. (...)
Que o Parque volte a ser Parque, para que os homens deixem de vez o
primitivismo que habita as cavernas do desrespeito à Natureza e à sociedade [...].

Desembargador Antônio Nery da Silva, em 13.10.1997.

(Voto proferido no Processo n 3851-4/195, às fls. 716-730,


aprovado pela maioria dos membros das Câmaras Cíveis do Tribunal
de Justiça de Goiás, que julgou a ação de nulidade de escritura
pública de alienação de uma área de 27.800 m, no Setor Jaó,
destinado ao Parque Municipal dos Beija-Flores, em Goiânia).
vii

Aos meus pais:

Osmar Martins Barros e


Amélia Pires Sardinha (in memoriam),

AGRADEÇO.

Aos profissionais que, com seu trabalho, contribuem para


a melhoria da qualidade de vida, a exemplo do (a):

Biólogo Prof. Divino Brandão e


Geógrafa Profª. Vanilda Aleixo,

COMPARTILHO.

À minha esposa e aos nossos filhos:


Josete Bringel Bezerra,
Ludmila,
Diogo e
Gustavo,

DEDICO.
viii

AGRADECIMENTOS

Para o desenvolvimento deste trabalho foi imprescindível o apoio e a


participação de pessoas e de instituições, sem as quais não seria possível atingir o objetivo
proposto. A elas registramos os nossos sinceros agradecimentos.
À equipe de digitalizadores formada pelos Geógrafos Rodrigo de Oliveira Barsi,
Adriana Aparecida Silva, Olga Maria Fernandes, Theandra Fernandes Drago e Profª. Vanilda
Aleixo, sob a responsabilidade técnica desta última, contribuindo com o autor na digitalização
de um mil e duzentos (1.200) mapas, numa jornada de oito meses de produção intensiva. Ao
Geol. Heitor Faria da Costa, Especialista em Geoprocessamento da Secretaria Estadual de
Indústria e Comércio, pela conversão dos mapas do SGI para o SPRING.
À Profª Maria Amélia Soares do Nascimento, Coordenadora do Laboratório de
Geoprocessamento do IESA/UFG, pela cessão das dependências, instalações e equipamentos
do laboratório, permitindo a execução deste projeto.
Às empresas que patrocinaram parte da execução do projeto, Maia & Borba
Ltda, Máximo Construtora e Incorporadora Ltda, Transentulho Transporte de Entulho Ltda e
Tropical Imóveis Ltda, por intermédio de termos de contrato assinados com o Programa de
Pós-Graduação em Biologia da UFG e com a FUNAPE/UFG. Ao Presidente desta fundação,
Prof. Valter Casseti, registramos a nossa gratidão.
À SEPLAM, através dos seus dirigentes, nomeando o Sr. Omar Gabriel, Diretor
do Departamento Administrativo e o Agrim. Antônio Vladimir Bojanic Helbingen, Chefe da
Divisão de Cartografia que, contando com a colaboração dos Servidores Gilvani, Júnior e
Loide, tornaram possível a reprodução heliográfica e xerográfica das plantas e dos memoriais
descritivos dos planos de loteamento de Goiânia.
Aos dirigentes e técnicos da SEMMA e da COMDATA, nomeando o Eng.
Flávio Yuaca, Gerente do Deptº de Geoprocessamento desta última, que se prontificaram a
colaborar com o desenvolvimento e implantação de um programa de cadastramento e
monitoramento das áreas verdes da cidade, a partir de um banco de dados geográfico sobre este
tema, a ser inserido no MUBDG.
Ao Oficial Substituto do Cartório de Registro de Imóveis da 3ª Circunscrição de
Goiânia, Sr. Fábio Ivo Bezerra, pela solicitude em disponibilizar os documentos do
planejamento originário de Goiânia.
Ao Prof. Divino Brandão/ICB pela orientação e à Profª. Patrícia de Araújo
Romão/IESA, pela co-orientação, a quem somos gratos pelas sugestões e contribuições à
elaboração e desenvolvimento do trabalho.
Aos colegas de pós-graduação, em especial os amigos Jales Teixeira Chaves
Filho, Adriano de Melo Ferreira e Carlos Roberto A. Santos, pela convivência fraterna em
compartilhar o caminho da aprendizagem.
Aos professores da Pós-Graduação em Biologia da UFG/concentração em
Ecologia, em especial os Professores Doutores: Divino Brandão, Maurício Bini, José
Alexandre Felizola Diniz-Filho, José Carlos Seraphin e Tomás de Aquino Portes e Castro,
pela competente capacidade de relacionamento com os mestrandos no desempenho da arte do
magistério.
ix

APRESENTAÇÃO

O Homem sempre considerou a Natureza como um meio de atender aos seus


interesses econômicos, principalmente após a revolução industrial, quando a agressão e a
destruição do equilíbrio ecológico provocaram e ainda provocam o desajuste da fauna e da flora,
modificando o clima, aumentando o risco de extinção das espécies mais raras, dentre outras
conseqüências. No entanto, ecologistas, biólogos, zoólogos, economistas, matemáticos, filósofos,
demógrafos, cientistas, gênios, santos e heróis têm buscado conter tais impulsos de destruição com
seus exemplos de atenta sensibilidade e muito trabalho diante de tudo que envolve ou caracteriza a
harmonia da Natureza.
Pitágoras, o filósofo que inspirou Sócrates, Aristóteles e Platão, edificou uma
cidade onde se vivia o profundo respeito ao meio ambiente, um enobrecedor laboratório social de
reverência ao ecossistema. Teofrasto, discípulo de Aristóteles, dentre os que se preocuparam com
o meio ambiente na Grécia Antiga, foi o primeiro a descrever as relações dos organismos entre si e
com o meio. São Francisco de Assis, padroeiro da Ecologia, defensor dos animais e do meio
ambiente, amou tanto a Natureza que todos os seres da Natureza passaram a ser seus irmãos
amados.
Ernst Haeckel, sensível zoólogo alemão do século XIX, foi o primeiro a cunhar a
palavra ecologia (do grego oikos, ‘casa’) para designar a “relação dos animais com seu meio
ambiente orgânico e inorgânico”. Thomas Robert Malthus, economista e demógrafo britânico do
século XIX, se interessou pela dinâmica das populações, demonstrando o conflito entre as
populações em expansão e a capacidade da Terra de fornecer alimento. Raymond Pearl, zoólogo
americano, em 1920, A. J. Lotka, em 1925, e Vito Volterra, matemático italiano, em 1926,
fundadores da biometria, desenvolveram as bases matemáticas para o estudo das populações,
contribuindo para as experiências sobre a interação de predadores e presas, as relações entre
espécies e o controle populacional.
Konrad Zacharias Lorenz, austríaco, fundador da Etiologia moderna, e Nikolaas
Tinbergen, de Haia, Países Baixos, lançaram os conceitos de comportamento instintivo. August
Thienemann, biólogo alemão que, em 1920, introduziu o conceito de níveis tróficos, ou de
alimentação, pelos quais a energia dos alimentos é transferida, por uma série de organismos, das
plantas aos animais. Charles Sutherland Elton, biólogo e ecologista inglês, especializado em
animais, estabeleceu os princípios da moderna ecologia animal com o conceito de nichos
ecológicos e pirâmides de números.
Edward Asahel Birge, zoólogo americano que, em 1930, fundamentou o estudo das
águas interiores (rios e lagos) e do efeito da ação do Homem sobre elas. Chancey Juday, biólogo
americano que também estudou os ecossistemas das águas interiores, desenvolvendo a idéia da
produção primária gerada pela fotossíntese.Raymond Laurel Lindeman, cientista americano que
desenvolveu o conceito trófico-dinâmico de ecologia, ou seja, o conceito da cadeia alimentar, que
regula a evolução do ecossistema.
Augusto Ruschi, naturalista brasileiro do Estado do Espírito Santo, notabilizou-se
em seus quase quinhentos trabalhos científicos após cinqüenta anos de pesquisa dedicados a
defesa da Natureza no Brasil por meio da preservação de animais e plantas. Albert Schweitzer,
Prêmio Nobel da Paz, reverenciou a Natureza de tal modo que modificou a planta do seu hospital
em Lambaréné, na África, para não exterminar um formigueiro, sabia preservar todas a
manifestações da Vida, Bem Maior da Natureza.
Osmar Pires Martins Júnior, biólogo e engenheiro agrônomo, brasileiro, natural do
Estado de Goiás, notável ambientalista com mestrado em Ecologia Urbana e doutor em Ciências
Ambientais (fase final de conclusão na UFG), membro da Academia Goianiense de Letras,
publicou em 1996 a excelente obra "Uma cidade Ecologicamente Correta", editado pela AB
x

Editora; e, em 1995, “Introdução aos Sistemas de Gestão Ambiental: teoria e prática”, editado pela
Kelps/editora da UCG.
Suas obras e o seu trabalho à frente da Secretaria de Meio Ambiente de Goiânia
(1993-96) e na presidência da Agência Ambiental refletem a excelência de uma vida dedicada ao
nosso planeta Terra. Uma vida de árduos testemunhos, mesmo contando com o apoio decisivo da
população goiana e da confiança incondicional de autoridades comprometidas com a preservação
do meio ambiente, como, por exemplo, o governador Marconi Perillo.
O nosso “Bandeirante da Ecologia” devolveu à população da capital goiana os
parques ecológicos urbanos Vaca Brava, Areião, Botafogo, Carmo Bernardes (Parque Atheneu-
Mariliza), dos Beija-Flores (S. Jaó), Flamboyant (Jardim Goiás) e o Jardim Botânico, recuperados
dos especuladores imobiliários. Assim, também, realiza em inúmeras cidades e regiões goianas,
implantando parques municipais e estaduais, inspirando ecólogos brasileiros e estrangeiros em
suas participações nos congressos nacionais e internacionais organizados por instituições
vinculadas com a Ecologia e áreas afins, a exemplo da Regional Government Network for
Sustainable Development (nrg4SD).
Agora este incansável ambientalista do Centro-Oeste brasileiro lança mais esta jóia
literária de rara beleza científica “AVALIAÇÃO DOS EFEITOS AMBIENTAIS DA
VEGETAÇÃO URBANA SOBRE A QUALIDADE DE VIDA EM GOIÂNIA”, trabalho de
fôlego que analisa o papel da vegetação na determinação da qualidade de vida urbana,
constituindo numa referência técnica sobre ecologia urbana dentro de um desenvolvimento
sustentável.
Lendo esta obra o leitor verá que Goiânia foi concebida por Attílio Corrêa Lima,
arquiteto-urbanista, como uma Cidade-Jardim de Howard - uma concepção que revolucionou o
urbanismo moderno. E segundo o biólogo Osmar Pires “uma das suas principais características é a
ordenação do espaço urbano de maneira a integrar funções urbanas como trabalho, moradia,
locomoção e lazer com qualidade de vida. Esta característica urbanística de Howard proporciona,
dentre outras coisas, uma elevada proporção de espaços livres por habitantes”.
Em sua inédita pesquisa o Dr. Osmar Pires calculou o Índice de Área Verde (IAV)
de Goiânia que é de 100 metros quadrados por habitante, o dobro de Curitiba.
Osmar é o semeador que saiu a semear... Nesta obra com inúmeras sementes ele
nos ensina que sempre possível “separar o joio do trigo”, “observar as aves do Céu e os lírios dos
campos”, “caminhar sobre águas turbulentas”, “aplacar tempestades” “transformar a água em
vinho”, “multiplicar pães e peixes” e “curar toda enfermidade”, bastando observar, registrar,
analisar, comparar, compreender, reverenciar, trabalhar e amar os mecanismos sagrados da
Natureza, fonte de Poder infinito.
Com os seus exemplos de Sabedoria o venerável amigo e notável escritor Osmar
Pires, integrante da Academia Goianiense de Letras como membro-fundador da cadeira nº 29, cujo
patrono é Attílio Corrêa Lima, está de parabéns porquanto suas atitudes bem representam o
pensamento do maior ecólogo da História da Humanidade, que asseverou, num santuário da
Natureza, referindo-se aos ambientalistas de todos os tempos: “BEM-AVENTURADOS OS
BRANDOS, PORQUE ELES HERDARÃO A TERRA”.

Goiânia, 30 janeiro de 2005

Prof. Dr. Emídio Silva Falcão Brasileiro


Presidente da Academia Goianiense de Letras
xi

SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS xiv


LISTA DE FIGURAS xv
RESUMO xix
ABSTRACT xix
ABREVIATURAS UTILIZADAS xx

Parte I – Objetivos, Caracterização da área de estudo e Métodos

1.1. Objetivos do estudo 1


1.1.1. Objetivo geral 1
1.1.2. Objetivos específicos 1
1.2. Caracterização da área de estudo 2
1.2.1. Localização 2
1.2.2. Meio Físico 2
1.2.2.1. Climatologia 2
1.2.2.1.a) Precipitação pluviométrica 4
1.2.2.1.b) Temperatura 4
1.2.2.1.c) Umidade relativa do ar e Evaporação 5
1.2.2.1.d) Insolação e Nebulosidade 8
1.2.2.1.e) Velocidade e direção dos ventos 9
1.2.2.2. Geologia, geomorfologia e solos 11
1.2.3. Meio Biótico 15
1.2.3.1.Vegetação 15
1.2.3.2. Fauna 17
1.2.4. Meio Social ou Antrópico 18
1.3. Materiais e Métodos 21
1.3.1. Descrição do projeto 21
1.3.2. Descrição das atividades desenvolvidas 25
1.3.2.1. A entrada de dados 25
1.3.2.1.a) Compilação de mapas temáticos 25
1.3.2.1.b) Compilação complementar dos mapas temáticos 25
1.3.2.1.c) Atualização dos mapas temáticos 26
1.3.2.2. Poligonalização e rasterização dos PI’s 26
1.3.2.3. Manipulação dos PI’s 27
1.3.2.4. Saída/geração de cartas 27

Parte II. Urbanismo e meio ambiente urbano. O exemplo de Goiânia


2.1. Introdução 28
2.2. Urbanismo- breve histórico conceitual na ótica da qualidade
ambiental de vida 32
xii

2.3. Um ensaio sobre o urbanismo no Brasil com enfoque para questões


do planejamento ambiental 40
2.4. A urbanização de Goiás - uma breve contextualização
histórico-ambiental 45
2.5. Uma breve resenha sobre os aspectos socioculturais da urbanização
do estado de Goiás 47
2.6. Alguns aspectos da revolução de 30 e o processo de urbanização de
Goiás relacionados ao meio ambiente urbano 51
2.7. Goiânia - urbanização e urbanificação relacionados ao meio ambiente 57
2.7.1.A concepção urbanística de Goiânia 57
2.8. Origem e evolução ambiental do plano urbanístico de Goiânia 60
2.8.1. Retrospectiva do primeiro Plano Diretor da Cidade 62
2.8.1.1.O memorial descritivo do primeiro Plano de Urbanização de Goiânia 65
2.8.1.2.A aprovação do Plano Diretor de Goiânia e o surgimento do conflito
com a concepção de Cidade-Jardim de Howard 77
2.8.2.Análise preliminar das alterações do Plano de Urbanização de Goiânia 80
2.8.3.Alguns problemas de ordem urbanística e ambiental gerados pelos
conflitos e contradições do planejamento originário de Goiânia 84
2.8.4.A proteção dos espaços livres na legislação de uso do solo e nos
memoriais descritivos dos loteamentos de Goiânia 87
2.8.5.Uma tentativa de caracterização dos agentes produtores do espaço
urbano com repercussões sobre os espaços livres de Goiânia 90

Parte III - O homem, o clima e o ecossistema urbano:


um estudo de ecologia humana

3.1. Estudo dos fatores microclimáticos intervenientes na formação do


clima urbano 95
3.1.1. O sítio urbano de Goiânia e os fatores climáticos de ordem local 95
3.1.2. Fatores e processos do microclima urbano 98
3.1.2.1.Processos de transferência de calor 101
3.1.2.1.a) Radiação 102
3.1.2.1.b) Condução térmica 106
3.1.2.1.c) Convecção 107
3.1.2.1.d) Transferência do calor utilizado em sínteses e processos
bioquímicos 111
3.1.2.2.Umidade do ar 111
3.1.2.2.a) Tensão atual de vapor d’água (e) 112
3.1.2.2.b) Umidade absoluta (U.A.) 113
3.1.2.2.c) Umidade de saturação (U.S.) 113
3.1.2.2.d) Umidade relativa (U.R.) 113
3.1.2.3. Condensação do vapor d’água na atmosfera e precipitação 114
3.1.2.4. Vento 117
xiii

3.1.2.5. Evapotranspiração 122


3.2. Estudo da vegetação na determinação do clima local 125
3.3. Estudo da interação Homem-Clima no Meio Urbano 132
3.3.1. Introdução 132
3.3.2. O clima urbano e seu estudo: a microclimatologia 133
3.3.3. Os efeitos da urbanização sobre os elementos do clima 134
3.3.4. A morfologia urbana e seus condicionantes climáticos 145
3.3.5. O efeito dos elementos naturais sobre o clima urbano 147
3.3.5.1. Os efeitos benéficos da vegetação 147
3.3.5.2. Os efeitos das massas de água e da topografia 153
3.3.6. Parâmetros de conforto ambiental de vida urbana 153
3.4. Ecologia Humana: o estudo do Homem 156
3.4.1. Introdução 156
3.4.2. Breve histórico conceitual 157
3.4.3. Cibernética: um sistema particular e a compreensão do Sistema
Homem 163
3.4.4. A teoria da informação e a auto-regulação dos sistemas 165
3.4.5. A perspectiva ecossistêmica de Dansereau 169
3.5. Ecologia Urbana: o estudo do habitat do Homem 176
3.5.1. A especificidade do ecossistema urbano 176
3.5.2. A cidade numa abordagem geográfica 178
3.5.2.1. A estrutura interna da cidade 180
3.5.3. A cidade numa abordagem ecossistêmica 184
3.5.4. A cidade numa abordagem biológica 186
3.5.5. A cidade numa abordagem bioclimática 190
3.6. Espaços livres, áreas verdes e qualidade de vida 191
3.6.1. Conceitos e definições 191
3.6.2. Os espaços livres na história das cidades 194
3.6.3. Alguns indicadores censitários da qualidade de vida urbana 196
3.6.4. Qualidade de vida e indicadores ambientais urbanos 200
3.6.5. O Índice de Área Verde (IAV) como um indicador de qualidade
ambiental de vida urbana 204

Parte IV – Resultados, Considerações finais, Recomendações e Sugestões

4.1. Apresentação dos resultados 206


4.1.1. Análise quantitativa 206
4.1.1.1. Micro-Região Aeroviários (PI AERO) 211
4.1.1.2. Micro-Região Riviera (PI AGUA) 213
4.1.1.3. Micro-Região Amazônia (PI AMAZ) 215
4.1.1.4. Micro-Região Meia Ponte (PI BALN) 217
4.1.1.5. Micro-Regiões Campinas e Coimbra (PI CAMP) 219
4.1.1.6. Micro-Regiões do Bairro Capuava (PI CAPU) 221
xiv

4.1.1.7. Micro-Região Cidade Jardim (PI CJAR) 223


4.1.1.8. Micro-Região Marechal Rondon (PI CRIO) 225
4.1.1.9. Micro-Regiões do Setor Central (PI CS) 227
4.1.1.10. Micro-Região São Domingos (PI CURI) 229
4.1.1.11. Plano de Informação Jardim Faiçalville (PI FAI) 231
4.1.1.12. Micro-Região Criméia Leste (PI FERR) 233
4.1.1.13. Micro-Região Finsocial (PI FINS) 235
4.1.1.14. Micro-Região Madri e Itaipu (PI GARA) 237
4.1.1.15. Micro-Regiões Urias Magalhães e Nova Esperança (PI GENT) 239
4.1.1.16.Micro-Região Goiânia 2 (PI GOI2) 241
4.1.1.17. Micro-Regiões Guanabara e Aldeia do Valle (PI GUA) 243
4.1.1.18. Micro-Regiões Santo Hilário e Pedroso (PI HILA) 245
4.1.1.19. Micro-Regiões Campus Universitário e Pq. dos Cisnes (PI ITAT) 247
4.1.1.20. Micro-Regiões Santa Genoveva e Jaó (PI JAO) 249
4.1.1.21. Micro-Regiões Sudoeste e Jardins (PI JATL) 251
4.1.1.22. Micro-Regiões Santa Rita e Bairro Jd. Botânico (PI JDBO) 253
4.1.1.23. PI Jardim Goiás (PI JG51) 255
4.1.1.24. Micro-Região Solar Ville (PI MAI) 257
4.1.1.25. Micro-Região Novo Mundo (PI MUN) 259
4.1.1.26. Micro-Regiões Vila Nova, L. Universitário e B. Feliz (PI NOVA) 261
4.1.1.27. Micro-Regiões Granville, Goiá e João Braz (PI PIJB) 263
4.1.1.28. Micro-Regiões Pedro Ludovico, Redenção e Stº Antônio (PI PL) 265
4.1.1.29. Micro-Regiões Portal do Sol e Laranjeiras (PI PLA) 267
4.1.1.30. Micro-Região Jardim América (PI SERR) 269
4.1.1.31. Micro-Região Vera Cruz (PI VERA) 271
4.1.1.32. PI Campus Samambaia UFG (PI UNI) 273
4.1.2. Análise estatística 275
4.1.2.1. Os fatores IAV e densidade demográfica 275
4.1.2.2. Estimativa do IAV de Goiânia para um futuro qualquer 281
4.1.2.3. Os fatores densidade demográfica e índice de dilapidação do
patrimônio público 282
4.1.2.4. O IAV em função da densidade demográfica e do índice de
dilapidação do patrimônio público 284
4.2. Considerações finais 285
4.3. Recomendações e Sugestões 287
4.3.1. Recomendações 287
4.3.2. Sugestões 288
4.3.2.1. Levantamento e medição de variáveis ambientais 288
4.3.2.2. Levantamento de variáveis sócio-ambientais 289

BIBLIOGRAFIA 290
xv

LISTA DE TABELAS
Número página

01 - O efeito da cobertura vegetal sobre as perdas de terra e água, em latossolo


vermelho-amarelo eutrófico de Goiânia (1980/81) ............................................... 14
02 - Áreas de matas por características do Município de Goiânia ............................... 15
03 - Matriz do Potencial de Impacto Ambiental por Gênero de Indústria no Brasil,
segundo Torres (1993) .......................................................................................... 21
04 - Produção de ouro na colônia brasileira durante o século XVIII e a participação
relativa das três capitanias maiores produtoras ...................................................... 46
05 - Evolução da população de Goiás (1738 - 2000) ..................................................... 53
06 - Composição percentual da Renda Interna de Goiás (1940/95) ............................... 56
07 - Os Espaços livres e suas respectivas categorias de acordo com as diretrizes do
projeto do primeiro Plano de Diretor de Goiânia ................................................... 71
08 - Relações construtivas estabelecidas no memorial descritivo do primeiro Plano
Diretor de Goiânia .................................................................................................. 74
09 - Redução das Zonas Comercial e de Diversões com correspondente aumento do
n.º dos lotes residenciais no Centro de Goiânia ...................................................... 82
10 - Alteração do Quadro de Áreas do Setor Bueno ....................................................... 91
11 - Albedo de algumas superfícies naturais e cultivadas ............................................... 100
12 - Atenuação média do vento entre 0 a 30 vezes a altura (h) da barreira vegetal,
considerando três graus de permeabilidade e três diferentes velocidades do vento. 122
13 - Variação do coeficiente de reflexão pelas plantas em função do comprimento de
onda da radiação solar ............................................................................................ 131
14 - Balanço térmico de acordo com o uso do solo ........................................................ 132
15 - Algumas unidades climáticas e os espaços urbanos correspondentes ..................... 134
16 - Fontes e magnitudes do calor antropogênico ......................................................... 135
17 - Temperatura média do solo urbano de Rondonópolis/MT de acordo com o uso
do solo e correspondentes coeficientes de reflexão e de absorção .......................... 141
18 - Energia média economizada em cidades arborizadas dos EUA e modificação
do albedo ................................................................................................................. 149
19 - Algumas estratégias para o Conforto Climático Externo em Ecossistema
Urbano de Clima Tropical Úmido-Seco................................................................. 154
20 - Zonas de conforto de âmbito mundial .................................................................... 156
21 - As antropo-seras (1 a 9) em correlação com as revoluções sócio-tecnológicas
(I a VI), com as fases da escalada do poder do Homem sobre a paisagem (A a F),
com os impactos causados e as respostas correspondentes..................................... 172
22 - Chave simplificada para a classificação ecológica dos espaços ............................ 173
23 – O Sistema Clima Urbano (SCU) e as articulações dos subsistemas de acordo com
os canais de percepção humana................................................................................. 191
24 - Classificação dos espaços abertos, segundo Vieira (1994)................................... 193
25 - Alguns indicadores censitários sanitários (valores em % de domicílios urbanos).. 197
26 - Acesso aos serviços de saneamento no Brasil por classes de renda....................... 199
27 - Matriz simplificada de indicadores ambientais urbanos ....................................... 203
28 - Classificação e quantificação (m²) dos espaços livres de Goiânia, em 20/11/2000 207
29 - Equipamento público com área permeável computada no IAV ............................ 208
30 - Área pública alienada que mantém função ambiental ........................................... 208
31 - Relação entre densidade demográfica e IAV por micro-região (correspondente ao
PI) do Município de Goiânia ................................................................................. 275
xvi

32 - Desenvolvimento do método de verificação da homogeneidade dos dados da


tabela 31, segundo Mead & Curnow (1983) ......................................................... 277
33 - Densidade demográfica – x (hab.km-²) e IAV – y (m2.hab) e seus valores
transformados (x’ = log.x e y’ = log.y), por micro-região de Goiânia .................. 278
34 - Análise de variância – modelo y’ = a + b.x’, dos dados da tabela 33 ...................... 280
35 - Densidade demográfica – x (hab.km-²) e índice de dilapidação do patrimônio
público – y (%) e seus valores transformados x’ = log (x + 1) e y’ = log (y + 1),
por micro-região de Goiânia ................................................................................. 283

LISTA DE FIGURAS

01 - Precipitação pluviométrica mensal – série 1949/87, em Goiânia .......................... 5


02 - Temperatura de Goiânia – série histórica 1949/87 ................................................ 6
03 - Umidade relativa do ar em Goiânia – 1949/87 ...................................................... 7
04 - Evaporação mensal de Goiânia – série 1949/87 .................................................... 8
05 - Insolação média de Goiânia – 1949/87 .................................................................. 10
06 - Nebulosidade média em Goiânia – 1949/87 .......................................................... 10
07 - Fragmentos de reservas florestais da “Fazenda São Domingos” – Região NW
de Goiânia .............................................................................................................. 16
08 - Diagrama da concepção urbanística de Howard .................................................... 33
09 - Diagrama da Cidade-Jardim de Howard e seus principais elementos urbanísticos 35
10 - Vista aérea de Welwin (Inglaterra), a segunda Cidade-Jardim de Howard ........... 36
11 - Evolução da população economicamente ativa do Brasil - 1920/80 ..................... 44
12 - Vista aérea de Versalhes, mostrando o partido clássico Pate d'oie, que foi
adotado no plano de Goiânia ................................................................................. 67
13 - Zoneamento e esquema de circulação de Goiânia, de acordo com o Relatório do
Plano Diretor apresentado ao Estado de Goiás em 13.1.1935 ............................... 68
14 - Plano de Loteamento da Cidade de Goiânia aprovado pelo Decreto-Lei n. 90-A,
de 30.7.38, destacando-se os contrastes com o Relatório do Plano Diretor
apresentado ao Estado de Goiás em 10.1.1935 ...................................................... 79
15 - Anúncio publicitário de venda de lotes em Goiânia pela firma Coimbra Bueno
& Cia. Ltda ............................................................................................................ 83
16 - A área original e a área atual do parque dos Buritis, reduzida em 70%, pela firma
loteadora Coimbra Bueno, em 1955 ...................................................................... 86
17 - O loteamento das áreas públicas do Setor Coimbra, implantado em área destinada
à Zona de Esporte .................................................................................................. 90
18 - Estádio Serra Dourada, construído pelo Estado de Goiás, em 1975, em parcelas
expressivas de áreas públicas municipais localizadas no Jardim Goiás ................ 94
19 - Formações Vegetais do sítio urbano de Goiânia demarcadas como Unidades de
Conservação. Fotografia aérea de 1937 ................................................................. 96
20 - Esquema do balanço de radiação pelo solo em ambiente natural ........................... 99
21 - Espectro eletromagnético da radiação solar ........................................................... 103
22 - Interação da radiação eletromagnética (REM) com a matéria ................................ 104
23 - Diagrama simplificado do efeito estufa no meio urbano ........................................ 105
24 - Diagrama de transferência de energia no solo por condução térmica .................... 107
25 - Diagrama da transferência de energia por calor sensível ....................................... 108
26 - Curva de aquecimento da água ............................................................................... 109
27 - Esquema da transferência de energia via calor latente de vaporização ................ 111
28 - Diagrama da condensação do tipo “nevoeiro de evaporação” ............................... 114
xvii

29 - Diagrama da condensação do tipo “nevoeiro de advecção” .................................. 115


30 - Diagrama da condensação do tipo “nevoeiro de radiação” ................................... 115
31 - Diagrama do processo de expansão adiabática ..................................................... 117
32 - Perfil de velocidade U(Z) de um fluxo laminar .................................................... 118
33 - Representação esquemática de uma partícula de ar em fluxo turbulento ............. 119
34 - Diagrama de um quebra-vento denso e fechado desde o solo até copa das
árvores, na massa de ar advectiva ........................................................................ 121
35 - Diagrama da atuação de uma barreira vegetal com permeabilidade de 30% ...... 121
36 - Ponte de hidrogênio: propriedade química responsável por importantes
funções e atividades da água ................................................................................ 126
37 - Continuum de água solo-planta-atmosfera seguindo um gradiente de potencial
hídrico................................................................................................................... 127
38 - Diagrama das trocas energéticas em três diferentes ecossistemas........................ 132
39 - Representação esquemática da atmosfera urbana ……………………………… 136
40 - Princípio térmico das correntes de convecção ………………………………….. 138
41 - Variação das diferentes superfícies ao processo radiativo e sua influência na
temperatura da camada-limite ………………………………………………….. 139
42 - O ciclo diário das brisas térmicas no meio urbano, guiado pelo princípio das
correntes de convecção, através dos corredores de vento ………………………. 139
43 – Seção transversal de uma típica ilha de calor urbano 140
44 - Zona de contaminação nas vias expressas em função da velocidade, do volume
do tráfego e da distância em relação ao leito carroçável……...…………………... 143
45 - O Ser Humano no processo de interação Homem-Natureza .................................. 161
46 - Representação gráfica do objeto de análise da Ecologia Humana: a interseção
das interações dos sistemas Homem e Ambiente ................................................... 161
47 - Diagrama do fluxo de informação através de um sistema inanimado (computador)
e de um sistema vivo (Homem) ............................................................................. 163
48 - Diagrama da regulação em constância com retroação negativa ............................. 166
49 - Diagrama da regulação em tendência com retroação positiva ................................ 167
50 - Diagrama da regulação por servomecanismo .......................................................... 167
51 - Diagrama da interação com reação em cadeia: (1) ação de A sobre B; (2) reação
de B sobre A; (3) ação de N sobre AB; (4) reação de AB sobre N.......................... 169
52 - Diagrama do ecossistema segundo o modelo da “bola de flechas”, de Dansereau.. 170
53 - Diagrama do “bolo-do-ambiente”: matriz de repartição dos recursos para
satisfação das necessidades humanas como estratégia da qualidade de vida .......... 174
54 - “Bolo-do-ambiente” para dois grupos ocupacionais diferentes -Montreal, Canadá.. 175
55 - Diagrama de três modelos de padrões espaciais urbanos, determinados pela
segregação residencial, conforme o status social: (1) alto, (2) médio e (3) baixo .... 181
56 - Diagramas de representação de dois ecossistemas, um cultural (cidade) e um
natural (floresta), ilustrando as diferentes intensidades de carga trófica.................. 184
57 - “Bolo-do-ambiente” para duas cidades altamente adensadas localizadas em
contextos evolutivos diferentes .............................................................................. 185
58 - Satisfação relativa de necessidades para dois assentamentos humanos: Nova
Iorque e Calcutá ..................................................................................................... 186
59 - Diagrama cibernético de representação da cidade .................................................. 187
60 - Diagrama da cidade como um sistema regulado em tendência ............................. 188
61 - Marco conceitual para os indicadores de pressão, de estado e de resposta ........... 203
62 - Modelo conceitual para a definição de critérios sobre desenvolvimento
sustentável e para a identificação de indicadores .................................................. 204
63 - Mapa dos espaços livres da zona urbana e da zona de expansão urbana de
xviii

Goiânia (Projeto Gyn) ........................................................................................... 209


64 - Diagrama dos espaços livres de Goiânia .............................................................. 210
65 - Distribuição percentual dos espaços livres de Goiânia e da área pública parcelada 210
66 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Aeroviários (PI AERO) ............... 211
67 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Aeroviários (PI AERO) .................... 212
68 - Diagrama dos espaços livres da Micro-região Riviera (PI AGUA) ...................... 213
69 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Riviera (PI AGUA)............................. 214
70 - Diagrama dos espaços livres da micro-região Amazônia (PI AMAZ) .................. 215
71 - Mapa dos espaços livres Micro-Região Amazônia (PI AMAZ)........................... 216
72 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Meia Ponte (PI BALN) .............. 217
73 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Meia Ponte (PI BALN) ...................... 218
74 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Campinas e Coimbra (PI CAMP) 219
75 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Campinas e Coimbra (PI CAMP) .. 220
76 - Diagrama dos Espaços livres Micro-Regiões do Bairro Capuava (PI CAPU) ........ 221
77 - Mapa dos espaços livres Micro-Regiões do Bairro Capuava (PI CAPU) ................ 222
78 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Cidade Jardim (PI CJAR) .............. 223
79 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Cidade Jardim (PI CJAR) ..................... 224
80 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Marechal Rondon (PI CRIO) ......... 225
81 - Mapa dos espaços livres Micro-Região Marechal Rondon (PI CRIO) .................... 226
82 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões do Setor Central (PI CS) ............ 227
83 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões do Setor Central (PI CS) ................... 228
84 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região São Domingos (PI CURI) ............. 229
85 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região São Domingos (PI CURI) ................... 230
86 - Diagrama dos espaços livres do Plano de Informação Jardim Faiçalville (PI FAI) . 231
87 - Mapa dos espaços livres do Plano de Informação Jardim Faiçalville (PI FAI) ....... 232
88 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Criméia Leste (PI FERR) .............. 233
89 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Criméia Leste (PI FERR) .................... 234
90 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Finsocial (PI FINS) ...................... 235
91 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Finsocial (PI FINS) ............................. 236
92 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Madri e Itaipu (PI GARA) ......... 237
93 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Madri e Itaipu (PI GARA) ............... 238
94 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Urias Magalhães e Nova
Esperança (PI GENT) ............................................................................................. 239
95 - Mapa dos espaços livres da Micro-Regiões Urias Magalhães e Nova Esperança
(PI GENT) ............................................................................................................... 240
96 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Goiânia 2 (PI GOI2) ..................... 241
97 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Goiânia 2 (PI GOI2) ........................... 242
98 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Guanabara e Aldeia do Valle
(PI GUA) ................................................................................................................. 243
99 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Guanabara e Aldeia do Valle
(PI GUA) ................................................................................................................. 244
100 - Diagrama dos Espaços livres das Micro-Regiões Santo Hilário e Pedroso
(PI HILA) .............................................................................................................. 245
101 - Mapa dos Espaços livres das Micro-Regiões Santo Hilário e Pedroso
(PI HILA) .............................................................................................................. 246
102 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Campus Universitário e
Pq. dos Cisnes (PI ITAT) ...................................................................................... 247
103 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Campus Universitário e
Pq. dos Cisnes (PI ITAT) ...................................................................................... 248
104 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Santa Genoveva e Jaó (PI JAO) 249
xix

105 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Santa Genoveva e Jaó (PI JAO) .... 250
106 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Sudoeste e Jardins (PI JATL) 251
107 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Sudoeste e Jardins (PI JATL) ...... 252
108 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Santa Rita e Bairro Jardim
Botânico (PI JDBO) ............................................................................................ 253
109 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Santa Rita e Bairro Jardim
Botânico (PI JDBO) ............................................................................................ 254
110 - Diagrama dos espaços livres do Plano de Informação Jardim Goiás (PI JG51). 255
111 - Mapa dos espaços livres do Plano de Informação Jardim Goiás (PI JG51)....... 256
112 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Solar Ville (PI MAI) ................ 257
113 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Solar Ville (PI MAI)....................... 258
114 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Novo Mundo (PI MUN) .......... 259
115 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Novo Mundo (PI MUN) .................. 260
116 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Vila Nova, L. Universitário e
B. Feliz (PI NOVA) ............................................................................................. 261
117 - Mapa dos Espaços livres das Micro-Regiões Vila Nova, L. Universitário e
B. Feliz (PI NOVA) ............................................................................................. 262
118 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Granville, Goiá e João Braz
(PI PIJB) ............................................................................................................ 263
119 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Granville, Goiá e João Braz
(PI PIJB) ............................................................................................................ 264
120 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Pedro Ludovico, Redenção e
Santo Antônio (PI PL) ......................................................................................... 265
121 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Pedro Ludovico, Redenção e
Santo Antônio (PI PL) ......................................................................................... 266
122 - Diagrama dos espaços livres das Micro-Regiões Portal do Sol e Laranjeiras
(PI PLA) ............................................................................................................. 267
123 - Mapa dos espaços livres das Micro-Regiões Portal do Sol e Laranjeiras
(PI PLA) ............................................................................................................. 268
124 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Jardim América (PI SERR) ..... 269
125 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Jardim América (PI SERR) ........... 270
126 - Diagrama dos espaços livres da Micro-Região Vera Cruz (PI VERA) ............. 271
127 - Mapa dos espaços livres da Micro-Região Vera Cruz (PI VERA) .................... 272
128 - Diagrama dos espaços livres do Plano de Informação Campus Samambaia
da UFG (PI UNI) ............................................................................................... 273
129 - Mapa dos espaços livres do Plano de Informação Campus Samambaia da
UFG (PI UNI) ................................................................................................... 274
130 - Dados brutos das variáveis: y - índice de área verde (em m².hab-1) em função de
x - densidade demográfica (em hab.km-²), por micro-região de Goiânia ........... 276
131 - Gráfico de y’ = log y versus x’ = log x, correspondente aos dados da tabela 33 .. 278
132 - Gráfico de y’ = log (y + 1) versus x’ = log (x + 1), correspondente aos dados
da tabela 35 .......................................................................................................... 283
133 - Variação do IAV em função da densidade demográfica e do índice de dilapidação
do patrimônio público em Goiânia (variáveis com dados transformados) .......... 284
xx

RESUMO

Desenvolveu-se uma abordagem do ecossistema urbano, tendo como objeto de


estudo a cidade de Goiânia. O seu primeiro Plano Diretor foi elaborado sob a influência de uma
das concepções marcantes do urbanismo mundial, a Cidade-Jardim de Howard. Com ênfase neste
plano e com base na sua evolução urbanística, buscou-se uma identificação preliminar dos agentes
sociais produtores do espaço urbano goianiense.
Realizou-se a classificação e quantificação dos espaços livres e das áreas verdes da
cidade. A vegetação, em quantidade (m².hab-1) e em qualidade (tipologia), com distribuição
espacialmente adequada, cumpre importante papel na manutenção do equilíbrio do ecossistema
urbano, exercendo efeitos ambientais benéficos sobre a qualidade de vida. Por isso, um dos
indicadores do desenvolvimento urbano é o Índice de Área Verde (IAV).
A evolução dos espaços livres, como um indicador do IAV, em correlação com a
evolução da densidade demográfica, como um indicador da presença humana no ambiente,
permitiu prever a quantidade de área verde por habitante urbano. O IAV calculado da capital de
Goiás é de 100,25 m².hab-1. Em relação ao que foi estabelecido no plano de criação da cidade em
1938, ele sofreu uma redução per capita de 17,68%. Nos próximos 15 anos, prevê-se que este
índice será 54,4% menor do que o atual, decaindo para 45,71 m².hab-1, caso persista a política de
privatização dos espaços públicos.
As áreas verdes são bens públicos de uso comum da população, inalienáveis e
imprescritíveis. Apesar disso, elas vêm se reduzindo com o tempo. Calculou-se o grau de
dilapidação do patrimônio público, que se constitui num fator de degradação da qualidade de vida
urbana. Foi sugerida, dentre outras medidas, a adoção de um programa de cadastramento e
monitoramento do patrimônio ambiental de Goiânia.

ABSTRACT

This project is a study of the eco-system of the city of Goiânia (Goiás). Goiânia’s
first Directive Plan was created according to the Garden City of Howard, one of the most
important urban conceptions in the word. Using this plan and its urbanist evolution, one has tried
to make a preliminary identification of the social agents, which produced the urban spaces of
Goiânia.
A classification and qualification of the open spaces and “green areas” of the city
has been made. The quantity of vegetation (m².inhab.-1) and its quality (typing), when distributed
adequately is important to the preservation of the urban eco-system, having important
environmental effects on the quality of life of the population. The “green area” rate (Índice de
Área Verde – IAV) is, therefore, one of the indicators of urban development.
Changes in the open spaces, as indicators of IAV, in relation with changes in
demographic density, indicative of human presence in the environment, have allowed the
prevision of the amount of “green area” per urban inhabitant. The IAV calculated for Goiânia is
100,25 m². inhab.-1, having suffered a per capita reduction of 17,68% in relation to the IAV
established in the original city plan in 1938. In the next fifteen years it is possible forecast that the
IAV will be 54,4% smaller than it is at the moment, decreasing to 45,71 m².inhab.-1, if the
privatization policy regarding publics spaces should persist.
The “green areas” are unalienable and imprescriptible public property destined for
common use. In spite of this, these areas have been decreasing over the years. The degree of
deterioration of public assets has been calculated and constitutes a factor in the decay in urban life
quality. The adoption of a programme to register and monitor the environmental assets of Goiânia
is suggested, among other measures.
xxi

ABREVIATURAS UTILIZADAS

B.A. - Bilhões de anos


Boc - Balanço de ondas curtas
Bol - Balanço de ondas longas
CAO - Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público do
Estado de Goiás
CBD - Central Business District
CDN - Centro de Negócios
CELG - Centrais Elétricas de Goiás
CIAM - Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna
COMDATA - Companhia de Dados do Município de Goiânia
COMOB - Companhia de Obras e Habitação do Município de Goiânia
CPU - Unidade Central de Processamento
DF - Distrito Federal
DNA - Ácido desoxirribonucléico
DVOP/SEVOP - Departamento/Secretaria de Viação e Obras Públicas do Estado de Goiás
EIA - Energia Interna de Agitação
ELM - Energia de Ligação Média
EMCIDEC - Empresa de Ciência e Tecnologia do Estado de Goiás
EUA - Estados Unidos da América
FUNAPE - Fundação de Apoio à Pesquisa /UFG
FUMDEC - Fundação Municipal de Desenvolvimento Comunitário de Goiânia
IAV - Índice de Área Verde
IBAMA - Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis e do Meio Ambiente
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICB - Instituto de Ciências Biológicas da UFG
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano
IESA - Instituto de Estudos Sócio-Ambientais
INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
INMET – Instituto Nacional de Meteorologia
INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
IPLAN - Instituto de Planejamento Municipal de Goiânia
IV - Radiação infravermelha
LBA/GO - Legião Brasileira da Assistência em Goiás
m.a. - milhares de anos
M.a. - Milhões de anos
MLCP - Movimento de Luta pela Casa Própria
MUBDG - Mapa Urbano Básico Digital de Goiânia
OCDE - Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PDIG - Plano de Desenvolvimento Integrado de Goiânia
PEA - População economicamente ativa
PI - Plano de Informação
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
POLOCENTRO - Programa de Desenvolvimento dos Cerrados
PRODOESTE - Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Centro-
Oeste
PROTERRA - Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e
Nordeste
xxii

PUG - Plano de Urbanização de Goiânia


RAM - Random Access Memory
REM - Radiação eletromagnética ou energia radiante
RL - Radiação líquida disponível
RNA - Ácido ribonucléico
ROM - Read Only Memory
RV- Radiação visível
SANEAGO - Empresa de Saneamento de Goiás
SEFIN – Secretaria Municipal de Finanças de Goiânia
SEMMA - Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Goiânia
SEPLAM - Secretaria de Planejamento do Município de Goiânia
SEPLAN - Secretaria de Estado de Planejamento de Goiás
SGI - Sistema de Informações Geográficas
SIGGO - Sistema de Informações Geográficas de Goiânia (software desenvolvido pela
COMDATA)
SUDAM - Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia
SUDECO - Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste
TE - Índice de Temperatura Efetiva
TELEGOIÁS - Empresa de Telecomunicações de Goiás
TGS - Teoria Geral dos Sistemas
U.A. - Umidade absoluta
U.R. - Umidade relativa
U.S. - Umidade de saturação
UCG - Universidade Católica de Goiás
UFG - Universidade Federal de Goiás
UNESCO – United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
UV - Radiação ultravioleta
ZPA-I - Zona de Proteção Ambiental I
ZPA-II - Zona de Proteção Ambiental II
ZPA-III - Zona de Proteção Ambiental III
ZPA-IV - Zona de Proteção Ambiental IV
ZV’s - Zonas Verdes
ZV-C - Zona Verde de Conservação
ZV-E - Zona Verde Especial
ZV-P - Zona Verde de Preservação
ZV-T - Zona Verde de Transição
1

Parte I – OBJETIVOS, CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO E


MÉTODOS
“Nossa fé em nós mesmos deveria nos permitir concentrar o olhar num
ponto situado mais além da nossa capacidade de realização. O valor de um
objetivo não tem a ver com a sua acessibilidade, mas com a atração magnética
da direção que ele impõe”.
Pierre Dansereau (1999)

1.1. OBJETIVOS DO ESTUDO

1.1.1. Objetivo Geral

Estudar o ecossistema urbano com base num tripé das áreas de


conhecimento - ecologia humana, bioclimatologia e ecofisiologia vegetal -,
fornecendo subsídios para a avaliação teórica dos efeitos ambientais da
vegetação sobre a qualidade de vida urbana.

1.1.2. Objetivos específicos

Desenvolver uma abordagem do meio urbano de Goiânia,


periodizando preliminarmente a história da sua evolução urbanística, procurando
identificar a relação entre os agentes produtores do espaço urbano, na sua
primeira fase, com o desenvolvimento do Plano Original.
Formular um indicador ambiental urbano que possa informar sobre
o uso do solo e de forma correlata sobre a permeabilidade do solo, enquanto
instrumento confiável de análise, avaliação e implementação de uma política de
ocupação do espaço e de desenvolvimento urbano sustentável.
Levantar, classificar e quantificar os espaços livres do município,
caracterizando preliminarmente as áreas verdes da zona urbana e da zona de
expansão urbana, visando determinar o índice de área verde (IAV) de Goiânia,
em metros quadrados por habitante, conforme metodologia descrita na Seção
1.3.1.
Identificar as áreas públicas constantes dos planos de loteamento,
de acordo com o memorial e a planta aprovada, bem como atualizar o uso do
solo das mesmas, visando quantificar as que foram desvirtuadas,
proporcionando subsídios para a elaboração de políticas de gestão do patrimônio
ambiental urbano.
Calcular o índice de dilapidação do patrimônio público, por micro-
região, como um indicador da degradação das áreas verdes do Município de
Goiânia, conforme metodologia descrita na Seção 1.3.1.
Realizar a análise estatística dos fatores densidade demográfica e
índice de dilapidação do patrimônio público, por micro-região, enquanto
indicadores da presença humana no meio urbano de Goiânia, procurando
estabelecer o tipo de associação entre estes fatores e o IAV de Goiânia.
2

A partir da análise estatística, calcular a equação de regressão entre


as variáveis: dependente (índice de área verde - IAV) e explanatória (densidade
demográfica), para que se possa estimar o IAV em função do adensamento
humano de Goiânia.
Analisar a política municipal de meio ambiente de Goiânia, a partir
da correlação dos IAV’s (m².hab.-1) com a densidade demográfica (hab.km-²) por
plano de informação ou micro-região da cidade.

1.2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

1.2.1. Localização

A área objeto de estudo é o município de Goiânia. Situa-se no


Planalto Central do Brasil, a cerca de 764,5 metros acima do nível do mar,
latitude 16º40’43” e longitude 49º15’14”. Com uma área de 789,7 km², Goiânia
ocupa 0,23% da área total do Estado, abrigando 1.090.581 habitantes (IBGE,
2000).
O Planalto Central do Brasil situa-se sob o Domínio dos Cerrados,
que pelo caráter florístico, faunístico e geomorfológico e pela extensão de quase
dois milhões de quilômetros quadrados, se constitui no ponto de equilíbrio dos
grandes domínios morfoclimáticos e fitogeográficos do Brasil. Em termos de
paisagem vegetal, a cidade de Goiânia está localizada no centro da área “core”
ou núcleo central da Província Biogeográfica do Cerrado (Barbosa, 1993) 1.

1.2.2. Meio Físico

1.2.2.1. Climatologia

O Planalto Central do Brasil, segundo o modelo de classificação


climática de Köppen (Ayoade, 19912, p. 232; Ometto, 1981, p. 58-653, p. 390) é
do tipo Aw, tropical úmido - clima de savana, caracterizado por apresentar duas
estações bem definidas – uma chuvosa, de outubro a março e outra seca, de abril
a setembro, no qual a precipitação anual é menor que 10 vezes a precipitação do
mês mais seco (sendo esta inferior a 60 mm) e a temperatura de todos os meses
maior que 18ºC.
No verão, o elevado índice de concentração pluviométrica decorre
da influência principal da Massa Equatorial Continental – um tipo de massa de
ar quente e úmida, formada pelos ventos alísios de NE que se misturam pela
região do Amazonas e se dirigem através das planícies das drenagens naturais
1
BARBOSA, A. S. (Coord.) Goiânia: coração do cerrado - um programa para arborização. Goiânia: I.T.S., 1993.
54p. /n.p./.
2
AYOADE, J. O. Introdução à climatologia para os trópicos. Tradução de Maria Juraci Zani dos Santos. 3 a. ed.
Rio de Janeiro: Bertrand, 1991. 332 p.
3
OMETTO, J. C. Bioclimatologia vegetal. São Paulo: Ed. Agronômica Ceres, 1981. 440p.
3

em direção à zona de depressão barométrica localizada na região central do


continente Sul-Americano (Planície do Chaco e Pantanal Mato-grossense). Sob
esta influência, o clima regional do Centro-Oeste apresenta alta temperatura e
umidade e pequena amplitude térmica anual (Monteiro, 1951)4.
No semestre de maior precipitação pode ocorrer um período de
total interrupção de chuva, com duração variável de 5 a 25 dias, geralmente em
janeiro. Trata-se de um fenômeno que ocorre particularmente na região
denominado veranico, causado pela alteração do ângulo de inclinação da Terra
(em média de 2 graus), o que permite a penetração das massas quentes e secas
oriundas da depressão do Chaco e o conseqüente afastamento momentâneo das
massas de ar úmidas.
No inverno ocorre um recuo da Massa Equatorial Continental em
direção ao equador, sendo substituída pela Massa Polar Atlântico Sul, que
avança pelas planícies platina e paraguaia, contornando o extremo ocidente do
Planalto Brasileiro, resultando num grande decréscimo pluviométrico e numa
sensível diminuição da temperatura. A passagem de anticiclones de origem polar
pode provocar quedas rápidas da temperatura por cerca de dois dias, num
fenômeno conhecido regionalmente por friagem. A circulação de inverno
realiza-se ainda em função de outra massa de ar quente que sopra
persistentemente de leste e nordeste (Massa Tropical Atlântica). É deste choque
entre duas massas de ar de direções e temperaturas diferentes que resulta a
conformação do regime térmico e da circulação dos ventos na região Centro-
Oeste (Monteiro, 1951).
Entretanto, Nimer (1989)5 destaca que dentro do grande sistema de
clima tropical quente e úmido da Região Centro-Oeste, pela conjunção de
fatores locais de relevo e altitude, diferencia-se uma modalidade de clima
subquente, no qual ocorre pelo menos um mês com média térmica inferior a 18º
C, abrangendo uma área semicontínua dos municípios de Goiânia e de
Anápolis, do Distrito Federal e da Serra do Caiapó; bem como uma modalidade
de clima subúmido, abrangendo quase todo o Estado de Goiás e parte dos
Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, onde o período de insuficiência
de chuva dura de 5 a 7 meses, sendo de 4 a 6, muito seco (Inverno-Primavera) e
estação úmida é mais curta do que se verifica no restante da região Centro-
Oeste, com chuvas ainda mais concentradas no Verão, gerando grandes
excedentes hídricos e enchentes fluviais.
A seguir expõe-se uma breve revisão bibliográfica sobre a atuação
dos principais elementos climáticos na área objeto do estudo, obtidos de
registros da Estação Meteorológica de Goiânia, referentes à série histórica de
1939 a 1987 (Casseti, 1991)6 e de 1949 até 1987 (Emcidec, 1994)7.
4
MONTEIRO, C. A. F. Notas para o estudo do clima do Centro-Oeste brasileiro. Revista Brasileira de
Geografia, Rio de Janeiro, ano XIII, 1, p. 2-46, jan/mar., 1951.
5
NIMER, E. A circulação atmosférica e as condições do tempo como fundamento para a compreensão do clima.
Geografia do Brasil, vol. 1, Região Centro-Oeste. Rio de Janeiro: IBGE, 1989, p. 23-33.
6
CASSETI, V. Ambiente e apropriação do relevo. São Paulo: Contexto, 1991. 147p.
4

1.2.2.1. a) Precipitação pluviométrica

As chuvas em Goiânia apresentam uma variação sazonal, com


maiores índices de precipitação de novembro a abril e com menores de maio a
outubro, caracterizando duas estações nítidas – um semestre úmido e outro,
seco. Os dados da Emcidec (op. cit.) mostram (v. figura 1), que as precipitações
máximas mensais são observadas entre outubro e janeiro, com totais superiores a
400 mm e máximas diárias superiores a 100 mm que podem ocorrer no período
de dezembro a fevereiro; e que as precipitações mínimas mensais iguais a zero
são observadas entre junho e agosto, nos quais as mensais normais giram em
torno de 8 mm/mês.
Na série histórica de 1939/87 elaborada por Casseti (op. cit.), o
total pluviométrico normal anual é de 1.551 mm, enquanto no da Emcidec (op.
cit.), para o período 1949/87, é de 1.486,9 mm, sendo 86% proveniente do
semestre úmido e apenas 14% do semestre seco. Casseti (op. cit.) observa que
até 1969 a precipitação se caracterizava por oscilações em torno da média e,
após esta data, apresenta a tendência de assumir valores acima da média da série
histórica.

1.2.2.1.b) Temperatura

A temperatura compensada por Casseti (op. cit.) para o período


1939/87 é de 22,6ºC. Na década de 40 ela se encontrava na casa de 21ºC,
passando para 23ºC na de 1980, acusando um acréscimo de 2ºC neste período.
Da mesma forma, segundo o autor, a temperatura máxima média e
a temperatura mínima média passaram a apresentar tendência térmica crescente,
a partir de 1966, com valores superiores às médias de 29,6ºC e de 16,4ºC,
respectivamente, da série histórica analisada.
A figura 2 ilustra os dados levantados pela Emcidec (op. cit.),
segundo os quais, as mensais normais indicam que a temperatura média está
compreendida entre 20ºC e 24,5ºC. Os meses mais quentes coincidem com o
semestre úmido e os mais frios com o seco.
Vê-se ainda na mesma figura que a temperatura máxima absoluta
nos meses quentes supera a casa de 34ºC, podendo chegar a 37,9ºC em outubro,
enquanto neste período a temperatura não cai abaixo de 10ºC. Nos meses mais
frios, a temperatura mínima absoluta é sempre inferior a 6ºC, chegando a 2,3ºC
em julho e que, mesmo neste período, ocorrem máximas absolutas superiores a
33ºC, com a média das máximas acima de 29ºC.

7
EMCIDEC. Empresa Estadual de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico-Social de Goiás. Estudo
de Impacto Ambiental do loteamento de interesse social da Fazenda São Domingos. Goiânia: DBO
Engenharia, 1994. 248 p.
5

Figura 01 – Precipitação pluviométrica mensal – série 1949/87, em Goiânia


(Fonte: INMET –10º DISME, Goiânia, apud Emcidec, op. cit.)

1.2.2.1.c) Umidade relativa do ar e Evaporação

A média anual da umidade relativa da série 1939/87 levantada por


Casseti (op. cit.) é de 68,7%. No início do período, a umidade do ar apresentava
valores acima da média, entre 70 e 75%. A partir de 1966, são encontrados
valores entre 60 e 65%. Para o autor, a evolução higrométrica segue uma
6

tendência decrescente como reflexo do efeito térmico (crescente), decorrente da


redução da cobertura vegetal.

Figura 02 – Temperatura de Goiânia – série histórica 1949/87


(Fonte: INMET –10º DISME, Goiânia, apud Emcidec, op. cit.)

Nas figuras 3 e 4 são apresentados os dados da Emcidec (op. cit.)


sobre a marcha anual da umidade relativa do ar e da evaporação de Piche. No
semestre úmido e mais quente, a umidade relativa é elevada, apresentando uma
umidade normal sempre acima de 66%; os totais evaporimétricos são baixos,
com valores mensais inferiores a 145 mm. No semestre seco e mais frio, a
7

umidade relativa é baixa, apresentando uma umidade normal sempre inferior a


73%; os totais evaporimétricos apresentam, obviamente, valores mensais sempre
acima de 100 mm.

Figura 03 – Umidade relativa do ar em Goiânia – 1949/87


(Fonte: INMET –10º DISME, Goiânia, apud Emcidec, op. cit.)
8

Figura 04 – Evaporação mensal de Goiânia – série 1949/87


(Fonte: INMET –10º DISME, Goiânia, apud Emcidec, op. cit.)

1.2.2.1.d) Insolação e Nebulosidade

A insolação é a exposição à radiação solar, isto é, o número de


horas de brilho solar diário. Em geral os dias não são completamente limpos,
existindo nuvens com diferentes concentrações de vapor, água e gelo, e com isso
pode alterar a radiação incidente sobre a superfície do solo. Portanto, as
mudanças de condições de nebulosidade, poeira e umidade da atmosfera afetam
a insolação. A duração máxima do dia ou insolação máxima gira em torno de 12
9

horas nos trópicos. O heliógrafo é o aparelho que mede a insolação (Ometto, op.
cit.).
A nebusolidade ou a quantidade de nuvens é visualmente estimada
pela proporção de céu coberto por nuvens de qualquer tipo. A unidade de
medida da nebulosidade é o okta que corresponde à área de um oitavo do céu
dentro do campo de visão do observador (Ayoade, op. cit.).
A nebulosidade anual média sobre a Terra varia de acordo com a
distribuição latitudinal e, dentro de uma mesma zona, com o local, a estação do
ano e com a hora do dia. Em geral, quanto maior a latitude maior a
nebulosidade, embora ocorra alteração de valores em função da dinâmica e da
circulação atmosférica: no Equador, os valores ligeiramente mais elevados estão
associados aos centros de baixa pressão e ao fluxo convergente de ar; nas zonas
subtropicais, os valores muito baixos são causados pelas células de alta pressão
e ao ar subsidente (Ayoade, op. cit.).
Nos trópicos continentais, a nebulosidade apresenta grande
variação sazonal e até diária, sobretudo no período vespertino, por causa dos
processos convectivos. Com o resfriamento noturno da atmosfera, o ar torna-se
estável e a nebulosidade diminui. Mas, sobre as superfícies hígricas tropicais a
nebulosidade apresenta um máximo à noite. As chuvas tropicais estão
associadas às nuvens do tipo cumulonimbus que podem se estender da superfície
terrestre até uma altura de seis mil metros. As nuvens estratiformes são raras e,
às vezes, podem persistir à noite retardando o resfriamento noturno (Ayoade, op.
cit).
Nas figuras 5 e 6 são mostrados os dados da Emcidec (op. cit.)
ilustrando a marcha anual da insolação e da nebulosidade mensal em Goiânia.
Nelas se vêem que no semestre úmido ocorrem os menores índices de insolação
(sempre abaixo de 200 horas/mês) e, naturalmente, os maiores de nebulosidade
(sempre acima de 6,4). Por outro lado, no semestre seco ocorrem os maiores
índices de insolação (sempre acima de 218 horas/mês) e, naturalmente, os
menores de nebulosidade (sempre abaixo de 5,5). O máximo de insolação ocorre
em julho ou agosto com normal de 9,3 horas/dia e o mínimo em dezembro com
5,8 horas/dia. O total anual normal de Goiânia é de 2.650,2 horas de insolação.

1.2.2.1.e) Velocidade e direção dos ventos

No contexto da Região Centro-Oeste, durante o período chuvoso


predominam os ventos do norte em função da Massa Equatorial Continental, que
traz umidade concentrada da Amazônia. Em grande parte do ano, contudo, a
região é dominada por ventos de nordeste e leste, provenientes do ciclone do
Atlântico Sul. Sob ação da Massa Tropical Atlântica, sopram ventos secos que
asseguram condições de tempo bom, com dias ensolarados e com altas
temperaturas, principalmente no outono e primavera.
10

Figura 05 – Insolação média de Goiânia, 1949/87


(Fonte: INMET –10º DISME, Goiânia, apud Emcidec, op. cit.)

Figura 06 – Nebulosidade média em Goiânia – 1949/87


(Fonte: INMET –10º DISME, Goiânia, apud Emcidec, op. cit.)

De acordo com dados coletados em Goiânia no período de 1986/91


pelo Centro Nacional de Pesquisa de Arroz e Feijão da Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (CNAPAF/Embrapa), apud Emcidec (op. cit.), pode-se
concluir que, no semestre úmido, os ventos originam-se de noroeste, com uma
freqüência média anual 10-23%. No semestre seco, os ventos sopram de leste-
sudeste, com uma freqüência média anual de 12-34%.
11

De acordo a bibliografia consultada, os ventos locais são


predominantes fracos, inferiores a 10 km/h, mesmo no período de transição
entre os semestres úmido e seco, quando os valores são os mais elevados do ano.

1.2.2.2. Geologia, geomorfologia e solos

De acordo com a Carta de Risco do Município (Nascimento et al.,


8
1991) , regionalmente a geologia é constituída por rochas do Arqueano (superior
a 4 B.A.) pertencentes ao Complexo Basal Goiano. De modo amplo, sobre estas
rochas ocorrem, em grande parte, coberturas detrito-lateríticas, formando
extensos chapadões aplainados por longos processos erosivos iniciados no
Período Terciário.
O Município de Goiânia, segundo Nascimento et al., (op. cit.),
situa-se no contato entre rochas metamórficas que foram submetidas a eventos
termotectônicos diversos, resultando numa orientação estrutural dos minerais
com gradiente de leste para oeste. As fraturas rochosas obedecem a padrões
preferenciais nas direções de nordeste-sudoeste e de noroeste-sudeste.
A área objeto deste estudo e suas adjacências encontram-se
inseridas no vasto Planalto Central Goiano, dentro de uma subunidade
conhecida como Planalto Rebaixado de Goiânia. Este compreende um extenso
planalto localizado a 850 - 950 metros, dissecado e rebaixado que, de acordo
com o trabalho citado, desenvolveu-se sobre litologias diversas, cristalinas e
metassedimentares, há bilhões de anos, cuja superfície é mantida por depósitos
de material clástico (ou fragmentos desagregados pela erosão mecânica),
produto de um passado de condições climáticas áridas.
De acordo com a Carta de Risco de Goiânia (Nascimento et al., op.
cit.), as principais unidades geomorfológicas municipais são os Terraços e
Planícies Fluviais da Bacia do Meia Ponte, os Fundos de Vale e o Planalto
Embutido de Goiânia. A primeira unidade citada encontra-se individualizada
pelos terraços fluviais, que estão vinculados às oscilações climáticas de um
passado recente e, pelas planícies fluviais de inundação, observadas nas atuais
linhas de drenagens hidrográficas do município.
Os terraços fluviais são constituídos por seixos rolados, cimentados
por uma matriz areno-argilosa, sotopostos por uma ampla seqüência aluvio-
coluvionar. As planícies fluviais de inundação são constituídas por sedimentos
arenosos, com intercalações silto-argilosas, onde se verificam fenômenos de
hidromorfismo (solos do tipo Glei e Aluviais), sujeitos a enchentes.

8
NASCIMENTO, M.A.L.S. et al. Carta de Risco de Goiânia. Goiânia: IPLAN, 1991.

“Depósitos aluvionares” referem-se a “aluvião - depósitos originados pela ação fluvial, em que se acumulam
nas planícies sedimentos orgânicos e inorgânicos (argila, silte, cascalho, seixo, areia ou outro material de detrito
e matéria orgânica)”, cf. Lima-e-Silva (1999, p.10); “Depósitos coluvionares” referem-se a “colúvio – material
transportado de um local para outro, principalmente pelo efeito da gravidade, ocorrendo no sopé das vertentes ou
em lugares pouco afastados dos declives situados acima, de constituição heterogênea em termos
granulométricos, devido à pequena seleção do agente transportador” (id., ibid., p. 55).
12

Os Fundos de Vale são unidades azonais que acompanham as


drenagens do município de Goiânia, onde se acentuam as declividades
topográficas. Para além do conceito convencional de “leito maior e menor do
rio”, os fundos de vale abarcam uma unidade geomorfológica na qual o processo
de urbanização, nestes sítios declivosos, está relacionado ao desmatamento e
outras formas desordenadas de produção e apropriação do espaço, resultando
freqüentemente em processos erosionais (sulcos, ravinas e voçorocas).
É comum a ocorrência de diversificado material de cobertura,
associados a solos pouco desenvolvidos, sendo freqüente a exposição de rochas
e do lençol freático nos relevos desta unidade.
O Planalto Embutido de Goiânia é constituído predominantemente
por formas suaves ou moderadamente convexas. Em condição natural, o relevo
encontra-se em equilíbrio dinâmico entre declividades e cobertura vegetal. Nesta
condição, o grau de dissecação responde pelo gradiente das vertentes, sendo
estas ora tabulares ora convexas de onde emergem morros residuais mais
elevados, sustentados no maciço de rocha subjacente. São exemplos os morros
da Serrinha e do Mendanha, testemunhos da evolução morfopedológica do
Planalto Embutido de Goiânia.
Em condição de desequilíbrio, predominam a substituição da
cobertura natural por usos impermeabilizantes do solo, intensificadores do
escoamento superficial concentrado e dos processos erosivos, constituindo-se
em elementos desestabilizadores da paisagem.
No geral, os terrenos desta unidade são altos e secos, de relevo
suave a fortemente ondulado, recobertos por solos do tipo Latossolos,
Podzólicos, Gleissolos, Cambissolos, Litossolos e Solos Aluviais. O primeiro
grupo citado predomina largamente sobre os outros, o que contribui para a
existência de uma malha hidrográfica bastante rica no município de Goiânia,
associado aos fatores de ordem climática e às características litológicas já
descritas.
Os mananciais hídricos municipais pertencem à bacia da margem
direita do Rio Meia Ponte. Nos limites do Município destacam-se os Ribeirões
João Leite, Dourados, Anicuns e Caveirinha, constituindo-se nos elementos
condicionadores do clima e do relevo. O Rio Meia Ponte se destaca formando
vastas planícies de inundação no sentido noroeste-sudeste da cidade.
Casseti (op. cit.) define a geomorfologia como uma ciência que
procura explicar dinamicamente as transformações morfológicas (relativos à
forma) e fisiológicas (relativos à função) do geo-relevo, incorporado
organicamente ao movimento histórico das sociedades.
De acordo com estudo do autor citado sobre a dinâmica das
vertentes em ambientes tropicais, podemos reconhecer a influência da cobertura
vegetal na proteção dos nossos solos. A evolução das vertentes ocorre através de
um balanço morfogenético, estabelecido pela relação entre dois componentes: o
primeiro, denominado perpendicular, caracteriza-se pela infiltração, responsável
13

pelo processo de pedogeneização (acumulação de material formador dos solos).


O segundo componente, chamado paralelo, caracteriza-se pelo fluxo superficial,
responsável pelo processo de morfogênese (transporte do material pré-elaborado
e formação do relevo).
A chuva, nas regiões intertropicais, é um fator da maior
importância na dinâmica das vertentes. Na presença da cobertura vegetal, a
intensa precipitação pluviométrica acentua a infiltração (componente
perpendicular), implicando em reações bioquímicas e decompositoras
responsáveis pelo desenvolvimento dos solos tropicais. Por outro lado, na
ausência do revestimento florestal, há um aumento do fluxo por terra
(componente horizontal). Neste caso, o escoamento realiza o transporte do
material pré-elaborado pelo componente perpendicular para os fundos de vale
(Casseti, op. cit.).
Nos biomas tropicais, uma vertente protegida pelo manto vegetal
encontra-se, – diz o autor –, numa fase biostásica. Nesta condição, ocorre o
predomínio da infiltração sobre o escoamento (pedogênese > morfogênese). A
infiltração, em meio ácido, promove a alteração dos silicatos de alumina
(feldspato), originando a caulinita que, juntamente com o quartzo, constituem a
rocha matriz dos nossos solos. Os hidróxidos de ferro e alumínio também ficam
incorporados ao solo, enquanto os elementos minerais potássio, sódio, cálcio,
magnésio e silício são transportados, formando as rochas organógenas.
Por outro lado, uma vertente na condição de fase resistásica,
segundo a terminologia do mesmo autor, mostra uma evolução diferente. Esta
situação pode ser derivada de alterações climáticas naturais, ocorridas no tempo
geológico (escala de milhares a milhares de anos), mas também por intervenções
antrópicas implicando em rápida denudação do solo. Os elementos minerais e os
hidróxidos de ferro e alumina são transportados pelo componente paralelo,
causando turbidez dos cursos d’água. Por conseqüência ocorre uma redução da
camada pedogeneizada (empobrecimento do solo) e o assoreamento de vales,
isto é, pedogênese < morfogênese.
Neste contexto evolutivo das vertentes, em que os seus
componentes estabelecem uma relação de equilíbrio dinâmico, podemos avaliar
a potencialidade erosiva da gota da chuva. Esta se constitui num importante
agente erosivo nas condições de solo e de clima tropicais.
Como se sabe, a erosão do solo é um processo de desprendimento e
de transporte das partículas edáficas pelos agentes erosivos. Bertoni (19[--])9
demonstrou que muitas destas partículas podem ser atiradas a mais de 0,6
metros de altura e a mais de 1,5 metros de distância. Se o terreno está desnudo
de vegetação, uma chuva muito forte golpeia cada hectare do terreno com
milhares a milhões de gotas de chuva, impactando o solo.

9
BERTONI, J. A potencialidade erosiva da gota da chuva. Campinas: IAC, 19[--]. /n.p./.
14

As gotas da chuva desprendem centenas de toneladas de partículas


de solo, salpicando-as e imprimindo-lhes energia, em forma de turbulência.
Acentua-se, portanto, o fluxo superficial que é o componente erosivo do balanço
morfogenético da vertente. A força com que a gota de chuva golpeia o solo pode
ser calculada pela seguinte equação:

KE = 13373 – 9820 log I

Sendo KE, a energia cinética da chuva natural, em quilograma por milímetro; e,


I a intensidade pluviométrica, em milímetro por hora (Bertoni, op. cit.).
Na área objeto deste estudo, os solos apresentam uma grande
variedade de tipos, mas são freqüentes os Latossolos, que possuem uma textura
argilosa, eventualmente variando para areno-argilosa. A textura argilosa
predominante favorece a erodibilidade deste tipo de solo, dependendo da
declividade e da cobertura vegetal, pois o escoamento pode predominar sobre a
infiltração. Num trabalho de Bertoni at al., apud Casseti (op. cit.) demonstrou-se
uma perda anual média de 21,1 toneladas de terras por hectare e de 5,7% de
água da chuva num solo arenoso, contra 9,5% e 3,3%, respectivamente, num
solo terra roxa, com base em 1300 mm de chuva e declives entre 8,5% e 12,8%.
Conforme se vê na tabela 1, que ilustra as observações realizadas
em Goiânia pelo autor citado, está demonstrado o efeito imediato da cobertura
vegetal ou mesmo da pastagem na contenção da estabilidade da vertente. As
parcelas com uso de solo direto e que implicam em desnudamento da cobertura
vegetal nativa, responderam pela quase totalidade das perdas de solo (99,96%) e
de água (94,77%), enquanto as parcelas com uso de solo indireto, cobertas por
mata, apresentaram valores insignificantes.

Tabela 1 – O efeito da cobertura vegetal sobre as perdas de terra e água, em Latossolo


Vermelho-Amarelo Eutrófico de Goiânia (1980/81)
Terra % relativo ao Água % relativo ao
Parcela Declive
(t/ha/ano) total (% chuva) total
6,70 31,638 41,64 13,41 37,51
Cultivo 11,00 51,655 51,65 10,20 28,54
40,60 0,349 0,35 2,78 7,74
4,70 0,059 0,07 0,71 1,98
Pastagem 14,40 0,230 0,23 3,66 10,23
36,00 0,101 0,10 3,12 8,74
14,40 0,010 0,01 0,58 1,62
Mata 15,80 0,032 0,03 0,43 1,21
40,60 - - 0,86 2,40
Total - - 100,00 - 100,00
Fonte: Casseti (1991, p. 81)

Os dados da tabela 1 reforçam a importância, para o equilíbrio do


meio urbano, da manutenção das áreas permeáveis e cobertas por vegetação
15

natural ou daquelas não edificadas que possam se manter permeáveis e de serem


revegetadas pelo processo de reflorestamento.

1.2.3. Meio Biótico

De acordo com Barbosa (1993), a fitogeografia do Município de


Goiânia reflete resquícios dos diferentes mosaicos paisagísticos que
caracterizam a Província Biogeográfica do Cerrado. Neste meio urbano ainda se
pode encontrar formações abertas como campo e cerrado stricto sensu,
ambientes de vereda, mata ciliar e fragmentos de interflúvio, implicando numa
grande diversidade florística urbana.
É provável que essa heterogeneidade de ambientes propicie
condições para a sobrevivência de muitas espécies animais.

1.2.3.1. Vegetação

A tabela 2 mostra levantamentos realizados por órgãos municipais


que atestam a existência de reservas urbanas como resquícios dos diferentes
tipos paisagísticos que caracterizam o Bioma Cerrado.
Embora adotando um sistema de classificação da vegetação
diferente da usada neste trabalho, os dados da tabela 2 mostram a existência de
mais de 9,5 milhões de metros quadrados de áreas de matas de diversas
características. Esse levantamento fornece uma noção da quantidade de
cobertura vegetal nativa, a partir da qual pode-se ter uma avaliação da flora
municipal no aspecto qualitativo.

Tabela 02 - Áreas de matas por características do Município de Goiânia


Quantidade de Área
Características da vegetação
matas (m²)
62 Floresta submontana 5.978.000
02 Floresta remanejada 27.000
07 Floresta estacional 695.000
07 Savana arbórea densa 576.000
13 Floresta de galeria dos vales encaixados 352.000
10 Floresta de galeria paludícola 309.000
01 Contato savana arbórea densa /floresta estacional 112.000
05 Vegetação secundária 170.000
01 Floresta aluvial 18.000
53 Matas não visitadas 1.287.000
Total geral 9.529.000
Fontes: IPLAN. Diagnóstico da vegetação residual do município de Goiânia, 1991; SEMMA. Levantamento em
planta cadastral de Goiânia, escala 1:10.000, 1996.

Na região noroeste de Goiânia, à margem direita do Rio Meia


Ponte, na antiga Fazenda São Domingos, incorporada à malha urbana de
Goiânia em 1993, existem vários fragmentos, de tamanho significativo, da
floresta de interflúvio (Emcidec, op. cit., p. 70-126).
16

A figura 7 mostra a localização desses fragmentos de reservas


naquela região da cidade, onde os solos eutróficos favoreceram a dominância de
florestas estacionais semideciduais, cobrindo no total uma área de 1.076.800 m²
(um milhão, setenta e seis mil e 800 metros quadrados). Nesses fragmentos, a
Emcidec (op. cit.) identificou 186 espécies arbóreas, constituindo-se numa
significativa biodiversidade em termos de vegetação urbana.

Figura 7 – Fragmentos de reservas florestais da “Fazenda São Domingos” – Região NW de


Goiânia (segundo Emcidec, 1994, p. 71)

O Parque Botafogo, instituído pelo Plano Diretor da Cidade em


1938, é uma das mais antigas reservas urbanas do Município de Goiânia.
Localiza-se na divisa dos setores Central e Leste Vila Nova. Possuía uma área
de 540 mil m² (v. adiante Seção 3.1.1, figura 19, letra f). Posteriormente, foi
dividido na década de 50 pelo prolongamento da Avenida Araguaia, ficando
com uma superfície de 176,4 mil m², à leste dessa via. Na área à oeste da
avenida com 98,8 mil m², foi implantado, em 1969, o Parque Mutirama.
As duas áreas são designadas popularmente pelo nome de “Bosque
da Araguaia”. Este bosque possui uma área de Cerradão (Parque Mutirama) e
uma área de transição para Mata de Galeria (Parque Botafogo), à margem
esquerda do córrego de mesmo nome que drena a reserva.
Hashimoto & Cruvinel (1995)10 relacionaram 51 espécies de
arvores nativas de cerradão e de mata para a execução do projeto de
reflorestamento heterogêneo do Parque Botafogo. Por sua vez, o levantamento
florístico do Parque Mutirama, realizado por Carneiro (1988)11, identificou 27
espécies dessas árvores.
10
HASHIMOTO, M. Y. (Eng. Agr.) & CRUVINEL, S. R. C. (Biolª). Relação quantitativa e qualitativa das
espécies vegetais a serem usadas no reflorestamento do Parque Botafogo. Goiânia: SEMMA, 1995.
11
CARNEIRO, M. A. N. C. (Biolª). Relação das espécies nativas identificadas existentes no Parque Mutirama.
Goiânia, 1988.
17

1.2.3.2. Fauna

De acordo com levantamento ornitológico do município de


Goiânia, realizado por Hidasi (1997)12, foi constatada a presença de 254
espécies, pertencentes a 18 ordens e 52 famílias diferentes. A avifauna
goianiense é significativa, pois corresponde a 20% do total das aves existentes
no país, expressando a diversidade local de ambientes. Para o autor citado, a
presença da vegetação típica do Planalto Central (cerradão, cerrado, campo sujo,
campo limpo e brejo) associada a uma vasta área de mata ciliar junto às margens
das drenagens municipais, contribui para esta numerosa e admirável presença de
aves em Goiânia.
Reforçando a opinião acima, retomamos o levantamento da
“Fazenda São Domingos”, na região NW de Goiânia (Emcidec, op. cit.). A
relação da avifauna observada constou de 46 famílias e 112 espécies,
destacando-se a presença da inhuma ou anhuma (Anhima cornuta Linnaeus,
1776), a ameaçada ave-símbolo do Estado de Goiás, habitante dos brejos e das
margens de rios, como as áreas lindeiras ao rio Meia Ponte.
Quanto a outros grupos faunísticos foram ali encontrados ofídios,
lacertílios, quelônios e crocodilianos, englobando 12 famílias e 20 espécies de
répteis; 3 famílias e 5 espécies de anfíbios; 11 famílias e 27 espécies de peixes.
Com relação a mastofauna, foram observadas ainda 8 famílias e 11
espécies, inclusive a lontra (Lutra longicaudis Olfers, 1818), um mamífero de
hábito carnívoro da família Mustelídea. Trata-se de uma espécie ameaçada de
extinção no Brasil, listada pela Portaria nº 1.522, de 19/12/1989, do IBAMA.
Nas reservas de matas desta região foram encontradas ainda populações de
macaco-prego (Cebus apella) e de mico-estrela (Callithrix sp).
A manutenção dessa relativa diversidade faunística dependeria da
execução de várias medidas. Estas foram estabelecidas judicialmente por ação
do Ministério Público, cabendo ao Governo do Estado de Goiás, como
empreendedor do projeto de loteamento da Fazenda São Domingos, a “execução
do zoneamento ambiental, da implantação da Área de Proteção Ambiental e da
criação de um Centro de Recuperação de Animais Silvestres”, dentre outras
(Martins Júnior, p. 145-59, 1996)13. Infelizmente, as medidas citadas não foram
executadas a contento. Com isso, acentuou-se o impacto da urbanização,
resultando no empobrecimento ainda maior do patrimônio ambiental de Goiânia.
A exemplo do caso citado, todo processo de urbanização implica na
substituição dos ambientes naturais pelos ambientes artificiais. Os ecossistemas
originais sofrem o processo de fragmentação e os que restam preservados,
geralmente, ocupam áreas geográfica e ecologicamente insuficientes. Privados
dos habitats necessários à sua sobrevivência, os animais migram ou são
localmente extintos.
12
HIDASI, J. Aves de Goiânia. Goiânia: Fund. Jaime Câmara, 1997. 324 p.
13
MARTINS JÚNIOR, O. P. Uma cidade ecologicamente correta. Goiânia: AB, 1996. 224 p.
18

As espécies de animais que sobrevivem ficam confinadas nos


resquícios de habitats remanescentes, sofrendo restrições de ordem trófica e
reprodutiva. Com o crescimento da cidade, a tendência é a supressão por
completo de todo o ambiente natural e a extinção total da fauna nativa.

1.2.4. Meio Social ou Antrópico

O Município de Goiânia tem uma área de 789,7 km²,


correspondente a 0,23% do território goiano, abrigando 1.090.581 habitantes, o
que representa 21,8% da população total do Estado de Goiás, segundo dados do
Censo 2000 do IBGE. Goiânia é a décima segunda cidade mais populosa do
país.
O Município de Goiânia faz limites com Goianápolis, Nerópolis,
Goianira, Aparecida de Goiânia, Aragoiânia, Guapó, Senador Canedo e
Trindade. A taxa anual de crescimento vegetativo da população urbana de
Goiânia era de 3,82% em 1940, passando para 2,52% em 1970, reduzindo para
2,24% em 1990. Em 1990, a população goianiense somava 920.838 pessoas e
em relação ao último censo demográfico, a taxa anual de crescimento foi de
1,84%.
O declínio da taxa de crescimento vegetativo da população urbana
de Goiânia está relacionado à redução da queda da fecundidade, isto é, uma
redução do número médio de filhos por pessoa e à diminuição do movimento
migratório para a capital do Estado. A redução da taxa de imigração para
Goiânia, por sua vez, se fez acompanhar pela elevação das taxas anuais de
crescimento das cidades da Grande Goiânia. Neste item, destaca-se Aparecida
de Goiânia que conta atualmente com uma população de 335.822 pessoas,
constituindo-se na cidade mais populosa do Estado, depois da capital, com uma
taxa média de crescimento anual de 7,35% (IBGE, Censo 2000).
De acordo com estudo do PNUD, a partir de dados da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílio, reunidos pelo Professor José Carlos
Libâneo (In: Becca, C. Aqui se vive bem. Gazeta de Goiás, Goiânia, 8-14 abr.
2001, p. 8), Goiânia ostenta o melhor desempenho do Índice de Condição de
Vida (ICV), comparativamente às doze maiores cidades brasileiras.
De acordo com o autor citado, a pesquisa do PNUD foi
desenvolvida com base no IDH que originou o ICV. Em síntese, alguns dos 27
indicadores agrupados que compõem o ICV são os seguintes:
 a taxa de analfabetismo da população goianiense com mais
de 15 anos caiu de 10,21% no período de 1981/85, para 6,31% em 1995/99,
havendo acréscimo de 3,9% na alfabetização;
 o número médio de anos de estudo da população com mais
de 25 anos saltou de 5,75 no período de 1981/85, para 7,17 em 1995/99,
representando um ganho de 1,42;
19

 a renda média familiar per capita saltou de R$ 290,00 em


1981/85, para R$ 361,00 em 1995/99, representando uma melhoria de 24,48%
no poder aquisitivo médio da população;
 a esperança de vida ao nascer saltou de 56,58 anos em
1981/85, para 67,18 anos em 1995/99, estendendo em 10,6 anos a longevidade
da população.
Por outro lado, segundo informação do órgão municipal de
planejamento, o déficit habitacional do Município de Goiânia é de cerca de 48
mil habitações, embora exista um estoque de 122.905 mil lotes vagos, conforme
dados do Cadastro Imobiliário da SEFIN. Ao mesmo tempo, segundo a
COMOB, em 15 áreas de posse da cidade, sendo 08 em situação de risco, vivem
2.210 famílias e 11.050 pessoas. Estas posses estão localizadas nos fundos de
vale das drenagens municipais, em áreas públicas destinadas a parques.
A especulação imobiliária e a “favelização” são aspectos
diferenciados de um problema ambiental relacionado ao processo de produção e
apropriação do espaço urbano. O que diferencia um do outro é o valor de
comércio do terreno objeto da ação: se valorizado, é objeto de especulação pelos
detentores de capital; se desvalorizado, é objeto de posse pelos excluídos
sociais.
O uso do solo urbano em Goiânia envolve conflitos entre o
zoneamento das atividades econômicas e as demais funções urbanas. O nível de
urbanização da economia é de cerca de 88%, predominando pela ordem, o setor
terciário, o setor secundário e, o setor primário, sendo este com apenas 12%.
Essa estrutura econômica implica na dispersão das atividades, gerando efeitos
poluidores que são, em geral, subestimados pelos empreendedores, por serem de
pequena monta, mas que, no conjunto, afetam o equilíbrio ambiental urbano.
O maior volume da população economicamente ativa (PEA) está
ocupado no setor terciário. No comércio, destacam-se os ramos de produtos
alimentares e de implementos e insumos agrícolas. No setor de serviços, que
apresenta grande diversidade, destacam-se os ramos bancários, hospitalares,
hoteleiros, educacionais e comunicações.
Algumas atividades do setor terciário em Goiânia lideram com
folga as denúncias de poluição ambiental, registradas nos órgãos públicos e no
Ministério Público. A principal queixa é contra a poluição sonora causada por
bares, boates, restaurantes e similares, localizados em zonas residenciais, cujos
estabelecimentos não são dotados de estrutura adequada de contenção acústica.
Outro problema é a autorização inadequada de estabelecimentos de serviços em
locais que não suportam o fluxo de trânsito demandado com o funcionamento
dos mesmos. Exemplifica-se com a instalação de uma universidade particular
numa área pública destinada a parque interno no Setor Sul, gerando
congestionamento e quebra do sossego público.
O setor secundário se constitui de um parque industrial
relativamente consolidado e diversificado. São mais de 3.510 estabelecimentos
20

industriais, destacando-se os seguintes gêneros: produtos alimentares,


vestuários, bebidas, calçados, materiais de construção, mobiliário, metalurgia,
editorial e gráfico. Com exceção da metalurgia, todos os demais integram um
conjunto de gênero industrial denominado de indústria tradicional.
As indústrias em geral são pequenas, empregando entre 15 e 100
operários, destacando-se as atividades do ramo de alimentos, ligadas aos
produtos do setor primário e, as do ramo de vestuário, calçados e artefatos de
tecidos.
De acordo com Torres (1993, p. 48)14, “alguns gêneros industriais
são potencialmente mais danosos para o meio ambiente do que outros”.
Segundo a matriz de potencial de degradação ambiental por gênero da indústria,
na qual o impacto de cada ramo de atividade sobre um segmento ambiental é
valorado numa escala de 0 a 3, verifica-se que o gênero da indústria tradicional
(madeira, mobiliário, couro e peles, têxteis, vestuários, bebidas, fumo, editorial e
gráfico) impacta menos o ambiente do que o gênero industrial de bens
intermediários (minerais não metálicos, metalurgia, química, papel e papelão). A
indústria tecnológica (mecânica, material elétrico e de comunicação, material de
transporte, borracha, farmacêuticos, perfumaria e plástico) agrega gêneros
industriais de impacto variável.
A tabela 3 mostra a Matriz do Potencial de Impacto, onde os três
tipos de gêneros da indústria (tradicional, bens intermediários e tecnológica) são
cruzados com os diversos segmentos do ambiente, como por exemplo, ar, água,
solo, cobertura florestal, fauna, clima, etc.
Entretanto, argumenta o autor, segmentos como madeira, bebidas,
indústria têxtil, alimentos, couro e peles apresentam elevado potencial de
impacto, em virtude de estarem associados no Brasil a padrões arcaicos de
proteção ambiental. Tal é o caso de Goiânia, onde se verifica que as atividades
citadas se desenvolvem seja consumindo desordenadamente recursos naturais,
seja realizando lançamento de efluentes sem o prévio tratamento, poluindo a
atmosfera, o solo e os cursos d’água. São exemplos, as fábricas de curtumes e os
abatedouros, instalados às margens principalmente dos córregos Cascavel e
Anicuns, que tradicionalmente lideram as queixas da população como
causadores de poluição ambiental.
Já o setor primário da estrutura econômica do Município de
Goiânia responde por apenas 6% da demanda da população por produtos
agrícolas, com destaque para o tomate, milho, soja em grãos, mandioca e
laranja. Na zona rural, 70% da área explorada é ocupada pela atividade pecuária
sobretudo para a produção leiteira que responde anualmente por 7,1 milhões de
litros.

14
TORRES, H. G. 1993. Indústrias sujas e intensivas em recursos naturais: importância crescente no cenário
industrial brasileiro. In: MARTINE, G. op. cit., p. 43-68.
21

Tabela 03 – Matriz do Potencial de Impacto Ambiental por Gênero de Indústria no Brasil,


segundo Torres (1993)
Poluição Demanda Rec’s.
Gênero de Indústria Poluição Hídrica Total
Atmosférica Naturais
Minerais não metálicos 3 3 3 9
Metalurgia 3 3 3 9
Química 3 3 2 8
Papel e Celulose 1 3 3 7
Material de transporte 2 3 1 6
Madeira 2 1 3 6
Alimentos 1 2 3 6
Bebidas 1 3 1 6
Têxtil 2 2 1 5
Material Elétrico/Comunicação 1 2 1 4
Borracha 1 1 2 4
Couros e Peles 1 2 1 4
Perfumaria 0 3 1 4
Plásticos 1 1 1 3
Fumo 1 0 2 3
Editorial 1 1 1 3
Farmacêuticos 1 1 0 2
Mobiliário 0 1 1 2
Mecânica 0 0 1 1
Vestuário 0 1 0 1
Fonte: Torres (1993, p. 49).

Os principais problemas ambientais relacionados às atividades


primárias no município de Goiânia são o desrespeito às áreas de preservação
permanente e de reserva legal, bem como o desenvolvimento de práticas
agrícolas sem o manejo e o uso adequados do solo, implicando no processo
erosivo e no assoreamento dos mananciais hídricos. Outro problema é o uso sem
controle de fertilizantes e defensivos agrícolas, implicando na poluição
ambiental. Os resíduos de agrotóxicos nos alimentos são uma permanente
ameaça à saúde pública.

1.3. MATERIAIS E MÉTODOS

1.3.1. Descrição do projeto

Os dados cartográficos do Município de Goiânia foram organizados


no Projeto Gyn; projeção UTM/córrego; escala 1:100000; coordenadas planas;
retângulo envolvente: X1 = 662000 mE, X2 = 700000 mE; Y1 = 8140000 mN,
Y2 = 8172000 mN; meridiano central O-49-16-00.
Utilizou-se da técnica do geoprocessamento (Rosa, 199215; Assad
& Sano, 199816) para quantificar e avaliar a evolução da cobertura vegetal per
capita em Goiânia, através do Sistema de Informações Geográficas,

15
ROSA, R. Introdução ao sensoriamento remoto. 2. ed. Uberlândia: EDUFU, 1992. 110p.
16
ASSAD, E. D. & SANO, E. E. Sistema de Informações Geográficas: aplicações na Agricultura. 2 ª ed. Brasília:
Embrapa-SPI/CPAC, 1998, 434 p.
22

desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (SGI/INPE) versão


2.0.
As informações geográficas foram formatadas e representadas em
trinta e dois PI’s, agrupando os bairros ou setores da cidade de acordo com o
macrozoneamento e, em geral, com os trinta e quatro distritos administrativos
estabelecidos no PDIG para a zona urbana e para as zonas de expansão urbana
do Município (Goiânia, 1992, v. 1, p. 74-9)17.
Os PI’s definidos pertencem à categoria modelos temáticos
compostos por polígonos fechados (arcos ou ilhas) que delimitam regiões
correspondentes a cada uma das classes determinadas de acordo com o uso do
solo, que foi analisado sob o ponto de vista da categorização dos espaços livres,
classificados de acordo com a metodologia adaptada de Escada, apud Bianchi &
Graziano (1992)18 e Richter, apud Sousa et al. (1992)19.
Os espaços livres, de acordo com as diretrizes do Plano Original da
Cidade, aprovado pelo Decreto-lei nº 90-A, de 30 de julho de 1938 (IBGE,
194220, p. 41-56; Álvares, 194221, p. 159-75) e com as plantas e respectivos
memoriais descritivos dos planos de loteamento aprovados pela municipalidade,
foram identificados e selecionados para inclusão nas Zonas de Proteção
Ambiental definidas pelo Zoneamento Urbano de Goiânia (Lei Complementar nº
031, de 29 de dezembro de 1994), sendo classificados em:
 Praça: área pública definida como Zona de Proteção
Ambiental IV (ZPA – IV) pelo artigo 85, IV, letra a da Lei de Zoneamento, com
dimensão de 1.000 m² a 3.000 m², ou de acordo com a dimensão definida na
planta e no memorial descritivo do plano de loteamento, limitada total ou
parcialmente por via de circulação de veículos, destinada a função ambiental,
recreativa e/ou de lazer, possuindo ou não equipamentos de lazer ativo ou
passivo;
 Parque: área pública estabelecida na planta e no memorial
descritivo do plano de loteamento como unidade de conservação municipal,
definida pelo artigo 85, II e pelo artigo 87 da Lei de Zoneamento como ZPA –
II, dotada ou não de cobertura vegetal, com função ambiental, recreativa e/ou de
lazer, possuindo ou não equipamentos de lazer ativo ou passivo e com área
geralmente superior a 10.000 m²;

17
GOIÂNIA. Plano de Desenvolvimento Integrado de Goiânia – PDIG. Goiânia: IPLAN, 1992. v. 1.
18
BIANCHI, C. G. & GRAZIANO, T. T. Caracterização e análise das áreas verdes urbanas de Jaboticabal. In:
ENCONTRO NACIONAL SOBRE ARBORIZAÇÃO URBANA, 4, 1992, Vitória, Anais... Vitória: SBAU,
1992. p. 225-37.
19
SOUSA, M. A. L. B.; FIORAVANTE, A. P. & CRUZ, R. A. Levantamento e classificação das áreas verdes da
zona urbana de Botucatu, SP. In: ENCONTRO NACIONAL SOBRE ARBORIZAÇÃO URBANA, 4, 1992,
Vitória. Anais... Vitória: SBAU, 1992. p. 239-252.
20
IBGE. Goiânia - coletânea especialmente editada como contribuição ao batismo cultural. Rio de Janeiro: Graf.
do IBGE, 1942, 125 p.
21
ALVARES, G. T. A luta na epopéia de Goiânia: uma obra da engenharia nacional - documentário histórico,
técnico e descritivo. Rio de Janeiro: Graf. do Jornal do Brasil, 1942, 187 p.
23

 Parque Linear: estabelecido por diretriz do Plano Original


da cidade (parkway), enquadrado como ZPA – II pelo artigo 87, I e II da Lei de
Zoneamento, estando conforme o artigo 18 da Política Nacional do Meio
Ambiente - Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, é uma área pública constante
na planta e no memorial descritivo do plano de loteamento, lindeira aos cursos
d’água, numa faixa bilateral contígua mínima de 50 metros, com a função
conservacionista (recursos hídricos e mata ciliar), recreacional e/ou de lazer,
possuindo ou não equipamentos de lazer ativo ou passivo e ocupando área de
dimensão variável de acordo com a extensão do curso d’água;
 Verde de Acompanhamento Viário: área pública
estabelecida pelo artigo 85, IV da Lei de Zoneamento como ZPA – IV, exerce
função ornamental ou de integração urbana, como canteiros de avenidas e
rotatórias. Não tem função recreacional e a sua função conservacionista é
limitada, cuja importância ganha relevo em Goiânia, por ser uma categoria de
espaço livre presente em praticamente todos os planos de loteamento, na qual o
poder público desenvolve tradicionalmente o cultivo de flores nos canteiros e,
não raro, com a participação da população por iniciativa própria do plantio de
árvores de rua;
 Espaço Livre Público: área pública, de dimensão variável,
constante da planta e do memorial descritivo dos planos de loteamento, não
numerada e que não recebeu uma destinação específica, podendo desempenhar a
função comunitária ou de preservação, de acordo com a conveniência do poder
público;
 Área Verde Particular: área de preservação permanente, de
domínio particular, no perímetro urbano ou de expansão urbana, estabelecida
pelo artigo 85, I e pelo 86 da Lei de Zoneamento como ZPA-I, qual seja: i) área
recoberta por mata (floresta ou cerrado) ou várzea, identificada no mapa
aerofotogramétrico de Goiânia; ii) faixa bilateral contígua aos cursos d’água,
numa largura mínima de 50 metros, para todos os cursos d’água e de 100 metros
para o rio Meia Ponte e para os ribeirões João Leite e Anicuns; iii) área
circundante de nascente temporária ou permanente num raio mínimo de 100
metros; iv) área de topos e encostas dos morros Mendanha, Serrinha, Santo
Antônio e do Além; v) área circundante aos lagos, lagoas e reservatórios d’água
naturais ou artificiais, numa faixa de 50 metros;
 Cemitério: área de domínio público ou particular, incluída
como uma classe de espaço livre de acordo com a metodologia adotada (Sousa
et al., op. cit., p. 243), geralmente ocupando significativas superfícies em área
urbana ou de expansão urbana;
 Equipamento público: área de domínio público, na qual se
inclui a área institucional destinada a instalação de equipamento público (água,
esgoto, telefonia etc) ou comunitário (escola, posto de saúde, segurança), bem
como de parque infantil (artigo 85, IV, letra b da Lei de Zoneamento), destinado
ao lazer e recreação direcionado ao público infantil e de parque esportivo (artigo
24

85, IV, letra c da mesma lei), destinado ao lazer e recreação a todas as faixas
etárias;
 Jardim de representação: área de domínio público ou
particular, estabelecida como planta ornamental de logradouro pelo artigo 85,
IV da Lei de Zoneamento (ZPA-IV). São os jardins em volta de prédios
públicos, igrejas, etc. O jardim de representação não tem função recreacional e
sua função ambiental é reduzida. Nesta classe foram incluídas outras categorias
de espaços livres que não se enquadraram em nenhuma das anteriores, como
áreas não construídas e gravadas nas plantas como reservadas, mas sem
numeração e sem destinação especificada no memorial descritivo do loteamento.
Essas áreas foram interpretadas como espaços abertos enquadrados como ZPA-
IV, seguindo a jurisprudência sobre o parcelamento e uso do solo urbano (v.
adiante, Seção 3.6.1);
 Área Pública Parcelada: é a área pública destinada no plano
de loteamento a espaço livre (praça, parque, parque linear, verde de
acompanhamento viário e equipamento público) e que foi desvirtuada da sua
destinação original; o uso do solo atual desta categoria foi identificado pelo
confronto das cartas planialtimétricas dos planos de loteamento com as cartas
aerofotogramétricas do município e com o Mapa Urbano Básico Digital de
Goiânia (MUBDG), versão 9.
Para cada PI foi calculada a área das respectivas classes de espaços
livres, sendo as de função ambiental computadas no somatório da categoria de
área verde, conforme conceituação exposta na Seção 3.6.1. Isto é, área verde é
todo espaço livre, público ou particular, não edificado, na zona urbana ou de
expansão urbana, com potencial ou efetiva função ambiental, de uso comunitário
(lazer, recreação, esportivo), de permeabilidade do solo e/ou de conservação dos
recursos naturais. Portanto, temos:
Área verde total = praça + parque + parque linear + verde de
acompanhamento viário + área verde particular + cemitério + jardim de
representação + área pública parcelada que mantém função ambiental +
equipamento público com área permeável.
O índice de área verde (IAV) foi calculado através da fórmula:

Área verde total (m²)


IAV =
População (nº de habitantes)

Para cada PI foi calculado o índice de dilapidação do patrimônio


público, como um indicador da degradação das áreas verdes de Goiânia, através
da seguinte relação:
Área pública parcelada por PI (m²)
Índice (%) = x 100
Total dos espaços livres por PI (m²)
25

1.3.2. Descrição das atividades desenvolvidas

1.3.2.1. A entrada de dados

A fase de entrada de dados poligonais (mapas temáticos) consistiu


das tarefas de digitalização, edição e identificação de áreas. No processo de
digitalização, os dados em formato analógico da carta planialtimétrica foram
transformados para o formato digital, através das coordenadas U e V da mesa
digitalizadora, relacionadas às coordenadas X e Y da carta planialtimétrica nela
fixada.
As linhas que delimitam as classes estudadas foram digitalizadas de
acordo com suas características (arco ou ilha). Na fase da edição, as linhas
passam pelas operações de separar (quebrar linhas em dois segmentos), suprimir
(excluir linhas) e concatenar (eliminar um nó ou transformar duas linhas numa
só), parar corrigir erros de digitalização, além da função ajustar manual e
automaticamente, para ajustar pontas de acordo com o valor de tolerância
definido.
Em seguida, as áreas foram identificadas, através da função inserir
centróides. Colocou-se um ponto no interior da área digitalizada, informando o
índice correspondente a sua classe (de 1 a 10, respectivamente, praça, parque,
parque linear, verde de acompanhamento viário, espaço livre público, área verde
particular, cemitério, equipamento público, jardim de representação/outras e
área pública parcelada).

1.3.2.1.a) Compilação de mapas temáticos

A entrada de dados geográficos foi feita utilizando-se as cartas


planialtimétricas, escala 1:1000, que se encontram arquivadas na Secretaria
Municipal de Planejamento de Goiânia (SEPLAM). Os planos de loteamento
aprovados pelo Estado (em número de 04), pelo INCRA (em número 08) ou
pelo Município (em número de 360) ou em aprovação pela municipalidade (em
número de 06), totalizando 378 bairros regulares.
As cartas dos loteamentos em situação regular foram reproduzidas
em papel heliográfico 100 x 30 ou 120 x 30 e levadas ao Laboratório de
Geoprocessamento do IESA/UFG para digitalização, armazenamento e
tratamento dos dados cartográficos de interesse.

1.3.2.1.b) Compilação complementar dos mapas temáticos


A compilação das cartas dos planos de loteamento em situação
regular, não permitiu fechar as classes de todos as áreas digitalizadas. A base
cartográfica utilizada, apesar de confeccionada numa escala de 1:1.000,
apresentava lacuna no levantamento de áreas limítrofes entre bairros vizinhos.
Os arcos ou ilhas de seus polígonos não se fechavam por que a informação
26

geográfica correspondente às áreas limítrofes entre bairros vizinhos não existia


na carta planialtimétrica.
As cartas topográficas dos planos de loteamento aprovados até o
final da década de 50 geralmente são as que apresentam este tipo de problema. É
possível que as lacunas observadas tenham sido decorrentes do levantamento
topográfico incompleto, por não realizar a aquisição das cotas de áreas
localizadas às margens dos cursos d’água, geralmente de difícil acesso e que
eram ocupadas, em muitos trechos, por densa mata ciliar. Como estas áreas não
eram de interesse do loteador e sim do poder público, pois se destinavam a
parques lineares, o topógrafo não se dava ao trabalho de levanta-las, já que não
constavam da exigência do órgão oficial que aprovava o loteamento, que até
1962 era o Estado de Goiás através do DVOP/SEVOP.
Assim, foi necessário lançar mão das cartas aerofotogramétricas do
Município de Goiânia, vôo 1988, escala 1:5.000 reduzida para 1:10.000. Estas
cartas foram heliografadas e levadas ao laboratório para digitalização das
informações complementares às cartas planialtimétricas. Com isso foi possível
fechar as linhas dos polígonos dos mapas limítrofes com esse tipo de problema
abordado.
As cartas aerofotogramétricas constituíram-se numa base
cartográfica importante, pois permitiram complementar a elaboração dos mapas
temáticos com informações de uso do solo de setores ou bairros não
regularizados e clandestinos, no total de 155.

1.3.2.1.c) Atualização dos mapas temáticos

Além da complementação das informações geográficas, os dados


cartográficos obtidos dos vôos aerofotogramétricos contidos nas cartas
aerofotogramétricas permitiram atualizar o uso do solo de cada classe de espaço
livre. Com isso, definiu-se uma nova classe, a de área pública parcelada, a partir
do confronto das informações de uso do solo contidas nas cartas
planialtimétricas dos loteamentos regulares com aquelas extraídas das cartas
aerofotogramétricas, que forneceram informações dos loteamentos e ocupações
irregulares.
As informações foram ainda atualizadas e checadas com o
MUBDG. Utilizou-se o aplicativo SIGGO da COMDATA para acessar e
manipular as entidades de interesse contidas no MUBDG.

1.3.2.2. Poligonalização e rasterização dos PI’s

As linhas e os centróides armazenados na função digitalização de


áreas foram, em seguida, ativados na função poligonalizar PI. A poligonalização
permitiu gerar os polígonos a partir dos arcos que foram armazenados no PI,
fechando-os em torno de um centróide interno. Esta função realizou, assim, a
27

ordenação dos polígonos e a criação de topologia (relação espacial entre o


polígono e seus vizinhos).
Após a poligonalização, através dos operadores de conversão,
realizou-se a transformação dos PI’s do formato digitalizado (vetorial) para o
formato raster ou varredura. Assim, criou-se uma imagem temática, onde cada
pixel recebeu uma cor correspondente a classe. Na definição da resolução
espacial, optou-se pelos menores valores “default” admitidos pelo programa,
objetivando melhorar a qualidade e a precisão da imagem gerada.

1.3.2.3. Manipulação dos PI’s

Na função calcular área, realizou-se a quantificação de áreas


obtidas nos cruzamentos efetuados de todas as classes que compõem os PI’s.
Através desta função, o SGI/INPE computou o número de pixel de cada classe
presente na imagem que, multiplicado pela área de cada pixel, forneceu a área
parcial e total das classes presentes em cada um dos 32 PI’s do Projeto Gyn.

1.3.2.4. Saída/geração de cartas

Nesta fase, optou-se pela geração e impressão de cartas através de


outros programas disponíveis. No caso, foi utilizado o SPRING/INPE, por
apresentar uma estrutura de banco de dados superior à do SGI.
O Projeto Gyn foi importado do SGI para o SPRING, onde as
cartas no tamanho A4 foram geradas. Ativou-se a função SCARTA, através da
qual foram criados os moldes, as coordenadas planas, editadas as grades, os
textos, os símbolos e as legendas. As cartas criadas foram salvas no arquivo
SPRING CARTA.
Em seguida, foi criado o arquivo de saída IPLOT, em postscript.
Para a impressão das cartas, foi utilizado o aplicativo CorelDRAW versão 9,
importando-se o arquivo gerado pelo IPLOT, na extensão DXF.
A vantagem da utilização deste aplicativo Windows é que o
CorelDRAW possui recursos não disponíveis no SCARTA, possibilitando
melhorar a qualidade gráfica dos produtos, em termos de finalização do texto, de
escala e de legenda. Os produtos gerados foram: i) 32 cartas, cada qual contendo
os espaços livres dos PI’s criados e, ii) uma carta do Projeto Gyn, contendo os
Espaços Livres das Zonas Urbana e de Expansão Urbana de Goiânia. Os
resultados são apresentados e analisados na Parte IV.
28

Parte II - URBANISMO E MEIO AMBIENTE URBANO


O Exemplo de Goiânia

“Afinal, qual é a essência do homem: o trabalho ou o conhecimento? Se o


conhecimento, a evolução abre-se por completo, infinitamente. Se o
trabalho, então a evolução vai enfrentar crises, dominações econômicas e
guerras, sejam quais forem as ideologias dominantes”.
Henri Laborit (1990)

2.1. INTRODUÇÃO

No século XIX as cidades européias apresentaram um vertiginoso


processo de crescimento e de aumento populacional. O fenômeno da
urbanização foi uma conseqüência do processo de industrialização. Até então
nenhuma sociedade poderia ser descrita como eminentemente urbana, pois a
população se distribuía em maior número no campo.
O termo urbanização designa, tecnicamente, o fenômeno pelo qual
a população urbana cresce em proporção superior à população rural. A
sociedade humana experimentou no século XX uma forte característica de
concentração demográfica urbana, passando de apenas 1,7% do total global no
início do século XIX, para 21% em 1950 e 41,5% em 1980 (Mendonça, 1995)22.
Seguindo esta tendência, no início deste século a maior parte da população
mundial estará vivendo nas cidades.
Com o advento da Revolução Industrial, as unidades fabris, os
meios produtivos e de locomoção puderam se "desvencilhar" das fontes de
recursos naturais. O surgimento da máquina a vapor permitiu a geração da
energia necessária ao acionamento das engrenagens produtivas, sem que a
unidade fabril precisasse ficar nas proximidades de um rio que gerasse a energia
hidráulica. Os meios de transporte motorizados libertaram o homem da
limitação imposta pela tração animal. O desenvolvimento técnico-científico
permitiu o crescimento sem fronteiras das cidades de forma autônoma ao campo,
no aspecto locacional. A urbanização da humanidade é, assim, uma
característica da sociedade industrializada.

22
MENDONÇA, F. A. O clima e o planejamento urbano de cidades de porte médio e pequeno. 323 p. Tese
(Doutorado - Geografia Física/Climatologia) FFLCH, USP, São Paulo, 1995.
29

O processo da urbanização manifestou-se primeiro na Europa e nos


EUA, com o surgimento das grandes cidades e das metrópoles em particular
(megapolização), baseado principalmente na industrialização e secundariamente
no êxodo rural. No conjunto dos países dependentes a urbanização se acentuou a
partir da segunda metade do século XX, caracterizado pelo êxodo rural e
paradoxalmente, pela insuficiência de oferta de empregos no setor industrial.
Nestes países, o binômio desenvolvimento econômico tardio - urbanização
tardia, evidencia o quanto o urbanismo é um fenômeno fortemente associado ao
desenvolvimento econômico. O entendimento deste fenômeno talvez contribua
para o conhecimento das causas da crise urbana atual e para o aperfeiçoamento
das técnicas urbanísticas, objetivando a busca de solução dos inúmeros
problemas relacionados ao meio urbano.
A obra de Howard (1996)23 é considerada por vários autores como
um marco divisor do urbanismo do século XX. Ele abordou a questão urbana do
final do século XIX na Inglaterra nos seguintes termos:

[...] Nestes dias (...) de problemas sociais (...) talvez possa parecer difícil
encontrar uma única questão de importância essencial para a vida e o bem-estar
da nação sobre o qual estejam todos completa e inteiramente de acordo, não
importando (...) qual o matiz de sua opinião sociológica (...).
Há, no entanto, uma questão sobre a qual praticamente não se manifestam
quaisquer diferenças de opinião. É quase universalmente aceito (...) por
homens de (...) toda a Europa, América e em nossas colônias, ser
profundamente deplorável que pessoas continuem afluindo a cidades já
superpovoadas, esvaziando ainda mais os distritos rurais [...]. (HOWARD, op.
cit., p. 104).

Com efeito, Ottoni (1996)24 destaca que a população de Londres e


seus subúrbios apresentavam em 1891 um contingente de 5,6 milhões,
distribuídos em apenas 316 km² de área. A explosão demográfica experimentada
por Londres gerou um quadro de extrema degradação, com milhões de
indivíduos descartados como “lixo urbano”, transformando a cidade inglesa “[...]
num abcesso, num tumor, uma elefantíase, sugando goela abaixo a vida, o
sangue e os ossos dos distritos rurais [...]” (Howard, op. cit., p. 105).
Esse quadro Pós-Revolução Industrial encontra-se registrado nas
obras de Friedrich Engels (Contribuição ao Problema da Habitação, 1887; a
Situação da Classe Operária na Inglaterra, 1848), bem como nas famosas
gravuras de Gustave Doré. Ambas retratam a extrema miséria da maioria da
população urbana européia, onde a alta densidade humana dentro dos cortiços
provocava um revezamento entre seus moradores que eram obrigados a

23
HOWARD, E. Cidades-Jardins de Amanhã. Tradução de Marco Aurélio Lagonegro e revisão de Maria Irene
Szmrecsányi. 1ª impr. 1898, reimpr. 1902. São Paulo: HUCITEC, 1996. 211p.
24
OTTONI, D. A. B. 1996. Cidade-Jardim: formação e percurso de uma idéia. In: Howard, E. op. cit., p. 10-101.
30

permanecer nas ruas. Estas desempenhavam, entre outras coisas, a função de


estar, morar e de comércio.

Além disso, afirma Ottoni (op., cit, p. 18):

[...] o sistema de higiene era precário, com valas a céu aberto, contaminando o
curso d'água mais próximo. Juntam-se a essa situação, salários aviltantes e
conseqüentes desnutrição e precárias vestimentas. Forma-se, dessa maneira, o
conhecido quadro de epidemias e surto de cólera que se expande nas cidades
(europeias) após 1830 [...].

Traçando um paralelo da evolução urbana nos países ricos com a


dos países dependentes, verificamos que as metrópoles dos países europeus no
século XIX, no primeiro período após o advento da Revolução Industrial -
denominado a Grande Expansão – enfrentaram crises no desenvolvimento
urbano. Embora as características dos problemas sejam histórica e socialmente
diferentes, eles se manifestam atualmente nos grandes centros urbanos dos
países pertencentes ao denominado terceiro mundo.
Na opinião de Mendonça (op. cit., p. 68), a urbanização dos países
dependentes caracteriza-se por ser acelerada, desordenada e espontânea, sem
planejamento. Nas cidades destes países observam-se elevados níveis de
degradação ambiental e todos os tipos de problemas relacionados ao "inchaço"
populacional (violência urbana, desemprego e as mais variadas formas de
manifestação da marginalidade e da exclusão social).
No caso brasileiro, a urbanização saltou de 44,60% em 1960, para
77,13% em 1991. A taxa de urbanização apurada pelo Censo 2000 do IBGE é de
81,2%. A sociedade brasileira caracteriza-se como urbanizada, com alto grau de
diversificação hierárquica entre as cidades. O curioso é que o adensamento
urbano ocorreu no mesmo período em que se verificou uma queda abrupta na
fecundidade total. O crescimento vegetativo passou de 2,9% a.a., na década de
60, para 1,5% a.a., na década de 1990 (MARTINE, 1993, p. 30)25.
A contradição verificada entre queda da fecundidade total
simultaneamente ao aumento da população urbana, pode ser explicada pelo
fenômeno da concentração espacial da população e da megapolização em
particular. Na verdade, a maioria das cidades pequenas, dos distritos e dos
povoados apresentou decréscimo populacional. No reverso da medalha, as
cidades com população acima de 20 mil habitantes, sofreram um vertiginoso
aumento de 51, em 1940, para 685 em 1990; na atualidade, 21,38% dos
brasileiros vivem nas doze regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro,

25
MARTINE, G. (org.). População, meio ambiente e desenvolvimento: verdades e contradições. Campinas: Ed.
da UNICAMP, 1993, 207 p.
31

Salvador, Belo Horizonte, Fortaleza, Brasília, Curitiba, Recife, Manaus, Porto


Alegre, Belém e de Goiânia.
Reforçando os dizeres de Mukai (1988)26 de que não há
desenvolvimento econômico sem urbanização e vice-versa, as cidades
brasileiras refletem, além da concentração espacial da população, também a
distribuição desigual das atividades econômicas. Apenas as regiões
metropolitanas de São Paulo, Campinas, Santos, Rio de Janeiro, Belo Horizonte,
Porto Alegre, Curitiba e Salvador agrupavam, em 1980, 55,1% de toda a
produção nacional de bens intermediários (MARTINE, op. cit., p. 56).
De acordo com a "Matriz de Potencial de Impacto" elaborada por
Torres (op. cit., p. 49), a indústria de bens intermediários é a que incorpora os
segmentos industriais nos gêneros de minerais não metálicos, metalurgia,
química, papel e celulose. Por um lado, essa indústria tem uma demanda mais
intensa em recursos naturais, sendo, por outro lado, mais poluente do que a
média dos demais ramos da atividade industrial brasileira.
O potencial de impacto ambiental do parque industrial de uma
região varia também em função de outros fatores, como o nível de tecnologia
adotado e o grau de restrições ambientais e exigências sociais estabelecidos
legalmente.
Nota-se, no estágio atual de desenvolvimento econômico de países
como o Brasil, a manifestação de uma crise do modelo neoliberal, que se
fundamenta na abertura sem controle das economias nacionais aos monopólios
transnacionais e ao capital especulativo internacional. Estes países viveram um
curto período de prosperidade, a exemplo do Brasil, dos integrantes dos "Tigres
Asiáticos" e ainda do México e da Argentina. Com a atual crise da globalização,
eles enfrentam a desvalorização das moedas nacionais, a intensa evasão de
divisas, o sucateamento dos parques industriais nacionais, a liquidação dos
patrimônios estatais, a redução do poder de compra da massa salarial, o
enfraquecimento dos mercados internos.
Os sintomas mais expressivos dos desajustes econômicos
comentados se manifestam nas cidades. O contingente dos desempregados
aumenta com os trabalhadores que perdem seus postos de trabalho; torna-se
mais difícil conquistar o primeiro emprego; cresce a economia informal nos
grandes centros urbanos; recrudesce a marginalidade e a exclusão social dos
sem-trabalho, sem-teto, sem-escola, sem-saúde, etc.
Pelo exposto, é possível evidenciar, no nosso país - inserido no
contexto histórico dos países de desenvolvimento econômico atrasado - a
oportunidade de se priorizar o tema urbanismo e meio ambiente. Torna-se
urgente e necessário aprofundar os estudos e aperfeiçoar as técnicas capazes de
proporcionar qualidade de vida à maioria da população brasileira.

26
MUKAI, T. Direito e Legislação Urbanística no Brasil (História – Teoria – Prática). São Paulo: Saraiva, 1988.
307p.
32

2.2. URBANISMO E QUALIDADE AMBIENTAL DE VIDA

O processo de urbanização começou com as primeiras


aglomerações humanas, há mais ou menos 5.500 anos. O urbanismo se praticava
então, exclusivamente, em alguns pontos da aglomeração e em espaços
privilegiados da cidade (MENDONÇA, op. cit., p. 65).
O urbanismo, do ponto de vista técnico, foi definido inicialmente,
como a
[...] ciência que se preocupa com a sistematização e desenvolvimento da cidade
buscando determinar a melhor posição das ruas, dos edifícios e obras públicas,
de habitação privada, de modo que a população possa gozar de uma situação
sã, cômoda e estimada [...]. (MUKAI, 1988, p. 4)

Essa concepção de urbanismo correspondeu ao desenvolvimento


histórico anterior à Revolução Industrial, restringindo-se aos limites da cidade,
posto que as aglomerações humanas eram insignificantes e a maioria da
população distribuía-se nos campos. Com a industrialização e com o surgimento
do fenômeno da metropolização e da megapolização, este conceito foi superado.
No entendimento do autor citado, o marco divisor conceitual do
urbanismo moderno pode ser encontrado na obra de Howard. Este, ao formular o
conceito de Cidade-Jardim, quebrou a dicotomia entre o urbano e o rural,
elaborando um plano urbanístico que se propôs a conciliar as benesses sociais e
econômicas da cidade com a disponibilidade de recursos naturais do campo. O
urbanismo, assim, deixou de se preocupar apenas com a cidade em si e seus
aspectos físico-territoriais, mas também com o campo e com a planificação de
regiões e do país como um todo.
A esse respeito escreveu Ottoni (1996, p. 39):

[...] o marcante êxito de sua obra (Howard) deve-se à eficiência com que
sintetizou um século de incomum desenvolvimento econômico, convivendo
com extremos de miséria e deterioração em cidades em contínuo crescimento
[...]. Seu livro mostra com clareza, simplicidade e admirável objetividade,
idéias que, além de estarem perfeitamente vinculadas à tradição cultural de seu
país, apresentavam viabilidade financeira e eram economicamente realizáveis
[...].

A essência da concepção urbanística de Howard está expressa num


traçado urbano que se preocupa em configurar um agrupamento humano
equilibrado, em condições de proporcionar o usufruto das vantagens do campo e
da cidade e de evitar as deficiências de ambos.
No diagrama da figura 8, ilustra-se a alternativa proposta por
Howard – a Cidade-Campo.
33

OS TRÊS ÍMÃS

afastamento da
natureza ausência de vida
x social
CIDADE CAMPO
oportunidades x
O POVO: belezas da
sociais PARA ONDE IR?
natureza

CIDADE-CAMPO

belezas da natureza com oportunidades sociais


Figura 08 - Diagrama da concepção urbanística de Howard

A questão do êxodo rural e do inchaço urbano na Inglaterra do


século XIX foi discutida nos seguintes termos:

[...] quaisquer que sejam as causas que atuaram no passado e continuam agindo
no presente, arrastando as pessoas para as cidades, elas devem ser entendidas
como 'atrativos', tornando-se óbvio, portanto, que não haverá solução efetiva
senão oferecendo às pessoas 'atrativos' maiores do que os que nossas cidades
atualmente oferecem, de modo que a força dos antigos 'atrativos' seja
sobrepujada pela dos novos que possam vir a ser criados. Cada cidade poderia
ser vista como um ímã, cada pessoa como uma agulha. [...]
O que poderia ser efetivamente feito para tornar o campo mais atraente do que
as cidades? [...] A questão é universalmente considerada como se agora fosse
(e assim devesse permanecer para sempre) completamente impossível para os
trabalhadores viver no campo e apesar disto dedicar-se a atividades outras que
não a agricultura; como se as cidades superpovoadas e malsãs fossem as
últimas palavras em ciências econômicas. Na verdade, não há somente duas
alternativas como se crê - vida urbana ou vida rural. Existe também uma
terceira, que assegura a combinação perfeita de todas as vantagens da mais
intensa e ativa vida urbana com todas as belezas e os prazeres do campo, na
mais perfeita harmonia. [...] (HOWARD, 1996, p. 108).

Na visão de Ottoni (1996, p. 38), a alternativa Cidade-Campo,


formulada como um novo plano urbanístico, denominado Cidade-Jardim,
representou uma síntese conciliadora que toma por empréstimo do socialismo
"[...] sua larga concepção de esforço comum e vigoroso conceito de vida
municipal [...]", e do capitalismo o estilo de vida voltado ao "[...]
individualismo, a preservação do auto-respeito e da confiança em si mesmo
[...]".
Na concepção urbanística de Howard, Ottoni destaca ainda a
influência do movimento Arts & Crafts, com seu desencanto pela baixa
34

qualidade estética dos produtos fabris em decorrência da desvalorização do


trabalho humano e da retirada da participação criadora do operário na era
industrial. De acordo com os expoentes deste movimento, como John Ruskin e
William Morris, isto não ocorria na Idade Média, pois havia o relacionamento
entre mestres e artesãos e as cidades eram de pequeno porte, diretamente ligado
ao ambiente rural, contendo assim relações de produção mais equilibradas.
Assim, a concepção de Howard representou um avanço histórico,
ao formular uma proposta urbanística contendo as diretrizes técnicas para a
busca do equilíbrio no relacionamento entre o homem e a natureza, sob novas
condições de desenvolvimento industrial.
Engels (s.d.)27 escreveu que a espécie humana, ao dominar a
natureza, diferencia-se de todas as demais espécies, mas que esta aparente
superioridade humana sobre a natureza não poderia representar o corte do
"cordão umbilical" que os une, sob pena de arcar com as consequências desse
ato. Exemplificou o autor com os desmatamentos dos bosques da Mesopotâmia,
da Grécia, da Ásia Menor e de outras localidades, onde a eliminação dos centros
de acumulação e reserva de umidade desencadearam o processo atual da aridez
das terras destas regiões antes cultiváveis e férteis. Por isso, destaca Engels, esse
domínio humano sobre a natureza não é o de alguém situado fora dela, pois a
espécie Homo sapiens pertence à natureza, encontra-se em seu seio, e todo o
domínio sobre ela, diferentemente dos demais seres, consiste no fato de os
humanos serem capazes de conhecer suas leis e aplicá-las de maneira adequada.
A concepção urbanística de Howard, no bojo dos desafios
representados pela ruptura da industrialização com o modo medial de produção,
reflete uma expressão dialética da evolução, em novo estágio, do
desenvolvimento humano. Os diagramas elaborados por esse urbanista mostram
um modelo em asterisco ou circular-concêntrico de cidade dividida em seis
setores, por seis bulevares (avenidas largas e arborizadas), que se irradiam num
parque central e se estendem até o perímetro externo, constituído por um eixo
viário que, após envolver a cidade, faz a ligação com o meio rural. Cinco
avenidas concêntricas ao parque central completam a estrutura viária da Cidade-
Jardim.
As diretrizes de crescimento e expansão urbanas da Cidade-Jardim
e seu entorno rural são baseados nos princípios da inter-relação harmônica
campo-cidade, através dos cinturões verdes, das cidades-satélites e do controle
do uso do solo pela comunidade. Os cinturões verdes são circundados pelas
alamedas do tipo parkways ao longo das matas ciliares, das reservas florestais e
dos parques municipais. Os bulevares e os espaços livres verdes também atuam
como "vasos comunicantes" entre as áreas verdes rurais diretamente com o meio
intra-urbano.

27
ENGELS, F. Sobre o papel do trabalho na transformação do macaco em homem. In: MARX, K. & ENGELS,
F. Obras escolhidas. 3 v. São Paulo: Alfa-Omega, 19[- -], v. 2, p. 267-80.
35

Na Cidade-Jardim, o controle do uso do solo, segundo Ottoni, é


realizado sem os extremos do liberalismo e do comunismo, através de um
cooperativismo a ser desenvolvido diretamente pela comunidade e de acordo
com o seu grau de participação na vida da cidade.
Conforme mostra a figura 9, em cada hexágono do diagrama,
desenvolve-se uma cidade-satélite, interligada à “cidade-central" pelos
"bulevares" radiais. As cidades-satélites são interligadas entre si por anéis
viários. A estrutura viária interurbana constituiu-se num sistema multimodal,
pois é capaz de dar vazão a todo tipo de transporte, motorizado ou não,
individual ou coletivo, com ênfase a esta última modalidade, tanto rodoviária
como sobre trilhos.

Elementos urbanísticos:
d
a- cidade-central;
b- cidades-satélites;
o c- parque central;
e d- bulevares radiais e
intermunicipais;
cidade-satélite f e- avenidas concêntricas;
c
g f- cinturão verde;
g- parkways;
cidade-central h- anéis viários;
o i- espaços livres intra-
h
urbanos;
j- zonas urbana e rural
o inter-relacionadas.

Figura 09 - Diagrama da Cidade-Jardim de Howard e seus principais


k- elementos urbanísticos

A proposta de Howard é bastante concisa e de fácil assimilação. Em


decorrência disso e tendo em vista a sua viabilidade financeira, a "utopia" da
Cidade-Jardim foi concretizada em várias partes do mundo. Em 1902 foi criada
a The Garden City Pioneer Company Ltd que adquiriu um terreno de 1.546
hectares, nos arredores de Londres. Ali se edificou Letchworth, a primeira
Cidade-Jardim de Howard. O plano de implantação urbano foi executado pelos
arquitetos Raymond Unwin e Barry Parker.
Em 1920 foi fundada a companhia Welwin Garden City Ltd que
adquiriu um terreno de 962 hectares, localizado a quinze quilômetros de
Letchworth, onde se edificou Welwin, a segunda Cidade-Jardim de Howard
(figura 10). O plano de urbanização foi desenvolvido pelo arquiteto Louis de
Soissons. A inovação do projeto consistiu na alternância de grupos de casas de
baixa e de média renda com amplos jardins coletivos internos, interligados por
vias de pouco trânsito. Esse sistema foi denominado cul-de-sac ou “fundo de
saco”, formando parques internos, que, além de propiciar lazer, funcionavam
36

como caminhos para os pedestres, livres do trânsito motorizado, irem à escola


primária, ao playground, ao centro comunitário etc.

Figura 10 - Vista aérea


de Welwin (Inglaterra),
a segunda Cidade-
Jardim de Howard

À esquerda, ampla
avenida arborizada
(Parkway) chegando ao
semicírculo do centro
cívico, na parte superior.
Fonte: OTTONI (op. cit., p.
62)

As experiências de Letchworth e de Welwin prosperaram sob a


administração cooperativa das companhias das respectivas cidades. Além do
aspecto urbanístico, lograram êxito também no aspecto comercial, cujos
resultados beneficiaram não só seus moradores, como toda a região
metropolitana de Londres. Com a concretização do plano urbanístico de
Howard, ficou demonstrado ser possível:
[...] a) a construção de cidades novas com indústrias, independentemente de
paternalismos esclarecidos ou do Estado, conservando o incremento do valor
da terra para a comunidade, em vez de subúrbios-jardins;
b) cada família poderia possuir uma casa em meio ao verde, com fácil acesso
ao trabalho, ao centro da cidade e ao campo;
c) obter boa qualidade ambiental, mediante distribuição das áreas verdes no
conjunto da cidade, que se comunicariam com um cinturão verde definido, não
como uma área não construída, mas sim permanente e integrado à cidade; [...]
(OTTONI, 1996, p. 66).

As influências da concepção de Howard se refletiram no


planejamento urbano de todo o mundo, com repercussões na Europa, nos EUA e
também no Brasil. Na Escandinávia com os Planos de Copenhague (1948 e
1960) e, sobretudo, de Estocolmo (1952 e 1966), realizou-se a modernização
urbana, através da interligação das cidades antigas às novas por vias coletivas de
transporte (metrô) e por contínuas áreas verdes, com a vegetação penetrando
organicamente os núcleos dos espaços urbanos de maneira harmoniosa e
acolhedora.
37

Na França, elaborou-se o Plano Diretor da Região de Paris (1963-


66) e de implantação de cidades novas nos arredores parisienses, tudo baseado
num sistema de controle ambiental e de uso de reservas florestais, parques e da
recuperação de todo o vale do rio Sena, além do desenvolvimento de oito
"metrópoles de equilíbrio" na periferia do território francês.
Na Inglaterra, com a vitória do Partido Trabalhista em 1945 e a
reconstrução do pós-guerra, o governo volta sua atenção para o planejamento
urbano. Várias leis e planos governamentais são aprovados para regulamentar a
reestruturação e estruturação urbana. O Plano de Construção das Cidades
Novas estendeu-se por três gerações - 1947/50, 50/64 e a partir de 1964 até
década de 70, envolvendo a reconstrução de 21 cidades e a construção de 34
novas.
Em 1944 inicia-se a execução do Plano de Abercrombie para a
Grande Londres. Este plano realizou a remoção de um milhão de pessoas do
centro da cidade, para a vasta zona exterior ao cinturão verde londrino, onde a
população foi redistribuída em oito cidades novas e onde as indústrias foram
relocadas. Permitiu-se, assim, a remoção de cortiços e de construções de baixa
qualidade, abrindo espaços para novas atividades coletivas e o aumento das
áreas verdes de Londres. Tanto Londres como as cidades novas foram
envolvidas por cinturões verdes e protegidas contra a expansão incontrolável. As
cidades novas foram estruturadas com base no zoneamento do solo, baixa
densidade e grandes espaços verdes. O núcleo central destas cidades foi
projetado para abrigar uma população de apenas cinqüenta a oitenta mil
habitantes. Posteriormente, esses planos foram flexibilizados e modificados para
se adaptarem a realidade urbana complexa dos tempos modernos. Em
decorrência, os núcleos centrais dessas cidades foram planejados para abrigar
250.000 pessoas em Milton Keynes ou 430.000 habitantes em Central
Lancashire.
Apesar do desenvolvimento das concepções urbanas racionalistas,
que incorporaram os edifícios à paisagem dessas cidades, com o objetivo de
absorver um número crescente de moradores, as idéias de Howard estão nelas
impregnadas. Nos Estados Unidos desenvolveu-se um importante movimento
"City Beautiful", - integrado por planejadores como Lewis Mumford, professor
de Planejamento Urbano na Universidade da Pensilvânia, autor de clássicos
estudos sobre a história da urbanização -, que se preocupou com o planejamento
das cidades, a democracia política e a justiça social, e manteve íntima sintonia
com o ideário da Cidade-Jardim de Howard. Esse movimento deixou
importantes contribuições ao desenvolvimento do urbanismo nos EUA, quais
sejam:
 Sunnyside Garden, planejada em 1928, foi construída a 25
km do centro de Nova York, para 1.200 famílias, com quadras contendo jardins,
playgrounds e campos esportivos, numa ruptura com o esquema existente, denso
e fechado das quadras daquela megalópole.
38

 Radburn que foi projetada em 1928 para ser uma Cidade-


Jardim completa. De acordo com o plano geral, junto à avenida central
construiu-se o setor de comércio e serviços. No entorno deste setor, tem-se a
zona residencial em forma de culs-de-sacs, com unidades de vizinhança
desenvolvidas nas partes internas das quadras, para cada 7.500 pessoas. A
grande depressão de 1929 não permitiu a construção da sua indústria, projetada
para a parte sul da cidade, bem como a manutenção da integridade do seu
cinturão verde.
 O Programa dos Cinturões Verdes, do Governo dos
Estados Unidos da América, que construiu três cidades-jardins: Greenbelt, em
Maryland, Norte de Washington, D.C.; Greenhills, próxima a Cincinnati; e
Greendale, a sudoeste de Milwaukee.
O programa dos cinturões verdes integrou o programa “New
Deal nas cidades” que revitalizou o planejamento urbanístico nos EUA
(Chaudacoff, 1977, p. 284-7)28. Foi elaborado durante o governo do Presidente
Franklin Roosevelt, em 1935, no contexto de um conjunto de medidas de
intervenção estatal para a recuperação da economia norte-americana. Esse
programa procurou transferir para a América as idéias de Howard. Propugnou
pela construção, com verbas oficiais, de 25 cidades novas e pela instalação de
uma rede de 3 mil comunidades planejadas, de tamanho limitado, destinadas a
famílias de baixa renda. Essas comunidades deveriam localizar-se nos cinturões
verdes das áreas metropolitanas e seriam arrendadas pelo governo a cooperativas
de residentes.
No entanto, o programa foi combatido pelo setor imobiliário, pelos
incorporadores e construtores. A justiça americana, inclusive, por iniciativa dos
setores contrariados, considerou a construção de cidades uma atribuição
exclusiva da livre iniciativa. O governo interrompeu a execução do programa,
transferindo-o para a iniciativa privada em 1955. Esta foi a responsável pela
enorme expansão dos subúrbios-jardins nos Estados Unidos, que, embora bem
menos equipados do que as cidades inicialmente planejadas pelo poder público,
tornaram-se uma característica marcante daquele país.
Segundo Ottoni, o desenvolvimento americano baseado nos meios
de transporte por ferrovia, metrô e automóvel, favoreceu a proliferação dos
subúrbios-jardins. Estes representaram a descaraterização da proposta de
Cidade-Jardim de Howard, pois foram despojados da preocupação social e
vistos unilateralmente apenas no seu aspecto físico, tal como na conceituação
tradicional de urbanismo. Ademais, no raciocínio de Chaudacoff, a iniciativa do
planejamento público americano na área urbana foi abortada, pois contrariou os
interesses e a lógica da iniciativa privada, que tinha nos terrenos altamente
valorizados dos cinturões verdes metropolitanos, a oportunidade da acumulação
e da reprodução ampliada do capital.
28
CHAUDACOFF, H. P. A evolução da sociedade urbana. Tradução de Ruy Jungman. Rio de Janeiro: Zahar,
1977. 342 p.
39

Pelo exposto, depreende-se que a obra de Howard, ao articular a


funcionalidade com a estética, bem como a cidade ao campo, representou uma
perspectiva de evolução conceitual do urbanismo de

[...] uma disciplina que se preocupa apenas com o desenvolvimento de técnicas


e conhecimentos relacionados à construção, reforma e extensão das cidades,
para projetos de estruturação regionais e planos de ordenação do território de
um país [...]. (MUKAI, 1988, p. 4)

Na primeira década do século XX desenvolveram-se novos


materiais de construção como o ferro, o aço e o cimento armado, impulsionando
a indústria da construção civil. Esse desenvolvimento foi intensificado pela
reconstrução das cidades que foram destruídas pela segunda guerra e em função
do fenômeno da urbanização em todo o mundo, elevando a demanda por novas
habitações. Criaram-se as condições para a formação de uma nova filosofia do
urbanismo, expressa na idéia de que “o que é belo é útil e de que a estética não é
tudo” (MENDONÇA, 1995, p. 66). Surge então, nesse contexto, a escola da
cidade funcional ou racionalista, por ocasião do Congresso Internacional de
Arquitetura Moderna – CIAM. O congresso realizado na Grécia, em 1933,
produziu a Carta de Atenas, na qual, são estabelecidos os postulados básicos do
planejamento urbano e regional, destacando-se, dentre outros, os seguintes:
i) As funções básicas do urbanismo são habitação, recreação,
trabalho e circulação, devendo cada uma possuir espaços próprios no tecido
urbano;
ii) Cada município deve, com urgência, estabelecer o seu
programa de urbanização, pois a sua ausência dará lugar à improvisação;
iii) O programa, elaborado por especialistas, deverá prover, por
etapas e em harmonia, no tempo e no espaço, os recursos naturais do lugar, a
topografia, os dados econômicos, as necessidades sociológicas e os valores
espirituais;
iv) A cidade não é senão uma das partes do conjunto econômico,
social e político que constitui a região e, por isso, não se resolve um problema
de urbanismo sem referência constante a ela.
Da escola racionalista ou funcional destacam-se dois modelos de
urbanismo: a cidade ideal-linear ou cidade verde de Le Corbusieur, que
influenciou a elaboração do plano piloto de Brasília pelo arquiteto Lúcio Costa;
e o da cidade dispersa-policêntrica concebida nos EUA por Frank Loyd Wright.
Este último se configurou no padrão urbanístico das cidades americanas, com
seu Central Business District (CBD), de um ou mais centros adensados e
verticalizados, com o adensamento construtivo e populacional decrescendo em
direção à periferia urbano-rural.
40

Vieira (1994, p. 23)29 observa que os modelos funcionais foram


concebidos a partir de padrões como “valores universais”, “homem-tipo” e
“funções urbanas” extraídas da Carta de Atenas. Apesar de representarem um
inequívoco avanço para o urbanismo mundial, as cidades funcionais, como
Brasília, apresentam uma monotonia da paisagem e um uso reduzido dos
espaços públicos. Estes aspectos decorrem de um zoneamento padronizado do
uso do solo, da existência de grandes espaços livres plantados entre as
edificações atuando como fatores de segregação social, das vias de comunicação
que privilegiam a locomoção motorizada individual, bem como da localização
dos espaços públicos dificultando o acesso à maioria dos cidadãos.
A influência da escola sociológica ou organicista, representada por
Lewis Mumford, Patrick Geddes e Le Play, ao enfatizar a função social das
cidades, permitiu uma síntese das escolas precedentes, em que “[...] o urbanismo
moderno passa a ser concebido em termos funcionais e racionais, mas com uma
concepção básica humana, isto é, com os valores espirituais, visando o homem
no contexto urbano e a melhoria das condições de vida [...]” (Mukai, 1998, p. 5).
Na atualidade mundial, o urbanismo se caracteriza por uma certa
mesclagem de estilos e concepções, na qual se destaca

[...] a tendência em se conferir uma certa imagem à cidade através da


organização de espaços urbanos espetaculares, inclusive áreas verdes com fins
de estética e/ou funcionalidade, como um meio de atração de capital e de
pessoas, nestes tempos de competição globalizada [...]. (MENDONÇA, 1995,
p. 67-8).

2.3. O URBANISMO NO BRASIL COM ENFOQUE PARA QUESTÕES


DO PLANEJAMENTO AMBIENTAL

De acordo com Mukai, as origens do urbanismo brasileiro


remontam às Ordenações do Reino, quando se fundaram as tradições mais
solidamente arraigadas da vida dos compatriotas citadinos, qual seja a de que o
proprietário de terreno tem assegurado o seu direito de construir e de que a
definição de normas urbanísticas locais (poder de polícia referente às posturas e
às edificações) é da competência exclusiva das autoridades municipais.
No Rio de Janeiro, durante o período colonial, apesar de editadas e
reeditadas diversas normas de posturas pela Câmara, elas não foram acatadas
pela população (Coaracy, 1944)30. Situações semelhantes de implementação das
normas de posturas encontram-se nas atas das Câmaras Municipais de São
Paulo, Salvador, Recife, Olinda, Vila Rica.

29
VIEIRA, F. M. Proposta de roteiro para análise e concepção bioclimática dos espaços externos urbanos.
Estudo de casos: praças. 233 p. Dissertação (Mestr. – Conforto Ambiental) FAU-UFRJ, 1994.
30
COARACY, V. O Rio de Janeiro no século 17. 2. ed. R. de Janeiro: J. Olympio, 1944, apud Mukai, op. cit.,
p. 15
41

Um aspecto interessante a destacar na história do nosso urbanismo é


que, conforme Mukai (op. cit.), desde os tempos do Brasil Colônia, os terrenos
públicos eram distintos dos particulares, através das Ordens Régias de 1731,
1754 e 1792. Essas ordenações faziam distinção entre as terras das sesmarias –
consequentemente, as terras devolvidas – e os terrenos reservados às margens
dos rios públicos. Nessa época já se percebem algumas preocupações
urbanísticas por parte do poder público, como na cidade de São Paulo (Taunay,
s.d.)31, com o embelezamento das ruas, praças e construções de moradia, bem
como com a fixação dos limites urbanos e com os serviços públicos. Como a
base econômica do período colonial estava no campo, as cidades não tinham
expressão, muito embora servissem de centro administrativo e de sede local do
poder político do reino emanado da metrópole central. Como salienta Reis Filho
(1968)32, no final do reinado de D. João V e durante a Era Pombalina (1750 -
77) – no apogeu do ouro, quando as Capitanias Hereditárias foram extintas e a
capital foi transferida para o Rio de Janeiro –, instalou-se no nosso país uma
administração centralizada que proporcionou o esboço de uma política de
urbanização rudimentar.
No período do Império desenvolveram-se, de forma incipiente,
algumas normas, leis, técnicas e instrumentos de intervenção urbanas, que
estiveram, em geral, relacionados ao código de obras, aos esboços de
zoneamento, às posturas, às desapropriações, ao direito de propriedade e ao
direito de construir.
Para Mukai (1988, p. 16), tanto “[...] no Império, como no período
Colonial, o Brasil ainda vivia os reflexos de uma política de isolacionismo do
homem (o homem antiurbano), decorrente do sistema de sesmarias implantado
entre nós [...]”. Segundo ele, o contexto em que se deu o processo de surgimento
das cidades no território nacional “[...] não é posterior ou mesmo concomitante à
sua organização social. Nasce-lhes a população já debaixo das prescrições
administrativas [...]" (p. 17).
No período republicano, o urbanismo brasileiro sofreu a influência
de concepções e filosofias distintas do período anterior. Destacam-se dois
marcos: a instauração da República em 1889, e a Revolução de 1930. Os
períodos compreendidos entre estas datas delimitam as Repúblicas Velha e
Nova, respectivamente. Na primeira República surgiu o Código Civil brasileiro,
que, do ponto de vista do meio ambiente urbano, estabeleceu restrições ao
direito de construir, mediante regulamentos administrativos (art. 572) e realizou
o enquadramento dos bens públicos (artigos 66 e 67) em três categorias:
i) Bens de uso comum do povo – as vias de comunicação, as
praças e os parques, que são dotados das características peculiares da
inalienabilidade (não podem ser transacionados, vendidos ou doados) e da

31
TAUNAY, E. História seiscentista da vila de São Paulo, t. 4, s.n.t., apud Mukai, op. cit., p. 16.
32
REIS FILHO, N. G. Evolução urbana do Brasil. São Paulo: USP/Pioneira, 1968, apud Mukai (op. cit., p. 17).
42

imprescritibilidade (caráter de um direito que não se extingue por efeito da


prescrição, isto, não pode caducar);
ii) Bens de uso especial – os destinados aos equipamentos
comunitários como escolas, hospitais, postos policiais, quadras esportivas, que
sofrem restrições à alienação pelo Poder Público, em função da satisfação das
necessidades comunitárias na oferta daqueles serviços a que os bens foram
destinados, segundo o plano de loteamento e a densidade prevista;
iii) Bens dominiais ou dominicais – os de propriedade do
Estado, que podem ser transacionados de acordo com as leis das licitações
públicas.
No geral, na primeira fase republicana, segundo avaliação de
Mukai, a prática das posturas e dos códigos de obras marcaram as manifestações
do urbanismo nas principais capitais brasileiras. Na capital paulista, ocorreu um
violento surto de explosão populacional, de especulação imobiliária, de
valorização dos terrenos e dos prédios. Morar em São Paulo, neste período, "[...]
era moda e o sonho dos agricultores do interior [...]", já anunciava a matéria do
jornal "A província de S. Paulo", 15.11.1876 (SOUZA, 1994, p. 46)33.
No entanto, ao mesmo tempo em que os problemas cresceram e se
avolumaram, o Poder Público manteve-se inoperante. Coube aos urbanistas
Francisco Prestes Maia e Ulhoa Cintra a apresentação, ao Governo estadual, em
1924, de um plano de ordenação da cidade de São Paulo que, infelizmente, não
saiu do papel. Diante da falta de planejamento urbano da capital paulistana, no
primeiro período da república, "[...] a ideia da verticalização aparece como
solução para alguns problemas e como símbolo de modernidade [...]" (SOUZA,
op. cit., p. 47).
Na segunda fase republicana, conforme Mukai, ocorreu um marco
divisor do urbanismo brasileiro, estabelecido pela Constituição de 1934. Trata-
se do conceito de propriedade como função social, que impôs limitações ao
interesse particular em benefício do interesse comum, que àquele se sobrepõe.
Desde então, através das várias limitações de uso do solo urbano em decorrência
deste conceito, é que se pode começar a falar de urbanismo como um direito da
população brasileira.
O relativo salto evolutivo do urbanismo no Brasil, neste período,
está relacionado ao binômio industrialização versus urbanização. A Revolução
de 1930 representou a inserção do Estado no esforço da industrialização
nacional. Consequentemente, data também desta época as medidas mais
significativas da política de urbanização no país, que sofreu os reflexos dos
postulados estabelecidos pela Carta de Atenas. No entanto, esses reflexos foram
tímidos porque, mesmo sendo poucos os Planos Diretores implantados , neles
não se aplicaram, na verdade, a conceito técnico integral do urbanismo moderno.

33
SOUZA, M. A. A. A identidade da metrópole. São Paulo: HUCITEC/EDUSP, 1994. 257p.

No Brasil as cidades maiores fundadas mediante um plano urbano são apenas Belo Horizonte, Goiânia,
Maringá, Marília, Londrina, Brasília, Palmas, num conjunto de mais de cinco mil municípios.
43

Segundo a concepção da Carta de Atenas, o plano urbano não se


circunscreve à etimologia da palavra urbes (do latim urb, urbis, significando a
cidade e seus habitantes), mas relaciona a cidade ao meio em que se insere e,
portanto, aquele não se realiza sem a planificação regional.
A estrutura produtiva de um país, região ou estado constitui-se dos
Setores:
 Primário - agricultura, pecuária, silvicultura, caça, pesca e
extração vegetal;
 Secundário - indústrias de transformação (alimentar,
metalúrgica, mecânica, química) e de construção, extração mineral, serviços de
gás e energia elétrica;
 Terciário - administração pública, comércio de mercadoria e
de imóveis, transporte, comunicações, instituições financeiras e outros serviços
(profissionais liberais e serviços pessoais como empregados domésticos).

(%)

Setor Primário

Setor Secundário

Setor Terciário

Figura 11 - Evolução da população economicamente ativa do Brasil - 1920/80


(Fonte: IBGE - Anuário Estatístico do Brasil; Singer, P. Força de trabalho e emprego no Brasil: 1920-1969.
Cadernos CEBRAP, n. º 3, 1971)

A estrutura social do Brasil sofreu grande transformação entre as


décadas de 50 e 80 (figura 11). A população que era preponderantemente rural
tornou-se urbana; a força de trabalho, que estava vinculada principalmente à
lavoura e à pecuária, incorporou-se em sua maioria a atividades urbanas,
44

indústria e sobretudo de serviços; as relações capitalistas de emprego tornaram-


se predominantes, embora ainda jogue papel importante no campo e na cidade,
as relações não capitalistas, verificadas no artesanato, em fábricas caseiras e de
fundos-de-quintal, escritórios e comércio ambulante.
Em síntese, o crescimento demográfico brasileiro caracterizou-se
por um processo de intensa urbanização e acelerada redução do contingente
rural. O grau de urbanização reflete-se na composição da renda interna do país.
Como se pode ver na figura 11, a agricultura (setor primário) paulatinamente
perdeu peso a partir da década de 50 e o setor secundário (industrial) e o de
serviços (terciário) aumentaram sua participação relativa.
A tricentenária cidade de Curitiba - surgida como pouso de
garimpeiros e localizada numa região topograficamente desfavorável, que a
sujeita periodicamente a catástrofes "naturais" (inundações) - na opinião de
Mendonça (op. cit., p. 70), "[...] é um dos únicos exemplos onde se
implementou, nas últimas décadas, um planejamento de caráter sistêmico no
Brasil [...]".
Pode-se destacar também Brasília, com seu Plano Piloto concebido
por Lúcio Costa com base na cidade funcional ideal-linear de Le Corbusieur, e
na tentativa de equacionamento da sua urbanização através das oito cidades-
satélites, bem como da implementação do Programa de Desenvolvimento da
Região Geoconômica, de investimento em infra-estrutura e no setor industrial e
rural nos municípios da sua área de influência, como o Distrito Agroindustrial
de Anápolis (ESTEVAM, 1998, p. 169-70)34.
No entanto, estes exemplos são "ilhas de exceções" diante do
cenário das nossas cidades, em geral, caracterizadas pela falta de planejamento
urbano. Mesmo no conceito tradicional do termo, a discussão sobre urbanismo e
planificação regional, não é assunto prioritário.
Num país de economia e urbanização atrasadas, como o Brasil, as
intervenções urbanísticas circunscreveram-se, no geral, às intervenções
localizadas em determinados setores das cidades, em geral atendendo interesses
dominantes. Este fato pode ser entendido como a expressão do perfil
extremamente desigual da distribuição da renda nacional, que materializa nas
cidades a segregação de classes. Uma minoria social de maiores rendimentos se
apropria e produz um espaço dotado de infra-estrutura adequada, em meio ao
caos urbano reinante para a maioria da população que possui menor poder
aquisitivo.
Como salienta Souza (op. cit.), os responsáveis pela produção do
sítio urbano, sobretudo nas metrópoles, são claramente delimitados num
processo em que aparecem, lado a lado, os agentes da verticalização, da
incorporação, da valorização da terra, do Estado e, até mesmo, dos moradores,
destacadamente sob a ótica dos interesses eleitorais.
34
ESTEVAM, L. O tempo da transformação - estrutura e dinâmica da formação econômica de Goiás. Goiânia:
Ed. do Autor, 1998. 276p. Tese (Doutorado - Economia) UNICAMP, São Paulo, 1997.
45

2.4. A URBANIZAÇÃO DE GOIÁS - UMA BREVE


CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO - AMBIENTAL

Palacín & Moraes (1989, p. 9)35 ensinam que o povoamento do


Estado de Goiás foi determinado pela mineração aurífera, sobretudo a partir da
bandeira de Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhangüera, que partiu de São Paulo
em 3.7.1722. Durante o período histórico do Ciclo do Ouro ocorreu o
descobrimento e a exploração intensiva das minas de ouro e de diamante no
Brasil. Assim, na sua origem, a forma de urbanização de Goiás configurou-se
como sendo “[...] a mais irregular e instável, sem nenhum planejamento, sem
nenhuma ordem. Onde aparece ouro, ali surge uma povoação; quando o ouro se
esgota, os mineiros mudam-se para outro lugar e a povoação definha ou
desaparece [...]" (PALACÍN & MORAES, op. cit., p. 11).
De acordo com Estevam (op. cit.), a descoberta do ouro no território
goiano (1722) deu-se dentro de um intenso processo deflagrado em todo o país,
sob o jugo do Estado português. Este se inseriu no sistema mercantilista como
um entreposto lusitano da Inglaterra no cenário das trocas mundiais. A
descoberta das jazidas na região do Rio Vermelho, realizada pelo "Anhangüera",
introduziu mais um "eldorado" no cenário da colônia brasileira, depois de Mato
Grosso (1719) e de Minas Gerais (1690). A produção total durante o século
XVIII pode ser vista na tabela 4.
O território das Minas dos Goiases, denominação devida aos índios
Goyaz que o habitavam, pertenceu à Capitania de São Paulo até 1749, quando
ganhou autonomia, transformando-se em Capitania de Goiás. À época, a
população de brancos e escravos estava na casa dos 40 mil habitantes.
Tabela 04 - Produção de ouro na colônia brasileira durante o século
XVIII e a participação relativa das três capitanias produtoras
Minas Gerais Goiás Mato Grosso Total
Em tonelada 118,94 28,88 10,70 158,52
Percentagem 75,50 18,20 6,80 100,00
Fonte: Pinto, V. N. O ouro brasileiro e o comércio português. São Paulo: CEN/MEC,
1979, apud Estevam (1998, p. 40).

A primeira região ocupada foi a do Rio Vermelho onde se edificou


o arraial de Sant'Ana, - chamado posteriormente Vila Boa e depois, como é
hoje, Cidade de Goiás - que foi, durante duzentos anos, a capital do território.
Nesta região foram erguidos os povoamentos mais antigos e importantes do
período da mineração, coincidindo com a localização das maiores concentrações
auríferas em torno dos Montes Pirineus e da Serra Dourada.
Os estudiosos da formação econômica de Goiás afirmam que a
economia aurífera goiana, em relação à de Minas Gerais, foi modesta tanto no

35
PALACÍN, L. & MORAES, M. A. S. História de Goiás. 5 ª ed. Goiânia: 1989, Ed. UCG, 124 p.
46

aspecto quantitativo (v. tabela 4) como no qualitativo. Neste aspecto, verificou-


se que em pouco mais de 50 anos ocorreu a decadência rápida e quase completa
das jazidas. O método de prospecção do metal foi o de aluvião de superfície, que
se esgotava rapidamente. A mineração de morro - abertura de talhos ou
trituração de rochas - quase não foi praticada em Goiás, como ocorreu na
capitania mineira.
Devido à extensão do território goiano, era grande o distanciamento
entre as jazidas. As pousadas e povoações foram distanciadas pela capacidade de
marcha dos animais: carro-de-boi, 4 léguas; boiada e tropa, 4-6 léguas; cavalo,
7-8 léguas. A dificuldade de abastecimento fez com que a mineração coexistisse
com a lavoura e a pecuária como uma alternativa necessária ao suprimento de
víveres aos acampamentos de mineração. Assim, surgiram em torno destes,
colonos agricultores ("roceiros", e.g., "os donos das roças") que vendiam seus
produtos aos mineradores ("mineiros", e.g., "os donos das minas").
Portanto, os arraiais que se formaram no rastro do caminho do ouro
nasceram desta realidade, que impôs diferentes atividades e composições sociais
ao processo colonizador, tendo a participação dos mineradores, dos escravos e
da população autóctone. Esta era constituída pelos povos indígenas das tribos
Caiapó, Xavante, Tupi, Crixá, Carajá, Avá, Araés, Xerente, Acroá, Aricobé,
Xacriabá, Apinajé e Krahô, perfazendo uma população estimada de cerca de
500 mil nativos.
Com a exaustão das jazidas e a decadência completa da mineração,
no final do século XVIII, a capitania de Goiás entrou em crise. Uma parcela da
população branca emigrou para outros territórios. Os escravos foram
abandonados pelas expedições. Em 1804 o censo encomendado pelo conde de
Palmas registrou 50 mil habitantes, dos quais 20 mil eram escravos. A
população total decresceu 20% em relação ao auge do ciclo do ouro em Goiás
no ano de 1783 (PALACÍN & MORAES, op. cit.).
Assim, o grosso da população colonizadora de mineradores e de
escravos, depois de quase um século de exploração mineraria, acabou
permanecendo no território goiano, dispersando-se inicialmente pelos arraiais e
vilas formados durante o período aurífero.
Na historiografia de Goiás encontra-se o registro de um período,
que perdurou durante todo o século XIX, após a decadência da mineração de
aluvião, durante o qual os colonos abandonaram lentamente os "núcleos
urbanos", que desapareciam ou arruinavam-se, embrenhando-se nos sertões e
dedicando-se à agropecuária de subsistência. Os costumes e os hábitos da
"civilização branca" foram esquecidos em decorrência do isolamento a que os
goianos estavam confinados, resultando - segundo terminologia de Palacín &
Morais (op. cit.) - na ruralização da população e na desumanização do homem.
Os historiadores caracterizaram esse fenômeno - peculiar no
continente americano - como uma estagnação do modus vivendi colonial e até
mesmo de regressão aos costumes dos povos ágrafos:
47

[...] insulados geograficamente e culturalmente, sem meios de transporte e


comunicação, esses elementos humanos conservaram o modo de vida da época
colonial, ou regrediram, em alguns aspectos, ao estado selvagem dos nossos
índios. No ciclo da pecuária em Goiás, registrou-se a regressão dos costumes
ou indianização do modus vivendi [...] (Palacín & Moraes, op. cit., p. 63).
Esse período ocorreu após a decadência da mineração, no final do
século XVIII e perdurou até as primeiras décadas do século XX - "[...] o estado
de Goiás caracterizou-se pelo seu isolamento, baixa densidade demográfica e
pela economia de subsistência [...]" (PALACÍN & MORAES, op. cit., p. 90).

2.5. UMA BREVE RESENHA SOBRE OS ASPECTOS


SÓCIOCULTURAIS DA URBANIZAÇÃO DE GOIÁS

No processo de formação sócio - econômica de Goiás, por um


longo tempo, durante todo o século XIX e até o início do século XX,
manifestou-se intensamente entre nós as características socioeconômicas do
período colonial. O monopólio da extração mineral e as relações escravistas de
produção caracterizaram o Brasil Colônia. Basta ver que perdurou até o início
do século XIX a proibição de se instalar fábricas e manufaturas em toda a
colônia.
Com o colapso das riquezas auríferas, o legado deixado pelo modo
colonialista de produção não permitiu que se abrisse caminho para a
industrialização do país, como ocorreu, por exemplo, na Austrália, de
industrialização precoce em relação aos demais países do Hemisfério Sul
(ESTEVAM, op. cit.).
O sistema atrasado de produção que vigorou no Brasil Colônia,
repercutiu mais intensamente em Goiás. Durante todo o século XIX, no período
do chamado “ciclo do gado”, a estrutura produtiva goiana esteve fundamentada
numa economia de subsistência, imune às influências das manifestações
republicanas e das transformações capitalistas em curso no Sudeste do nosso
país, ainda que estas se processassem tardiamente em relação aos países
europeus.
Uma das heranças mais significativas do longo período colonial na
região está relacionada à estrutura fundiária de Goiás, marcados por dois traços
fundamentais e às vezes interligados - o latifúndio e a posse. O regime de
regularização fundiária vigente estava assentado na ordenação das sesmarias –
lotes de terras incultos ou abandonados concedidos pelos reis de Portugal aos
sesmeiros para seu cultivo (ESTEVAM, op. cit.).
O poder estatal colonial estabeleceu uma série de mecanismos -
como os critérios restritivos de posse – que, por um lado, dificultou a concessão
dos benefícios da propriedade aos menos favorecidos, interessados no cultivo da
terra e, por outro lado, permitiu o acesso legal apenas aos que dispunham de
48

influência e conheciam os meandros da burocracia, obtendo assim grandes


glebas.
Por esta razão, segundo os nossos historiadores, a produção
pioneira do espaço goiano resultou na ocupação das terras de lavoura e de
criação, sem a preocupação com esta formalidade – os títulos de propriedade por
concessão das sesmarias - e, portanto, ocorreu “às margens da lei”. A
legalização destas propriedades fez-se posteriormente, através de “brechas” na
legislação, através das quais “[...] os cartórios locais aceitavam, por exemplo, os
contratos de compra e venda dessas terras, que se tornavam, desta forma,
legalizadas [...]” (ALENCAR apud ESTEVAM, 1993, p. 73)36.
Contudo, à maioria dos desempregados da mineração, que não tinha
condição de avançar na ocupação do território e demarcar a sua própria posse,
restava a alternativa de agregar-se a uma propriedade, em geral um latifúndio
estabelecido. Muitos destes, por sinal, sequer delimitação legal possuía.
Assim, desenvolveu-se na fazenda goiana, toda uma organização
baseada no trabalho pecuária extensiva - agricultura intensiva, através de um
sistema complexo de intercâmbio e de convivência entre agregados e
fazendeiros “[...] sem as características básicas de formação de classes sociais e,
portanto, sem a promoção do divórcio entre os meios de produção e a força de
trabalho [...]” (ESTEVAM, op. cit. 75).
Assim, no aspecto sociocultural, desenvolveu-se uma civilização
em Goiás cuja unidade básica de organização sócio-produtiva era a fazenda
sertaneja – “[...] lugar de morar, criar gado, plantar roça e sociabilizar-se, ou
seja, viver e produzir [...]” (ESTEVAM, op. cit., p. 77).
Essas características imprimiram uma marca bastante particular ao
processo de inserção de Goiás na economia nacional, através de um ritmo
próprio de desenvolvimento cultural, social e político na nossa região. Pode-se
destacar, neste aspecto, as formas de relacionamento entre o homem e a
natureza, que foram desenvolvidas durante o longo período em que se deu a
“ruralização” da sociedade goiana, simultaneamente ao processo conflituoso de
miscigenação dos colonizadores e escravos com os povos autóctones.
As comunidades humanas tradicionais guardam um valioso acervo
de conhecimento sobre a biodiversidade tropical, que se expressa no uso das
plantas nativas na arte culinária, na medicina popular, nos rituais religiosos e
folclóricos. Estes aspectos culturais do patrimônio ambiental brasileiro encerram
importantes ensinamentos que, resgatados pela ciência, fornecem diretrizes para
o uso sustentado dos recursos naturais.

36
ALENCAR, M. A. G. Estrutura fundiária em Goiás, Série Teses Universitárias, n. 2. Goiânia: Ed. UCG, 1993,
apud ESTEVAM, L. (op. cit., p. 73).
49

Diegues (1996, p. 135)37 alerta para a necessidade de proteger tanto


a biodiversidade quanto à diversidade sociocultural, tendo em vista relação
intrínseca entre cultura e meio ambiente:
[...] já existe a nível internacional uma consciência crescente que a proteção da
diversidade biológica, de espécies, ecossistemas e genes não pode ser
dissociada daquelas culturas tradicionais que possuem um vasto conhecimento
do meio natural em que vivem [...].
A literatura consulta cita a existência de muitas espécies de ervas
“daninhas” disseminadas nos trópicos, sendo algumas de distribuição
cosmopolita, como a tiririca, ora-pró-nóbis e caruru-do-reino, que eram
utilizadas na alimentação humana, prática esta que ilustra a interação da cultura
com o meio ambiente, no sentido preconizado pelo autor acima citado
(ANDERSEN & ANDERSEN, 198938; ZURLO & BRANDÃO, 199039).
Em Goiás, as primeiras ocupações pré-históricas identificadas por
Barbosa (1992)40 constituíram a Seqüência Cultural de Serranópolis, na região
do Mato Grosso Goiano: os caçadores do Paleoíndio, de 11 a 9 mil antes do
presente (a.p.); os coletores do Arcaico, de 9 a 1 mil a.p.; e os agricultores da
seqüência Horticultor, desde 1 mil a.p. até o presente. Estes povos deixaram um
legado de plantas domesticadas como milho, feijão, abacaxi, tomate, seringueira,
mandioca.
De acordo com Sobrinho & Vaz (1992)41, as populações indígenas,
existentes à época da colonização, eram constituídos de caçadores e pequenos
agricultores de antigos grupos Macro-Jê. Distinguem-se várias etnias, como os
Caiapó, que tinham um contingente de 150 mil nativos, distribuídos pela região
onde hoje se encontram os municípios de Sancrerlândia, São Luiz de Montes
Belos e Morrinhos; neste, inclusive, se formou um aldeamento.
Cerca de 100 mil Carajá habitavam as margens do Rio Araguaia,
da Ilha do Bananal até o Bico do Papagaio. A tribo dos Crixá formou o
aldeamento Carretão; os Avá, o aldeamento São José do Ouro; os Caiapó foram
aldeados em São José de Mossâmedes; os Acroá, que habitavam a região de
Arraias, Natividade e São Domingos foram aldeados em Duro, atual Dianópolis.
O aldeamento consistia numa política de fixação dos índios em
aldeias, construídas e mantidas pela Capitania, sob a supervisão de uma

37
DIEGUES, A. C. S. O Patrimônio Natural e o Cultural: por uma visão convergente. In: SIMPÓSIO SOBRE
POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE E PATRIMÔNIO CULTURAL, Goiânia, 9-12 de dezembro
de 1996, Atas... Goiânia: UCG/IGPA, 1996, p. 135-7.
38
ANDERSEN, O. & ANDERSEN, V. U. As frutas silvestres brasileiras. 3 ª ed. São Paulo: Globo, 1989, 203p.
39
ZURLO, C. & BRANDÃO, M. As ervas comestíveis: descrição, ilustração e receitas. 2 ª ed. São Paulo: Globo,
1990, 167p.
40
BARBOSA, A. S. Antropologia social. 26-28 mar. 1992. In: CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
ADMINISTRAÇÃO DE COOPERATIVAS. Goiânia: UCG/OCG, 18 mar. 1992 a 30 maio 1993. /n.p./.
41
SOBRINHO, W. C. & VAZ, E. Formação econômica de Goiás. 27-29 ago. 1992. In: CURSO DE PÓS-
GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO DE COOPERATIVAS. Goiânia: UCG/OCG, 18 mar. 1992 a 30
maio 1993. /n.p./.
50

autoridade leiga ou religiosa, onde os nativos deveriam cultivar o solo e


aprender uma religião.
Apesar da marginalização a que os indígenas foram submetidos no
processo de formação da sociedade goiana, o fato é que eles deixaram um
legado consistente na prática da "agricultura de coivara", herdada
principalmente do Tupi; na transformação da mandioca e do milho; no
artesanato (rede, cerâmica) e na construção de ranchos, palhoças e casas rurais
primitivas com cobertura de palha, paredes de pau-a-pique e o uso do barro ou
taipa.
Para Bertran (1994, p. 22)42, a hipótese antropológica de uma
interação estreita entre indígenas e natureza sugere um paradigma eco-histórico
na abordagem do desenvolvimento da sociedade na região dos cerrados. Entre os
povos da etnia Caiapó do Pará, cita este autor, os pesquisadores identificaram 50
plantios de espécies medicinais, alimentícias e florísticas do cerrado que foram
plantadas, sistematicamente, geração após geração, na pré-Amazônia.
Trabalhos desenvolvidos por Barbosa (1990)43 e por Rizzo (1985)44,
mostram essa relação homem-ambiente, no aspecto da saúde humana, sob a
influência dos traços sócio-culturais de formação da sociedade goiana,
reforçando o paradigma eco-histórico de Bertran, citado anteriormente. Essas
manifestações sócio-culturais-ambientais foram definidas historicamente por um
longo período de "ruralização", no qual os goianos tiveram que se inserir ou
submeter-se às condicionantes da realidade ambiental. Esta inserção no mundo
natural, no período de colonização do Estado de Goiás, decorreu da necessidade
de sobrevivência através de um modelo quase que extrativista, onde a sociedade
goiana aprofundou sua ligação com o bioma cerrado, e, de alguma maneira
facilitou a miscigenação do colonizador com os povos autóctones. Nesse
processo, foi possível acumular conhecimentos sobre os recursos naturais que
são aplicados pela população para satisfazer as necessidades sociais.
No entanto, o paradoxo está em que, a força motriz do
desenvolvimento do Estado de Goiás, baseada nas levas de imigrantes a procura
do "eldorado", seja na época do ciclo do ouro, da pecuária ou mais recentemente
da agricultura e da agroindústria, tem como motivação a exploração máxima dos
recursos naturais, levando-os à quase exaustão. Assim, esse processo de
desenvolvimento gera um conflito com as comunidades tradicionais que, ao
contrário, estabelecem com a natureza relações de interdependência.

42
BERTRAN, P. História da terra e do homem no Planalto Central: Eco-história do Distrito Federal: do indígena
ao colonizador. Brasília: Solo, 1994. 314 p.
43
BARBOSA, M. A. A fitoterapia como prática de saúde - o caso do Hospital de Terapia Ayurvedica de
Goiânia. 257 p. Dissertação (Mestr. - Enfermagem) Escola de Enfermagem Anna Nery, UFRJ, R. de Janeiro,
1990.
44
RIZZO, J. A. Utilização de plantas medicinais em Goiânia. Goiânia: Ed. UFG, 1985.
51

2.6. ALGUNS ASPECTOS DA REVOLUÇÃO DE 30 E O PROCESSO


DE URBANIZAÇÃO DE GOIÁS RELACIONADOS AO MEIO
AMBIENTE URBANO

Como já foi exposto, o ciclo da mineração do ouro e do diamante


em Goiás abriu caminho para a exploração agropecuária, permitindo a fixação
do homem no meio rural. Durante todo o século XIX o povoamento era
heterogêneo, com baixíssima densidade demográfica.
No início do século XX, um fator a ser lembrado no povoamento e
no incremento da urbanização de Goiás foi a expansão da cafeicultura paulista.
Esta repercutiu no sul de Goiás, estimulando o surgimento das fazendas de café
e de uma correspondente camada social que se inseriu perifericamente ao
sistema oligárquico dominado pela burguesia cafeeira. Outro fator, foi a
construção da estrada de ferro até Araguari, no Triângulo Mineiro, em 1896 e
até Roncador, em 1913, adentrando um trecho de apenas 233 km no território
goiano. Somente em 1935 chega a Anápolis e em 1950 a Goiânia.
Até a década de 30, a população goiana estava ligada às atividades
agropastoris. A preocupação dominante era a criação de gado - regularmente
vendido a invernistas (que se ocupam da engorda de novilhos e recuperação do
gado para o abate), principalmente do triângulo mineiro e de São Paulo. A
agricultura de subsistência voltava-se para o consumo local, com poucos
excedentes exportáveis, como o arroz (ESTEVAM, op. cit., p. 206).
O Estado de Goiás, até então, tinha uma inexpressiva população,
com mais de 90% do seu contingente habitando o campo. Uma pequena parcela
residia em povoações que tinham mais caráter de “[...] formações urbanas em
meio rural do que propriamente caráter de cidades [...]” (CHAUL, 1997, p.
25)45, não se podendo falar em meio urbano.
Em 1920, o setor industrial era praticamente inexistente, contando
com apenas 16 indústrias, empregando 244 operários. A participação de Goiás,
no conjunto da produção industrial do Brasil, era totalmente inexpressiva,
representando apenas 0,0001% do capital total e 0,0002% da produção nacional.
Até o advento da “revolução de 30” a indústria em Goiás existia apenas para
“[...] atender as necessidades mais imediatas do setor primário de indústrias
artesanais não fabris [...]” (SILVA, 1983, p. 30)46.
A exportação de gado constituía-se na maior fonte da receita
estadual. Em termos gerais, na virada da década de 30, as exportações goianas
de produtos agropecuários cresciam nominalmente, sobretudo para São Paulo. A
economia goiana formava a "periferia da periferia" do sistema capitalista
dependente do país, até então baseada na agro-exportação de produtos primários.

45
CHAUL, N. F. Caminhos de Goiás: da construção da decadência aos limites da modernidade. Goiânia: Ed.
UFG, Ed. UCG, 1997, 247 p. Tese (Doutorado - História) USP, São Paulo, 1995.
46
SILVA, A. L. A revolução de 30 em Goiás. 220 p. Tese (Doutorado - História) USP, São Paulo, 1983.
52

Tabela 05 - Evolução da população de Goiás (1738 - 2000)


Ano População (em milhares) Tx. anual de crescim. (%)
1738 19,1 -
1750 40,0 9,1
1783 60,0 1,5
1804 50,8 -15,3
1809 50,4 -0,2
1819 63,2 1,3
1824 60,0 0,9
1837 117,4 7,4
1856 122,0 0,2
1861 133,0 1,8
1872 160,4 1,9
1888 211,7 2,6
1890 227,6 3,7
1900 255,3 1,2
1905 270,0 1,2
1908 280,0 1,2
1920 511,9 6,9
1940 826,4 3,1
1950 1214,9 4,7
1960 1954,9 6,1
1970 2938,7 5,0
1980 - -
1990 4417,8 2,5
2000 4994,9 1,3
*este dado pode conter imprecisão do censo, cf. Palacín (1986). Fontes: Palacín (1986, ps. 63, 93 e
114); Bertran, P. Formação econômica de Goiás. Goiânia: Oriente, 1978, p. 151; Estevam (1998, p.
16l); IBGE, Censo 2000.

A grande depressão de 1929, contudo, impôs uma queda do


consumo, repercutindo na pauta da exportação goiana. Como uma moldura deste
quadro de crise, segundo Silva (op. cit., p. 211-4), “[...] desenvolve-se a
‘revolução de 30’, que põe fim ao domínio do sistema oligárquico da burguesia
do café, levando Getúlio Vargas ao poder central [...]”. Para esta autora, o
comando deste processo esteve ligado aos setores das classes médias,
principalmente nas grandes cidades das regiões Sul e Sudeste do país, sob a
liderança dos tenentes, aliados a outras frações das classes dominantes
descontentes com o domínio da oligarquia cafeeira.
Contudo, em Goiás, segundo a autora supra, diferentemente das
regiões brasileiras mais desenvolvidas, em função da formação econômica
caracteristicamente rural deste estado, não se formaram as classes sociais
concernentes ao processo de industrialização. Além disso, as classes médias
eram pouco expressivas. Daí que, em nosso meio, o "movimento revolucionário"
significou uma substituição de oligarquias no poder de um estado
eminentemente rural.
Mas, para CHAUL (op. cit., p. 45-6), além desta alternância
política, a condução deste movimento na sociedade goiana repercutiu
53

[...] numa mesclagem da participação destas classes médias com o ideal


burguês do mundo capitalista, que supõe ao mundo agrário o padrão urbano;
numa interação entre o urbano e o rural, o médico e o fazendeiro ou o médico-
fazendeiro; o liberal e o conservador; o oligarca e o revolucionário [...].
Enfim, o surgimento de Goiânia, em 1933, pode ser visto como
resultado da "utopia possível" - um produto típico da ‘revolução de 30’, pois
“[...] vamos notar a construção de Goiânia como uma consolidação do possível
entre o urbano e o rural, capaz de absorver os elementos existentes e as ideias
em trânsito, o velho e o novo, a oligarquia e a revolução, a agricultura e o
comércio [...]” (CHAUL, op. cit., p. 47).A construção de Goiânia promoveu a
valorização das terras e incentivou o seu parcelamento; os solos férteis da região
do "Mato Grosso Goiano" foram desmatados e explorados; levas de imigrantes
chegaram ao planalto central. Enfim, Goiânia representou uma arrojada aposta
no futuro, ampliando as possibilidades de negócios e investimentos que
alteraram a estrutura produtiva da região.
Estevam (op. cit., p. 118) destaca que a “[...] revolução de 30
ensejou alterações na ordem política que repercutiram numa nova visão de
desenvolvimento nacional [...]”. Inaugurou-se um período de industrialização do
país, através da política da "substituição das importações". O setor agro-
exportador deixou de ser o "centro dinâmico da economia nacional".
Desenvolveu-se a integração dos mercados regionais ao pólo
dinâmico da industrialização - Estado de São Paulo. Neste contexto, o projeto
federal de interiorização promoveu um surto migratório para o planalto central -
"marcha para o oeste" - nas décadas de 1940/50, somente suplantado pelo
Estado do Paraná.
No Paraná, segundo Mendonça (op. cit.), a política de imigração
contou com a participação ativa da iniciativa privada, como a Paraná
Plantations Limited, criada por ingleses, que adquiriu o correspondente à 1/16
do território paranaense. Implementou-se um processo de colonização, de
loteamento de terra e de produção de café nos solos férteis de terra roxa, através
de uma estruturação fundiária baseada em pequenas propriedades, de 18 a 50
hectares. As propriedades foram distribuídas sobre o relevo na forma de
espinha-de-peixe, onde a maioria tinha acesso tanto ao sistema viário para o
escoamento da produção quanto aos mananciais hídricos.
Do ponto de vista ambiental, esta forma de colonização efetivada
no Paraná, de acordo com o autor supra, constituiu-se num fator decisivo para o
desmatamento da Floresta Tropical-Subtropical e para o esgotamento dos solos.
Mas, a partir da década de 50, a estruturação social efetivada permitiu a
"modernização da agricultura", substituindo-se a cafeicultura por culturas
cerealistas rotativas, resultando em intenso êxodo rural nas décadas de 60 e 70.
Em Goiás, por sua vez, a colonização foi promovida sob a tutela do
setor público, através de pesados investimentos e subsídios. O governo federal
criou uma série de oito colônias agrícolas. A mais importante delas, iniciada em
54

1946, foi a Colônia Agrícola Nacional de Goiás (CANG), localizada em Ceres,


que assentou gratuitamente cerca de 10 mil colonos numa área de 106.000
hectares de florestas virgens e densas da região do "Mato Grosso Goiano".
A produção desta colônia cresceu e despertou a atenção do capital
mercantil, que submeteu os colonos a um esquema especulativo de
comercialização da produção. Como o governo não transferiu o título de
propriedade das posses aos colonos e com a valorização das terras, atraiu-se a
cobiça de grileiros e fazendeiros, gerando conflitos de terra, alguns dos quais
ganharam notoriedade nacional, como o de Trombas (ESTEVAM, op. cit.).
No aspecto ambiental, o projeto do governo previu a rotação de
cultura e a implantação de uma agricultura permanente, como forma de evitar a
depredação das matas. Temia-se esta como uma conseqüência da agricultura
itinerária. Todavia, na prática, foi adotado o método tradicional. Este método é
baseado nas queimadas, na abertura de novas frentes de lavouras em solos
férteis de matas recém desmatadas, exploração, exaustão e abandono.
Deflagrou-se um círculo vicioso que resultou no rápido desmatamento de toda a
área. Esta devastação foi considera pelo escritor Carmo Bernardes como "a
maior catástrofe ecológica de Goiás" (Diário da Manhã, Goiânia, 1º jul. 1983).
Essas formas agressivas de colonização foram comparadas pelos
historiadores de Goiás a uma "frente militar", na qual o contingente de colonos -
agricultores pioneiros - combatia a natureza, transfigurando a paisagem natural
sem se preocupar com as conseqüências ambientais.
Em função da construção de Goiânia, um atrativo real para o surto
migratório foi a existência das faixas de terras cobertas de matas, baratas e
férteis, existentes na região do Mato Grosso de Goiás. Silva (op. cit., p. 195)
destacou que "[...] o desbravamento desta área foi intenso sendo que, em 1940,
34% do estoque de matas do estado havia sido destruído [...]".
Segundo a autora citada, a corrente migratória, nas décadas de 40 a
60, foi tão intensa que a população residente em Goiás que nasceu fora do
estado ampliou de menos 1/5 para mais de 1/4 do contingente total, neste
período. A maioria dos migrantes era originária do estado de Minas Gerais -
entre 50 e 60% - e o restante praticamente dos estados do Nordeste. Para a
autora, na ótica ambiental, o mesmo processo colonizador que destruiu a mata
atlântica repetiu-se, em Goiás, nas florestas do cerrado.
Outro instrumento de intervenção estatal no processo de
colonização da Região Centro-Oeste e de Goiás, em particular, foi a política de
subsídios, através de programas federais desenvolvidos pela Comissão de
Desenvolvimento do Centro-Oeste, posteriormente SUDECO e, na sua parte
norte, pela SUDAM. Estes programas foram o PROTERRA, o PRODOESTE, o
POLOCENTRO e o Programa de Desenvolvimento da Região Geoeconômica
de Brasília, que objetivaram a realização de investimento em infra-estrutura e de
financiamento da atividade agropecuária e agro-industrial.
55

A atuação do Estado, por via da política de incentivos e de


subsídios foi de tal monta que, em 1975, o produto bruto da agricultura no
Centro-Oeste foi inferior ao volume do crédito rural concedido. A estrutura
sócio-produtiva sofreu significativas transformações. Graças ao
desenvolvimento da agroindústria, o estado de Goiás aprofundou a sua inserção
no cenário econômico nacional. No período de 1985 a 1991, o quantitativo de
empresas de capital internacional e nacional, saltou de 2 para 8 e de 6 para 13,
respectivamente (ESTEVAM, op. cit., ps. 168 e 176).
A expansão da fronteira agrícola e a industrialização da agricultura
permitiram aprofundar a especialização do estado na transformação de produtos
alimentares. No quadro da estrutura produtiva, este ramo da indústria goiana
passou a ser o responsável pela maior parte do Valor da Transformação
Industrial (VTI), com destaque para o complexo agroindustrial grãos-carne-leite
(derivados de soja, frigoríficos e laticínios).
Contudo, a industrialização goiana, como não poderia deixar de ser
- pela sua condição histórica de "periferia da periferia" do sistema capitalista
(Silva, op. cit.) - é incompleta. A tabela 6 mostra a evolução da composição da
renda interna de Goiás a partir de 1940, cujos dados ilustram uma
industrialização parcial do estado.
Apesar das atividades agrícolas terem perdido peso na composição
da estrutura produtiva, elas ainda foram responsáveis, em 1995, pela absorção de
1/4 da população economicamente ativa. As atividades agroindustriais
localizaram-se apenas nas periferias dos centros urbanos maiores. E no setor de
serviços houve aumento da oferta de empregos, refletindo o fenômeno da
intensa e rápida urbanização do estado. Na década de 1980, o êxodo rural foi
espantoso em Goiás. A redistribuição urbano/rural resultou numa taxa de
urbanização de 80,8% em 1991. Esta taxa saltou para 87,87% em 2000.
Embora o processo de urbanização seja um fenômeno nacional, ele
apresenta-se diferenciado qualitativamente de acordo com as características
peculiares do desenvolvimento econômico regional. Em São Paulo, por
exemplo, decorreu mais fortemente da industrialização do estado.

Tabela 06 - Composição percentual da Renda Interna de Goiás (1940/95)


Ano Agricultura Indústria Serviços
1940 70,4 5,8 23,8
1950 51,0 9,2 39,8
1960 49,5 7,3 43,2
1970 28,0 9,0 63,0
1980 27,9 21,7 50,3
1985 20,2 26,0 53,8
1990 16,0 29,2 54,8
1995 16,2 25,4 58,4
Fonte: FGV e IPEA, apud Estevam (1998, ps. 151 e 196).
56

No caso de Goiás, embora a base econômica esteja na agropecuária


e não na indústria, o fenômeno também ocorreu, de maneira intensa e rápida. A
urbanização em Goiás é uma conseqüência, sobretudo, da chamada
modernização da agropecuária. Em outros termos,
[...] não houve 'generalização' espacial da modernização produtiva e sim
'aliança' entre o elemento conservador agrário, expresso pela grande
propriedade e pelo capital comercial, além de representantes das
agroindústrias. Deste modo, os programas oficiais e as inovações tecnológicas
rearticularam o espaço rural goiano intensificando o ritmo de concentração
fundiária e o 'fechamento horizontal' da fronteira. [...] (ESTEVAM, op. cit., p.
179).
Esta "modernização da agricultura", intensificada a partir de 1980,
converteu-se numa nova etapa da "marcha para o oeste", que foi iniciada na
década de 40. E mais uma vez, surge o fenômeno correlato do surto migratório,
só que agora acompanhado também do surto da urbanização. Entre 1980 e 1995,
a região Centro-Oeste recebeu 931 mil pessoas, ficando abaixo do Nordeste (1
milhão) e de São Paulo (1,9 milhões), demonstrando o efeito atrativo dos
grandes centros urbanos e das fronteiras agrícolas no ciclo migratório do país.
Neste contexto, de notável fluxo migratório urbano-rural, de
dissolução da fazenda tradicional, de valorização e especulação de terras, em
Goiás,
[...] as famílias deixaram as fazendas, mas permaneceram - em cidades
próximas - na condição de trabalhadores rurais temporários; o número de
agregados de fazendas foi reduzido drasticamente assim como o de lavradores
sem terra que cultivavam em pequenas terras alheias; antigos meeiros viraram
diaristas, da mesma forma que pequenos proprietários passaram a fornecer
trabalho acessório em propriedades alheias tornando-se sazonalmente
assalariados. [...] (ESTEVAM, op. cit., p. 208).
A contradição está em que, dada a estrutura econômica da região, a
expansão da fronteira agrícola atraiu o surto migratório, mas foi a cidade que
assentou o imigrante. Agravou-se, assim, o êxodo rural e os conseqüentes
problemas sócio-ambientais urbanos, já que as cidades não dispunham de
condições político-administrativas para enfrentar o desafio da gestão urbana.

2.7. GOIÂNIA: URBANIZAÇÃO E URBANIFICAÇÃO


RELACIONADAS AO MEIO AMBIENTE

Como já exposto, a urbanização é o processo pelo qual a população


urbana cresce em proporção superior à população rural. Constitui-se num
fenômeno, mais do que de crescimento das cidades, de redistribuição
populacional através da concentração humana nos aglomerados urbanos.
Um país é considerado urbanizado quando a sua população urbana
ultrapassa 50%. Os economistas consideram o grau de urbanização como um
57

dos indicadores de desenvolvimento de uma nação pelo fato de os países


industrializados serem urbanizados.
No entanto, a urbanização gera enormes problemas de deterioração
do meio ambiente urbano, nos aspectos físicos - uso e abuso do solo, poluição
atmosférica e hídrica; sociais - favelização, marginalização, insegurança,
desemprego, desatenção à saúde e à educação; e biológicos - destruição das
áreas verdes, expulsão da fauna, etc.
Conforme salienta Afonso da Silva (1995)47, a solução destes
problemas é feita mediante intervenção do poder público, objetivando-se
transformar o meio urbano e criar novas formas urbanas. Este processo
denomina-se urbanificação, que é uma forma deliberada de correção da
urbanização, através da renovação urbana - reurbanização - ou, também, da
criação artificial de núcleos urbanos, como as cidades novas da Grã-Bretanha e
Brasília. Aduz, ainda, o autor supra que "[...] este termo foi cunhado por Gaston
Bardet para designar a aplicação dos princípios do urbanismo, advertindo que a
urbanização é o mal, a urbanificação é o remédio [...]" (p. 21).
A urbanização de Goiânia, como analisada nos itens anteriores,
decorreu de uma política deliberada e planejada, tanto do Governo Federal,
objetivando a redistribuição demográfica integrando o processo de
transformação da estrutura econômica brasileira, como do Governo de Goiás
como estratégia de frações da oligarquia dissidente pela consolidação do poder
estadual. Acima disso tudo, representou a oportunidade de aplicação dos
princípios do urbanismo através de uma urbanificação embasada em moderna e
inovadora concepção urbanística.

2.7.1. A Concepção Urbanística de Goiânia

De acordo com interessante ensaio de Coelho (1996)48, Goiânia


exprime, no seu plano urbanístico e na arquitetura - Art Déco, objeto do referido
ensaio - a efervescência política, intelectual e cultural mais intensa da nossa
história, manifestada nas primeiras décadas do século XX: guerras mundiais,
polarização ideológica entre capitalismo e socialismo, emergência de estados
totalitários de direita e de esquerda, avanço técnico-científico, expansão dos
oligopólios transnacionais.
A industrialização e a urbanização como fenômenos que
caracterizaram o período citado, fizeram surgir entre os urbanistas da Europa e
dos Estados Unidos da América diversas concepções. Pode-se destacar
basicamente as propostas de cidade-funcional ou racionalista de Wright; a
cidade ideal-linear de Le Corbusieur; e a Cidade-Jardim de Howard.
Estas concepções foram enfocadas na Seção 2.2, destacando-se as
influências das idéias de Ebenezer Howard na Europa, nos EUA e no Brasil.
47
AFONSO DA SILVA, J. Direito urbanístico brasileiro. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1995. 421 p.
48
COELHO, G. N. A modernidade do Art Déco na construção de Goiânia. Goiânia: Ed. do Autor, 1997. 75 p.
58

Vimos que elas influenciaram a urbanificação de grandes cidades dos países


europeus, como os Planos de Reurbanização de Londres, Paris e Estocolmo;
o Plano de Construção das Cidades Novas da Grã-Bretanha. Nos EUA,
Radburn e as Greenbelt constituíram-se numa tentativa de implantação de
Cidades-Jardins, frustradas por fatores históricos relativos ao desenvolvimento
daquele país.
Com relação ao Brasil, entretanto, a literatura urbanística apresenta-
se omissa, no que se refere às influências que as idéias de Howard exerceram na
elaboração e execução dos planos de urbanização bem como reurbanização
nacional. Com relação a Goiás, observamos uma lacuna, a esse respeito, tanto na
literatura científica quanto em artigos na imprensa e até mesmo em documentos
oficiais. No geral, a abordagem desenvolvida peca por "desconhecer" e/ou
"desconsiderar" a concepção urbanística de Howard na implementação do plano
original da capital dos goianos.
Ottoni (op. cit., p. 67), ao enfocar as influências no Brasil das idéias
de Howard, cita Goiânia, restringindo-se que "[...] a zona residencial ao sul da
cidade é construída de ruas curvas, com inúmeros 'cul de sac' e extensa
vegetação, lembrando o sistema empregado nas duas Cidades-Jardins inglesas
[...]".
A literatura deixa evidenciar, assim, de forma parcial, que a
influência destas idéias se manifestaram em apenas um bairro de Goiânia. O
projeto do Setor Sul, elaborado pelo engenheiro-urbanista Armando Augusto de
Godói, foi inspirado na experiência de Redburn, que ele visitara na década de
30. Este urbanista é co-autor do Plano da Cidade, em conjunto com o arquiteto-
urbanista Attílio Corrêa Lima. A implantação daquele setor se deu de acordo
com a concepção global de Goiânia, qual seja, a da Cidade-Jardim.
Desconsiderar a concepção original de Goiânia leva a abordagens
equivocadas que acentuam a perda da sua identidade, dificultando o
equacionamento dos problemas urbanos. Uma manifestação dessa intrigante
falta de identidade com a sua concepção urbanística reside na afirmação de que
“[...] a cidade cresceu mais do se pensava e a população estimada de 50 mil
habitantes está na casa de um milhão [...]” (O POPULAR. Os caminhos de
Goiânia. Goiânia, Cidades, 24 out. 1996, p. 2B).
Será que essa afirmação quanto à previsão populacional de Goiânia
faz crer que a cidade foi mal planejada? Que o crescimento desordenado de hoje
nos remete a um mal de origem, qual seja, o plano diretor de 1938?
Se essa é a premissa, o raciocínio é equivocado. A previsão
populacional de 50 mil habitantes constante do plano inicial da cidade, apenas
cumpriu as cláusulas quarta e décima-terceira do Decreto nº 3547, de
06/07/1933. Através desse instrumento legal o Interventor Federal em Goiás
contratou o Arq. Attílio Corrêa Lima para elaborar o projeto de implantação de
uma cidade com capacidade inicial para 50 mil habitantes.
59

Portanto, este número de habitantes reflete a posição do governante,


como uma questão até mesmo de ordem orçamentária e pragmática, pois
nenhuma autoridade contrataria um projeto de cidade para uma população
infinita.
Quando nos remontamos aos estudos elaborados pelo referido
arquiteto-urbanista que subsidiaram a elaboração do Plano Diretor da Cidade,
vemos que a capacidade demográfica de Goiânia foi prevista de acordo com o
diagrama de Cidade-Jardim de Howard, mostrado na figura 9 (Seção 2.2):
 Cidade-Central = 58.000 habitantes:
Com possibilidade de expansão, a exemplo das “cidades novas” da Inglaterra, para......400 mil
 Cidades-Satélites = cada uma com 50.000 habitantes:
População das oito cidades satélites ................................................................................400 mil
População total de Goiânia ..............................................................................................800 mil
Assim, sob o aspecto do seu plano urbanístico, não é correto
afirmar que Goiânia foi concebida para 50 mil habitantes. O plano diretor
aprovado em 1938 compreendeu uma cidade-central com quatro setores iniciais
(Central, Norte, Sul e Oeste) e uma cidade-satélite (Campinas). A expansão da
cidade normalmente ocorreria pela ampliação da zona urbana e suburbana, com
a aprovação de loteamentos de novos setores e pela criação de mais sete
cidades-satélites.
Façamos um paralelo com a cidade de Brasília. Desde a sua
implantação, o Distrito Federal foi planejado para crescer a partir de um Plano-
Piloto - com previsão para 500 mil habitantes - e oito cidades-satélites
(Braslândia, Ceilândia, Gama, Guará, Núcleo Bandeirante, Planaltina,
Sobradinho e Taguatinga). Apesar da explosão demográfica e da falta de
respeito ao planejamento inicial, os elementos urbanísticos do plano de Brasília
podem ser vistos nos dias de hoje, cumprindo, bem ou mal, não se aborda aqui
esse mérito do problema, as funções urbanas previstas.
A discussão não se limita a saber se Goiânia foi planejada para 50
ou 800 mil habitantes. As explicações do porquê as cidades-satélites não foram
construídas, apesar de planejadas, nos remete à questão da gestão e da
apropriação do espaço urbano, tendo-se em vista a determinação legal
estabelecida desde os primórdios da cidade de, no mínimo, 35% de espaços-
livres e vias de comunicação das glebas parceladas.
Até o final da década de 1950, em decorrência das diretrizes do
Plano Original da Cidade, os únicos parcelamentos permitidos de glebas de
áreas na zona rural eram os que estavam de acordo com as exigências dos
módulos mínimos do INCRA, além da obediência às normas do Código
Municipal de Obras, aprovado pela Lei n. 574, de 12.5.1947, alterada
posteriormente pela Lei n. 176, de 16.3.1950. Estas normas legais de uso do solo
de Goiânia somente permitiam a existência de cidades-satélites, num raio de 15
km da Praça Cívica. Fora estes casos - cidades satélites e módulos mínimos do
INCRA - os únicos usos possíveis eram as chácaras e os sítios de recreio.
60

Um núcleo urbano planejado conforme a concepção de Cidade-


Jardim apresenta os espaços interurbanos, compreendidos entre as cidades-
satélites, formando um cinturão verde que se comunica diretamente com as áreas
urbanas, através de várias categorias de espaços livres (parkways, parques-
lineares, parques municipais, praças, áreas verdes, jardins, chácaras, áreas de
preservação ambiental, reservas particulares do patrimônio natural, áreas de
preservação permanente, reserva legal, etc.).
Assim, uma cidade planejada com tal concepção apresenta
necessariamente uma quantidade elevada de áreas verdes por habitante. Além
dos aspectos estéticos, este tipo de traçado se constitui num indicador de
qualidade de vida urbana, denominado índice de área verde, dado em metros
quadrados per capita.
O crescimento da cidade, a demanda por habitação e a inversão
pública em serviços urbanos promovem a valorização da terra. Por isso, todas as
cidades do mundo, num sistema de livre mercado, estão sujeitas ao fenômeno da
especulação imobiliária pelos agentes que produzem e se apropriam do espaço
urbano. Entrementes, o fenômeno especulativo não impediu a construção de
várias Cidades-Jardins na Inglaterra e nos EUA (subúrbios-jardins). Tão pouco,
foi impeditivo para a implantação de Planos Diretores Urbanos em várias
cidades do mundo, quaisquer que sejam as suas concepções urbanísticas.
No caso em foco, a existência das cidades satélites em Goiânia não
significaria ausência de especulação imobiliária, mas sem dúvida, seria um freio
a ela, pois o uso do solo seria controlado por regras bem mais democráticas de
parcelamento.
Um fator importante de descaracterização do Plano de Urbanização
de Goiânia (PUG) está na realização de ganhos econômicos através da
especulação imobiliária. Mas, a condição necessária para o fenômeno
especulativo em Goiânia está no desconhecimento da concepção, fundamentada
em princípios sócio-econômicas e ambientais, que embasou a formulação do
PUG.
Um fator relacionado a esse problema foi, por um lado, a ineficácia
técnica dos órgãos responsáveis pela gestão do PUG. À falta de gestão pública
do espaço urbano, fortaleceu-se a ingerência da iniciativa particular nas decisões
responsáveis pelos destinos da cidade.
As autoridades municipais de Goiânia, neste aspecto, têm se
manifestado, em geral, no interesse da iniciativa privada. Essa é a tendência
observada nas decisões adotadas em vários processos administrativos que
envolvem o uso do solo e o domínio de áreas públicas.
Por outro lado, verificou-se a desinformação da comunidade para
com as normas de uso do solo determinadas pelo planejamento urbanístico da
cidade. O Setor Sul ilustra bem esse aspecto, já que a própria população não
seguiu o Código de Obras, por falta de orientação do Poder Público e inverteu a
testada e o fundo das residências. As fachadas frontais voltaram-se para as
61

estreitas vielas de serviço e as de fundo para os amplos parques internos. Assim,


as áreas verdes foram relegadas e abandonadas, transformando-se em espaços
baldios, sujos e inseguros.
A premissa adotada é a de que a debilidade do Poder Público
contribuiu para a desinformação e o desconhecimento do plano original, gerando
uma falta de identidade urbanística da população para com a sua cidade.

2.8. ORIGEM E EVOLUÇÃO AMBIENTAL DO PLANO URBANÍSTICO


DE GOIÂNIA

Todos os planos de loteamento, sejam eles da iniciativa privada ou


do poder público, se subordinam às leis de parcelamento do solo urbano. Tanto a
lei atual - Lei n. 6766/79, como suas antecessoras - Decreto-Lei n. 271/67 e
Decreto-Lei n. 58/37, exigem do empreendedor público ou privado a
manutenção de áreas públicas nas glebas loteadas, destinadas a circulação viária
e a espaços livres.
À época da criação de Goiânia, estava em vigor o Decreto-Lei n.
58, de 10.12.37 que no art. 3º determinava - tal como na lei atual - a
transferência, para o domínio do Município, das vias de comunicação e dos
espaços livres existentes no memorial e na planta de loteamento. Essa
transferência “[...] decorria da própria estipulação do art. 3º do citado Decreto-
Lei 58/37 que, ao prever a inalienabilidade dos bens públicos, estava
inequivocamente incluído nessa categoria de bens referidos espaços livres [...]"
(MEIRELLES, 1985, p. 413-4)49.
Assim, o empreendedor responsável pela construção de Goiânia - o
Estado de Goiás -, submetia-se a uma legislação urbanística própria, como
qualquer outro empreendedor particular.

2.8.1. Retrospectiva do primeiro Plano Diretor da Cidade

Por decisão do Interventor Federal em Goiás, Med. Pedro Ludovico


Teixeira, foi determinada a mudança da capital da cidade de Goiás.
Consequentemente, vários atos oficiais foram desencadeados, a seguir
discutidos, na ótica da presente análise da questão urbanístico-ambiental
goianiense.
De acordo com revisão da historiografia de Goiânia (Alvares, op.
cit.; IBGE, op. cit.; Graeff, 199350; Chaul, op. cit.; Coelho, op. cit.; Cordeiro &
Queiroz, 198051; Cordeiro, 198952; Monteiro, 197953; Palacín, 198654; Sabino

49
MEIRELLES, H. L. Direito Municipal Brasileiro. 5 ª ed. São Paulo: RT, 1985.
50
GRAEFF, E. A. Goiânia, 50 anos. Goiânia: Ed. UCG, 1993.
51
CORDEIRO, N. & QUEIROZ, N. M. Embasamento do plano urbanístico original. Goiânia: Composição:
1989.
52
CORDEIRO, N. A. Goiânia: evolução do plano urbanístico. Goiânia: Composição, 1989.
53
MONTEIRO, O. S. N. Como nasceu Goiânia. 1ª impr. 1938. Goiânia: Revista dos Tribunais, 1979. 663 p.
62

Júnior, 198055; Moysés, 199656), podemos estabelecer uma cronologia histórica,


para situar e concatenar os fatos, permitindo uma análise da evolução ambiental
do PUG.
 Em 20.12.32, através do Decreto n. 2737, foi nomeada a
Comissão responsável pela escolha do local onde se construiu a cidade,
presidida pelo Bispo de Goiás, Dom Emanuel Gomes de Oliveira, fundador da
Academia Goiana de Letras e da Universidade Católica de Goiás; Eng. João
Argenta; Eng. Jerônimo Fleury Curado; Med. Laudelino Gomes de Almeida;
Adv. Colemar Natal e Silva; e mais três representantes, um do exército e dois do
comércio.
Destacamos os seguintes tópicos elaborados pela subcomissão que
efetivou os estudos técnicos:
A situação geográfica (localização e densidade demográfica) e
topográfica são apropriadas. Dentro de um raio de 12 km, em rumo 130 graus
de Campinas, distante 7 km desta, num planalto de 760 m de altitude, de terras
ótimas para cultura, todas cobertas com matas, localizava-se o melhor local para
se construir uma cidade moderna.
A hidrografia é constituída por importantes mananciais para o
equilíbrio do clima urbano e para o abastecimento público, apresentando os
seguintes dados de vazão e de altitudes: Rio Meia Ponte - 4,2 m³.s-1; Rio
Anicuns - 2,7 m³.s-1, altitude 695 m; Rio Santo Antônio - 1,6 m³.s-1, altitude
655 m; Córrego Cascavel - 0,3 m³.s-1, altitude 700 m; Ribeirão Macambira -
0,2 m³.s-1, altitude 700 m.
 Em 24.4.1933, tendo sido acatada a sugestão do Presidente da
Comissão de escolha do local, Bispo Dom Emanuel Gomes de Oliveira, foi
contratado o Engenheiro-urbanista Armando Augusto de Godói - goiano
radicado no Rio de Janeiro, um destacado especialista em engenharia urbana do
país.
Este urbanista apresentou ao Interventor Federal em Goiás, naquela
data, o "Relatório sobre a conveniência da mudança da capital", confirmando o
local escolhido pela subcomissão, que seria desapropriado a partir da "estaca
zero" (localidade "Paineira", próxima à atual Praça do Cruzeiro), cravada pelo
Eng. João Argenta, encarregado pelo levantamento topográfico, para o
assentamento do núcleo inicial.
O relatório estabeleceu as diretrizes urbanísticas preliminares,
segundo as quais as cidades modernas, planificadas racionalmente,

54
PALACÍN, L. Fundação de Goiânia e desenvolvimento de Goiás. Goiânia: Oriente, 1986.
55
SABINO JÚNIOR, O. Goiânia Global. Goiânia: Oriente, 1980, 286p.
56
MOYSÉS, A. Estado e urbanização: conflitos sociais na Região Noroeste de Goiânia (década de 1980). 190 p.
Dissertação (Mestr. - C. Sociais) PUC, São Paulo, 1996.

Estimados pelo método de afluentes e os nivelamentos com barômetro olostérico altimétrico, em período de
chuva, segundo o relatório da subcomissão citada.
63

desempenham uma função altamente social e integradora (habitação, trabalho,


lazer e locomoção). Daí as preocupações com o metabolismo das cidades, numa
ótica de ecologia humana. Para Godói (1942a)57,
[...] o urbanismo ampliou seu campo de ação, estendendo os seus
tentáculos ao campo, são somente para sugar elementos de que
precisam as agremiações humanas, mas também para veicular
coisas indispensáveis à vida rural. É que as cidades não são mais
parasitas no sentido material da palavra, verificando-se entre elas e
o campo a eterna troca de produtos e de ações que caracteriza a
existência social. [...] (id., ibid., p. 20).
Nos aglomerados humanos, entende o urbanista citado, viabiliza-se
a "trindade econômica" (industrial, bancária e comercial), que resulta na
valorização da terra, na geração de riquezas e na agregação de valor à produção
local e regional. A resultante se vê no estímulo à cidadania e na valorização do
homem, tendo como exemplo “[...] a cidade como idealizou Howard, cujas
idéias foram empreendidas e realizadas por Unwin, Parker e outros profissionais
na Inglaterra bem como na França, Estados Unidos etc. [...]" (GODÓI, 1942b, p.
35)58.
O autor citado destacou que o controle do crescimento da cidade
deve ser feito pelo Estado, bem como a venda dos lotes, segundo um plano de
valorização gradativa, visando o financiamento das obras de construção da nova
cidade. O urbanista citou o fracasso de Belo Horizonte, cuja valorização do solo
urbano foi apropriada por particulares, que fizeram fortunas rapidamente sem
que se tenha revertido a favor do Plano Urbanístico da capital mineira.
O urbanista reverenciado apontou para a importância da
implementação das diretrizes do Plano, sob as quais os elementos urbanísticos
seriam articulados como os órgãos de um ser vivo, mantendo uma relação de
interdependência com o entorno rural (cinturão verde); para a formação de um
estoque público de terras visando a expansão urbana e um plano de
colonização através de chácaras e granjas para o desenvolvimento de atividades
agrícolas necessárias ao abastecimento da cidade; e para a preservação dos
mananciais fluviais, sugerindo a desapropriação das áreas marginais dos
mesmos até as suas nascentes, visando garantir o abastecimento público e a
melhoria do clima.
 Em 18.5.33, foi publicado o Decreto n. 3359, aprovando o
local escolhido pela Comissão referida, nas fazendas "Criméia", "Vaca Brava" e
"Botafogo", definindo as diretrizes preliminares para a urbanização, inclusive
abertura de crédito para custear as despesas com indenizações a serem
conduzidas por uma comissão técnica.

57
GODÓI, A. A. 1942a. Relatório sobre a conveniência da mudança da capital. In: IBGE (op. cit., p. 13-30).
58
GODÓI, A. A. 1942b. A futura capital de Goiaz. In: IBGE (op. cit., p. 35-40).
64

 Em 6.7.33, através do Decreto n. 3547, o Estado de Goiás


contratou o Arquiteto-urbanista Attílio Corrêa Lima, da firma P. Antunes
Ribeiro & Cia., do Rio de Janeiro, para elaborar o Plano da Cidade e os projetos
detalhados de sete prédios públicos estaduais e um municipal e de vinte casas-
padrão para o funcionalismo público, estipulando-se prazos, sendo o último, de
180 dias, para a entrega do relatório final e da legislação competente (cláusula
9ª do referido contrato).
O decreto citado estabeleceu quatorze cláusulas, determinando,
entre outras, a elaboração do sistema de logradouros públicos; do zoneamento da
cidade em várias zonas, cada uma com determinada finalidade; das redes de
água, esgoto; dos sistemas de parques, ruas-jardins, terrenos para esportes e
recreio, bem como indicação sobre arborização de ruas; da coleta, transporte e
tratamento do lixo; da legislação relativa ao Plano Diretor; do regulamento sobre
a abertura de ruas e loteamento do terreno; do regulamento de construções.
 Em 28.9.33 foi assinado outro contrato, com a firma P.
Antunes Ribeiro & Cia, tendo como preposto o Arquiteto-urbanista Attílio
Corrêa Lima, para acompanhar a execução das obras.
 Em 24.10.33, por determinação do Decreto n. 3929, de
21.10.33, foi realizado o lançamento da pedra fundamental de Goiânia.
 Em 29.11.34, foi aprovada pelo Interventor Federal em Goiás
a proposta do Eng. Jerônimo Coimbra Bueno para assumir a direção geral das
obras, cujo contrato com o Estado foi assinado no dia 4.12.34.
Este contrato tinha o mesmo objetivo do segundo contrato assinado
pelo Estado com a firma P. Antunes Ribeiro & Cia., que somente foi rescindido
em 26.4.35.
Há uma lacuna na historiografia de Goiânia a respeito de um acordo
proposto à firma Coimbra Bueno pelo Interventor Federal em Goiás, através de
intermediário enviado em missão especial ao Rio de Janeiro, Dr. Oscar Campos
Júnior - então encarregado dos Serviços Gerais das Obras de Goiânia.
O insistente apelo - inicialmente negado - mas, sendo reiterado pelo
citado intermediário, via telegrama (grifamos): "[...] Dr. Jeronimo Coimbra
Bueno - Voluntários Pátria, 246, Rio - Doutor Pedro deseja sua vinda urgente
acordo telegrama lhe dirigiu. Abraços, Oscar [...]" (ALVARES, op. cit., p. 80).
Dessa maneira, finalmente, o acordo proposto foi aceito. O fato
histórico concreto nos remete a premissa de que há uma relação desse acordo do
Governo do Estado com os irmãos Jerônimo e Abelardo Coimbra Bueno, cuja
firma Coimbra Bueno assumiu a execução das obras, na condição oficial de
"construtores da cidade", com a descaracterização do Plano Original elaborado
pelo Arq. Attílio C. Lima. Cabe aos historiadores analisar essa relação, que será
abordada a seguir no aspecto pontual referente ao PUG.

2.8.1.1. O Memorial Descritivo do primeiro Plano de Urbanização de


Goiânia (PUG)
65

 Em 10.1.35 o Arq. Attílio C. Lima apresentou ao Estado de


Goiás o Relatório final do Plano Original, 12 meses além do prazo contratual,
justificando o atraso pela demora no fornecimento dos dados topográficos, na
distância e dificuldade de comunicação, conforme já era previsto no contrato.
O relatório apresentado cumpriu as determinações emanadas do
Decreto n. 3547/33, quanto ao Plano Diretor da Cidade, constando todos os
elementos urbanísticos contratados pelo Estado-empreendedor para a edificação
de Goiânia. Sob o aspecto da legislação urbanístico-ambiental, o Relatório
constituiu-se no Memorial Descritivo do Plano de Urbanização de Goiânia,
juntamente com os respectivos Mapas que, após a sanção do Prefeito,
formaram os documentos necessários ao registro e legalização do loteamento.
A seguir destacamos e comentamos aqueles pontos mais
importantes do Relatório do Plano Diretor da Cidade relacionados ao tema
em foco.
Localização
A escolha do local pela subcomissão técnica, aprovada pela
Comissão presidida pelo Bispo Dom Emanuel Gomes de Oliveira e confirmada
pelo Eng. Armando A. de Godói foi anterior à contratação do arquiteto
responsável pela elaboração do plano diretor. Isso não se constituiu em
problema pois, como afirmou Lima (1942, p. 46)59, "pelo fato de figurarem na
referida comissão técnicos de renome, nossa consciência fica tranqüila quanto
à sua atuação".

O sítio para instalação do núcleo inicial


O Relatório do Plano Diretor justifica a mudança feita para a
instalação do sítio, inicialmente proposto pela subcomissão técnica e aprovado
pelo Eng. Armando A. de Godói, na localidade "Paineira", que ficaria próximo à
atual Praça do Cruzeiro, para o local onde se assenta a atual Praça Cívica.
Esta mudança do local onde se cravou o marco zero para a
instalação do núcleo central, a partir do qual se fez o traçado da cidade, foi
justificado no relatório por três razões:
i) Comunicação - coincidir o traçado da Av. Anhangüera com a
estrada de rodagem que já existia atravessando o sítio no sentido leste-oeste;
ii) Abastecimento público - o reservatório de distribuição foi
localizado na "Paineira", com o objetivo de reduzir a extensão da tubulação de
adução, com apenas 900 m, até o reservatório de acumulação, através do
barramento do Córrego Areião na confluência com o Botafogo, onde se faria a
captação, bem como de reduzir o recalque, que poderia ser feito até mesmo por
um ariete hidráulico, dada a pequena altura de elevação (45 m), barateando
assim distribuição da água aos primeiros 5 mil habitantes;

59
LIMA, A. C. 1942. Plano Diretor da Cidade. In: IBGE (op. cit., p. 45-56).
66

iii) Configuração do terreno - a localização do merco zero na Praça


Cívica, como foi feito, permitiu reduzir a declividade média do terreno de 3,5%
para 1,5%, com inúmeras vantagens à urbanização da cidade (estéticas e
econômicas).

O traçado da cidade
De acordo com o Relatório, foi adotado em Goiânia o partido
clássico denominado Pate d'oie ou pé de pato. Este traçado permitiu aliar o
aspecto monumental, herdado da tradição renascentista e barroca francesa - mas
sem cair no apelo à simetria, com traçados axiais e geométricos - com a tradição
inglesa de identificação à natureza. Um bom exemplo deste modelo é a cidade
de Versalhes - remodelada por influência das idéias de Howard -, cuja vista
aérea (figura 12), mostra "[...] o controle da natureza e do Centro
Administrativo, através do eixo central básico, do parque, lago e avenida
arborizada. [...]" (OTTONI, op. cit., p. 33).
O planejador de Goiânia soube tirar proveito da topografia e dos
recursos naturais do sítio escolhido (veredas e buritizais; matas ciliares e de
cerradão), para implantar um traçado que poderia permitir a circulação por vias
arborizadas entre bosques. Além do que, segundo Lima (1937, p. 141)60, "[...]
quem atravessar a cidade ao longo da Avenida Anhangüera, verá
sucessivamente três pontos de vista diversos ao cruzar as três grandes avenidas
que convergem para o Centro Administrativo [...]".

Figura 12 - Vista aérea de Versalhes, mostrando o partido clássico Pate d'oie, que foi adotado
no plano de Goiânia. (Fonte: Ottoni, 1996, p. 33)
60
LIMA. A. C. 1937. Goiânia: a nova capital de Goiás. Resumo de um estudo a ser editado futuramente.
Arquitetura e Urbanismo. {Rio de Janeiro}, jan./fev., p. 32-4; mar./abr., p. 60-3; maio/jun., p. 140-6.
67

O zoneamento
A cidade foi demarcada em cinco grandes zonas: administrativa;
comercial; industrial; residencial; e rural; com base no conceito funcional da
cidade, nos seus aspectos técnicos, econômicos, sanitários e estéticos.
A Zona Administrativa foi localizada em torno da Praça Cívica,
onde se localizaram os edifícios da administração municipal, estadual e federal.
A Zona Comercial foi localizada em torno do centro geométrico da
cidade - Av. Goiás e Av. Anhangüera -, tendo esta como eixo principal. Todas
as quadras desta zona foram dotadas de espaços públicos internos, com o
objetivo de:
i) Rede de ruas internas para alargamento e vazão de trânsito
intenso no futuro sem desapropriações;
ii) Áreas internas para uso do comércio (carga e descarga de
mercadorias), bem como a coleta do lixo;
iii) Pátios de estacionamentos de veículos nas quadras 21, 23, 38,
51 e 52.

Circulação interna

Figura 13 - Zoneamento e esquema de circulação de Goiânia, de acordo com o Relatório do


Plano Diretor apresentado ao Estado de Goiás em 13.1.1935 (Fonte: LIMA, 1937, p. 62 e 142)

A rua 3, entre as ruas 6 e 9, foi destinada exclusivamente à zona


bancária e a Av. Goiás para o comércio de modas, joalherias, cafés, bares e
68

restaurantes. O comércio do gênero de primeira necessidade foi distribuído em


todo o perímetro da cidade.
A Zona Industrial foi localizada na parte mais baixa da cidade,
com lotes mínimos de 20 x 50 m, reservando-se a parte norte, após a estação
ferroviária, para futura expansão industrial, em virtude do maior distanciamento
da zona residencial e da facilidade para o escoamento da produção.
A Zona Residencial, cujos lotes terão dimensões de 12 metros de
testada, no centro, atingindo 15 metros e mesmo 25 metros de frente,
aumentado-se proporcionalmente os fundos, nas zonas periféricas destinadas a
pequenas chácaras. Em algumas quadras de grandes dimensões foi introduzida,
no seu interior, uma série de lotes no sistema “cul de sac", cujas ruas eram
dilatadas em fundos de saco, dotadas de play-grounds.
A zona residencial foi instalada em regiões próximas às áreas de
matas, cerradão e veredas, proporcionando tranqüilidade e conforto ambiental,
além da facilidade de acesso aos bairros tanto "suburbanos" - Setores Sul e
Oeste - como "urbanos" - Setor Central - pelas avenidades-parques (Alamedas
115, das Rosas, dos Buritis, do Botafogo e Av. Oeste). Campinas foi planejada
como cidade-satélite.
A Zona de Diversões e Esportes, sendo a quadra 69 inteiramente
reservada ao Teatro Municipal e mais três quadras vizinhas a ela, pela rua 3,
lado norte do Parque dos Buritis. Na parte sul deste parque foi reservado uma
área para o Automóvel Clube de Goiás, projetado com sede social, campos de
tênis e grande piscina.
Além do Automóvel Clube, foram reservadas ainda, quatro áreas
para clubes esportivos, sendo uma na extremidade da Av. Araguaia, junto ao
Parque Botafogo e mais o Estádio Olímpico Municipal, projetado no setor
Central, junto ao Aeródromo, com um campo de futebol de acordo com
dimensões internacionais, pista para atletismo, doze quadras de tênis, uma
grande piscina e sede social.
A área compreendida entre a cidade-satélite de Campinas e o
parque público da nascente do Córrego Capim Puba, foi delimitada como Zona
de Esportes para instalação de clubes voltados à prática de pólo, golfe, tênis,
equitação, ciclismo e passeios em meio aos recantos naturais de belas paisagens
que ali existiam, segundo o referido relatório.
A Zona Rural foi estabelecida no restante do território municipal,
destinado à produção agrícola e às indústrias pesadas.

Vias Públicas, Praças e Jardins


As vias de comunicação foram projetadas de acordo com as
seguintes preocupações: proporcionar vazão ao tráfego (ver figura 13); assegurar
o caráter monumental e artístico das avenidas centrais; arborização e
ajardinamento voltados para o aspecto não só estético, mas também ambiental
como manutenção da permeabilidade para viabilizar o escoamento pluvial.
69

As vias públicas foram traçadas com largura proporcional ao


tráfego previsto para a região projetada, tomando-se como base para as seções
transversais, múltiplos de gabarito dinâmico do automóvel (2,5 metros) e, para
os passeios, do gabarito de um indivíduo (0,75 metros). A Avenida Goiás foi
projetada com 50 metros de largura, sendo 45% de área ajardinada (41.440 m²);
as Avenidas Araguaia e Tocantins com 25 metros e a Av. Anhangüera com 30
metros de largura, foram projetadas com arborização e com áreas de infiltração,
correspondendo, em média, a 30% da largura da via (v. tabela 7).
As avenidas-parques com largura média de 15 a 20 metros de
largura, foram traçadas contornando grandes extensões de áreas verdes criadas
como parques públicos. Verifica-se, assim, a preocupação do projetista em fazer
com que as vias de comunicação cumpram sua função viária precípua, mas
também de controle da qualidade ambiental, já que os poluentes atmosféricos
lançados pelos escapamentos dos veículos, bem como as emissões de ruídos
poderiam ser filtradas, retidos ou absorvidos pela biomassa vegetal dos parques
por elas contornados.
As avenidas-parques projetadas compreenderam as seguintes
vias:
 Av. Oeste, no setor Norte, contornando pelo lado do setor
Central, o Horto Florestal (totalmente desmatado para dar origem ao setor
FAMA e parte do setor Aeroporto);
 Alameda dos Buritis, contornando o Parque dos Buritis, no
setor Central;
 Ruas 101, 106 (contornando o Parque dos Buritis), ruas 134
e 133 (contornando o parque da nascente do Córrego dos Buritis); rua 115
(contornando o Parque Linear Botafogo), no setor Sul;
 Alameda Botafogo, contornando o Parque Linear Botafogo e
o Parque Botafogo, fazendo a ligação leste dos setores Sul, Central e Norte;
 Av. das Indústrias, de sentido leste-oeste, ligando a cidade-
satélite de Campinas ao setor Central, numa extensão da avenida-parque de
contorno da represa do Jaó.
A Praça Cívica foi projetada com caráter monumental, do ponto de
vista do paisagismo, pela sua área de 28.000 m² com ajardinamento e lagos
decorativos. Nesta praça, na projeção dos eixos das Avenidas Goiás, Araguaia e
Tocantins com as Ruas 10 e 26, o planejador propôs um monumento
comemorativo ao Anhangüera, às bandeiras e às riquezas do Estado. Hoje neste
local se encontra o monumento das três raças. Na praça localizada no
cruzamento da Av. Goiás com a Av. Anhangüera, propôs a construção de um
monumento comemorativo à construção de Goiânia contendo o marco de aroeira
que serviu à sua fundação. Hoje ali se encontra a estátua do Anhangüera, mas a
praça cedeu lugar ao eixo do sistema de transporte coletivo urbano.
A função ambiental do paisagismo urbano projetado no plano de
Goiânia confirma-se com a preocupação em se interligar os espaços livres de
70

praças, canteiros, ilhas e rotatórias com os parkways – alamedas ajardinadas


traçadas ao longo das margens dos cursos d'água, cujas águas seriam protegidas
contra a poluição através da implantação dos parques lineares, visando garantir o
abastecimento público, além de proporcionar efeito plástico e visual com lagos
decorativos.

O sistema de espaços livres


No plano original da cidade, o sistema de espaços livres é
constituído por parques públicos, praças ajardinadas, estacionamentos
arborizados, play-grounds, áreas destinadas ao esporte e de vias públicas,
perfazendo um total de 375 hectares ou 3.750.000 m², representando 34,65% do
espaço total projetado de 1.082 hectares.
O Plano de Urbanização de Goiânia de 1935 já definia claramente
que
[...] os espaços não construídos representam 34,6% do total, relação talvez
aparentemente exagerada, se não levarmos em consideração, que de
preferência procuramos incluir e preservar certos sítios, já beneficiados pela
natureza, para servir de parque ou jardins, evitando, tanto quanto possível, a
sua destruição. A relação de 25% aconselhável na prática, será facilmente
atingida, não com a destruição das matas, como é a tendência natural, porque
estas já estão incluídas na área que consideramos (...). Tratando-se de uma
cidade em formação, o nosso fito foi salvaguardar a natureza, deixando o
campo livre à expansão de terras e arruamento novos, não havendo carência de
terras, para a edificação. [...] (LIMA, 1937, p. 144).
Conforme ensina Meirelles (op. cit.), os espaços de uso comum
acima referidos são de domínio público, e se transferem automaticamente ao
município a partir do ato de aprovação do plano de loteamento pela autoridade
municipal competente, pelo só efeito (ex-vi-legis) das leis de uso e parcelamento
do solo urbano em vigor no país, desde então (Decreto-Lei n. 58/37, Decreto-Lei
n. 271/67 e Lei n. 6766/79).
Os espaços livres mostrados na tabela 7 definem uma diretriz
estabelecida no plano que visou proporcionar à população goianiense uma
elevada relação de áreas verdes per capita. Considerando os dados ali
observados, obtemos 121,78 m² áreas verdes urbanas e rurais, públicas e
privadas, para cada habitante, de acordo com a população inicialmente prevista
nos setores Norte, Central, Sul, Oeste e cidade-satélite de Campinas.
Por seu turno, foi explicitamente estabelecida no memorial
descritivo do primeiro Plano de Urbanização de Goiânia, a quantia de 162
hectares ou 1.620.000 m² de espaços livres públicos e urbanos - parques,
parkways, jardins, play-grounds, campos de esporte -, de função ambiental,
recreativa, lazer e/ou de esporte, correspondendo a
[...] 14% da área total, significando, portanto, uma proporção de 308
habitantes para cada hectare de parque ou jardim. Isto no caso mais
desfavorável, isto é, tomando-se a população máxima de 50 mil habitantes,
71

prevista, condensada por nós na área projetada. Ora, este caso não se dará, pois
dispõe o patrimônio de Goiânia de terras suficientes para expandir-se e mesmo
criar novas reservas. [...] (LIMA, 1937, p. 145).

Tabela 07 - Os Espaços livres e suas respectivas categorias de acordo com as diretrizes do


projeto do primeiro Plano de Diretor de Goiânia
Categorias Denominação / Localização Área (m²) Domínio
Capim Puba e dos Bandeirantes 315.000 Público
Botafogo, setores Central/Norte 540.000 Público
Parques
Buritis, setores Central/Oeste 400.000 Público
Paineira, setor Sul 160.000 Público
Parkways Capim Puba e Botafogo, às margens destes mananciais 250.000 Público
Horto Florestal, na mata ao norte do Córrego Capim 1.000.000 Público
Puba
Reservas Florestais
Reserva Florestal da nascente do Córrego Palmito a 1.000.000 Particular
leste da cidade
Parque Metropolitano Parque Aquático da Represa do Jaó, às margens do Rio 2.000.000 Público
Meia Ponte
Jardins Distribuídos na malha projetada 160.000 Público
Áreas p/ Esporte Zona de Diversões e Esporte 80.000 Público
Praças Distribuídas na malha projetada 50.000 Público
Estacionamentos
Quadras 21, 23, 38, 51 e 52 no Setor Central 10.000 Público
arborizados
Play-grounds Interior das quadras residenciais 30.000 Público
Av. Goiás 41.400 Público
Arborização de vias Av. Tocantins 11.250 Público
públicas Av. Araguaia 11.250 Público
Av. Anhangüera 30.000 Público
Total de áreas verdes (m²) 6.088.900
Estimado com base nas diretrizes do plano; fonte: Lima (1942, p. 45-56)

Como foi mostrado, extraímos do planejamento originário uma


importante diretriz para a gestão ambiental de Goiânia. Trata-se do Índice de
Área Verde (IAV) que, considerando a densidade populacional prevista e a área
do sítio inicialmente parcelado, proporcionou a cada habitante urbano a quantia
de 121,78 metros quadrados de espaços livres, dos quais 32,5 metros
quadrados são de domínio público.

Cursos d'água e abastecimento público


O núcleo inicial da cidade foi implantado na bacia do Córrego
Botafogo e nas sub-bacias dos seus tributários Areião e Capim Puba. A proteção
destes mananciais era uma necessidade ao abastecimento da população urbana.
A vazão do Areião, medida pelo projetista, no período da seca, foi de 16 litros
por segundo ou 0,016 m³.s-1, suficiente para abastecer 4608 pessoas,
considerando uma demanda per capita de 300 litros.
Assim, o plano estabeleceu a proteção das bacias e sub-bacias
fluviais, recomendando que a bacia de infiltração que forma a cabeceira do
Córrego Botafogo
72

[...] será interditada a toda e qualquer construção (...) que visa proteger de
modo eficaz a pureza da água que deverá abastecer a cidade. Igual atenção
deverá ser dada à bacia do Córrego Capim Puba, que será o reforço indicado
quando a capacidade do Botafogo for ultrapassada, (...) principalmente para a
zona suburbana. [...]" (LIMA, 1942, p. 52-3).
Em decorrência desta diretriz, foi definido um importante elemento
urbanístico no plano da cidade, qual seja, as unidades de conservação de uso
indireto do solo das cabeceiras e margens dos mananciais hídricos de
Goiânia. Estas unidades foram gravadas no memorial descritivo e nas plantas do
PUG com os respectivos nomes dos cursos d'água: o Jardim Botânico e o Parque
Linear Botafogo; o Parque Areião e o Parque Linear Areião; os Parques da
nascente e das margens do Capim Puba; o Parque dos Buritis; o Parque
Aquático Jaó, no Rio Meia Ponte, concebido para "[...] constituir um centro de
atrações esportivas, (...) pela extensão que alcançará o lago formado, (onde)
todos os esportes aquáticos poderão ser praticados. [...]" (LIMA, 1937, p. 146).

Saneamento urbano
O saneamento urbano contido no plano urbanístico é constituído de
três sistemas: esgotamento das águas pluviais; coleta e tratamento de lixo;
transporte e tratamento do esgoto.
O esgotamento sanitário proposto foi do tipo separativo (rede de
galeria pluvial separada da de esgotos sanitários). Existia um sistema utilizado
desde o século XIX até aquela época, chamado unitário, em que as águas
servidas se juntavam às águas pluviais (TINÔCO FILHO, 1990, p. 151)61.
De acordo com o projeto de saneamento de Goiânia, o sistema de
galeria pluvial foi projetado para se beneficiar de uma redução da composição
de custos, dado que o planejamento urbano levou em conta as características
naturais do sítio. O aproveitamento da topografia no traçado das ruas,
acompanhando as linhas de menor declive, contribuiu para a redução do run off.
A preocupação em se manter a capacidade de infiltração natural do solo -
preservação das planícies de inundação como as veredas do Parque Buritis e as
áreas marginais dos mananciais fluviais também contribuíram para a diminuição
do escoamento superficial.
O resultado deste planejamento ambiental é que, segundo o projeto
original, foi possível calcular tubulações de diâmetros relativamente simples,
podendo, com isso, ser lançada diretamente nos cursos d'água.
Segundo o memorial de cálculo realizado pelo projetista de
Goiânia, gentilmente cedido pela sua neta, Bibliotecária Rachel Corrêa Lima,
residente no Rio de Janeiro, o sistema de esgotamento sanitário calculado
permitiu o escoamento por gravidade. A rede domiciliar foi interligada ao tubo
coletor Botafogo, em dois pontos: A, com diâmetro de 0,3 metros, descarga de

61
TINÔCO FILHO, A. F. O administrador de saúde e o saneamento do meio. In: CAMPOS, J. Q. et alii.
Fundamentos de Saúde Pública. São Paulo: J. de Q. Campos, 1990, v. I, p. 130-56.
73

76 litros por segundo e declividade de 0,009 metros por metro; e B, com


diâmetro de 0,45 metros, descarga de 146 litros por segundo e declividade de
0,0072 metros por metro.
De acordo com o Plano Diretor, o componente final do projeto de
esgotamento doméstico terminaria num "[...] emissário que transporte os
resíduos abaixo da represa do Jaó, não sendo permitido de maneira alguma que o
despejo se faça acima deste, embora esse só seja aconselhável após um
tratamento bacteriológico ou químico. [...]" (LIMA, 1942, p. 53).
Sobre o lixo, o autor do plano da cidade opinou que, por ser
obviamente desconhecida a composição do mesmo, não era possível projetar um
sistema de tratamento, deixando explícita a recomendação de aproveitamento da
matéria orgânica, especialmente gorduras, em virtude da prática de alimentação
do brasileiro. Com relação à coleta e o transporte, as ruas da zona comercial
foram planejadas para permitir o desenvolvimento deste serviço urbano. Não foi
apresentado projeto ou diretriz para a disposição final do lixo.

Regulamentação das construções e loteamento


Em cumprimento ao Decreto n. 3547/33 de contratação do projeto
de estabelecimento de Goiânia, cláusula 3ª, i, III e IV, o técnico responsável
apresentou ao Estado de Goiás os regulamentos sobre estes problemas urbanos,
listados no subtítulo, que são da maior importância para o êxito de um
planejamento urbano moderno.
O regulamento das construções, considerando a densidade
populacional prevista, a área total parcelada, bem como os espaços livres e vias
de comunicação, tendo adotado as relações construtivas mostradas na tabela 8.
Além disso, o regulamento estabeleceu o critério de lotes mínimos
com 20 x 50 metros na zona industrial e com área mínima de 360 metros
quadrados e com uma testada nunca inferior a 12 metros na zona
residencial, para “[...] viabilizar condições de iluminação, insolação, boa
distribuição interna e aspecto agradável (...), na zona residencial estas medidas
vão se dilatando, à medida que o lote se afasta no centro. [...]" (LIMA, 1942, p.
54).
Tabela 08 - Relações construtivas estabelecidas no memorial
descritivo do primeiro Plano Diretor de Goiânia
Destinação das áreas Relação (m²/pessoa)
Uso privado 141,4
Uso coletivo 75,0
Total 216,4
Fonte: LIMA (1942, p. 45-56)

O autor do plano da cidade revela, entretanto, que enfrentou muitas


dificuldades no estabelecimento destes critérios. Por um lado, citou as pressões
contrárias ao estabelecimento das dimensões mínimas no então Distrito Federal,
quando, "[...] sob orientação do Dr. Armando Godói foram introduzidas estas
74

dimensões mínimas para os lotes, muitos benefícios trazendo para a cidade, em


prejuízo, já se vê, dos interesses dos especuladores de terreno [...]" (LIMA,
1937, p. 146).
Para logo em seguida deixar registrado que o delegado do governo
do Estado de Goiás no Rio de Janeiro, o Eng. Benedito Velasco  "[...] grande
insistência fez para que déssemos aos lotes, as testadas mínimas de 10 metros,
alegando maior economia de espaço, para facilitar a execução do plano [...]" (id.,
ibid.).
Por outro lado, apesar da manutenção do critério mínimo de 12
metros, contra a vontade do governo do estado que queria lotes de pequenas
dimensões, muitas críticas partiram da população em geral, que se revoltou
contra as dimensões dos lotes projetados. Estas críticas foram consideradas pelo
urbanista como
[...] mais um preconceito, ou mesmo um sentimento inato do espírito
latifundiário do povo, do que propriamente uma necessidade material (...). De
que valem compridas chácaras se a construção é anti-higiênica, sem ventilação
e aeração, tendo somente aberturas para a via pública, devassadas e para os
fundos depósitos de imundícies! [...]" (LIMA, 1937, p. 146).
Pelo acima exposto, nota-se as dificuldades vividas pelo urbanista,
encarregado de implantar uma cidade moderna num Estado de características
estruturais latifundiárias.

O controle do loteamento dos arredores da cidade e a


organização administrativa
As diretrizes traçadas pelo projetista de Goiânia com relação ao
controle do loteamento dos arredores da cidade coincidem com as preocupações
do Eng. Armando Augusto de Godói, impressas no seu Relatório, retro citado. A
valorização fundiária decorrente dos investimentos públicos realizados, implicou
para esse engenheiro urbanista, a necessidade do controle da especulação
imobiliária pelo Poder Público. Ele citou o exemplo do Governo de Minas que,
logo após a fundação de Belo Horizonte, vendeu grande área de terrenos aí
situada, perdendo a oportunidade de reaver boa parte das somas empregadas na
construção da cidade e proporcionando em quinze anos grandes fortunas.
Exemplificou ainda, que a simples notícia da transferência da capital federal do
Rio de Janeiro, desencadeou uma venda desenfreada de lotes, resultando na
fragmentação de uma área situada no município de Planaltina. Esse processo
especulativo “[...] rendeu milhares de contos, não obstante não haver nenhum
ato do governo federal ou indícios de que a mudança se faria para o planalto
goiano [...]" (GODÓI, 1942b, p. 38).

*
Designado representante do Estado de Goiás, pela cláusula 11 ª do Decreto n. 3547, de 6.7.33, para acompanhar
os trabalhos do urbanista Attílio C. Lima, "solucionando as dúvidas que por acaso surgirem durante a
organização dos projetos".
75

O alerta feito por este urbanista ocorreu, portanto, mais de vinte


anos antes do início da construção de Brasília. A crua realidade dos fatos
situados pelos urbanistas que elaboraram o memorial descritivo do plano da
cidade de Goiânia, com base numa experiência concreta vivida por Belo
Horizonte, e ainda com base numa avaliação do que estava se processando no
submundo da especulação imobiliária em torno da possível mudança da capital
federal, fundamentaram, num aspecto estritamente técnico, as recomendações e
diretrizes do Plano de Urbanização de Goiânia para que se tentasse evitar aqui a
repetição deste mesmo fenômeno.
Quais as soluções propostas no memorial descritivo do Plano
Diretor para o equacionamento destes problemas? Basicamente foram:
i) Manutenção de um estoque público de terras e controle pelo
Poder Público da venda das terras de acordo com os interesses coletivos e da
cidade;
ii) Plano de colonização baseado em pequenas propriedades para a
produção necessária ao abastecimento da cidade;
iii) Expansão urbana planejada, mantendo a harmonia e coerência
do Plano de Urbanização;
iv) Gestão democrática e participativa, com a constituição da
Comissão do Plano da Cidade, composta pelo Prefeito, por doze cidadãos
representativos de vários segmentos sociais e pelo Diretor Técnico, com o
objetivo de "[...] introduzir melhoramento, corrigir erros no plano de
urbanização e zelar pelas belezas naturais da cidade [...]" (LIMA, 1942, p. 55).
Para implementar estas medidas, a Prefeitura deveria apresentar
uma organização administrativa, de acordo com as diretrizes do Plano Diretor,
caracterizado por um “[...] sistema simples, livre das influências políticas, como
ocorre nos grandes centros (...) formando uma engrenagem que, por si só, se
moverá, evitando o 'mandonismo', doença peculiar a nós brasileiros [...]"
(LIMA, 1942, p. 55).
Assim, o projeto de organização administrativa foi constituído por
três diretorias: da Fazenda, da Instrução e Técnica. Esta última, por sua vez, com
três subdiretorias encarregadas, respectivamente, do controle dos serviços; de
estudos e projetos; e de execução das obras.
É interessante destacar esse aspecto técnico da construção de uma
cidade do porte de Goiânia. A realidade da época era bastante diversa da de
hoje. Deve-se considerar que a cidade de Goiás permaneceu durante um século
com uma população estabilizada na casa dos oito mil habitantes, até a década de
30. Em 1940, o censo do IBGE apontou que apenas quatro cidades no Estado de
Goiás passavam dos 7 mil habitantes, sendo Goiânia com 15 mil e as demais
com menos (PALACÍN, op. cit., p. 119).
Além disso, quando se iniciou a construção da nova capital, havia
carência absoluta de engenheiros, arquitetos, topógrafos e outros técnicos, bem
como de mão de obra especializada na construção civil. Todos os materiais, a
76

não ser aqueles ofertados pela natureza da região - saibro, cascalho, areia, argila,
pedra, madeira - foram importados de São Paulo.
A Diretoria Técnica citada foi constituída por engenheiros e
arquitetos, vindos dos grandes centros urbanos do país como São Paulo, muitos
aqui se estabelecendo, como os pioneiros Eng. Jorge Diniz Carneiro, Arq. José
Neddermeyer, Eng. Werner Sonnenberg, Eng. Gustavo Aaderup, Topógrafo
Edgar Germano Honam, Contador Hermann Komma, Desenhista Jayme Vilhena
Leite (ALVARES, op. cit., ps. 99, 104).
A equipe da Diretoria Técnica mencionada produziu, durante os
anos de 1936 e 1937, e no primeiro trimestre de 1938, um volume de 740
projetos de construções, além daqueles referentes aos serviços de urbanização,
saneamento, engenharia de estradas, produção de mudas e ajardinamento. O
Escritório Técnico do Rio e de São Paulo, contratado pelo Estado de Goiás,
elaborou 241 plantas dos prédios públicos federais (Álvares, op. cit., ps. 119,
122). A construção de Goiânia exerceu valor educativo sobre várias cidades do
Estado que, a partir do exemplo irradiado pela capital, elaboraram seus Planos
de Urbanização e executaram projetos de abastecimento e prédios públicos,
dentre outros, no período acima considerado (ÁLVARES, op. cit., p. 179-84).
Portanto, no nascedouro da cidade, apesar das dificuldades
políticas, econômicas e sociais enfrentadas, - estudadas por diversos autores
sobre a transferência da capital, - formou-se em Goiânia, pelo balanço técnico
acima exposto, um núcleo embrionário, habilitado profissionalmente, que
poderia desenvolver ações de gestão e planejamento urbanístico-ambiental.

2.8.1.2. A aprovação do Plano Diretor de Goiânia e o surgimento do conflito


com a concepção da Cidade-Jardim de Howard

 Em 30.7.1938, o Prefeito de Goiânia Prof. Venerando de


Freitas Borges assinou o Decreto-Lei n. 90-A, aprovando o Plano Diretor da
Cidade de Goiânia.
A assinatura desta lei municipal estava inserida num processo de
divisão territorial do país. Cabia ao Governo Federal o comando desse processo
através do Decreto-Lei n. 311, de 2.3.38. A divisão deveria ser executada pelos
Governos Estaduais e Municipais. O Governo do Estado de Goiás baixou dois
decretos-lei, de n. 557, de 30.3.38 e de n. 808, de 9.6.38, autorizando o
Município a aprovar o plano de urbanização da cidade de Goiânia.
O Plano de Urbanização de Goiânia, aprovado pela lei acima
referida, será discutido, a seguir, comparando o seu texto legal e as plantas por
ela aprovadas com o memorial descritivo do plano de urbanização.
Memorial é "a exposição escrita, dirigida à autoridade pública, na
qual se pleiteia alguma coisa" (In: Enciclopédia e Dicionário Koogan/Houaiss.
Rio de Janeiro: Delta, 1995, p. 547).
77

No caso, o memorial do Plano Diretor é constituído pelos estudos,


planos e plantas elaborados pelo urbanista legalmente contratado para elabora-
lo, - qual seja, o Arq. Attílio Corrêa Lima. Estes estudos foram subsidiados pelo
Eng. Armando Augusto de Godói na análise do sítio escolhido para sediar a
capital, conforme exposto anteriormente. O memorial do Plano Diretor foi
dirigido à autoridade máxima do Estado de Goiás, pleiteando o adimplemento
dos contratos de realização dos serviços técnicos de urbanização da cidade
referida. Estes documentos, por seu turno, fazem parte do processo de aprovação
do Plano de Urbanização de Goiânia pela Autoridade Municipal.
Não há registro histórico de que outros urbanistas, além dos citados
acima, tenham sido contratados pelo Estado para a elaboração do PUG. O
contrato assinado pelo Estado com a firma Coimbra Bueno teve o objetivo de
viabilizar a superintendência da execução das obras. Todo processo de
aprovação de qualquer plano de loteamento é constituído obrigatoriamente das
plantas e do memorial descritivo.
Segundo Machado (1999, p. 325-39)62, desde a vigência do
Decreto-Lei n. 58, de 10.12.37, estes documentos são os mínimos necessários
para a análise, no âmbito da administração pública, do parcelamento requerido.
Com a aprovação do plano de loteamento pelo órgão técnico, ele é submetido à
aprovação do Prefeito Municipal e, então, levado ao registro no Cartório
Imobiliário, estando, após isso, regularizado.
Se estes preceitos básicos da legislação de uso do solo urbano não
forem obedecidos, cabe impugnação e ação judicial contra a aprovação do
loteamento na fase do registro. Mas, no caso de loteamento já aprovado e
registrado, poderá desferir-se a ação prevista no art. 45 da Lei n. 6766/79, pois

[...] um inegável interesse público para os cidadãos em fiscalizar a qualidade
do loteamento. (...) Por isso, qualquer cidadão, individualmente, ou através de
associações (...) poderá propor ação ordinária de anulação de ato
administrativo, quando (...) os municípios aceitarem a entrega de áreas públicas
em menor proporção que trinta e cinco por cento ou se não obrigarem a
reservada faixa 'non aedificandi' ou se executarem obras que cabem ao loteador
[...]. (MACHADO, 1999, p. 293).
Portanto, é inegável que os documentos constantes do processo de
loteamento devem, necessariamente, conferir coerência e harmonia ao plano de
urbanização. Conseqüentemente, o que está disposto no texto da lei que aprovou
o plano deve corresponder às plantas e ao memorial descritivo.
As normas de parcelamento do solo urbano são válidas tanto para o
empreendedor particular - loteadora A, B, ou C - como para o Poder Público -
empresas, autarquias ou quaisquer órgãos integrantes das esferas da União, dos
Estados ou dos Municípios.

62
MACHADO, P. A. L. Município: Urbanismo e Meio Ambiente. In: ___. Direito Ambiental Brasileiro. 7. ed.
São Paulo: Malheiros, 1999. Cap. 1 e 2, p. 297 – 350.
78

O que se vê ao analisar o Plano Diretor e a Planta Geral de


Urbanização bem como as plantas de arruamento e loteamento dos Setores
Central, Norte, Sul e satélite de Campinas, aprovados pelo Decreto-Lei 90-A, de
30.7.1938?
Em termos de concepção urbanística, permaneceu o traçado geral
de Cidade-Jardim de Howard, cujo esquema foi mostrado na figura 9. Os
elementos urbanísticos do plano e do memorial de 1938 coincidem
genericamente com este esquema, conforme se ilustra na figura 14.
No entanto, modificações significativas foram efetuadas no traçado
da cidade quando se compara com o Relatório do Plano Diretor apresentado ao
Estado de Goiás em 10.1.1935 pelo Arq. Attílio C. Lima. Estas modificações
não foram processadas no memorial descritivo, mas em algumas plantas de
loteamento que integram um mesmo plano de urbanização!
A comparação das plantas de 1938 com aquelas constantes do
relatório de 1935, discutidas anteriormente (comparar com a figura 13), mostram
diferenças conflitantes em alguns pontos.
Senão vejamos:
 O Projeto do Setor Oeste que estava incluído no relatório de
35, não consta do art. 2º, item a, da lei de 1938 entre os setores com plantas de
arruamento e loteamento aprovados, quais sejam, os Setores Central, Norte, Sul
e Satélite de Campinas;
 A área reservada ao futuro Setor Oeste na Planta Geral da
Cidade de 1938, onde se lê a inscrição "a ser projetado em 1950 por concurso
entre urbanistas brasileiros” foi, entretanto, loteada em nome do proprietário
particular Eng. Abelardo Coimbra Bueno, através do Decreto n. 71, de 20.7.55;
 O Projeto do Setor Sul aprovado em 1938 difere daquele
constante do relatório de 35;
 O Setor Coimbra aparece no plano de 1938 como uma
"extensão" da cidade-satélite de Campinas. Trata-se, na verdade, não de uma
extensão, mas de um loteamento estranho, que não foi aprovado pelo Decreto-
Lei 90-A/38 e que não consta do relatório de 35;
 A Zona de Esportes, descrita no relatório de 1935 como uma
área reservada entre o Parque Capim Puba, na nascente do córrego de mesmo
nome e a cidade-satélite Campinas, aparece na Planta Geral de Orientação de
1938, com sua área reduzida a uma faixa estreita, cedendo seu espaço para o
Setor Coimbra, criado como uma "extensão" da cidade-satélite de Campinas;
 O Parque ou Bosque dos Buritis na Planta Geral de
Orientação de 1938 não apresenta projeto de implantação, enquanto no relatório
de 1935, o parque está claramente implantado no Setor Oeste entre as atuais ruas
3 e 106;
 O Zoneamento proposto no relatório de 1935 foi alterado
significativamente: várias quadras reservadas à Zona de Diversões e Esportes
desapareceram; da mesma maneira, as áreas reservadas para as Zonas de
79

Comércio e de Indústria encolheram. No plano aprovado em 38 essas áreas


foram transformadas em lotes residenciais;
 Os eixos radiais de circulação sul, partindo do centro cívico,
foram alterados e alguns desapareceram no plano aprovado em 1938.

Figura 14 - Plano de Loteamento da Cidade de Goiânia aprovado pelo Decreto-Lei n. 90-A,


de 30.7.38, destacando-se os contrastes com o Relatório do Plano Diretor apresentado ao
Estado de Goiás em 10.1.1935 (Fonte: ÁLVARES, 1942, p. 159-76)

2.8.2. Análise preliminar das alterações do Plano de Urbanização de


Goiânia (PUG)

O PUG elaborado pelo Arq. Attílio C. Lima sofreu várias alterações


a partir da apresentação do relatório ao Estado de Goiás em 10.1.35. A primeira
mudança se tornou visível logo na assinatura do Decreto-Lei n.º 90-A, pelo
Prefeito da Cidade em 30.7.38, de aprovação do primeiro do Plano Diretor da
Cidade, como foi exposto acima.
É possível analisar as alterações efetuadas em função da atuação
dos agentes, historicamente determinados, responsáveis pela produção do espaço
urbano.
80

Segundo Souza (op. cit.) estes agentes se dividem em pelo menos


três tipos: os incorporadores, os construtores e os vendedores, sendo que cada
um deles pode assumir um ou mais destes papéis, esclarecendo que se eles
[...] podem agregar-se ou desagregar-se, neste ou naquele empreendimento,
assumindo, portanto, papéis e figuras jurídicas que variam com o tempo. Para
tanto, torna-se imprescindível uma reconstituição histórica das empresas que se
constituem nesses agentes [...] (id., ibid., p. 189).
Adotando a definição da autora supra, temos três agentes
fundamentais na produção do espaço urbano:
 O incorporador, que é quem incorpora, quem desmembra o
terreno em "frações ideais". Portanto, o incorporador fabrica o solo urbano,
através de uma cadeia de ações, que vai da compra do terreno, contratação dos
técnicos para elaboração do projeto, aprovação da planta na Prefeitura, registro
no cartório de imóveis, até a venda para o consumidor final, da mercadoria
produzida, arcando com os custos da campanha publicitária;
 O produtor propriamente dito, que é o construtor, escolhido
de acordo com requisitos estabelecidos pelo incorporador. A maior parte dos
riscos do empreendimento não cabe ao construtor e sim ao incorporador, que
pode, aliás, dependendo do contrato, ficar totalmente isento deles;
 O comprador, que é o agente indispensável pela existência de
mercado, isto é, o consumidor que paga pela mercadoria produzida.
Não se pretende analisar precisamente o processo de incorporação
imobiliária na construção da capital do Estado de Goiás, mas sim situar essa
questão do ponto de vista da interferência dos agentes produtores sobre os
espaços livres previstos no planejamento urbanístico-ambiental de Goiânia,
contextualizado historicamente na primeira parte desta dissertação.
Como vimos, o Estado de Goiás foi o agente incorporador nos
primórdios da cidade, tendo realizado a escolha do local, a desapropriação das
fazendas, a contratação dos técnicos para a elaboração do plano de urbanização,
inclusive a realização da propaganda da nova cidade para atrair os compradores
de lotes urbanos.
O agente construtor de Goiânia é a firma Coimbra-Bueno & Cia.
Ltda., contratada pelo Estado de Goiás. Esta função está impressa, inclusive, no
texto do Decreto-Lei n.º 90-A, de 30.7.1938, assinado pelo Prefeito Venerando
de Freitas Borges, que aprovou o primeiro Plano Diretor da Cidade.
O agente comprador é constituído pelos consumidores em geral,
pessoas físicas e jurídicas. A relação entre estes agentes envolve antagonismos, -
ressaltados por Souza (op. cit.) -, numa situação de economia imatura, de perfil
concentrado da distribuição de renda e em que os setores empresariais da
construção civil e da incorporação imobiliária são extremamente dependentes de
subsídios estatais no desenvolvimento, sobretudo, de uma das principais funções
urbanas - a habitação.
81

Na construção de Goiânia, a relação entre o Estado de Goiás e o


construtor Coimbra-Bueno, foi tal que houve troca entre os papéis por eles
exercidos. O Estado transferiu ao agente construtor, atribuições que eram da sua
responsabilidade – quais sejam a incorporação, a criação do solo urbano e a
venda de terrenos. Vejamos.
Por iniciativa do Eng. Abelardo Coimbra Bueno, Superintendente
Geral das Obras de Goiânia, o Governador do Estado de Goiás baixou decreto 
de alteração do traçado das Zonas Comercial e de Diversões da região central de
Goiânia. Estas zonas foram reduzidas com o conseqüente acréscimo de 535 lotes
residenciais (v. tabela 9).

Tabela 09- Redução das Zonas Comercial e de Diversões com correspondente aumento do n.º
dos lotes residenciais no Centro de Goiânia
Zona alterada Distribuição dos lotes residenciais criados N.º de lotes
Via pública Quadras criados
Comercial Rua 1 1a4 10
Rua 2 3a6 13
Rua 3 3, 5-8, 18, 20, 37 42
Rua 4 9-12, 52, 55-4 30
Av. Anhangüera 7-10, 20-23, 37-8, 51-3, 57-8, 61 124
Rua 6 37-8, 52-5 27
Rua 7 6,8,10,12, 35, 37, 53-4 43
Rua 8 5,7,9, 18, 20, 22 30
Rua 9 20-3 10
Av. Araguaia 38, 51-2, 57 17
Rua 17 53 05
Rua 20 61, 58, 51, 57 13
Subtotal de lotes residenciais adicionados na z. de comércio 460
Diversões Av. Tocantins 21, 67, 69, 70 26
Rua 23 23, 67-9 23
Av. Anhangüera 21, 23, 68, 70 16
Rua 4 69 10
Subtotal de lotes residenciais adicionados na zona de diversões 75
Total geral de lotes residenciais adicionados na região central 535
Fonte: Álvares (1942, ps. 145-6, 150-4).

A justificativa para o loteamento do centro histórico de Goiânia,


pelo agente construtor da cidade, deveu-se a que uma
[...] zona comercial muito extensa traria, como conseqüência, um número
demasiado de estabelecimentos comerciais para a população prevista para a
cidade, aumentando assim demasiadamente as ‘ofertas’ em relação às
‘procuras’. Daí um desequilíbrio da lei de ‘oferta e procura’, funesta para o
comércio e para a cidade, por que resultaria na existência de um grande número
de pequenas casas, com deficiente movimento de vendas (...). Isto manteria em
situação econômica precária grande número de habitantes da zona urbana, que
poderia dedicar-se a outros ramos de atividade (...). Se nos lembrarmos da
tendência que atualmente se verifica, de fuga das populações agrícolas para as
*
Decreto n.º 2148, de 7.8.37, publicado no "Correio Oficial" do dia 18 do mesmo mês e ano, aprovando minuta
apresentada por Coimbra-Bueno, via Ofício n.º 280, de 22.7.1937 reforçado pelo Ofício n.º 320, de 5.8.1937.
82

cidades, mais vivas se apresentam as razões de ser feita a limitação da zona


comercial [...] (MONTEIRO, 1979, p. 451).
O argumento exposto acima, na verdade, reflete a posição do
construtor investido da função de incorporador privado, de olho na apropriação
dos lucros advindos com a comercialização dos terrenos localizados na região
central da cidade, posto que foram valorizados pelos investimentos públicos e
pelos serviços de infra-estrutura urbana realizados pelo Estado.
Na prática, agindo em nome do Estado, a empresa atuou na
corretagem de lotes. Este mesmo fato também se verificou na alteração do
projeto do Setor Sul, por requisição do Eng. Abelardo Coimbra Bueno,
Superintendente Geral de Obras de Goiânia, ao Governador do Estado de
Goiás, que a aprovou. O Estado de Goiás - incorporador de direito e
empreendedor representante da vontade da sociedade goiana em ver realizado o
sonho de edificação de uma capital moderna -, ao sucumbir aos argumentos da
especulação imobiliária, permitiu que se golpeasse um elemento fundamental da
concepção urbanística de Goiânia.

Figura 15 - Anúncio publicitário de venda de lotes em Goiânia pela firma Coimbra-Bueno &
Cia. Ltda. (Fonte: Araújo, D. Goiânia: homenagem pelo seu 5º aniversário. Goiânia: Ed. do Autor, 1938).

**
Relatório apresentado em março de 1937 pela Superintendência Geral de Obras ao Diretor Geral da Fazenda
do Estado de Goiás.
**
Ofício n.º 317, de 4.8.37, que resultou no Decreto n.º 2.133, de 5.8.37, publicado no "Correio Oficial" de
10.8.1937.
***
Ofício n.º 317, de 4.8.37, que resultou no Decreto n.º 2.133, de 5.8.37, publicado no "Correio Oficial" de
10.8.1937.
83

Esse elemento urbanístico foi concebido por Howard (op. cit., p.


128) da seguinte maneira: no anel externo da cidade localizam-se fábricas,
armazéns, laticínios, mercados, carvoarias, serrarias, etc., próximos à via de
circulação que envolve toda a cidade, gerando uma renda-cota destes lotes
industriais e comerciais, que um empregador médio se disporia a pagar em
benefício da administração.
Essa disposição espacial, segundo o autor citado, proporcionaria
uma forma superior de vida industrial, através do correto princípio de
crescimento, sempre conservando um cinturão rural ao redor das cidades.
Esse planejamento urbano propiciaria a geração de uma renda-cota suficiente
para a criação e manutenção dos empreendimentos municipais.
De acordo com Howard (op. cit., p. 140), essa diretriz de
planejamento urbanístico possibilitou cobrir os custos anuais com a implantação
e a manutenção das cidades-jardins implantadas na Inglaterra, para uma
população de 30 mil pessoas, através da apropriação, pela coletividade, da
valorização da terra e das "contribuições de melhoria", pagas pelos cidadãos
beneficiários dos serviços e obras urbanos:
"(...) rendimento bruto:
 renda-cota da propriedade agrícola £ 9.750
 renda-cota de 5.500 lotes residenciais £ 33.000
 renda-cota de áreas para negócios, 10.625 pessoas
empregadas à média de £02 per capita £ 21.250
Total (em libras) £ 64.000"
"Gastos:
 40 km de vias a £2.500/km £102.500
 9,6 km de estradas rurais a £750/km £ 7.550
 Ferrovia e pontes, 8,9 km a £1.975/km £ 18.000
 Escolas para 6.400 crianças (1/5 da população)
a £12 por vaga £ 96.000
 Sede da municipalidade, biblioteca, museu £ 32.600
 Parques, 100 há a £125/ha £ 13.650
 Rede de esgotos £ 21.000
 Juros e taxas £ 9.165
Total (em libras) £ 50.000"

A gestão e o uso do solo urbano da Cidade-Jardim constitui-se em


instrumento fundamental de desenvolvimento urbano, onde a atuação da
municipalidade
[...] será medida unicamente pela disposição dos ocupantes em pagar as quotas-
partes, e crescerá à medida que os serviços municipais forem sendo executados
eficiente e honestamente, ou diminuindo se é feito de forma desonesta e
ineficiente. [...] (HOWARD, op. cit., p. 149).
84

E mediante uma gestão urbana participativa “[...] se os habitantes


da cidade se tornarem cooperativistas, a municipalidade avançará; se deles se
tornarem menos adeptos do cooperativismo, a municipalidade recuará [...]" (id.,
ibid.)
Pelo exposto, as alterações promovidas no planejamento de
Goiânia, bem como a gestão urbana desenvolvida, centralizada, sem
participação da sociedade, representaram uma ruptura com as concepções
urbanísticas de Howard e uma sucumbência aos interesses da especulação
imobiliária.

2.8.3. Alguns problemas de ordem urbanística e ambiental, gerados pelos


conflitos e contradições do planejamento originário de Goiânia

As modificações efetuadas no PUG por iniciativa da empresa


Coimbra Bueno, no período 1935-50, vistas na Seção 2.8.2, acarretaram os
seguintes problemas, no aspecto urbanístico-ambiental, para a cidade de
Goiânia:
i) o esquema de circulação da cidade foi prejudicado em função
de que o projeto do Setor Sul, aprovado em 1938, constituiu-se numa barreira ao
fluxo viário, quebrando o esquema projetado no relatório de 35. A sobrecarga da
Avenida 85, Praça do Ratinho, bem comprova isso;
ii) O Setor Sul, cuja concepção foi transplantada automaticamente
de Radburn - uma cidade subúrbio dos EUA - para a região central de Goiânia.
A firma Coimbra Bueno, que apresentou o projeto para aprovação
pelo Estado de Goiás e obteve autorização para comercializar os lotes deste
setor, estranhamente não orientou os proprietários para edificar as suas
residências de acordo com a concepção do bairro. Isto é, no sistema cul-de-sac
ou “fundo de saco”: as residências com frentes voltadas para os parques
internos, formando jardins e play-grounds;
ii) A redução da Zona Comercial comprometeu o futuro da
região central da cidade. A transformação das áreas antes reservadas ao
comércio e à indústria, além de elevar a densidade humana e o fluxo viário
previsto para a região central, resultou na falta de espaço para o comércio,
jogando camelôs e feirantes nas vias públicas, e retirando do Poder Público os
instrumentos necessários ao equacionamento do problema;
iii) A fragmentação do Parque dos Buritis pelo loteamento do
Setor Oeste que perdeu 2/3 das suas áreas de veredas, onde ocorreria a
infiltração e a drenagem das águas que escorrem do alto do Setor Marista em
direção ao Centro. A transformação da Rua 10, em frente ao Fórum, no Setor
Oeste, nos dias chuva mais intensa, de via pública em calha pluvial, é um
atestado de que o tamponamento dos poros naturais de escoamento vertical,
provocando um run off excedente, acarretou enormes transtornos à vida dos
citadinos de hoje e do futuro;
85

A criação do Parque dos Buritis, como um importante elemento


integrante do plano urbanístico original, não ficou apenas no papel, como uma
intenção vaga não concretizada. O primeiro Plano Diretor de Goiânia aprovado
pelo Decreto-Lei n.º 90-A, de 30/07/38, no parágrafo primeiro do artigo
primeiro assim estabeleceu:
[...] Art. 1°...
§ 1º - A área urbana de Goiânia abrangerá os setores: Central Norte Sul,
Oeste, Satélite Campinas e as áreas destinadas ao Aeródromo, Parque dos
Buritis, dos Bandeirantes e do Zoológico e Hipódromo [...].
Assim, de acordo com a lei acima citada foi criado o Parque dos
Buritis, como um espaço livre de domínio municipal. Segundo Machado (1999,
p. 343-5), parques e praças são um tipo de "[...] bem público dotado de uma
característica peculiar, a inalienabilidade [...]", não podendo por isso, sofrer
alteração no seu uso de lazer e de preservação para outro uso distinto do
original, seja público, como vias de circulação ou particular, como lotes
residenciais ou comerciais.
No entendimento do autor citado, a área do Parque dos Buritis é
classificada pelos artigos 66 e 67 do Código Civil Brasileiro, como bem de uso
comum do povo. Em decorrência, a desafetação e a mudança de destinação deste
tipo de bem público somente poderiam se dar no interesse maior da coletividade,
após autorização legislativa, o que não ocorreu.
A redução do bosque em conseqüência da apropriação de partes de
sua área para outros usos atualmente observados, como escolas particulares,
prédios de apartamentos, comércio e serviços, constitui-se numa flagrante
seqüência de atos que desconsideraram as determinações do Código Civil e das
Leis de Parcelamento do Solo Urbano, resultando em prejuízos ao meio
ambiente e ao interesse coletivo.
A descaracterização do Parque dos Buritis intensificou-se na década
de 40, quando ocorreram os primeiros parcelamentos de áreas a ele pertencentes,
como a doação de suas extremidades, feita pelo Governo do Estado aos colégios
Atheneu Dom Bosco e Externato São José. A investida mais dura contra o
Parque dos Buritis foi perpetrada através do Decreto n. 71, de 20 de julho de
1955, assinado pelo Prefeito João de Paula Teixeira Filho, que aprovou o
loteamento do Setor Oeste de propriedade do Eng. Abelardo Coimbra Bueno.
De acordo com Martins Júnior (op. cit.), nas áreas parceladas pelo
supramencionado decreto municipal foram incluídas áreas verdes que passaram
a ter um uso do solo bastante diverso do original como vias de comunicação e
quadras destinadas à habitação coletiva e unifamiliar, bem como comerciais e de
serviços de grande porte. As áreas originalmente pertencentes ao Parque dos
Buritis, - segundo determinação do primeiro Plano Diretor da Cidade -, e que
passaram a integrar o loteamento do Setor Oeste, - aprovado pelo Decreto n.
71/55 - foram inteiramente as Quadras A-7, A-8, A-9, B-9, B-8, B-7, B-6, B-5,
e, parcialmente as de número B-4, B-3, B-2 e B-1 (ver figura 16).
86

A transferência das áreas citadas do domínio público, integrando a


categoria de bens de uso comum do povo, inalienáveis, para bens particulares,
constitui uma página obscura da história da capital goiana. Como se sabe, por
força do § 1º do art. 1º do Decreto-lei n. 90-A/38, o Setor Oeste integra o
primeiro PUG, cujas áreas foram adquiridas pelo Estado de Goiás para a
construção de Goiânia, com exceção da área onde existia o núcleo urbano de
Campinas.
No caso de o empreendedor e detentor do domínio dos terrenos
destinados ao futuro Setor Oeste - o Estado de Goiás, ter realizado a
transferência do domínio da área deste setor para o Eng. Abelardo Coimbra
Bueno, em nada alteraria as diretrizes estabelecidas pelo Plano Diretor da
Cidade. A delimitação do Parque dos Buritis, conforme planta geral de Goiânia
e conforme plantas aprovadas dos Setores Central e Sul, incluía a extremidade
sul confrontando com a Avenida 85 e Rua 105 e o bico da extremidade norte
com a Rua 3.

Figura 16 - A área original e a área atual do Parque dos Buritis, reduzida em 70%, pela firma
Coimbra Bueno, loteadora do S. Oeste, em 1955 (segundo Martins Júnior, 1996, p. 50)

Não há registro de qualquer alteração do Plano Original de Goiânia


através de lei que tenha aprovada a desafetação e permitida a transferência de
áreas do Parque dos Buritis para o bem dominical ou dominial do Município e
deste para o Estado de Goiás e daí alienadas para o domínio particular do
loteador Jerônimo Coimbra Bueno.
87

v) a Zona de Esportes desapareceu totalmente: localizada à oeste


do Zoológico, essa área foi destinada, pelo relatório de 35, à preservação, por ser
dotada de recantos de rara beleza natural. No entanto, ela cedeu lugar para dois
loteamentos particulares, comercializados pela firma Coimbra Bueno & Cia.
Ltda., os Setores Oeste (parcialmente) e Coimbra (totalmente).

2.8.4. A proteção dos espaços livres na legislação municipal e nos memoriais


descritivos dos loteamentos de Goiânia

Nos cartórios de registros de imóveis estão arquivados os


documentos necessários à aprovação dos loteamentos urbanos. Nos memoriais
descritivos, aprovados sob a égide do plano original de Goiânia, encontram-se
explicitadas as suas diretrizes quanto à proteção dos espaços livres municipais.
A título de exemplo, citam-se os seguintes:
O Bairro Nova Suíça, aprovado pelo Decreto nº 166, de 27/8/52,
estabeleceu que o “[...] plano de loteamento (...) se enquadra perfeitamente no
plano geral de loteamento de Goiânia [...]” (SONNENBERG, 1952, n.p.)63.
O loteamento Jardim Europa, aprovado pelo Decreto nº121, de
6/11/56 “[...] foi elaborado de acordo com as exigências previstas no Código de
Edificações de Goiânia e do Decreto-lei municipal nº 90-A, de 13 de julho de
1938 [...]” (PEREIRA, 1956, n.p.)64.
Evidentemente que os memoriais descritivos não se limitam a
professar obediência genérica ao plano diretor, mas sim a justificar o projeto de
loteamento, a descrever detalhadamente o imóvel loteado quanto aos seus
limites e confrontações, a relacionar e enumerar os lotes residenciais e
comerciais, bem como os espaços públicos. Vejamos dois exemplos.
O Bairro Santa Genoveva, aprovado pelo Decreto nº 45, de
30/01/51, teve o projeto norteado pelos seguintes elementos:
[...] 1 - criar um bairro autônomo, uma verdadeira cidade satélite; (...) 3 –
Estabelecer um cinturão de vegetação em torno do bairro, dispondo para isto de
numerosas chácaras em seu redor; 4 – Estabelecer um plano de conjunto capaz
de servir às condições de futuro (...) com lotes amplos, grandes jardins e áreas
necessárias aos fins desportivos e culturais da população [...].
(NASCIMENTO, 1950, n.p.)65.
O Jardim Goiás, aprovado pelo Decreto nº 18, de 22/9/50, foi
projetado para ser um bairro do tipo cidade-jardim, com 14,6% de espaços
livres, correspondendo a 374.663 m² de parques, jardins públicos e praças
ajardinadas, sendo que, ao longo dos córregos existentes “[...] foram deixadas

63
SONNENBERG, W. Memorial descritivo do plano de loteamento do Bairro Nova Suíça. Goiânia: 22 abr.
1952. Arquivado no Cartório Teixeira Neto.
64
PEREIRA, B.A.S. Memorial descritivo do plano de loteamento do Jardim Europa. Goiânia: 20 nov. 1956.
Arquivado no Cartório de Registro de Imóveis da 2ª Circunscrição.
65
NASCIMENTO, O. Memorial descritivo e justificativo do Projeto de Urbanização do Bairro Santa Genoveva.
Goiânia: 18 jan. 1950. Arquivado no Cartório de Registro de Imóveis do 1º Ofício.
88

faixas verdes que depois de melhoradas e tratadas constituirão belos parques


para a recreação da população [...]” (MAIA & RIBEIRO, 1950)66.
O artigo primeiro do Decreto-lei n. 90-A, de 30/07/38, que instituiu
o primeiro Plano Diretor da Cidade de Goiânia aprovou importantes Unidades
de Conservação Municipal. Estas foram criadas com o objetivo de proteger as
matas de galeria e formações ciliares que cobriam e ainda cobrem parcialmente
algumas cabeceiras e margens de mananciais hídricos municipais.
Objetivando proteger estas formações vegetais típicas, o planejador
de Goiânia estabeleceu a diretriz de implantação dos parques lineares ou
parkway. Conseqüentemente fez inserir na planta e no memorial descritivo do
projeto inicial de loteamento da cidade, a proteção da cobertura vegetal existente
no entorno das nascentes e das margens dos mananciais, preservando a
qualidade das águas e ofertando recintos naturais aprazíveis para o lazer da
população.
Esta diretriz do planejador originário foi incorporada nos planos
diretores e nas leis de uso do solo que sucederam ao primeiro plano de 1938.
Trata-se de uma diretriz correta e atual, dentro da ótica do urbanismo moderno,
pois objetiva, em síntese, a manutenção do equilíbrio do ecossistema urbano e a
melhoria da qualidade de vida.
O Plano Diretor Integrado de Goiânia (PDIG) de 1971 – Lei 4.526,
de 31/12/71, no artigo 11, estabeleceu como uma das zonas de uso a serem
indicadas na planta de zoneamento, as zonas verdes de recreação e cultura (ZV).
No artigo 25 são citadas algumas medidas objetivando a preservação e
valorização de áreas para recreação, atividades ao ar livre e de preservação
ambiental, como Parques Infantis, Verde Linear, Parques Municipais nos fundos
de vale, a criação de um Parque Regional e a reserva de faixa mínima de 50
metros de ambos os lados dos córregos das zonas urbana e de expansão urbana.
A Lei de Zoneamento de 1980 – Lei 5.735, de 19/12/1980, no seu
art. 24, item XVII, cria a ZV-P, numa faixa marginal de 50 e de 100 metros para
córregos e ribeirões ou para rios, respectivamente, bem como área de raio de
100 a 500 metros da nascente de mananciais hídricos, além das áreas cobertas
por matas e florestas.
O item XVIII do artigo 24 desta lei define a ZV-C, como as áreas
de morros e aquelas cobertas por bosques, matas e florestas que não possuam
características ecológicas especiais. Quando possuidoras destas características,
elas se enquadram no conceito de ZV-P. As áreas do entorno de uma ZV-P são
definidas pelo item XIX da lei citada como ZV-T, numa largura mínima de 100
ou de 200 metros para córregos e rios ou represas, respectivamente. Finalmente,
a ZV-E, definida pelo item XX como as áreas de praças, parques, rótulas do
sistema viário, de lazer e de equipamentos específicos.

66
MAIA, F. P. & RIBEIRO, R. M. Memorial descritivo e justificativo do Projeto de Urbanização do Jardim
Goiaz. São Paulo: jun. 1950. Arquivado no Cartório de Registro de Imóveis da 3ª Circunscrição de Goiânia.
89

O PDIG de 1992 – Lei complementar nº 015/92 reafirmou a diretriz


de se criar Unidades Municipais de Conservação em áreas de características
ecológicas, paisagísticas e históricas.
A Lei nº 7.222, de 20/09/93 impôs condições especiais para a
aprovação do parcelamento do solo nas áreas urbanas e de expansão urbana,
estabelecendo no seu art. 10 a determinação de que os espaços livres de uso
público, o sistema de circulação e os equipamentos urbanos e comunitários, não
poderão apresentar área inferior a 35% do total da gleba loteada. O parágrafo
único deste artigo assegura o mínimo de 15% de áreas destinadas a equipamento
de uso comunitário e uso público. No art. 11, as áreas de preservação, não
parceláveis, ao longo dos cursos de água, bem como as reservas florestais, não
são computáveis para efeito do mínimo de 15% estabelecido no parágrafo único
do artigo 10. O art. 3º da mesma lei diz mais: as áreas de preservação ecológica,
não parceláveis, deverão atender o disposto na Lei de Zoneamento e Uso do
Solo de Goiânia.
Para todas as ZV’s, os usos do solo admitidos pelo art. 33 da Lei de
Zoneamento de Goiânia, de 1980, são incompatíveis com projetos de edificações
com mais de dois pavimentos e que ocupem mais de 25% da superfície do
terreno.
Todos os dispositivos anteriormente comentados da Lei nº 5.735/80
foram mantidos na atual Lei de Zoneamento de Goiânia – Lei Complementar nº
031, de 29/12/94.

2.8.5. Caracterização dos agentes produtores do espaço urbano com


repercussões sobre os espaços livres de Goiânia
Como foi exposto na Seção 2.8.2, no período de 1935 até a década
de 1950, ocorreu uma apropriação do solo urbano e da sua valorização pela
firma Coimbra-Bueno & Cia Ltda, pois milhares de lotes dos Setores Central,
Coimbra, Oeste e Sul foram comercializados por esta empresa.
A descaracterização do planejamento da cidade, portanto, está
relacionada diretamente à atuação da firma citada. A inclusão do Setor Coimbra
no Primeiro Plano Diretor de Goiânia, com o beneplácito do Estado, exemplifica
claramente a importância da empresa Coimbra Bueno como agente produtor do
espaço urbano de Goiânia. O Setor Coimbra se configurou numa espécie de
“enxerto" colocado entre os setores constantes do plano diretor. Um “enxerto”
que pegou, foi ficando, cresceu e enraizou, inclusive, expandiu suas raízes sobre
si mesmo, pois até as áreas públicas do Setor Coimbra foram loteadas pela
citada firma.
No Relatório apresentado pelo arquiteto-urbanista Attílio C. Lima
ao Estado de Goiás em 1935, a área destinada à implantação da Zona de
Esportes possuía 1.467.844 m². Nesta área foi implantado o Setor Coimbra. A
figura 17 mostra as áreas públicas alienadas deste setor: 15.845 m² de praças;
90

2.6894 m² de verde de acompanhamento viário; e, 22.265 m² destinadas a


equipamento público.

Figura 17 – O loteamento das áreas públicas do Setor Coimbra, implantado em área destinada
a Zona de Esporte segundo o Relatório de Atíllio Corrêa Lima entregue ao Estado em 1935.

A vinculação dos interesses do Estado com os de uma empresa


particular tornou-se mais íntima com a eleição do Eng. Jerônimo Coimbra-
Bueno para governador do Estado de Goiás em 1950. Sintomaticamente, após a
posse do eleito, foi aprovada a Lei n° 176, de 15.3.1950, alterando a legislação
municipal de uso e parcelamento do solo urbano de Goiânia e revogando as
exigências do Código de Obras estabelecidas desde o seu planejamento
originário. Segundo a legislação até então vigente, não se permitia o loteamento
da zona suburbana e rural, mas somente o parcelamento de chácaras e sítios de
recreio, prevendo-se dentro de um raio de 15 km da estaca zero (Praça Cívica) a
construção das futuras cidades-satélites.
Martins Júnior (op. cit.) calculou que, no Setor Bueno, foi
privatizada uma área de 356.630,56 m² de espaços livres e de vias de
comunicação (v. tabela 10), por intermédio da empresa loteadora – firma
Coimbra-Bueno, contando com a participação e/ou omissão da Prefeitura de
Goiânia.
91

Tabela 10 - Alteração do Quadro de Áreas do Setor Bueno (área total 2.516.800 m²)*
Área Original Área Atual Variação
Uso do solo
% m² % m² % m²
Vias de co
22,7 572.068,64 15,71 395.389,28 - 7,02 -176.679,36
municação
Espaços Livres 11,8 296.982,40 4,65 117.031,20 - 7,15 -179.951,20
Particulares
65,4 1.647.748,90 79,64 2.004.379,52 +14,17 +356.630,56
(Quadras)
*De acordo com memorial descritivo e plano de loteamento aprovado pelo Decreto n° 19, de 24.01.51, inscrito sob n.º 15,
livro 8-B, folhas 1 a 10, do Cartório de Registro de Imóveis da 1 ª Circunscrição.

A intrínseca relação entre os agentes produtores do espaço público


de Goiânia, - "Estado-incorporador" e "Empresa-construtora" revezando-se
como "Estado-construtor" e "Empresa-incorporadora", fica novamente
evidenciada. Segundo Moysés (op. cit., p. 25), a partir da vigência da Lei n°
176/50, Goiânia fica “[...] à mercê da iniciativa privada que passa a desenhar a
cidade de acordo com a lógica da economia de mercado [...]". Essa lógica vinha
sendo desenhada desde o momento em que a direção geral das obras de Goiânia
foi entregue sem a menor cerimônia a uma empresa privada do ramo da
especulação imobiliária. O corolário da atuação dos dois principais agentes
produtores do espaço urbano de Goiânia, no período considerado, se deu com a
revogação da lei municipal do solo urbano em 1950 e o surgimento em apenas
um ano de 179 novos loteamentos.
Para os geógrafos urbanos, as cidades surgem como expressão
particular da combinação de várias relações funcionais como a agropastoril, a
drenagem da renda fundiária, as migrações, os investimentos de capital, a
distribuição de bens e serviços e a difusão de idéias e valores.
A expansão urbana de Goiânia na década de 1950 traduziu a
necessidade de aumentar a disponibilidade de áreas para a construção urbana.
Segundo Sobrinho & Vaz (1992), esse fato está relacionado à política de
interiorização do Governo Federal cujo corolário se deu com a construção de
Brasília. Tanto é assim que, segundo esses autores, várias empresas que se
estruturam com a implantação de Goiânia, principalmente nas áreas de
engenharia e construção civil, se instalaram posteriormente no Distrito Federal.
Evidencia-se assim que, na década de 1950, parte expressiva do
excedente da renda produtiva do setor agropecuário foi investido em Goiânia e
depois em Brasília. Daí o surgimento do fenômeno da especulação imobiliária,
que se manifestou como um componente da falta de autonomia do Poder Local
em implementar uma política de desenvolvimento urbano.
Segundo Corrêa (1995)67, o exercício da função “drenagem da
renda fundiária” determinou o aspecto físico de muitas cidades brasileiras de
porte médio, com aparência de metrópole, cujo espaço urbano apresenta áreas de
adensamento construtivo com objetivo residencial, convivendo com áreas vagas
que se constituem em estoque especulativo de terra.
67
CORRÊA, R. L. O espaço urbano. 3. ed. São Paulo: Ática, Série Princípios, 1995. 94 p.
92

O Estado desempenhou papel decisivo como agente produtor do


espaço urbano de Goiânia, tanto na esfera estadual, como agente direto de
alienação dos espaços livres da cidade, como na esfera municipal, pela falta de
autonomia do Município de Goiânia em gerir os espaços livres transferidos à sua
competência pelo efeito da legislação do uso do solo.
Britto (1966, p.256)68 deixou patenteada a participação do Estado
de Goiás na dilapidação do patrimônio público municipal:
[...] em nossa gestão, não foram poucas as invasões havidas. (...) O Governo
Estadual, até a época da Intervenção Federal, ao contrário de ajudar-nos a
solucionar a questão, ampliava-a, favorecendo e mesmo incentivando as
invasões [...].
A falta de autonomia do Poder Público local sobre os espaços
livres, frente ao papel tutelar do Estado de Goiás, é uma característica histórica
do desenvolvimento de Goiânia, conforme registrou o já mencionado ex-
prefeito:
[...] preparava-me para ingressar em juízo, na qualidade de Prefeito do
Município para exigir cumprimento do Acórdão nº 39, de 28/11/1950, do
Egrégio Tribunal de Justiça, nos autos de apelação cível nº 1.709, quando a
situação se modificou com a intervenção federal no Estado, abrindo novas
perspectivas ao Município.
O acórdão citado garantiu ao Município de Goiânia o direito de propriedade
sobre os terrenos da zona urbana e suburbana e rural de Goiânia, bem como o
direito de exercitar livremente, sem qualquer restrição, as atribuições de sua
competência, definidas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica
do Município e no Código de Edificações de Goiânia [...] (BRITTO, 1966, p.
22-3).
No entanto, apesar das ações junto ao regime autoritário implantado
em 1964, desenvolvidas pelo autor citado, quando exerceu o cargo de prefeito de
Goiânia no período 1961-1965, a autonomia do Município não foi concretizada:

[...] desta forma, não pudemos conseguir junto aos Governantes do Estado a
emancipação completa do Município, nem antes da Revolução, quando, ao
invés de nos ajudar nos atrapalhavam, nem depois dela, quando nos enchemos
de ilusões, mas pouco de concreto vimos realizar em prol do Município [...]
(BRITTO, 1966, p. 24).
Um aspecto paradoxal à comentada falta de autonomia municipal,
refere-se à convergência de interesses do Estado com os interesses de grupos
sociais excluídos na promoção de assentamentos em áreas verdes locais. Por
iniciativa da LBA/GO, presidida pela Primeira Dama do Estado, promoveu-se o
loteamento, em 1953, da área destinada à implantação de um Parque Linear, às
margens do córrego Capim Puba. De acordo com o processo de parcelamento

68
BRITTO, H.S. Histórico de uma administração: autonomia municipal de Goiânia (1961-1965). São Paulo:
Edições Alarico, {1966}, 358 p.
93

arquivado na SEPLAM, a área pública municipal foi considerada como


propriedade do Estado de Goiás, sendo o parcelamento autorizado pelo
Município de Goiânia e os lotes vendidos pela LBA/GO.
A fragmentação e a doação de partes de área pública de domínio
municipal às margens do Córrego Botafogo, destinada à implantação do Parque
Linear de mesmo nome, ocorreram a partir da década de 50, por iniciativa do
Estado de Goiás. Nesta mesma área, durante a década de 80, a Fundação
Legionárias do Bem-Estar Social, sob a Presidência da Primeira Dama do
Estado, promoveu o parcelamento e a venda de lotes na mencionada área verde.
A falta de autonomia do Município de Goiânia na gestão dos seus
espaços livres pode ser demonstrada ainda com a construção do Estádio Serra
Dourada, na década de 70, pelo Estado de Goiás. A área escolhida pelo governo
estadual localizou-se no Jardim Goiás de propriedade de um empresário que foi
logicamente indenizado. Contudo, houve a inclusão de áreas destinadas a praças
(125.188 m²); verde de acompanhamento viário (8.296 m²); e, equipamentos
públicos (396.246 m²), totalizando 529.730 m² do patrimônio público municipal
(figura 18).

Figura 18 – Estádio Serra Dourada, construído pelo Estado de Goiás, em 1975, em parcelas
expressivas de áreas públicas municipais localizadas no Jardim Goiás.

*Processo nº 399, de 16/4/1953 e processo nº 573, de 31/3/1955 arquivado na SEPLAM – Secretaria de


Planejamento Municipal de Goiânia.
**Processo nº 9.354.581/96 – SEMMA, arquivado na 15 ª Promotoria de Justiça de Goiânia; Autos nº 253/88 de Ação
Reivindicatória na 1ª Fazenda Pública Estadual da Comarca de Goiânia, além de vários outros em trâmite neste juízo.
94

Em outro aspecto, destaca-se como exemplo da articulação do


Estado com agentes dominantes na produção do espaço urbano de Goiânia, o
projeto do porto de telecomunicações de Goiânia – “Teleporto Parque Serrinha”
(SEPLAN, 2001)69. A área objeto de licitação pelo Governo do Estado de Goiás
para implantação do referido projeto, a ser transferido para a iniciativa privada, é
o Parque Municipal Morro da Serrinha. Este parque se encontra desvirtuado da
sua função original, sob o domínio parcial de duas empresas estatais e de duas
empresas particulares, mas com o solo ainda permeável e com cobertura nativa
de “cerrado típico”. Levantamento do Prof. Heleno Dias Ferreira, do
Departamento de Botânica da UFG, realizado em 2001 registrou 71 espécies
vegetais no Morro da Serrinha.
Ao invés de atuar na recuperação do parque, o Poder Público, atua,
assim, como tem sido historicamente, na descaracterização ambiental do PUG,
privatizando o patrimônio ambiental de Goiânia. Para isso, conta com a ação do
Estado e a omissão do Município que não exerce a sua autonomia na gestão dos
espaços livres da capital dos goianos.
Pelo exposto, pode-se afirmar que o Estado (Poder Público), em
aliança principalmente com os proprietários dos meios de produção e os
promotores imobiliários, constituíram-se nos principais agentes produtores do
espaço urbano de Goiânia. Subsidiariamente, os interesses dos agentes
dominantes na produção do espaço urbano convergem com os dos grupos
sociais excluídos na apropriação de áreas verdes municipais.

69
SEPLAN. Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento do Estado de Goiás. Estudo de Impacto Ambiental
do projeto do porto de telecomunicações. Goiânia: Green Ambiental, 2001.
95

Parte III - O HOMEM, O CLIMA E O ECOSSISTEMA URBANO:


UM ESTUDO DE ECOLOGIA HUMANA
“A cidade é a realização humana de maior perenidade. Raramente uma cidade fenece;
ela pode permanecer em letargia por séculos, mas pode ser revitalizada. Basta
refuncionalizar-se. A vitalidade da urbe funda-se na sua capacidade de se constituir em
local de encontro, de troca, de festa entre os homens”
Henri Lefebvre (1991)

3.1. ESTUDO DOS FATORES MICROCLIMÁTICOS


INTERVENIENTES NA FORMAÇÃO DO CLIMA URBANO

3.1.1. O sítio urbano de Goiânia e os fatores climáticos de ordem local

A vegetação original do sítio onde foi implantada a cidade de


Goiânia é caracterizada por um mosaico onde aparecem vários tipos de
formações vegetais que compõem a região do cerrado, segundo a classificação
de Eiten (1994)70. O traçado urbano foi efetivado de tal maneira que áreas
contendo essas formações vegetais foram transformados em unidades de
conservação.
As Veredas estão presentes nas nascentes do córrego Buritis, que
constituíram o Parque dos Buritis (figura 19, letra a) - situado na região central
da cidade, com 400 mil m², hoje restritos a pouco mais de 100 mil m².
As Matas Ciliares que ocorrem nas nascentes e margens das
principais drenagens, como os córregos Botafogo e Capim Puba, foram
incluídas, respectivamente, no Jardim Botânico (figura 19, letra b) e Parque
Zoológico (figura 19, letra c), - que permanecem com seus perímetros quase
intactos, mas ocupados por posseiros e instituições - e seus correspondentes
parques lineares (figura 19, letras d, e), que praticamente desapareceram do
mapa.
O Cerradão, com árvores em torno de 10-15 metros de altura, e
sem um estrato gramíneo denso como no Cerrado, está representado em parte
pelo Parque Botafogo (figura 19, letra f), com 540 mil m², no Setor Central,
reduzido a 176 mil m² na atualidade.
As Florestas de Interflúvio ficaram representadas por uma área de
mais de 1 milhão de m², constituindo a maior parte do Horto Florestal (figura
19, letra g), que incluiu também a mata ciliar do córrego Capim Puba, na região
Norte da cidade, onde ainda se vêem algumas daquelas árvores nos quintais das
casas do Setor Fama e na vasta área onde se implantou o Cemitério Jardim das
Palmeiras.
O Cerrado típico, com um estrato gramíneo vigoroso e árvores
pequenas e retorcidas, foi representado pelo Parque Paineira com 60 mil m², que
não aparece na figura 19, pois o Setor Sul ainda não estava implantado. Este
70
EITEN, G. Vegetação do Cerrado, p. 17-73. In: MORAES PINTO, M. (ORG.) Cerrado: caracterização,
ocupação e perspectivas. Brasília: SEMATEC/EdUnB, 1994.
96

parque localiza-se próximo a Praça do Cruzeiro, ocupada na atualidade pelos


clubes da CELG, SANEAGO e TELEGOIÁS.

Figura 19 - Formações Vegetais do sítio urbano de Goiânia demarcadas como Unidades de


Conservação. Fotografia aérea de 1937 (Fonte: IBGE)

A região destinada a instalar a cidade de Goiânia foi escolhida por


uma comissão técnica que percorreu o Estado em visita aos sítios mais
favorecidos. O local escolhido foi posteriormente confirmado por estudos de
engenharia urbanística, que apresentaram os seguintes requisitos:

[...] O clima é determinado principalmente pelos seguintes elementos: latitude,


altitude, direção dos ventos, condições topográficas, geológicas e hidrográficas
do terreno. (...) a altitude é, nos lugares de cota inferior, superior a 700 metros,
o que influi sobremodo para que a coluna termométrica indique, nos dias mais
quentes, temperatura perfeitamente suportável (...).
Outro elemento que é bem favorável, no local, é o grau higrométrico, para o
que concorre a circunstância de nos arredores de Campinas, os ventos não
encontrarem obstáculos de ordem orográfica. Todos os terrenos se acham bem-
dispostos à influência das correntes aéreas (...).
Também concorre para o favorável grau de umidade a circunstância do rio
Meia Ponte e dos regatos que banham a área em questão não apresentarem
margens alagadas. Isto provém da permeabilidade e da regular declividade dos
terrenos. Também concorre para temperar o clima a vizinhança de matas, as
97

quais constituem um elemento precioso nas proximidades de um centro urbano


(...) pela salutar influência sobre as condições atmosféricas e pelo que podem
proporcionar sob o ponto de vista paisagístico e recreativo. (...)
Os acidentes topográficos oferecem nenhuma dificuldade que se oponha a um
traçado moderno. O terreno é compacto e de constituição uniforme, sílico-
argiloso, resistente (...).
Entre os elementos mais indispensáveis à fundação e desenvolvimento de um
centro urbano figura a água. (...) O consumo d’água tem crescido muito nos
últimos anos nas aglomerações humanas civilizadas (...) com uma média
mínima de 450 litros por pessoa.
Em Campinas corre o rio Meia Ponte com uma descarga de mais de quinze
milhões de litros por hora (...), o rio Anicuns com nove milhões e seiscentos
mil litros; (...) o Cascavel com um milhão e duzentos mil litros; o Macambira
com cinco milhões e oitocentos e setenta mil litros [...] (GODÓI, 1942a, p. 25-
7).

Além destas características do sítio, contendo elementos e fatores


geográficos favoráveis à determinação do clima local, deve-se destacar o fator
humano que também responde pela formação microclimática da urbe citada.
De um lado, implantou-se na região central do Brasil uma cidade de
concepção urbanística moderna, - planejada como a 3ª Cidade-Jardim de
Howard, depois de Letchworth e Welwin.
Por outro lado, verificou-se um crescimento demográfico
acentuado, acompanhado de uma violenta especulação imobiliária. A
dilapidação do patrimônio ambiental de Goiânia, conforme demonstrou Martins
Júnior (op. cit.) para o Setor Bueno, contou com a decisiva participação do
poder público, tanto do Executivo como do Legislativo, transacionando
livremente as áreas públicas criadas no planejamento da cidade.
Daí que, em Goiânia, emerge um ambiente urbano resultante do
conflito entre a "cidade virtual", que consta da legislação urbanístico-ambiental
original e burocraticamente vigente, e a "cidade real" concretizada por agentes
sociais dominantes que efetivamente produzem o espaço urbano segundo os
interesses de ampliação e reprodução do capital. Este embate desenvolve-se sob
uma incipiente cultura cidadã, que esporadicamente se manifesta no interesse do
coletivo, pois se desconhece a própria história da cidade.
Na prática, o que vem ocorrendo é a concessão, pela Prefeitura, de
sucessivos alvarás de construção em áreas públicas de parques, como o da
nascente do Córrego dos Buritis (LACERDA, T. L. Espigão em lugar de área
verde. Diário da Manhã, Goiânia, 03 set. 1998, p. 4) ou de transacionar com as
áreas verdes sempre no interesse dos grupos econômicos, conforme noticiado
pela imprensa, o caso da permuta de um parque de 122 mil metros quadrados
atendendo interesses dos empreendedores de um condomínio de luxo (O
POPULAR. Ministério Público vai investigar permuta de área. Goiânia, Política,
2 abr. 1999, p. 2).
98

Os poderes do legislativo e do executivo do Município de Goiânia


institucionalizaram a prática das doações e permissões das áreas públicas, sem o
menor controle. No período de 1993 a outubro de 1994 foram apresentados 76
projetos, beneficiando, em sua maioria as igrejas evangélicas, com 47,2 mil m² e
a Igreja Católica, com 43,3 mil m² (DIÁRIO DA MANHÃ. Câmara suspende
doação de áreas públicas. Goiânia, Local, 25 maio 1995, p. 10).
A Comissão Especial de Inquérito (CEI) das Áreas Públicas da
Câmara Municipal de Goiânia estimou que “[...] mais de quatro mil áreas
públicas estejam ocupadas por particulares [...]” (O POPULAR. CEI tenta anular
acordo de venda de área pública. Goiânia, Cidades, 28 abr. 2001, p. 3B).

3.1.2. Fatores e processos do microclima urbano

Segundo Geiger (1980, p. 481)71, a bioclimatologia, em sentido


amplo, “[...] é o estudo dos condicionamentos da vida do homem, das plantas e
dos animais em relação às condições e fenômenos da atmosfera [...]”. Em
sentido estrito, para o mesmo autor, “[...] é o estudo das inter-relações do clima
e da vida [...]”.
Para Vieira (op. cit.), os efeitos do clima sobre a vida devem ser
analisados nos aspectos bioclimáticos do conforto térmico, acústico e lumínico,
tanto para ambientes internos (criptoclima) como para ambientes externos pois,
na cidade, as idéias de conforto são complementadas por segurança, comércio e
interação. Esta socialização imprime características físicas, climáticas, sócio-
culturais e paisagísticas peculiares ao meio urbano.
Os espaços-livres e as áreas verdes das cidades progressivamente
cedem lugar para as edificações. As leis de mercado tendem a maximizar o uso
do solo, no exercício das funções urbanas (habitação, trabalho, locomoção e
recreação) que possibilitam a acumulação e reprodução do capital investido
pelos agentes produtores do espaço urbano.
O racionalismo da cidade funcional pode levar ao último grau o
desprezo às leis da natureza. Ao substituir a cobertura natural do solo por
edificações contendo materiais de constituição e propriedades termodinâmicas
diversas, altera-se radicalmente o balanço da radiação solar e da água no meio
intra-urbano.
A energia flui para a Terra na forma de radiação do sol (insolação).
Arbitrariamente e por conveniência se divide a radiação ambiental em ondas
curtas e ondas longas. A radiação de onda curta refere-se àquela que é direta,
refletida ou dispersa, originada do sol. A radiação de onda longa, em geral, é
originada de fontes terrestres. O solo, a vegetação, a água e outras superfícies,

71
GEIGER, R. Manual de microclimatologia: o clima da camada de ar junto ao solo. Tradução de Ivone Gouveia
e Francisco Caldeira Cabral. Lisboa: Fund. Calouste Gulbenkian, 1980. 642p.
99

alteram a composição do espectro de radiação ao absorvê-la, refleti-la ou


transmiti-la, resultando desta interação, as diferenças de cores dos objetos.
Conforme demonstram Ometto (op. cit., p. 58-65), Geiger (op. cit,
p. 9 - 31) e Larcher (1986, p. 24-31)72 no meio natural, o balanço da radiação
pelo solo (QI), é formado pelo equilíbrio entre o balanço de ondas curtas (Boc),
cujo espectro solar compreende a faixa de 0,22 – 4 μm (micrômetro) ou 220 -
4.000 nm (nanômetro) e o balanço de ondas longas (Bol), com espectro de
emissão terrestre na faixa de 4 – 130 μm ou 4.000 -130.000 nm (figura 20).
Por convenção, toda energia que chega a um corpo receptor é
computada como positiva, sendo negativa a que é perdida. A sua somatória
algébrica é o balanço de energia radiante.

sol Ii ou Rc atmosfera (N2, CO2, aerossóis, vapor d'água)


Ir ou r I g ou Es

Ir Ia ou Ea
Id ou Rd

Boc (220 - 4.000 nm) Bol (4.000 - 130.000 nm)


Figura 20 - Esquema do balanço de radiação pelo solo em ambiente natural

A radiação solar que atravessa a atmosfera pode ser difundida pelos


seus constituintes fixos (N2, O2, gases nobres e outros) ou variáveis (CO2, vapor
d'água, aerossóis, poluentes atmosféricos e outros). Esta parcela é denominada
de radiação difusa ou do céu (Rc ou Ii). A radiação que atinge diretamente a
superfície do solo é denominada de radiação direta (Rd ou Id). A radiação solar
global (Rg) é a soma das radiações difusa e direta, i.é., Rg = Ii + Id.
Há ainda uma parte da energia solar incidente que é devolvida à
atmosfera por radiação difusa e que depende da natureza da superfície terrestre,
denominada radiação refletida pela superfície (r ou Ir).
Daí que, no balanço de ondas curtas (Boc), temos:

Boc = Id + Ii - Ir

O albedo é a razão entre a quantidade de radiação refletida por um


corpo e a incidente sobre ele, expressa em percentagem, para qualquer
comprimento de onda. Diferencia-se da reflectância (v. Seção 3.1.2.1.a), que
expressa o coeficiente de reflexão para um determinado comprimento de onda.
O albedo depende da natureza do material da superfície receptora.
Os materiais que absorvem pouca energia radiante devolvem muito; e vice-
versa, os que absorvem muito, devolvem pouco. Os materiais de superfícies
72
LARCHER, W. Ecofisiologia vegetal. Tradução de Antônio de P. Danesi e Hildegard T. Buckup. São Paulo:
EPU, 1986. 319 p.
100

claras, lisas e secas possuem valores de albedo maiores do que os de superfícies


escuras, ásperas e molhadas (tabela 11).
De acordo com Ayoade (op. cit., p. 316), nos últimos seis mil anos,
houve um aumento de 8,44% do albedo médio da superfície do globo, refletindo
alterações na cobertura vegetal e no uso do solo.

Tabela 11 - Albedo de algumas superfícies naturais e cultivadas


Superfícies Albedo (%)
Neve fresca 75 – 95
Areia clara das dunas 30 – 60
Solo arenoso seco 25 – 45
Solo cinza seco 20 – 35
Pradarias e campos 12 – 30
Solo cinza úmido 10 – 20
Florestas 5 – 20
Solos cultivados escuros 7 – 10
Superfícies com lâmina d’água 3 – 10
Fonte: Geiger (1980, p. 20) e Robinette, apud Vieira (1994, p. 88)

Opondo-se ao ganho de energia radiante do sol, há uma perda


associada à emissão dos corpos terrestres. Parte da energia ganha pelo solo é
reemitida, após interagir com a matéria do corpo irradiado, como radiação
térmica do solo e das plantas - Ig (também denominada emissão radiante da
superfície do solo - Es). As moléculas dipolares da atmosfera, principalmente
vapor d'água, realizam a absorção de Es, de forma acentuada, aquecendo o ar
que envolve a Terra. Ocorre, assim, rerradiação ou emissão da atmosfera (Ia ou
Ea), em todas as direções, inclusive, uma parte direcionada à superfície da terra.
No balanço de ondas longas (Bol) temos:

Bol = Ia – Ig

Assim, o balanço de radiação pelo solo (QI) é dado por:

QI = Boc +_ Bol

A radiação líquida disponível (RL) é a energia resultante deste


balanço que é disponibilizada ao meio depois que todas as trocas radiativas são
efetuadas. Durante o dia, a radiação líquida resulta:

RL (d) = Boc – Bol

O termo Boc é positivo, pois é uma conseqüência da radiação solar


que alcança o sistema, e o termo Bol é negativo, pois representa a emissão do
sistema. Durante o dia, o balanço é positivo, pois Boc > Bol. O equilíbrio torna-
101

se negativo quando a luz do dia for insuficiente para compensar a perda de


radiação térmica e à noite quando, evidentemente, Boc = 0.
A energia excedente é transferida para a biosfera, sendo consumida
na fotossíntese das plantas, no aquecimento da biomassa vegetal, do solo e do ar
e em fenômenos evaporativos.
A temperatura do ar expressa a energia contida no meio. A energia
se propaga pelo processo de difusão turbulenta, oscilando entre dois extremos,
num ciclo de 24 horas. Ao nível do solo, a temperatura é máxima ao meio dia e
mínima antes do sol nascer.
Os seres vivos estão adaptados a energia do meio ambiente. O
homem desenvolveu a homeotermia, conservando a energia interna em torno de
uma média constante. Na maioria dos casos a adaptação se faz com a estagnação
do metabolismo à flutuação da temperatura externa. A taxa metabólica é
controlada pela atividade – o corpo em movimento produz duas ou três vezes
mais calor do que em repouso.
Os vegetais desenvolveram a capacidade adaptativa aos valores
térmicos extremos do meio. Dois desses mecanismos adaptativos são o ponto de
compensação e o fechamento dos estômatos. O primeiro se verifica quando a
energia do meio alcança um valor tal que o estímulo à respiração equivale ao da
fotossíntese, de maneira que o produto da fotossíntese é consumido pela
respiração e a fotossíntese líquida é igual a zero. O outro ocorre quando a
energia do meio alcança valor elevado, estimulando a perda de água por
transpiração a uma velocidade maior do que a capacidade de absorção pela raiz e
de transporte às folhas. Neste caso, as plantas fecham seus estômatos.

3.1.2.1. Processos de transferência de calor

A energia térmica pode se propagar de um corpo para outro ou de


uma região para outra de um mesmo corpo, de forma espontânea, no sentido da
temperatura maior para a menor. Durante a propagação, a energia térmica recebe
o nome de calor.
O balanço da energia global é dado pela distribuição da RL
disponível, considerando o nível do solo, a partir dos processos básicos de
transferência de calor (radiação, condução e convecção) e nos processos e
sínteses biológicos como fotossíntese, crescimento e desenvolvimento de
microrganismos.

3.1.2.1.a) Radiação
A radiação é a fonte primária de ganho de energia, emitida
principalmente pelo sol e pela Terra. É o principal elemento meteorológico que
impulsiona os fenômenos da atmosfera e se constitui no princípio básico da
vida.
102

A radiação é a transmissão de energia através de ondas ou de


partículas eletromagnéticas (quanta). O calor é a energia em trânsito
obedecendo a um gradiente térmico, no sentido de temperaturas decrescentes.
Caloria (cal) é a quantidade de calor necessária para aquecer 1 g de
água pura de 14,5ºC para 15,5ºC, sob pressão normal; 1 cal corresponde a 4,18
Joules (J). Sendo Watt (W) a energia por unidade de tempo e de área, temos a
relação: 1W. m-² = 1 J.m-².s-1 = 14,3 cal.m-².min-1 = 1,43.10-³ cal.cm-².min-1 =
0,2383 cal.s-1.m-².
A radiação eletromagnética (REM) ou energia radiante é um tipo
de energia que se move à velocidade da luz e que não necessita de um meio
material para se propagar.
A natureza da REM pode ser descrita através das teorias ondulatória
e corpuscular. Segundo a teoria ondulatória, a propagação da energia
eletromagnética ocorre na forma de ondas, de acordo com a equação:

c=.

Sendo: c = velocidade da luz (m.s-1);  = freqüência (Hertz ou Hz);  =


comprimento de onda (m).
Pela teoria corpuscular ou quântica, a REM é emitida, absorvida e
propagada na forma de fótons ou quanta. A energia de um quantum ou fóton
pode ser expressa por:

E = h.  = h. c. -1

Sendo: E = energia de um fóton ou quantum da radiação (J); h = constante de


Planck (6,6255 x 10-34 J.s. fóton-1);  = freqüência da radiação (Hz).
O corpo negro é o modelo teórico de estudo da REM emitida pelos
corpos. Ele tem a propriedade de absorver e emitir toda radiação incidente,
independente da faixa espectral e da direção, não refletindo nenhuma radiação.
O comportamento de um corpo negro obedece, entre outras, a lei da
emissão eletromagnética de Stefan-Boltzmann: a emissão energética de um
corpo é proporcional à quarta potência de sua temperatura absoluta (Ta).

Es =  .  . Ts4

Sendo: Es - emissão radiante da superfície do solo, em W.m-² ou J.m-².s-1 ou cal.


cm-².min-1;  - emissividade (é a relação que existe entre a emissão do corpo
considerado - Ec e a do corpo negro - Ecn,  = Ec/Ecn  1);  - constante de
Stefan-Boltzmann ( =5,789.10-10 W.m-².ºK-4 ou  = 0,827.10-10 cal.cm-2. min–1.
ºK-4); Ts - temperatura da superfície do solo (ºK).
103

O fluxo de REM pode ser refletido, absorvido ou reemitido


(transmitido), em função das propriedades físico-químicas dos elementos
irradiados. O grau de reflexão, de absorção e de transmissão depende do
comprimento de onda da radiação.
A ecosfera, parte da biosfera que mantém a vida, recebe radiação
solar, cujos comprimentos de onda oscilam de 290 a cerca de 3000 nm.Cerca de
40-50% da insolação cai na região de 380-780 nm, que percebemos como luz
visível. Essa faixa é limitada no extremo inferior de comprimento de onda curta,
por UV e, no extremo superior, por IV.

Raios Gama Raios X UV IV Microondas Ondas de rádio

Visível

Violeta Azul Magenta Verde Amarelo Laranja Vermelho


380 430 520 560 580 600 650
comprimento de onda (nanômetro – nm); 1nm = 1000 μm

Fig. 21 – Espectro eletromagnético da radiação solar

A interação da REM com a matéria pode ser entendida a partir de


um dos princípios fundamentais da física: a teoria cinética. Essa teoria diz que
as partículas elementares (átomos, íons e moléculas) estão em constante
movimento à temperatura acima do zero absoluto (0 ºK ou –273 ºC).
As forças de atração de cada uma das partículas dos corpos sólidos,
líquidos e gasosos oscilam em torno de uma posição média, denominada
Energia de Ligação Média (ELM).
A energia média de uma partícula em uma substância homogênea
aumenta com o aumento da temperatura, isto é, eleva-se a Energia Interna de
Agitação (EIA). Essa energia média é constante para diferentes substâncias em
uma dada temperatura.
Quando um corpo é irradiado, os elétrons absorvem a energia
incidente e ficam excitados, saltando do nível orbital de estado fundamental para
o nível de estado excitado. Essa passagem de elétrons de uma à outra órbita
denomina-se transição eletrônica. Nas moléculas orgânicas, o domínio geral das
transições eletrônicas é da ordem de 40-250 Kcal.mol-1, que corresponde à faixa
de absorção de 220-700nm. A energia de uma REM no espectro do UV, de
menor comprimento de onda e maior freqüência, aproxima-se da ELM das
moléculas orgânicas. Essa absorção de um fóton responde pelos efeitos
fotoquímicos sobre os organismos, desarranjando a sua estrutura molecular.
104

e- (estado excitado)
REM

e- (estado fundamental)
Fig. 22 – Interação da radiação eletromagnética (REM) com a matéria

Durante o dia a insolação aquece os corpos que passam a emitir


energia radiante na forma de ondas eletromagnéticas. A transferência da energia
absorvida, pelo solo e pelas plantas, obedece à lei de Stefan-Boltzman, segundo
a qual a emissão radiante (E) de um corpo é proporcional ao seu estado
energético, isto é, à quarta potência da sua temperatura absoluta (T).

E α T4

Essa lei nos diz que uma pequena variação no estado de energia
interna de um corpo (EIA) causa uma grande variação da energia emitida.
Assim, quanto maior a temperatura de um corpo, mais intensamente ele se
resfriará e emitirá energia, aquecendo o meio ambiente.
Em função das características da REM e dos corpos irradiados,
observam-se diferentes bandas de absorção e de reflexão, ocorrendo processos
de interação, a nível molecular e atômico, do comprimento de onda e da
freqüência da radiação incidente com a estrutura molecular e com o arranjo dos
átomos de cada material irradiado.
De acordo com Rosa (op. cit.), o comportamento espectral dos solos
é função do teor de matéria orgânica (quanto maior, menor a reflexão); da
granulometria (quanto menor o tamanho das partículas, maior a reflexão), da
composição mineralógica, da umidade (quanto maior, menor a reflexão) e da
capacidade de troca de cátions (quanto maior, menor a reflexão).
O comportamento espectral da vegetação, segundo o mesmo autor,
varia em função das condições atmosféricas, do solo, da espécie, do índice de
área foliar, da fenologia, da biomassa, bem como da forma, posição,
pigmentação, teor em água e estrutura interna da folha. A interação da REM
com a matéria define os conceitos de absorção, reflexão e transmissão, relativos
às propriedades termodinâmicas dos alvos irradiados.
A absorção é a capacidade do material absorver, em um
determinado comprimento de onda, parte da radiação solar incidente. A
absortância ou absortividade é o coeficiente de absorção entre o fluxo de
energia absorvido e o recebido, isto é, é a fração da radiação incidente que é
absorvida por um material. Geralmente é inferior a um, mas nos corpos negros é
igual a um.
105

No processo de absorção, a energia transportada pelos raios


luminosos converte-se em outras formas de energia, por exemplo, calor. O
material irradiado vai sendo aquecido até atingir uma temperatura constante. No
equilíbrio, a energia absorvida (Boc) é aproximadamente igual à energia emitida
(Bol).
Contudo, a absorção ocorre no espectro de ondas curtas, da
radiação visível, mas a emissão ocorre na faixa de ondas longas da radiação
infravermelha, que é retida pelos materiais constituintes do meio urbano, como
vidros e plásticos. Esta energia retida responde pelo aquecimento do ambiente
ou efeito estufa (figura 23).

R.V.

R.I.V. Vidro ou plástico

alvo

Figura 23 - Diagrama simplificado do efeito estufa no meio urbano (radiação visível - R.V.;
radiação infravermelha - R.I.V.).

A reflexão é a propriedade térmica que permite um material refletir


parte da radiação no mesmo comprimento de onda da radiação incidente. A
reflectância ou refletividade é o coeficiente de reflexão que expressa, em
percentagem, a relação entre a radiação refletida (fluxo radiante refletido) e a
recebida (fluxo radiante incidente) por um corpo, para um comprimento de onda
específico. Geralmente este coeficiente é inferior a um, mas no corpo negro é
igual a zero.
Quanto menor a absortância ou absortividade do material
constituinte da superfície, maior será a reflectância. Quando a radiação atinge
uma superfície, temos reflexão:
i) Difusa - se a superfície é opaca e irregular (rugosa);
ii) Especular - se a superfície é opaca e lisa (polida);
iii) Refração - se o material é transparente.
A transmissão é o processo pelo qual os corpos irradiados
transmitem parte da radiação solar incidente. A transmitância ou
transmissividade é o coeficiente de transmissão entre o fluxo de energia
transmitido e o recebido. É geralmente inferior a um, mas no vácuo perfeito é
igual a um. Para alvos opacos, a transmitância é igual a zero.
A emissão é a capacidade de um material emitir uma radiação
particular, em função da natureza e temperatura próprias de cada alvo irradiado.
A emitância ou emissividade é o coeficiente de emissão que relaciona a emissão
de um corpo considerado com a de um corpo negro perfeito. Em um
106

determinado comprimento de onda, a emissividade e a absortividade têm o


mesmo valor. Os corpos reais apresentam emitância entre zero e um. Um
refletor perfeito possui emitância igual zero, sendo a reflectância, por
conseqüência, igual à unidade. Num corpo negro, onde toda a energia absorvida
é emitida, temos reflectância igual a zero e emitância igual a um.
A troca de calor entre as superfícies das plantas ou do solo e o meio
ambiente efetua-se principalmente nas formas de:
i) Calor sensível, por condução ou por convecção, através da
qual se produz variação de temperatura;
ii) Calor latente de transição, através da qual se produz
mudança do estado de agregação da matéria (vaporização, fusão ou sublimação
e condensação).
A condução constitui um fator significante de troca de calor para
os solos. Para as plantas ou para as comunidades vegetais, assume importância a
redistribuição de calor pela convecção e pela evaporação, que são intermediadas
sobretudo pelos fluxos de massa de ar e água.
A capacidade térmica (C) é a quantidade de calor (Q) necessária
para variar de uma unidade a temperatura (θ) de um corpo ou substância.

C = Q/θ

O calor específico sensível (c) é a capacidade térmica (C) da


unidade de massa (m) de uma substância ou corpo.

c = C/m ou c = Q/m. θ

3.1.2.1.b) Condução térmica

A condução é a transmissão de energia térmica através das


partículas que constituem o meio. O aquecimento da matéria causa choque
molecular, ganho de energia térmica (que causa aquecimento) e de energia
cinética (que causa movimento e transferência de calor) a favor de um gradiente
térmico.
O fluxo radiante () de calor por condução é a quantidade de
radiação ou energia radiante (Q) recebida, emitida ou transmitida por unidade
de tempo.
 = Q / t
Sendo:  – fluxo radiante, expresso em J.s-1 ou Watt (1W = 1 J. s-1); Q –
radiação ou energia radiante, em Joule ou caloria (1 J = 0,239 cal); t – intervalo
de tempo;
A densidade de fluxo radiante (Φ) é o fluxo radiante que passa por
uma superfície de área S e de espessura e.
107

Φ = c . S. θ / e

Sendo: Φ – densidade de fluxo radiante (J.s-1. m-2); c – coeficiente de


condutibilidade térmica; S – área da superfície; θ – variação térmica (ºC);
e – espessura da superfície.

atmosfera

Ecs moléculas da sup. do solo (s)


ts-i
Ecs > Eci
Eci moléculas do int. do solo (i)

Figura 24 - Diagrama da transferência de energia no solo por condução térmica

O coeficiente de condutibilidade varia em função das características


térmicas da superfície irradiada (tipo de material, tamanho das partículas e
temperatura). A condutividade térmica é uma medida da velocidade com que o
calor atravessa o material. Os materiais construtivos de uma cidade podem
possuir alta condutividade, se forem bons condutores como o metal ou baixa
condutividade, no caso de maus condutores que são isolantes térmicos (o vidro,
a madeira, a cortiça, o poliestireno, os plásticos, os tecidos e a água no estado
líquido ou gasoso).
O fluxo energético, ocasionado pela RL, da superfície para o
interior do solo, ocorre como conseqüência do transporte molecular de calor. As
moléculas da superfície do solo recebem energia, agitam-se, transferindo-a
sucessivamente para as moléculas vizinhas. Tem-se assim um gradiente térmico
(ts-i) entre a superfície e o interior do solo, em que a energia cinética das
moléculas da superfície do solo é maior do que as do interior (Ecs > Eci). Este
gradiente determina a parcela da RL que é utilizada pelo solo (condutividade
térmica do solo) (v. figura 24).

3.1.2.1.c) Convecção

Convecção é o movimento de troca de calor, ascendente ou


descendente, de massas de um fluido, devido à diferença de densidade.
A troca de energia, por convecção, das plantas com o meio
ambiente depende de fatores fisiológicos (transpiração) e de fatores físicos
(temperatura do ar e vento). Se o balanço de radiação é positivo (Q I > 0), temos
que a temperatura da planta é superior à temperatura do ar. O calor é transferido
dela para o meio circundante. Em habitats tropicais, sob forte insolação
incidente, a superfície da planta é cercada por um envoltório de ar quente, de
maneira que as suas folhas e órgãos ficam vários graus mais quentes do que o ar.
108

Se o balanço é negativo (QI < 0), a temperatura da planta é inferior


à do ar circundante, invertendo a direção da convecção de calor, que é
transferido para as folhas a partir do meio ambiente.
Não só os fatores físicos, mas também os fatores fisiológicos são
determinantes no equilíbrio térmico das plantas. Se as plantas transpiram
livremente, em condições favoráveis de vento, elas extraem tanto calor do ar que
as folhas podem tornar-se muitos graus mais frias que o meio circundante.
Ao nível do solo, o transporte de calor por convecção se dá de duas
maneiras principais: por calor sensível e por calor latente de transição
(vaporização ou condensação).

 Calor sensível
O calor sensível (QH) é a quantidade de calor que produz variação
de uma unidade de temperatura (θ), numa dada massa (m) de um corpo ou
substância.
QH = C. θ ou QH = m.c. θ

Sendo: QH – calor sensível (cal); C – capacidade térmica (cal.g-1); m – massa


(g); c – calor específico (cal.g-1.ºC-1); θ – variação de temperatura (ºC).

Eca atmosfera difusão turbulenta


ts-i camada-limite fluxo de calor sensível
superfície do solo (s)
Ecs
camada interior do
Ecs > Eca solo (i)

Figura 25 - Diagrama da transferência de energia por calor sensível

O calor sensível é utilizado para o aquecimento do ar atmosférico.


É ocasionado pela RL disponível à superfície do solo que, em contato com uma
camada muito reduzida da atmosfera (camada-limite), promove a transferência
molecular de energia, estabelecendo um gradiente térmico de difusão turbulenta,
entre a energia cinética da superfície (Ecs) e da atmosfera (Eca) (v. figura 25).
O transporte de calor sensível em condição de difusão turbulenta é
dado pela equação:

fs= - ρ.Ks.cp.dT/dZ
Sendo: fs – fluxo de calor sensível (cal.cm-².s-1); ρ – densidade do ar (1,200
g.dm-³ à 1000 mb e 15ºC; decresce à partir da superfície do solo); Ks –
coeficiente de difusividade térmica (cm².s-1); cp – capacidade calorífica unitária
(0,241 cal.g-1.ºC-1); dT/dZ – variação da temperatura (ºC. cm-1).
A difusão turbulenta ou pseudocondução é um movimento
convectivo em pequena escala, associado à falta de uniformidade da superfície
109

evaporante, à diferença de densidade entre as moléculas da atmosfera (as mais


energéticas localizam-se acima da camada-limite) e ao estado de equilíbrio da
atmosfera local.
A convecção térmica ou livre é um movimento convectivo de ar (no
sentido vertical), de grande escala, deflagrado em condições de dias calmos e
sem ventos, sob as quais se estabelece um gradiente térmico entre a camada
limite e a atmosfera.
Em dias de ventos fracos ou moderados de movimento horizontal
de massas de ar (advecção), quebra-se o gradiente térmico de difusão turbulenta,
desencadeando um movimento convectivo, de maior escala e freqüência, que
homogeneiza o perfil térmico considerado.

 Calor latente de transição (L)


É a quantidade de calor trocada por unidade de massa de uma
substância, ao sofrer uma mudança do estado de agregação, à temperatura
constante.
tºC
t2
Vaporização
vapor
tE 100
ou ebulição (+)
água Liquefação (-)
Fusão (+)
tF 0 tempo
Solidificação (-)
t1 -20 gelo
Figura 26 – Curva de aquecimento da água

A quantidade de calor latente para variar a temperatura de uma


unidade de massa de gelo, sob pressão de uma atmosfera, é de ± 80cal/g para a
fusão/solidificação e de ± 540 cal/g na vaporização/liquefação, como se
visualiza pela curva de aquecimento da água (figura 26).
A evaporação é um fenômeno físico de mudança do estado da água
presente na atmosfera, de líquido para vapor. As partículas atômicas dos corpos
sólidos, líquidos e gasosos sofrem a atração de forças denominadas energia de
ligação média (ELM), de tal maneira que: ELM gases < ELM líquidos < ELM
sólidos. Assim, há uma transferência natural de água no estado líquido da
superfície do globo para o estado gasoso na atmosfera.
Segundo a teoria cinética da matéria, quando se transfere calor para
um corpo, as suas partículas ganham energia cinética a um nível de quebra da
ELM, causando mudança do estado de agregação da matéria de sólido para
gasoso. Para que isso ocorra, à temperatura constante, exige-se o consumo de
uma quantidade de energia por unidade de massa.
O calor latente de evaporação (QE) é a parcela da RL que é
utilizada na mudança de fase da água de líquida no solo para o gasoso na
110

atmosfera, à temperatura constante. Subtrai do solo e das superfícies evaporantes


em geral a energia necessária à evaporação da água, transportando-a para a
atmosfera. No fenômeno inverso, o calor latente de condensação fornece ao solo,
às plantas e outras superfícies de contato, a energia necessária à condensação da
água, retirando-a da atmosfera.
Quando a quantia de energia recebida por um corpo é maior do que a
que é cedida, em condição de déficit de umidade, verifica-se um desequilíbrio.
Sendo o corpo aquecido, eleva-se a energia interna de agitação (EIA). Quando
esta supera a ELM das moléculas da superfície evaporante (EIA >ELM), torna-se
suficiente para vencer as forças de tensão superficial que impedem as moléculas
de escapar para a atmosfera. Quanto maior a energia cinética média das partículas,
maior o número de moléculas que escapa por unidade de tempo, intensificando a
evaporação para a atmosfera.
Quando a quantia de energia consumida é igual à que é liberada, em
condição de saturação de vapor d’água, verifica-se um equilíbrio: o número de
moléculas que escapa do corpo evaporante é igual ao número de moléculas que é
capturado, para um mesmo intervalo de tempo.
A energia consumida é dada por:
Qa = m.cp. θ

Sendo: Qa – quantidade de calor absorvido para realizar a evaporação; m – massa


de ar; cp – calor específico; θ – variação da temperatura do ar.
A energia liberada é dada por:
Qe = m.L.q
Sendo: Qe – quantidade de energia liberada para realizar a condensação; L – calor
latente de condensação; q – variação da umidade específica.
O vapor d’água difunde-se ao nível da superfície evaporante na
forma de finas camadas laminares, sendo liberado na atmosfera, ao nível final da
camada limite, por difusão turbulenta, sob ação de pequenos turbilhões.
Em dias de ar calmo, sem ventos, forma-se um gradiente de umidade
absoluta, decrescente com a altura. Sob condição de ventos fracos e moderados
(massas advectivas) ocorre quebra do gradiente e a conseqüente homogeneização
do perfil de umidade atmosférica.

ua Vapor d'água atmosférico

us-a fluxo de calor latente

us superfície do solo

Reservatório de água líquida do solo


Figura 27 - Diagrama da transferência de energia via calor latente de vaporização, sendo
us – umidade do solo; ua – umidade da atmosfera; u – gradiente de umidade absoluta; us > ua.
111

O transporte de calor latente também está associado à difusão


turbulenta, pois o vapor d'água encontra-se difundido no ar atmosférico em
turbulência. O fluxo de calor latente de evaporação turbulenta é dado por:

fe = - ρ.Ke.L.dq/dZ

Sendo: fe – fluxo de calor latente por evaporação turbulenta (cal.cm-².s-1); ρ –


densidade do ar (1,129x 10-³g.cm-³ à p = 712 mmHg e t = 20ºC); Ke – coeficiente
de difusão turbulenta (cm-².s-1); L – calor latente de condensação (592,6 cal.g-1 à
t = 20ºC); dq/dZ – variação da umidade específica (g. cm-1).
Substituindo os valores de cada termo na equação anterior, temos
que o fluxo de vapor d’água (fe) está na razão direta do coeficiente de difusão
turbulenta (Ke) e da variação da tensão atual de vapor na atmosfera (de/dZ):

fe = - 0,58.10-³.Ke.de/dZ

3.1.2.1.d) Transferência do calor utilizado em sínteses e processos


bioquímicos

É a parcela da RL disponível que atua nos processos metabólicos


(fotossíntese, reprodução, desenvolvimento de organismos). Do ponto de vista
da microclimatologia, segundo Ometto (op. cit., p. 83) "essa parcela é tão
pequena que pode ser desprezada". Isso não significa, contudo, que os
processos biológicos são desprezíveis na determinação do clima urbano. Ao
contrário, eles jogam importante papel, como se mostra na Seção 3.2.

3.1.2.2. Umidade do ar

O termo umidade do ar expressa a quantidade de vapor d’água na


atmosfera. O seu teor varia em função da disponibilidade de água no local e da
energia térmica do meio.
O vapor d’água é um constituinte variável da atmosfera e um
elemento muito importante no estudo bioclimatológico. O processo evaporativo
origina na superfície do solo, nu ou coberto por vegetação, como resultado de
interações físico-fisiológicas com o meio ambiente e com os seres vivos.
A água no estado de vapor possui uma estrutura e um arranjo
molecular que permitem aos seus átomos interagir fortemente com as radiações
eletromagnéticas emitidas por corpos à temperatura ambiente. Tem-se, assim,
um absorvedor do espectro de emissão terrestre (radiação de ondas longas).
Quanto maior o teor de umidade do ar, maior será o valor da absorção, o que
eleva a energia interna das moléculas de vapor, expande o volume e reduz a
112

densidade da substância. Assim, o vapor d’água dissociado na atmosfera


movimenta-se com o ar, das regiões de maior pressão ou densidade para as de
menor, atuando como um equalizador da energia do meio.
A matéria constituinte da superfície do solo emite radiação de
acordo com a lei de Stefan-Boltzmann (v. Seção 3.1.2.1.a). O vapor d’água na
atmosfera absorve uma parcela da emissão radiante da superfície do solo (E s),
reemititindo-a em todas as direções, sendo parte em direção a terra, de acordo
com a expressão:

Ev =  ..Ta4(0,44+0,092√ea)

Sendo: Ev – reemissão do vapor d’água atmosférico; ea – pressão ou tensão


parcial do vapor d’água na atmosfera.
O balanço de ondas longas (Bol) em relação à temperatura radiante
da atmosfera, em dia limpo, pode ser estimado pela equação:

Bol = .Ta4(0,56 - 0,09√ea)

Além do vapor d’água, outros constituintes da atmosfera como o


gás carbônico, os sesquióxidos de enxofre e de fósforo, atuam como “gases
estufas”, bem como os aerossóis (partículas em suspensão com diâmetros de 10-
12μ), absorvendo a radiação terrestre de ondas longas, mantendo o meio mais
energético.

3.1.2.2.a) Tensão atual de vapor d’água (e)

A tensão ou pressão atual de vapor d’água (e) pode ser calculada


com o auxílio do psicrômetro de funda. Este aparelho possui dois termômetros,
o de bulbo seco e o de bulbo úmido. Pela leitura dos termômetros, se obtém os
dados para calcular a tensão atual de vapor, através da seguinte expressão:

e = e’s – γ (T – Tu)

Sendo: e – tensão atual do vapor d’água (mmHg); e’s – tensão de saturação à


temperatura do bulbo úmido; γ –constante psicrométrica (γ = 0,476 mmHg.ºC-1);
T – temperatura do termômetro de bulbo seco (temperatura do ar) (ºC);
Tu – temperatura do termômetro de bulbo úmido (temperatura da superfície
evaporante).

3.1.2.2.b) Umidade absoluta (U.A.)


113

A umidade absoluta (U.A.) é a relação que expressa a massa de


vapor d’água (mv), em nº de gramas, que existe em cada metro cúbico de
volume de ar estudado (V), num dado instante. Pode ser obtida pela equação:

288.e
U.A. =
273 + t

Sendo: U.A. – umidade absoluta (g/m³); e – tensão ou pressão atual de vapor


d’água no ar (mmHg); t – temperatura do ar (ºC).

3.1.2.2.c) Umidade de saturação (U.S.)

A umidade de saturação (U.S.) é a relação que expressa a massa de


vapor d’água (mv), em nº de gramas, que existe em cada metro cúbico de
volume de ar (V), em condição de saturação. Pode ser obtida pela equação:

288.es
U.S. =
273 + t

Sendo: U.S. – umidade de saturação (g/m³); es – tensão máxima ou de saturação


de vapor d’água no ar (mmHg); t – temperatura do ar (ºC).

3.1.2.2.d) Umidade relativa (U.R.)

A umidade relativa (U.R.) é a relação entre o teor em vapor d’água


que o ar contém – em umidade absoluta (U.A.) ou em tensão atual (e), e o teor
máximo que poderia conter – em umidade de saturação (U.S.) ou em tensão
máxima (es), à temperatura ambiente.
A U.R. pode ser determinada a partir da tensão atual de vapor,
através da equação:
U.R. = e 100
es
Sendo: U.R. – umidade relativa (%); e – tensão atual de vapor d’água (mmHg);
es – tensão de saturação de vapor d’água (mmHg).

3.1.2.3. Condensação do vapor d’água na atmosfera e precipitação

A condensação ocorre quando o vapor d’água da atmosfera sofre


um processo de resfriamento, liberando uma quantidade de energia que
corresponde ao calor latente de condensação, passando para o estado líquido.
114

A condição necessária para a condensação do vapor d’água na


atmosfera é a ocorrência dos núcleos de condensação. Estes são impurezas, com
diâmetros de 10-4 a 10-6 μ, higroscópicas ou não, que se encontram em suspensão
na atmosfera, formando superfícies úmidas de contato.
Os núcleos de condensação podem ser:
i) neutros – são formados por partículas de poeiras, não reagindo
eficientemente nas condições normais da atmosfera;
ii) moderadamente higroscópicos – são provenientes do sal marinho
e se distribuem em pequena quantidade nos constituintes da água da chuva, nas
nuvens e nos nevoeiros, dando início à condensação quando a U.R. alcança 97-
98%;
iii) higroscópicos – são lançados na atmosfera pelos efluentes
gasosos industriais, constituídos de óxidos de enxofre e fósforo, causando
grandes nevoeiros e iniciando a condensação quando a U.R. alcança em torno de
80%; na baixa atmosfera dos centros urbanos podem ser encontrados de 2000 a
5000 núcleos de condensação por cm³ de ar poluído.
A base física da condensação, a partir da existência dos núcleos de
condensação, é formada pelas condições meteorológicas: i) de aumento da
quantidade do vapor d’água no ar; e, ii) do resfriamento do ar úmido até a
temperatura do ponto de orvalho.
A condensação que ocorre sob a primeira condição meteorológica,
de aumento da quantidade de vapor d’água no ar, é denominada de “nevoeiro de
evaporação” (figura 28). Esse tipo de condensação se verifica quando uma
massa de ar frio se aproxima de uma superfície aquosa mais quente (superfícies
de lagos e rios). Nestas condições, nas madrugas de inverno, ocorre uma rápida
evaporação, na qual a tensão atual de vapor eleva-se à tensão de saturação do
vapor d’água na atmosfera.
massa de ar frio
T2
condensação (vapor visível)
T1 > T2 evaporação

T1 superfície líquida

Figura 28 – Diagrama da condensação do tipo “nevoeiro de evaporação”

A segunda condição meteorológica para a ocorrência de


condensação se verifica com o resfriamento do ar úmido até a temperatura do
ponto de orvalho, mantendo-se constante a tensão atual de vapor d’água no ar.
Neste caso, são quatro os processos de resfriamento:
i) resfriamento por contato, que se verifica quando uma massa de
ar úmida e quente passa sobre uma superfície terrestre ou aquática com
temperatura e umidade inferior à daquela. Neste caso há transferência de calor,
115

por condução, da nuvem para a superfície. Se a diferença térmica é grande, a


perda de calor é muito rápida. Estando o ar sem movimento de turbulência, o seu
resfriamento ocorre apenas numa estreita camada em contato com a superfície,
ocasionando o fenômeno de condensação superficial denominado “nevoeiro de
advecção”, com deposição de orvalho, névoa ou geada (figura 29).

T1 massa de ar quente e úmida

condensação superficial (deposição


T1>T2 condução de calor de orvalho, névoa ou geada)
Q

T2 superfície

Figura 29 – Diagrama da condensação do tipo “nevoeiro de advecção”

O transporte de calor por turbulência, que ocorre quando o ar está


em movimento, elimina o gradiente térmico, homogeneíza a densidade da
camada de ar e evita a condensação superficial.
ii) resfriamento devido à radiação solar, que decorre da gradativa
redução do teor de umidade e da temperatura das camadas de ar à medida que
elas ganham altitude. Cada camada irradia verticalmente mais calor para cima
do que para baixo. A camada de ar bem próxima à superfície do solo apresenta
valores máximos de umidade e temperatura. Quando a camada imediatamente
acima se encontra nas condições de céu límpido, seco e ventos amenos, ela sofre
rápido resfriamento em relação à camada superficial.

céu limpo e seco (UR2, T2) Q2


camada de
ar úmido
Q1 chuva fina
camada superficial (UR1, T1)

Figura 30 – Diagrama da condensação do tipo “nevoeiro de radiação”,


onde: (UR1 ,T1) > (UR2, T2); (Q2 > Q1)

À noite, a temperatura superficial do solo é mínima. Ao sofrer


inversão térmica, o ar de máxima umidade fica retido na camada superficial,
pelo fato do ar frio ser mais pesado. Esse resfriamento causa uma condensação
moderada e vagarosa do tipo “nevoeiro de radiação” (figura 30), formando
nuvens estratiformes próximas à superfície do solo, do tipo baixo stratus,
constituídas de minúsculas gotículas e bordos não delimitados e possibilitando
chuvas finas.
116

iii) resfriamento pela mistura de massas de ar saturado, que é


uma conseqüência do aquecimento diferenciado do globo pela radiação solar e
das diversas regiões que se apresentam com temperaturas também diferenciadas.
O ar atmosférico se movimenta das regiões de baixa energia ou temperatura,
onde a densidade e a pressão são maiores, para as de maior energia, onde a
densidade e a pressão são menores. Nesse deslocamento, as massas de ar e as
superfícies do meio trocam entre si as características termodinâmicas que
possuem.
Os diferentes tipos de nuvens existentes são o resultado do encontro
do vapor d’água originado na ecosfera com as correntes de ar. Quando um local
é invadido por um ar mais frio, têm-se as nuvens formadas por frentes frias, que
são: alto-stratus, formadas em altitude, estratificadas, cobrindo completamente o
céu com tênue camada; stratus-cumulus, evolução do tipo anterior, apresentando
bordos de pequenos flocos visíveis; cumulus, originária de convecção térmica,
formam grandes flocos de algodão com bordos bem delimitados e causam
intensas chuvas.
Quando um determinado local é invadido por um ar mais aquecido,
têm-se as nuvens formadas por frentes quentes: cirrustratus são estratificadas e
de grandes altitudes, acima de seis mil metros; alto-stratus, evolução do tipo
anterior, mais condensada nos seus níveis inferiores; nimbustratus, nuvens
escuras altamente condensadas e estratiformes, que possibilitam chuvas intensas.
iv) resfriamento por expansão adiabática, que é o mais importante
dos processos de condensação, no qual um volume de ar quente se desloca
verticalmente, sofrendo aumento de volume e expansão, devido à queda da
pressão, sem troca de calor com o meio circundante (figura 31).
À medida que ganha altura, o ar se resfria rapidamente, por
convecção térmica ou livre. O calor latente (de condensação, de
fusão/solidificação e de sublimação), produzido adiabaticamente no interior da
massa de ar, é transformado em trabalho, que promove a ascensão da massa.
A equação das adiabáticas para determinação da temperatura em
função da variação de pressão é:
T2 P2 0,288
=
T1 P1
Na ascensão da massa de ar atuam forças de coalescência que
aumentam o tamanho das gotículas de água. Quando se atinge a temperatura de
congelamento, as gotas começam a se solidificar, liberando calor de
fusão/solidificação. As gotas continuam a ganhar massa e a perder energia
interna. Após o congelamento de toda a massa de água, no nível mais alto de
sublimação, uma expansão posterior de ar saturado que se eleva fornece um
117

resfriamento ainda maior, com a sublimação do vapor. Formam-se gotas de


grande dimensão, com baixa energia interna e elevada energia potencial.
P2, T2

P2 < P1
T2 < T1
P1, T1

Fig. 31 – Esquema do processo de expansão adiabática

Sob a ação da gravidade, as partículas fazem o movimento


descendente, atritando-se com os níveis mais energéticos inferiores e
ocasionando uma evaporação rápida. Se no nível de condensação as partículas
tiverem massa suficiente para continuar a trajetória descendente, chegará até o
solo.
Os solos urbanos são cobertos por materiais de propriedades
térmicas responsáveis por diferentes absorções da energia solar, resultando em
aquecimento diferenciado do ambiente. Aquele meio mais aquecido ocasiona no
ar imediatamente acima, o abaixamento da densidade e o aumento do volume da
massa de ar. A ascensão dessa enorme “bolha”, mais energética que o meio
circundante e com menor pressão que a atmosférica, por convecção térmica,
desencadeia a expansão adiabática, conforme exposto acima. Esse processo
resulta em nuvens do tipo cumulus e cumulusnimbus ou trovoada, que produzem
“chuvas locais” moderadas a intensas.

3.1.2.4. Vento

A energia solar que alcança a superfície terrestre aquece


diferentemente cada região. As regiões mais aquecidas possuem sobre elas um
ar atmosférico com menor densidade. As regiões menos aquecidas possuem um
ar com maior densidade. Essa diferença de densidade faz com que o ar se
desloque daqueles locais de maior em direção aos de menor densidade. Essas
variações propiciam o aparecimento de gradientes horizontais de pressão
atmosférica.
É esse gradiente de pressão horizontal que origina uma quantidade
de movimento na massa de ar (Momentum). O vento é o ar em movimento, em
outras palavras, o momentum da massa de ar é o vento. Assim, o vento tem a
característica de se transferir aos obstáculos, causando-lhes danos proporcionais
ao momentum.
Em meteorologia, os aspectos gerais do vento junto à superfície do
solo são regidos por um sistema dinâmico, em que o movimento do ar é
118

determinado pelo gradiente horizontal de pressão e pela temperatura, bem como


pelos efeitos da rotação da terra (forças de Coriolis).
Em bioclimatologia, é dada ênfase aos problemas que envolvem
ventos muito próximos do solo, onde os efeitos das trocas de pressão podem ser
controlados e onde as forças de Coriolis podem ser desprezadas. Os fatores mais
importantes a serem considerados são as influências da fricção e do gradiente de
densidade ou de pressão.
No meio urbano, por causa da extrema variabilidade da natureza da
superfície sobre a qual o ar se desloca, numa camada de até cerca de cem metros
acima da superfície, o vento é primeiramente determinado pelo efeito do
gradiente de densidade local (vento local) e secundariamente pelo efeito do
gradiente de pressão de larga escala (vento regional).
As experiências realizadas em laboratório, usando tubos de vento,
mostram que a velocidade de um fluxo laminar contido em um tubo de paredes
lisas não é uniforme, variando da menor velocidade junto às suas paredes, à
maior que é no centro do tubo. Da mesma maneira, se um fluxo de ar for
introduzido paralelamente a uma grande superfície horizontal e polida, teremos
o perfil ilustrado na figura 32.
O perfil do fluxo de ar mostra que: i) a velocidade do fluxo (U),
relativo a qualquer superfície sólida e quando é aproximado dela, tende para
zero; ii) a velocidade máxima do ar ocorre acima da “camada limite” (ΔZ); iii)
há um amortecimento por atrito (τ) entre o ar e a superfície; iv) esse
amortecimento é transmitido laminarmente às camadas de ar adjacentes, até uma
altura limite, onde U = ƒ (Z).
Z
U Z U

ΔU ΔZ
Uo Zo

Fig. 32 – Perfil de velocidade U(Z) de um fluxo laminar, sendo: ΔU – gradiente de velocidade


horizontal e ΔZ – gradiente de velocidade normal ou vertical.

O amortecimento por atrito (τ) de um fluido qualquer, inclusive o


ar, é proporcional à razão de atrito ou gradiente de velocidade vertical – dU/dZ.
Sendo a proporcionalidade dada pelo termo μ , temos:

τ = μ . dU
dZ

Onde: μ – viscosidade dinâmica, uma propriedade de um fluido que mede a


resistência à distorção oferecida pelo fluido.
119

No perfil de velocidade do ar, o efeito da viscosidade na “camada


limite” é o de causar a difusão de momentum da camada de maior para a de
menor velocidade. Por isso, acima de superfícies sólidas, não são encontrados
altos gradientes.
O fluxo vertical de momentum, isto é, o transporte de uma
quantidade de movimento pelo ar, é ocasionado pelo amortecimento por atrito
(τ) que a massa de ar sofre com a fricção na superfície por onde se desloca:

τ = - ρ.Km.dU/dZ

Sendo: τ – amortecimento por atrito (g.cm-1.s-2); ρ – densidade do ar (g.cm-3);


Km – coeficiente de transporte turbulento (cm-1.s-2); dU/dZ – variação da
velocidade horizontal em relação à variação de altura (s-2).
De acordo com suas características básicas, o fluxo de ar pode ser
laminar ou turbulento. O fluxo laminar ocorre quando as camadas adjacentes do
fluido caminham regulares e equilibradas umas às outras e as linhas de fluxo dão
a direção a qualquer elemento do fluido.
O fluxo turbulento ocorre quando os elementos do fluido
apresentam uma flutuação em suas coordenadas de posição e de velocidade. O
fluxo horizontal próximo à superfície transfere no sentido vertical, calor, vapor
d’água, CO2 e momentum. No fluxo turbulento, a transferência de elementos do
fluido é de diversas vezes superior à ordem de grandeza da difusão molecular.
A turbulência pode ser forçada ou mecânica e livre ou térmica. A
turbulência forçada ou mecânica ocorre em condição de céu encoberto, de vento
advectivo (horizontal) e com um gradiente real de temperatura igual à razão de
queda adiabática seca (neutralidade atmosférica). O obstáculo quebra as linhas
de fluxo, surgindo diferentes pressões ao longo do obstáculo. A pressão máxima
ocorre na direção e no sentido do fluido e a mínima, na direção e no sentido
contrário. Essa condição provoca turbulência do ar próximo à superfície,
forçando sua elevação vertical.
U
u’ (+)

U
u’ (-)

Tempo
Fig. 33 – Representação esquemática de uma partícula de ar em fluxo turbulento, sendo: U – valor
médio da velocidade; u’ – valor médio da flutuação.
A turbulência livre ou térmica se verifica quando o gradiente
térmico real na atmosfera é inferior à razão de queda adiabática seca
(instabilidade atmosférica). As diferenças de aquecimento na superfície do solo
provocam ascensão da massa de ar por diferenças de densidade, causando a
120

convecção térmica (deslocamento vertical da massa de ar). Esse tipo de


turbulência aumenta com o aumento do gradiente térmico e diminui com o
aumento do gradiente de vento horizontal (advectivo).
As forças que atuam sobre uma parcela de ar turbulento são o
gradiente de pressão no sentido horizontal e o gradiente de momentum no
sentido vertical. A constância do amortecimento por atrito está em que a
variação da pressão com a distância horizontal é igual à variação de momentum
com a altura vertical, isto é:
dP dτ
=
dX dZ
A expressão acima mostra que: i) em uma parcela com
deslocamento constante, a variação da pressão com a distância horizontal
(dP/dX), é igual à variação do momentum com a altura vertical (dτ/dZ); ii) a
grandeza da transferência de movimento de uma massa de ar em deslocamento é
diretamente proporcional a força de gradiente a que essa massa está acionada.
Quanto maior o gradiente de pressão, maior o momentum.
O movimento dos ventos em uma cidade, em torno de uma
edificação ou equipamento urbano, se comporta de acordo com os conceitos
acima expostos. A velocidade dos ventos aumenta com a altura, atingindo as
diferentes partes da edificação com força variada.
A vegetação urbana, individualmente ou em conjunto, pode
proporcionar o controle do vento, dependendo da permeabilidade, da altura e da
largura da barreira vegetal e da combinação de faixas paralelas e perpendiculares
à direção principal do ar em movimento.
De acordo com Vieira (op. cit., p. 98-101) a classificação do efeito
da proteção do quebra-vento pode ser feita a partir da sua caracterização levando
em conta as noções de:
i) percentagem de “vazios visuais”, que é obtida pela
identificação das formas por trás dos obstáculos; uma barreira opaca tem uma
percentagem de “vazios visuais” praticamente nula;
ii) porosidade geométrica, que é obtida pela relação entre área
dos orifícios e área total da barreira vegetal; uma porosidade geométrica de 0,2
corresponde a uma barreira opaca, de percentagem de vazios visuais quase nula;
uma porosidade de 0,5 corresponde a uma barreira vegetal com 30% de vazios
visuais;
iii) permeabilidade da barreira vegetal, que é um conceito
importante para a eficiência do controle do vento. Quando o obstáculo (quebra-
vento) é muito denso (pouco permeável), praticamente toda força se desloca
para o alto, formando uma área de sub-pressão na sua parte posterior. Essa área
121

força o rápido fluxo de ar para baixo, gerando o turbilhonamento, o que diminui


o efeito protetor.

Fig. 34 – Diagrama de um quebra-vento denso e fechado desde o solo até copa das árvores, na
massa de ar advectiva (segundo Ometto, 1981, p. 229)

Uma barreira vegetal não muito densa, isto é, permeável, permite


um certo fluxo de ar pelo quebra-vento, amortecendo o turbilhonamento e
fazendo com que o fluxo continue com características laminares.
Segundo a literatura consultada, a permeabilidade ideal de uma
barreira vegetal gira em torno de 30 a 50% da intensidade do vento incidente,
expressando o valor que as folhas, galhos e troncos devem ocupar na área frontal
do obstáculo. Para valores superiores de permeabilidade, o efeito do obstáculo
fica bastante reduzido. Para valores inferiores, ocorre turbulência, conforme
exposto, anulando ou diminuindo o efeito protetor do quebra-vento.
Alem disso, a densidade deve ser homogênea. Árvores de copas
densas e altas forçam a passagem do vento sob as mesmas, aumentando a
velocidade do fluxo de ar. Daí, para os autores consultados, o ideal é um bosque
com extensão mínima de 15 metros. Ele deve ser formado por uma associação
de espécies vegetais e com vegetação subarbustiva sob as árvores.

Figura 35 – Diagrama da atuação de uma barreira vegetal com permeabilidade de 30%


(segundo Ometto, 1981, p. 230)

A transferência de momentum pode ocasionar sobre a vegetação


urbana a agitação dos troncos e dos galhos e conseqüente queda dos mesmos.
Além disso, a transferência do movimento das massas de ar pode vir associada à
alta energia das partículas constituintes e com baixo teor de umidade (massas de
ar quentes) ou pode vir associada à baixa energia das partículas constituintes
(massas de ar frias), produzindo efeitos sobre a estratificação térmica da massa
de ar e sobre o microclima urbano.
122

O “projeto urbano” deve escolher adequadamente o tipo, a forma, a


densidade e a quantidade de barreira vegetal para o controle do vento. As
árvores devem ser escolhidas de acordo com as características convenientes ao
objetivo desejado. Existe uma grande proporcionalidade entre a altura do
quebra-vento com o tamanho da zona de atenuação do vento, considerando os
graus de permeabilidade da barreira vegetal, bem como diferentes velocidades
do vento.

Tabela 12 – Atenuação média do vento entre 0 a 30 vezes a altura (h) da barreira vegetal,
considerando três graus de permeabilidade e três diferentes velocidades do vento
Valor médio atenuado Extensão da zona de atenuação
Grau de
(0 e 30 x h da barreira), em % (x h da barreira), em metros.
permeabilidade -1
Velocidade do vento (m.s ) Velocidade do vento (m.s-1)
(%)
4 6 8 4 6 8
30 45 44 37 47 50 53
50 29 27 23 46 42 40
70 17 14 2 34 31 28
Fonte: Ometto (1981, p. 230)

Como mostra os dados da tabela 12, uma barreira vegetal com 30%
de permeabilidade, quando submetida a um vento com velocidade de 8 m.s -1,
atenua em 37% essa velocidade, numa extensão de 53 vezes a altura da barreira;
com permeabilidade de 70%, a atenuação é de apenas 2% e a extensão de 28
vezes.

3.1.2.5. Evapotranspiração

A evapotranspiração é a perda associada de água pela evaporação


do solo e pela transpiração da planta. Os parâmetros meteorológicos de radiação
solar, insolação, temperatura do ar, umidade absoluta do ar e precipitação,
interagem com a planta e estimulam a evapotranspiração.
A evapotranspiração potencial (Ep) é a demanda máxima, em água,
de uma determinada cultura com intenso crescimento vegetativo, cobrindo
completamente um solo em condição de potencial matricial, condutibilidade
hidráulica solo-planta sem solução de continuidade e em relacionamento ideal
com o clima.
A evapotranspiração atual ou real (Er) é a perda de água que uma
cultura sofre num instante qualquer, independente do seu estágio de
desenvolvimento vegetativo e do meio. É extremamente variável e dependente
de muitos fatores.
De acordo com a literatura, diversos mecanismos fisiológicos
desenvolvidos pelas plantas estão relacionados ao controle da
evapotranspiração real. Sob condição de elevado potencial matricial do solo, de
tensão atual de vapor atmosférico e de radiação solar, as plantas reduzem a
123

atividade estomática e a fotossíntese. Plantas em crescimento mantém os seus


estômatos abertos, sustentando elevada taxa de respiração e de
evapotranspiração. Em condição de radiação solar de 80-90 calorias por metro
quadrado e de velocidade do vento superior a 2 metros por segundo, a
evapotranspiração supera a absorção de água pelas raízes das plantas. Neste
caso, as plantas fecham os estômatos, reduzindo a taxa de respiração, a razão
fotossintética e, de conseqüência, o crescimento.
No estudo da evapotranspiração, destacam-se os mecanismos
envolvidos na relação planta-solo. Após a incidência de uma chuva, o potencial
matricial do solo é de aproximadamente 0,006 atm. Neste momento, a perda de
água do solo para a atmosfera através da evaporação do solo é superior à perda
pela transpiração vegetal. Sucedendo à quebra da capilaridade do solo, quando a
camada superior do solo se apresenta com potencial matricial elevado, decorre a
brusca queda da evaporação. O sistema radicular localizado abaixo da região de
ruptura da capilaridade se apresenta com baixo potencial matricial. Esta
situação favorece a absorção radicular e o transporte hídrico pela planta. Resulta
que, depois de algum tempo após a precipitação, a transpiração vegetal suplanta
a evaporação pelo solo.
Na relação planta-atmosfera, o fator mais importante é a variação
de umidade absoluta do ar no espaço e no tempo. Os mecanismos envolvidos na
troca planta-meio dependem do número de estômatos por folha, da capa cerosa,
do tamanho, espessura e geometria das folhas.
Existem vários métodos de determinação da evapotranspiração. Os
métodos diretos são aplicados através de tanques: lisímetros – que fornecem a
Er, e evapotranspirômetros – que fornecem a Ep. A sonda de nêutrons é outro
método direto, que através de um contador fornece o teor de umidade do solo e
por leituras consecutivas, a perda contínua de água pelo solo (Er). O método
indireto, denominado gravimetria, mede Er por intermédio de amostragens do
perfil do solo.
Os institutos de pesquisa utilizam freqüentemente os modelos
matemáticos, confrontando os valores obtidos em laboratório com os parâmetros
meteorológicos. Estes modelos fornecem Ep através da expressão aero-
energética de Penmam, do método de Thornthwaite e dos coeficientes de ajuste
para o tanque classe A.
O método que permite uma abordagem do ponto de vista da
bioclimatologia e que será exposto a seguir é o da estimativa de
evapotranspiração real pelo balanço energético de Bowen.
Segundo Ometto (op. cit.) o equilíbrio térmico das superfícies
terrestres pode ser expresso pela equação do balanço de energia. A energia
líquida disponível ao sistema (RL+h) é utilizada na evaporação (E), no calor
sensível (S) e no aquecimento do solo (C), de acordo com a equação:
124

RL + h = E + S + C

Sendo: RL - a radiação líquida disponível; h – fluxo de energia calorífica


advectiva (vento horizontal); E - calor latente de evaporação; S - calor sensível
transportado da superfície; C - fluxo de calor no solo.
Como os valores de E e S são de difícil medição, utiliza-se um
artifício para a extrapolação destes valores com base na razão de Bowen ():
S
=
E
O calor latente ou transporte de vapor d’água (E) é governado pelo
déficit de saturação, isto é, pela diferença entre tensão de saturação (es) e tensão
atual do vapor d’água atmosférico (ea).
O calor sensível ou transporte de calor por difusão turbulenta (S) é
governado pelo déficit térmico, isto é, pela diferença entre a temperatura da
superfície evaporante (ts) e do ar (ta).
Considerando as equações dos fluxos de calor sensível e de calor
latente, nas condições de turbulência, temos que a razão de Bowen pode ser
expressa pela relação entre os respectivos fluxos:

Ks.Cp.P dT
=
Ke.L.0,622 de

Os fluxos verticais de E e S do tipo convectivo forçado, em


condições de atmosfera neutra, apresentam igualdade nos respectivos
coeficientes de transferência turbulenta (Ks = Ke), podendo ser cancelados na
equação anterior. Então, o quociente de Bowen fica sendo:

Cp.P dT
=
L.0,622 de

O primeiro termo da equação anterior é a constante psicrométrica


(γ), cujo valor é conhecido:
γ = (Cp.P) / L.0,622 => γ = 0,46 mmHg.ºC-1

E a razão de Bowen fica simplificada à expressão:

 = γ . (dT/de) =>  = 0,46(ts - ta)/(es - ea)


125

A variação da temperatura (ts – ta) e da umidade (es - ea) pode ser


obtida através de leituras instantâneas, várias vezes ao dia, de dois psicrômetros,
um instalado na cobertura vegetal e, o outro, no nível de maior densidade foliar
a 10-20 cm abaixo do primeiro.
Assim, a estimativa da evapotranspiração pela teoria do balanço de
energia pode ser obtida pela expressão:
RL - C
E=
1+

3.2. ESTUDO DA VEGETAÇÃO NA DETERMINAÇÃO DO CLIMA


LOCAL

O trabalho de Vieira (op. cit.) destaca que a vegetação interfere no


clima urbano através da oxigenação do ar, do controle da poluição e da fixação
da poeira; do controle da umidade e da precipitação; do controle da radiação
solar.
No meio urbano, sobretudo nas regiões adensadas, a vegetação
desaparece, deixando de contar com um importante fator de equilíbrio
microclimático. Em decorrência do desnudamento vegetal, o balanço de
radiação tende a apresentar prevalência de ondas longas (Bol), refletidas pelos
materiais construtivos de elevado albedo. Esse excedente do Bol contribui para o
aquecimento do ambiente intra-urbano.
A ecofisiologia vegetal nos traz conhecimentos sobre os
mecanismos de atividade da água, da fotossíntese e da luz nos processos de
interação entre o solo e a planta na determinação do clima urbano. Como se
sabe, na relação água-solo-planta há um continuum de movimentação da água do
solo, passando pela coluna vegetal, até a atmosfera, obedecendo a um gradiente
de potencial hídrico.
As forças propulsoras de ascensão da água na planta são a pressão
de raiz e a tensão-coesão-transpiração. A pressão de raiz é uma força causada
pela pressão hidrostática na superfície de absorção das raízes. Afirma Portes e
Castro (1998)73 que a pressão de raiz é muito pequena - de cerca de 2 atm ou 2
Bar ou 0,2 MPa - quando comparada com as 20 atmosferas necessárias para
elevar uma coluna d'água em plantas de altura mediana.
De acordo com esse autor, a ascensão da água ocorre em função da
força de tensão-coesão-transpiração. Esta força é determinada por três fatores
básicos: i) a força propulsora do sistema solo-planta-atmosfera; ii) o processo
de hidratação; iii) a água de coesão.

73
PORTES E CASTRO, T. A. A água no solo, na planta e na atmosfera. Goiânia: ICB/UFG, 1998. /n.p./.
126

A força propulsora é constituída pelo gradiente de potencial de


água que forma um continuum solo-planta-atmosfera; quanto menor a umidade
relativa do ar, comparativamente à concentração de vapor de água nos espaços
intercelulares das folhas, maior será a demanda evaporativa. A radiação solar
incidente sobre as folhas do dossel intensifica a transpiração, fornecendo calor
latente de vaporização para a mudança de estado da água de líquida para gasosa.
A continuidade da coluna líquida no interior da planta é mantida
pela atuação das forças de coesão e de adesão, que são devidas às pontes de
hidrogênio. Esta é uma importante propriedade da água cuja molécula é formada
:
por dois átomos de hidrogênio e: um de oxigênio, que formam entre si um ângulo
de 105°, proporcionando uma leve carga positiva para o lado do hidrogênio e
uma carga negativa igual para o lado do oxigênio. Resulta daí uma carga
molecular líquida neutra, mas entre as moléculas de água há atração
eletrostática, formando uma polaridade ou pontes de hidrogênio (figura 36). Esta
estrutura eletro-molecular confere à água importantes funções graças aos valores
relativamente elevados de calor específico e de calor latente.

Figura 36 - Ponte de hidrogênio - propriedade química responsável por importantes funções e


atividades da água (segundo Portes e Castro, 1998)

O processo de hidratação deve-se à força de adesão que une as


moléculas de água às paredes dos vasos do xilema, bem como ao pequeno
diâmetro do xilema e à tensão superficial da água, fazendo da capilaridade um
fator importante na ascensão da água (seiva bruta) na planta.
A coesão é responsável pela união das moléculas da água entre si.
Esta força denomina-se água de coesão que, segundo Portes e Castro (op. cit.), é
responsável pela prevenção ao processo de cavitação. Este processo ocorre sob
condição de extrema demanda evaporativa, quando a água é submetida a fortes
tensões. Então, o ar dissolvido na água pode desprender-se, formando bolhas e,
com isso, romper a coluna d'água.
Sintetizando: ocorre a passagem da água pela planta, fluindo do
solo, onde o potencial hídrico é maior, para a atmosfera, onde ele é menor, num
continuum de corrente a favor deste gradiente de potencial.
127

A análise dos processos envolvendo o equilíbrio dinâmico entre o


solo, a planta e a atmosfera, no contexto das condições de clima tropical,
necessita ser mais bem estudado. De acordo com a literatura consultada, a
evapotranspiração vegetal joga importante papel no ciclo hidrológico de regiões
de grandes massas continentais, como a região central da América do Sul.
A figura 37 ilustra o esquema do movimento da água pela planta, de
acordo com o gradiente do potencial hídrico entre o solo, cuja solução é muito
diluída, em relação à solução vascular da raiz, e a atmosfera que apresenta
intensa demanda evaporativa nas condições tropicais.

w (folha) = - 0,3 MPa

w(atm) = - 1,4 MPa

Nível do
solo
w (solo) = - 0,03 MPa
w (raiz) = - 0,05 MPa

Figura 37 - Continuum de água solo-planta-atmosfera seguindo um gradiente de potencial


hídrico, em que w solo > w atm; no exemplo acima, valores hipotéticos
(Adaptado de Portes e Castro, 1998)

De acordo com Larcher (1986) e com Ricklefs (1996)74, as maiores


reações de transformação de energia da vida são as que envolvem o processo
assimilativo e desassimilativo do carbono na fotossíntese e na respiração. A
única fonte de carbono assimilável pelas plantas é o CO2 atmosférico. A
concentração do gás carbônico no ar - de apenas 0,0003 atm -, é muito menor do
que o gradiente de pressão que puxa vapor de água da planta para a atmosfera.
Esta diferença de pressão que o CO2 e a H2O exerce no tecido de uma folha e no
ar circundante é responsável pela transpiração de mais ou menos 500 g de água
para cada grama de carbono assimilado pelas plantas.

74
RICKLEFS, R. A. A economia da natureza. Tradução Cecília Bueno e Pedro P. de Lima-e-Silva. 3.ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 1996. 502 p.
128

No processo de evapotranspiração ocorre a mudança do estado de


agregação da água, de líquido para gasoso no interior das câmaras
subestomáticas.
Associado ao fenômeno da transpiração, tem o calor latente de
vaporização que é uma importante propriedade da água. Esta propriedade
expressa a quantidade de energia requerida por unidade de massa de uma
substância, ao sofrer mudança do estado de agregação de líquido para vapor, à
temperatura constante.
A vaporização de 1 g de água a 20 °C consome 586 cal. Uma taxa
de transpiração de 0,1 mm de água por hora (1 g de H2O . dm-2 . h-1) corresponde
à remoção de calor da ordem de 0,1 cal. cm-2 de área foliar neste mesmo
período, o que equivale a 70 watts.m-2 .h-1 (Larcher, op. cit., p. 24-5).
A energia é fornecida gradualmente pela folha, que perde
temperatura, repercutindo no resfriamento da planta e conseqüentemente do
ambiente onde ela se encontra. Nos ambientes vegetados, onde o ar é carregado
de umidade, tem-se assim um importante regulador térmico, que absorve tanto a
radiação solar de ondas curtas como as terrestres de ondas longas.
Daí que superfícies cobertas com vegetação, ao consumirem calor
latente de vaporização, sem, no entanto provocar o aquecimento do ar, pois a
temperatura das folhas é inferior à do ar circundante, desenvolvem,
simultaneamente, a refrigeração e a umidificação do ambiente.
A transpiração vegetal é basicamente um processo de evaporação.
O que determina a intensidade de evaporação de água é o gradiente de pressão
de vapor da superfície de evaporação para o ar circundante (Kramer &
Koslowski, 1972, p. 341)75. A eficácia da taxa de transpiração aumenta com a
elevação da temperatura e a redução da umidade relativa do ar, bem como com o
suprimento hídrico e a velocidade do vento. Regiões com massas vegetais
transpirando intensamente contribuem para amenizar a temperatura do ambiente,
constituindo-se em verdadeiras "ilhas de frescor".
Tendo-se em vista a elevada taxa de transpiração que ocorre numa
árvore adulta, sobretudo nas condições de clima tropical quente e seco, constata-
se que cerca de 95% da água transpirada simplesmente passa pela planta, do solo
para a atmosfera, substituindo a que se perde por evaporação (Kramer &
Koslowski, op. cit., p.333-4). À relação entre produção líquida (que é a energia
acumulada na biomassa pela fotossíntese) e a transpiração, denomina-se
eficiência de transpiração. Na maioria das plantas, as eficiências de transpiração
são menores do que 2 gramas de produção liquida por quilograma de água
transpirada (Ricklefs, op. cit., p. 89).
Os autores consultados citam que em povoamentos de diversas
espécies, os valores de transpiração diária média podem variar da ordem de 2,35

75
KRAMER, P. J. & KOSLOWSKI, T. Fisiologia das árvores. Lisboa: Fund. Calouste Gulbenkian, 1972. 756 p.
129

a 5,3 milímetros, equivalentes a 23.500 a 53.000 litros de água por hectare


(Kramer & Koslowski, p. 361); e que 1 hectare de bosque pode produzir 5.000
toneladas de água por ano (Izard & Guyot, apud Vieira, op. cit., p. 82-3).
Estes dados ilustram a participação das plantas no ciclo hidrológico,
ao realizar o bombeamento da água do solo para a atmosfera. Além de responder
pela umidificação do ar, a evaporação das massas vegetais responde também
pela alteração de outros elementos do microclima.
As áreas cobertas com vegetação apresentam características
higrométricas satisfatórias em relação aos ambientes desnudos e edificados. A
quantidade de água existente na atmosfera influencia na dinâmica do clima
local, quanto à condensação e precipitação, bem como na absorção da radiação
solar e terrestre.
Nos estudos de padrões globais de produção primária encontram-se
as estimavas de que os povoamentos florestais na Europa Central sintetizam
diariamente o equivalente a 75-300 kg de glicose por hectare, além da
quantidade que é utilizada na respiração; de que a fotossíntese líquida relativa a
um período vegetativo é da ordem de 21,8 a 77 toneladas por hectare; de que as
plantas produzem 16,6 x 109 toneladas de carbono orgânico por ano, dos quais
70% são produzidos pelas árvores (Kramer & Koslowski, op. cit., p. 71).
A produção vegetal terrestre é máxima nos trópicos úmidos, graças
à combinação favorável de intensa luz solar, temperatura alta e abundante
precipitação. Nos ecossistemas de floresta tropical é de 1.800 g.m-².ano-1; numa
savana é de 700 g.m-².ano-1 (Ricklefs, op. cit., p. 90-1) .
Podemos calcular, a partir dos dados citados, que as plantas,
principalmente as árvores, liberam anualmente na atmosfera uma quantia da
ordem de 8,3 x 1012 toneladas de água. Nas condições dos trópicos úmidos e dos
cerrados, podemos estimar uma liberação anual entre 350 e 900 kg. m-².
Nos climas tropicais, de acordo com o suprimento hídrico e com a
temperatura do ar, as árvores desenvolvem intensas taxas de transpiração. O
bombeamento de vapor d'água pela vegetação, conseqüentemente, é
fundamental na manutenção dos níveis satisfatórios de umidade relativa do ar.
As árvores do cerrado, em geral, têm raízes profundas que atingem
o lençol freático. No manejo das bacias hidrográficas, inclusive do meio urbano,
a cobertura vegetal do solo contribui para a reposição do freático que alimenta
os mananciais.
Larcher (op. cit.) afirma que a troca de energia entre as plantas e o
meio ambiente é determinada por fatores físicos e fisiológicos. Os fatores físicos
(radiação, insolação, velocidade do vento, etc.) influenciam na condução e
convecção de calor sensível (QH). Os fatores fisiológicos exercem controle na
evaporação ou condensação de calor latente (QE). O QE representa o fluxo de
energia consumida na mudança de fase da água para vapor, sendo negativo
130

quando a planta transpira, e positivo quando o orvalho ou a geada se condensa


nas folhas das árvores.
O efeito refrescante da evaporação pode ser calculado pela taxa de
transpiração:
QE =  . 

Sendo:  - quantidade de água evaporada;  - calor latente ou de vaporização da


água ( = 2,4-2,5 kJ . g-1 H2O).
A eficácia da taxa de transpiração aumenta com a elevação da
temperatura do ar, a redução da umidade relativa e com um bom suprimento de
água. Se a transpiração é acelerada pelo vento, ela extrai tanto calor que as
folhas podem tornar-se mais frias que o ar.
A evapotranspiração é o fenômeno associado à perda conjunta de
água do solo pela evaporação e da planta pela transpiração. Dias (1992a) 76 relata
que as plantas lenhosas do cerrado mantêm seus estômatos abertos transpirando
livremente, mesmo no período da seca, graças às suas raízes profundas que
garantem o acesso à água. Mas que, mesmo estas plantas, interrompem o
crescimento nas estações de pouca precipitação, evidenciando estresse hídrico
moderado.
Estudos de comunidade realizados por Miranda & Miranda
77
(1992) revelaram uma redução da taxa de transpiração da ordem de 42% na
estação seca, quando a demanda evaporativa é elevada, principalmente pela
resistência estomática do dossel. Assim, segundo estes autores, a vegetação
nativa do cerrado é fisiologicamente adaptada às variações climáticas e sazonais
do Brasil Central. Daí ressaltam os autores supra, a manutenção da cobertura
vegetal dos solos, com essências nativas, é essencial as microbacias de captação,
para garantir o abastecimento de água tanto para a população, para as atividades
econômicas, como também para os ecossistemas da região.
Em condição de clima tropical, há uma estreita inter-relação entre
solo e vegetação, mais do que nos subtrópicos e regiões temperadas. Afirmam
Kramer & Koslowski (op. cit.), complementados por Detzel (1992)78 que, com
adequado suprimento hídrico no solo, conforme já citado, uma árvore isolada
pode transpirar 400 litros d’água por dia, cujo efeito térmico equivale ao
funcionamento diário de 5 condicionadores de ar com capacidade de 2500
quilocalorias cada. Dessa maneira, a evapotranspiração das massas vegetais

76
DIAS, B. F. S. Cerrados: uma caracterização. In: FUNATURA. Alternativa de desenvolvimento dos cerrados -
manejo e conservação dos recursos naturais renováveis. Brasília: IBAMA, 1992a, p. 11-25.
77
MIRANDA, A.C. & MIRANDA, H. S. Estresse hídrico. In: FUNATURA: Alternativa de desenvolvimento
dos cerrados - manejo e conservação dos recursos naturais renováveis. Brasília: IBAMA, 1992, p. 30-34.
78
DETZEL, V. A. Arborização urbana: importância e avaliação econômica. In: ENCONTRO NACIONAL
SOBRE ARBORIZAÇÃO URBANA, 4, 1992, Vitória. Anais... Vitória: SBAU, 1992, p. 39-52.
131

urbanas proporciona um efeito de refrigeração e de umidificação do ar


importante na qualidade ambiental de vida.
A vegetação interfere no controle da radiação solar por intermédio
das propriedades termodinâmicas da matéria vegetal, de quatro modos: na
reflexão; na absorção; na transmissão; e na emissão. Ao contrário do solo, a
vegetação é permeável às radiações solares, apresentando uma refletividade que
depende do comprimento de ondas da radiação (tabela 13).
Em relação às superfícies naturais existentes no globo, Geiger (op.
cit.) afirma que a única que tem uma refletividade tão baixa quanto uma
cobertura de floresta é o solo escuro e molhado. Por sua vez, a capacidade de
absorção da radiação solar de uma massa vegetal depende da densidade de
cobertura, do desenvolvimento das folhas e das áreas de folhagens voltadas para
o sol.
Tabela 13 – Variação do coeficiente de reflexão pelas plantas
em função do comprimento de onda da radiação solar
Comprimento
Intervalo espectral Albedo (%)
de onda (μm)
Ultravioleta < 0,38 < 10
Luz visível 0,38-0,78 8-20
Infravermelho > 0,78 > 35
Fonte: Geiger (1980, p. 268-9).

A transmissão é a percentagem de radiação solar incidente que a


folha transmite. Ela é inteiramente difusa, ao passo que a radiação refletida pode
ser em parte difusa e em parte especular. Por isso, a sombra de uma árvore que
transmite a radiação de forma difusa, difere da de um muro que bloqueia o sol e
apenas reflete a radiação.
A transmissão depende das variações de: i) altitude solar; ii) ângulo
de incidência dos raios solares; iii) transparência do céu; iv) densidade da copa
do vegetal; v) variação sazonal (estações do ano).
Quanto à propriedade da emissão, as plantas absorvem o calor
emitido pelo solo durante o dia e, à noite, emite o calor para a atmosfera de
forma lenta e gradual. Numa área desnuda, o solo emite calor rapidamente para
a atmosfera. Por isso, a temperatura abaixo da cobertura vegetal se apresenta,
por um longo período, mais fria durante o dia e, mais quente à noite, do que
numa área desprotegida.
No balanço de radiação de uma árvore, segundo Sattler (1992)79, de
10 a 25% da fração interceptada é refletida, e o restante, ou é absorvida pela
árvore para fins de transpiração ou fotossíntese, ou se transforma em calor
aquecendo o ar circundante. Este aquecimento, no entanto, é pouco significativo,

79
SATTLER, M. A. Arborização urbana e conforto ambiental. In: ENCONTRO NACIONAL SOBRE
ARBORIZAÇÃO URBANA, 4, 1992, Vitória. Anais... Vitória: SBAU, 1992, p. 29-38.
132

não chegando a afetar o efeito maior da vegetação sobre o microclima de


abrandamento da temperatura do ar.
A razão de Bowen () fornece uma boa estimativa da relação entre
calor sensível e calor latente existente num dado ambiente. Esta relação depende
da densidade do revestimento vegetal e da disponibilidade de água. Durante o
dia grande parte da energia proveniente dos raios solares é consumida pela
evaporação, nas imediações de grandes superfícies aquáticas ou de comunidades
vegetais com intensa respiração. Por isso, o quociente de Bowen aumenta de
uma área florestada para uma área desnuda. Revestimentos vegetais densos
melhoram o clima e as condições de vida da ecosfera (figura 38).
Floresta Prado Campo arenoso

E S E
S S E
C
C P C+P
Figura 38 - Diagrama das trocas energéticas em três diferentes ecossistemas, sendo fluxos de
calor: S – sensível; E – evaporação; C – condução pelo solo; P – energia armazenada na
fitomassa (segundo Larcher, 1986, p. 31).

Tabela 14 – Balanço térmico de acordo com o uso do solo


Rad. Líquida (W.m- Fluxo de calor (W.m-²)
Uso do solo Albedo (%)
²) Sensível - S Latente - E
Floresta decídua 18 53 13 39
Solo arável, úmido 20 50 08 42
Solo arável, seco 20 50 15 35
Fonte: Ayoade (1991, p. 316).

O quociente de Bowen é um indicador que pode expressar a


alteração do balanço térmico de um ecossistema, inclusive o urbano, promovido
pela ação antropogênica. As alterações dos parâmetros termodinâmicos,
decorrentes da transformação do uso do solo de florestal para agrícola, são
mostradas na tabela 14. Como se extrai desta tabela, o quociente de Bowen salta
de 0,33 da floresta decídua, para 0,43 num solo arável seco. Neste, obviamente,
prevalecem condições desconfortáveis de vida.

3.3. ESTUDO DA INTERAÇÃO HOMEM - CLIMA NO MEIO URBANO

3.3.1. Introdução

A gestão do espaço público e o conseqüente tratamento dado à


paisagem urbana são um importante diferencial das cidades quanto à qualidade
ambiental de vida. Aquelas com planejamento urbano-ambiental moderno, ao
invés de consumirem seus espaços públicos, desenvolvem mecanismos de
133

gestão para articulá-los com as áreas particulares e destinadas ao comércio, à


indústria e à moradia.
O controle e a melhoria do clima urbano são as razões pelas quais a
gestão urbano-ambiental desenvolve uma abordagem da paisagem urbana como
um componente que perpassa a questão de domínio do espaço urbano - se
público ou particular. Vários são os exemplos de cidades, como Stuttgart, na
Alemanha e Dayton, nos EUA, que reuniram esforços do poder público e da
iniciativa particular para desenvolver projetos urbanos, com base na recuperação
dos fundos de vale e no reflorestamento e implantação de parques com o
objetivo de resolver problemas de clima. Hoje estas cidades colhem os frutos
destas iniciativas com a melhoria da qualidade de vida de seus moradores.
Paradoxalmente, no nosso país, a regra geral é o Poder Local,
através das Prefeituras, principalmente, realizar obras de impermeabilização nos
espaços livres e nos fundos de vale. Nestes encontramos construções de vias
marginais, de canalizações dos mananciais, de favelas e de condomínios
habitacionais para a população de baixa renda, construídos numa política de
“desfavelização” urbana.
Os fundos de vale geralmente constituem as drenagens das bacias
hidrográficas urbanas. Eles têm importância ambiental, pois neles estão,
potencialmente, as mais importantes áreas permeáveis e de cobertura vegetal
urbana. Os fundos de vale convertem-se, ainda, num importante corredor de
espaço aberto, permitindo o fluxo do ar fresco, a melhoria da ventilação natural
e a remoção dos poluentes. Além disso, os fundos de vale são um espaço
potencial para a implementação de políticas de gestão urbanas, através do
plantio de árvores com o objetivo colaborar para a redução do efeito “ilha de
calor”, a canalização das brisas térmicas e a criação de um microclima para
captar e reduzir a absorção de calor e aumentar ou diminuir a velocidade do
vento, conforme o necessário.

3.3.2. O clima urbano e seu estudo: a microclimatologia

Geiger (op. cit.) diferencia os conceitos de clima e microclima em


função das unidades de superfícies abrangidas pelos fenômenos meteorológicos.
O clima abrange a totalidade dos fenômenos meteorológicos isolados de um
dado local ou estados do tempo, compreendendo situações médias, além dos
fenômenos extraordinários.
O microclima abrange os fenômenos do clima de áreas muito
reduzidas, que apresentam nas proximidades do solo diferenças entre todos os
elementos meteorológicos, bem como diferenças horizontais em pequenas áreas,
causadas pelas diversas características do solo, como umidade, declividade, tipo
e altura da vegetação.
134

A estrutura microclimática do espaço aéreo se estende da superfície


da terra até uma altura onde os efeitos característicos da superfície não mais se
distinguem do clima geral local (meso ou macroclima). A indicação na literatura
é que as condições microclimáticas desaparecem no nível compreendido de, no
mínimo, dois metros convencionalmente, a até geralmente, quatro vezes a altura
das superfícies estudadas.
Monteiro (1976)80 estabelece os conceitos de espaços climáticos de
mesoclima, topoclima e microclima em correspondência ao grau de urbanização,
respectivamente, da cidade de grande porte e de pequeno porte e, dentro da
cidade, ao setor de habitação (tabela 15).

Tabela 15 – Algumas unidades climáticas e os espaços urbanos correspondentes


Espaços climáticos Unidades de superfície Grau de urbanização
2
Mesoclima Centenas de km Cidade grande; bairro ou subúrbio de metrópole
Topoclima Dezenas de metros2 Pequena cidade; fácies de bairro/subúrbio de cidade
Microclima Metros2 Grande edificação; habitação; setor de habitação
Fonte: adaptado de Monteiro (1976, p. 109).

A microclimatologia ou ecoclimatologia é o estudo do clima da


camada de ar junto ao solo. Quanto mais se aproxima do solo, maior é o atrito,
menor a velocidade do ar e conseqüentemente a mistura de ar; a superfície do
solo absorve a luz e irradia calor, constituindo-se em fonte quente, às vezes, ou
em fonte fria, outras vezes, em relação ao ar próximo. A superfície do solo é
também fonte de água, de poeira e de gases (Geiger, op. cit.).
O clima urbano é “um sistema que abrange o clima de um dado
espaço terrestre e sua urbanização” (Monteiro, op. cit., p. 95). Para ecólogos,
como Odum (1988)81, a cidade é um sistema incompleto ou heterotrófico,
dependente de grandes áreas externas para obtenção de energia, água e outros
materiais, apresentando as características de: i) intenso metabolismo por unidade
de área; ii) grande necessidade de entrada de materiais; iii) saída de produtos
poluentes.

3.3.3. Os efeitos da urbanização sobre os elementos do clima

O urbanismo é uma ciência que avançou bastante neste século. Há a


compreensão de que o maior impacto humano sobre o clima ocorre nas áreas
urbanas. De acordo com Detzel (op. cit.), Vieira (op. cit.) e Cavalheiro (1991) 82,
o clima urbano apresenta várias alterações climáticas em relação ao entorno não
urbanizado.

80
MONTEIRO, C. A. F. Teoria e clima urbano. São Paulo: IGEO/USP, 1976, 181 p. (Série Teses e
Monografia). Tese (Livre-Docência) USP, São Paulo, 19[--]. 109 p.
81
ODUM, E. P. Ecologia. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1988.
82
CAVALHEIRO, F. Urbanização e alterações ambientais. In: TAUK. S. M. Análise ambiental – uma visão
multidisciplinar. São Paulo: Ed. UNESP, 1991, p. 88-99.
135

A temperatura média urbana é de 0,5 - 1,5 ºC mais alta do que a da


zona rural, por causa dos elevados índices de absorção e de reflexão da radiação
solar. Os ambientes construídos são ricos em superfícies refletoras, como
asfalto, espelhos, calçadas e cerâmicas, que aumentam a temperatura do ar com
a conseqüente redução da umidade relativa. As edificações de diferentes alturas
geram efeitos de reflexão da radiação solar incidente, aprisionando as radiações
de ondas longas. Os efeitos térmicos causados pelas propriedades
termodinâmicas dos materiais construtivos, pela alta densidade das edificações,
pela reduzida evaporação decorrente da canalização das águas pluviais e/ou do
pequeno índice de área verde, além da produção de calor antropogênico,
respondem pelo fenômeno das “ilhas de calor” no meio urbano, como será
adiante exposto.
Na cidade, a umidade relativa é menor tanto no inverno (2%) como
no verão (8-10%). Apesar da baixa umidade, as precipitações urbanas são, em
média, 5-10% maiores e as tempestades são mais intensas. A poluição
atmosférica é 5-25% maior, com 10 vezes mais partículas sólidas em suspensão
na atmosfera urbana do que na zona rural. A poluição do ar provoca um
aumento dos núcleos de condensação, a formação de nuvens carregadas do tipo
cumulus e nimbus e um aumento do espectro do tamanho das gotas de chuva.
A reduzida massa vegetal urbana determina baixa taxa de
evaporação e umidificação do ar. Ao mesmo tempo, a elevada densidade
construtiva, que exerce o efeito da rugosidade e o efeito de obstáculo, altera a
movimentação das correntes de ar. Daí que a média de vento é 10-30% de
menor ocorrência, a turbulência é maior e a incidência das calmarias também é
maior na cidade em relação ao campo.
Outro importante fator de mudança climática urbana é a produção
artificial de calor por causa: i) do aquecimento em geral causado pelo
metabolismo e pela combustão decorrente das atividades humanas; ii) das
propriedades térmicas dos materiais construtivos urbanos que absorvem e
armazenam radiação durante o dia e liberam-na à noite.
Ayoade (op. cit.) observa que, em comparação com a radiação solar
líquida na superfície da terra de 160 W.m-2, as fontes de calor antropogênico
assumem valores da mesma magnitude que as fontes naturais (tabela 16).

Tabela 16 – Fontes e magnitudes do calor antropogênico


Fontes artificiais de energia Magnitude (W.m-2)
Produção de energia Sobre o globo 0,016
distribuída em 1970 Sobre os continentes 0,054
Calor das maiores cidades No verão 20-40
dos EUA No inverno 70-120
Fonte: Ayoade (1991, p. 318)
136

Segundo os autores pesquisados, o principal efeito do calor


antropogênico é sobre o clima local, muito embora estes aumentos de
temperatura possam também contribuir para o efeito estufa regional e global.
As alterações do balanço de energia no espaço urbano modificam os
estados de todos os parâmetros atmosféricos - cujo conjunto representa o clima -
gerando camadas atmosféricas urbanas e locais particulares, respectivamente, a
"Camada limite urbana" (Urban boundary layer) e a "Camada de cobertura
urbana" (Urban canopy layer), conforme classificação dada por Oke (1987)83 e
internacionalmente aceita (figura 39).

Figura 39 - Representação esquemática da atmosfera urbana (segundo Mendonça, 1995, p. 15)

A "Camada limite urbana" engloba toda a atmosfera alterada pela


estrutura, morfologia e função urbanas; portanto, ela é definida por fenômenos
de meso-escala (isto é, em escala regional ou ainda local, englobando áreas de
até uma centena de quilômetros quadrados). A "Camada de cobertura urbana"
compreende a atmosfera do espaço intra-urbano, sendo definida por fenômenos
de micro-escala (isto é, áreas pequenas, ao nível de uma rua, um fundo de vale,
uma praça ou um bosque).
As cidades americanas, no geral, foram concebidas segundo o
modelo funcional de Wright. O zoneamento urbano é realizado em função dos
centros de negócios (CBD), que possuem localização privilegiada e são dotados
de toda infra-estrutura disponível. Conseqüentemente, as funções urbanas
(habitar, locomover, trabalhar e recrear-se) giram em torno dos CBD
implantados. Como o adensamento urbano é determinado pela estrutura e pela
fisiologia urbanas, a tendência geral é de que as regiões centrais se apresentem
com maior densidade, decaindo em direção à periferia.
Assim, nas cidades geridas segundo o modelo funcional, os
espaços-livres e por conseqüência as áreas verdes são substituídas pelas
edificações que maximizam o uso do solo de acordo com as leis de mercado,
não recebendo, portanto, tratamento prioritário na gestão do espaço urbano.

83
OKE, T. R. Boundary Layer Climates. 2nd ed. Methuen: London and New York, 1987. 372p.
137

A substituição da cobertura natural do solo por edificações


contendo materiais de constituição diversa tem como conseqüência a alteração
radical do balanço da radiação solar no meio intra-urbano.
No meio natural, o balanço da radiação é formado pelo equilíbrio
entre as radiações de ondas curtas (incidentes diretas e difusas) e as de ondas
longas (refletidas e rerradiadas). A manutenção deste equilíbrio é exercida
preponderantemente pela cobertura vegetal do solo.
No meio urbano, por seu turno, sobretudo, nas regiões adensadas, a
vegetação desaparece, deixando de cumprir este papel de equilíbrio. Em
decorrência, o balanço de radiação tende a apresentar prevalência de ondas
longas, refletidas pelos materiais construtivos da cidade. O asfalto, por exemplo,
apesar do baixo albedo, em virtude da alta capacidade de absorção da energia
radiante do sol, torna-se um emissor de ondas longas, aquecendo o meio intra-
urbano. Já as florestas e as superfícies cobertas por água possuem baixo albedo e
elevada capacidade de absorção, mas atuam na refrigeração e umidificação desse
meio.
A cidade apresenta uma enorme variedade de tipos de "cobertura da
superfície urbana" (sky view factor, segundo Oke, op. cit.). A natureza térmica e
a rugosidade do material que compõe a "camada limite" de interface - horizontal
ou vertical - entre o solo e a atmosfera, determina o modo de propagação da
energia no ambiente urbano, bem como se constitui num fator de dissipação,
desvio, intensificação ou geração dos movimentos do ar, podendo dispersar ou
concentrar a poluição, melhorar ou piorar a qualidade do ar. Portanto, a
“cobertura da superfície urbana” e a natureza da "camada limite" contribuem
para o equilíbrio do balanço de energia e para o conforto urbano.
O calor é a energia térmica em trânsito, obedecendo a um gradiente
térmico, a favor de temperaturas decrescentes (v. Seção 3.1.2.1). Ocorre
interação de calor do ar com a superfície do solo por condução e por convecção.
A condução é a transmissão de energia térmica através das partículas que
constituem o meio de propagação. O fluxo de calor é proporcional ao coeficiente
de condutibilidade térmica do material construtivo dos edifícios e da
pavimentação.
A convecção é o processo de propagação de calor através de
movimento ascendente ou descendente de massas de um fluido (líquido, gás ou
vapor), devido à diferença de densidade provocada pela existência de um
gradiente térmico.
No meio urbano, em dias normais, as partículas do vapor d'água do
ar poluído - quentes e menos densas - da camada limite formam correntes de
convecção ascendentes, forçadas pelo movimento descendente das partículas
mais frias e mais densas do ar puro proveniente da atmosfera rural (figura 40).
Destacam-se duas propriedades da água que se relacionam com o
processo convectivo de propagação de energia. O calor específico (c) é a
138

quantidade de energia requerida para aumentar a temperatura de uma unidade de


massa de uma substância em 1°C.

DURANTE O DIA DURANTE A NOITE

campo cidade campo cidade

Figura 40 - Princípio térmico das correntes de convecção

O valor de c para a água pura é de 1 cal/g.°C, isto é, uma caloria é


requerida por 1 g de água para elevar a sua temperatura em 1°C, sendo maior do
que para qualquer outra substância, exceto amônia líquida. Esta propriedade é o
resultado do arranjamento das moléculas de água que permitem os átomos de H
e O vibrarem livremente, como se fossem íons livres. Assim elas podem
absorver grande quantidade de energia sem grande aumento da temperatura.
Por exemplo, em relação ao calor específico do solo (c = 0,2
cal/g.°C), uma certa massa de água necessita de cinco vezes mais quantidade de
calor para subir de 1°C a mesma massa de terra. Da mesma forma, para sua
temperatura cair de 1°C a água tem de ceder mais calor.
Por isso, regiões cercadas por muita água ou com grandes massas
vegetais, transpirando livremente e umidificando a atmosfera, apresentam clima
mais ou menos estável: nem o verão é muito quente, nem o inverno é muito frio.
Outra propriedade da água é o calor latente de vaporização, já
explicada na Seção 3.1.2.1.c. Nos ambientes urbanos, onde as superfícies se
mantêm cobertas por massas de vegetação e o ar carregado de umidade, tem-se
um importante regulador térmico, que absorve tanto a radiação solar de ondas
curtas como as terrestres de ondas longas.
Para o clima urbano, uma conseqüência das propriedades da água
acima citadas é a manifestação do fenômeno das brisas térmicas que sopram
entre a cidade e o campo, gerados pela diferença de temperatura. Durante o dia,
a temperatura da cidade, - de superfície impermeabilizada com relativa baixa
inércia termal, - aumenta mais rapidamente do que a do campo, - de superfície
mais úmida e verde com elevada inércia termal, - promovendo a ascensão do ar
quente sobre ela e o ar frio é aspirado do entorno rural para substitui-lo.
A Inércia termal (I) é conceituada como a capacidade que um
material possui em resistir a mudança de temperatura. Ela depende da
condutividade térmica (k), densidade (d) e do calor específico (c), conforme
expressão dada por Rosa (op. cit., p. 54):
139

I=1/k.d.c

De acordo com Mendonça (op. cit.), as diferentes superfícies


reagem diferentemente ao processo radiativo e possuem, conseqüentemente,
distinção de albedo; este, por sua vez, vai influenciar diretamente na formação
da temperatura da camada de ar mais próxima.
O revestimento das superfícies e o seu teor em umidade influenciam
diretamente no balanço de energia e na caracterização do ar da camada-limite,
pois superfícies úmidas protegidas por cobertura vegetal possuem baixo albedo e
elevada inércia termal em relação àquelas que são desnudas e secas (figura 41).

1- rochas e solos;
2- água;
3- vegetação;
4- terreno úmido

Figura 41 - Variação das diferentes superfícies ao processo radiativo e sua influência na


temperatura da camada-limite (segundo Mendonça, 1995, p. 107)

Quando a ilha de calor urbano é mais pronunciada, inicia-se um


padrão centrípeto de fluxo do ar desde as áreas mais frescas da periferia da
cidade para o centro mais quente. O ar sopra para dentro, a poucos metros por
segundo, até que seja diminuído ou bloqueado ou aquecido; então se eleva,
esfriando gradualmente com a altura e descendo novamente sobre o campo. Daí
a importância dos corredores de espaço aberto no meio intra-urbano para
permitir a circulação de ventos que melhoram as condições urbanas (figura 42).

Figura 42 - O ciclo diário das brisas térmicas no meio urbano, guiado pelo princípio das
correntes de convecção, através dos corredores de vento.

A ilha de calor urbano é uma característica universal do clima


urbano, consistindo num contraste de temperatura entre a área urbana e a área
rural circunvizinha. A diferença de temperatura (tu-r) é com freqüência, de 5
°C, podendo atingir até 12°C numa noite clara de verão.
140

De acordo com Mendonça (op. cit.), os estudos de casos de


climatologia urbana brasileira constataram, na sua maioria, fortes alterações nos
ambientes climáticos das cidades correlacionadas com a deterioração ambiental
e a queda da qualidade de vida urbana. A causa principal deste fenômeno está na
intensa urbanização. Das dez maiores cidades brasileiras pesquisadas por esse
autor, Goiânia experimentou a mais elevada tendência de aumento da
temperatura atmosférica, de 0,0037 graus por mês e de 0,048 graus por ano,
contra o segundo maior aumento de 0,0022 graus/mês e 0,020 graus/ano
apresentado pela cidade de São Paulo.
De acordo com a formulação de Oke (op. cit.), pode-se esboçar que,
sob condições meteorológicas de céu limpo e ventos fracos, que caracterizam
grande parte do estado do tempo na região do Planalto Rebaixado de Goiânia, a
ilha de calor é mais pronunciada junto à área mais expressiva de urbanização
("pico", de áreas mais quentes), coincidindo com o CBD. A ilha de calor urbana
vai decaindo em direção à fronteira urbano-rural ("penhasco", no contraste com
as áreas rurais mais frias). A uniformidade do "platô térmico" urbano é
interrompida pela influência de distinções intra-urbanas de uso do solo como
parques, lagos, fundos de vale e outros espaços livres que formam "ilhas de
frescor" em meio às ilhas de calor.
Na figura 43 se esquematiza a seção transversal de uma típica ilha
de calor urbano, na qual se visualiza o efeito oásis de descontinuidade do perfil
térmico, derivado dos espaços livres verdes que proporcionam frescor em meio
ao platô térmico.

Figura 43 - Seção transversal de uma típica ilha de calor urbano (segundo Oke, 1987, p. 255)

Casseti (1991), individualizou no dia 8/3/86 às 15 horas, no centro


da cidade de Goiânia uma isoterma máxima de 31°C (ilha de calor), com
tendência decrescente em direção à periferia de 28°C na região sul. No mesmo
instante, a umidade relativa encontrava-se em torno de 50% no centro (ilha de
141

secura), com acréscimo gradativo em direção à periferia. Sette (1996)84


constatou que numa cidade com típico clima tropical - no caso
Rondonópolis/MT - o desmatamento e a impermeabilização do solo, sobretudo
na área adensada central, impõem uma brusca redução na capacidade de
armazenamento d'água pelo solo urbano.
Ressalta essa autora que, sob condições de intensa radiação solar
reinante nos trópicos, a água armazenada no solo poderá ser evaporada em
questão de horas. Esse aquecimento rápido diminui o consumo de calor latente
(energia gasta na vaporização d'água). Assim, pelo fato de existir pouca
evaporação (pela ausência de vegetação e água disponível), toda energia
absorvida pela superfície impermeável junto à interface solo/atmosfera,
transforma-se em calor sensível, aumentando a temperatura intra-urbana e o
desconforto ambiental.
Observou ainda que a temperatura da superfície terrestre da cidade
citada apresenta uma variação de acordo com o uso do solo e com a natureza da
sua cobertura. A temperatura do solo aumenta e o albedo diminui quando se
passa de ambientes vegetados e permeáveis para ambientes concretados e
impermeabilizados.
O comportamento térmico no meio urbano pode ser visto na tabela
17: i) em solos cobertos com grama, - albedo 15-30% e absorção 85-70% -, a
média é de 28,9°C; ii) em solos nus, vermelho-arenosos, - cujo albedo varia de
10-20% e absorção de 90-80% -, apresenta uma média de 30°C; e iii) em
superfícies cobertas com concreto, - albedo 02-05%, mas de absorção elevada
98-95% liberando mais calor sensível -, a média eleva-se a 33,15°C.

Tabela 17 - Temperatura média do solo urbano de Rondonópolis/MT de acordo com o uso do


solo e correspondentes coeficientes de reflexão e de absorção
Temp. (°C)
Natureza do solo Albedo (%) Absorção (%)
Per.seco Per.chuva
Nu (verm.-aren.) 10-20 80-90 30,3 29,7
Grama 15-30 70-85 29,5 28,3
Concreto 02-05 95-98 33,5 32,8
Fonte: Sette (1996, v. 1, p. 88-91)

A substituição dos espaços naturais por áreas edificadas resulta na


modificação da natureza das superfícies horizontal e vertical urbanas.
Conseqüentemente, o ecossistema urbano deixa de contar com a cobertura
vegetal na manutenção do equilíbrio térmico do ar.
O atual processo de ocupação e uso do solo urbano verificado na
maioria das cidades tem provocado o fenômeno das "ilhas de calor" e das "ilhas
de secura", que obrigam os citadinos a um gasto adicional de energia para

84
SETTE, D. M. O clima urbano de Rondonópolis/MT. 2 v. 236 p. Dissertação (Mestr. - Geografia
Física/Climatologia) FFLCH, USP, São Paulo, 1996.
142

refrigeração, no verão, ou para calefação, no inverno, dos ambientes internos. Os


gastos com saúde pública elevam-se nos períodos de "inversão térmica" para o
tratamento das doenças do aparelho respiratório e circulatório, por causa das
alterações provocadas na dinâmica atmosférica intra-urbana, resultando na
concentração dos poluentes nas épocas mais frias do ano.
Em Rondonópolis foi encontrada uma diferença geral de 11,5% na
umidade do centro em relação à periferia, considerando a média das diferenças
entre as estações de seca e de chuva (Sette, op. cit.). Seguindo a tendência do
comportamento dos elementos do clima vistos até aqui, cujos valores estão
correlacionados ao tipo de uso do solo, as precipitações no meio urbano não
fogem à regra geral. A autora mencionada constatou uma média de totais de
chuva 50% maiores no centro do que na periferia.
O ciclo diário das brisas térmicas nas cidades apresenta uma
movimentação horizontal do ar da periferia, mais frio e de maior pressão, em
direção ao centro, mais quente e de menor pressão. Neste, ocorrem correntes
convectivas térmicas ascendentes, que, em virtude de maior quantidade dos
núcleos de condensação decorrentes dos poluentes atmosféricos que ali se
concentram, respondem pelas intensas e curtas precipitações pluviométricas nas
cidades tropicais.
O componente de calor latente, em superfícies vegetadas, atua
como um regulador no equilíbrio térmico do ambiente urbano. Sem a adequada
cobertura vegetal, com solos impermeabilizados e edificados, formam-se
verdadeiras "ilhas secas" nas quais aumenta-se o calor sensível no balanço da
radiação de ondas longas. Com isto, gera-se desconforto térmico e hígrico,
deplecionando as condições de vida urbana.
Daí que os vegetais, ao consumirem calor latente de vaporização –
sem, no entanto provocar o aquecimento do ar, pois a temperatura das folhas
permanece abaixo da do ar – desenvolvem, simultaneamente, a refrigeração e a
umidificação do ambiente intra-urbano.
Na opinião de Spirn (1995)85, os construtores da cidade - tanto o
governo como a iniciativa privada - com muita freqüência se esquecem de
aplicar os conhecimentos que determinam as características do clima urbano.
A avaliação da autora se aplica à realidade vivida pela maioria das
cidades brasileiras. Antes de se conhecer os recursos naturais do sítio onde a
cidade está instalada e maximizar as suas relações com as formas do traçado
urbano, na busca da melhoria da qualidade de vida urbana, o próprio poder
público implementa medidas que degradam irreversivelmente os seus recursos
naturais.
Tal é o caso dos espaços livres e de fundos de vale, que têm sido
alvo de projetos altamente impactantes, principalmente a construção de vias
marginais do sistema viário.

85
SPIRN, A. W. O jardim de granito; tradução de Paulo Renato M. Pellegrino. São Paulo: EDUSP, 1995. 345p.
143

A autora citada afirma quem "a contaminação da atmosfera urbana


é causada por uma fonte maior: os transportes; e enquanto os automóveis
particulares forem o principal meio de circulação urbana, a poluição das ruas
continuará" (Spirn, op. cit., p. 82).
Os engenheiros de tráfego hierarquizam as vias de comunicação em
ruas locais, vias coletoras, arteriais e expressas, de acordo com as funções
características de velocidade e fluxo do tráfego, entre outras.
De acordo com a mesma autora, uma via expressa e arterial tem
como objetivo a eficiência tanto do tráfego leve como pesado, bem como
dispersar os poluentes atmosféricos e limitar a exposição das pessoas a eles, sem
impedir o movimento do tráfego.

Figura 44 - Zona de contaminação nas vias expressas em função da velocidade, do volume do


tráfego e da distância em relação ao leito carroçável (segundo Spirn, 1995, p. 86)

As vias de comunicação, com as características acima citadas, -


assevera Spirn (op. cit., p. 85-6), -“são projetadas para a circulação de mais de
20 mil veículos por dia, gerando uma zona de poluição na qual o teor de
chumbo é dezesseis vezes superior à taxa atmosférica normal, (...) caindo para
oito (8) vezes a taxa normal, 50 m além de cada margem" (v. figura 44).
É pela razão exposta que "as vias expressas devem possuir um
cinturão de árvores numa faixa de no mínimo 50 m em ambos os lados da
margem do leito carroçável. As espécies (a serem plantadas) devem ser
selecionadas entre as que possuem características de resistência ao meio
urbano e capacidade de biofiltração, com maior densidade de ramos, troncos e
galhos mais rugosos e folhas pilosas com alta proporção de superfície em
relação ao volume" (Smith, 1980)86.

86
SMITH, W. H. Urban vegetation and air quality. IN: PROCEDINGS OF THE NATIONAL URBAN
FORESTRY CONFERENCE. Syracuse: State University of New York, 1980. Apud SPIRN (op. cit., p. 86).
144

Diante do que foi argumentado, conclui-se que a ocupação dos


espaços livres, com destaque para os de fundos de vale, pode causar
significativos impactos negativos sobre os ecossistemas urbanos, como:
 Tendência de eliminação progressiva do "efeito oásis"
proporcionado pelos espaços livres de fundos de vales das drenagens naturais
dos municípios, como as dos córregos Botafogo e Capim Puba em Goiânia;
 Ampliação da magnitude da "ilha de calor urbano", elevando-
se o platô térmico do meio urbano, em decorrência da ação anterior;
 Decaimento da qualidade do ar por causa da supressão dos
canais naturais de movimentação das correntes de convecção, que dispersam os
poluentes e proporcionam as brisas térmicas que melhoram o clima urbano;
 Aumento da incidência do fenômeno das inversões térmicas,
com repercussões sobre a saúde pública;
 Edificação em áreas de preservação permanente, às margens
de mananciais hídricos, com redução de áreas permeáveis, aumentando assim o
componente horizontal do fluxo hídrico e também, por conseqüência, os gastos
com a drenagem urbana;
 Aumento da poluição hídrica pelo lançamento de lixo e de
esgotos, em decorrência do superadensamento às margens de mananciais;
 Aumento da poluição atmosférica pelos escapamentos dos
veículos automotores que circulam pelas vias de baixa hipsometria como as vias
marginais do Tietê em São Paulo ou do Botafogo em Goiânia, formando um
corredor de migração de poluentes, graças às edificações às margens dos
mananciais, que afetará tanto os transeuntes, como os moradores urbanos em
geral;
 Agravamento dos transbordamentos de leito de mananciais,
no seu fluxo inferior, em decorrência da ocupação das suas margens nos trechos
de montante;
 Possibilidade de aumento da instabilidade dos taludes dos
fundos de vale das bacias hidrográficas, com as edificações que exigirão
movimentação de terra, implicando na alteração do equilíbrio geo-ecológico da
vertente como um todo;
 Aumento do risco de destruição das estruturas construídas
nas áreas marginais aos cursos d'água, tanto públicas como particulares;
 No caso específico de Goiânia, a ocupação dos fundos de
vale das drenagens do sítio urbano, é uma agressão ao patrimônio histórico da
cidade, - cujo patrimônio natural e cultural foi tombado pelo Conselho
Municipal do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental, através da Resolução
n. 004/94, homologada pelo Decreto n. 2109/94;
 Ainda no caso de Goiânia, a ocupação dos fundos de vale é
uma agressão ao Plano Diretor da Cidade, pois as áreas num raio de 100 a 500
metros das nascentes e numa faixa bilateral de 50 a 100 metros das margens das
145

drenagens naturais são constituídas em unidades de conservação de uso indireto


do solo.

3.3.4. A morfologia urbana e seus condicionantes climáticos

As diversas formas urbanas possuem características peculiares que


condicionam o clima. Estas características são a rugosidade, a porosidade, o uso
do solo, a orientação, a permeabilidade do solo urbano e as propriedades
termodinâmicas dos materiais construtivos (Vieira, op. cit.).
A rugosidade é uma característica da forma urbana que se constitui
num dos princípios básicos da movimentação das massas de ar. Conforme o que
já foi exposto na Seção 3.1.2.4, o gradiente de pressão atmosférica horizontal é
responsável pela movimentação da massa de ar. No seu deslocamento o vento
encontra resistência. A inércia da massa de ar faz com que, à resistência desses
obstáculos, o vento mude de direção. A rugosidade das superfícies causa fricção
ao deslocamento do ar, reduzindo a sua velocidade e alterando o fluxo de
laminar para turbulento.
A porosidade da estrutura urbana é a sua permeabilidade aos
ventos. Esta característica responde pela possibilidade de circulação das brisas
térmicas e das correntes de ar responsáveis pelo transporte de importantes
propriedades, como vapor d’água, oxigênio, temperatura, gás carbônico, entre o
ecossistema urbano e seu entorno rural.
A densidade e o tamanho são as características relacionadas ao
adensamento urbano (população e construção). Quanto maior o adensamento,
maior a produção de calor antropogênico e de poluentes.
O uso do solo refere-se ao tipo de ocupação e ao tipo de atividade.
É determinado pelo zoneamento urbano que estabelece espaços próprios para o
desenvolvimento das funções urbanas (habitação, trabalho, circulação e
recreação).
Lombardo (1985)87 encontrou, na capital de São Paulo, uma íntima
relação entre o uso do solo e a elevação das temperaturas intra-urbanas. Nos
padrões de uso do solo, estudados pela autora, na conformação da ilha de calor
urbano, destaca-se a relação entre índice de área construída e distribuição de
espaços livres, bem como a distribuição das áreas verdes. Na capital paulista, a
área ocupada pela mancha da ilha de calor bem como a de maior concentração
de poluentes coincide com aquela mais densamente construída.
A orientação é uma característica que se refere ao posicionamento
da estrutura urbana frente ao sol, aos ventos e aos elementos naturais e
artificiais.

87
LOMBARDO, M. A. Ilha de calor nas metrópoles. O Exemplo de São Paulo. São Paulo: HUCITEC,1985.
244 p.
146

A permeabilidade do solo urbano é uma característica importante


no equilíbrio do balanço hídrico. A equação do balanço hídrico é dada por:

P ± R ± ∆W – ET = 0

Sendo: P - precipitação; R - escoamento superficial; ∆W – capacidade de


retenção do solo; ET – evapotranspiração.
A impermeabilização do solo urbano é um fator do microclima
associado à elevação da temperatura da cidade, à formação das “ilhas de calor” e
à ocorrência de elevadas precipitações.
A ampliação das áreas urbanizadas e seu efeito correlato de
impermeabilização da superfície do solo reduzem a capacidade de infiltração das
águas no solo, favorecendo o escoamento superficial, a concentração das
enxurradas e a ocorrência de enchentes, constituindo-se num fator de
desequilíbrio do ciclo hidrológico.
Christofoletti (1993)88 mostrou que, num meio urbanizado, o
período de retorno das enchentes é drasticamente reduzido para as cheias de
mesma magnitude, que se tornam mais freqüentes. Em trabalho realizado na
cidade do Rio de Janeiro, Brandão (2001)89 ressaltou a coincidência das áreas de
ocorrência de episódios pluviais de maior intensidade com aquelas resultantes de
profundas alterações nos padrões de uso do solo em decorrência das atividades
humanas.
Vieira & Cunha (2001)90 constataram em Teresópolis que os
principais impactos do desenvolvimento da área urbana sobre o sistema fluvial
urbano são ocasionados pelo aumento das áreas impermeáveis e das alterações
dos canais. Os rios sofreram modificações que resultaram numa desproporção
entre as capacidades dos canais e as respectivas áreas da bacia hidrográfica.
A capacidade do canal de drenagem, para uma bacia com uma taxa
de impermeabilização inferior a 5% do total da área da bacia, é fornecida pela
equação de Hammer (Christofoletti, op. cit., p. 136):

área da seção transversal = 0,9243 (área da bacia)0,6442

De acordo com o autor citado, o uso da equação de Hammer


permite calcular a área esperada do canal que, confrontada com a área
mensurada em determinada seção, fornece o índice de alargamento do canal:
88
CHRISTOFOLETTI, A. Impactos no meio ambiente ocasionados pela urbanização no mundo tropical. In:
SOUZA, M. A. A. et alii. Natureza e sociedade: uma leitura geográfica. São Paulo: HUCITEC/ANPUR,
1993, p. 127-38.
89
BRANDÃO, A. M. P. M. 2001. Clima urbano e enchentes na cidade do Rio de Janeiro. In: GUERRA &
CUNHA (op. cit., p. 47-109).
90
VIEIRA, V. T. & CUNHA, S. B. 2001. Mudanças na rede de drenagem urbana de Teresópolis (Rio de
Janeiro). In: GUERRA & CUNHA (op. cit., p. 111-45).
147

área mensurada do canal


Índice de alargamento =
0,9243 (área da bacia)0,6442

Aplicando-se o índice de alargamento em diversas seções


transversais, em direção à jusante, pode-se avaliar o estado de equilíbrio de uma
rede de drenagem. Em equilíbrio, a largura e a profundidade do canal tendem a
aumentar, em direção à jusante, proporcionalmente à área da bacia de drenagem,
para conter o volume das águas. O índice de alargamento apresenta correlação
positiva com a taxa de impermeabilização da bacia de drenagem, isto é, quanto
maior a urbanização maior o índice de alargamento. Por conseqüência, maior a
tendência à ocorrência de transbordamento e de enchente.
As propriedades termodinâmicas dos materiais (absorção, reflexão,
albedo, transmissão, emissão, condução e convecção), abordadas na Seção
3.1.2.1, são responsáveis pelos diferentes processos de interação da matéria com
a radiação eletromagnética, resultando em efeitos positivos ou negativos sobre o
clima urbano. Os microclimas com mudanças bruscas de temperatura (amplitude
térmica acentuada) são constituídos de materiais com elevada refletividade e
baixa condutividade, como os estacionamentos pavimentados e os edifícios. Os
microclimas com moderadas variações térmicas, como os lagos e os parques,
são constituídos de materiais com baixa refletividade e elevada inércia termal.

3.3.5. Os efeitos dos elementos naturais sobre o clima urbano

Os elementos naturais mais importantes da paisagem urbana que


exercem influência sobre o clima são a vegetação, as massas de água e a
topografia.

3.3.5.1. Os efeitos benéficos da vegetação

Segundo Sattler (op. cit.), a arborização urbana contribui para a


preservação e melhoria da qualidade ambiental das cidades através de duas
funções. A função fisiológica está relacionada à melhoria das condições do solo;
a regularização do ciclo hidrológico, limitando as “trombas d’água”; a
moderação dos extremos climáticos; a sobrevivência da fauna; e a redução dos
níveis de poluição atmosférica. A função psicológica se refere à quebra da
monotonia das cidades, com a mudança do horizonte e a manifestação de um
ritmo natural, com cores relaxantes, possibilitando a renovação espiritual.
De uma maneira intrínseca a estas funções, a arborização urbana
contribui para a percepção de conforto que envolve as respostas aos sentidos de
audição, visão, olfato, paladar, tato, equilíbrio, calor e de frio, todos
relacionados a estímulos do ambiente. A sensação de conforto ou desconforto
representa a integração de respostas dos nossos sentidos a estes estímulos, sejam
148

eles individualmente exagerados percebidos por qualquer um dos sentidos, ou


quando simultaneamente fracos, mas detectados por vários deles (Kloetzel,
199291; Sattler, op. cit.).
Do ponto de vista do conforto ambiental, a vegetação exerce o
papel de atenuação dos estímulos intensos e dominantes relacionados à
propagação e percepção do calor ou do frio, dos sons e da luz. A arborização
urbana interfere diretamente nos fatores ambientais que determinam os
confortos térmicos, acústicos e lumínicos (Sattler, op. cit.).
Remmert (1982)92, ao analisar a circulação da água em grandes
massas continentais equatoriais, localizadas longe dos oceanos, ressalta que a
evapotranspiração vegetal desempenha um fator decisivo na reposição da água
na atmosfera, proporcionalmente maior do que a quantidade de água evaporada
pelos oceanos. A análise do autor corresponde, por exemplo, à região central do
da América do Sul e se aplicaria a cidades nela localizadas, como Brasília,
Goiânia e Palmas.
Os revestimentos vegetais tendem a melhorar tanto o clima das
imediações como as condições de vida. Estes benefícios ambientais decorrem
dos processos ecofisiológicos, expostos na Seção 3.2, relacionados ao balanço
térmico e hídrico da vegetação.
De acordo com Ometto (op. cit.) o percentual de vapor d'água na
atmosfera é determinado pela temperatura ambiente, bem como pelas interações
físicas e fisiológicas com o meio, incluindo vegetais e animais. No aspecto
físico, a estrutura molecular do vapor d'água possui uma propriedade de forte
interação com radiações eletromagnéticas emitidas por materiais existentes a
temperatura do ambiente. Assim, por ser um armazenador de energia e por se
movimentar juntamente com o ar, o vapor d'água é um equalizador da energia do
meio, amenizando, devido a isso, as trocas de energia.
Noutro aspecto, através da evapotranspiração, - um processo físico-
fisiológico de trocas com o meio -, as plantas têm as suas funções fisiológicas
estreitamente ligadas à quantidade de vapor d'água existente no ar atmosférico.
Os benefícios mais perceptíveis decorrentes das funções fitofisiológicas no meio
urbano, no aspecto do conforto ambiental estão relacionados, em síntese, à
redução das amplitudes térmicas, seja rebaixando as temperaturas máximas seja
elevando as temperaturas mínimas.
Do ponto de vista econômico, a vegetação urbana pode propiciar
vários benefícios, reduzindo significativamente os gastos financeiros necessários
para amenizar as condições estressantes da vida urbana e para proporcionar
condições de conforto humano. Kielbaso (1994)93 mostrou que o maior

91
KLOETZEL, K. Higiene física e do ambiente. São Paulo: EDART, 1992. 192 p.
92
REMMERT, H. Ecologia. São Paulo: EPU / EDUSP, 1992. 335 p.
93
KIELBASO, J. Urban Forestry: The international situation. In: ENCONTRO NACIONAL SOBRE
ARBORIZAÇÃO URBANA, 5, 1994, São Luís. Anais... São Luís: SBAU, 1994, p. 3-12.
149

benefício das árvores urbanas é o efeito indireto decorrente do modo como elas
agem sobre a energia e o CO2, especialmente em regiões que dependem do uso
do combustível fóssil para o esfriamento e aquecimento internos. Qualquer coisa
que reduza estas demandas de energia reduzirá a quantia de consumo de
combustível fóssil. Árvores localizadas estrategicamente ao redor de edifícios –
afirma o autor – podem reduzir em até 50% o consumo de energia para a
refrigeração dos ambientes internos.
Estudos têm mostrado que a energia economizada produz, num
curto período de 1 a 3 anos, o pagamento do que foi gasto no plantio. Akbari et
al. (1988)94, apud Kielbaso (op. cit.) modelou sete cidades distribuídas nos EUA
e mostrou para casas construídas depois de 1980 uma economia média geral no
consumo anual de energia de refrigeração, bem como um poder de pico das
árvores e o incremento do albedo graças à pintura com cal do revestimento das
edificações, conforme tabela 18.
O autor citado demonstrou que o plantio de cem milhões de árvores
nas proximidades das residências norte-americanas, poderia economizar
nacionalmente cerca de 22 bilhões de kWh de eletricidade, equivalentes a U$
2,3 bilhões de dólares por ano, bem como a 9 milhões de toneladas de emissões
de gás carbônico.

Tabela 18 - Energia média economizada em cidades arborizadas dos


EUA e modificação do albedo.
Consumo Árvores Albedo
Pico (KW) 21,7 6,4
Anual (Kwh) 8,7 10,6
Fonte: Akbari et al., apud Kielbaso (1988)

Em países de climas quentes, as árvores incrementam a taxa de


ventilação natural no interior dos edifícios, reduzindo as necessidades de
refrigeração. Em regiões mais frias, as árvores podem formar barreiras que
evitam a pressão exercida pelos ventos frios diretamente sobre as edificações,
diminuindo as necessidades de calefação. Outra forma de reduzir o consumo de
energia das cidades é através do desenvolvimento de uma arquitetura baseada na
climatização mais natural das edificações, harmonizando a iluminação de
ambientes com o acondicionamento térmico apropriado.
As massas vegetais podem amenizar as condições térmicas urbanas
pelo efeito da transpiração e do consumo de calor latente. As correntes de
convecção horizontal que circulam das regiões formadoras de massas frias

94
AKBARI, H.; HUANG, J.; MARIEN P; RAINER, L; ROSENFELD, A; TAHA, H. The impact of summer
heat islands on cooling energy consumption and global CO2 concentration. In: Procedings of ACEEE. Summer
Study On Energy Efficiency In Buildings, vol. 5; Asilomar, CA. Washington, D.C: American Council for an
Energy Efficient Economy: 1988, p. 11-23.
150

(vegetação periférica) às regiões formadoras de massas quentes (centro urbano)


produzem resfriamento de até 3ºC na temperatura urbana e elevação da umidade
relativa de 5% (Vieira, op. cit.; Portes e Castro, op. cit.).
Diversos autores desenvolveram estudos evidenciando o benefício
da arborização urbana no controle da poluição atmosférica. Sattler (op. cit.) e
Detzel (op. cit.) mostraram que uma barreira de árvores, arbustos e folhagens
pode atenuar as ondas sonoras, reduzindo os níveis de poluição acústica; que a
copa das árvores de um bosque promove a refração das ondas sonoras com o
solo, diminuindo os níveis de ruído; que a vegetação possui uma capacidade de
absorção e dispersão de fumaça e poeira; que as cortinas vegetais podem filtrar
de 75% a 85% das partículas em suspensão, além de eliminar muitos poluentes
atmosféricos, como dióxido de enxofre, fluoreto de hidrogênio, óxido de
nitrogênio, hidrocarbonetos e foto-oxidantes, melhorando a qualidade do ar.
Segundo Sattler (op. cit.), o efeito de biofiltração da cobertura
vegetal pode colaborar para reduzir os custos de implantação de equipamentos
antipoluentes em distritos industriais, pois os gases emanados que se aderem aos
materiais particulados em suspensão na atmosfera poderão ser 100% filtrados
conjuntamente por uma barreira vegetal de 30 metros de espessura, colocada
entre as zonas industrial e residencial. Pompéia, apud Sattler (op. cit.),
identificou 38 famílias e 73 gêneros de plantas resistentes ou tolerantes a
poluição atmosférica no pólo industrial de Cubatão (SP).
O efeito de biofiltração das plantas pode depurar um ar poluído
com 10 mg de SO2/m³ que atravessar uma floresta de bétulas de meia idade a
uma velocidade de 25 km/hora. Um povoamento florestal de 30 metros de
largura pode reduzir em 6-8 dB as emissões sonoras (Lapoix, 1979)95.
As árvores amenizam o calor e melhoram o ar intra-urbano geral,
enquanto elas próprias sofrem, ao mesmo tempo, os efeitos contaminantes
adversos. Kielbaso (op. cit.) calculou que a arborização urbana pode reduzir uma
quantidade de particulados aerotransportados da ordem de 18 a 180 kg por
árvore por ano, a um valor anual de U$ 4,00 per capita.
McPherson et al. (1993)96, apud Kielbaso (op. cit.) calculou uma
relação custo-benefício de 2,6 e uma taxa interna de retorno de 7,1 pelo plantio
de 500.000 árvores. Este autor mostrou em um subúrbio de Chicago com 23,2%
de cobertura vegetal que o benefício gerado por 212 hectares de área arborizada
é de U$ 136 por dia. Quase dois terços do benefício são proporcionados pelo
efeito da vegetação na mitigação de particulados e outros 20% na depuração do
dióxido de nitrogênio.

95
LAPOIX, F. Cidades verdes e abertas. In: CHARBONNEAU, J. P. et. al. Enciclopédia de Ecologia. São
Paulo: EPU, 1979, p. 324-336.
96
MCPHERSON, E.G; NOWAK, D.; SOCAMANO, P; PRICHARD, S. & MAKRA, E. Chicago's evolving
urban forest: initial report of the Chicago Urban Forest Climate Project. Gen. Tec. Rep. NE-169, Radnor, PA:
USDA Forest Service, NE Expt. Station, 1993. 55 p.
151

Kielbaso (op. cit.) diz que o reconhecimento dos efeitos


antipoluentes proporcionados pela adequada cobertura vegetal urbana permitiu
desenvolver um novo conceito, a "Biomassa como Agente Seqüestrador da
Poluição". A partir deste conceito é possível calcular e comparar o custo por
árvore, repassando à sociedade o valor derivado dos benefícios proporcionados
pela vegetação.
As árvores são importantes no ciclo hidrológico, pois interceptam a
precipitação, bloqueando o impacto das gotas da chuva sobre o solo. Com isto,
aumenta-se a infiltração pelo solo, diminuindo o escoamento superficial. A
proteção das matas ciliares pode melhorar a qualidade e o volume dos
mananciais de abastecimento público. Assim, reduzem-se os custos com o
tratamento da água ao proporcionarem a melhoria da qualidade dos mesmos,
reduzindo o preço das tarifas para os consumidores.
O saneamento urbano também pode ter seus custos reduzidos com a
adoção de um sistema natural de drenagem. A substituição de áreas verdes por
superfícies edificadas ou pavimentadas aumenta a taxa de impermeabilização e
reduz a taxa de absorção de água pelo solo. Conseqüentemente, o meio urbano
necessita de uma gigantesca rede de galeria pluvial para a descarga da água das
chuvas.
O que mais pesa na composição do custo de implantação da rede
pluvial é o preço das tubulações que aumenta na razão direta dos seus diâmetros,
bem como as desapropriações e indenizações de bens particulares. Quanto
menor a área de solo permeável na bacia de captação, maior será a contribuição
no volume a ser captado pela rede pluvial, que exigirá diâmetros e extensões
maiores, onerando os custos. De acordo com relato de Menezes (1994)97, a
experiência realizada em Curitiba revela que é mais barato para o Poder Público
Municipal manter um sistema natural de drenagem, com os fundos de vale
revegetados, do que implantar um sistema totalmente artificial.
Finalmente, um índice adequado de área verde possibilita a
implantação de parques que geram empregos diretos e indiretos, movimentam
divisas, com o consumo de bens e serviços. Sinergicamente, os efeitos
ambientais resultam na valorização das propriedades. Nos países do primeiro
mundo, os parques agregam um valor de U$ 9 mil aos preços de vendas dos
imóveis vizinhos (Detzel, op. cit.). Segundo a Folha de São Paulo (29.06.97), na
capital paulista, este valor agregado representa um adicional, em média, de 18%
no preço dos imóveis localizados próximos ao Parque Ibirapuera,
comparativamente a outros de mesmo padrão, mas distantes das áreas verdes.
Do ponto de vista social, a vegetação urbana exerce efeitos diretos e
indiretos sobre o bem-estar da comunidade. O benefício gerado por um índice de
cobertura vegetal de 30% do território urbano, com adequado balanço térmico

97
MENEZES, C. L. Desenvolvimento urbano e meio ambiente: a experiência de Curitiba. Campinas: Papirus,
1996. 202 p.
152

correspondente, é o de manter a umidade do ar em níveis capazes de reduzir as


infecções do aparelho respiratório (Sattler, op. cit.). A importância desta função
social está na possibilidade de redução das internações hospitalares que, nos
períodos de inversão térmica, ocorrem numa freqüência acima da média anual,
provocando grandes dispêndios de recursos públicos e privados.
Os efeitos da urbanização implicam em mudanças antibiosféricas,
como as ilhas de calor e a inversão térmica, que impedem a troca de ar da cidade
com o perímetro rural. Em decorrência, o ar poluído não se dispersa, de forma
que os poluentes ficam confinados no meio intra-urbano. Esses fenômenos
relacionados à dinâmica do clima urbano contribuem para aumentar a incidência
de afecções pulmonares na população citadina. Na Inglaterra, as cidades com
população acima de cem mil habitantes, apresentam as doenças respiratórias -
pneumonia, bronquite etc. - como causa mortis de 120,65 por 10 mil habitantes,
contra 78,15 na zona rural (KLOETZEL, op. cit.).
Dados desse mesmo autor assinalam que as cidades de rápido e
desordenado crescimento ou sem planejamento, destituídas de áreas verdes,
apresentam um quadro agravante das condições psicológicas da população; e
que de 50 a 70% de seus pacientes têm enfermidades de fundo eminentemente
emocional; e ainda que algumas doenças são típicas do meio urbano, como o
câncer de pulmão, a úlcera péptica e certas cardiopatias.
O desenvolvimento de uma adequada relação de áreas verdes por
habitante pode contribuir para a reconciliação do homem com a natureza. O
conjunto das características do ser humano é o resultado da interação entre o
genótipo - herança genética - com o ambiente onde se vive. A seleção natural
moldou o genoma da espécie humana atual há mais de 2500 gerações, quando a
humanidade estava no estágio cultural de caçador-coletor. Neste estágio, a vida
era nômade e interdependente da natureza. Contudo, nas últimas 200 gerações, a
civilização alterou radicalmente o seu ambiente de vida, ao criar as metrópoles.
A forma de vida passou a ser sedentária e menos “dependente” da natureza.
Assim, a nossa espécie desenvolveu uma adaptação cultural, por
meio de padrões de socialização ao “agregarismo urbano”. Só que esta evolução
sócio-cultural foi muito mais acelerada do que a evolução biológica da espécie.
A relação com o ambiente pretérito, no entanto, está presente em várias
manifestações do nosso quotidiano, muitas vezes de maneira atávica. À primeira
oportunidade, o cidadão “escapa” para o campo, litoral ou ambientes mais
naturais para recarregar as energias e aliviar o estresse, deixando as cidades
vazias nos feriados. Daí a importância das áreas verdes urbanas, a serem dotadas
de equipamentos para a recreação ao ar livre da população, gerando benefícios
físicos, psicológicos, comportamentais e sócio-econômicos.
153

3.3.5.2. Os efeitos das massas de água e da topografia

As massas de água permitem a penetração de cerca de 10 a 40% da


radiação solar a uma profundidade de 1 metro. No solo, ao contrário, apenas
uma fina camada do perfil do solo sofre a insolação direta. Na água uma grande
quantidade de calor fica armazenada, ao passo que nos solos, uma pequena parte
é armazenada e uma grande quantidade de calor é irradiada para a atmosfera
(Geiger, op. cit.).
Em decorrência, as superfícies líquidas apresentam uma amplitude
diária e anual de variação térmica inferior à que se verifica nas superfícies dos
solos.
As propriedades térmicas da água que respondem pelos efeitos
benéficos ao meio ambiente como “equalizador” da energia são: i) o elevado
calor específico (1 cal.g-1.ºC-1); ii) o elevado calor latente de evaporação (580
cal. g-1 de água a 30ºC) e de fusão (80 cal. g-1 de gelo); iii) uma maior densidade
específica a 4 ºC, o que impede o congelamento dos lagos até o fundo; iv) uma
reflexão da radiação, no espectro do ultravioleta e do visível, de 5% e de 9%,
respectivamente (a água atua como um espelho, dependendo da altura solar, isto
é, ao amanhecer e ao entardecer).
As características físicas da área geográfica onde se insere o sítio
urbano também exercem influência no controle climático. A topografia
influencia: i) na interceptação do vento; ii) na proteção ou aproveitamento da
radiação solar; iii) no controle da temperatura.

3.3.6. Parâmetros do conforto ambiental de vida urbana

De acordo com Vieira (op. cit.), o conforto ambiental de vida


depende de um planejamento global das cidades que relacione os elementos do
clima, os elementos naturais do sítio urbanizado, a massa edificada e os espaços
externos ou livres. O desenvolvimento urbano com qualidade de vida deve ser
enfocado com base numa gestão que articule as variáveis climáticas,
psicológicas e sociológicas.
Daí que o conforto global é decorrente de parâmetros de conforto
individual e ambiental. Os parâmetros de conforto ambiental estão relacionados
às manifestações de energia nos meios térmicos, acústicos e lumínicos. Eles
podem ser desdobrados em subparâmetros específicos e gerais. Os
subparâmetros específicos são aqueles que afetam os sentidos térmicos,
acústicos e lumínicos. Estes subparâmetros podem ser avaliados por medidas
físicas, por exemplo, ºC, dB e lux, respectivamente, para temperatura,
intensidade de som e de luz.
Os subparâmetros gerais são aqueles que afetam simultaneamente
vários sentidos, aferidos em termos de dimensão, de tempo ou de espaço.
154

Os parâmetros de conforto individual são específicos para cada


indivíduo e não têm relação direta com o ambiente. Estes parâmetros
influenciam a apreciação que o indivíduo faz do meio circundante. Podem ser
desdobrados em subparâmetros fisiológicos, sociológicos e psicológicos.
A autora citada sustenta que as estratégias para a obtenção do
conforto climático, em ecossistema urbano de clima quente e seco, devem ser
baseadas principalmente na manutenção, implantação e manejo das áreas verdes,
dos espaços livres permeáveis e do uso de material construtivo de propriedades
térmicas adequadas aos trópicos (tabela 19).
Tabela 19 – Algumas estratégias para o Conforto Climático Externo em
Ecossistema Urbano de Clima Tropical Úmido-Seco.
Objetivos Medidas
 Bloqueio da radiação solar  Sombreamento por meio de vegetação;
direta e difusa;  Coberturas com superfícies não reflectantes;
 Bloqueio da radiação  Tratamento da pavimentação adjacente c/
refletida. materiais (↓refletividade e ↑inércia térmica);
 
Amenização das temperaturas Uso da vegetação;
e diminuição da amplitude  Uso da água (evaporação e inércia térmica);
térmica diária.  Resfriamento do ar em movimento.
 Aumento da umidade do ar.  Uso da vegetação (evapotranspiração);
 Uso da água (evaporação).
 Redução das trocas por  Canalização das brisas;
convecção.  Uso da vegetação ou de jatos d’água.
 Redução das trocas por  Pisos com cobertura vegetal ou espelhos d’água;
radiação de ondas longas.  Materiais com propriedades térmicas adequadas e
permeáveis;
 Coberturas com vegetação ou irrigação.
Fonte: adaptado de Vieira (1994, p. 131).

Os estudos bioclimatológicos avançaram quanto ao parâmetro


temperatura na elaboração do conceito de zona de conforto. Este conceito
relaciona a temperatura do ar com a temperatura das superfícies circundantes,
com a umidade atmosférica e com a velocidade do ar.
Segundo Ayoade (op. cit., p. 63-71), a temperatura fisiológica é “a
temperatura experimentada por um organismo vivo, inclusive o homem, em
função da temperatura do ar e da taxa de perda de calor proveniente daquele
organismo”. A temperatura fisiológica varia com os indivíduos, em função: i)
das suas características (constituição geral e peso); ii) do tipo de vestuário; iii)
das atividades físicas ou trabalho; iv) da dieta; v) do estado de saúde; vi) da
idade; vii) do sexo; viii) do estado emocional; ix) do grau de ajustamento às
condições climáticas predominantes.
Para manter o equilíbrio térmico, o ser humano produz calor
metabólico (M), criado quimicamente pelo organismo, junto com o calor ganho
155

ou perdido pela radiação (R) e pela convecção (C), para contrabalançar o calor
perdido pela evaporação (E). Em equilíbrio, a soma de todos os termos da
equação do equilíbrio térmico do corpo humano deve ser zero:

M ± R ±C – E = 0

A temperatura fisiológica é função do meio ambiente térmico


circundante; e, da eficiência e da velocidade da evaporação. Por sua vez, o meio
ambiente térmico circundante é determinado pelo equilíbrio entre o ganho e a
perda de radiação. Já a eficiência e a velocidade da evaporação são controladas
por três fatores: umidade do ar; velocidade do vento; e, grau de exposição à luz
solar.
Quando o ar é úmido, a evaporação do suor a partir do corpo é
limitada, surgindo uma sensação de fadiga; quando o ar é seco, a evaporação do
suor pelo corpo é favorecida, permitindo um rápido resfriamento da pele graças
ao efeito do calor latente. Por isso, o organismo humano suporta melhor altas
temperaturas se as umidades não forem elevadas.
O estabelecimento do conforto ambiental urbano deve levar em conta,
simultaneamente, o controle da temperatura e da umidade relativa do ar. A
capacidade de a atmosfera manter em suspensão o vapor de água aumenta com a
temperatura. O ar saturado não aceita mais vapor de água, interrompendo o
processo de evaporação pela pele; por outro lado, o ar seco facilmente absorve o
vapor de água evaporado, ressecando a pele e as mucosas. Assim, os extremos
geram desconforto, recomendando-se como padrão de conforto uma temperatura
variando de 15 a 24C para uma umidade de 40 a 70% (Kloetzel, op. cit.).
Em condição de calmaria (ausência de vento), a camada de ar
próxima ao corpo fica saturada, ocorrendo pouca ou nenhuma evaporação.
Quando ocorre fluxo de ar, há renovação da camada próxima ao corpo,
afastando o ar saturado e possibilitando a manutenção do processo de
evaporação pelo organismo. A exposição direta à luz solar limita a eficiência da
evaporação como um meio de resfriamento do corpo. Nesta condição a pele
absorve uma grande quantidade de calor que não pode ser prontamente
eliminada.
Os índices de temperatura fisiológica têm sido usados em vários
países para determinar a extensão das zonas de conforto. O mais comum é o
Índice de Temperatura Efetiva (TE), que foi elaborado por Thom (1959), apud
Ayoade (op. cit.). O índice de temperatura fisiológica é expresso da seguinte
maneira:
TE = 0,4 (Td + Tw) + 4,8

Sendo: TE - temperatura efetiva; Td - temperatura de bulbo seco; Tw -


temperatura de bulbo úmido.
156

Os valores obtidos através do índice de temperatura efetiva


permitem determinar o alcance da zona de conforto, para adultos vestidos e em
repouso, sob condição de leve movimento do ar. Assim, Ayoade (op., cit.)
registra que uma TE ≤ 18,9ºC indica condição desconfortável de stress ao frio; e
TE ≥ 25,6ºC, de stress ao calor.

Tabela 20 – Zonas de conforto de âmbito mundial


Região Zona de conforto (ºC)
Índia, Malásia 21-26
Europa Continental 20-26
Sul dos EUA 21-25
Norte dos EUA 20-22
Norte da Nigéria 18-21
Inglaterra 14-19
Fonte: Ayoade (1991, p. 66)

De acordo com o autor citado, os padrões de distribuição espacial


da temperatura efetiva sobre o globo, no período de janeiro a julho, mostram
valores similares aos da temperatura do ar em virtude da estreita associação
desta com a umidade atmosférica. As maiores diferenças entre TE e temperatura
do ar ocorrem nas regiões de deserto, onde a elevada temperatura da atmosfera
está associada à baixa umidade relativa do ar (v. tabela 20).

3.4. ECOLOGIA HUMANA: O ESTUDO DO HOMEM

3.4.1. Introdução

O termo Ecologia – do grego oikos = casa + logos = ciência,


literalmente a “Ciência do Habitat”, foi introduzido pelo biólogo alemão Ernst
Haeckel em 1866 para caracterizar o “[...] estudo das condições de existência
dos seres vivos e das suas interações com o meio ambiente [...]” (DAJOZ, 1978,
p. 14)98.
Na abordagem de Ribeiro & Vieira (1999)99 a Ecologia é uma
ciência de síntese que incorpora aspectos, modelos de análise e resultados
produzidos em diferentes áreas, sendo que os estudos da estrutura e da dinâmica
dos sistemas sócio-ambientais são enfocados de um ponto de vista inter e
transdisciplinar.
Na definição de Machado (1985, p. 32)100, a Ecologia Humana “[...]
é o estudo interdisciplinar das interações entre o Homem e o Meio Ambiente,
realizado sob inspiração sistêmica e com objetivos prospectivos (...),

98
DAJOZ, R. Ecologia Geral. 3a. ed. Petrópolis: Vozes, 1978. 474 p.
99
RIBEIRO, M. A. & VIEIRA, P. F. Ecologia Humana, Ética e Educação: a mensagem de Pierre Dansereau.
Porto Alegre: Palloti; Florianópolis: APED, 1999. 704 p.
100
MACHADO, P. A. Ecologia Humana. São Paulo: Cortez/Autores Associados; Brasília: CNPq, 1985. 174 p.
157

[constituindo-se num] novo nível de pensamento ao alcance das diferentes


disciplinas [...]”.
Os autores desta área de conhecimento, segundo Dias (1994)101,
convergem para uma abordagem holística ao tratarem da relação Homem -
Natureza, cuja dinâmica envolve os aspectos biológicos, sociais, econômicos,
políticos e culturais do ambiente. As interações da espécie humana com o seu
ambiente formam um conjunto de elementos, ações ou indivíduos comuns a
todos os conjuntos dos aspectos citados. É nesta interseção que se localiza o
objeto de estudo da Ecologia Humana (Lima, 1995)102.
A Ecologia Humana é a ecologia da espécie humana - a única
espécie que, transcendendo os parâmetros etológicos, é capaz de modificar o
ambiente natural e de criar um ambiente construído. O ambiente construído é
altamente complexo, pois nele estão integrados conceitos de sociedade,
habitação, transporte, comunicação, trabalho, religião, economia, governo, etc.
A Ecologia do Homem está na base de sustentação conceitual,
teórica e metodológica do ecodesenvolvimento ou desenvolvimento sustentável.
A problemática do desenvolvimento, no enfoque da sustentabilidade, permite
compatibilizar os aspectos naturais e culturais do ambiente. Numa perspectiva
ampla, o desenvolvimento sustentável é “ [...] o processo que melhora as
condições de vida das comunidades humanas e, ao mesmo tempo, respeita os
limites da capacidade de carga dos ecossistemas [...]” (SACHS, 1993, p. 24)103.
Ao planejá-lo, diz o autor, deve ser considerada simultaneamente a dimensão
ecológica, espacial, econômica, social e cultural da sustentabilidade.

3.4.2. Breve histórico conceitual

Nos seus primórdios, os autores identificaram a Ecologia Humana


como “um ramo da Geografia Humana que, na transição dos séculos XIX e XX,
se derivou da Geografia Geral, em boa parte graças às obras de Ratzel, Semple,
Blanche e Brunhes. “[...] Os geógrafos humanos pioneiros sublinharam a
influência do meio físico sobre a cultura humana, associando seus estudos a um
determinismo geográfico [...]” (THEODORSON, 1974, v.2, p. 203)104.
Posteriormente, os autores passaram a destacar a reciprocidade da relação entre
os aspectos da cultura e do meio físico, sem uma determinação unilateral deste
sobre aquela. Estes estudos passaram então a ser referidos como Ecologia
Humana.

101
DIAS, G. F. Populações marginais em ecossistemas urbanos. 2. ed. Brasília: IBAMA, 1994. 157 p.
102
LIMA, M. J. A. Ecologia Humana: realidade e pesquisa. 2. ed. Recife: UFRPE, 1995. 164 p.
103
SACHS, I. Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. Tradução de
Magda Lopes. São Paulo: Studio Nobel/FUNDAP, 1993. 103 p.
104
THEODORSON, G. Estudios de ecología humana. Tradução de Javier G. Pueyo. Barcelona: Labor, 1974. 2
vs.
158

Com o ecossociólogo Robert E. Park – pioneiro da Escola de


Chicago de Sociologia Urbana, considerado o pai da Ecologia Humana – tem
início em 1936 a formulação de um marco conceitual desta nova ciência e da
verificação objetiva das influências do ambiente sobre o homem. Para Park
(1974)105, a sociedade humana está organizada em dois níveis mutuamente
interdependentes: o nível biótico, que implica reações adaptativas não
conscientes, desenvolvidas na luta pela existência, com base nas relações inter e
intra-específicas do tipo cooperação e competição; e, o nível cultural, que
implica reações adaptativas e ações transformadoras conscientes, desenvolvidas
sob formas superiores e sublimes de luta pela existência, com base na
comunicação e no consenso, que se institucionalizam na superestrutura
sobreposta a infraestrutura biótica.
A partir do conceito de sucessão ecológica, o autor citado aplicou o
princípio da dominação para as comunidades humanas. A evolução das
comunidades biológicas ocorre através de uma seqüência de séries ou estágios
de organismos que se sucedem, de uma comunidade simples e instável (imatura)
formada por organismos pioneiros, sendo substituídos por organismos
secundários e terciários, que evoluem para uma comunidade madura, complexa
e estável (climax comunitário). Em cada série encontra-se sempre uma ou mais
espécies dominantes, em função da competição e do domínio, que são forças
impulsionadoras do processo e que operam para manter a sua ordem natural.
No entendimento de Park (op. cit.), o princípio da dominação opera
na comunidade humana determinando o modelo ecológico geral da cidade e a
relação funcional de cada uma das diversas zonas urbanas. Esse modelo se
expressa na dominação das atividades individuais e institucionais por uma
localização estratégica baseada no valor do solo urbano. Os preços mais
elevados se verificam nas zonas comercial e bancária decaindo gradualmente até
a periferia urbana. A contribuição da Escola de Chicago, representada por Park,
Burgess e Mckenzie, dentre outros, formulou conceitos que ainda hoje são
considerados pelos geógrafos e ecólogos humanos, como os de centralização,
descentralização e segregação ao abordarem o espaço urbano (Park, op. cit.;
Mckenzie, 1974106), como será visto na Seção 3.5.2.
Apesar de reconhecer que a sociedade humana apresenta inter-
relações mais complexas e diversificadas do que sugere a dicotomia “nível
biótico versus nível cultural”, pois inclui os aspectos econômicos, políticos e
éticos, a contribuição do autor citado permitiu estabelecer uma concepção
determinística para os ecólogos humanos que sublinham a primazia dos aspectos
biológicos sobre os aspectos culturais.

105
PARK, R. E. 1974. Ecología Humana. In: THEODORSON, G. A. (op. cit., v. 1, p. 43-55).
106
McKENZIE, R. D. 1974. El ámbito de la ecología humana. In: THEODORSON (op. cit., v.1, p. 57-68).
159

Em oposição a Park, surgiu a corrente representada por Hawley


107
(1974) . Para ele a ecologia humana se constitui numa ciência social básica, em
virtude do grau de flexibilidade do comportamento do Homo sapiens. Esse autor
entende que, por ser a espécie humana dotada de natureza biopsicosociológica
complexa e dinâmica, as suas comunidades são dotadas de características
superiores às de uma simples organização de relações bióticas. Repete-se assim a
visão reducionista numa nova versão, a da primazia dos aspectos culturais sobre os
aspectos biológicos.
A discussão epistemológica, do reducionismo, evoluiu para a
concepção expansionista. Esta é devida a Bews, apud Machado (1985, p. 29),
segundo a qual a Ecologia Humana “seria uma síntese inclusiva de todas as
ciências humanas”. Apesar do exagero expansionista, esta concepção contribuiu
para uma visão integrada da relação Homem-Ambiente.
Como havia dificuldades práticas à Ecologia Humana em reunir
especialistas de diferentes áreas e de impor-se como uma ciência de síntese, o
expansionismo de Bews perdeu terreno. Emerge então uma tentativa de correção de
rumo, graças a Wirth, apud Machado (1985), situando o Estudo do Homem num
campo de ação formado por áreas marginais adjacentes de diferentes disciplinas, a
partir da delimitação das suas convergências. Contudo, nesta visão, a ecologia do
homem perderia sua identidade, não passando de uma “colcha de retalhos mais ou
menos compatíveis de diversas disciplinas desintegradas” (Machado, 1985, p. 31).
O coroamento da evolução gnosiológica em Ecologia Humana se deu
com a Teoria Geral dos Sistemas (TGS). A TGS é a teoria sobre os princípios de
organização dos sistemas vivos. Esta teoria surgiu em contraposição à análise
cartesiana de fragmentar ou decompor um problema em partes para compreende-lo.
Ocorre que, ao faze-lo, não se obtém a visão da totalidade, já que a decomposição
impõe perdas de características e de atributos às suas partes constituintes.
Bogdanov, apud Lima-e-Silva et al. (1999)108, já propunha no início
do século XX a Tectologia (do grego Tecton = construtor) “[...] uma ciência
universal da organização onde a forma organizacional é a totalidade de conexões
entre elementos sistêmicos [...]” (LIMA-E-SILVA, op. cit., p. 224).
O biólogo Ludwig von Bertalanffy, considerado o idealizador da
TGS, dedicou-se a substituir os fundamentos cartesiano-mecanicistas da ciência por
uma visão holística, que preconiza o modo orgânico e sistêmico de observar as
coisas. Os fundamentos desta teoria foram publicados em 1940, contribuindo para
elucidar um dilema termodinâmico até então vigente. Trata-se do segundo princípio
da termodinâmica, segundo o qual a energia possui sempre a tendência de se
perder, na forma de calor, de um nível a outro ou de um elemento a outro dentro de
um sistema. A entropia é a grandeza que permite avaliar essa perda de energia,

107
HAWLEY, A. H. 1974. Ecología e Ecología Humana. . In: THEODORSON (op. cit., v.1, p. 243-54).
108
LIMA-E-SILVA, P. P.; GUERRA, A. J. T. & MOUSINHO, P. (Orgs.) Dicionário brasileiro de ciências
ambientais. Rio de Janeiro: Thex, 1999. 263 p.
160

medindo o grau de desordem de um sistema. Quanto maior a complexidade do


sistema físico, maior a entropia, maior o seu grau de desordem.
Embora os princípios termodinâmicos tenham sido confirmados como
leis que regulam os sistemas físicos, para os sistemas biológicos a sobrevivência
dos seres vivos manifestava-se como uma fuga constante ao segundo princípio e
como uma contradição à entropia, pois os sistemas vivos caminham da desordem
para a ordem. O dilema foi elucidado por Bertalanffy (1973)109 com a formulação
da TGS, segundo a qual os organismos são sistemas abertos que trocam matéria e
energia com o ambiente externo em estado de equilíbrio dinâmico. Assim, a
entropia não é um princípio válido para os sistemas biológicos, mas sim para os
sistemas fechados que são regulados pelas leis naturais da realidade física.
Para o formulador da TGS, sistema é um conjunto de unidades em
inter-relação. A definição de sistema foi enriquecida por Morin, apud Machado
(1985) como uma unidade global (ou macro-unidade) organizada de inter-relações
dinâmicas, isto é, unidades sintetizadas em totalidades organizadas, tendo como
ponto de origem os elementos, as ações e os indivíduos atuantes num dado
processo ou fenômeno.
Lima-e-Silva et al. (op. cit., p. 214) definem sistema como um “[...]
conjunto de elementos interdependentes, inter-relacionados e interatuantes,
coordenados entre si, e que funcionam como um todo complexo, uma estrutura
organizada [...]”.
De acordo com os autores consultados, a teoria sistêmica se apóia na
concepção unitária da vida e na isomorfia das leis em diversas áreas do saber, em
oposição à ênfase exclusiva dada à decomposição e à classificação das suas partes
constituintes pelo racionalismo cartesiano. Multiplicaram-se os procedimentos
analíticos e a fragmentação do saber através da ultraespecialização. Esta forma
racionalista de agir representou a ampliação do conhecimento a respeito de cada
vez menos, pois o Homem “[...] desceu num estreito poço de grande profundidade
e quando olhou para o alto percebeu a estreiteza do seu horizonte [...]”
(MACHADO, 1985, p. 37).
A teoria sistêmica tem como princípio unificador o modelo de mundo
como uma grande organização, reforçando a reverência pelos seres vivos e
contrapondo-se ao reducionismo da metodologia cartesiano-mecanicista. A visão
sistêmica procura superar a concepção reinante numa sociedade que vangloria o
tecnicismo, baseado unicamente nas leis da física. A TGS é, portanto, “uma
concepção operatória ampla que aponta para o perspectivismo” no dizer de
Monteiro (1976, p. 103) ou “com objetivos prospectivos” conforme palavras de
Machado (1985, p. 32-3).
No processo de interação Homem-Natureza, manifestam-se relações
biossociais que resultam na formação do Ser Humano, conforme destaca Lima

109
BERTALANFFY, L. von. Teoria Geral dos Sistemas; tradução de Francisco M. Guimarães. Petrópolis:
Vozes, 1973. 351 p.
161

(1995). A relação biológica decorre da condição biológica da espécie humana,


enquanto organismo integrante da cadeia alimentar, do ciclo de matéria e de
energia, submetido às leis naturais e à evolução biológica. Por sua vez, a relação
social decorre da necessidade de o homem explorar e transformar a natureza
através do trabalho, contraindo relações sociais e produzindo a evolução social
(Figura 45).

Relações biológicas

Homem
Transformação de energia
Ser humano
Realização de trabalho
Natureza

Relações sociais

Figura 45 - O Ser Humano no processo de interação Homem-Natureza (seg. Lima, 1995, p. 22)

O objeto de análise da Ecologia Humana encontra-se na interseção das


interações entre dois sistemas dinâmicos: o Sistema Homem e o Sistema Ambiente
Humano. O primeiro conjunto é constituído pela espécie humana, dotada de
características orgânicas próprias, além dos atributos peculiares de inteligência,
criatividade, livre-arbítrio, artes e ciências. O segundo é constituído não só pelos
meios biótico e abiótico, como também pelo ambiente construído, que é integrado
pelas criações e instituições humanas – religiões, mitos, doutrinas, teorias,
economia, governo, sociedade, Estado, etc. (figura 46).

Político Social
Divisão
Partici
do trabalho
pação
Ecolo-
Valor e gia Hu Modo de Econô
Cultural Uso mana Produção
mico
Cadeia
alimentar
Biológico

Figura 46 – Representação gráfica do objeto de análise da Ecologia Humana: a interseção das


interações dos sistemas Homem e Ambiente (segundo Lima, 1995, p. 24)

Os ecólogos humanos sustentam que a auto-regulação dos sistemas


enfocados conduz a um estado de equilíbrio transitório ou de equilíbrio
dinâmico. A atuação dos fatores internos (biológicos) ou externos (ambientais)
162

não conduzem a um estado de estagnação ou steady state e sim a uma constante


reorganização com características evolucionárias.
Os fatores ambientais atuam cada qual com uma ação definida
sobre o Sistema Homem. Este recebe e decodifica a informação do Sistema
Ambiente, elaborando uma ação ou resposta correspondente. Os fatores
ambientais promovem a interação dos indivíduos com o meio ambiente, numa
dada condição socioeconômica, desdobrando-se em: i) fatores ecológicos –
relativos a produção e uso dos recursos dos ecossistemas; ii) fatores econômicos
– relativos às relações de produção; iii) fatores sócio-culturais – relativos ao
modo de vida da comunidade.
O estudo de cada fator deve ser voltado tanto para o ambiente
natural como para o artificial. Nos ambientes construídos pelo Homem os
fatores naturais são modificados, havendo a introdução de novos fatores. Por
exemplo, novos fatores físico-químicos relacionados à interação da energia com
os materiais construtivos ou com as atividades metabólicas urbanas, implicando
em novas formas de radiação, vento, trepidação, umidade, ruídos, concentração
de poluentes, etc.
Na interação homem-ambiente deve merecer análise as categorias
de: i) relação de produção – conceito que se refere às atividades desenvolvidas
na aquisição de bens e serviços; ii) modo de produção – designa determinada
atividade do indivíduo que expressa sua maneira de viver; e, iii) modo de vida –
que é o conjunto de hábitos, atitudes, valores, crenças e comportamentos de um
agrupamento humano.
O conflito teleológico que aflige os Ecólogos Humanos reside na
dificuldade da análise dialética das interações entre o Sistema Homem e o
Sistema Ambiente, diante da complexidade dos problemas. A metodologia
determinística trabalha com hipóteses baseadas nas relações causa-e-efeito
conhecidas, sendo, portanto, adequada para a abordagem da problemática
relacionada às Ciências Físicas e Naturais.
Por outro lado, para as Ciências Humanas, não é possível
estabelecer uma ralação causal entre todos os fenômenos estudados, pois os
efeitos não podem ser sempre conhecidos a priori. Ocorre aí o oposto do
determinismo, que é o indeterminismo.
Em razão do exposto, com base no quadro da TGS, em Ecologia
Humana o método determinístico tem aplicação restrita, devendo-se buscar
apoio nas Análises Probabilísticas e outras metodologias adequadas à análise
sistêmica dos problemas.
163

3.4.3. Cibernética: um sistema particular e a compreensão do Sistema


Homem

A Cibernética, do grego Kibernesis, que significa a arte de


governar, é um termo criado por Wiener (1970)110 para designar uma nova
ciência que estuda os sistemas auto-reguladores, objetivando desenvolver uma
teoria da relação entre os elementos animados e inanimados, abrangendo o
controle e a informação entre eles. A Cibernética tem o mérito de – na opinião
de Xifra-Heras (1975, p. 28)111 – permitir o “exame do comportamento das
máquinas, dos homens e dos grupos utilizando métodos compatíveis a uma
linguagem comum”.
A compreensão do Sistema Homem, na abordagem de Machado
(1985, p. 40-3), ficou facilitada com o desenvolvimento da informática. O
computador é o resultado da aplicação da idéia de sistema. Didaticamente, pode-
se comparar o fluxo de dados no computador - um sistema fechado, inanimado,
lógico e previsível com o fluxo de informações no Homem – um sistema aberto,
vivo, lógico com livre-arbítrio e nem sempre previsível (figura 47).
Na computação, input ou entrada de dados é qualquer dado
fornecido ao sistema; o dado é a representação da informação, ou seja, qualquer
símbolo capaz de representar uma idéia, um evento, um fato, um conceito ou
uma instrução, possibilitando a comunicação e/ou processamento.

Input Processamento Output


(computador)

Informação Homeostase Resposta


(Homem)
(Homem)
Figura 47 – Diagrama do fluxo de informação através de um sistema inanimado
(computador) e de um sistema vivo (Homem)

A informação é um conjunto de dado inteligível, isto é, dotado de


alguma significação; é tudo aquilo que pode ser interpretado pelo Homem,
trazendo algum conhecimento ou sentimento sobre determinado assunto.
No sistema inanimado, o Processamento (CPU) recebe e manipula
(processa ou modifica) os dados e executa os programas de acordo com o
objetivo do sistema, controlando o funcionamento de todos os componentes da
máquina.
No sistema humano, o processamento da informação é feito por um
sistema homeostático, que garante a homeostasia ou coordenação do meio
interno. Este sistema funciona com sinais de natureza energética proveniente das
110
WIENER, N. Cibernética. São Paulo: EDUSP/Perspectiva, 1970.
111
XIFRA-HERAS, J. A informação: análise de uma liberdade frustrada; tradução de Gastão Jacinto Gomes. São
Paulo: EDUSP; Rio de Janeiro: Lux, 1975. 346 p.
164

reações bioquímicas – são as informações de origem endógena -, que são


detectadas pelo sistema neurovegetativo, promovendo um equilíbrio dinâmico
através de diversos mecanismos como o sistema endócrino, o sistema
circulatório, o sistema nervoso. Assim, a concentração iônica, a taxa de glicose
no sangue, a temperatura corporal, o teor de oxigênio e de gás carbônico são
regulados e mantidos constantes por mecanismos homeostáticos.
Estes mecanismos são auto-reguladores, fazendo com que, na
homeostase, os sistemas biológicos mantenham um “equilíbrio ou estabilidade,
enquanto se ajustam às mudanças de condições ambientais para uma ótima
sobrevivência. Por exemplo, a regulação da população implica num mecanismo
homeostático. Quando mudanças ambientais ocorrem tais que proporcionem
maior quantidade de recursos e proteção, a população aumenta em resposta;
por outro lado, quando há falta de recursos ou proteção a população diminui
para se ajustar a esta nova situação” (Lima-e-Silva et al., op. cit., p. 128).
O organismo humano tem capacidade de perceber os vários
estímulos do meio externo - informações de origem exógena -, que são
detectadas pelos órgãos sensoriais, promovendo uma adaptação às modificações
ambientais, através de diversos processos fisiológicos. A homeostase atua na
“manutenção de condições internas constantes em face de um ambiente externo
variante” (Lima-e-Silva, op. cit.). São exemplos as reações vasculares de
termorregulação do organismo face às variações climáticas e às condições
ambientais; a reação imunitária do organismo relativamente à invasão de corpos
estranhos; a intervenção no meio ambiente ou o desenvolvimento da
organização social para se adaptar à manifestação de fatores físicos ou de fatores
sócio-político-culturais.
A memória é a parte do computador responsável pelo
armazenamento dos dados. A memória principal fica na sua placa-mãe, sendo
subdividida em dois tipos: a ROM (Read Only Memory) – usada apenas para
leitura, pois os dados vêm gravados de fábrica e não podem ser apagados ou
modificados; e a RAM (Random Access Memory) – memória de acesso
aleatório, que permite a leitura, a alteração e a escrita de novos dados.
No Sistema Homem, a memória permanente (equivalente à ROM) é
programada pela genética, pelas leis biológicas e pela cultura. Já os
conhecimentos adquiridos e as experiências vividas vão-se acumulando na
memória do Homem, podendo se expandir no decorrer da vida, de maneira
equivalente à RAM (Machado, 1985).
No sistema inanimado, output é a saída ou o resultado obtido após o
processamento. Analogamente, no sistema humano é a enorme capacidade de
decodificar as informações recebidas e dar uma resposta conforme a
disponibilidade de equipamentos disponíveis, desde o nível bioquímico
(decodificação inconsciente) até o nível social (decodificação consciente).
165

3.4.4. A teoria da informação e a auto-regulação dos sistemas

Em cibernética, a informação é uma noção fundamental, pois -


segundo Laborit (1990, p. 18)112 - “a vida é sistema e informação, enquanto a
máquina é um sistema que se alimenta de informação”.
Etimologicamente, informar significa dar forma, configurar e, por
extensão, apresentar, criar uma idéia ou uma noção. Além disso, acrescenta
Xifra-Heras (op. cit.), a informação está associada a uma simbologia ou signos
que objetivam torna-la transmissível. Temos, assim, a mensagem, que é o sinal
ou uma sucessão de sinais portadores de uma informação, por exemplo, os
hormônios (Laborit, op. cit).
Para os autores consultados, o fenômeno informativo tem um
caráter processual, de sintonização entre a fonte (responsável pela emissão) e o
destino final (responsável pela recepção). São atividades básicas entre o emissor
e o receptor, a codificação, a transmissão, a detecção, a decodificação, a
interação e o feedback.
Toda a dinâmica da interação Homem-Ambiente se inicia pela
detecção de uma informação proveniente do Sistema Ambiente, que se propaga
como diferente forma de energia e comprimento de onda, sendo captada pelo
Sistema Homem através de diferentes órgãos detectores. A informação - no
dizer de Machado (1985) - é a ‘centelha’ que deflagra o processo interativo. Sem
ela os dois sistemas não poderiam interagir.
No sistema humano a informação é uma seqüência contínua ou
descontínua de acontecimentos temporais mensuráveis, tangíveis ou intangíveis.
São modificações ambientais como as variações térmicas, lumínicas,
barométricas, sonoras, higrométricas, químicas, nutricionais, biológicas, etc.
Pode ser a palavra escrita ou falada, as ordens, o salário, os impostos, as leis,
etc., ou ainda representar uma manifestação de sentimento como afeto e
solidariedade, rancor e ódio.
O ser humano recebe simultaneamente todo tipo de informação, que
é decodificada de maneira variada, de acordo com o patrimônio genético,
imunoquímico, afetivo, intelectual e cultural de cada pessoa. Tem-se um
patrimônio pessoal de mensagens recebidas e decodificadas. A decodificação é
adaptada conforme a significância e a freqüência das mensagens que alcançam
cada indivíduo, onde são decifradas e interpretadas.
A elaboração da resposta, por sua vez, é igualmente dependente de
fatores variáveis – fisiológicos, físicos, psicológicos, nutricionais, etc, fazendo
surgir distúrbios metabólicos ou endócrinos e imunológicos próprios, bem como
escalas de valores diferenciadas.

112
LABORIT, H. O homem e a cidade. Portugal: Europa-América, {1990}. 232 p.
166

A teleonomia
Outro conceito associado à informação é o da finalidade ou
teleonomia, usado para designar a “ação dos sistemas que operam nas bases de
um programa, de uma informação codificada” (Laborit, op. cit., p. 20). Esse
autor aduz que os organismos são constituídos por estruturas funcionais
concorrentes para a sua automanutenção. Trata-se de um fenômeno
essencialmente biológico, pois a finalidade de uma máquina não é a de se
conservar enquanto estrutura complexa, ao passo que a de conjunto vivo é a
sobrevivência da sua estrutura, num permanente desafio à entropia.
Shannon & Weaver (1948)113, apud Machado (1985) e Laborit (op.
cit.), com base na Teoria da Informação, sustentam que a entropia é um
fenômeno a ela associado. A informação desencadeia um fluxo de energia e,
portanto, de comportamentos em todos os sistemas. O aumento da entropia
implica numa perda progressiva de informação.
Como os elementos atômicos que entram na constituição do mundo
animado e inanimado são os mesmos, a diferença entre eles é que, no primeiro,
as relações entre esses átomos são específicas e definem a estrutura de um ser
vivo. A desestruturação dos seres vivos ocorre quando há perda de informação
bem como da teleonomia das relações atômicas.

A regulação
Decorre do elemento teleológico acima exposto o conceito de
regulação, auto-regulação, retroação ou feedback. Dependendo da finalidade
do efetor, segundo Laborit (op. cit), a regulação pode ser de três tipos: i) em
constância; ii) em tendência; ou, iii) servomecanismo.
O efetuador ou efetor, - isto é, um órgão ou um organismo-sede das
reações às informações recebidas -, atua como um mecanismo que produz em
certo efeito. Como se mostra nos diagramas das figuras 48 e 49, o efeito
representa a finalidade para a qual qualquer organismo foi programado,
inclusive de um indivíduo humano ou de um grupo social, isto é, a de manter a
sua estrutura viva; o fator representa as condições necessárias ao funcionamento
do efetor; e, a retroação é um dispositivo sensível às variações do efeito, capaz
de reagir sobre os fatores, para atingir a finalidade prevista.
Retroação ou feedback
Fator regulado
-
+ Efetuador
Efeito
Outro fator

Figura 48 – Diagrama da regulação em constância com retroação negativa

113
SHANNON, C. & WEAVER, W. The Mathematical Theory of Communication. University of Illinois Press,
1949.
167

Na regulação em constância (figura 48), a finalidade do efetuador é


atingir e manter um determinado valor do efeito. Para que isto ocorra é
necessária uma retroação negativa do efeito sobre os fatores, isto é, o sinal da
retroação é diferente do sinal do fator regulado. A manutenção de um organismo
vivo se dá por regulação em constância com retroação negativa, como ocorre no
Sistema Homem, com os efetores fisiológicos. Este tipo de regulação determina
o aparecimento dos diversos níveis de organização, do mais simples ao mais
complexo (Laborit, op. cit.).
Na regulação em tendência (figura 49), a finalidade do efetuador é
atingir um valor máximo do efeito, isto é, a retroação e o fator regulado têm o
mesmo sinal.
Fator regulado
+ Retroação ou feedback
+
Efetuador Efeito
Outro fator

Figura 49 – Diagrama da regulação em tendência com retroação positiva

Na regulação do tipo servomecanismo (figura 50), o efeito tem um


valor que depende de um comando externo ao sistema. Conforme exemplifica
Laborit (op. cit.), um termostato que mantém uma temperatura constante, a 37
ºC, é um sistema regulado em constância. Para que ocorra uma regulação a uma
temperatura diferente daquela, é necessária uma ação vinda de fora do sistema.
O servomecanismo permite regular o sistema para fixar esse novo objetivo.
Reator
Informação
Comando externo
Fator regulado Detector

Efetuador
Efeito
Outro fator

Figura 50 – Diagrama da regulação por servomecanismo

No servomecanismo, o comando externo é constituído por: i)


detector - dispositivo sensível destinado a revelar, automaticamente, qualquer
variação do efeito; ii) reator – dispositivo que catalisa uma variação da
informação emitida pelo efeito, funcionando por reação direta na regulação do
sistema, sem acionar o efetuador, para atingir o valor programado do efeito.
168

A necessidade
O conceito de necessidade refere-se à “quantidade de energia e de
informação necessárias à manutenção de uma estrutura” (Laborit, op. cit., p.
26). A característica fundamental das formas vivas está na informação
relacionada aos elementos naturais que se organizam estruturalmente em
obediência aos princípios da termodinâmica, especialmente a entropia. Para esse
autor, a necessidade fundamental é a energia fotônica solar, transformada pela
fotossíntese, em energia química presente nos substratos alimentares.
Ainda segundo o mesmo autor, o conhecimento desse conceito pode
ser realizado a partir do funcionamento do Sistema Nervoso. Os hábitos e as
memórias, tanto inatas como adquiridas pelo ser humano, criam necessidades
decorrentes de um antagonismo funcional entre as estruturas nervosas
hipotalâmicas e límbicas.
A necessidade instintiva ou inata é aquela necessária à manutenção
da estrutura inata do ser vivo, determinada geneticamente. As manifestações
instintivas são regidas pelo cérebro reptiliano, especialmente o hipotálamo.
Trata-se de uma estrutura cerebral formada há 200 milhões de anos. Ela está
programada por aprendizagens ancestrais inatas, sendo responsável pela
regulação dos comportamentos primitivos e estereotipados, relacionados à fome
e à sede; ao estabelecimento do território; à caça; ao cio e acasalamento; e, ao
estabelecimento de hierarquias sociais (Laborit, op. cit.).
O cérebro reptiliano é inadaptado à aprendizagem de um
comportamento diferente, frente a uma situação nova e inesperada. O
funcionamento deste cérebro – ilustra o autor citado – se manifesta no
comportamento humano atual através de ritos cerimoniais, nos preconceitos
sociais e no automatismo da delimitação do território, expressos na segregação
de classe social e na noção de propriedade privada.
A necessidade criada é aquela resultante dos automatismos criados
pela aprendizagem e pela informação, estabelecidos na memória e nos hábitos
sob o comando do sistema límbico. São as necessidades aprendidas ou
automatismos sociais. A informação cria a necessidade – afirma o autor –, pois
esta não existe sem aquela. Na sociedade moderna e, sobretudo na cidade, os
automatismos sociais que conduzem às necessidades são fomentados pelos
meios de comunicação de massa ou mass média (Laborit, op. cit.; Xifra-Heras,
op. cit.).
O sistema límbico evoluiu a partir do cérebro reptiliano,
correspondendo ao cérebro dos antigos mamíferos. Ele desempenha um papel
fundamental nos processos de memória da aprendizagem, atuando sobre o nível
instintivo, através das atividades emocionais, endócrinas e víscero-somáticas
(Laborit, op. cit.).
O cérebro reptiliano e o sistema límbico constituem o paleocéfalo –
que é a estrutura cerebral dos mamíferos responsável pela investigação e
169

orientação da qualidade das informações. Ao associar a estratégia instintiva


gravada no hipotálamo (cérebro reptiliano) com a aprendizagem memorizada de
experiências passadas, sob a coordenação do sistema límbico (cérebro dos
mamíferos), o objetivo imediato do paleocéfalo é a sobrevivência da estrutura do
organismo (Laborit, op. cit.).
O neocórtex é a estrutura mais avançada do cérebro do Homo
sapiens, constituindo-se na base funcional da imaginação e criatividade da nossa
espécie. Representa, nesta breve exposição evolutiva do Sistema Nervoso, o
coroamento evolutivo das espécies vivas.

A interação
A interação é um fenômeno universal, seja no plano biótico,
abiótico ou social (v. figura 51). Cada interação é um fluxo bidirecional de
energia freqüentemente acompanhado de reação em cadeia: “uma ação ou
informação de A sobre B, provoca uma reação ou resposta de B sobre A, que
irá produzir efeito de outras informações, repercutindo sobre N circunstantes.
Estes são outros componentes do mesmo sistema ou de sistemas adjacentes que
detectam e reagem às alterações ocorridas” (Machado, 1985, p. 55).
As ações humanas sobre os ambientes naturais são um exemplo
deste fenômeno, freqüentemente acompanhado de reações em cadeia, como
numa explosão nuclear, no desmatamento de uma floresta, no represamento de
um rio (Machado, 1985).

Nn 3 N1
1 4
A B
2
3 4
N1 Nn
Figura 51 – Diagrama da interação com reação em cadeia: (1) ação de A sobre B; (2) reação
de B sobre A; (3) ação de N sobre AB; (4) reação de AB sobre N.

3.4.5. A perspectiva ecossistêmica de Dansereau

A comunidade científica internacional – conforme Vaillancourt,


114
1999) – reconhece na obra de Pierre Dansereau uma das mais expressivas
contribuições à ciência da Ecologia Humana. Essa contribuição ocorre na forma
de três eixos principais: i) nas ciências naturais – ecologia, biogeografia,
fitossociologia e taxonomia vegetal; ii) nas ciências humanas e sociais –
ecologia humana, ecossociologia e ecodesenvolvimento; e iii) na ética ambiental
– da educação e do humanismo passando pela ecodecisão.

114
VAILLANCOURT, J. 1999. Pierre Dansereau, da biogeografia à ecossociologia. In: RIBEIRO & VIEIRA
(op. cit., p. 537-59).
170

Enfocando nesta Seção o segundo eixo da contribuição de


Dansereau (1999a, p. 189)115 que, ao analisar a unidade fundamental do meio
ambiente – o ecossistema –, propôs um modelo denominado “bola-de-flechas”
(figura 52). Este modelo possui os quatro níveis tróficos até então reconhecidos:
I) minerotrofia; II) fitotrofia; III) zootrofia (herbívoro); e IV) zootrofia
(carnívoro); sendo acrescido de mais dois outros novos níveis: V) tecnotrofia
(investimento); e VI) nootrofia (controle e informação).
Às dimensões abióticas (minerais) e bióticas (plantas e animais), o
autor incorporou a dimensão humana na definição de ecossistema. Assim, os
recursos considerados indispensáveis à dinâmica dos sistemas ecológicos são
gerados em três grandes esferas: i) a cosmo-atmo-piro-lito-hidrosfera produz os
minerais; ii) a biosfera produz os tecidos vegetais e animais; e, iii) a noosfera,
que corresponde ao nível superior de administração, produz e controla a
informação. Segundo Dansereau (1999b, p. 233)116, o modelo “bola-de-flechas”
permite visualizar a estrutura do ecossistema compreendida por recursos e por
agentes. Estes realizam a ciclagem dos recursos através de processos ecológicos
que geram produtos. Cada nível trófico comporta um regime de ciclagem que
lhe é próprio, gerando produtos característicos.

VI

IV
III

II
I

Figura 52 – Diagrama do ecossistema segundo o modelo da “bola de flechas”, de Dansereau:


sendo: I) minerotrofia; II) fitotrofia; III) zootrofia-H; IV) zootrofia-C; V) tecnotrofia; VI)
nootrofia. Os relés de energia ( ), setas à esquerda – input e à direita – output, permitem a
entrada, circulação e saída de recursos, bens e informações entre todos os níveis tróficos.

115
DANSEREAU, P. 1999a. A ecologia e a escalada do impacto humano. In: RIBEIRO & VIEIRA (op. cit., p.
189-215).
116
DANSEREAU, P. 1999b. As dimensões ecológicas do espaço urbano. In: RIBEIRO & VIEIRA (op. cit., p.
219-293).
171

Através do modelo proposto, os níveis tróficos e seus regimes


respectivos tornam visíveis os processos ecológicos de circulação desigual de
energia ou de cargas tróficas nos ecossistemas. O modelo de Dansereau - opina
Vaillancourt (op. cit., p. 542) - representa um “caráter de certa isomorfia com a
divisão clássica de infra- e superestrutura, assumida no campo das ciências
humanas e sociais de modelos de análise da realidade, inclusive marxista”.
A “bola-de-flechas” é um

[...] excelente modelo estruturalista da realidade ecossistêmica, (...) integrando


os diferentes níveis de complexidade que se estende do fundamento material
(minerotrófico), passando pelos níveis tróficos intermediários (fitotrófico e
zootrófico), até o suplemento mais imaterial, no nível trófico da noosfera, onde
o ser humano exerce o controle econômico, político, cultural e religioso sobre
o conjunto do meio ambiente [...] (VAILLANCOURT, op. cit., p. 540).

Na mesma perspectiva histórica, Dansereau (1999a, p. 119-212)


sistematizou os processos ecológicos humanos de transformação da energia em
nove estágios de sucessão ecológica ou antropo-seras. Estas foram assim
esquematizadas: Primitiva ou Terras virgens → Coleta → Caça-e-pesca →
Pastoreio → Agricultura → Indústria → Urbanização → Controle climático →
Fuga exobiológica (v. tabela 21).
Para Dansereau (1999c, p. 394)117, a passagem de uma antroposera
a outra é viabilizada através de Revoluções Sóciotecnológicas (instrumental,
doméstica, agrícola, industrial, cibernética e cósmica) promovendo a
correspondência aos processos dominantes de ciclagem dos recursos ambientais.
Na perspectiva de Dansereau, sistematizada na tabela 21, vê-se que cada uma
destas inovações evolutivas mantém uma correlação com as antropo-seras,
caracterizando as respectivas fases de poder na escalada do impacto humano.
Tem-se, assim, “[...] um modelo evolucionista das transformações sofridas pelas
sociedades humanas que guarda sintonia com (...) os trabalhos de sociólogos e
antropólogos como Morgan, White, Mumford e Lefèbvre [...]”
(VAILLANCOURT, op. cit., p. 540).
Conciliando a trajetória das trocas e das ciclagens através dos
processos ecológicos (a escalada do impacto humano) com o modelo de “bola-
de-flechas”, Dansereau formulou uma classificação ecológica da ocupação dos
espaços. Procede-se a uma análise da paisagem por meio de um mapa ou de
entrevistas, leituras de fotos aéreas ou de levantamentos de campo. As
referências utilizadas são as Unidades de Análise de Doxiadis (1968)118, apud
Dansereau (1999b): natureza, homem, sociedade, invólucros (construções) e
redes (transporte, comunicação e controle).

117
DANSEREAU, P. 1999c. O avesso e o lado direito: a necessidade, o desejo e a capacidade. In: RIBEIRO &
VIEIRA (op. cit., p. 373-426).
118
DOXIADIS, C. Ekistics: an introduction to the science of human settlements. London: Hutchinson, 1968.
172

Tabela 21 – As antropo-seras (1 a 9) em correlação com as revoluções sóciotecnológicas (I a


VI), com as fases da escalada do poder do Homem sobre a paisagem (A a F), com os impactos
causados e as respostas correspondentes.
Respostas
Revolu- Fase de Estágio ou
Impacto Organização
ção poder antropo-sera Economia Vestuário Abrigo
social
9. Ultra- Metal,
Escape à Indivíduo
F. Fuga De poder especiali- plástico,
gravidade isolado
VI. Ciberní- exobiológica zação móvel
Cósmica gena 8. Alteração Metal,
Especiali-
Controle atmosférica e Tecnocracias De poder sintético,
zado
V. climático geológica móvel
Ciber- E. 7. Urbaniza- Aglomeração Sociedades De consumo, Pedra,
nética Urbígena ção do habitat densas de controle tijolo,
Estofos,
madeira,
D. Substituição Dependente, tecidos
6. Sociedades sintético,
Fabríge- (mineral), transforma- diversos.
Indústria concentradas perma-
na fabricação dora
nente
IV. Cultura, De produ- Rudimen- Pedra,
Industrial 5. seleção, Tribos e ção, autár- tar, peles, madeira,
Agricultura substituição sociedades quica até tecidos, perma-
(biológica) dependente estofos nente
C.
Pedras,
III. Agrígena Fogo, Tribos, De subsistên-
Rudimen- estacas,
Agrícola 4. pastoreio, sociedades cia,
tar, peles, peles,
Pastoreio transumância, (por vezes autárquica até
tecidos madeira,
propagação nômades). aberta
temporário
II. De subsistên-
Domés- Tribos
Ablação, cia, autár-
tica 3. (freqüente- Rudimen- Rudimen-
deslocamento, quica ou
Caça-e-pesca mente tar tar
B. fogo ligeiramente
nômades)
Colígena aberta
Pequenas Autárquica
2. Ablação, Nenhum, Nenhum,
tribos, ou de
Coleta submissão rudimentar rudimentar
eremitas subsistência

1.
A. Não Não
I. Terras nenhum Não aplicável Não aplicável
Indígena aplicável aplicável
Instru- Virgens
mental
Fonte: Dansereau (1999c, p. 394)

A classificação prevê uma fórmula com três dígitos (letras ou


cifras) para representar painel/bloco/tipo. Pode-se acrescentar um ou mais
dígitos para caracterizar os sub-tipos. E, em algarismo romano, se agrega o nível
trófico dominante (I a VI).
Como ilustra a tabela 22, os painéis (em número de 6) caracterizam
o processo dominante de cada fase do poder na escalada do impacto humano. Os
blocos (25), situados no interior dos painéis, têm por base o input de energia e a
natureza dos recursos implicados, agrupando tipos que obedecem a um mesmo
regime de ciclagem. Os tipos (196 ao todo) constituem ecossistemas
caracterizados por um recurso ou por um agente.
173

Tabela 22 – Chave simplificada para a classificação ecológica dos espaços


PAINÉIS
A. B. C. D. E. F.
Indígeno Colígeno Abrígeno Fabrígeno Urbígeno Cibernígeno
6. Ocupação 3. 4. 4. 4. 4.
animal Captura Pecuária Tecnologia Serviços Instituição
5.
Predomínio de 2. 3. 3. 3. 3.
plantas lenhosas Colheita Pastoreio Manufatura Comércio Administração
de terra firme
4. 1. 2. 2. 2. 2.
Predomínio de Ablação Explotação de Energia Residência Informação
BLOCOS

plantas (extrati- plantas


herbáceas de vismo) lenhosas 1. 1. 1.
terra firme Extração Espaço não Transporte
3. 1. construído e
Terras úmidas Explotação de comunicação
2. Herbáceas
Massas d’água
1.
Minérios a
descoberto
Fonte: Dansereau (1999b, p. 248)

As análises referentes ao uso dos solos e dos recursos naturais


devem ser feitas detalhadamente, formando diversos mosaicos. Os conteúdos
espaciais, ao serem representados cartograficamente, caracterizam as marcas
impressas pelo homem na paisagem. Os mapas temáticos expressam, através de
vários métodos de representações tipológicas – ordenadas e quantitativas –, a
predominância de cada uma das seis fases, relativas ao meio rural (fase
indígena), ao desenvolvimento agrícola (fase agrígena), industrial (fase
fabrígena) e urbano (fase urbígena).
O modelo proposto por Dansereau se aplica tanto ao ecossistema
rural como urbano (v. adiante, Seção 3.5.3). O ecossistema de uma savana em
contato com floresta, por exemplo, com base na classificação ecológica dos
espaços e no modelo “bola-de-flechas”, pode ser representado pela fórmula:

A 5 Cf / II

Sendo: A – painel (fase indígena); 5 – bloco (predomínio de plantas lenhosas em


terra firme); Cf – tipo savana com árvores, subtipo contato com floresta; II –
nível trófico dominante (fitotrófico).
De acordo com o autor citado, a classificação ecológica dos espaços
é morfológica e estática, embora possa comportar uma interpretação dinâmica
dos painéis e dos blocos. No entanto, a classificação morfológica é um pré-
requisito à explicação da paisagem, sendo indispensável à análise funcional.
À análise espacial do ecossistema, Dansereau (1999b, p. 274-5)
sobrepôs uma outra dimensão ecológica: a partilha (sempre desigual) dos
174

recursos ambientais de acordo com as necessidades da população, formulando o


modelo do “bolo-do-ambiente” (figura 53).

A. Necessidades 12 – assentamento B. Funções da sociedade


do indivíduo doméstico 24 - gestão
1 - luz 13 - trabalho 25 - investimento
2 - ar 14 - associação 26 - planejamento
3 - água 15 - renda 27 - legislação
4 - alimento 16 - decisão 28 - cultura
5 - abrigo 17 - propriedade C. Destino da
6 - progenitura 18 - educação espécie humana
7 - espaço 19 - informação 29 - diversidade
8 - paz 20 - participação 30 - produtividade
9 - sexo 21 - fé 31 - ajuda
10 - relacionamentos 22 - congregação 32 - saúde
11 - vizinhança 23 - ética

Figura 53 – Diagrama do modelo “bolo-do-ambiente”: matriz de repartição dos recursos para


satisfação das necessidades humanas como estratégia da qualidade de vida
(DANSEREAU, 1999b, p. 274-5)

Este modelo permite enfocar a análise da qualidade de vida com


base na etologia humana, ciência que estuda o comportamento das espécies,
distinguindo seis tipos de necessidades a serem satisfeitas: fisiológicas,
psicológicas, sociológicas, econômicas, políticas e ético/religiosas. A satisfação
das necessidades é cumulativa e vai da esfera individual, passando pelo
potencial de atendimento da sociedade, na qual os indivíduos estão inseridos e
se direciona ao conjunto do bem-estar da espécie humana.
No entanto, como a apropriação e a repartição dos recursos do meio
ambiente, – tanto entre indivíduos de uma dada sociedade como entre diferentes
175

sociedades historicamente determinadas – é desigual, o modelo prevê 4 graus de


satisfações possíveis, em círculos concêntricos, respectivamente valorados com
escores de 1 a 4, que vão do centro à periferia do diagrama:

1) Privação
2) Necessidade
3) Saciedade 1
23
4) Excedente 4

Assim valorado, o modelo permite que seja identificada e


comparada a satisfação relativa de cada grupo de necessidades e da totalidade
das mesmas. Portanto, torna-se possível avaliar como se reparte os recursos do
meio ambiente tanto entre indivíduos quanto entre comunidades. O modelo foi
aplicado por Dansereau (1999b, p. 280-88) em diversos contextos, comparando
grupos ocupacionais diferentes.
Por exemplo, entre um estudante e um artista de cinema, em
Montreal, no Canadá, ilustrado na figura 54. Nos diagramas desta figura
observa-se que o grau de satisfação das necessidades entre um e outro grupo
ocupacional diverge em alguns e converge em outros aspectos. Enquanto o
estudante sofre privação em várias necessidades individuais (psicológicas,
sociais, econômicas e da espécie), o artista sofre privação apenas na esfera da
espécie humana, refletindo uma partilha desigual dos recursos entre estes grupos
– o artista se apropria mais e o estudante menos –, embora ambos se preocupem
com o destino da espécie humana.

Figura 54 – “Bolo-do-ambiente” para dois grupos ocupacionais diferentes, em Montreal –


Canadá (DANSEREAU, 1999b, p. 280)
176

3.5. ECOLOGIA URBANA: O ESTUDO DO HABITAT DO HOMEM

3.5.1. A especificidade do ecossistema urbano

Goitia (1992, p. 208)119 identifica a Ecologia Urbana como um


ramo da Ecologia Humana, numa linha próxima à da Escola de Chicago (v.
Seção 3.4.2):

[...] A localização e distribuição das plantas e animais não é, portanto,


meramente acidental, mas obedece sim a determinados processos de
concorrência e cooperação, cujas causas e leis se podem muitas vezes definir
com bastante rigor. O mesmo acontece com o homem civilizado quando o
observamos sob um ponto de vista social. (...)
Existe, portanto, a ecologia humana (...). Quando esta distribuição do homem e
dos grupos sociais se verifica na cidade, temos a ecologia urbana [...].

O objeto de estudo da Ecologia Urbana é o ecossistema urbano, um


espaço limitado e densamente povoado, ou "urbosfera" conforme definição de
Lago (1991)120. A estabilidade dos ecossistemas naturais aumenta com o
crescimento da sua complexidade. Ao contrário dos ambientes naturais, as
cidades - ambientes com crescentes elementos artificiais e decrescentes
elementos naturais - possuem uma tendência oposta, o que as tornam mais
frágeis e passíveis de disrupção (DASMANN, 1972)121.
Esta disrupção deve ser entendida como uma perturbação ou
distúrbio provocado numa comunidade ou num sistema. Distúrbio, segundo
Lima-e-Silva et al. (op. cit., p. 178) é “[...] uma mudança causada por agente
natural ou artificial, que leva a uma reestruturação com eliminação ou acréscimo
de espécies ou de interações [...]”.
Os aglomerados urbanos, de acordo com Odum (op. cit.),
apresentam um metabolismo muito mais intenso por unidade de área quando
comparado com os ecossistemas naturais, exigindo um influxo maior de energia,
e uma grande necessidade de entrada de materiais e de saída de resíduos.
Dados da UNESCO (1975122, 1981123), apud Dias (1992b)124, dão
conta de que as demandas diárias per capita de um centro urbano são de 560
litros de água; 1,8 kg de alimentos e de 8,6 kg de combustíveis fósseis, com a

119
GOITIA, F. C. Breve história do urbanismo. 3. ed. Lisboa: Presença, 1992. 233 p.
120
LAGO, P. F. A consciência ecológica. 2. ed. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1991. 232 p.
121
DASMANN, R. F. Environmental conservation. 3. ed. New York: John Wiley & Sons, Inc., 1972. 375 p.
122
UNESCO. Task force on integrated ecological studies on human settlements within the framework of Project
11. MAB - UNEP, 1975.
123
UNESCO. Un enfoque ecológico integral para el estudio de los asentamientos humanos. Notas técnicas del
MAB 12 - PNUMA, 1981.
124
DIAS, G. F. Educação Ambiental: princípios e práticas. São Paulo: Ed. Gaia, 1992b. 399 p.
177

produção de 450 litros de águas servidas; 1,8 kg de lixo e de 0,9 kg de poluentes


do ar.
Segundo Rebouças (1994)125, para que um milhão de pessoas
possam usufruir condições modernas de conforto, levando-se em conta os
múltiplos usos da água, como fator de comodidade doméstica, de bem estar
psicológico e como matéria prima e/ou fator dos processos produtivos, gera-se
uma demanda de 4 a 5 m³/s. Por conseqüência, torna-se necessário preservar
uma bacia hidrográfica de 600 a 1200 km² para atender apenas a demanda desta
metrópole de porte médio.
As relações do homem com a natureza tornaram-se mais complexas
com o surgimento dos aglomerados urbanos. A Conferência das Nações Unidas
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Brasil, 1996, p. 83-4)126, alertou que:

[...] nos países industrializados, os padrões de consumo das cidades


representam uma pressão muito séria sobre o ecossistema global, ao passo que
no mundo em desenvolvimento os assentamentos humanos necessitam de mais
matéria-prima, energia e desenvolvimento econômico simplesmente para
superar seus problemas econômicos e sociais básicos (...), cujas condições vêm
se deteriorando, sobretudo em decorrência do baixo volume de investimentos
no setor (...). Nos países de baixa renda, apenas 5,6% em média do orçamento
do Governo central, referente a 1991, foram dedicados à habitação, lazer,
seguridade social e bem-estar social. Já nos países industrializados da
Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, no
mesmo ano, este gasto foi de 39% em média [...].

Uma das estratégias para frear o "caos urbano" é a adoção do


conceito de qualidade ambiental relativo ao estado de boa qualidade dos
ecossistemas visando alcançar o bem-estar de uma população. A qualidade de
vida urbana (v. adiante na Seção 3.6) requer a satisfação das necessidades
econômicas, liberdades civis, direitos humanos e justiça, mas também da
qualidade ambiental, que engloba, dentre outros, ar puro, água limpa, saúde e
lazer.
A Ecologia Humana se ramifica na Ecologia Urbana quando o
estudo do Homem tem por objeto o seu habitat específico, a cidade. Esta é alvo
de interesses de pesquisadores e profissionais de diversas áreas do conhecimento
- historiadores, sociólogos, biólogos, geógrafos, climatologistas, urbanistas,
jornalistas, dentre outros.
A temática urbana interessa ainda aos planejadores, aos políticos,
aos militantes das organizações de bairros – enfim, a todos os habitantes da
cidade.
125
REBOUÇAS, A. C. Água e desenvolvimento econômico. In: ÁGUAS - MANANCIAIS E USO,
SANEAMENTO E SAÚDE, POLÍTICA E LEGISLAÇÃO. Salvador: Instituto Cultural Brasil-
Alemanha/Goethe, 1994, p. 23-52.
126
BRASIL. Senado Federal. Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável: a Agenda 21 (1992: Rio de Janeiro). Brasília: Subsecretaria de Edições Técnicas, 1996. 585 p.
178

O interesse particular em observar e estudar a cidade deriva do fato


dela ser não só o lugar onde vive a maioria da população, mas também de ser o
lugar onde os investimentos de capital, de poder, de ideologia, de controle e de
informação são maiores e concentrados - tanto no desenvolvimento das
atividades urbanas como na produção da própria urbe.

3.5.2. A cidade numa abordagem geográfica

De um ponto de vista geográfico a cidade pode ser considerada


como espaço urbano, que é o conjunto de diferentes usos da terra justapostos
entre si. Por conseguinte, para Corrêa (op. cit. p. 11), a cidade capitalista é “uma
organização social - fragmentada, articulada, reflexo, condicionante social,
cheio de símbolos e campo de lutas – e um produto social, resultado das ações
acumuladas através do tempo e engendradas por agentes que produzem e
consomem o espaço”.
Na definição do autor, a fragmentação e a articulação decorrem do
fato de que cada uma das partes da cidade mantém relações espaciais com as
demais, através do fluxo de veículos, de pessoas, de decisões e investimentos
relacionados ao poder, à ideologia e ao capital. Assim, no ecossistema urbano,
onde as cargas tróficas fluem num espaço relativamente pequeno, os interesses
concentram-se no quinto (tecnotrofia ou investimento) e no sexto nível trófico
(nootrofia ou controle) segundo o modelo “bola-de-flechas”, visto na Seção
3.4.5.
As relações espaciais urbanas – fragmentadas e articuladas - são um
reflexo da sociedade de classes e seus processos, tendo por conseqüência um
forte caráter de exclusão e de segregação. Este caráter é facilmente visível nas
suas áreas residenciais - dos elitistas condomínios horizontais fechados,
passando pelos bairros e setores de classe média, aos assentamentos periféricos
de baixa renda - regulares ou irregulares. Estes, quando localizados mais
proximamente ao centro da cidade, estão em áreas invadidas e/ou de risco.
O espaço urbano é um condicionante da sociedade – continua o
autor – em virtude de que as formas espaciais (zonas industriais e comerciais) e
suas respectivas funções viabilizam a continuidade da produção econômica (ou
reprodução das condições de produção), bem como as zonas residenciais
segregadas jogam papel no processo de diferenciação das classes e dos grupos
sociais (ou reprodução das relações de produção).
Ainda considerando a definição geográfica de cidade, o seu caráter
simbólico e de campo de lutas está associado à vida cotidiana das pessoas e aos
valores, mitos e crenças criados num contexto de desigualdade sócio-espacial,
configurando um espaço privilegiado de reivindicação pelos direitos e
necessidades individuais, sociais e de destino do conjunto da espécie humana.
179

Enquanto produto social, a cidade é um processo permanente de


organização e de reorganização espacial, no qual atuam agentes concretos que
fazem e refazem o urbano. Estes agentes são:
i) os proprietários dos meios de produção (empresários industriais
ou comerciais);
ii) os proprietários fundiários (donos das terras urbanas e das terras
localizadas na periferia rural-urbana);
iii) os promotores imobiliários (incorporadores, financiadores,
construtores e/ou corretores);
iv) o Estado (nas três esferas de poder federal, estadual e municipal,
sobretudo nesta última, enquanto organizador e consumidor do espaço urbano);
v) os grupos sociais excluídos (população de baixa renda ou sem
renda - são os principais agentes que se apropriam dos solos urbanos de baixo
valor de troca e/ou áreas de risco para a construção de favelas ou para
realizarem assentamentos populares em regime de autoconstrução).
Lembra o autor citado que, apesar de haver diferenciações entre os
três primeiros agentes, há um denominador comum entre eles, sobretudo, pelo
fato de se apropriarem da renda da terra e de atuarem na reprodução das
relações capitalistas de produção, tornando-os aliados, quando não organizados
em grandes corporações. Estes agentes realizam a gestão do Estado cuja
finalidade precípua é a de mediar os conflitos sociais na ótica dos interesses
dominantes.
A cidade capitalista – continua o autor – é o local de ocorrência de
processos sociais (acumulação do capital e reprodução social) que engendram
funções (isto é, as atividades) e formas espaciais (isto é, a materialização das
atividades industriais, comerciais, de serviços e residenciais).
A viabilização das formas espaciais pelos processos sociais ocorre
graças aos processos espaciais. Estes são de caráter mutável e desigual e se
constituem de um conjunto de forças postas em ação pelos agentes modeladores,
– aqueles que fazem a locação e a relocação das atividades e da população –, do
espaço urbano.
Para o autor citado, os processos espaciais que definem a divisão
econômica do espaço urbano (indústria, comércio e serviço) e as suas
respectivas formas espaciais são:
i) Centralização – é o processo espacial inerente à dinâmica da
primeira fase do capitalismo concorrencial, onde a centralização espacial
derivava de uma dispersão de capitais, isto é, a competição entre firmas
comerciais pressupunha uma localização central. Esta força de atração relaciona-
se também a outros fatores, destacando-se os meios de transporte sobre trilhos
que, por serem inflexíveis, convergiam para o centro urbano. Daí que a forma

*
É a remuneração bruta que os proprietários fundiários obtêm em razão das propriedades da terra, além da renda
diferencial e renda de monopólio, que implicam em superlucros, decorrentes de localizações privilegiadas e
seletivas no espaço urbano (Corrêa, op. cit., p. 83-4).
180

espacial conseqüente do processo de centralização é a Área Central da cidade


com o setor CBD e com o setor zona periférica do centro;
ii) Descentralização – é o processo espacial inerente à dinâmica
da fase monopolista do capitalismo, onde a descentralização espacial deriva de
uma concentração de capitais, isto é, o grande capital em expansão demanda
novos espaços e novos mercados, pressupondo uma localização descentralizada.
Esta força de repulsão relaciona-se também a outros fatores, destacando-se os
meios de transporte mais flexíveis, não mais presos aos trilhos, como ônibus,
caminhão, automóveis. Daí que as formas espaciais conseqüentes dos processos
de descentralização são os núcleos secundários da indústria, do comércio e de
serviços, localizados fora da Área Central;
iii) Coesão – é o processo espacial caracterizado por um
movimento que leva as atividades a se localizarem juntas, visando o aumento da
lucratividade. Estes processos geram áreas especializadas, como a coesão de
firma de uma mesma ou de diferentes linhas de produto ou de produtos
complementares entre si, em um mesmo local ou em locais descentralizados.
São exemplos as ruas especializadas, os shopping centers, os distritos
especializados.
Já os processos espaciais que definem a divisão social do espaço
urbano e as suas respectivas formas espaciais, se constituem basicamente nas
diferentes formas da:
iv) Segregação – é o processo espacial que implica em separação
espacial de áreas sociais internamente homogêneas, mas segregadas entre si. É
deste mosaico de áreas com forte homogeneidade interna e com forte
heterogeneidade externa, que surge os diferentes padrões espaciais urbanos.

3.5.2.1. A estrutura interna da cidade

Para Clark (1991, p. 181)127 um dos traços mais característicos da


cidade moderna é “o seu alto nível de diferenciação interna (...) facilmente
distinguível em termos de aparência física, composição da população, aspectos
(...) e problemas sociais, que se repetem de uma cidade para outra. A existência
destes padrões residenciais e sociais similares sugere que a estrutura urbana
está determinada por princípios gerais de uso do solo e de localização”.
Como foi visto na Seção 3.5.2, a segregação residencial é o
processo espacial responsável pela separação espacial das diferentes classes
sociais fragmentadas. Esta separação – afirma Corrêa (op. cit.) – determina uma
distribuição espacial padronizada de áreas segregadas.
As principais explicações, de forma simplificada, para os padrões
espaciais de segregação residencial são as que se expõe a seguir.

127
CLARK, D. Introdução à Geografia Urbana. 2. ed. Tradução de Lúcia Helena de O. Gerardi e Silvana Maria
Pintaudi. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1991. 286 p.
181

i) Teoria das zonas concêntricas de Kohl: formulada em 1841


pelo geógrafo alemão J. G. Kohl, com base no padrão espacial das cidades pré-
industriais da Europa Ocidental. A distribuição espacial dos grupos sociais de
maior para os de menor poder aquisitivo obedece ao modelo centrípeto “centro-
periferia”. As camadas sociais privilegiadas ocupam a Área Central, onde se
localiza a fonte de poder e de prestígio, enquanto as camadas desprivilegiadas
distribuem-se na periferia urbana (figura 55a).
ii) Teoria das zonas concêntricas de Burgess: formulada em
1925 pelo norte-americano Ernest W. Burgess, um dos expoentes da Escola de
Ecologia Humana da Universidade de Chicago, com base no padrão espacial das
cidades industriais norte-americanas, no qual a população de menor renda reside
na área central e a elite na periferia.
No início do século XX o sistema de comunicação de longa
distância estava baseado no transporte sobre trilhos. A localização dos terminais
ferroviários na Área Central exerceu um forte fator de coesão para diversas
atividades industriais e comerciais. Como estas são geradoras de poluição
atmosférica e sonora, a Área Central se transformou em zona inadequada à
moradia. Daí, a elite abandonou o centro urbano – que passou a ser ocupado
pelas camadas de menor poder aquisitivo – indo segregar-se nos subúrbios da
periferia, em área dotadas de amenidades. A industrialização, nas cidades
americanas, portanto, provocou uma inversão do padrão de Kohl, estabelecendo
um modelo centrífugo “periferia-centro” (figura 55b).
iii) Teoria setorial de Hoyt: formulada em 1939 pelo economista
norte-americano Homer Hoyt. Segundo esta teoria, a elite se apropria do espaço
de maior valor de uso e de troca, de acordo com um “modelo setorial”,
explicado pela concentração de usos do solo similares ao longo de vias radiais
de acesso e em direção aos espaços urbanos dotados de amenidades como praias
e parques (figura 55c).

1 3
2 2
3 1

a) Kohl b) Burgess c) Hoyt


Teorias das zonas concêntricas Teoria setorial
Figura 55 – Diagrama de três modelos de padrões espaciais urbanos, determinados pela
segregação residencial, conforme o status social: (1) alto, (2) médio e (3) baixo.
182

O solo urbano é uma mercadoria como outra qualquer e como tal –


afirma Marx (1988, p. 45-78)128 – “possui um duplo valor: de uso e de troca,
dialeticamente relacionados”. O primeiro está relacionado à utilidade da
mercadoria, que é a sua aptidão em satisfazer ou responder às necessidades dos
cidadãos, da população urbana, como a habitação. O segundo, está relacionado à
medida de troca, isto é, às formas aparentes (relativa, equivalente e dinheiro)
que uma mercadoria adquire para ser trocada no mercado.
Sendo o espaço urbano um conjunto de usos do solo justapostos
entre si e que, enquanto mercadoria que se realiza como valor de uso e de troca,
através da circulação, desigualmente distribuída, pode-se dizer que os padrões
espaciais refletem as estruturas sociais urbanas. Mais ainda, os geógrafos
urbanos afirmam que a segregação é um processo que caracteriza as cidades não
só no capitalismo, mas em todas as fases da história do urbanismo, seja a cidade
asteca, a medieval, a renascentista, a colonial ou a moderna. A segregação
residencial é um produto da existência de classes sociais, sendo a sua
espacialização no urbano. Em outras palavras, a segregação residencial é a
expressão espacial da segregação social (GOITIA, op. cit; CORRÊA, op. cit.;
CLARK, op. cit.).
Além disso, a reprodução social ocorre via áreas sociais
segregadas. É num ambiente de homogeneidade social, espacialmente
segregado, formando nichos funcionais configurados, com práticas sociais e
estilo de vida comum e padronizado, que se reproduz as relações sociais de
produção. Através da segregação residencial, as classes dominantes mantêm o
controle social sobre outros grupos sociais para que eles continuem a
desempenhar os papéis que lhe são destinados dentro da divisão social do
trabalho.
Para Harvey (1980)129, o urbanismo encontra-se no seu terceiro
estágio de desenvolvimento – a cidade industrial – sucessora da cidade
comercial e da cidade política. O primeiro estágio – a cidade política –
desempenhou a função principal de força política, ideológica e militar para
manter um padrão particular de relações sociais de produção.
No atual estágio industrial, argumenta o autor, a cidade como forma
edificada e o urbanismo como modo de vida são conceitos que deixaram de ser
sinônimos. O urbanismo, apesar do seu caráter de entidade auto-suficiente,
dentro da dialética do processo social-forma espacial, expressa e modela suas
relações com outras estruturas da totalidade, além de possuir suas próprias leis
de transformação, bem como de princípios básicos de organização social.

128
MARX, K. O capital: crítica à economia política.Tradução de Regis Barbosa e Flávio R. Kothe. 3. ed. São
Paulo: Nova Cultura, 1988, v. I.
129
HARVEY, D. A Justiça Social e a Cidade. Tradução de Armando Corrêa da Silva. São Paulo: Hucitec, 1980.
316 p.
183

A organização social é o espaço socialmente produzido ou a


natureza transformada pelo trabalho social, de acordo com o desenvolvimento
das forças produtivas e das relações de produção de cada sociedade.
Nesse quadro conceitual, as forças produtivas são um aspecto
material da produção social, constituindo-se num indicador do grau do
desenvolvimento de uma sociedade, graças à ciência e à tecnologia. Elas
expressam a relação de transformação mútua que se estabelece entre o Homem e
a Natureza, no processo de produção de bens materiais. Para isso, as forças
produtivas movimentam o conjunto dos meios de produção e das forças de
trabalho**.
As relações de produção expressam a relação Homem-Homem no
processo de produção e são determinadas não só pela forma de propriedade dos
meios de produção, mas também por uma rede bastante complexa de relações
interdependentes como a divisão de trabalho entre os homens e como a divisão
social entre a cidade e o campo. Essas divisões são marcadas pelas contradições
crescentes entre força de trabalho e detentores dos meios de produção e entre
produtor rural e consumidor urbano, respectivamente.
Na síntese do autor citado, o urbanismo no estágio da sociedade
industrial expandiu rumo ao meio rural, diminuindo o clássico antagonismo
campo-cidade. Mas, a sociedade industrial fez emergir novos antagonismos
como a eliminação dos estilos regionais de vida rural; a ruralização subsidiária
da cidade em conseqüência da urbanização do campo; a substituição do espaço
efetivo (isto é, a diferenciação geográfica a partir da heterogeneidade natural de
recursos e de ambientes) pelo espaço criado (constituição antrópica de um
sistema de recursos de significação econômica, social, política e simbólica); a
distinção cada vez mais difícil entre o público e o privado (HARVEY, op. cit., p.
247-70).
Daí que, frente aos desafios do urbanismo da sociedade industrial –
conclui o autor – os geógrafos urbanos têm “a oportunidade de criar espaço, de
fortalecer criativamente as forças que trabalham para a diferenciação urbana.
Mas, para agarrar estas oportunidades temos que defrontar as forças que criam
cidades como ambientes estranhos (...) e mudar o caminho de um urbanismo
baseado na exploração para um urbanismo apropriado à espécie humana”
(HARVEY, op. cit., p. 270).

*
Meios de produção: são os instrumentos de trabalho (ferramentas, máquinas e as condições materiais de
trabalho como construções, instalações e meios de transporte) considerados em conjunto com os objetos de
trabalho (as coisas sobre as quais o homem atua no processo de produção como madeira e minérios).
**
Forças de trabalho: representam a totalidade das condições físicas e mentais do homem, que são
aperfeiçoadas pela habilidade e pela experiência, para realizar um determinado objetivo.
184

3.5.3. A cidade numa abordagem ecossistêmica

O modelo “bola-de-flechas” proposto por Dansereau (v. Seção


3.4.5) se aplica também ao ecossistema urbano. Neste meio os influxos de
investimento e de controle são intensos, como já foi exposto. Os diagramas da
figura 56 ilustram as diferenças no fluxo de energia e matéria entre um ambiente
dominado por processos ecológicos baseados nos níveis fitotróficos (uma
floresta) e um ambiente urbano onde a circulação de recursos, bens e
informações predominam nos níveis tecnotróficos e nootróficos. A diferença de
intensidade de cargas tróficas entre eles está em que, na cidade (figura 56a), a
maior carga está nos níveis V (tecnotrofia) e VI (nootrofia); na floresta (figura
56b), no nível II (fitotrofia). Para maiores detalhes sobre os níveis tróficos ver
figura 52 (Seção 3.4.5).

Figura 56 – Diagramas de representação de dois ecossistemas, um cultural (cidade) e um


natural (floresta), ilustrando as diferentes intensidades de cargas tróficas
(RIBEIRO & VIEIRA, op. cit., p. 567)

O ecossistema de uma igreja, por exemplo, com base na


classificação ecológica dos espaços e no modelo “bola-de-flechas” pode ser
representado através da seguinte fórmula:

F 4 De / VI , V

Sendo: F – painel (fase cibernígena); 4 – bloco (instituição); De –


tipo religioso, subtipo igreja; VI, V – níveis tróficos dominantes (controle e
investimento).
Mas Dansereau aplicou o seu modelo também para diagnosticar e
avaliar o desenvolvimento de cidades de diferentes dimensões e contextos
evolutivos. Por exemplo, Calcutá na Índia e Nova Iorque, nos Estados Unidos da
América.
O diagrama da figura 57 mostra as diferentes repartições dos
recursos entre as duas cidades superpopulosas citadas. Analogamente ao da
185

figura 54 (Seção 3.4.5), o “bolo-do-ambiente” de uma cidade que se localiza


num contexto de menor capacidade concorrencial – Calcutá – possui níveis de
satisfação inferiores para a maioria das necessidades da população, em
comparação com aquela de fase mais evoluída ou cibernígena, que é Nova
Iorque.

Figura 57 – “Bolo-do-ambiente” para duas cidades altamente adensadas localizadas em


contextos evolutivos diferentes (DANSEREAU, 1999b, p. 284)

Na figura 58 estão valoradas as satisfações dos grupos de


necessidade que constituem o “bolo-do-ambiente”. Nas ordenadas dos gráficos
estão gravados os escores de cada grupo, demonstrando que na cidade indiana
ocorrem vários níveis de privação e não se verifica nenhum nível de satisfação
excedente. Na metrópole americana, por sua vez, apesar da existência de
privações, verificam-se escores elevados de níveis de satisfação excedente,
sobretudo no aspecto da informação e da cultura.
Deduz-se das informações contidas nos diagramas do modelo
“bola-de-flechas”, que os ecossistemas urbanos possuem uma estrutura
funcional que se coaduna com os enunciados dos geógrafos urbanos sobre o
espaço urbano e seus conceitos correlatos, referentes à unidade dialética de
processos e formas espaciais, refletindo as etapas evolutivas das organizações
sociais – e a cidade é a mais especial delas - na escalada do impacto humano.
186

Figura 58 – Satisfação relativa de necessidades para dois assentamentos humanos: Nova


Iorque (em cima) e Calcutá (em baixo). Na ordenada, os escores dos graus de satisfação (de 1
a 4); na abscissa, as necessidades (de 1 a 32). A satisfação de cada grupo está valorada pela
soma dos escores das necessidades que o constitui (DANSEREAU, 1999b, p. 286)

3.5.4. A cidade numa abordagem biológica

A abordagem biológica do urbanismo baseia-se na contribuição de


Henri Laborit, um reconhecido pesquisador dos mecanismos dos seres vivos,
que desenvolveu a técnica da hibernação artificial e produziu tranquilizantes e
outras importantes drogas no domínio da anestesia, da cardiologia e da
psiquiatria. Suas descobertas revolucionaram os conceitos da medicina nos
meados do século XX.
Para Laborit (op. cit.), de acordo com a teoria dos sistemas e com a
ciência cibernética, a cidade se constitui numa produção humana, mais
especificamente, é o produto de um efetuador – o grupo social que a constitui ou
constrói. Segue daí a premissa do autor para essa abordagem de que, antes da
sociologia urbana, deve-se compreender a biologia humana, como suporte de
análise do urbano!
O quadro teórico da visão biológica de Laborit foi exposto nas
Seções 3.4.3 e 3.4.4. De acordo com o enunciado cibernético, a cidade é o efeito
187

do efetuador. Este é o grupo social. A cidade reage sobre a estrutura sócio-


econômica que a originou – o grupo social –, através de mecanismos auto-
reguladores, tentando controlar os fatores que atuam sobre o seu equilíbrio
interno (v. figura 59).
Fator ecológico Retroação

Fator técnico-histórico Grupo


Cidade
social
Fator informativo

Figura 59 – Diagrama cibernético de representação da cidade (LABORIT, 1990, p. 21)

Como foi visto na Seção 3.4.4, nos sistemas auto-regulados, todo


efetuador possui uma finalidade, pois ele está programado para isto. A
finalidade de um grupo humano não é propriamente construir uma cidade. Como
estrutura viva, a finalidade do grupo social será sempre a de conservar a sua
estrutura. Portanto, a cidade é um meio utilizado por este organismo social para
conservar a sua própria estrutura. A cidade torna-se ela própria um efetuador,
através do qual se difundem informações, se criam e se satisfazem necessidades,
visando o controle e a reprodução da estrutura sócio-econômica que a fez
nascer.
Nesta abordagem do urbanismo, importa considerar a noção da
dupla dimensão humana, enquanto ser biológico e enquanto ser cultural. Ambas
as dimensões se relacionam mútua e dialeticamente entre si, formando um todo
complexo, que se expressa na dinâmica da organização social. Na primeira
dimensão, estuda-se a espécie como produto e coroamento da evolução
biológica – um ser dotado de características altamente complexas, de atributos
peculiares de imaginação, associação e prospecção proporcionados pela elevada
capacidade do cérebro humano.
Já a segunda dimensão - cultural - é temporal ou histórica. Na visão
ecossistêmica “[...] muito daquilo que os antropólogos reconhecem como a
‘dimensão cultural’ deve ser agora redefinido como sendo algo que desempenha
também uma função ambiental [...]” (DANSEREAU, 1999d, p. 162)130.
Nesse sentido, cabe retomar a concepção da cidade como um
sistema auto-regulador. No diagrama da figura 60 vemos as interações que
ocorrem entre os constituintes deste sistema: i) a cidade como efeito do grupo
social; ii) a retroação da cidade sobre o grupo social; iii) a retroação da cidade
sobre os fatores (o ambiente, as necessidades e as informações); iv) o comando
exterior ao sistema tendendo ao servomecanismo.

130
DANSEREAU, P. 1999d. Impacto ecológico e ecologia humana. In: Ribeiro & Vieira, op. cit., p. 125-183.
188

ou efetuador

Figura 60 – Diagrama da cidade como um sistema regulado em tendência: efetuador ou


atuador - grupo social; efeito – cidade; fatores - ambiente, necessidades e informações;
servomecanismo – comando externo ao sistema (LABORIT, 1990, p. 23)

A cidade é o efeito do efetuador, isto é, é o produto do grupo social


que a originou. O grupo social não é homogêneo. Ao contrário, ele é
heterogêneo e segregado em classes sociais que se diferenciam principalmente
em função do domínio sobre os meios de produção e da participação nos postos
diretivos da estrutura social. Já foi dito que a finalidade de todo organismo vivo
e auto-regulador é a sua sobrevivência. E que, para isso, o efetuador atua em
constância. Na sociologia urbana – afirma Laborit (op. cit.) – o efetuador é um
grupo humano organizado, cuja estrutura, essencialmente, é a resultante das
estruturas biológicas individuais. O efetuador urbano é, assim, uma entidade
viva que, embora dotado de uma complexidade organizacional superior ao
organismo individual, está condicionado às mesmas leis biológicas que regem o
indivíduo.
Numa sociedade segregada socialmente, o efetuador se constitui
nas classes e nos segmentos sociais dominantes que transformam a cidade num
meio para assegurar a reprodução da estrutura socioeconômica. Essa
reprodução, no capitalismo, ocorre mediante a obtenção do lucro e da
acumulação do capital. Por exemplo, explorando o espaço urbano pela venda de
espaços construídos e não construídos e até mesmo do patrimônio público.
Sendo assim, a finalidade do efetuador é obter um valor máximo do efeito. Por
conseqüência, a regulação do sistema deixa de ser em constância e passa ser em
tendência (v. Seção 3.4.4).
189

De acordo com Laborit (op. cit.), a Revolução Neolítica


transformou a cidade num lugar de trocas de mercadorias e com a Revolução
Industrial a cidade assumiu a função de alojar as indústrias e a força de trabalho.
O desenvolvimento do setor secundário (industrial) fez convergir para a cidade
diversas atividades econômicas, florescendo um vasto setor terciário ou de
serviços.
Entretanto, a urbanização acelerada e intensa acarretou problemas
sociológicos, no que tange ao relacionamento dos indivíduos entre si e
problemas ecológicos em virtude da relação da espécie humana com o seu novo
meio. Esses problemas refletem a retroação da cidade sobre o efetuador ou
grupo social e sobre o meio ambiente. A principal retroação, no aspecto
sociológico, é a segregação social (v. Seção 3.5.2.1). No aspecto ecológico, é a
poluição e a degradação dos recursos naturais, não só no meio intra-urbano, mas
também, no seu entorno e no meio rural, pelos resíduos urbanos que são
produzidos e exportados.
A retroação da cidade sobre os demais fatores consiste em que a
cidade como meio de produção e de consumo é o local apropriado para criar
necessidades. Estas são orientadas para manter a estrutura socioeconômica
dominante cuja finalidade é o lucro. O fator informação consiste em levar ao
conhecimento das amplas massas consumidoras os objetos, os símbolos e as
idéias que geram as necessidades e facilitam ou suprimem a imaginação, de
acordo com a finalidade do efetuador.
Os meios de comunicação de massa ou mass média são eficazes e
rápidos na difusão de uma enorme quantidade de informação (Xifra-Heras, op.
cit.). No entanto, segundo Laborit (op. cit.), a informação é um fator que as
frações dominantes do grupo social manipulada e controla, com a finalidade do
aumento do consumo, da mais-valia e do lucro, por meio dos quais mantêm o
seu domínio sobre a estrutura socioeconômica.
Pelo exposto, de acordo com a conclusão de Laborit (op. cit.), a
estrutura da sociedade humana é sempre a conseqüência do domínio de uns
grupos ou indivíduos sobre outros e que todas as regulações usadas por estas
estruturas não farão mais do que acentuar as suas características de dominação.
Portanto, trata-se de uma regulação em tendência, cuja finalidade é alcançar o
valor máximo do efeito. Sendo a cidade apenas um meio para alcançar o lucro,
na regulação em tendência a manutenção da estrutura deixa ser a finalidade
principal, pois, segundo Laborit (op. cit, p. 203), “[...] tudo o que aumenta o
lucro se torna um fim [...]”. Sobrevém assim a perspectiva da crise urbana.
No entanto, aduz ainda o autor, por analogia com os sistemas
orgânicos auto-reguladores, nos quais, de acordo com o conceito de finalidade, a
sobrevivência de um órgão ou subconjunto passa pela de todo o organismo ou
conjunto, da mesma forma a sobrevivência das frações dominantes do grupo
humano passa pela da espécie a qual pertence; e a sobrevivência desta depende
da do planeta. Para Laborit (op. cit.) essa é a idéia que justifica a adoção de um
190

controle externo ao sistema regulador em tendência, submetendo-o a


servomecanismos que irão intervir sobre o arco retroativo, fixando nova
finalidade, numa regulação em constância. Isto é, a finalidade da estrutura
socioeconômica será a manutenção dela própria, como alternativa ao controle da
poluição e dos desequilíbrios ambientais.
Os servomecanismos baseiam-se em normas e padrões de emissão
de poluentes, em equipamentos e tecnologias ambientalmente limpas, em
reciclagens dos recursos ambientais, em normas técnicas e legais de combate à
poluição, em medidas preventivas não só do ponto de vista tecnológico, mas,
sobretudo, da formação de uma nova concepção do relacionamento do homem
com o meio ambiente. Enfim, os servomecanismos concretizam os princípios de
uma política de desenvolvimento sustentável sendo, portanto, um produto da
imaginação criativa e associativa do neocórtex.

3.5.5. A cidade numa abordagem bioclimática

A abordagem desenvolvida nesta Seção fundamenta-se no trabalho


de Monteiro (1976), que formulou uma metodologia para o equacionamento dos
problemas ambientais urbanos brasileiros, baseada na climatologia. Esta
metodologia foi aplicada em inúmeras cidades, representando uma importante
contribuição ao planejamento urbano brasileiro.
O autor estudou o clima urbano segundo a funcionalidade sistêmica
de Bertalanffy. Utilizando a Teoria Geral dos Sistemas (TGS – v. Seção 3.4.2) e
o conceito de Cibernética (v. Seção 3.4.3) - um sistema particular formulado por
Wiener -, o autor estabeleceu um quadro de referência teórica para o estudo
climático das cidades, a partir do qual formulou hipótese de trabalho,
objetivando encontrar explicação, fazer previsão e realizar o controle dos
fenômenos de clima urbano. O clima urbano é um sistema complexo e singular
que abrange ao mesmo tempo um fato natural (o clima local) e um fato social (a
cidade). Como sistema aberto importa energia, submetendo-a a transformações
internas com sucessivas mudanças de estados, gerando produtos que são
exportados (Monteiro, 1976).
O Sistema Clima Urbano (SCU) concebido pelo autor citado é
estruturado pelo operador e pelo operando. O primeiro é formado pelos
elementos climáticos, sendo que a entrada de energia, oriunda do sol, de
natureza térmica, exerce efeitos decisivos sobre o organismo urbano, implicando
em outros componentes dinamicamente relacionados à circulação atmosférica e
hídrica. O operando é todo elemento urbano não atmosférico, e.g., a
comunidade social e a arborização urbana que se concretiza no espaço urbano,
estruturado em partes inter-relacionadas e dinâmicas.
A interação entre os elementos operadores do SCU resulta numa
produção variada e heterogênea, como poluição do ar, ilha de calor, inundações,
etc. É a retroação da cidade, enquanto operador, sobre o meio ambiente. Para
191

Monteiro (1976) a apreensão e análise desse sistema pelo homem urbano devem
ser feitas a partir dos canais de percepção (conforto térmico, qualidade do ar e
impacto meteórico) que os indivíduos possuem aos elementos operadores
perceptíveis, integrantes de subsistemas correspondentes (termodinâmico, físico-
químico e hidrometeórico). A tabela 23 mostra as articulações destes
subsistemas com os canais de percepção humana.

Tabela 23 – O Sistema Clima Urbano (SCU) e as articulações dos subsistemas de acordo com
os canais de percepção humana
Subsistemas e I - Termodinâmico II- Físico-Químico III-Hidrometeórico
Canais
Conforto térmico Qualidade do ar Impacto meteórico
Caracterização
atividade urbana;
atmosfera;
atmosfera; radiação; veículos automotores;
Fonte estados especiais
circulação horizontal indústrias;
(desvios rítmicos)
obras-limpeza
ilha de calor; ventilação;
Produtos poluição do ar ataques à integridade urbana
aumento de precipitação
problemas sanitários;
desconforto; redução do problemas de circulação e
Efeitos diretos doenças respiratórias e
desempenho humano comunicação urbanas
oftalmológicas
aperfeiçoamento da infra-
controle do uso do solo;
Reciclagem vigilância e controle dos estrutura; regularização
tecnologia de conforto
adaptativa agentes de poluição fluvial; uso adequado do
habitacional
solo
Correlações engenharia sanitária; engenharia sanitária;
bioclimatologia; arquitetura;
disciplinares e engenharia ambiental; engenharia ambiental;
urbanismo; ecologia
tecnológicas química ambiental infra-estrutura urbana
Fonte: adaptado de Monteiro (1976, p. 127)

O autor assevera que a estrutura urbana possui um desenvolvimento


dinâmico e evolutivo e que, em função do operando do sistema (elemento
homem), as formas urbanas (v. Seção 3.5.2) se sucedem temporalmente umas
às outras. Graças a isso, o sistema está sujeito à auto-regulação, na medida em
que o operando, ao detectar suas disfunções, intervenha por via do
servomecanismo (v. Seção 3.5.4) visando sua readaptação e recondução às
metas do desenvolvimento sustentável.

3.6. ESPAÇOS LIVRES, ÁREAS VERDES E QUALIDADE DE VIDA

3.6.1. Conceitos e definições

De acordo com Milano (1992)131, os espaços livres, as áreas verdes


e a arborização urbana são conceitos bastante correlacionados. Os espaços
livres são áreas não edificadas com potencial para se transformarem em áreas
verdes. Toda área verde é um espaço livre, não sendo verdadeira a recíproca.

131
MILANO, M. S. As cidades, os espaços abertos e a vegetação. In: ENCONTRO BRASILEIRO SOBRE
ARBORIZAÇÃO URBANA, 4, 1992, Vitória, Anais... Vitória: SBAU, 1992, p. 3-14.
192

Um determinado espaço livre poderá transformar-se em área verde se nele, por


exemplo, for implantada uma praça, ou poderá permanecer como tal se, ao
contrário, for construído um estacionamento com superfície impermeabilizada e
com inadequada cobertura vegetal. A arborização urbana, por sua vez, é o
conjunto de áreas públicas e privadas com vegetação em estado natural ou
predominantemente arbórea.
Para Lapoix (op. cit.) os espaços abertos ou externos são os espaços
não construídos que não se destinam à implantação de obras de infra-estruturas
no interior e nas proximidades dos setores reservados à construção. Por este
conceito bastante amplo, nesta categoria de espaço podem ser incluídos os
parques, bosques, jardins, florestas naturais e áreas verdes, as superfícies
cobertas por água, praças e áreas destinadas à prática esportiva, as ruas, estradas,
alamedas, passeios e caminhos. Na definição do autor, estes espaços podem ser
públicos ou particulares, localizados tanto na zona urbana como na rural.
Lima et al. (1994)132 tentaram encontrar convergências na
conceituação dos termos técnicos acima discutidos, concluindo que o termo
mais abrangente é o de Espaço Livre, que se contrapõe ao termo Espaço
Construído, em áreas urbanas. O estudo citado concluiu que “tal conceito tem
que ser integrado ao uso do espaço, sua escala e função, devendo esta última,
satisfazer três objetivos principais: ecológico, estético e de lazer” (Lima et al.,
op. cit., p. 579).
Do ponto de vista do uso e parcelamento do solo urbano, a
legislação brasileira, desde a vigência do Decreto-lei nº 58, de 10/12/1937,
passando pelo Decreto-lei nº 271, de 28/02/67 até a atual Lei nº 6.766, de
19/12/1979, estabeleceu as categorias de espaços livres e vias de comunicação.
A interpretação destas leis pelos tribunais de justiça consolidou uma
inequívoca jurisprudência a respeito do patrimônio público urbano, como a
seguir citada:

[...] A aprovação do loteamento pela Prefeitura tem o efeito imediato de tornar


as vias de comunicação e os espaços livres, tanto aqueles destinados ao uso da
comunidade, como todo e qualquer espaço vazio ou vago, sem numeração,
constantes da planta e do memorial descritivo, em bens de domínio público
inalienáveis a qualquer título, e, a fortiori, fora do comércio, sendo vedado dar-
se lhes qualquer outra destinação [...] (DJ nº 11592 de 15/06/93, p. 4; DJ nº
11766 de 8/02/94, p. 14; DJ nº 12269 de 15/03/96, p. 12; DJ nº 12579 de
19/06/97, p. 4; DJ nº 12642 de 16/07/97, p. 4).

As vias de comunicação são as avenidas, alamedas, ruas e vielas


que se destinam ao sistema de comunicação viário. Os espaços livres são os
bens públicos enquadrados pelo artigo 66 do Código Civil como de uso comum
132
LIMA, A.M.L.P.; CAVALHEIRO, F.; NUCCI, J.C.; SOUSA, M.A.L.B.; FIALHO, N.O.& DEL PICCHIA,
P.C.D. Problemas de utilização na conceituação de termos como espaços livres, áreas verdes e correlatos. In:
ENCONTRO NACIONAL SOBRE ARBORIZAÇÃO, 5, 1994. São Luís, Anais...São Luís: SBAU, 1994, p.
539-54.
193

da população. São os parques, bosques, jardins de representação, praças, áreas


verdes e outros espaços não construídos, vegetados ou não, destinados ao
necessário equilíbrio do meio ambiente urbano.

Tabela 24 – Classificação dos espaços abertos, segundo Vieira (1994)


Quanto à (ao) Espaços Descrição/Exemplos
Canais Ruas; avenidas; vielas
Abertos Praças; parques; alamedas
Paisagísticos –vazios urbanos;
Tipologia Livres Naturais – parques e florestas;
Arquitetônicos – pátios; miolos de quadras
Áreas livres – praças internas;
Fechados
Arquitetônicos – claustros e vazios de projeto
De dominância vegetal Áreas com cobertura natural do solo (vegetação ou
(Espaços verdes) massas d’água) – locais de parada, passeio e lazer
Áreas cuja porção maior é constituída de elementos
De dominância mineral
Forma construídos – locais de trocas, animação,
(Espaços livres)
equipamentos, habitação, comércio
Áreas com cobertura do solo em parte natural e
Plantado
outra artificial
Locais de Encontro ou de Atividade – praças;
largos; pátios;
De estar urbano
Locais de Lazer ou de Repouso – parques, jardins
Uso
públicos, margens de rios e lagos
Vias de circulação de veículos e de pedestres –
Rede viária
ruas, avenidas, vielas
Fonte: adaptado de Vieira (1994, p. 13-16)

Os espaços livres são também os bens públicos enquadrados pelo


artigo 67 do Código Civil como de uso especial, isto é, os equipamentos
públicos. Estes podem ser subdivididos em Urbanos e Comunitários. Os
Equipamentos urbanos referem-se a abastecimento de água, serviços de esgotos,
energia elétrica, galerias de águas pluviais, rede telefônica e gás canalizado (§
único do art. 5º da Lei nº 6.766/79). Os Equipamentos comunitários são os que
se relacionam à educação, cultura, saúde, lazer, esporte, recreação e similares (§
2º do art. 4º do mesmo diploma legal).
Além disso, o loteamento deve ser dotado de proporcionalidade
entre áreas públicas (sistema viário, equipamentos públicos e espaços livres) e
áreas privadas. Essa proporcionalidade foi fixada pelo § 1º, do art. 4º da Lei nº
6.766/79 com base num percentual mínimo de 35% de áreas públicas do total da
gleba loteada. No entanto, este e outros dispositivos que fixavam índices
urbanísticos foram alterados pela Lei nº 9.785, de 29/01/99, deixando ao
encargo dos municípios a fixação de percentuais mínimo e máximo, de acordo
com as leis municipais e com o planejamento local. Desde o primeiro Plano
Diretor de Goiânia, as diretrizes de planejamento urbano consagraram um
percentual de 35% de espaços livres públicos.
194

3.6.2. Os espaços livres na história das cidades

A história dos espaços livres se confunde com a história da própria


cidade. A praça como espaço aberto ou livre, tem como ponto inicial de
referência o conceito de ágora que, no dizer de Mumford (1982, p. 166)133, “[...]
é o centro dinâmico da cidade grega, um local de assembléia aonde a gente da
cidade ia-se reunir [...]”. Essa função social do espaço livre permaneceu nas
cidades dos países latinos como descendente direto do ágora grego.
Nas cidades-estado da Grécia existiam a cidade alta ou acrópole
com seus templos e prédios sagrados; e a cidade baixa onde se localizava a praça
pública ou ágora.
O Fórum Romano seguiu a tradição do ágora grego, sendo mais
que uma praça aberta, um recinto de traçado regular com santuários, templos,
prédios de justiça e casas do conselho, circundados por majestosas colunatas.
Mumford (op. cit., p. 244), esclarece que “o Fórum Romano era, assim, uma
combinação de ágora e acrópole” refletindo a ordem militar e o poder absoluto
dos governantes romanos.
Na cidade medieval a praça do mercado

[...] reinvestiu as funções do antigo ágora grego e do Fórum Romano, onde


também se situava a catedral e os edifícios característicos da organização da
sociedade (...). [Todas as atividades convergiam para ela], desenvolvendo as
funções culturais, políticas e de socialização [...] (MUMFORD, op. cit., p.
334).

Na maior parte das cidades medievais se encontrava um bairro ou


núcleo central rodeado por uma série de anéis irregulares, circundando-o e
protegendo-o. Segundo o autor supra, essa forma espacial foi gerada por forças
opostas de atração e de proteção: os edifícios públicos e as praças abertas
encontram segurança por trás de um labirinto de ruas que convergiam
irregularmente para eles.
Esse padrão medieval foi suplantado pelos urbanistas barrocos que
traçaram as ruas em direção ao centro da cidade, na clássica forma do asterístico
(radial concêntrico). Salienta o autor que há exceções ao padrão medieval, pois
se verificam “[...] presbitérios e igrejas de aldeias que são edifícios livres,
levantados no meio de um campo verde aberto à feição de parque, como o que
existe em frente de Notre Dame, em Paris [...]” (MUMFORD, op. cit., p. 333).
A cidade medieval não desapareceu com o fim da vida medieval no
século XVI. Algumas das suas instituições se renovaram no século seguinte,
como revela a arquitetura gótica e neogótica (VIEIRA, op. cit.).
A Peste Negra do Século XVI – uma doença epidêmica grave que
dizimou milhares de pessoas na Europa – causou uma profunda alteração nas
133
MUMFORD, L. A cidade na história: suas origens, desenvolvimento e perspectivas. Tradução Neil R. da
Silva. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1982. 741 p.
195

instituições medievais, determinando uma nova ordem que se tornou visível no


século seguinte. Os urbanistas e construtores renascentistas modificaram a
estrutura da cidade medieval, executando planos com ruas retas e espaços
abertos.
Paradoxalmente à tendência de maior higienização e humanização,
o surgimento e desenvolvimento do Estado Moderno e da tecnologia exerceram
sobre a cidade influência decisiva. Como até o século XVI a defesa
predominava sobre o ataque, as cidades localizavam-se estrategicamente em
colinas inacessíveis ou encostas. Com o avanço da “arte de guerrear”, a nova
artilharia tornou vulnerável o aglomerado urbano, que a partir de então começou
a se fortificar. As novas fortificações afastaram para longe da urbe os jardins,
pomares e praças. Mumford (op. cit., p. 391) afirma que “[...] os espaços abertos
foram cobertos por construções, destruindo os padrões medievais das cidades
que assumiram um padrão militar [...]”.
Ao mesmo tempo - afirma o autor - a mudança de uma economia
baseada na troca de mercadoria para uma economia monetária aumentou
grandemente os recursos do Estado, impulsionados pelo capitalismo militarista e
pelo imperialismo colonialista. As instituições refletiram a nova base econômica
e revolucionaram os conceitos, como o do espaço urbano, organizado de forma
contínua e associado ao movimento e ao tempo. Na cidade barroca, a avenida
viabiliza a mais importante função urbana, servindo aos interesses militares da
nova ordem. Exemplifica esta tendência a destruição de castelos e bairros
inteiros para a construção de amplos bulevares em Paris a mando de Napoleão
III.
Com o desenvolvimento da larga avenida, a segregação entre as
classes sociais toma forma na própria cidade: de um lado, os ricos transitam pelo
largo leito da via; de outro, os pobres se arrastam pela estreita calçada. “[...] A
unidade de planejamento da cidade barroca passou a ser a rua e não a vizinhança
ou o bairro [...]” (MUMFORD, op. cit., p. 424).
Do mesmo autor a idéia de que a cidade barroca, como herdeira das
idéias renascentistas, exprimiu esta herança no traçado radial-concêntrico, com
avenidas radiais partindo de uma praça central – expressão da exaltação à
monarquia centralista.
A Revolução Industrial no século XIX alterou fortemente o espaço
urbano. As fábricas tornaram-se donas do solo urbano e suburbano. A escalada
humana avançou para a completa substituição dos recursos naturais. Nos seus
primórdios, a industrialização superpovoou as cidades européias, espalhando a
degradação social e a poluição ambiental. Neste contexto, no final do século
XIX, surge a ciência do urbanismo para disciplinar os exageros da
industrialização: Camillo Sitte (1848-1903), Tony Garnier (1869-1948) e
Ebenezer Howard (1850-1928) vêem os parques urbanos como soluções
“sanitárias” (VIEIRA, op. cit.).
196

Em meados do século XX, em sintonia com o desenvolvimento da


sociedade industrial, desenvolveu-se o conceito das funções urbanas: i) habitar;
ii) trabalhar; iii) locomover-se; iv) recrear-se. Esta última função resguarda a
existência dos espaços livres urbanos. No entanto, tal como na transição da
cidade medieval para a barroca, os espaços livres – apesar do indubitável avanço
ocorrido e sob condição histórica diversa – muitas vezes são tratados como
“sobras” pelos administradores da cidade.

3.6.3. Alguns indicadores censitários da qualidade de vida urbana

A população urbana brasileira aumentou 165% em 30 anos,


passando de 52 milhões de pessoas em 1970 para 137,8 milhões no ano 2000. A
taxa atual de urbanização é de 81,2%. Ocupando uma área de 43.908,8 km², as
nove regiões metropolitanas (São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Belo
Horizonte, Fortaleza, Brasília, Curitiba Recife e Porto Alegre) abrigam 1/3 da
população total, num espaço geográfico de apenas 0,52% do território nacional.
Há, portanto, uma forte pressão sobre a capacidade suporte dos
ecossistemas urbanos. Estes estão submetidos a intensas demandas por recursos
e a fortes impactos ambientais, por um lado e a crescentes déficits de infra-
estrutura, habitação, educação e de saúde pública, por outro lado. Essa
preocupação torna urgente a necessidade de formulação de políticas e estratégias
para adequar o meio urbano ao bem-estar da sua população.
O crescimento das metrópoles, mesmo se for meramente vegetativo
tende a ocorrer acima da capacidade das bacias hidrográficas suprirem a
demanda de abastecimento público. Em decorrência, poderá vir a faltar água,
generalizadamente, o que já ocorre em algumas metrópoles como São Paulo. O
abastecimento de água torna-se um problema significativo, quando as demandas
atingem entre 10 e 20% das descargas totais médias dos rios da região, exigindo
gerenciamento e investimentos importantes. Quando as demandas superam os
20%, os investimentos tornam-se tão pesados que a água se transforma em fator
limitante do desenvolvimento sócio-econômico (REBOUÇAS, op. cit.).
Mais de 14% dos brasileiros ou 18 milhões de pessoas que vivem
nas cidades, não são atendidas por um sistema de abastecimento de água
adequado (MBES, 1994)134. Considerando-se que uma cidade com um milhão
de habitantes gera uma demanda de 5m³/s, torna-se necessário, por
conseqüência, preservar uma bacia hidrográfica de até 1.200 km², para atender a
demanda deficitária de água potável (REBOUÇAS, op. cit.). Então, podemos
admitir que, para suprir o déficit dos 14% da população urbana, adicionado ao
crescimento vegetativo, fica claro que é imperiosa a adoção de planos de
recursos hídricos para evitar o racionamento e a interrupção do abastecimento
público das cidades brasileiras.

134
MBES - MINISTÉRIO DO BEM-ESTAR SOCIAL. Proposta de ordenamento institucional e financiamento
do setor saneamento - versão preliminar. Brasília: IPEA, nov. 1994. 47 p.
197

Por sua vez, o planejamento urbano deve adotar uma metodologia


baseada no saneamento ambiental abrangente onde as questões se integram entre
si - meio ambiente, infra-estrutura e saneamento (água, esgoto, lixo e drenagem
pluvial), com os aspectos sócio-econômicos da qualidade de vida (saúde,
educação, lazer, etc.).
Parcelas expressivas da população urbana estão privadas dos
serviços urbanos essenciais à saúde pública e ao meio ambiente saudável (v.
tabela 25). O problema ambiental básico reside na falta de tratamento dos
esgotos sanitários que são lançados no solo ou nos mananciais hídricos in
natura. A estimativa é de que apenas 5% a 8% da população urbana sejam
atendidas por algum tipo de tratamento de esgotos (GASTAL, 1994)135.
Conseqüentemente o déficit gira na casa de 150 milhões de pessoas.

Tabela 25 – Alguns indicadores censitários sanitários (valores em % de domicílios urbanos)


Indicadores Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul C.-Oeste
Água – suprimento
-rede pública 86,34 67,47 78,26 93,53 90,62 79,71
-outras soluções 13,66 35,53 21,74 6,47 9,38 20,29
Esgoto sanitário
-rede pública 49,01 1,72 13,22 70,45 17,85 33,27
-fossas sépticas 14,60 34,67 22,58 10,50 46,91 8,54
-outras soluções 33,69 63,61 64,20 19,05 35,24 58,19
Lixo
-coletado 78,67 54,81 63,72 86,99 87,27 76,20
-sem coleta 21,33 45,19 36,28 13,01 12,71 23,80
Fonte: IBGE (Censo Demográfico de 1991)

Outro problema ambiental sério e urgente é o lixo urbano cuja


produção domiciliar diária é de 90 mil toneladas. Como mostra a tabela 25, os
serviços de coleta atendem cerca de 78,67% dos domicílios brasileiros,
significando que cerca de 29,4 milhões de brasileiros não são atendidos (MBES,
op. cit.). Porém, a qualidade da prestação desse serviço é precária, por que
86,4% dos resíduos coletados são dispostos a céu aberto (nos lixões) e 1,8%
diretamente em corpos d’água (GASTAL, op. cit.).
Tanto pela elevada produção per capita, como pela forma de
lançamento e de disposição dos resíduos urbanos, verificam-se o esgotamento da
capacidade de ciclagem dos ecossistemas afetados e o comprometimento dos
recursos naturais. De acordo com o modelo sistêmico de análise do ecossistema
urbano (v. Seções 3.5.3, 3.5.4 e 3.5.5), estes outputs elevados são os sintomas de
um sistema regulado em tendência, tendendo à crise e à ruptura do seu
funcionamento.
Os dados censitários mostram que os déficits de saneamento urbano
afetam desigualmente as regiões, sendo mais acentuados nas regiões

135
GASTAL, A. Diretrizes para uma política ambiental urbana. In: SEMINÁRIO SOBRE UMA POLÍTICA
AMBIENTAL URBANA. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, dez. 1994. 88 p.
198

desfavorecidas economicamente. Os domicílios urbanos atendidos por


esgotamento sanitário variam de 1,72% na Região Norte para 70,45% na Região
Sudeste. Nas Regiões Norte e Nordeste 45,19% e 36,28% das residências não
são atendidas por serviço de coleta de lixo urbano, enquanto nas Regiões Sul e
Sudeste, estes percentuais são de 12,71% e 13,01%, respectivamente.
Além da desigualdade regional, vemos nas cidades brasileiras e,
principalmente, nas regiões metropolitanas, de acordo com Gastal (op. cit.), a
existência de uma forte segregação constituída por quatro estratos diferenciados
de população de composição e densidade distintas.
O primeiro estrato é formado pelos habitantes das “áreas
organizadas” da cidade, abrigando não mais que 25% da população total das
regiões metropolitanas. Esse estrato é composto pela população tradicional que
criou a cidade e desfruta de todos os serviços públicos implantados ao longo do
seu desenvolvimento.
O segundo estrato é formado pelos habitantes das “áreas
periféricas” da cidade, de urbanização mais recente e relativamente planejada,
abrigando cerca de 45% da população total das metrópoles. Esse estrato é
composto pela população pobre que não desfruta de serviços públicos
adequados.
O terceiro estrato é formado pelas populações das “favelas” em
áreas sem urbanização regular, abrigando cerca de 30% da população urbana
total.
O quarto estrato – afirma o autor – é formado pelas “populações das
ruas”, onde milhares de habitantes habitam ou permanecem durante parte da
semana. Esse estrato compõe um quadro típico da degradação urbana brasileira,
sendo constituído pelos segmentos sociais do segundo e terceiro estratos
anteriormente citados, que foram excluídos do processo de desenvolvimento dos
países tropicais subdesenvolvidos. Em Goiânia, a FUMDEC constatou que
existem 350 moradores de rua, dos quais 147 têm as ruas como a única opção de
moradia (O POPULAR. A rua é a casa deles. Goiânia, Cidades, 10 ago. 2001, p.
2-3B).
A segregação espacial acima exposta é a expressão da segregação
social, implementada por via de políticas públicas socialmente excludentes,
como se mostra na tabela 26. A política de saneamento ambiental urbano exclui
a população de baixa renda: 1/3 das residências sem saneamento referem-se a
famílias com ganhos inferiores a 3 salários mínimos; nesta mesma classe de
renda estão mais da metade dos domicílios urbanos que não são atendidos pelo
serviço de esgotamento sanitário, por rede de esgotos ou por fossas sépticas.
Este quadro demonstra a dimensão do dilema urbano atual,
implicando em enormes investimentos de recursos públicos, nas áreas de infra-
estrutura e de saúde pública. Anualmente o país gasta 2,4 bilhões de dólares em
internações hospitalares por falta de saneamento, que afeta principalmente a
população de baixa renda (BRASIL, op. cit.).
199

Nas últimas três décadas houve uma redução das taxas de


mortalidade por doenças infecciosas em crianças menores de 1 ano, em função
de alguma melhoria setorizada das condições de vida urbana no país. Por outro
lado, as doenças diarréicas ainda constituem um dos maiores problemas de
saúde pública. Um indicativo da crise na saúde é o recrudescimento de doenças
que no Brasil já haviam sido extintas, como é o caso da dengue e da febre
amarela. Crescem as taxas de hanseníase, tuberculose e hepatite e doenças
sexualmente transmissíveis. A malária apresentou 63 milhões de pessoas
expostas (BRASIL, op. cit.).
Tabela 26 – Acesso aos serviços de saneamento no Brasil por classes de renda.
Classes de renda (salário Domicílios com água Domicílios com rede Total de domicílios
mínimo) canalizada (%) sanitária (%) (milhões)
0a1 67 41 1,4
1a2 62 44 7,8
2a3 88 60 4,2
3a5 95 72 3,8
5 a 10 97 80 3,5
10 a 20 99 88 1,6
20 e mais 99 91 0,8
Fonte: IBGE (Censo Demográfico de 1991)

Além da persistência dos bolsões de pobreza, a degradação


ambiental e o próprio modelo de desenvolvimento do país afetam a elevação
destes índices de doenças endêmicas e epidêmicas no meio urbano brasileiro. As
pesquisas têm demonstrado que o crescimento da população na periferia é de 3 a
4 vezes maior do que o crescimento da cidade como um todo. Este fenômeno
está relacionado ao crescimento espacial desigual da população brasileira. Em
Goiás, segundo o Censo 2000 do IBGE, a população urbana cresceu em média
35,15% contra um declínio 21,45% da população rural.
A conseqüência deste tipo de crescimento demográfico, aliada às
restrições econômicas das últimas décadas, é a tendência de um caráter
anárquico da urbanização brasileira, com a queda da qualidade de vida urbana.
Esse fenômeno também está associado à degradação ambiental, que afeta mais
fortemente os grupos de baixa renda. As populações mais carentes estão
assentadas em áreas desprovidas de infra-estrutura e também estão,
freqüentemente, em espaços urbanos de alto risco, sujeitos a enchentes,
deslizamentos e processos erosivos.
Este processo desordenado e concentrado de crescimento urbano
cobra hoje seu alto preço: aproximadamente 1/3 dos habitantes das nove regiões
metropolitanas do país moram em favelas. Grande parte dos favelados mora à
beira dos córregos para onde destinam o lixo e o esgoto. Durante as enchentes,
os favelados recebem de volta os dejetos e perpetua-se um ciclo de doenças
causadas pelas más condições de uso do solo.
Só no município de São Paulo 800 mil moram em favelas, 3
milhões em cortiços e 2,4 milhões nos loteamentos desurbanizados da periferia.
200

Os favelados representam 28%, 30% e 25% da população que mora atualmente


nas cidades de Porto Alegre, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, respectivamente
(MARICATO, 1992)136. O ambiente agredido volta-se, não só, mas
principalmente, contra a população pobre, mostrando a inter-relação entre os
dramas social e ambiental.
A lei de parcelamento do solo urbano estabeleceu requisitos
urbanísticos de loteamento, fundamentados na melhoria da qualidade de vida.
Estabeleceu normas imperativas dando um mínimo de conforto para o morador,
dotando a área loteada de equipamentos urbanos e comunitários (MACHADO,
1999). A estas exigências urbanísticas, o projeto de loteamento está submetido
às exigências fundamentais, básicas, quanto ao local do loteamento. A lei proíbe
o loteamento em terreno encharcado, sujeito à erosão ou inundação, em áreas
marginais aos cursos d’água ou naqueles locais que impliquem em risco de vida
ou perigo à saúde humana.
Como a aprovação de loteamentos é uma competência exclusiva
dos municípios, e como na hierarquia dos Poderes, o Poder Municipal é o que
está mais próximo do povo, podemos avaliar que as mazelas urbano-ambientais
e sociais refletem a insuficiente consciência da cidadania brasileira.
Este quadro precisa mudar urgentemente. A questão urbana
necessita ser colocada na pauta política, técnica e científica dos centros de
decisão da sociedade brasileira.

3.6.4. Qualidade de vida e indicadores ambientais urbanos

Para os Ecólogos Humanos o desenvolvimento social é o resultado


do aprimoramento constante das interações entre o homem e o meio ambiente
tanto físico como biológico ou social. Este aprimoramento é conseqüência da
adaptação a um universo em evolução bem como da aquisição de novas aptidões
físicas, intelectuais, sociais e políticas.
O bem-estar social pode ser uma das conseqüências do
desenvolvimento social. O primeiro é um indicador econômico do segundo.
Além do econômico, existem outros indicadores do desenvolvimento social que
estão relacionados à satisfação das necessidades integrais do ser humano, no
tocante ao indivíduo, à sociedade e ao destino da nossa espécie, tal como
formulou Dansereau (1999b) no modelo “bolo do ambiente” (v. Seção 3.5.4).
Machado (1985) alerta que a sociedade de consumo tenta confundir
os dois conceitos, difundindo propositadamente a idéia da economia do bem-
estar, que implica em fazer prosperar a produção e a venda de mercadorias,
como estratégia de crescimento do comércio e da indústria.

136
MARICATO, E. Drama urbano e rural. In: A terra gasta: a questão do meio ambiente. São Paulo: EDUC,
{1992}, p. 79-81. 229 p.
201

Contudo, a idéia keynesiana de que o desenvolvimento seria a


conseqüência do maior poder de compra de bens de consumo resultou numa
falácia. Este tipo de crescimento econômico, como no Brasil dos anos 70 –
“crescer o bolo para depois repartir” – teve como conseqüência o agravamento
das desigualdades regionais e sociais, o aumento da concentração da renda, a
instabilidade social e a exclusão social crescente.
O desenvolvimento urbano, por ser extremamente demandador de
recursos e por gerar produtos degradadores do meio ambiente, requer a
formulação de uma política de desenvolvimento sustentável. Este foi definido no
Informe Brundtland da Comissão das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, em 1987, como sendo aquele que atende às necessidades do
presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às
suas próprias necessidades.
A idéia da sustentabilidade, segundo Cendrero (1996)137, embora
seja consensual, contém uma sensibilidade que dificulta a sua definição clara.
Por isso, é mais fácil definir o que não é sustentável, por exemplo, uma política
de desenvolvimento que implique em crescimento continuado, posto que
vivemos num mundo de recursos limitados. A aferição do grau de
sustentabilidade do desenvolvimento de uma sociedade torna necessária a
existência de um sistema de informações capaz de propiciar a integração dos
dados referentes aos múltiplos aspectos envolvidos. Para tal é preciso dispor de
um conjunto de indicadores adequados e dinâmicos.
De acordo a OCDE, apud Cendrero (op. cit.), o indicador urbano é
aquele capaz de dar uma informação quantitativa e integrada que permita
melhorar a formulação, avaliação e implementação das políticas ambientais
urbanas.
Para que os indicadores sejam realmente aplicáveis, eles têm de ser
claros, simples e universais, de forma que sirvam para sintetizar e transmitir
informação de maneira significativa dentro do processo decisório. As funções
principais de um indicador são as de permitir: i) constatar ou conhecer o estado
do meio ambiente ou qualidade ambiental, sua evolução espaço-temporal; ii)
entender, fazer comparações e criar tipologias; e iii) modificar a qualidade
ambiental, através de decisões futuras, a partir da avaliação das decisões
passadas, permitindo a formulação de estratégias e de planos de ação.
Os indicadores podem ser classificados de várias maneiras, como
por exemplo:
Indicadores subjetivos

*
Termo relativo à doutrina formulada por John Maynard Keynes (1883 – 1946), economista e financista
britânico que propugnou a intervenção do Estado na economia capitalista, contribuindo para a recuperação dos
países ocidentais arrasados pela 2a Guerra Mundial. Sua doutrina baseia-se no princípio da tendência natural do
ser humano para o consumo, que seria limitado apenas pelo poder de compra.
137
CENDRERO, A. Indicadores de desarrollo sostenible para la toma de decisiones. Santander: DICITIMAC –
Facultad de Ciencias Universidad de Cantabria, 1996. 21 p. /n.p./.
202

São aqueles que expressam a percepção de um fenômeno pelo


indivíduo.
Indicadores objetivos
São aqueles que se relacionam e correspondem aos mecanismos de
descrição e de ação;
Indicadores simples
São os indicadores de primeiro plano ou descritores, criados a partir
da análise dos dados primários ou brutos por uma seleção de estatísticas
homogeneizadas. São publicados regularmente por instituições como o IBGE (v.
Seção 3.6.3);
Indicadores agregados
São derivados dos indicadores simples, reunindo a informação em
um ou poucos índices que integrem um conjunto de indicadores expressivos das
características desejadas do meio ambiente.
Os indicadores agregados permitem visualizar um quadro sinóptico
da qualidade ou estado do meio ambiente bem como o grau de sustentabilidade
do modelo de desenvolvimento adotado. São exemplos:
- o Índice de Preço ao Consumidor (IPC) que reúne numa só cifra
os dados de preços de artigos os mais diversificados;
- o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, que combina dados relativos à
qualidade de vida como a situação da mulher, liberdade, saúde, educação, renda
e expectativa de vida da população;
- o Índice de Qualidade das Águas (IQA’s) sintetiza os valores
analíticos de seis parâmetros de controle - demanda bioquímica de oxigênio
(DBO), oxigênio dissolvido (OD), pH, resíduos totais (R.T.), turbidez e
coliformes fecais -, numa escala de 0 (zero) a 100 (cem), cujo significado para o
abastecimento público como água bruta vai de imprópria a ótima;
- o Índice da Área Verde (IAV) que é a relação área verde urbana e
outros espaços livres correlatos, em m², por habitante, portanto associa o uso do
solo de função ambiental e a densidade demográfica, sendo uma das expressões
da qualidade de vida na cidade.
No entendimento de Cendrero (op. cit.), a simples divulgação de
um indicador agregado é suficiente para influir nas atuações dos organismos
públicos e instituições privadas, ainda que eles não sejam utilizados de maneira
explícita para definir políticas.
Indicadores de desenvolvimento sustentável
A OCDE desenvolveu um marco conceitual, internacionalmente
aplicado, fundado no modelo pressão, estado e resposta. Este modelo está
esquematizado na figura 61 e mostra que as ações derivadas das atividades
humanas representam pressões sobre o meio ambiente. Essas pressões resultam
na modificação de certos parâmetros que servem para descrever o estado ou
qualidade do ambiente afetado. Por fim, a modificação desses parâmetros leva a
203

que os ecossistemas, por via de processos de retroação ou feedback, promovam


respostas, para readaptar o sistema aos impactos produzidos.
Sistema Subsistemas
humano naturais
Subsistema econômico contaminação Componentes ambientais
bens e
trabalho PRESSÃO impactos ESTADO impactos
serviços
Subsistema populacional esgotamento Ecossistemas
dos recursos

retroalimentação
natural
RESPOSTA
resposta social (retroalimentação do sistema humano)

Figura 61 – Marco conceitual para os indicadores de pressão, de estado e de resposta


(CENDRERO, 1996, p. 3)

Tendo-se em vista o marco conceitual acima exposto e


considerando as dimensões políticas, econômicas, sociais e ambientais, são
formuladas as propostas para os indicadores de desenvolvimento sustentável
(figura 62). Os critérios para essa identificação estão baseados na capacidade
dos sistemas naturais como fonte de recursos, como sumidouro dos efluentes em
função da capacidade de assimilação de cada ecossistema e como suporte das
atividades desenvolvidas, bem como avaliar o bem-estar humano.
Na tabela 27 exemplifica-se este tema com uma matriz simplificada
de alguns indicares ambientais urbanos (Cendrero, op. cit.; Forge, 1994 138).

Tabela 27 – Matriz simplificada de indicadores ambientais urbanos


Tema Indicadores
Capacidade do ecossistema Pressão Estado Resposta
Mudanças de uso do Superfície, Input/output, taxa de
Fonte de recurso Bosques
solo distribuição e valor reciclagem
Sumidouro de Concentração de Gastos com
Mudança climática Emissões de CO2
efluente CO2 atmosférico despoluição
Mudanças de uso do Relação habitante/ % território como
Suporte de atividade Biodiversidade
solo reservas naturais zonas protegidas
Habitação/ Densidade Gastos com proteção
Bem-estar humano Níveis de ruído
Urbanismo demográfica sonora

Em síntese, os indicadores ambientais urbanos representam


instrumentos de grande utilidade no tratamento das informações sobre os
diversos aspectos sócio-ambientais, bem como para monitorar a qualidade e a
evolução do meio ambiente urbano, constituindo-se em instrumentos
138
FORGE, I. Informacion e indicadores ambientales urbanos. In: SEMINÁRIO SOBRE UMA POLÍTICA
AMBIENTAL URBANA. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, dez. 1994. 6 p. /n.p./.
204

fundamentais para a avaliação do grau de sustentabilidade de políticas, planos e


ações municipais, tanto a curto, como a médio e longo prazo.
ATIVIDADES HUMANAS

INSUMOS ESPAÇO EFLUENTES


(energia, ar, água, mat. primas) (sólido, líquido, gasoso)

TAXAS DE RITMOS, CAPACIDADE CAPACIDADE


RENOVAÇÃO INTENSIDADE DE SUPORTE DE ASSIMILAÇÃO

Renovável Não renovável


SUPORTE DE
ATIVIDADES SUMIDOURO DE EFLUENTES
FONTE DE RECURSOS (solo, água, ar)

MEIO NATURAL
Indicadores de fonte Indicadores de sumidouro
Indicadores
de qualidade

Indicadores de
bem-estar humano

Figura 62 – Modelo conceitual para a definição de critérios sobre desenvolvimento


sustentável e para a identificação de indicadores (CENDRERO, 1996, p. 8)

3.6.5. O Índice de Área Verde (IAV) como um indicador de qualidade


ambiental de vida urbana

As áreas verdes jogam um papel importante na melhoria da


qualidade de vida urbana. Elas são um indicador ambiental, calculado através do
Índice de Área Verde (IAV) que fornece a quantidade de área verde, em metros
quadrados, disponível para cada habitante de uma cidade.
Na Alemanha, a recomendação oriunda das Faculdades de
Paisagismo é de 13 metros quadrados de áreas verdes por habitante. Estas áreas
deverão ser constituídas por parques públicos, dotados de equipamentos
recreativos, a serem localizados nas proximidades das residências
(CAVALHEIRO & DEL PICCHIA, 1992)139. Nos EUA, a Associação Nacional

139
CAVALHEIRO, F. & DEL PICCHIA, P. C. Áreas Verdes: conceitos, objetivos e diretrizes para o
planejamento. In: ENCONTRO NACIONAL SOBRE ARBORIZAÇÃO URBANA, 4, 1992, Vitória. Anais...
Vitória: SBAU, 1992. p. 29-38.
205

de Recreação recomenda de 28 a 40 metros quadrados de área verde por


habitante urbano (SOUSA et al., op. cit.).
Embora em sã consciência a maioria dos cidadãos concorde com a
intenção de conservar as áreas verdes urbanas, a verdade é que as árvores vão
desaparecendo progressivamente das cidades. Mesmo nas cidades de muitos
países do primeiro mundo, as áreas verdes urbanas não são adequadamente
conservadas. Na França, apenas 4 das 24 cidades com mais de cem mil
habitantes dispõem de mais de 5 m²/habitante de espaço aberto público; 11
dispõem de 2 a 5 m² e 9 cidades, de menos de 2 m² (LAPOIX, op. cit.).
Nos países do terceiro mundo a degradação social se constitui num
forte fator de pressão sobre as áreas verdes urbanas. Na cidade do Rio de Janeiro
ocorre diariamente uma redução de 4 m² de área verde pelo desmatamento das
encostas dos maciços para dar lugar à expansão das favelas (BRANDÃO, op.
cit.). Cerca de 1/3 da população das regiões metropolitanas brasileiras vivem em
favelas que, na sua maioria, ocupam áreas de preservação permanente às
margens dos mananciais hídricos ou, como no caso carioca, nas encostas dos
morros.
No Brasil, são poucas as cidades que conhecem o seu Índice de
Área Verde. Milano (op. cit.) informa que em:
 Curitiba (PR) foram identificadas 50,15 m² per capita, sendo
que 9,55 m² eram áreas originalmente públicas, e os restantes 40,60 m²
correspondiam, em 1987, a áreas particulares, cuja preservação é estimulada
pela isenção do IPTU;
 Vitória (ES) foi realizado levantamento em 1991 que indicou
a existência de 82,70 m² de área verde per capita, sendo que as praças e os
pequenos parques contribuíam com 1,88 m², as árvores de rua com 2,62 m², as
unidades de conservação tradicionais com 31,78 m²;
 Maringá (PR) foram identificados, em 1988, 20,62 m² por
habitante, dos quais 6,69 m² eram áreas públicas tradicionais e 13,92 m² eram
provenientes da contribuição das árvores de rua.
206

Parte IV – RESULTADOS, CONSIDERAÇÕES FINAIS,


RECOMENDAÇÕES E SUGESTÕES
“Talvez seja da natureza humana construir-se de mitos e de
mistificações. Essa parte ilusionária responda talvez pelo melhor e
pelo pior que a diversificada natureza do homem e de sua civilização
realizaram na história”.
Paulo Bertran (1994)

4.1. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

4.1.1. Análise quantitativa

A tabela 28 relaciona os espaços livres do município de


Goiânia, dentro do perímetro urbano e de expansão urbana, por cada classe e por
Plano de Informação, com suas respectivas medidas de superfície, em metros
quadrados. No total, Goiânia possui uma superfície coberta por 116,303 milhões
de m² de espaços livres, sendo 3,307 milhões de m² de praça; 13,658 milhões de
m² de parque; 14,569 milhões de m² de parque linear; 2,774 milhões de m² de
verde de acompanhamento viário; 3,382 milhões de m² de espaço livre
público; 55,933 milhões de m² de área verde particular; 643 mil m² de
cemitério; 20,212 milhões de m² de equipamento público; e 1,827 milhões de
m² de jardim de representação/outras classes.
A área pública alienada é de 8.419.228 m². São áreas
originalmente destinadas ao uso público e comunitário de praças, parques,
parques lineares, escolas, postos de saúde, etc. que sofreram um processo de
alienação, estando hoje com uso do solo privatizado e desvirtuado da sua
destinação original.
As áreas de equipamentos públicos que foram computadas no
Índice de Área Verde, por serem permeáveis e/ou cobertas por vegetação,
somam o total de 12.400.924 m² (tabela 29)
As áreas públicas alienadas que, mesmo assim, mantém função
ambiental perfazem uma superfície de 841.304 m² (tabela 30).
O Índice de Área Verde (IAV) é o quociente entre o somatório da
metragem quadrada de praça, parque, parque linear, verde de acompanhamento
viário, espaço livre público, cemitério, equipamento público com área
permeável, jardim de representação e de área pública alienada que mantém
função ambiental; e, o número total de habitantes da cidade.
3.306.781+13.658.142+4.569.469 +2.774.957 +3.382.289 +55.932.867+643.170 +12.400.924 +1.826.866+841.304

1.090.581
IAV = 109.336.769 ÷ 1.090.581 => IAV = 100,25 m².habitante-1
207

Portanto, em Goiânia, cada cidadão dispõe dos benefícios


ambientais de 100,25 metros quadrados de áreas verdes potencial e/ou
efetivamente implantadas.

Tabela 28 – Classificação e quantificação (m²) dos espaços livres de Goiânia, em 20/11/2000


Pis/ Espaço Área Jd. Área
Pq. Verde Cemi- Equip.
clas- Praça Parque Livre Verde Rep. / Pública
Linear Viário tério Público
ses Público Part. outras Parc.
AERO 23.699 17.037 557.361 22.994 154.156 0 0 69.791 1.417 500.296
AGUA 182.788 1.177.244 713.938 291.063 135.300 2.927.619 0 156.888 393.819 267.719
AMAZ 52.844 114.012 472.048 2.836 37.132 251.108 0 42.484 2.588 442.412
BALN 92.182 589.842 1.210.382 60.735 264.040 2.292.322 0 221.536 13.640 3.846
CAMP 44.343 0 23.375 11.655 22.012 0 49.381 142.081 0 335.266
CAPU 88.956 0 798.588 51.435 100.260 5.093.343 0 224.406 34.893 466.803
CJAR 88.436 42.345 97.972 41.463 35.465 0 0 729.959 28.940 190.694
CRIO 27.936 0 320.609 15.500 32.306 0 0 10.159 0 307.568
CS 240.313 1.181.469 155.638 151.100 55.419 17.750 0 558.544 39.131 1.150.131
CURI 106.368 1.271.192 347.960 79.184 516.360 6.438.808 0 403.456 195.504 196.736
FAI 175.410 354.612 297.525 80.552 0 513.635 0 227.008 0 131.424
FERR 100.959 69.311 995.853 39.193 256.489 0 436.112 392.744 2.835 513.443
FINS 158.220 19.024 238.832 28.440 27.920 1.046.376 0 364.424 17.664 32.812
GARA 76.551 279.068 123.146 167 4.148 6.076.600 0 122.468 0 80.430
GENT 137.144 0 401.029 48.438 126.995 21.722 157.678 181.964 8.507 70.544
GOI2 18.772 178.644 659.140 73.360 0 12.512 0 300.376 153.644 0
GUA 35.875 585.338 673.500 115.675 362.938 813.906 0 612.075 15.031 95.013
HILA 107.796 349.280 289.768 42.296 90.084 2.178.372 0 1.267.052 13.536 91.980

ITAT 60.220 915.739 316.969 262.250 83.632,64 8.735.686 0 276.317 50.964 0


JAÓ 76.424 1.326.400 526.968 130.580 0 240.457 0 4.933.103 6.490 588.764
JATL 132.512 94.092 891.808 84.656 46.476 0 0 248.424 106.632 162.164
JDBO 137.114 116.413 349.652 61.061 205.314 3.289.726 0 276.345 31.212 43.562
JG51 85.476 247.812 257.968 126.128 151.584 195.092 0 304.776 384 280.220
MAI 15.176 61.864 0 10.428 8.616 0 0 78.956 17.128 0
MUN 96.092 581.076 311.296 76.684 37.544 112.256 0 21.136 5.836 848.588
NOVA 113.713 48.067 124.954 66.662 4.493 0 0 966.193 0 176.592
PIJB 202.896 239.229 1.079.280 75.069 511.722 2.858.427 0 334.224 159.858 466.965
PL 91.032 1.051.062 245.188 83.437 68.388 0 0 217.097 0 419.081
PLA 150.403 1.405.111 269.771 269.771 34.261 8.435.922 0 1.732.489 184.977 240.598
SERR 176.728 0 627.504 10.668 7.928 0 0 119.784 0 261.716
VERA 210.403 582.432 353.324 141.356 1.308 4.381.227 0 506.778 342.235 53.861
UNI 0 760.428 838.125 220.122 0 0 0 4.168.827 0 0
TOTAL 3.306.781 13.658.142 14.569.469 2.774.957 3.382.289 55.932.867 643.170 20.211.864 1.826.866 8.419.228

Na figura 63 visualiza-se o mapa da zona urbana e da zona de


expansão urbana de Goiânia, contendo os espaços livres classificados e
quantificados bem como a área pública alienada e/ou parcelada, de acordo com
os dados da tabela 28
208

Tabela 29 – Equipamento público com área permeável computada no IAV


Discriminação Área (m²) Coordenadas (X1, X2; Y1, Y2)
691991.94, 693521.87;
Autódromo Internacional de Goiânia 929.923
8150078.20, 8151472.06
680241.82, 681191.41;
Hipódromo da Lagoinha 459.513
8154106.16, 8154857.72
681003.80, 681298.13;
Clube da Telegoiás 60.698
8154556.69, 8154832.31
687505.11, 687891,05;
Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) 37.515
8158581,69, 8158770,08
691485.03, 692258.31;
Central de Abastecimento (CEASA) 593.315
8160080.58, 8161325.97
690906.94, 692023.45;
GOIASRURAL 898.197
8158214.54; 8159697.28
688496.13, 691503.74;
Aeroporto Santa Genoveva 4.116.896
8158884.99; 8161201.41
689606.55, 690720.74;
Ministério da Agricultura 735.116
8158230.24, 8159388.41
687089.55, 687417.97;
Caixa Econômica de Goiás (CAIXEGO) 35.136
8158350.78, 8158568.56
686669.18, 686974.66;
Hospital Adauto Botelho 59.153
8157655.00, 8158028.34
686604.63, 687325.10;
ETAG SANEAGO/Regimento de Cavalaria 177.911
8157818.14, 8158498.31
685449.80, 685851.30;
Terminal Rodoviário de Goiânia 128.724
8157162.08; 8157628.75
682981.75, 686121.18;
Campus II da UFG 4.168.827
8162957.92, 8164843.81
TOTAL 12.400.924 -

Tabela 30 – Área pública alienada que mantém função ambiental


Coordenadas
Discriminação Destinação original Área (m²)
(X1, X2; Y1, Y2)
Parque Municipal 689221.16, 690242.01;
Clube Jaó 409.964
Aquático Jaó 8157753.05, 8159287.55
Estádio e sede do 685169.98, 685501.35;
Praça 67.314
Goiás E. Clube 8151525.27, 8151739.13
Reservatório da Saneago, Parque Municipal 685938.00, 686384.46;
109.070
Clube da Celg/Telegoiás Paineiras 8153165,58, 8153648.48
Clubes de Engenharia, Parque Municipal do 685477.62, 685790.17;
90.611
dos Oficiais, dos Sargentos S. Marista 8153074.13, 8153862.16
Estádio e sede do Parque Municipal do S. 687918.27, 688051.18;
24.798
Vila Nova F. Clube Leste Universitário 8155668.24, 8155873,25
Estádio e sede do 682876.86, 683129.11;
Praça 31.849
Atlético Clube Goianiense 8156073.10, 8156318.39
Morro da Serrinha Parque Municipal da 684802.85, 685422.66;
107.698
(Telegoiás/Celg/Saneago) Serrinha 8150084.87, 8150407,92
Total - 841.304 -

O gráfico de colunas da figura 64, construído a partir dos dados da


tabela 28, mostra que as categorias mais expressivas de espaços livres em
Goiânia, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
equipamento público, parque linear e parque.
209

Espaços livres da zona urbana e da zona de expansão urbana de Goiânia (Projeto Gyn)
210

Figura 64 – Espaços livres de Goiânia e área pública alienada e/ou parcelada

Como se observa no gráfico de setores da figura 65, referente à


tabela 28, a distribuição dos espaços livres em Goiânia apresenta os seguintes
valores percentuais: 44,84% de área verde particular, 16,21% de equipamento
público, 11,68% de parque linear, 10,95% de parque, 2,72% de espaço livre
público, 2,65% de praça, 2,21% de verde de acompanhamento viário, 1,47% de
jardim de representação/outras e 0,52% de cemitério.

Figura 65 – Distribuição percentual dos espaços livres de Goiânia e da área pública parcelada

Os gráficos das figuras 64 e 65 mostram que o Sistema de Espaços


Livres de Goiânia é rico e diversificado. Nas áreas urbanizadas predominam as
categorias de equipamento público, de parque, de parque linear, de praça e de
jardim de representação. Nas áreas de expansão urbana predomina a categoria de
área verde particular, ocupando os espaços de fundos de vale e os fragmentos de
matas e/ou cerrados, que são áreas de domínio particular, mas protegidas por lei
municipal (v. Seções 1.3.1 e 2.8.4).
211

Por outro lado, vê-se que a área pública parcelada já se constitui em


6,75% do total dos espaços livres. As áreas parceladas e/ou alienadas são áreas
originalmente de domínio público que sofreram o processo legal ou ilegal de
alienação, podendo estar ou não parceladas. O percentual de áreas alienadas
expressa o grau de dilapidação do patrimônio público de Goiânia que é de
12,24%. Isto é, de cada 10 m² de áreas públicas, 1,22 m² foram privatizados.
A seguir, analisa-se a distribuição dos espaços livres por Plano de
Informação - PI, cada qual correspondendo em linhas gerais às micro-regiões ou
distritos estabelecidos no PDIG (GOIÂNIA, op. cit., p. 79).

4.1.1.1. MICRO-REGIÃO AEROVIÁRIOS (PI AERO)

O PI AERO corresponde à digitalização de setores pertencentes à


micro-região do Bairro dos Aeroviários, englobando este e mais o Bairro
Rodoviário, Bairro Esplanada dos Anicuns, Conjunto Padre Pelágio, Vila São
José e Vila São Paulo.
De acordo com o gráfico de coluna da figura 66, neste distrito as
classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície
são: parque linear, espaço livre público e equipamento público. Notar a ausência
de área verde particular. A área pública parcelada é de 500,29 mil m²,
representando um índice de 37,15% de dilapidação do patrimônio público. Na
figura 67 visualiza-se o mapa do PI AERO.

Figura 66 – Espaços livres da micro-região Aeroviários (PI AERO) e área pública alienada
212

Espaços livres da Micro-Região Aeroviários (PI AERO)


213

4.1.1.2. MICRO-REGIÃO RIVIERA (PI AGUA)

O PI AGUA corresponde à digitalização de setores pertencentes à


micro-região Riviera, englobando o Conjunto Riviera, Bairro Água Branca,
Chácara São Francisco de Assis, Conjunto Aruanã I, II e III, Jardim Brasil, Vila
Parque Santa Maria, Residencial Sonho Verde, Residencial Olinda, Vila Maria
Luiza, Residencial Aldeia do Valle e Condomínio Alphaville.
De acordo com a figura 68, na micro-região Riviera as classes de
espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área
verde particular, parque, parque linear e jardim de representação. Esta última,
caracterizada por possuir individualmente pequena superfície, no total da região
ocupa a expressiva área de 393,62 mil m². A categoria de área verde particular
com 2,927 milhões de m² se destaca, principalmente, em virtude da contribuição
dos fundos de vale do Rio Meia Ponte, em zona não parcelada, refletindo na
expressividade da categoria parque linear, em zona parcelada.
Nesta micro-região, a área pública parcelada é de 267,72 mil m²,
representando um índice de 8,07% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 68 – Espaços livres da micro-região Riviera (PI AGUA) e área pública alienada

O mapa da figura 69 mostra os espaços livres do PI AGUA.


214

Espaços livres da Micro-Região Riviera (PI AGUA)


215

4.1.1.3. MICRO-REGIÃO AMAZÔNIA (PI AMAZ)

O PI AMAZ corresponde à digitalização de setores pertencentes à


micro-região do Parque Amazônia, englobando este e a Vila Divino Pai Eterno,
Residencial Taynan e Vila São Tomaz.
De acordo com a figura 70, no distrito Amazônia as classes de
espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque
linear, área verde particular, parque e praça. A categoria de parque linear se
destaca com 472 mil m², em virtude da contribuição dos fundos de vale dos
Córregos Mingau e Serrinha.
Nesta micro-região, a área pública parcelada é de 442,41 mil m²,
representando um índice de 37,93% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 70 – Espaços livres da micro-região Amazônia (PI AMAZ) e área pública alienada
e/ou parcelada

O mapa da figura 71 mostra os espaços livres do PI AMAZ.


216

Espaços livres da Micro-Região Amazônia (PI AMAZ)


217

4.1.1.4. MICRO-REGIÃO MEIA PONTE (PI BALN)

O PI AMAZ corresponde à digitalização de setores pertencentes à


micro-região Meia Ponte, englobando o Jardim Balneário Meia Ponte, Parque
das Nações, Mansões Goianas, Granjas Brasil, Sítios de Recreio Panorama,
Residencial Recreio Panorama, Recanto Barravento, Residencial Maria
Lourença, Parque das Flores, Jardim Ipê, Residencial Jardim Belvedere e
Residencial Primavera.
De acordo com a figura 72, na micro-região Meia Ponte as classes
de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área
verde particular, parque linear, parque, espaço livre público e equipamento
público. A categoria área verde particular se destaca com 2,292 milhões de m²,
bem como a categoria parque linear com 1,210 milhões de m², em virtude da
contribuição dos fundos de vale do Rio Meia Ponte, respectivamente em zona de
expansão urbana (não parcelada) e em zona urbana.
Nesta micro-região, a área pública parcelada é de 3,85 mil m²,
representando um índice de 0,16% de dilapidação do patrimônio público. Este
baixo índice é um reflexo das restrições estabelecidas pelo PDIG para a
ocupação da região norte da cidade, cuja diretriz prioritária é a de uso agrícola
como Zona de Proteção de Manancial, inibindo em parte a ação imobiliária
especulativa.

Figura 72 – Espaços livres da micro-região Meia Ponte (PI BALN) e área pública alienada
e/ou parcelada
218

Espaços livres da Micro-Região Meia Ponte (PI BALN)


219

4.1.1.5. MICRO-REGIÕES CAMPINAS E COIMBRA (PI CAMP)

O PI CAMP corresponde em linhas gerais à digitalização de setores


pertencentes às micro-regiões Campinas e Coimbra, englobando o Setor
Campinas, Setor dos Funcionários, Setor Centro-Oeste, Vila Abajá, Jardim
Xavier, Vila São Francisco, Setor Coimbra, Vila Boa Sorte, Vila Aguiar, Vila
Americano do Brasil e Vila Teófilo Neto.
De acordo com a figura 74, nas Micro-regiões Campinas e Coimbra
as classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de
superfície são: equipamento público, cemitério e praça. O Cemitério Público
Santana aparece com a superfície de 49,38 mil m² no Setor dos Funcionários.
Nesta micro-região, a área pública parcelada é de 335,26 mil m²,
representando um índice de 53,38% de dilapidação do patrimônio público. Este
elevado índice reflete a ação imobiliária especulativa e a ocupação por posseiro
urbano dos espaços livres públicos da micro-região, destacando-se o
parcelamento do parque linear Capim Puba, bem como das praças e dos
equipamentos públicos do Setor Coimbra.

Figura 74 – Espaços livres das micro-regiões Campinas e Coimbra (PI CAMP) e área pública
alienada e/ou parcelada
220

Espaços livres das Micro-Regiões Campinas e Coimbra (PI CAMP)


221

4.1.1.6. MICRO-REGIÕES DO BAIRRO CAPUAVA (PI CAPU)

O PI CAPU corresponde à digitalização de setores pertencentes às


micro-regiões Capuava, São Francisco, Vila Regina, São Joaquim, Nova
Esperança e parte do Finsocial, englobando os setores Bairro Capuava, Vila
João Vaz, Chácara João Vaz, Jardim Petrópolis, Chácaras Maringá, Bairro
Ipiranga, Bairro São Francisco, Jardim Leblon, Residencial Leblon, Jardim
Leblon II, Setor Santos Dumont, Vila Regina, Parque Industrial Paulista,
Residencial 14 Bis, Chácaras de Recreio São Joaquim, Chácaras Mansões Rosa
de Ouro, Residencial Noroeste, Chácara Helou, Setor Cândida de Moraes e
Jardim Nova Esperança.
De acordo com a figura 76, nas micro-regiões do PI CAPU as
classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície
são: área verde particular, parque linear e equipamento público. A categoria área
verde particular se destaca ocupando uma significativa área de 5,09 milhões de
m², em zona ainda não parcelada, representando resquícios de matas e/ou
cerradão, de matas ciliares e de galerias em fundos de vale.
Nesta micro-região, a área pública parcelada é de 466,8 mil m²,
representando um índice de 26,44% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 76 - Espaços livres das micro-regiões do Bairro Capuava (PI CAPU) e área pública
alienada e/ou parcelada
222

Espaços livres Micro-Regiões do Bairro Capuava (PI CAPU)


223

4.1.1.7. MICRO-REGIÃO CIDADE JARDIM (PI CJAR)

O PI CJAR corresponde à digitalização de setores, em linhas gerais,


pertencentes à micro-região Cidade Jardim, englobando os setores Cidade
Jardim, Conjunto Guadalajara, Conjunto Castelo Branco, Conjunto Romildo do
Amaral, Setor Castelo Branco, Conjunto Morada Nova, Vila Aurora Oeste, Vila
Nova Canaã, Vila Canaã, Conjunto Residencial Rodoviário (Loteamento Santa
Terezinha), Vila Santa Rita, Vila Santo Afonso, Bairro Industrial Mooca, Vila
Mooca, Bairro Nossa Senhora de Fátima, Vila Adélia, Vila Betel, Vila Sol
Nascente, Vila Anchieta, Vila Lucy, Setor Jóquei Clube.
De acordo com a figura 78, na micro-região Cidade Jardim as
classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície
são: equipamento público, parque linear e praça. A categoria equipamento
público se destaca ocupando uma área de 729,96 mil m², com o Hipódromo
Lagoinha contribuindo com uma superfície de 459,51 mil m².
Nesta micro-região, a área pública parcelada é de 190,69 mil m²,
representando um índice de 15,19% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 78 – Espaços livres da micro-região Cidade Jardim (PI CJAR) e área pública alienada
224

Espaços livres da Micro-Região Cidade Jardim (PI CJAR)


225

4.1.1.8. MICRO-REGIÃO MARECHAL RONDON (PI CRIO)

O PI CRIO corresponde à digitalização de setores, em linhas gerais,


pertencentes à micro-região Marechal Rondon, englobando o Setor Marechal
Rondon ou Fama, Setor Criméia Oeste, Vila Isaura, Vila Santa Helena, Vila
Vera Cruz, Vila Vianadelli, Vila Jacaré, Vila Perdiz, Vila Santana, Vila Ofugi,
Vila Paraíso, Vila Irany, Vila São Luis, Vila Fernandes, Vila Ana Maria.
De acordo com a figura 80, na micro-região Marechal Rondon as
classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície
são: parque linear, praça e espaço livre público. A categoria parque linear se
destaca ocupando uma área de 320,61 mil m² de fundos de vale das drenagens
da região, sobretudo a foz do córrego Capim Puba no Botafogo e deste no
ribeirão Anicuns.
Nesta micro-região, a área pública parcelada é de 307,57 mil m²,
representando um índice de 43,07% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 80 – Espaços livres da micro-região Marechal Rondon (PI CRIO) e área pública
alienada e/ou parcelada
226

Espaços livres Micro-Região Marechal Rondon (PI CRIO)


227

4.1.1.9. MICRO-REGIÕES DO SETOR CENTRAL (PI CS)

O PI CS corresponde à digitalização dos distritos: Central, Sul,


Oeste, Aeroporto, Marista e Bueno, englobando os setores de mesmo nome,
acrescido do Setor Bela Vista.
De acordo com a figura 82, na micro-região Marechal Rondon as
classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície
são: parque, equipamento público, praça, parque linear e verde de
acompanhamento viário. A categoria parque se destaca ocupando uma área de
1,181 milhões de m², devido ao Bosque dos Buritis, Parque Educativo
(Zoológico/Lago das Rosas), Parque Vaca Brava e Parque Areião.
O verde viário ocupa uma superfície de 151 mil m². A
disponibilidade deste tipo de espaço livre viabiliza uma política municipal, nas
áreas centrais, de tratamento dos canteiros floridos das rótulas e ilhas do sistema
viário, exercendo um interessante efeito plástico ou visual na paisagem urbana.
Nestes distritos, a área pública parcelada é de 1,150 milhões de m²,
representando um índice de 32,56% de dilapidação do patrimônio público,
destacando-se o parcelamento de 356.630,56 m² de parques, praças e
equipamentos públicos do Setor Bueno (v. tabela 7, Seção 2.8.5) bem como a
fragmentação de grandes áreas de parques (e.g., 100% do Parque das Paineiras
no S. Oeste, 100% do Parque do S. Marista, 70% do Bosque dos Buritis e 50%
do Parque Vaca Brava) e de Parques Lineares como o do córrego Botafogo.

Figura 82 – Espaços livres dos distritos da região central (PI CS) e área pública alienada
228

Espaços livres das Micro-Regiões do Setor Central (PI CS)


229

4.1.1.10. MICRO-REGIÃO SÃO DOMINGOS (PI CURI)

O PI CURI corresponde à digitalização do distrito São Domingos


englobando os Bairros da Vitória, São Carlos, Floresta, Boa Vista, São
Domingos, mais o Recreio dos Bandeirantes e o Jardim Curitiba I, II, III e IV.
De acordo com a figura 84, na micro-região São Domingos as
classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de superfície
são: área verde particular, parque, espaço livre, equipamento público e parque
linear. A categoria área verde particular se destaca com uma área de 6,439
milhões de m².
A categoria de parque ocupa uma superfície de 1,271 milhões de
m². Essa região possui importantes fragmentos de reservas de floresta de
interflúvio (v. Seção 1.2.3.1). A categoria jardim de representação soma um total
de 195,50 mil m², o que é significativo por se tratar de uma categoria
caracterizada por ocupar individualmente pequena superfície de terreno.
A área pública parcelada é de 196,74 mil m², representando um
índice de 6,31% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 84 – Espaços livres da micro-região São Domingos (PI CURI) e área pública alienada
e/ou parcelada

O mapa da figura 85 mostra os espaços livres do PI CURI.


230

Espaços livres da Micro-Região São Domingos (PI CURI)


231

4.1.1.11. PLANO DE INFORMAÇÃO JARDIM FAIÇALVILLE (PI FAI)

O PI FAI corresponde à digitalização do Jardim Faiçalville, Jardim


Presidente, Vila Rosa, Jardim Sônia Maria, Setor Solar Santa Rica e Residencial
Della Penña.
De acordo com a figura 86, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
parque, parque linear, equipamento público e praça. A categoria área verde
particular se destaca com uma área de 513,63 mil m². A categoria de parque
ocupa uma superfície de 354,61 mil m² e de parque linear com 297,52 mil m²,
constituindo-se em importantes fragmentos de reservas de floresta urbana.
A área pública parcelada é de 131,42 mil m², representando um
índice de 10,38% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 86 – Espaços livres do Plano de Informação Faiçalville (PI FAI) e área pública
alienada e/ou parcelada

O mapa da figura 87 mostra os espaços livres do PI FAI.


232

Espaços livres do Plano de Informação Jardim Faiçalville (PI FAI)


233

4.1.1.12. MICRO-REGIÃO CRIMÉIA LESTE (PI FERR)

O PI FERR corresponde à digitalização do Setor Criméia Leste,


Vila Megale, Vila Fróes, Loteamento Manso Pereira, Vila Jaraguá, Vila
Monticelli, Setor Negrão de Lima que integram o distrito Criméia Leste.
De acordo com a figura 88, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque linear, cemitério,
equipamento público e espaço livre público. A categoria de parque linear ocupa
uma superfície de 995,85 mil m² devido às planícies de inundação dos Ribeirões
Anicuns e João Leite bem como do Rio Meia Ponte.
O Cemitério Jardim das Palmeiras localiza-se neste distrito,
ocupando 436,11 mil m², resquício de uma área pública originalmente destinada
ao Horto Florestal segundo as diretrizes do Plano Diretor de Cidade de 1938.
Existe inclusive um Contrato de Concessão firmado em 20/09/72 e um Termo
Aditivo de Re-Ratificação, datado de 04/06/98 publicado no D.O.M. nº 2.163,
entre a Fraternidade e Assistência a Menores Aprendizes (FAMA) – instituição
ligada à maçonaria – e o Município de Goiânia. Este, como poder concedente
tem o direito de 15% sobre o valor bruto dos jazigos comercializados e de 20%
sobre o faturamento bruto de todos os serviços funerários prestados pela
concessionária.
Neste distrito, a área pública parcelada é de 513,44 mil m²,
representando um índice de 18,29% de dilapidação do patrimônio público

Figura 88 – Espaços livres do distrito Criméia Leste (PI FERR) e área pública alienada
234

Espaços livres da Micro-Região Criméia Leste (PI FERR)


235

4.1.1.13. MICRO-REGIÃO FINSOCIAL (PI FINS)

O PI FINS corresponde à digitalização da Vila Finsocial,


Residencial Alto Vale, Setor Morada do Sol, Residencial Prive Norte, Jardim
Colorado, Setor Parque Tremendão, Jardim Fonte Nova, Setor Novo Planalto,
Residencial Vista Bela, Jardim das Hortências, Vila Mutirão e Jardim
Liberdade, pertencentes ao distrito Finsocial.
De acordo com a figura 90, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
equipamento público, parque linear e praça. A categoria de área verde particular
ocupa uma superfície de 1,046 milhões de m², contendo fragmentos de reservas
urbanas de Mata e de Cerradão. A área destinada à categoria equipamento
público soma 364 mil m² numa região carente de serviços públicos na qual há
predominância de uma população de extrato social D/E. Isto é, não é por falta de
espaço geográfico que estes equipamentos deixariam de ser instalados.
Neste distrito, a área pública parcelada é de 32,81 mil m²,
representando um índice de 3,70% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 90 – Espaços livres da micro-região Finsocial (PI FINS) e área pública alienada
236

Espaços livres da Micro-Região Finsocial (PI FINS)


237

4.1.1.14. MICRO-REGIÕES MADRI E ITAIPU (PI GARA)

O PI GARA corresponde à digitalização do Setor Garavelo, Setor


Caravelas, Jardins Madri, pertencentes ao Distrito Madri e do Condomínio
Cristina, Setor Maria Celeste, Condomínio Andréia, Condomínio Amin
Camargo, Condomínio dos Dourados, Condomínio Marlene, Setor Grajaú,
Jardim Itaipu e Residencial Itaipu, pertencentes ao distrito Itaipu.
De acordo com a figura 92, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
parque e parque linear. A categoria de área verde particular ocupa uma
superfície de 6,077 milhões de m² devido à vegetação ciliar do Ribeirão
Dourados e aos resquícios particulares de matas.
Nestes distritos, a área pública parcelada é de 80,43 mil m²,
representando um índice de 11,72% de dilapidação do patrimônio público

Figura 92 – Espaços livres das micro-regiões Madri e Itaipu (PI GARA) e área pública
alienada e/ou parcelada.
238

Espaços livres das Micro-Regiões Madri e Itaipu (PI GARA)


239

4.1.1.15. MICRO-REGIÕES URIAS MAGALHÃES E NOVA


ESPERANÇA (PI GENT)

O PI GENT corresponde à digitalização do Setor Urias Magalhães I


e II (Vila Roriz), Bairro Jardim Diamantina, Vila Diamantina, Panorama Parque,
Residencial Morumbi, Vila Nossa Senhora Aparecida, Setor Gentil Meireles e
Granja Cruzeiro do Sul, pertencentes ao Distrito Urias Magalhães e da Zona
Industrial Pedro Abrão, Vila Maria Dilce/Setor Empresarial, Chácara Maria
Dilce, Vila Cristina, Setor Sevene, pertencentes ao distrito Nova Esperança,
acrescido dos Setores Progresso e Perim e da Vila Clemente, que integram o
distrito Aeroviários.
De acordo com a figura 94, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque linear,
equipamento público, cemitério, praça e espaço livre público. A categoria de
parque linear com uma superfície de 401,03 mil m² ocupa as planícies de
inundação dos Ribeirões Anicuns e João Leite bem como do Rio Meia Ponte. O
Cemitério Parque, administrado pela Prefeitura, com 157,68 mil m², localiza-se
no Setor Gentil Meireles.
A área pública parcelada é de 70,54 mil m², representando um
índice de 6,23% de dilapidação do patrimônio público. A Vila Roriz, localizada
na planície de inundação do Rio Meia Ponte na década de 80 por iniciativa da
Prefeitura, representa a quase totalidade da área alienada.

Figura 94 – Espaços livres das micro-regiões do PI GENT e área pública parcelada


240

Espaços livres das Micro-Regiões Urias Magalhães e Nova Esperança (PI GENT)
241

4.1.1.16. MICRO-REGIÃO GOIÂNIA 2 (PI GOI2)

O PI GOI2 corresponde à digitalização do Bairro Goiânia 2, que


integra o distrito de mesmo nome, acrescido da digitalização da Chácara Retiro.
De acordo com a figura 96, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque linear,
equipamento público, parque e jardim de representação/outras classes. A
categoria de parque linear com uma superfície de 659,14 mil m² ocupa as
margens do Ribeirão João Leite bem como do Rio Meia Ponte. A categoria
jardim de representação ocupa uma área de 153,64 mil m². Este tipo de espaço
livre se distribui espacialmente, sobretudo nos afastamentos frontais das
residências, formando largas calçadas e nos cantos de quadras.
Nesta micro-região, não há área pública parcelada, segundo a base
cartográfica utilizada na pesquisa. Portanto, verifica-se um índice de 0,00% de
dilapidação do patrimônio público.

Figura 96 – Espaços livres da micro-região Goiânia 2 (PI GOI2) e área pública alienada e/ou
parcelada
242

Espaços livres da Micro-Região Goiânia 2 (PI GOI2)


243

4.1.1.17. MICRO-REGIÕES GUANABARA E ALDEIA DO VALLE


(PI GUA)

O PI GUA corresponde à digitalização do Jardim Guanabara I, II,


III e IV, Chácara Nossa Senhora da Piedade, Residencial Felicidade, Conjunto
Vila Militar, que integram o distrito Guanabara e do Residencial Aldeia do
Valle, integrante do distrito de mesmo nome, acrescido dos Sítios Ipê e do
Núcleo Empresarial Bernardo Sayão, que fazem parte do distrito Santo Hilário.
De acordo com a figura 98, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
parque linear, equipamento público, parque e espaço livre público. A categoria
de área verde particular ocupa uma superfície de 813,90 mil m²; as áreas de
parque linear e de parque somam, juntas, uma área de 1,259 milhões de m².
Essas categorias representam fragmentos de reservas de floresta de interflúvio e
de cerradão.
A área pública parcelada é de 95,01 mil m², representando um
índice de 3,81% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 98 – Espaços livres das micro-regiões Guanabara e Aldeia do Valle (PI GUA) e área
pública alienada e/ou parcelada
244

Espaços livres das micro-regiões Guanabara e Aldeia do Valle (PI GUA)


245

4.1.1.18. MICRO-REGIÕES SANTO HILÁRIO E PEDROSO (PI HILA)

O PI HILA corresponde à digitalização do Bairro Santo Hilário I e


II, Recanto das Minas Gerais, Jardim Lajeado, Parque das Amendoeiras, Jardim
Abaporu, Residencial Sonho Dourado, Conjunto Residencial Palmares,
Conjunto Caiçara, que integram o distrito Santo Hilário e da Vila Pedroso,
Residencial Mar Del Plata, Loteamento Grande Retiro, Jardim Retiro, Vila
Concórdia, Jardim Dom Fernando I e II, Vila Matilde, Jardim das Aroeiras e
Jardim Conquista, integrantes do distrito Pedroso.
De acordo com a figura 100, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
equipamento público, parque e parque linear. A categoria área verde particular
com uma superfície de 2,178 milhões de m², representa importantes fragmentos
de reservas urbanas de Mata e de Cerradão. A categoria equipamento público
possui com 1,267 milhões de m².
A área pública parcelada é de 91,98 mil m², representando um
índice de 4,08% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 100 – Espaços livres das micro-regiões Santo Hilário e Pedroso (PI HILA) e área
pública alienada

O mapa da figura 101 ilustra os espaços livres do PI HILA.


246

Espaços livres das micro-regiões Santo Hilário e Pedroso (PI HILA)


247

4.1.1.19. MICRO-REGIÕES CAMPUS UNIVERSITÁRIO E PARQUE


DOS CISNES (PI ITAT)

O PI ITAT corresponde à digitalização do Conjunto Itatiaia,


Conjunto Shangri-lá, Residencial Morada do Bosque, Village Atalaia, Sítios de
Recreio São Geraldo, Residencial dos Ipês, Residencial Campus, Residencial
Nossa Morada, Residencial Atalaia, Vila Jardim Pompéia, Vila Jardim São
Judas Tadeu, Vila Maria Rosa, Jardim Califórnia, Chácaras Califórnia, Village
Casa Grande e Morada dos Sonhos, integrantes do distrito Campus
Universitário, bem como do Condomínio Parque dos Cisnes que pertence ao
distrito de Vila Rica.
A área específica do Campus Samambaia da UFG foi digitalizada
em separado no PI UNI (v. adiante na Seção 4.1.1.32). De acordo com a figura
102, as classes de espaços livres mais expressivas, em ordem decrescente de
superfície são: área verde particular, parque, parque linear, equipamento
público e verde viário. A categoria de área verde particular, com uma superfície
de 8,735 milhões de m², a de parque com 915,74 mil m² e a de parque linear
com 316,97 mil m², perfazem uma cobertura de 9,968 milhões de m² de
importantes fragmentos de reservas urbanas da mata semicaducifólia tropical do
Centro-Oeste.
Não há área pública parcelada, segundo a base cartográfica
utilizada na pesquisa e o índice de dilapidação do patrimônio público é 0,00%.

Figura 102 – Espaços livres das micro-regiões Campus Universitário e Parque dos Cisnes (PI
ITAT) e área pública alienada e/ou parcelada
248

Espaços livres das micro-regiões Campus Universitário e Pq. dos Cisnes (PI ITAT)
249

4.1.1.20. MICRO-REGIÕES SANTA GENOVEVA E JAÓ (PI JAÓ)

O PI JAÓ corresponde à digitalização do Bairro Santa Genoveva e


do Setor Jaó, pertencentes aos respectivos distritos Santa Genoveva e Jaó.
De acordo com a figura 104, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: equipamento público,
parque, parque linear, área verde particular e verde viário.
A categoria de equipamento público se sobressai com uma
superfície de 4,933 milhões de m², sendo que o Aeroporto de Goiânia contribui
com 4,117 milhões de m². As categorias de parque com 1,326 milhões de m² e
de parque linear com 526,97 mil m², perfazem a significativa superfície de 1,853
milhões de m² em plena malha urbana relativamente adensada.
A área pública parcelada é de 586,76 mil m². Portanto, em relação
ao total de área pública, incluindo a do Aeroporto, calculando-se uma taxa de
7,76% de dilapidação do patrimônio público. O alvo principal da ação
parceladora e/ou alienadora têm sido o Parque Municipal Aquático Jaó, às
margens do Rio Meia Ponte.

Figura 104 – Espaços livres das micro-regiões Santa Genoveva e Jaó (PI JAÓ)
e área pública alienada e/ou parcelada
250

Espaços livres das micro-regiões Santa Genoveva e Jaó (PI JAO)


251

4.1.1.21. MICRO-REGIÕES SUDOESTE E JARDINS (PI JATL)

O PI JATL corresponde à digitalização do Setor Sudoeste, Setor


União, Vila Bela, Vila Alpes e Residencial Manhattan, pertencentes ao distrito
Sudoeste; do Jardim Atlântico, Jardim Europa, Jardim Planalto, Vila Rezende,
Bairro Anhangüera, Vila Rosa, Parque Anhangüera I e II, integrantes do distrito
Jardins; da Vila Novo Horizonte e Jardim Vila Boa, do distrito Novo Horizonte;
e do Jardim Ana Lúcia, Vila Mauá, Vila Alvorada e Jardim Europa que fazem
parte do distrito Ana Lúcia.
De acordo com a figura 106, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque linear,
equipamento público, praça, jardim de representação, parque e verde viário.
Nestes distritos as categorias são bem diversificadas, sobressaindo a de parque
linear que ocupa uma superfície de 891,81 mil m² ladeando principalmente o
Córrego Cascavel.
A área pública parcelada é de 162,16 mil m². Portanto, em relação
ao total de área pública, verifica-se uma taxa de 9,18% de dilapidação do
patrimônio público.

Figura 106 - Micro-regiões Sudoeste e Jardins e parcialmente N. Horizonte e Ana Lúcia (PI
JATL) e área pública alienada e/ou parcelada
252

Espaços livres das micro-regiões Sudoeste e Jardins (PI JATL)


253

4.1.1.22. MICRO-REGIÕES SANTA RITA E CAROLINA (PI JDBO)

O PI JDBO corresponde à digitalização do Alphaville Residencial,


Jardim Alphaville, Village Santa Rita, Parque Santa Rita, Residencial Rio
Verde, Residencial Forte Ville, Vila São Paulo, Residencial Solar Bougainville,
Jardim Eli Forte, pertencentes ao distrito Santa Rita; do Condomínio Marques de
Abreu, Condomínio Rio Branco, Jardim Aritana, Vila Rizzo, Jardim das Rosas e
Bairro Jardim Botânico, integrantes do distrito Carolina, acrescido das Chácaras
e Condomínio Anhangüera do distrito João Braz, bem como do Residencial
Center Ville e do Solar Santa Rica, do distrito Granville.
De acordo com a figura 108, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
parque linear, equipamento público e espaço livre público. A categoria de área
verde particular ocupa uma superfície de 3,290 milhões de m² contendo
importantes fragmentos de reservas de Mata e de Cerradão.
A área pública parcelada é de 43,56 mil m². Portanto, em relação ao
total de área pública, verifica-se uma taxa de 3,57% de dilapidação do
patrimônio público.

Figura 108 - Micro-regiões Santa Rita e Carolina (PI JDBO) e área pública alienada
254

Espaços livres das micro-regiões Santa Rita e Bairro Jardim Botânico (PI JDBO)
255

4.1.1.23. PLANO DE INFORMAÇÃO JARDIM GOIÁS (PI JG51)

O PI JG51 corresponde à digitalização do Jardim Goiás.


De acordo com a figura 110, as classes de espaços livres neste PI
são bem diversificadas, destacando-se, em ordem decrescente de superfície:
equipamento público, parque linear, parque e área verde particular. As
categorias de parque lineares e de parque ocupam em conjunto uma superfície
de 505,78 mil m², representando importantes unidades de conservação em área
urbana adensada.
A área pública parcelada é de 280,22 mil m². Portanto, verifica-se
uma taxa de 19,27% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 110 – Espaços livres do Jardim Goiás (PI JG51) e área pública alienada e/ou parcelada

O mapa da figura 111 mostra os espaços livres do PI JG51.


256

Espaços livres do Plano de Informação Jardim Goiás (PI JG51)


257

4.1.1.24. MICRO-REGIÃO SOLAR VILLE (PI MAI)

O PI MAI corresponde à digitalização do Tropical Ville, Jardim


Real, Recanto das Garças, Residencial Tempo Novo, Parque Buriti e Setor
Maysa, integrantes do distrito Solar Ville.
De acordo com a figura 112, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: equipamento público,
parque, jardim de representação e praça. As categorias de equipamento público
com 78,96 mil m² e de parque com 61,86 mil m² se destacam como os espaços
livres de maior superfície ocupada nesta micro-região.
Não há área pública parcelada neste distrito, de acordo com a base
cartográfica usada na pesquisa. Portanto, a taxa de dilapidação do patrimônio
público é de 0,00%.

Figura 112 – Espaços livres da micro-região Solar Ville (PI MAI) e área pública alienada
258

Espaços livres da micro-região Solar Ville (PI MAI)


259

4.1.1.25. MICRO-REGIÃO NOVO MUNDO (PI MUN)

O PI MUN corresponde à digitalização do Jardim Novo Mundo,


Vila Morais, Vila Bandeirantes, Vila Romana, Jardim Califórnia/Parque
Industrial, Chácara Bota Fogo, Vila Martins, integrantes do distrito Novo
Mundo.
De acordo com a figura 114, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque, parque linear, área
verde particular, praça e verde viário. Destacam-se as categorias de parque com
581 mil m² e de parque linear com 311,30 mil m² somam a superfície de 892,30
mil m² de unidades de conservação de uso indireto do solo.
A área pública parcelada é de 848,59 mil m². Portanto, calcula-se
uma taxa de 42,90% de dilapidação do patrimônio público. A principal área
parcelada é a do Parque Municipal Palmito, desde a cabeceira até sua foz no rio
Meia Ponte. Esse parque foi proposto no Plano Original da cidade, para
preservar uma reserva de mata semidecídua tropical do planalto central do país.

Figura 114 – Espaços livres da micro-região Novo Mundo (PI MUN) e área pública alienada
260

Espaços livres da micro-região Novo Mundo (PI MUN)


261

4.1.1.26. MICRO-REGIÕES VILA NOVA, LESTE UNIVERSITÁRIO E


BAIRRO FELIZ (PI NOVA)

O PI NOVA corresponde à digitalização do Setor Leste Vila Nova,


e do Setor Leste Universitário que integram, respectivamente, os distritos Vila
Nova e Leste Universitário bem como o Bairro Feliz, Chácara Elísios Campos,
Loteamento Rasmussen, Vila Osvaldo Rosa, Vila Santa Izabel, Vila Colemar
Natal e Silva, do distrito Bairro Feliz, acrescido da Nova Vila e da Vila Viana
que fazem parte do distrito Criméia Leste.
De acordo com a figura 116, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: equipamento público,
parque linear e praça. A categoria equipamento público com 966,19 mil m²,
destaca-se como o espaço livre de maior superfície nesta micro-região. Trata-se
principalmente de área coberta pelas edificações do Campus I da UFG na Praça
Universitária.
A área pública parcelada é de 176,59 mil m². A taxa de dilapidação
do patrimônio público é de 11,77%. A principal área parcelada é a do Parque
Municipal do Setor Leste Universitário, ocupado por algumas residências, por
um clube de futebol, por alguns órgãos estatais e também da iniciativa privada.

Figura 116 – Espaços livres das micro-regiões Vila Nova, Leste Universitário e Bairro Feliz
(PI NOVA) e área pública parcelada e/ou alienada
262

Espaços livres das micro-regiões Vila Nova, L. Universitário e B. Feliz (PI NOVA)
263

4.1.1.27. MICRO-REGIÕES GRANVILLE, GOIÁ E JOÃO BRAZ


(PI PIJB)

O PI PIJB corresponde à digitalização do Residencial Granville,


Vereda dos Buritis, Parque Oeste Industrial, Bairro Recreio dos Funcionários
Públicos, Residencial Canadá, Residencial Porto Seguro, Conjunto Residencial
Monte Carlo, Celina Parque, Residencial Eldorado, Vila Luciana, Chácara Dona
Ge e Residencial Center Ville, que integram o distrito Granville; o Bairro Goiá
I, II, III e IV, Condomínio Santa Rita, Chácara Santa Rita, Parque Oeste
Industrial, Setor Velos e Jardim Mirabel, do distrito Goiá; o Parque Industrial
João Braz, Residencial Tropical Verde, Residencial Goiânia Viva, Araguaia
Parque, Solange Parque I, II e III, Chácara Solange, Parque Paraíso e Lorena
Parque, que fazem parte do distrito João Braz. Neste PI foram digitalizados os
setores Carolina Parque, Jardim das Oliveiras e Jardim das Rosas que integram o
distrito Carolina.
As classes de espaços livres mais expressivas, em ordem
decrescente de superfície são: área verde particular, parque linear, espaço livre
público e equipamento público. As categorias de área verde particular com
2,858 milhões de m² e de parque com 1,079 milhões de m², somam 3,937
milhões de m² de cobertura natural, representado importantes fragmentos de
reservas urbanas de florestas de interflúvio. A área pública parcelada é de
466,97 mil m². A taxa de dilapidação do patrimônio público é de 15,21%.

Figura 118 - Espaços livres das micro-regiões Granville, Goiá e João Braz (PI PIJB) e área
pública parcelada e/ou alienada
264

Espaços livres das micro-regiões Granville, Goiá e João Braz (PI PIJB)
265

4.1.1.28. MICRO-REGIÕES PEDRO LUDOVICO, REDENÇÃO E


SANTO ANTÔNIO (PI PL)

O PI PL corresponde à digitalização do Setor Pedro Ludovico e


Jardim das Esmeraldas, integrantes do distrito Pedro Ludovico; da Vila
Redenção, que integra o distrito de mesmo nome; do Jardim Santo Antônio, que
integra o distrito Santo Antônio. Neste PI foram digitalizados os setores Bairro
Alto da Glória, Conjunto Vila Isabel, Vila Maria José e Vila São João, que
fazem parte do distrito Jardim Goiás.
De acordo com a figura 120, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque, parque linear,
equipamento público, praça e verde viário. As categorias de parque com 1,051
milhões de m² e de parque linear com 245,19 mil m², somam 1,296 milhões de
m² de unidades de conservação de uso indireto do solo em área urbana adensada.
Destaca-se o Jardim Botânico que preserva importante fragmento da mata
semidecídua tropical típica do Centro-Oeste Brasileiro.
A área pública parcelada nestes distritos é de 419,08 mil m².
Portanto, calcula-se uma taxa de 19,27% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 120– Espaços livres das micro-regiões Pedro Ludovico, Redenção e Santo Antônio
(PI PL) e área pública alienada e/ou parcelada
266

Espaços livres das micro-regiões Pedro Ludovico, Redenção e Santo Antônio (PI PL)
267

4.1.1.29. MICRO-REGIÕES PORTAL DO SOL E LARANJEIRAS


(PI PLA)

O PI PLA corresponde à digitalização do Residencial Portal do Sol


e Residencial Aruanã, do distrito Portal do Sol; do Parque das Laranjeiras,
Chácara Alto da Glória, Parque Atheneu, Jardim Mariliza, Parque Flamboyant,
Parque Santa Cruz, Chácara do Governador, Conjunto Fabiana, Parque
Acalanto, Conjunto Carajás, Jardim Bela Vista, Jardim Vitória, Vila Alto da
Glória, Jardim da Luz, Conjunto Anhangüera, que fazem parte do distrito
Laranjeiras.
De acordo com a figura 122, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
equipamento público e parque. A área verde particular com 8,436 milhões de m²
preserva importantes fragmentos de reservas das formações de mata de
interflúvio e ciliar. Na categoria de parque que ocupa 1,405 milhões de m²,
destaca-se o Parque Carmo Bernardes que preserva a mata ciliar do Córrego dos
Buritis.
O Autódromo Internacional de Goiânia localiza-se no distrito Portal
do Sol com 929,92 mil m² integrando a categoria de equipamento público, que
nestas micro-regiões soma o total de 1,733 milhões de m². A área pública
parcelada é de 240,60 mil m². Calcula-se uma taxa de 5,61% de dilapidação do
patrimônio público.

Figura 122 – Espaços livres das micro-regiões Portal do Sol e Laranjeiras (PI PLA) e área
pública alienada e/ou parcelada
268

Espaços livres das micro-regiões Portal do Sol e Laranjeiras (PI PLA)


269

4.1.1.30. MICRO-REGIÃO JARDIM AMÉRICA (PI SERR)

O PI SERR corresponde à digitalização do Jardim América e da


Vila Santa Efigênia, integrantes do distrito Jardim América, acrescido do Setor
Nova Suíça e do Bairro Serrinha que fazem parte do distrito Alto Bueno.
De acordo com a figura 124, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: parque linear, praça e
equipamento público. A categoria de parque linear se destaca com 627,50 mil
m². Nota-se a total ausência da categoria de parque nestas micro-regiões.
A área pública parcelada é de 261,72 mil m². Portanto, calcula-se
uma taxa de 21,73% de dilapidação do patrimônio público. Destaca-se como
área desvirtuada da sua função original o Parque Municipal Morro da Serrinha,
com 107.698 m² (v. tabela 30, Seção 4.1.1).

Figura 124 – Espaços livres da micro-região Jardim América e de parte do Alto do Bueno (PI
SERR) e área pública alienada e/ou parcelada
270

Espaços livres da micro-região Jardim América (PI SERR)


271

4.1.1.31. MICRO-REGIÃO VERA CRUZ (PI VERA)

O PI SERR corresponde à digitalização do Conjunto Vera Cruz I, II


e III, Parque Bom Jesus, Parque Eldorado Oeste, Residencial Primavera e Setor
das Nações, que fazem parte do distrito Vera Cruz.
De acordo com a figura 126, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: área verde particular,
parque, equipamento público, parque linear e jardim de representação. A área
verde particular com 4,381 milhões de m², constitui-se em importantes reservas
de resquícios de matas bem como de formações ciliares e de cabeceiras do
Ribeirão Anicuns e de seus formadores. A categoria parque aparece com 582,43
mil m². A categoria jardim de representação se destaca com 342,23 mil m².
A área pública parcelada neste distrito é de 53,86 mil m². Portanto,
calcula-se uma taxa de 2,46% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 126 – Espaços livres da micro-região Vera Cruz (PI VERA) e área pública alienada
272

Espaços livres da micro-região Vera Cruz (PI VERA)


273

4.1.1.32. PLANO DE INFORMAÇÃO CAMPUS SAMAMBAIA DA UFG (PI UNI)

O PI UNI corresponde à digitalização do Campus Universitário


Samambaia da Universidade Federal de Goiás que, embora fazendo parte do
distrito Campus Universitário, foi digitalizado em separado para visualizar um
espaço enquadrado na categoria de equipamento público com área permeável e
cobertura natural de mata (Bosque Augusto Saint-Hilaire, Matas do antigo
Colégio Aplicação, da Escola de Veterinária e da Represa).
De acordo com a figura 128, as classes de espaços livres mais
expressivas, em ordem decrescente de superfície são: equipamento público,
parque linear e parque.
Na categoria equipamento público, calculou-se uma área permeável
de 4,169 milhões de m². Como parque linear tem-se a quantia de 838 mil m² e
como parque (ou bosque) tem-se 760,43 mil m². Juntas, estas duas últimas
categorias citadas perfazem 1,599 milhões de m² de importantes reservas de
fragmentos da mata semicaducifólia tropical do Município de Goiânia,
abrigando uma fauna bem diversificada (BRANDÃO & KRAVCHENKO,
1997)140.
A área pública parcelada neste distrito é de 0,00 m². Portanto, tem-
se uma taxa de 0,00% de dilapidação do patrimônio público.

Figura 128 – Espaços livres do Campus Samambaia da UFG

140
BRANDÃO, D. & KRAVCHENKO, A. A biota do campus samambaia: história, situação atual e
perspectivas. Goiânia: Editora da UFG, 1997. 157 p.
274

Espaços livres do Plano de Informação Campus Samambaia da UFG (PI UNI)


275

4.1.2. Análise estatística

4.1.2.1. Os fatores IAV e densidade demográfica

Observando-se a tabela 31 é possível supor que há uma relação


causal entre a ocupação humana, indicada pela densidade demográfica e os
espaços livres, indicados pelo índice de área verde (IAV), por micro-região, que
corresponde aos planos de informação – PI’s, do Município de Goiânia.

Tabela 31 – Relação entre densidade demográfica e índice de área verde (IAV)


por micro-região (correspondente ao PI) do Município de Goiânia
Índice de Índice de
Plano de Densidade Plano de Densidade
Área Verde- Área Verde
Informação Demográfica Informação Demográfica
IAV - IAV
(PI) (hab.km-2) * (PI) (hab.km-2) *
(m².hab.-1) (m².hab.-1)
AERO 7.515 38,31 GOI2 318 731,51
AGUA 2.940 282,71 GUA 2.737 113,94
AMAZ 6.054 51,29 HILA 6.919 118,33
BALN 2.427 282,49 ITAT 3.516 589,27
CAMP 9.911 6,34 JAO 1.331 960,78
CAPU 3.045 122,97 JATL 6.128 25,65
CJAR 8.731 28,49 JDBO 876 423,28
CRIO 7.520 17,27 JG51 2.645 219,29
CS 10.187 19,22 MUN 6.572 25,71
CURI 5.617 503,38 NOVA 10.229 28,81
FAI 1.682 156,12 PIJB 3.224 115,36
FERR 4.317 116,83 PL 7.852 46,55
FINS 5.922 48,63 PLA 7.150 316,48
GARA 2.063 576,25 SERR 9.067 19,00
GENT 3.493 33,50 VERA 3.410 303,92
*Fonte: SEPLAM. Distribuição da população e extrato social de acordo com a regionalização de
Goiânia. DPE/DOSE, 1999; Id. Relatório estatístico de quadras por bairro. COMDATA, 2000.

Tomou-se a densidade demográfica como indicador da presença


humana, em habitantes por quilômetros quadrados. Como indicador dos espaços
livres tomou-se o índice de área verde (IAV), em metros quadrados por
habitantes. Quando se estuda a variação de uma variável y em função de uma
variável x, diz-se que y é a variável dependente e que x é a variável
explanatória. No caso, suspeita-se que o IAV apresente variação de valores em
função da densidade demográfica. Então aquele é a variável dependente e esta é
a variável explanatória.
É possível observar a variação do IAV em função da densidade
demográfica através do diagrama de dispersão. Os pares de valores da tabela 31
foram colocados num sistema de eixos cartesianos, respectivamente no eixo das
abscissas e no das ordenadas. Os dados assim ordenados estão apresentados na
figura 130. Nota-se que os pontos da amostra estudada estão dispostos em torno
de uma reta. No caso, as variáveis x e y variam em sentido contrário, isto é, com
o aumento da densidade demográfica, o índice de área verde diminui.
276

Diagrama de dispersão
1.200

1.000
Índice de Área Verde (m²/hab.)

800

600

400
y = a - bx

200

0
- 2.000 4.000 6.000 8.000 10.000 12.000

-200
densidade demográfica (hab./km²)

Figura 130 –Variáveis, dados brutos, y - índice de área verde (em m².hab-1) em função
de x - densidade demográfica (em hab.km-²), por micro-região de Goiânia.

Objetivando tornar válida e melhorar a análise estatística, testou-se


a homogeneidade dos dados da tabela 31, através do método preconizado por
Mead & Curnow (1983)141. Foram obtidas as estatísticas, apresentadas na tabela
32, dos dados de densidade demográfica (hab.km-2) e de IAV (m².hab.–1). A
menor variabilidade, obtida pela razão entre o maior e o menor valor de cada
conjunto de dados, não ocorre na coluna da “amplitude” e sim na da
“amplitude/média”. Concluiu-se que, segundo o método citado, os dados não
são homogêneos, realizando-se a transformação dos mesmos.
Os dados das variáveis transformadas, em escala logarítmica (x’ =
log x e y’ = log y), são apresentados na tabela 33 e na figura 131.
O grau de associação entre as variáveis x e y foi medido pelo
coeficiente de correlação de Pearson (rxy), dado por:

Σxi. yi - (Σx.Σy/n)
rxy =
√{Σxi² - (Σ x)²/n}{Σ yi² - (Σy)²/n}

141
MEAD, R. & CURNOW, R.N. Statistical Methods in Agriculture and Experimental Biology. London:
Chapman and Hall, 1983, reprint 1990.
277

Tabela 32 – Desenvolvimento do método de verificação da homogeneidade dos dados da


tabela 31, segundo Mead & Curnow (1983)
Dens. Dem. IAV Média Amplitude Ampl./Med. Ampl./√med.
PI (hab.km-²) (m².hab) C D E F
A B (B + A)÷2 /A – B/ (D÷C) D÷(√C)
AERO 7.515 38,31 3.776,655 7.476,690 1,980 121,662
AGUA 2.940 282,71 1.611,355 2.657,290 1,649 66,198
AMAZ 6.054 51,29 3.052,645 6.002,080 0,983 54,322
BALN 2.427 282,49 1.354,745 2.144,510 1,583 58,264
CAMP 9.911 6,34 4.958,670 9.904,660 1,997 140,656
CAPU 3.045 122,97 1.583,985 2.922,030 1,845 73,419
CJAR 8.731 28,49 4.379,745 8.702,510 1,987 131,498
CRIO 7.520 17,27 3.768,635 7.502,730 1,991 122,216
CS 10.187 19,22 5.103,110 10.167,780 1,992 142,334
CURI 5.617 503,38 3.060,190 5.113,620 1,671 92,439
FAI 1.682 156,12 919,060 1.525,880 1,660 50,332
FERR 4.317 116,83 2.216,915 4.200,170 1,895 89,206
FINS 5.922 48,63 2.985,315 5.873,370 1,967 107,496
GARA 2.063 576,25 1.319,625 1.486,750 1,127 40,927
GENT 3.493 33,50 1.763,250 3.459,500 1,962 82,387
GOI2 318 731,51 524,755 413,510 0,788 18,051
GUA 2.737 113,94 1.425,470 2.623,060 1,840 69,475
HILA 6.919 118,33 3.518,665 6.800,670 1,933 114,647
ITAT 3.516 589,27 2.052,635 2.926,730 1,426 64,599
JAO 1.331 960,78 1.145,890 370,220 0,323 10,937
JATL 6.128 25,65 3.076,825 6.102,350 1,983 110,013
JDBO 876 423,28 649,640 452,720 0,697 17,762
JG51 2.645 219,29 1.432,145 2.425,710 1,694 64,098
MUN 6.572 25,71 3.298,855 6.546,290 1,984 113,976
NOVA 10.229 28,81 5.128,905 10.200,190 1,989 142,428
PIJB 3.224 115,36 1.669,680 3.108,640 1,862 76,077
PL 7.852 46,55 3.949,275 7.805,450 1,976 124,205
PLA 7.150 316,48 3.733,240 6.833,520 1,830 111,841
SERR 9.067 19,00 4.543,000 9.048,000 1,992 134,240
VERA 3.410 303,92 1.856,960 3.106,080 0,836 36,040
MÉDIA 5.113,27 210,72 Variabilidade 27,552 6,183 13,023

O coeficiente de correlação também pode ser obtido a partir do


coeficiente de explicação (R2), que exprime o quanto da variação total é devida
ao efeito da variável x’ sobre y’, através da relação:

R2 = SQR/SQT ; portanto, r = √R2


278

Tabela 33 – Densidade demográfica – x (hab.km-²) e IAV – y (m2.hab) e seus valores


transformados (x’ = log.x e y’ = log.y), por micro-região de Goiânia

PI x y x' y' PI x y x' y'


AERO 7.515 38,31 3,88 1,58 GOI2 318 731,51 2,50 2,86
AGUA 2.940 282,71 3,47 2,45 GUA 2.737 113,94 3,44 2,06
AMAZ 6.054 51,29 3,78 1,71 HILA 6.919 118,33 3,84 2,07
BALN 2.427 282,49 3,39 2,45 ITAT 3.516 589,27 3,55 2,77
CAMP 9.911 6,34 4,00 0,80 JAO 1.331 960,78 3,12 2,98
CAPU 3.045 122,97 3,48 2,09 JATL 6.128 25,65 3,79 1,41
CJAR 8.731 28,49 3,94 1,45 JDBO 876 423,28 2,94 2,63
CRIO 7.520 17,27 3,88 1,24 JG51 2.645 219,29 3,42 2,34
CS 10.187 19,22 4,01 1,28 MUN 6.572 25,71 3,82 1,41
CURI 5.617 503,38 3,75 2,70 NOVA 10.229 28,81 4,01 1,46
FAI 1.682 156,12 3,23 2,19 PIJB 3.224 115,36 3,51 2,06
FERR 4.317 116,83 3,64 2,07 PL 7.852 46,55 3,89 1,67
FINS 5.922 48,63 3,77 1,69 PLA 7.150 316,48 3,85 2,50
GARA 2.063 576,25 3,31 2,76 SERR 9.067 19,00 3,96 1,28
GENT 3.493 33,50 3,54 1,53 VERA 3.410 303,92 3,53 2,48

Diagrama de dispersão

4,00
3,50

3,00
2,50
y' = log y

2,00
y = -1,2435x + 6,4857
1,50 2
R = 0,549
1,00
0,50
-
- 1,00 2,00 3,00 4,00 5,00
x' = log x

Figura 131 – Gráfico de y’ = log y versus x’ = log x, correspondente aos dados da tabela 33

Os resultados dos cálculos intermediários para a obtenção de rx’y’


com n = 30, que corresponde ao conjunto de pares de variáveis (x’ e y’) da
tabela 33, são os seguintes:
x = 3,61 Σy = 59,98 Σxi² = 393,99 Sy = 0,58
y = 2,00 Σx.Σy = 6,491,63 Σyi² = 129,80
Σx = 108,23 Σxi.yi = 212,05 Sx = 0,39
279

Aplicando a fórmula do coeficiente de correlação, obtemos:


rx’y’ = - 0,74
Portanto, as variáveis y’ e x’ têm forte correlação negativa. No
entanto, pode não haver entre elas relação de causa-e-efeito. O teste de hipótese
referente a β nos dirá se há regressão de y’ para x’ ou não.
O F-teste foi aplicado para testar a hipótese de que o coeficiente de
regressão (β) entre as duas variáveis estudadas é igual a zero, contra a hipótese
de que é diferente de zero.
Ho : β = 0

Ha : β ≠ 0
A hipótese foi testada através da análise de variância que estuda as
causas da variabilidade dos dados: se devida à regressão (isto é, por efeito da
variável x sobre y); ou se devida ao acaso (variabilidade residual).
O F-teste verifica se a variância causada por efeito da variável x
sobre a variável y é maior do que a variância residual. Logicamente se x não
influir sobre os valores de y, estes tenderão a se distribuir ao redor da sua própria
média.
Para fazer a análise de variância, calculou-se:
a) os graus de liberdade:
da regressão: k – 1 = 1
do total: n – 1 = 29
dos desvios da regressão: n – k = 28
b) a soma de quadrados total
SQT = Σyi² – {(Σy)²/n} = 9,88
c) a soma de produtos
SP = Σxi.yi – (Σx.Σy/n) = - 4,35
d) a soma de quadrados de x
SQx = Σxi² – {(Σx)²/n} = 3,50
e) a soma de quadrados da regressão
SQR = (SP)²/SQx = 5,41
f) a soma de quadrados de desvios da regressão:
SQDR = SQT – SQR = 4,47
g) quadrado médio da regressão
QMR = SQR/(k – 1) = 5,41
h) o quadrado médio de desvios da regressão
QMDR = SQDR/(n – k) = 0,16
i) o valor de F
F = QMR/QMDR = 33,81
Assim, quando QMDR > QMR, o valor de F deverá ser menor do
que o valor crítico para a significância especificada e o grau de liberdade
exigido, aceitando a hipótese nula de que não há regressão; o contrário ocorrerá
quando QMDR < QMR, rejeitando a hipótese nula, i.é., há regressão.
280

Tabela 34. Análise de variância – modelo y’ = a + b.x’, dos dados da tab. 33


Causas de variação GL SQ QM F
Regressão 1 5,41 5,41
33,81
Desvios da Regressão 28 4,47 0,16
TOTAL 29 9,88 S² = 0,34 R² = 0,55

F = 33,81 > F .01 (1; 28) = 7,46


Conclusão: o coeficiente de regressão (β) entre as variáveis
estudadas é, estatisticamente, significante para α = 1% com 1 e 28 graus de
liberdade. Portanto, rejeita-se a hipótese nula e aceita-se a hipótese alternativa
de que há regressão de y’ para x’.
Em termos práticos, o aumento da densidade demográfica, em
Goiânia, causa uma diminuição do índice de área verde.
O coeficiente de determinação (CD) ou coeficiente de explicação
(R²) permite conhecer quanto da variação de y pode ser explicada pela variação
de x, através das fórmulas:

CD = 100.(rx’y’)² ou CD = (SQR/SQT).100 = R².100

Calculando, obtêm-se:
CD = 55%
Isto significa que, em Goiânia, nesta proporção, a redução do IAV
pode ser explicada pelo aumento da densidade demográfica.
Estabelecida a relação entre IAV e densidade demográfica, foi
ajustada uma equação de regressão linear simples (isto é, a equação de uma reta
envolvendo duas variáveis) aos valores numéricos das variáveis transformadas.
A regressão de y para x, numa população de pares de valores dessas
variáveis, é a equação geral e reduzida da reta:

y = a + b.x

Designa-se por Ŷ os pontos y onde a reta passa. Assim, a equação


acima pode ser reescrita da seguinte maneira:

Ŷ = a + b.x
Com a transformação logarítmica dos dados, temos:

y’ = log a – b. x’

Sendo: y’ = log Ŷ e, x’ = log x


De acordo com a definição de logaritmo, segue que:
Ŷ = 10 y’
281

A linha reta fica determinada conhecendo-se o coeficiente angular


(b) – que mede a sensibilidade da regressão, representando a inclinação dada
pela tangente do ângulo que a reta de melhor ajuste faz com o eixo y – e o
coeficiente linear (a) – que registra o ponto da interseção da reta de regressão
com o eixo y.
Os coeficientes a e b estimam os parâmetros populacionais α e β,
respectivamente, sendo determinados a partir das equações normais da reta de
mínimos quadrados.
O valor de b é obtido pela fórmula:
Σxiyi - (Σx.Σy/n) Ou ainda b = SP/SQx
b= Σxi² - (Σx)²/n
Aplicando a fórmula aos dados do problema em estudo, tem-se:
b = - 1,2435
Obtém-se o valor de a isolando este fator da equação da reta:

a = Y - b.X

Calculando, tem-se que o coeficiente linear do nosso problema é:


a = 6,4837
Então, a reta que apresenta o menor desvio em relação aos valores
transformados de y é dada pela equação da reta de regressão:

y’ = 6,4837 - 1,2435.x’

4.1.2.2. Estimativa do IAV de Goiânia para um futuro qualquer

A equação da reta de regressão, acima calculada, permite estimar os


valores de Ŷ para quaisquer valores de X dentro do intervalo estudado.
Poderíamos estimar, por exemplo, qual seria o IAV de Goiânia para
o ano 2.015. De acordo com o PDIG (Goiânia, op. cit.) a projeção da população
urbana da capital do Estado de Goiás para a data citada é de 1.564.775 pessoas.
Considerando que o adensamento humano ocorrerá, principalmente, sobre a
atual base territorial urbanizada, poderíamos calcular, em 2015, uma densidade
demográfica da ordem de 7.635.
Assim, para X = 7.635, calculamos:
x’ = log.X = 3,88
Substituindo este valor em:
y’ = 6,4857 - 1,2435.x’
Temos:
y’ = 1,6574
A estimativa de y (Ŷ) é dada por:
Ŷ = 10 y’ = 101,6574
282

Resultando em:
Ŷ = 45,40
Portanto, podemos prever que nos próximos 15 anos o IAV de
Goiânia sofrerá uma redução de 54,71%, passando dos atuais 100,25 m².hab. -1
para 45,40 m².hab.-1, o que corresponde a uma taxa anual negativa de 3,65%.

4.1.2.3. Os fatores densidade demográfica e índice de dilapidação do


patrimônio público

Observando-se os dados do nosso problema, é possível supor que


há uma relação entre a densidade demográfica e o índice de dilapidação do
patrimônio público, por micro-região (que corresponde aos planos de
informação – PI’s) de Goiânia. Interessa estudar o comportamento conjunto das
duas variáveis e saber em que medida aumenta o índice de dilapidação do
patrimônio público quando a densidade demográfica aumenta.
Seguindo o mesmo procedimento da seção anterior, foi verificada a
homogeneidade dos dados pelo método de Mead & Curnow (op. cit.),
concluindo-se que os dados são heterogêneos, sofrendo transformação
logarítmica. Como o valor zero aparece no conjunto de dados, utilizou-se a
transformação x’ = log (x + 1) e y’ = log (y + 1).
Os pares de valores transformados da tabela 35 foram ordenados e
apresentados em diagrama de dispersão na figura 132. Os pontos da amostra
estudada foram ajustados em torno de uma reta. No caso, as variáveis x’ e y’
variam num mesmo sentido, isto é, com o aumento da densidade demográfica, o
índice de dilapidação do patrimônio público também aumenta.
O grau de associação entre as duas variáveis, medido pelo
coeficiente de correlação de Pearson (rx’y’), aplicando-se a fórmula já vista, é:
rx’y’ = 0,575.
Portanto, as variáveis x e y têm correlação positiva média.
O teste t foi aplicado para testar a hipótese de que o coeficiente de
correlação entre as duas variáveis estudadas é igual a zero, contra a hipótese de
que é diferente de zero.
Ho : ρxy = 0

Ha : ρxy ≠ 0
Como o coeficiente de correlação varia entre -1 e +1, se ele for
igual a zero, não existe correlação linear entre as variáveis. Mas como, no caso,
ele é diferente de zero (/rx’y’/ = 0,575), realiza-se a prova de significância da
estatística encontrada, para α = 1%.
A hipótese foi testada por:
rx’y’ √ n - 2
/to/ =
√ 1 - (rx’y’)²
283

Sendo: /to/ = t observado (calculado); rx’y’ = 0,575; n - 2 = 28.

Tabela 35 – Densidade demográfica – x (hab.km-²) e índice de


dilapidação do patrimônio público – y (%) e seus valores transformados
x’ = log (x + 1) e y’ = log (y + 1), por micro-região de Goiânia
PI x y x' y' PI x y x' y'
AERO 7.515 37,15 3,88 1,58 GOI2 318 0,00 2,50 -
AGUA 2.940 8,07 3,47 0,96 GUA 2.737 3,81 3,44 0,68
AMAZ 6.054 37,93 3,78 1,59 HILA 6.919 4,08 3,84 0,71
BALN 2.427 0,16 3,39 0,06 ITAT 3.516 0,00 3,55 -
CAMP 9.911 53,38 4,00 1,74 JAO 1.331 7,76 3,12 0,94
CAPU 3.045 26,44 3,48 1,44 JATL 6.128 9,18 3,79 1,01
CJAR 8.731 15,19 3,94 1,21 JDBO 876 3,57 2,94 0,66
CRIO 7.520 43,07 3,88 1,64 JG51 2.645 19,27 3,42 1,31
CS 10.187 32,57 4,01 1,53 MUN 6.572 42,90 3,82 1,64
CURI 5.617 6,31 3,75 0,86 NOVA 10.22911,77 4,01 1,11
FAI 1.682 10,38 3,23 1,06 PIJB 3.224 15,21 3,51 1,21
FERR 4.317 18,29 3,64 1,29 PL 7.852 19,27 3,90 1,31
FINS 5.922 3,70 3,77 0,67 PLA 7.150 5,61 3,85 0,82
GARA 2.063 11,72 3,31 1,10 SERR 9.067 21,73 3,96 1,36
GENT 3.493 6,23 3,54 0,86 VERA 3.410 2,46 3,53 0,54

Diagrama de dispersão
2,00
1,80
1,60
1,40 y' = 0,7883x' - 1,8151
y' = log (y + 1)

1,20 R2 = 0,3303

1,00
0,80
0,60
0,40
0,20
-
- 0,50 1,00 1,50 2,00 2,50 3,00 3,50 4,00 4,50

x' = log (x + 1)

Figura 132 – Gráfico de y’ = log (y + 1) versus x’ = log (x + 1), correspondente aos dados da
tabela 35

Aplicando a fórmula e comparando o t calculado com o t crítico


para nível de significância de 1% e 28 graus de liberdade, temos:
/to/ = 3,718 > t .01 (28) = 2,76
Conclusão: a associação entre as variáveis é, estatisticamente,
significante ao nível de 1% e, por isso, rejeita-se a hipótese nula e aceita-se a
hipótese alternativa. Em outras palavras, existe correlação linear na população
da qual se extraiu a amostra de dados.
284

Em termos práticos, significa que, em Goiânia, essas variáveis


crescem no mesmo sentido: a dilapidação do patrimônio público é acompanhada
pelo adensamento humano.
O coeficiente de determinação (CD) calculado para o problema é
de 57,5% significando que, nesta proporção, as variações em y (índice de
dilapidação do patrimônio público) podem ser explicadas pelas variações em x
(densidade demográfica).

4.1.2.4. O IAV em função da densidade demográfica e do índice de


dilapidação do patrimônio público

A figura 133 ilustra a variação conjunta das variáveis estudadas por


micro-região de Goiânia. A densidade demográfica e o índice de dilapidação do
patrimônio público mantêm correlação positiva entre si e, estas, relacionam-se
negativamente com o IAV. No entanto, ocorrem regiões com baixa densidade e
baixo IAV, mas com alta dilapidação do patrimônio público.

Índice de área verde (IAV)


4,50 3,50

Índice de dilapidação patr. públ.


4,00
3,00
3,50
Densidade Demográfica

2,50
3,00
2,50 2,00

2,00 1,50
1,50
1,00
1,00
0,50
0,50
- 0,00
C LN

JG O
C U

IT A

JB
PI A
O

PL
O

C R

FE I

SE LA
A UA

IO

G A

UA

JD TL
G NS

VE R
A
M 1
N N
RI
C P

FI R
C S

G T
G 2

T
B Z

FA

5
I
EN
P

IL
M

V
A

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U
AR

R
R
R

JA
ER

O
U
R

JA
A

P
O
A
M
G

H
A
A

Densidade Dilapidação IAV Linear (IAV) Linear (Densidade) Linear (Dilapidação)

Figura 133 – Variação do IAV em função da densidade demográfica e do índice de


dilapidação do patrimônio público em Goiânia (variáveis com dados transformados)

Uma compreensão mais completa da variação do IAV de Goiânia


exigiria a identificação de mais indicadores de desenvolvimento urbano para
uma análise multivariada das inter-relações entre os fatores envolvidos.
A identificação destes fatores como variáveis independentes –
(causas), cuja atuação conjugada relaciona-se com a variação da variável
dependente (efeito) pode permitir, estatisticamente, a elaboração de um plano de
regressão múltipla.
De acordo com Silva & Souza (1988)142, um esquema de regressão
múltipla, envolvendo mais de duas variáveis independentes, onde geralmente

142
SILVA, J. X. & SOUZA, M. J. L. Análise Ambiental. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 1988. 196 p.
285

muitas causas concorrem para o mesmo efeito, tem grande aplicabilidade a


estudos ambientais. No nosso caso, poderíamos identificar as causas da redução
das áreas verdes urbanas e, preventivamente, formular políticas de
desenvolvimento urbano sustentável.

4.2. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho quantificou e qualificou os espaços livres do


Município de Goiânia, que possui um Sistema de Espaços Livres diversificado
tanto no aspecto quantitativo como no qualitativo (v. Seções 1.2.3 e 4.1.1).
Calculou-se o Índice de Área Verde (IAV) que é de 100,25 metros quadrados
por habitante. É a cidade de maior índice calculado do país, superando Vitória
com 82,70 m² e Curitiba com 50,15 m².
O IAV expressa a quantidade per capita de biomassa vegetal ou de
espaços livres com potencialidade para proporcionar benefícios ambientais ao
meio urbano (v. Seção 3.6.5). O IAV é um dos indicadores da qualidade de vida
urbana que revela o caráter do desenvolvimento urbano, em particular do uso do
solo e da produção e apropriação do espaço urbano. O IAV da capital de Goiás
constitui-se, assim, num importante instrumento de gestão e planejamento
urbano (v. Seção 3.6).
O elevado IAV de Goiânia é uma característica marcante da sua
concepção urbanística. O Plano Diretor aprovado em 1938, elaborado sob a
influência da concepção de Cidade-Jardim de Howard, estabeleceu a diretriz de
elevada proporção de espaços livres e, especialmente, de áreas verdes por
pessoa.
Contudo, é preocupante o acentuado processo de degradação que o
patrimônio público de Goiânia vem sofrendo. O IAV estabelecido no primeiro
Plano Diretor foi de 121,78 m².hab-1 (v. Seção 2.8.1.1). Em relação ao IAV
atual, ocorreu uma redução de 17,68% per capita. O levantamento realizado
neste trabalho mostrou que, desde os primórdios da capital goiana até os dias de
hoje, foram privatizados quase oito milhões e quinhentos mil metros
quadrados de áreas públicas destinadas a escolas, postos de saúde, praças e
parques. Isto representa a apropriação de 7,72 m² de espaços livres per capita.
A privatização das áreas públicas de Goiânia, com reflexo direto na
redução do IAV, pode ser explicada, em grande parte, pelo aumento da
densidade demográfica e pelo aumento do índice de dilapidação do patrimônio
público (v. Seção 4.1.2).
O estudo da correlação entre estas variáveis apontou para uma
relação de causa-e-efeito, na qual o IAV é uma função inversa da densidade
demográfica e também do índice de dilapidação do patrimônio público. Sendo a
densidade demográfica um indicador expressivo da presença humana no
ambiente, esperar-se-ia, obviamente, esse tipo de relação.
286

Entrementes, em se tratando de gestão do espaço urbano, existem


vários fatores que regulam a relação entre IAV e densidade demográfica. Estes
fatores se referem à legislação de parcelamento e uso do solo municipal. Em
decorrência das diretrizes dos Planos de Urbanização de Goiânia, a legislação do
parcelamento do solo estabeleceu, no mínimo, 35% de espaços livres, sendo
14% de áreas verdes, em relação ao total da gleba parcelada (v. Seção 2.8).
As leis de zoneamento e de uso do solo de Goiânia estabelecem
ainda regras de ocupação do espaço urbano que poderiam, teoricamente, impedir
a degradação do patrimônio público em geral e das áreas verdes em particular
(v. Seção 2.8.4).
Por sua vez, verificou-se uma acentuada dilapidação dos espaços
livres nas micro-regiões em que os loteamentos estão em situação regular
(70,9% dos loteamentos existentes em Goiânia foram aprovados pela
Prefeitura). Quando os loteadores requerem da Prefeitura o parcelamento do
solo urbano, o órgão municipal de planejamento, ao analisar os de planos de
loteamento, tem a oportunidade de estabelecer critérios para a sua aprovação.
Como exemplo, citam-se os índices urbanísticos que relacionam a quantidade de
equipamentos públicos e comunitários com a população prevista, assim como a
quantidade de espaços livres de função ambiental (praças, parques, etc). O
crescimento demográfico não poderia, assim, implicar numa redução per capita
do IAV nesses loteamentos em situação regular.
O estudo da realidade de Goiânia apontou para uma correlação
negativa forte entre IAV e densidade demográfica. Com base na equação de
regressão calculada entre estas variáveis, para uma população estimada no ano
de 2015, em Goiânia, a previsão é a de que o IAV sofrerá uma redução de
54,4% em relação ao atual índice, decaindo de 100,25 m².hab -1 para 45,71
m².hab-1 (v. Seção 4.1.2).
Outrossim, como apontou a análise estatística, o fator densidade
demográfica explica cerca de metade da variação do IAV. Conseqüentemente,
outros fatores relacionados ao problema estudado devem ser investigados. É
provável que, em conjunto com aqueles mais específicos como a densidade
demográfica (hab.km-²) e a densidade de vias pavimentadas (km.km-²), atuem
também os indicadores de desenvolvimento sustentável, relacionados à gestão
do espaço urbano, à efetividade da política municipal do meio ambiente, à
legislação, à fiscalização, à conscientização e à educação ambiental. Todos eles
constituem-se em fatores intervenientes sobre os espaços livres municipais.
A redução dos espaços livres, nos níveis aqui calculados, significa
que o desenvolvimento municipal não é sustentável, pois ele se realiza em
permanente transgressão aos Planos de Urbanização de Goiânia.
Por outro lado, foi encontrada uma correlação positiva entre
dilapidação do patrimônio público e densidade demográfica. Esse tipo de
ligação associa-se à ação dos agentes de produção e apropriação do espaço
urbano (v. Seção 3.5.2). É razoável supor que o aumento da densidade
287

demográfica determine um uso mais intensivo e uma valorização do solo urbano


e, conseqüentemente, contribua para a conversão do espaço urbano, inclusive
dos espaços livres, em “[...] espaço-mercadoria pelos detentores do capital [...]”
(CASSETI, op. cit., p. 132-6).
Em Goiânia, os espaços livres convertem-se em áreas de ocupação
pelos agentes sociais excluídos, num processo de “favelização” dos fundos de
vale e também em áreas de assentamento da população de baixa renda pelo
Poder Público, num processo de regularização de posses urbanas.
Os espaços livres de Goiânia são ainda áreas objeto de implantação
de projetos de várias naturezas pelo Poder Público, como as avenidas marginais
de fundos de vale em áreas destinadas a parques lineares. Vale lembrar que
instituições tanto a nível Federal, como Estadual e Municipal, nas esferas do
Legislativo, Executivo e Judiciário, possuem suas sedes administrativas
edificadas em áreas de parques ou praças municipais e não em áreas
precisamente destinadas a equipamentos públicos.
Este trabalho mostrou que a tendência à redução dos espaços livres
e, em particular, das áreas verdes em Goiânia continuará num ritmo mais intenso
do que o atual, nos próximos anos. Portanto, pode-se afirmar que a continuidade
da política de privatização dos espaços livres é um fator de comprometimento da
qualidade de vida urbana do goianiense. E ainda, a dilapidação do patrimônio
público se constitui numa agressão aos princípios da democracia e da justiça
social.
Esse quadro de degradação das áreas verdes do Município de
Goiânia precisa ser revertido urgentemente. O Município dispõe de meios
suficientes para isso, pois, entre outros, conta com o respaldo da população que
se identifica com as questões ambientais (v. Seção 2.5); conta com uma
legislação urbanístico-ambiental consolidada e ampla, que pode e deve ser
melhorada (v. Seção 2.8.4); conta com o respaldo de instituições como o
Ministério Público do Estado de Goiás, que tem a incumbência constitucional de
zelar pelo cumprimento da lei.

4.3. RECOMENDAÇÕES E SUGESTÕES

4.3.1. Recomendações

Algumas indicações podem ser feitas, no aspecto prático, de


intervenções na natureza e na sociedade, de acordo com as conclusões da
pesquisa, quais sejam:
 Disponibilizar ao Município de Goiânia o banco de dados
elaborado (entidade “espaços livres”), para que ele possa ser inserido como uma
nova camada de informação, no MUBDG desenvolvido pela COMDATA;
 Propor o desenvolvimento de um banco de dados,
alfanumérico, geocodificado, com participação interinstitucional, que permita
288

manter atualizado um cadastro de áreas públicas, inserido num programa de


monitoramento do patrimônio ambiental de Goiânia, buscando implementar
meios de procedimento on-line, com a participação direta dos segmentos sociais
organizados;
 Realizar o levantamento detalhado da vegetação de Goiânia,
tendo-se em vista a indicação georreferenciada das áreas verdes existentes,
visando formular planos de prevenção e de preservação, como a aplicação do
artigo 85, I e do artigo 86 da Lei de Zoneamento que enquadrou como ZPA-I a
área recoberta por mata ou por várzea no Município de Goiânia;
 Em complementação ao item anterior, pode-se indicar a
realização de estudos e levantamentos para a “classificação ecológica dos
espaços urbanos de Goiânia”, sugerindo-se a metodologia formulada por
Dansereau (1999b) que foi brevemente exposta na Seção 3.4.5;
 Colocar à disposição do Ministério Público do Estado de
Goiás os levantamentos, dados e conclusões deste trabalho no sentido de
subsidiar tecnicamente a Promotoria Pública na defesa constitucional do
patrimônio ambiental de Goiânia.

4.3.2. Sugestões

Como sugestão para o desenvolvimento do estudo do ecossistema


urbano de Goiânia, a partir do levantamento e da classificação dos espaços livres
e das áreas verdes, propõe-se a obtenção de dados e informações visando
estabelecer as possíveis relações entre as variáveis sócio-ambientais, a seguir
listadas, com a vegetação, tendo em vista a identificação de parâmetros para a
avaliação da qualidade de vida urbana.

4.3.2.1. Levantamento e medição de variáveis ambientais

Nas unidades amostrais de estudo, tendo-se em vista as micro-


regiões distritais da cidade, sugere-se a realização de levantamento e medição de
variáveis biológicas e físicas do ecossistema urbano de Goiânia:
 Medição da taxa de assimilação de CO2 em plantas,
conduzida com o uso de um analisador infravermelho de gás - IRGA (HALL &
COOMBS, 1989)143;
 Medição in situ nas áreas experimentais da taxa de
transpiração vegetal, usando-se o porômetro de difusão dinâmica (PASSOS,
1996)144;
 Medidas de precipitação pluviométrica, utilizando-se
pluviômetros instalados em cada unidade amostral, determinando-se a espessura
143
HALL D. O. & COOMBS, J. Técnicas de bioprodutividade e fotossíntese. Fortaleza: EUFC, 1989. 292 p.
144
PASSOS, L. P. Métodos analíticos e laboratoriais em fisiologia vegetal. Coronel Pacheco: EMBRAPA-
CNPGL, 1996. 223 p.
289

da camada de água líquida ou altura de precipitação pela medida do volume de


água captado por uma superfície de área conhecida (TUBELIS, 1987)145;
 Determinação da umidade relativa do ar, definida como a
relação entre o teor em vapor d'água que o ar contém e o teor máximo que
poderia conter, à temperatura ambiente (OMETTO, 1981);
 Outras variáveis ambientais de interesse, como a
determinação do teor de evaporação do solo por unidade amostral e estimado
para a respectiva micro-região, utilizando-se técnica e equipamento adequado;
medição da temperatura do ar e do solo, através de termopares; medição dos
níveis de intensidade de poluição sonora, através de aparelhos medidores da
pressão sonora (decibelímetro), visando elaborar o mapa acústico de Goiânia.

4.3.2.2. Levantamento de variáveis sócio-ambientais

Sugere-se o levantamento de variáveis sócio-ambientais


indicadoras da qualidade de vida urbana. Estas variáveis poderiam ser
pesquisadas em documentação indireta, através de amostragem adequada junto
aos órgãos oficiais de saúde pública de Goiânia. Em cada unidade amostral
poder-se-ia fazer o levantamento da ocorrência de doenças do parelho
respiratório superior, procurando-se relacionar os dados de IAV com os de
número de internações, visando avaliar os efeitos de filtração dos poluentes
atmosféricos pela vegetação urbana com reflexos sobre a saúde da população.

145
TUBELIS, A. Meteorologia Descritiva: Fundamentos e Aplicações Brasileiras. Nobel: São Paulo, 1987.
290

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