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Universidade do Vale do Paraíba

Faculdade de Ciência Sociais Aplicadas

DORALICE DE OLIVEIRA E CITRO


VIVIANE SOUZA DA SILVA

SERVIÇO SOCIAL NO JUDICIÁRIO:


LIMITES E POSSIBILIDADES PARA UMA ATUAÇÃO COMPETENTE

São José dos Campos, SP


2007
1

Doralice de Oliveira e Citro


Viviane Souza da Silva

SERVIÇO SOCIAL NO JUDICIÁRIO:


LIMITES E POSSIBILIDADES PARA UMA ATUAÇÃO COMPETENTE

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como parte das exigências da
disciplina de Trabalho de Graduação à
Banca Examinadora do Curso de Serviço
Social da Faculdade de Ciências Sociais
Aplicadas da Universidade do Vale do
Paraíba, segundo a Normalização dos
Trabalhos Acadêmicos da UniVap 2007.
Orientadora: Andréa dos Anjos Pereira da
Silva.

São José dos Campos, SP


2007
2

Doralice de Oliveira e Citro


Viviane Souza da Silva

SERVIÇO SOCIAL NO JUDICIÁRIO:


LIMITES E POSSIBILIDADES PARA UMA ATUAÇÃO COMPETENTE

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado como requisito parcial de Graduação do Curso de


Serviço Social da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade do Vale do
Paraíba, São José dos Campos, SP pela seguinte banca examinadora:

_______________________________________________

_______________________________________________

_______________________________________________

_________________________________________________
_________________________________________________
São José dos Campos, _____ de ________________de 2007.
3

Dedicamos este trabalho


àqueles que são fiéis no que acreditam,
que vão à luta diariamente
mesmo sem saber onde irão chegar.
Aos que não tem voz e nem vez
e que constituem a razão
de nossa paz inquieta.
4

Agradecemos

- a Deus porque Ele é o segredo da nossa paz, nossa única certeza,


o sentido de nossas lutas e por colocar em nossos corações
a chama acesa da Fé, que nos impulsiona a cada dia a seguirmos em
frente no alcance de um amanhã mais justo e mais irmão;

- aos nossos familiares, por constituírem para nós um porto seguro,


ponto de apoio nas horas de angústia
e vitoriosos conosco em nossas alegrias e conquistas;

- à Assistente Social Andréa dos Anjos Pereira da Silva,


amiga, companheira, que caminhou conosco, ao lado, nunca à frente,
cuja postura foi fundamental para garimparmos
o ouro de sua experiência, enriquecendo-nos com sua atuação.
Mesmo “nada sabendo e desconfiando de muita coisa”,
muito temos a agradecê-la porque profissionais assim
fazem a diferença.
5

“Nunca duvide de que um pequeno grupo de cidadãos pensantes e


comprometidos possa mudar o mundo; na verdade, a única coisa que
já mudou o mundo foi isso”.
(Margaret Mead)
6

RESUMO

O presente trabalho visa refletir a prática do Assistente Social no Judiciário, delineando um


perfil ideal a partir do levantamento dos conhecimentos e habilidades próprios deste
profissional que atua frente às diversas expressões da questão social. Este artigo amplia o
olhar sobre a atuação do Serviço Social no Judiciário para além das atribuições que lhe são
pertinentes, e introduz a discussão sobre competência nos aspectos teórico-metodológicos,
técnico-operativos e ético-políticos. Na elaboração do artigo utiliza-se do estudo bibliográfico
e da análise crítica da prática desenvolvida no cotidiano do Setor Técnico do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, na Comarca de Caçapava. As reflexões emergem do contato
com os limites do agir profissional, visto que a prática está inserida numa realidade complexa
e contraditória. A partir da discussão sobre competência dentro deste espaço institucional,
conclui-se que não há um perfil ideal, e sim a existência de uma atuação competente que se
desenvolve entre limites e novas possibilidades.

Palavras-chave: Serviço Social. Judiciário. Competência. Habilidades. Prática profissional.

ABSTRACT

This essay aims to reflect the social worker practice within the Judiciary, tracing an ideal
profile based on a survey of the knowledge and skills that are peculiar to this kind of
professional that acts over several expressions regarding to the social question. This article
increases the vision range concerning the Social Work performance inside the Judiciary
farther the assignments that are relevant to the social worker and it introduces a discussion
about competence regarding to theoretical-methodological, technical-operational and ethical-
political aspects. This article was elaborated using the bibliographical study and the critical
analysis of the practice that was developed on the Technical Section of the Brazilian Justice
Tribunal from São Paulo's province, within Caçapava's Judicial District. These considerations
emerge from the contact with the professional acting limits, since the practice is inserted into
a complex and contradictory reality. Based on the discussion about the competence inside this
institutional area, it can be concluded that there is no ideal profile, but there is the existence of
a qualified performance that grow between limits and new possibilities.

Key words: Social Work. Judiciary. Competence. Skills. Professional Practice.


7

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 08

2 REVISÃO DE LITERATURA 10

3 RESULTADOS 17

3.1 O Serviço Social no Setor Técnico do Judiciário 20

3.1.1 Gerenciamento 21

3.1.2 Ações Acadêmicas 22

3.1.3 Ações Técnico-operacionais 22

4 DISCUSSÃO 27

5 CONCLUSÃO 31

REFERÊNCIAS 33
8

1 INTRODUÇÃO

Atualmente, a prática do Serviço Social nas instituições - seja ela qual for, está
permeável ao fenômeno da globalização. A economia globalizada faz-se acompanhar de
graves implicações no campo social, cultural e político, reproduzindo e acentuando a má
distribuição de renda.
A prática do Serviço Social sofre também influência do neoliberalismo que vem
alterando as dimensões, orientações e funções do Estado, através da concepção do Estado
mínimo, a privatização de empresas públicas, a não intervenção do Estado na economia e a
redução do gasto público destinado à área social.
Neste contexto, percebe-se que há uma tendência para novos postos de trabalho em
organizações não governamentais, ampliação de consultorias devido à terceirização e serviços
privados de saúde, mas ainda assim o Estado é o maior empregador da profissão.
Segundo a Constituição Federal de 1988, enquanto Estado democrático, há a
tripartição dos poderes: Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário.
Desde a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente a atuação dos
assistentes sociais no Tribunal de Justiça (órgão pertencente ao Poder Judiciário, cuja função
principal é a de julgar e aplicar as leis) é consolidada a partir da realização de processos
seletivos no Estado de São Paulo para ampliar o quadro dos setores técnicos, notadamente nas
comarcas do interior.
Assim, o espaço institucional do Poder Judiciário passa a ser um campo de atuação
que desperta a curiosidade e o fascínio dos estudantes de Serviço Social, dada a importância
deste na trajetória de vida dos indivíduos que a ele recorrem.
A partir da experiência de estágio prático do Serviço Social realizado no Setor Técnico
do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, na Comarca de Caçapava, buscou-se elencar
os conhecimentos e as habilidades específicas do Assistente Social no Judiciário que
propiciam um perfil ideal da profissão nesta área.
Contudo, a reflexão sobre a prática é o fio condutor da elaboração do presente trabalho
que inicialmente trará apontamentos de autores que discutem o Serviço Social no Judiciário e
o conceito de “competência”.
O presente trabalho pontuará que, numa atuação competente, o profissional
desenvolve uma série de habilidades essenciais, valendo-se de técnicas para transpor o
9

aparente, escolhendo novas alternativas de intervenção e apresentando-se com empenho, de


forma decisiva para que sua prática não se torne estagnada e mecânica.
Esta produção fomentará a reflexão sobre o grau de responsabilidade do trabalho
desenvolvido nesta área, sobretudo na elaboração do estudo social e apontará a importância
no agir profissional com competência quando, a partir da aplicação de novas formas de
intervenção o profissional propicia a decorrência de novas trajetórias para a vida dos sujeitos
envolvidos.
Este trabalho destacará ainda que, embora a função do Assistente Social nesta área se
restrinja a subsidiar os processos judiciários, os limites decorrentes da prática podem
favorecer uma atuação competente, na medida em que vislumbram novas possibilidades.
Na elaboração, a metodologia utilizada será o estudo bibliográfico de assuntos como:
composição e funcionamento do Judiciário, saber e prática profissional, competência,
habilidades e instrumentalidade do Serviço Social.
O trabalho contará também com o estudo documental através da leitura do plano de
trabalho, processos e relatórios sociais e descreverá a gama de atividades desenvolvidas no
Setor Técnico, inserida no contexto político, econômico e social e divididas em três eixos:
Gerenciamento, Ações Acadêmicas e Ações Técnico-operacionais, a partir dos registros em
caderno de campo e da observação sistemática da prática.
Finalmente será feita análise crítica do agir profissional, estabelecendo a correlação
entre a teoria e a prática.
10

2 REVISÃO DE LITERATURA

É no contexto da globalização mundial, da revolução técnica científica, dos novos


padrões de produção e trabalho, da crescente exclusão social, econômica, política, cultural das
classes subalternas (IAMAMOTO, 2005) que está inserida à prática profissional do Serviço
Social.
“Modificações de várias naturezas, tais como a globalização da economia, o avanço
tecnológico e o ideário neoliberal, incidem diretamente nas relações humanas,
impondo uma postura de ajustamento às novas conformações das relações de
mercado e, consequentemente, ao modo de organização do trabalho. É no cerne
desse contexto que a realidade impõe novas lógicas, posturas e a ética individualista.
Em conseqüência disso, a competitividade inaugura, na esfera do trabalho a
necessidade de transformar habilidades em competências”. (SOUZA; AZEREDO,
2004).
O Assistente Social é o profissional que atua nas expressões da questão social,
formulando e implementando propostas de intervenção para seu enfrentamento, promovendo
o exercício pleno da cidadania. Entende-se por questão social
“o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que
tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se
mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada,
monopolizada por uma parte da sociedade” (IAMAMOTO, 2005).
O objetivo do Serviço Social é participar como agente ativo na formulação das
políticas públicas, para assim incluir e acabar com o jogo da subordinação, transformando a
política de assistência social e os serviços que dela derivam em ferramentas estratégicas do
resgate da cidadania.
Para tanto, é preciso que o Assistente Social busque subsídios para o seu
desenvolvimento intelectual, visando alcançar o conhecimento do conhecimento que deve
aparecer como necessidade primeira, servindo de preparação para enfrentar os riscos
permanentes de erro e de ilusão. É também fundamental dar subsídios aos usuários, num
processo educativo: “Trata-se de armar cada mente no combate vital rumo à lucidez”
(MORIN, 2001).
Por conseguinte, desenvolve-se o espírito crítico do cidadão, como também a
organização e expressão dos conhecimentos e idéias já que
“não há outra solução visível e factível, a ser tomada de imediato, para solução de
médio a longo prazo do problema da falta de prática cidadã no país [...] É preciso
formar o cidadão. Moldar o ser humano de forma a compatibilizá-lo com a ética,
moral, humanidade, solidariedade, crítica e, acima de tudo, consciência, para que
este possa e tenha como buscar a prática constante de seus direitos. Direitos que já
são garantidos em constituição” (BRITO, 1999).
11

Com o advento do processo democrático e da consolidação do Estado de Direito,


também o Poder Judiciário passa por transformações, tendo de “enfrentar o desafio de alargar
os limites de sua jurisdição, modernizar suas estruturas organizacionais e rever seus padrões
funcionais” (FARIA, 2001).

“É possível uma forma alternativa, é possível desenvolver o modelo de mediação, é


possível ocupar espaço político, é possível tratar as pessoas não como súditos e clientela, mas
como cidadãos” (FALEIROS, 1991).

É neste espaço contraditório que se insere a prática do Serviço Social. Como nos alerta
Buriolla (2001)
“o agir profissional do assistente social está constantemente em transformação,
procurando oferecer respostas às questões que as transformações da sociedade lhe
cobram. Isto implica que a prática profissional precisa constantemente redefinida e
que o assistente social (para que essas respostas tenham um caráter transformador)
tenha conhecimento da realidade em sua totalidade, integrando suas várias
dimensões: o jogo de poder entre as classes, as lutas de classe, as condições de vida
dos setores populares, as diversas organizações da população, o conhecimento das
leis que regem os movimentos sociais etc”.

Segundo Chuairi (2001)


“o assistente social judiciário ou forense, como costuma ser denominado, atua nos
diferentes órgãos e setores do Poder Judiciário, intervindo prioritariamente nas
Varas da Infância e Juventude e nas Varas de Família e Sucessões dos Tribunais de
Justiça em processos cujas decisões judiciais envolvem as vidas de crianças,
adolescentes e famílias. Nesta área, o assistente social vem intervindo desde o final
da década de 1940 sendo uma atividade básica a de perito, fornecendo subsídios
técnicos na área de sua competência profissional para a decisão judicial”.
Ao pesquisar sobre as habilidades e a competência do Assistente Social do Judiciário
constata-se que pouco se discute ou se produz sobre este assunto na categoria profissional. O
termo competência sempre vem atrelado à idéia de atribuição, ou seja, o que compete a este
profissional específico.
O próprio Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais, promulgado pelo
CFESS em 1993 utiliza o termo “compete ao” em seu artigo 1º para discriminar as atribuições
dos Conselhos, focando o verbo competir como sinônimo de “cumprir, caber”.
A Lei nº. 8.862/93, que regulamenta a profissão de Assistente Social, em seu artigo 4º,
utiliza o termo “competências” para discriminar as ações próprias do Assistente Social.
Também o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 151, utiliza o termo com a
mesma conotação:
“Compete à equipe profissional, dentre outras atribuições que lhes forem reservadas
pela legislação local, fornecer subsídios por escrito, mediante laudos, ou
verbalmente, na audiência, e bem assim desenvolver trabalhos de aconselhamento,
orientação, encaminhamento, prevenção e outros, tudo sob a imediata subordinação
à autoridade judiciária, assegurada a livre manifestação do ponto de vista técnico”.
12

Ao abordar tal questão, Mioto (2001) afirma que “A competência técnica refere-se à
habilidade do profissional na utilização dos seus instrumentos de trabalho, a qual condiciona a
qualidade técnica da ação profissional”.
Entretanto, segundo Rios (1995),
“Falar em competência significa falar em saber fazer bem [...] numa dupla
dimensão: técnica e política [...], isto é, do domínio dos conteúdos de que o sujeito
necessita para desempenhar o seu papel, aquilo que se requer dele socialmente,
articulado com o domínio das técnicas, das estratégias que permitam que ele,
digamos, „dê conta de seu recado‟, em seu trabalho”.
Assim, o profissional competente é aquele que busca o encontro daquilo que lhe é
desejável, estabelecido valorativamente com relação à própria atuação. A competência,
portanto, não está estabelecida, não é estático, ao qual deva se ajustar o comportamento dos
indivíduos, ou um modelo prescrito num Código. Ela é construída cotidianamente, como um
ideal a ser alcançado (RIOS, 1995).

“A idéia de relação, presente na vida humana, aponta-nos para uma competência


que, além de construída é também compartilhada [...] uma pessoa não pode ser
competente sozinha. A qualidade do seu trabalho não depende apenas dela - define-
se na relação com os outros. As condições para a realização de um trabalho
competente estão na competência profissional e na articulação desta competência
com os outros e com as circunstâncias (RIOS, 1995).
Discutir a questão da competência e das habilidades exigidas na prática cotidiana do
Assistente Social na área jurídica, sob esta ótica, implica em compreender que:
“o Assistente Social não detém todos os meios necessários para efetivação de seu
trabalho: financeiras, técnicos e humanos necessários ao exercício profissional
autônomo[...] Ainda que dispondo de relativa autonomia na efetivação do seu
trabalho, o Assistente Social depende, na organização da atividade, do Estado, da
empresa, entidades não-governamentais que viabilizam aos usuários o acesso aos
seus serviços, fornecem meios e recursos para sua realização, estabelecem
prioridades a serem cumpridas, interferem na definição de papéis e funções que
compõe o cotidiano do trabalho institucional. [...] Importa ressaltar que o Assistente
Social não realiza seu trabalho isoladamente, mas como parte de um trabalho
combinado ou de um trabalhador coletivo que forma uma grande equipe de
trabalho.” (IAMAMOTO; 2005).
Há de se considerar ainda que a prática profissional esbarra não somente nos limites
institucionais, mas também na inoperância de outros setores, sobretudo do Poder Público:
“Diante da ineficácia do Poder Executivo na implementação de políticas sociais
redistributivas e universalizantes, busca-se no Judiciário soluções para estas
situações que são, em última instância, decorrentes da extrema desigualdade social,
principalmente nos países periféricos”. (POCAY; ALAPANIAN, 2006).
Também se faz necessária a compreensão sobre a imensa gama de atividades que lhe
são próprias. O comunicado DRH nº. 308/2004, do Tribunal de Justiça de São Paulo,
publicado no Diário Oficial de 12.03.2004, enumera em dezessete as atribuições dos
Assistentes Sociais Judiciários, aqui citados de forma sumária: atendimento de determinações
judiciais; avaliação dos casos, subsidiando a autoridade judiciária; emissão de laudos
13

técnicos; desenvolvimento de ações de aconselhamento e orientação; desenvolvimento de


atividade junto ao cadastro de adoção; mediação junto ao grupo familiar em situação de
conflito; articulação com a rede de atendimento; acompanhamento de visitas de pais às
crianças; trabalhos junto à equipe multiprofissional; elaboração de relatório estatístico;
atuação em programas de treinamento; supervisão de estágio; planejamento e coordenação de
atividades administrativas do setor social; cadastro de recursos da comunidade; elaboração e
implementação de projetos nos serviços de atendimento a magistrados e servidores; assessoria
a Alta Administração nas questões relativas à matéria do Serviço Social.

Em relação à atuação do Serviço Social Judiciário, há discussões que caminham por


rumos distintos. Segundo Gomes e Resende (2001)

“O Assistente Social deve atuar no Judiciário prioritariamente como perito, não


executando ou elaborando políticas sociais, como constitui o seu papel tradicional
[...] O papel de perito não possui natureza executiva, uma vez não cabe a ele efetuar
o atendimento concreto, mas sugerir medidas ao juiz que podem se converter em
encaminhamentos para a execução do atendimento”.
Há autores que defendem que, conforme o nível de envolvimento e compromisso
assumido pelo profissional, o Serviço Social no Judiciário ou caminha para o compromisso
com a defesa, ampliação e garantia de direitos, ou para o controle, de cunho disciplinar e
normatizador, de comportamentos considerados desviantes de convenções moralizantes
(FÁVERO; MELÃO; JORGE, 2005).
Como alternativas contrapostas à tradição judiciária, a autora Fávero (2006) fomenta
reflexões relativas à ampliação da atuação do Assistente Social no Judiciário, propondo
articulações para ações coletivas e o desenvolvimento de abordagem com indivíduos, famílias
e grupos de atendimento.
Nesta perspectiva, cita-se a técnica do Psicodrama:
“Psicodrama é um método de diagnóstico, assim como de tratamento. Um de seus
traços característicos é que a representação de papéis inclui-se organicamente no
processo de tratamento. Pode ser adaptado a todo e qualquer tipo de problema,
pessoa ou de grupo, de crianças ou adultos. É aplicável a todos os níveis de idade
[...] O Psicodrama é a sociedade humana em miniatura, o ambiente mais simples
possível para um estudo metódico da sua estrutura psicológica. Através de técnicas
com as do Ego-Auxiliar, da improvisação espontânea, da auto-preservação, do
solilóquio, da interpolação de resistência, revelam-se novas dimensões da mente e o
que é mais importante, elas podem ser exploradas em condições experimentais”.
(MORENO, 1997).

A prática psicodramática assenta-se sobre o tripé: Contextos, Instrumentos e Etapas:


Contexto é o encadeamento de vivências privadas e coletivas de sujeitos que se inter-
relacionam numa contingência espaço-temporal. O Psicodrama considera três tipos de
contexto: Social, Grupal e Dramático.
14

O Contexto Social é aquele representado pelo tempo cronológico. O Contexto Grupal


também é marcado pelo tempo atual, no entanto, delimitado. É definido um intervalo de
tempo para sua existência bem como o espaço concreto. O Contexto Dramático passa-se no
“como se”. É subjetivo quanto ao tempo e virtual quanto ao espaço concreto, devidamente
demarcado.
Na sessão psicodramática são utilizados como instrumentos o Protagonista - aquele
que emerge para a ação dramática, considerado o catalisador da emoção do grupo; o Cenário,
espaço virtual com delimitação física sobre o qual se desenvolve a ação dramática; o Diretor -
aquele que coordena a sessão; o Ego-Auxiliar, que auxilia o diretor através da interação com o
Protagonista; o Auditório/Audiência/Público - o conjunto dos participantes do grupo.
A sessão do Psicodrama acontece em três etapas. A primeira consiste na preparação
para a dramatização, chamada de aquecimento, dividido em inespecífico e específico. O
aquecimento inespecífico é o primeiro contato do diretor com o grupo para o entrosamento
inicial dos membros e a identificação do Protagonista. Já o específico é a preparação do
protagonista para a ação (um dos membros ou o grupo todo), definindo-se os papéis a serem
representados.
A segunda etapa é a dramatização considerada o clímax do Psicodrama, onde o
Protagonista representa as figuras do seu mundo interno, vivenciando seu conflito no cenário.
Nesta etapa, o Diretor utiliza técnicas de acordo com a leitura do momento vivido pelo
Protagonista, dentre elas cita-se: Duplo – é feito pelo Ego-Auxiliar ou pelo Diretor, para
expressar aquilo que o Protagonista não consegue expressar; Espelho – consiste em fazer o
Protagonista perceber-se a si mesmo, onde o Diretor retira o Protagonista do Contexto
Dramático e fica a seu lado no Contexto Grupal, assistindo ao desempenho do Ego-Auxiliar,
que ocupa o lugar do Protagonista na ação dramática; Solilóquio – é a expressão em voz alta
do Protagonista sobre o que está sentindo ou pensando naquele momento; Inversão de Papéis
– consiste no Protagonista tomar o papel de seu interlocutor.
A última etapa da sessão é denominada Comentários ou Compartilhar. A atenção
volta-se ao Auditório, ao Público, onde cada participante do grupo expressa aspectos da cena
dramatizada com os quais ele se identifica. (GONÇALVES; WOLFF; ALMEIDA, 1988).
Para efetivar esta prática complexa e diversa, o Assistente Social Judiciário faz jus de
sua habilidade técnica no uso do instrumental, concebida por Koumrouyan e Martinelli (1998)
como:
15

“O conjunto articulado de instrumentos e técnicas que permitem a operacionalização


da ação profissional [...]. O instrumental não é nem o instrumento nem a técnica
tomados isoladamente, mas ambos, organicamente articulados em uma unidade
dialética [...} e expressa o eixo operacional das profissões e abrange não só o campo
das técnicas como também dos conhecimentos e habilidades”.
A habilidade de avaliar os processos em andamento na Vara da Infância e Juventude
ou na Vara de Família e Sucessões, remete o profissional a uma reflexão imprescindível sobre
o fato descrito formalmente. Segundo Battini (1994), para compreender uma situação e
intervir com competência, os assistentes sociais precisam: ter claro o referencial teórico que
ilumina a leitura que faz da realidade, segundo sua visão de mundo; saber desempenhar-se
com habilidade, usando instrumental técnico e estratégias adequadas no enfrentamento da
questão social e ter consciência da repercussão da sua intervenção na defesa de um projeto de
sociedade.
“Pensar os fatos, os acontecimentos, as relações exige questionar, investigar a
realidade, criticá-la, tornando-a evidente pela contínua recolocação de questões,
fazendo-a emergir de forma cada vez mais rica e viva, recriando-a num contínuo
percurso entre a aparência e a essência, entre a parte e o todo, entre o universal e o
particular, numa visão dialética” (BATINNI, 1994).
“Mais do que observar e ouvir se faz necessário refletir para que se possa redefinir a
situação. No momento em que é redefinida pode gerar outras histórias; os sujeitos têm
condições de recordar-se de outros fatos e isto leva a uma outra definição da situação”
(MIOTO, 2001).
Outra habilidade, inclusive necessária para a realização do Estudo Social, é a atitude
investigativa, que para Battini (1994)
“faz superar a visão pragmática da ação dos assistentes sociais que é centrada na
imediaticidade dos fatos e que privilegia seqüências empíricas da ação [...] propicia
desvendar, pelas mediações, a realidade imediatamente dada, descobrindo suas
determinações, suas particularidades, seus atributos”.
Ainda ao nos remetermos para a prática de realização de Estudo Social, no espaço do
Judiciário, destacamos a habilidade de análise interpretativa na construção do parecer social.

Segundo Guimarães (2001), o parecer é a opinião fundamentada, o estudo dos


aspectos de uma lei ou de um caso jurídico [...] a opinião de técnico, perito, arbitrador, sobre
assunto de sua especialidade.

“Através das definições e redefinições que acontecem ao longo de todo o processo é


que se constrói o parecer social. Nesta perspectiva, este nada mais é que a
apresentação da definição de uma situação que o assistente social faz num dado
momento, através de determinados sujeitos e condicionado por determinadas
condições sociais, profissionais e institucionais e outras”. (MIOTO, 2001).
Para chegar ao parecer, o assistente social interpreta a situação apresentada à luz do
saber profissional.
16

“Esse saber se constrói na inter-relação entre conhecimentos já constituídos e postos


à mão e novos conhecimentos em processo de construção [...] O profissional não
tem apenas que analisar o que acontece, mas tem que estabelecer uma crítica, tomar
uma posição e decidir por um determinado tipo de intervenção” (BAPTISTA, 1995).
Percebe-se que o cotidiano do Assistente Social no Judiciário exige uma bagagem de
conhecimentos e habilidades que favorecem seu posicionamento, pois conforme afirma
Magalhães (2006), quanto maior for a instrumentalização teórica e técnica, mais fácil será
impor-se profissionalmente, no sentido de se fazer entender no âmbito da área de atuação.
17

3 RESULTADOS

Como parte integrante da grade curricular do curso de Serviço Social da Universidade


do Vale do Paraíba – UNIVAP, foi realizada a experiência do estágio prático junto ao Setor
Técnico do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo da Comarca de Caçapava – SP, nos
anos de 2006 e 2007.
O município de Caçapava está situado na Região do Vale do Paraíba, distante a
aproximadamente 110 km da cidade de São Paulo, na micro região de São José dos Campos,
com população estimada de 79.036 habitantes.

Assim como as demais cidades do Vale do Paraíba que margeiam a Rodovia


Presidente Dutra, Caçapava é beneficiária da expansão industrial do Estado de São Paulo,
com um parque industrial razoável, além de dispor de atividades agrícolas (cultivo de arroz
em várzeas drenadas e sistematizadas, seguido de cultura de cana-de-açúcar, batata, feijão e
milho) e pecuária leiteira. As atividades de comércio e serviços em Caçapava são incipientes,
em razão da proximidade com cidades como São José dos Campos e Taubaté, que oferecem
maior variedade de serviços.

A Prefeitura Municipal de Caçapava possui oito Secretarias: Administração,


Agricultura, Indústria e Abastecimento, Cidadania e Assistência Social, Saúde, Educação,
Cultura e Turismo, Esportes, Recreação e Lazer, Finanças, Obras e Serviços Municipais.

O Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, no eixo da defesa de


direitos, é composto pelos seguintes órgãos: o Conselho Tutelar, a Vara da Infância e
Juventude, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente – CMDCA e o
Fórum Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente. No eixo da promoção,
Caçapava conta com nove Organizações da Sociedade Civil, cadastradas no Conselho
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente: Lar Emanuel, Lar Fabiano de Cristo,
Casa da Criança, GAMT – Grupo de Assistência ao Menor Trabalhador, Associação
Conviver, APAE, Esquadrão Vida para Adolescentes, AMAS - Associação Moriah de
Assistência Social e Creche Lar Santo Antonio. O município conta com um Abrigo, Casa de
Acolhimento Provisório, entidade governamental vinculada à Secretaria Municipal de
Cidadania e Assistência Social.

A sede do Tribunal de Justiça do Estado de SP - Comarca de Caçapava está situada na


região central da cidade, bem como o Setor Técnico.
18

Para melhor elucidar a estrutura de funcionamento do Tribunal de Justiça da Comarca


de Caçapava, apresenta-se o seguinte organograma:

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO


COMARCA DE CAÇAPAVA

1ª Vara 2ª Vara Cartório de


Judicial Judicial Distribuição Administração Juizado
de Processos Especial
e Contador

Seção Seção Execuções Seção Seção Vara da Juizado Juizado


Cível Criminal Criminais Cível Criminal Infância e Especial Especial
Júri Juventude Cível Criminal

Setor
Técnico

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO A Comarca de


COMARCA DE CAÇAPAVA
Caçapava – SP conta
com duas Varas
Judiciais. Cada Vara
1ª Vara 2ª Vara
Judicial Judicial
Judicial apreende a
área cível e criminal.
A área cível

Seção Seção Execuções Seção Seção Vara da


corresponde às ações
Cível Criminal Criminais Cível Criminal Infância e
Júri Juventude de ordens diversas:
qualquer violação de
Setor direitos do cidadão,
Técnico
dívidas e cobranças,

dano moral e o Direito de Família (separação, divórcio, disputa de guarda de filhos). A área
criminal trata dos processos criminais. Na 1ª Vara Criminal de Caçapava está incluída a Seção
de Execução Criminal, que corresponde ao acompanhamento dos indivíduos reclusos e
acompanhamento e fiscalização das execuções da penas impostas pelo Juízo.
19

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO A 2ª Vara Criminal abrange,


COMARCA DE CAÇAPAVA
cumulativamente, a Vara da
Infância e da Juventude e a
2ª Vara
Judicial Seção Criminal. A Vara da
Infância e Juventude tem dois
aspectos característicos: a
garantia dos direitos da criança e
Seção Seção Vara da
Cível Criminal Infância e do adolescente e a aplicação de
Juventude
medidas sócio-educativas aos
Setor adolescentes infratores.
Técnico

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO A divisão dos


COMARCA DE CAÇAPAVA
processos nas
respectivas varas
é realizada pelo
1ª Vara 2ª Vara Cartório de
Judicial Judicial Distribuição Administração Juizado
de Processos Especial
Cartório de
e Contador
Distribuição da
Comarca.

Juizado Juizado
Especial Especial
Cível Criminal

A Seção da Administração centraliza todo o serviço administrativo da Comarca:


efetivação de compras de material de escritório, coordenação do uso da viatura oficial e da
equipe de limpeza, protocolo centralizado de ações em andamento, fotocópias, telefonia e
assessoria administrativa aos magistrados.
O Juizado Especial Cível visa atender as causas cíveis de menor complexidade com
valor até quarenta salários mínimos. No Juizado Criminal tramitam os processos relativos aos
crimes de menor potencial ofensivo.
20

3.1 O Serviço Social no Setor Técnico do Judiciário

“Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe
quanto és no mínimo que fazes. Assim, em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive”. –
Fernando Pessoa.

O Setor Técnico do Judiciário está localizado no mesmo espaço físico do Juizado


Especial. Conta com duas salas, telefone com linha própria e computador ligado à rede
executiva do Judiciário e um banheiro privativo. No Setor existe uma pequena biblioteca com
livros, textos, revistas e jornais que tratam de assuntos referentes à atuação do Serviço Social
especificamente em relação à criança e ao adolescente.

Em seu quadro, o Setor Técnico de Caçapava conta com duas assistentes sociais e uma
estagiária. Tecnicamente, o Serviço Social responde para o Juiz da Vara da Infância e
Juventude e administrativamente para o Juiz Diretor, que no caso de Caçapava, é o Juiz da 1ª
Vara Judicial.
O principal objetivo do Setor é fornecer subsídios técnicos nos processos das Varas da
Infância e Juventude, Família e Sucessões, quando solicitados pelo Juiz. O Assistente Social
utiliza-se de instrumentos próprios da ação profissional: visitas domiciliares, entrevistas,
relatórios, busca de recursos comunitários, para estudo social do caso e elaboração do parecer
técnico. A atuação do Assistente Social Judiciário está prevista no artigo 151 da Lei Federal
8.069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente e no Comunicado DRH nº. 308/2004.
Na operacionalização de suas atribuições, o Serviço Social da Comarca de Caçapava
desenvolve procedimentos contidos em seu Plano Anual de Trabalho, devidamente
documentado e levado ao conhecimento e apreciação do Juiz Diretor.
Para melhor compreensão e visualização da abrangência e competência que lhes é
assegurado seguem os procedimentos organizados em três grandes blocos:
1. Gerenciamento;
2. Ações acadêmicas;
3. Ações Técnico-operacionais.
21

3.1.1 Gerenciamento

O primeiro bloco - denominado Gerenciamento, abrange as ações de cunho


organizacional, de caráter administrativo. São elas: Cadastro de Recursos da Comunidade;
Assessoria na Fiscalização das Entidades de Atendimento à Criança e Adolescente, Registro
de Atendimento Diário, Preenchimento do Livro de Recebimento de Processos, Participação
em Audiências e a Estatística.
O Cadastro de Recursos da Comunidade é a relação de recursos existentes na região.
Abrange a lista dos serviços existentes no Vale do Paraíba, Capital e em outras localidades,
que atuam ou não na área da infância e juventude.
A Assessoria na Fiscalização das Entidades de Atendimento à Criança e Adolescente
ocorre através das visitas realizadas duas vezes por ano, juntamente com Juiz da Vara da
Infância e Juventude.
O Registro de Atendimento Diário é utilizado no plantão. Os atendimentos efetuados,
bem como os procedimentos adotados são devidamente anotados, por exemplo: orientação
sobre mudança de guarda e encaminhamento para OAB, orientação sobre problema de
conduta de adolescente, encaminhamento ao Conselho Tutelar. A orientação dada e o
encaminhamento efetuado são anotados. Cada atuação do técnico como visita domiciliar,
entrevista social, elaboração de relatório, orientação, contato com recurso da comunidade,
reunião, também são anotados.
O Livro de Recebimento de Processos é utilizado como forma de controle de retirada e
entrega dos autos no Cartório. Cada processo recebido no setor é anotado conforme sua
natureza: Procedimento Verificatório, Guarda, Modificação de Guarda, Sindicância, Pedido
de Providências, Cadastro para Adoção, Adoção, Regulamentação de Visita, Tutela, Busca e
Apreensão e Interdição.
A Participação em Audiências é realizada por intimação do Juiz, sempre com o
objetivo de desempenhar funções pertinentes à condição profissional.
A Estatística representa e explica, através de dados numéricos, a atuação do técnico. A
elaboração mensal e anual contribui para o controle e reflexão da prática.
A tabulação dos dados permite ao profissional elaborar análise sobre a sua atuação,
bem como identificar demandas de intervenção ou reestruturação dos atendimentos.
A Estatística é realizada mensalmente, observando a natureza e o procedimento dos
casos. Com base nos dados mensais é elaborado o quadro anual das atividades executadas
22

pelo Setor. Desta forma, a Estatística corresponde à atuação do técnico na


Comarca e não somente quanto ao número de processos recebidos.

3.1.2 Ações acadêmicas

As ações acadêmicas estão relacionadas aos treinamentos e ao processo de formação


continuada, próprios para o exercício reflexivo da prática cotidiana e renovação de conteúdo
teórico-metodológico, tais como a Supervisão do Estágio de Serviço Social e a Reciclagem
Profissional.
Para a Supervisão do Estágio são definidas reuniões quinzenais entre a supervisora e a
estagiária, onde são discutidos assuntos relevantes ao cotidiano profissional. Além das
reuniões quinzenais, a Assistente Social faz apontamentos e reflexões pertinentes quando
solicitados pela estagiária e também logo após os atendimentos de casos mais complexos.
A Reciclagem Profissional se dá através da participação em congressos, palestras,
seminários, na busca de atualização teórica e prática pertinente à ação profissional, sempre
com a devida liberação do Juiz Diretor.

3.1.3 Ações Técnico-operacionais

As ações técnico-operacionais correspondem ao atendimento direto à população


usuária, como a Triagem Social e a Elaboração do Estudo Social, a Organização do Cadastro
de Casais Interessados em Adoção, a Organização do Cadastro de Crianças em Condições de
Adoção, o Cadastro Individual da Criança/Adolescente sob Medida de Proteção de Abrigo, o
Desenvolvimento do Grupo de Apoio à Adoção e o Trabalho Conjunto com a Casa de
Acolhimento Provisório.
A Triagem Social é caracterizada pelo levantamento dos dados relacionados com os
problemas apresentados pelo usuário com o objetivo de obter as informações necessárias para
o devido encaminhamento. Esta é realizada através do Plantão, cujo horário de atendimento é
compreendido entre 13h30min às 17h de segunda à sexta-feira. A população utiliza-se deste
procedimento para solicitar orientações, encaminhamentos e esclarecimentos sobre os mais
diversos assuntos. As partes que têm processos em andamento nas Varas da Infância e
Juventude e Cível também recorrem ao Plantão.
23

O Estudo Social é constituído numa forma de prova pericial e tem por finalidade
apresentar uma avaliação técnica da situação sócio-familiar das partes em litígio ou de
crianças e adolescentes e prestar subsídios ao Juiz. A elaboração do Estudo Social dá-se
através da utilização do instrumental pertinente ao Serviço Social, ou seja, entrevistas sociais,
contatos com recursos da comunidade, visitas domiciliares (realizadas durante o período
matutino das terças e quintas-feiras), exame de documentação, estudo dos autos e observação.
O instrumental é utilizado de acordo com o objetivo da avaliação e de acordo com as
particularidades de cada caso. Através dele a assistente social efetua levantamento de dados
sobre a situação da criança/adolescente/família e formula o diagnóstico, emitindo parecer
sobre o caso.
Para elucidar a prática do Estudo Social, reproduz-se trecho de um relatório social, no
qual foram alterados os nomes das pessoas e as localidades, para preservar os envolvidos,
visto que o processo corre em segredo de justiça.
“Jonas Silva possui 30 anos, natural de Divinópolis/MG., cursando o último ano de direito, policial
militar, casado há 3 anos com Lívia Silva de 25 anos, estudante de direito. O casal tem uma filha de 2
anos. O endereço do casal encontra-se às págs. 09 dos autos em questão. No dia da visita não
encontramos os moradores em casa. Fomos atendidos por um pedreiro que trabalhava na casa
vizinha. Esta pessoa informou que o Sr. Jonas trabalha e estuda em outra cidade e que retorna ao seu
domicilio somente nos finais de semana. A Sra. Lívia estava viajando. Agendamos visita para o Sr.
Jonas em nova data. No dia marcado o requerente compareceu e foi possível levantarmos os dados
familiares transcritos neste relatório. Jonas relatou que manteve relacionamento com Marília de 30
anos, natural de Bauru/SP., segundo grau, solteira. Desta relação nasceu Andrezza Vieira Silva aos
15/04/96. Andrezza sempre morou com a mãe e a avó materna, Sra. Ísis Vieira de sessenta e três anos,
viúva. A família reside em casa própria ( três quartos, sala, cozinha, banheiro, garagem, amplo
quintal) e conta com os seguintes serviços de infra-estrutura urbana: água encanada, luz elétrica, e
rede de esgoto. Com a detenção de Marília, mãe da infante, Jonas assumiu a guarda da filha, apesar
da Sra. Ísis tentar responsabilizar-se pela neta (sic). Com a liberação de Marília, ocorrida em
dezembro de 2006, após um período de 8 meses e 10 dias, Andrezza voltou a morar com a mãe e com a
avó materna. Jonas esclareceu que permitiu a permanência de Andrezza com a mãe, tendo em vista o
longo período de afastamento entre elas. Disse que há diálogo com Marília. Desta forma, as decisões
referentes a filha são tomadas em conjunto. Efetuamos contato com Marília, que esclareceu não estar
de acordo com a concessão da guarda exclusiva de Andrezza para Jonas. Confirmou que há diálogo
entre ela e o requerente, no entanto, a questão da guarda não foi discutida. Relatou ainda que a
criança visita o pai esporadicamente e, nem sempre está disposta a acompanha-lo. Informou que na
primeira audiência dos autos em questão não pode comparecer, pois se encontrava presa e não teve
escolta (sic). Disse que não contestou a ação, pois, segundo Jonas não havia necessidade (sic).
Andrezza está matriculada no quinto ano do Ensino Fundamental. É certo que Andrezza pretende
continuar junto à mãe e a avó. Jonas por sua vez, desdobra-se entre o trabalho e o curso de direito,
24

ambos em outra cidade, não dispondo de tempo para dedicar-se à filha como gostaria. Possui, porém,
contato freqüente com a criança em tela, na medida do possível. Andrezza recebe assistência adequada
na companhia da mãe e da avó, pessoas que lhe são queridas, havendo reciprocidade de afeto e
segurança emocional. Conversamos tanto com Jonas, quanto com Marília, sobre a possibilidade da
guarda compartilhada tendo em vista a facilidade de diálogo entre eles, conforme exposto por ambos
durante as entrevistas. Houve receptividade à proposta apresentada, ficando o assunto para reflexão.”
A Organização do Cadastro de Casais Interessados em Adoção encontra respaldo legal
no artigo 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente e tem por finalidade propiciar a eficaz
colocação de crianças em lares substitutos, diminuindo o índice de rejeição e fracasso da
adoção. O pretendente à adoção é atendido pela assistente social que fornece o requerimento
de inscrição e o formulário referente à “Qualificação do (a) Pretendente”, cujo preenchimento
fica a cargo do usuário. O requerimento, acompanhado dos documentos exigidos (RG, CPF,
certidão de casamento, certidão de nascimento – se solteiro, comprovante de residência,
comprovante de rendimentos ou declaração equivalente, atestado ou declaração médica de
sanidade física e mental, fotografias do(s) pretendente(s) e de sua residência – parte externa e
interna) é protocolado para início da ação.
O Cadastro de Crianças em Condições de Adoção é realizado mediante determinação
judicial. A organização deste cadastro, além de relacionar as crianças liberadas para a
colocação em família substituta, possibilita agilidade no andamento dos casos que necessitam
de definição.
O Cadastro Individual da Criança/Adolescente sob Medida de Proteção de Abrigo
consiste no acompanhamento direto de cada caso de criança ou adolescente abrigado com
preenchimento de fichas, onde constam dados como data do abrigamento, possibilidade de
retorno à família ou encaminhamento para adoção, entre outras situações até o
desabrigamento.
O Grupo de Apoio à Adoção promove reflexões e formação para os casais e demais
interessados na temática, minimizando assim a problemática da criança abandonada. O seu
desenvolvimento se dá através de reuniões periódicas com pessoas simpatizantes e com os
casais devidamente cadastrados para adoção. Tais reuniões são realizadas fora do horário de
expediente e do local de atuação profissional. Abrange momentos de formação e partilha
sobre temáticas estabelecidas pelo próprio grupo de participantes, tais como “Revelação sobre
a Adoção”, “Divulgação da Mídia versus propaganda Enganosa”, “Trâmite Burocrático”,
“Essência da Adoção”, “Contribuição como Cidadão”, “Abandono versus Adoção”, “Grupo
de Apoio = Alicerce”.
25

O Trabalho Conjunto com a Secretaria Municipal de Cidadania e Assistência Social no


Projeto Renascer tem como proposta, além do caráter preventivo, acompanhar os casos de
crianças e adolescentes acolhidos, possibilitando o retorno ao convívio familiar ou
encaminhando para inserção em família substituta, através de reuniões mensais com os
usuários.
As reuniões são realizadas pela Assistente Social da Secretaria Municipal de
Cidadania e Assistência Social toda primeira segunda-feira do mês, nas instalações do
Albergue Municipal “Monsenhor Theodomiro Lobo”. No ano de 2006, as reuniões foram
ministradas por profissionais dos diversos segmentos da sociedade: psicólogos, educadores,
conselheiros tutelares, assistentes sociais, que deixaram sua contribuição social, no trato com
as famílias em situação de vulnerabilidade.
Desde janeiro de 2007, a convite da Assistente Social do Projeto Renascer, a
Assistente Social do Judiciário passou a contribuir de forma direta nas reuniões, através da
aplicação do Psicodrama.
Para ilustrar esta prática, faz-se aqui um recorte, transcrevendo o registro em caderno
de campo feito após a participação da estagiária em uma das reuniões, utilizando nomes
fictícios:
Em 04.06.2007, cerca de quinze pessoas participaram da reunião do Projeto
Renascer, no horário compreendido entre 09h e 11h, onde foi realizada uma sessão de
Psicodrama, cujo objetivo era de facilitar a reflexão sobre o desempenho da paternidade e
maternidade, visto que os participantes apresentavam dificuldades de relacionamento com os
filhos (desobediência, falta de diálogo, violência no contexto social) e mostravam-se
cansados e abatidos. A diretora da ação (Assistente Social do Judiciário) iniciou o
aquecimento inespecífico, perguntando como foi o Dia das Mães, de forma detalhada (como
foi o almoço, se recebeu presente, o que sentiu). Em seguida, solicitou que cada participante,
de olhos fechados, lembrasse detalhes do dia atual (como foi o despertar, o café da manhã,
como chegaram) e o motivo pelo qual estavam ali. Solicitou ainda que lembrassem um Dia
das Mães marcante e, quando recordassem, poderiam abrir os olhos. Em seguida, os
participantes partilharam em duplas as suas lembranças e os que sentiram vontade relatavam
ao grupo. Uns disseram que não se lembraram de nenhuma ocasião especial, outros
lembraram de coisas positivas e outros, negativas. A diretora conduziu o aquecimento
específico: o grupo que lembrou das coisas positivas poderia, se assim desejasse, oferecer um
presente aos que tiveram más lembranças, o que foi aceito. Na dramatização, foi escolhida
uma canção propícia para o momento, cantada por todos e seguida de um pequeno discurso
26

desejando “Feliz Dia das Mães”. Ao término da canção cada um dos participantes dirigiu-se
aos membros do outro grupo abraçando-os um a um. O abraço fazia parte do presente. Uma
das participantes, Sra. Ana Lúcia disse “Minha mãe não gosta de mim, tenho raiva dela”
(sic). Outra participante, Sra. Silvia indagou: “Você já perguntou pra sua mãe se ela
realmente não gosta de você?”(sic). Ana Lúcia comentou que não: “É melhor cada um no
seu canto”(sic). A diretora da ação perguntou se Ana Lúcia gostaria de dar um abraço em
sua mãe e a resposta foi positiva. Então, solicitou que todos fechassem os olhos e abraçassem
em pensamento a mãe da Sra. Ana Lúcia. Ao abrir os olhos, a diretora sugeriu que a Sra.
Silvia abraçasse a Sra. Ana Lúcia. Na seqüência, em círculo, houve o compartilhar e os
participantes se manifestaram, agradecendo o presente recebido, num clima de forte emoção.
Entretanto, a Sra. Mônica disse “Não foi bom, porque nada está bom para mim, sem meu
filho”(sic). A diretora conduziu o aquecimento especifico de Mônica, perguntando o porquê
de sua insatisfação e descontentamento. Mônica comentou que o grupo poderia ajudá-la a ter
o filho de volta. A diretora conduziu a dramatização, colocando Mônica em pé frente ao
grupo para que a mesma fizesse o pedido. Mônica dirigiu-se à estagiária, perguntando “O
que você pode fazer pra eu ter meu filho de volta?”. A diretora fez uma intervenção, pedindo
para que Mônica fizesse um pedido ao grupo e não a uma pessoa específica. Mônica não
conseguiu. A diretora então perguntou se alguém do grupo poderia ajudá-la. A Sra. Silvia
disse que sim e, ocupando o lugar de Mônica, pediu ao grupo que a ajudassem ter o filho de
volta porque estava sofrendo muito. A diretora pediu que Silvia retornasse ao seu lugar e que
Mônica repetisse o pedido. Mônica repetiu a fala de Silvia. A diretora pediu para que Mônica
se sentasse e como parte do grupo, desse uma resposta. No papel de integrante do grupo,
Mônica falou “Tenha paciência, confie em Deus porque só Ele pode ajudá-la”. A diretora
questionou se era isso mesmo que ela queria dizer e Mônica concordou. Novamente a
diretora conduziu o compartilhar e cada um dos participantes falou sobre os sentimentos
despertados durante a sessão psicodramática. Ao término, de mãos dadas, fizeram um circulo
e cantaram novamente, encerrando o momento com aplausos.
27

4 DISCUSSÃO

A experiência do estágio prático junto ao Setor Técnico do Tribunal de Justiça do


Estado de São Paulo na Comarca de Caçapava foi perpassada por expectativas e sentimentos
inusitados, compondo um cenário contraditório; um misto de entusiasmo, tristezas, alegrias,
decepções, aprendizado e reflexões.
A busca pelo conhecimento e a experiência vivenciada provocou a espera do
inesperado, a abertura para o novo que brota sem parar e a capacidade de rever teorias como
afirma Morin (2001), possibilitando a construção e desconstrução da idéia pré-concebida da
prática do Serviço Social no Judiciário.
No cotidiano desta prática, quer no plantão ou nos atendimentos dos envolvidos nos
processos, o Assistente Social se depara com expressões da questão social, tais como pobreza,
desemprego e trabalho precário, baixo nível de escolarização, precariedade da saúde física e
mental, violência familiar, adolescentes em cumprimento de medidas sócio-educativas,
dependência química, desagregação familiar e disputas nas relações familiares (FÁVERO;
MELÃO; JORGE, 2005).
A partir do contato com a prática profissional, cujo trabalho envolve a questão social
nas suas mais variadas expressões cotidianas (IAMAMOTO, 2005), identifica-se a paixão
como um elemento primordial para uma atuação com competência, esta, no sentido de estar
por inteiro no que se propõe: corpo, alma, mente, sentimentos e toda a bagagem de
conhecimento científico, teórico- metodológico perante o usuário.
Como afirma Baptista (1995), a capacidade da paixão é o motor necessário para uma
ação comprometida, embora o profissional corra o risco da perda desta capacidade, através da
banalização da vida humana provocada pela rotina.
Portanto, a paixão pelo que se faz é a mola propulsora para uma atuação competente.
Falar em competência é perceber a aptidão de fazer bem aquilo que lhe é atribuído, no
sentido de aplicar a capacidade de agir, intervir, decidir diante das mais variadas situações.
Mais do que dispor de conhecimentos e técnicas, ter competência é, sobretudo, demonstrar
eficácia e eficiência no desempenho da profissão, mobilizando valores, sentimentos,
habilidades, e acima de tudo, atitudes para alcançar determinado fim, ainda que de forma
utópica. Como alerta Rios (1995), sem esperança, sem utopia, perde-se o sentido de um
trabalho competente e eficaz, visto que na ação competente sempre haverá um componente
utópico, uma dimensão prospectiva.
28

O assistente social se coloca com todas as suas dimensões de “ser por inteiro”
(SOUZA; AZEREDO, 2004) em cada uma das atividades que desenvolve: leitura de
processos, visita domiciliar, estudo social, plantão social, encaminhamento, supervisão de
estágio, elaboração de laudos, pareceres, relatórios, cadastro, reuniões com grupos de apoio à
adoção, trabalho com as famílias, agindo, portanto, sob esta idéia de competência.
Embora o Comunicado 308/2004 TJ delimite as atribuições do Assistente Social do
Judiciário, antes de tudo, a prática profissional é pautada no Código de Ética Profissional e na
Lei de Regulamentação da Profissão a fim de garantir que as pessoas sejam tratadas, não
como súditos e clientela, mas como cidadãos (FALEIROS, 1991).
Em sua prática profissional, o Assistente Social do Judiciário fomenta o exercício
pleno da cidadania, afinal o seu trabalho é também educativo, visando despertar a consciência
do usuário acerca da prática cidadã (BRITO, 1999).
Assim, torna-se evidente que o Assistente Social não é mais o missionário, nem
apenas o técnico, mas também o intelectual que produz saber (IAMAMOTO, 2001) com
perfil profissional crítico, competência teórica-metodológica, técnica-operativa e ético-
política (RIOS, 1995) e uma postura de compromisso com os sujeitos, construindo respostas
qualitativas (SOUZA; AZEREDO, 2004) frente às demandas sociais.
Na prática do Estudo Social, a Assistente Social deveria proceder a uma visita
domiciliar, realizar entrevista, elaborar o relatório social e devolver o processo (Carta
Precatória) à Vara da Infância e Juventude.
Aponta-se que, mais do que cumprir o que lhe foi ordenado, como seu dever, a
Assistente Social foi além das solicitações atuando com competência e utilizou da habilidade
da atitude investigativa (BATTINI, 1994) identificando o que estava por trás do pedido de
guarda; buscou resposta satisfatória que preenchesse lacunas para uma avaliação mais
profunda do caso e questionou o motivo pelo qual a criança deveria deixar a segurança do lar
que a acolheu desde o nascimento, da comunidade na qual estava inserida, da convivência
amorosa com a avó materna, com a genitora, com os amigos da escola e professores. Elaborou
o parecer visando a garantia do direito à convivência familiar e comunitária da criança.
Assim, não somente analisou-se o caso, mas estabeleceu-se uma crítica, que possibilitou a
tomada de decisão na forma de intervenção, construindo o saber profissional, como ensina
Baptista (1995).
Como afirma Fávero (2006), há a necessidade de sistematizar metodologias de
intervenção concreta sobre a realidade. Nesta lógica, a aplicação do Psicodrama é um
exemplo, mesmo não sendo atribuição própria do Assistente Social no Judiciário. As sessões
29

psicodramáticas levam ao desbloqueio e liberação de emoções, sentimentos, pela constante


inversão de papéis, buscando uma resposta adequada a uma nova situação, através da
espontaneidade, sendo esta o fator primordial para uma existência saudável e uma capacidade
criadora ampliada (MORENO, 1988).
Refletir e analisar esta prática profissional implica em olhar para além do Serviço
Social e reconhecer que a atuação competente do Assistente Social está inserida numa
realidade que apresenta limites e possibilidades, como aponta Iamamoto (2005).
O profissional do Serviço Social, mesmo atuando com competência depende também
da ação de outros atores sociais, ou seja, das pessoas envolvidas diretamente no Sistema de
Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (educadores, profissionais de saúde,
dirigentes de órgão públicos e de organizações da sociedade, advogados, policiais,
conselheiros de direitos e tutelares).
Ao fazer o acolhimento e a escuta, por exemplo, durante a triagem social, depara-se
diretamente com a sede da população por políticas públicas que garantam sua dignidade e
cidadania que busca no Judiciário as soluções para situações decorrentes da extrema
desigualdade social (POCAY; ALAPANIAN, 2006), constatando-se a necessidade de uma
rede de proteção social, de políticas públicas para os devidos encaminhamentos.
Como então zelar pelo Código de Ética Profissional, que traz como princípios a
ampliação e consolidação da cidadania e a defesa intransigente dos direitos humanos? Embora
não se possa colocar o Assistente Social como “salvador da pátria”, nem como o que possui
alternativas em sua “cartola mágica” (IAMAMOTO, 2001) é preciso que ele seja “a voz que
clama no deserto” (Lucas 3, 41) e passe a apontar que a demanda apresentada no Judiciário é o
reflexo da inoperância do Poder Executivo.
Cercado destas limitações, o profissional apresenta possibilidades de redefinir a
prática para oferecer respostas às questões impostas pelas transformações da sociedade
(BURIOLLA, 2001), somando força a outros profissionais, como afirmam os princípios do
Código de Ética, através da “articulação com os movimentos de outras categorias
profissionais”, atuando na “defesa do aprofundamento da democracia” e com
“posicionamento em favor da equidade e justiça social”.
Nesta perspectiva, o Assistente Social assume a atuação competente em sua dimensão
política (SOUZA, AZEREDO; 2004). Como alternativa, o Assistente Social do Judiciário
pode vir a atuar junto aos conselhos de direitos, às discussões nos fóruns, nas reuniões

1
Citação Bíblica que traz referências ao personagem João Batista, o precursor de Jesus Cristo, cuja missão era
anunciar a vinda do Messias e denunciar as iniqüidades, alertando o povo sobre a necessidade de conversão.
30

ampliadas, para contribuir diretamente com propostas que não lhe cabem como intervenção
no Setor, mas que implicam no compromisso com o projeto ético-político da profissão.
Os dados estatísticos elaborados no Setor Técnico do Judiciário podem e devem
contribuir para a elaboração de um “projeto profissional vinculado ao processo de construção
de uma nova ordem societária”, conforme pressupõe o Código de Ética da Profissão. Ora,
como nos aponta Faleiros (1991) as estatísticas recolhem dados sobre o cotidiano das camadas
populares e por isso são formas de sistematização do conhecimento sobre a vida da população
e podem contribuir para a elaboração de estratégias para ao atendimento das necessidades,
bem como servem de indicadores da situação de vulnerabilidade social do município.
Enfim, por sua atuação competente, o Assistente Social do Judiciário assume um dos
maiores desafios da profissão: ser propositivo e não só executivo, como reflete Iamamoto
(2005), visto que sempre há possibilidades de propor alternativas criativas ao apropriar-se das
possibilidades, mesmo diante das contradições presentes na dinâmica da vida social.
31

5 CONCLUSÃO

Ao comentar a prática profissional do Assistente Social no Judiciário é comum que se


focalize inicialmente a intervenção direta através dos estudos sociais solicitados pelo Juiz,
dadas às características estruturais próprias do Poder Judiciário.
Em princípio, ao adentrarmos neste campo de atuação também estávamos permeados
por esta idéia, porém nos deparamos com uma prática diversificada, dinâmica e que exigia um
grau de responsabilidade e maturidade tamanha que nos motivou a percebê-la de outra forma.
Na elaboração deste artigo, inicialmente tínhamos como foco central o perfil do
profissional específico da Comarca onde atuamos, o que nos motivou a elencar suas
habilidades e a maneira como conduzia sua prática para que pudéssemos ressaltá-la como um
perfil ideal de profissional.
No cotidiano de sua prática, o profissional desenvolve habilidades como criatividade,
versatilidade, iniciativa, liderança, capacidade de negociação, avaliação, atitude investigativa,
resolutividade e de argumentação, vivenciando um agir profissional com postura ética,
desempenho, conhecimento e preparo técnico.
Entretanto, mais do que delimitar um perfil, o estudo possibilitou que o despertar de
um novo caminho a percorrer.
Construímos, portanto, a análise a partir do conceito de competência, esta, no sentido
de estar por inteiro no que se propõe: corpo, alma, mente, sentimentos e toda a bagagem de
conhecimento científico, teórico- metodológico perante o usuário.
A competência é construída pelo envolvimento, reciclagem profissional, introspecção
de novas técnicas, sobretudo pela paixão, que é a mola propulsora na definição do diferencial
de uma atuação.
Conclui-se portanto, que uma atuação competente do Serviço Social no Judiciário é
aquela em que emerge um profissional capaz de vencer-se a si mesmo, encarar limites e
através deles, descobrir novas possibilidades para garantir a efetividade de sua ação.
Considerar os limites é perceber que seja qual for o nível de comprometimento, o grau
de responsabilidade, ética e competência do profissional, sua prática sempre se esbarra
naquilo que está acima de suas vontades, seja no contexto social, político, cultural e
institucional.
32

Contudo, os limites podem favorecer o exercício da criatividade, a busca pelo novo, a


ânsia em vencer desafios e abrem por fim, novas possibilidades a serem partilhadas,
transmitidas e vivenciadas, concretizando o que consideramos “competência profissional”.
33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Serviço Social em Revista. Londrina, v. 8, n. 2, jan/jun.2006. Disponível em <
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Lúcia et al. (org.). O uno e o múltiplo nas relações entre as áreas do saber. São Paulo: Cortez,
1995.

BARBOSA, Ana Maria Giusti. O importante papel do estágio no desenvolvimento de


competências. In Revista Agora: Políticas Públicas e Serviço Social, ano 1, n. 1, out.2004.
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BATTINI, Odária. Atitude investigativa e formação profissional: a falsa dicotomia. In


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BÍBLIA SAGRADA. 91 ed. São Paulo: Ave Maria, 1993.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988.

______. Lei Federal 8.662/1993, de 07 de Junho de 1993 – Regulamentação da Profissão de


Assistente Social.

______. Lei n. 8.069/1990, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente.

BRITO, Fernando de Azevedo Alves. Brasil: 500 anos de cidadania?


Teoria da pseudotransferência de cidadania inerente à transferência de
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