Você está na página 1de 15

Capítulo I

O ESPÍRITO SANTO E A IGREJA PRIMITIVA

Igreja primitiva foi, a princípio, composta por judeus.


Tinham como base de sua doutrina a unidade de Deus,
fundamentados na Lei, mas, agora, com a encarnação do Cristo, uma
nova pessoa passa a ter atributos divinos, o Filho, e, juntamente com
Ele, o Espírito Santo, que, no Antigo Testamento, possuía uma
manifestação tímida em relação a Deus, o Pai.

Agora os judeus teriam que lidar com duas novas pessoas que
passariam a ter Sua divindade enfatizada, algo que antes era um
pouco mais obscuro.

O Espírito Santo na Trindade

Inicialmente, Deus não revelara claramente a doutrina da


Trindade, possivelmente para que não causasse confusão à mente
dos judeus, visto que estavam envoltos por comunidades politeístas.
Eles fatalmente tenderiam a interpretar a Trindade como triteísmo e
não como três pessoas em uma unidade.

Porém, com o advento de Cristo, as coisas começam a mudar,


porque, além de possuir prerrogativas divinas, Ele fala de outra
pessoa que também as teria, isto é, o Espírito Santo.

A Igreja, a princípio, devido a muitas perseguições, não parou


para debater este assunto tão profundo. O primeiro concílio que se
deu foi para tratar do conflito entre a lei e a graça – se os gentios
deveriam ou não guardar a lei (At 15), e não foi tratada a questão da
Trindade, o que certamente abordaria algo sobre a pessoa do Espírito
Santo. .

-3- Doutrina do Espírito Santo


1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Tertuliano, expositor da Trindade: O primeiro cristão que a


história menciona como expondo a doutrina da Trindade foi
Tertuliano, por volta do final do segundo século. Essa questão ficou
como que adormecida, não por ser irrelevante, mas, possivelmente
devido às perseguições que a Igreja sofria. Sua maior preocupação
era se defender das calúnias externas advindas dos pagãos e das
mãos de ferro do império que a tentavam massacrar.

Então, quando a Igreja obtém certa estabilidade, a partir do


momento em que o imperador Constantino “adere” ao Cristianismo,
a Igreja passa a tratar da questão da divindade de Cristo – algo que
afetaria diretamente a interpretação sobre a pessoalidade do Espírito
Santo e a Trindade.

A doutrina na Trindade

O primeiro concílio geral em que a Igreja se reuniu para tratar


sobre a divindade de Cristo ocorreu em Niceia, em 325 d.C. Isto se
deu porque um presbítero de Alexandria de nome Ário dizia que
Cristo era um ser criado. Neste concílio ficou decidido que Cristo era
Deus e a doutrina de Ário foi rejeitada.

Ário foi vencido, mas não convencido, e um grupo que o


seguia começou a difundir suas heresias no seio da Igreja. Devido a
isto se fez necessário um novo concílio – o de Constantinopla, em 381
d.C., no qual foi tratada a questão da Trindade e decidido sobre a
divindade de Cristo e do Espírito Santo, como Deus e pessoa,
estabelecendo, assim, a doutrina da Trindade de forma efetiva.

Dificuldades para conciliar a doutrina: Muitas vezes


podemos perguntar: Como os cristãos primitivos poderiam ter
dúvidas quanto à divindade de Jesus e à personalidade do Espírito
Santo? Isto para nós, que estamos há mais de dois mil anos de
história à frente deles, talvez seja mais fácil, mas, para eles que
vinham do paganismo politeísta ou do judaísmo monoteísta,
-4- Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

conciliar a doutrina da Trindade, composta por três pessoas em uma


só divindade, foi muito difícil.

Ainda hoje, apesar de todos esses anos de história, existem


muitos cristãos que não são capazes de fazer uma definição razoável
sobre a doutrina da Trindade. Algo que está diretamente relacionado
com a pessoalidade do Espírito Santo, pois aqueles que negam a
doutrina da Trindade normalmente negam a divindade de Cristo e a
pessoalidade do Espírito Santo.

A personalidade do Espírito Santo

Talvez não pareça algo tão importante, para alguns,


defendermos a personalidade do Espírito Santo; quem sabe pensem
que isto já esteja claro na Bíblia e, afinal, para que “malhar em ferro
frio”? No entanto, existem diversas seitas e linhas de pensamentos
que dizem não acreditar na existência do Espírito Santo como uma
pessoa; pregam que Ele seja simplesmente uma “força ativa de
Deus”.

Vejamos o que diz a Tradução do Novo Mundo adotada pelas


Testemunhas de Jeová: “Ora a terra mostrava ser sem forma e vazia, e
havia escuridão sobre a superfície das águas e profundeza, e a força ativa de
Deus movia-se por cima da superfície das águas.” 1

Nossas traduções usam o nome específico de uma das pessoas


da Trindade enquanto as Testemunhas de Jeová aplicam-no como se
fosse uma força ativa de Deus e não uma pessoa capaz de interagir,
de ter sentimento, de estar ao nosso lado, de compreender a nossa
dor e de interceder por nós junto a Deus com gemidos inexprimíveis.
(Rm 8.26).

1 Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas, Edição Brasileira de 1984, Gn 1.2.

-5- Doutrina do Espírito Santo


1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Quando falamos em personalidade do Espírito Santo, isto tem


diversas implicações para nós. Uma delas é que Ele é uma pessoa,
visto que a personalidade pode ser definida como o conjunto de
características que distinguem uma pessoa. Se o Espírito Santo é uma
pessoa, então Ele tem personalidade e, por isso, ele é uma das
pessoas da Trindade.

O Espírito Santo tem sensibilidade: Outro fator que não deve


ser esquecido é que o Espírito Santo, por ser uma pessoa, é sensível
aos nossos problemas, caso contrário seria uma contradição dizermos
que Ele foi dado como Auxiliador. Ele nos auxilia em nossos
problemas e não é um auxiliador indiferente a nós, seres humanos,
visto ser uma pessoa dotada de sentimentos.

O Espírito Santo interage: Além de ser sensível aos nossos


sofrimentos, por ser uma pessoa, o Espírito Santo pode também
interagir conosco – falar, ouvir e ajudar-nos em momentos aflitivos.
Ele nos foi deixado por Deus como advogado. Como seria difícil se
tivéssemos um advogado que fosse indiferente e que não pudesse
interagir conosco! No entanto, existem muitos que preferem este tipo
de advogado, ao que é relatado na Bíblia como alguém imbuído de
personalidade.

Vejamos um comentário de Berkhof sobre a personalidade do


Espírito Santo:

“São lhE atribuídas características de pessoa, como inteligência


(Jo 14.26; 15.26; Rm 8.16); vontade (At 16.7; 1Co 12.11); e
sentimentos (Is 63.10; Ef 4.30). Ademais, Ele realiza atos
próprios de personalidade: sonda, fala, testifica, revela, luta,
cria, intercede, vivifica os mortos (Gn 1.2; 6.3; Lc 12.12;
Jo 14.26; 15.26; 16.8; At 8.29; 13.2; Rm 8.11; 1Co 2.10,11). O
realizador destas coisas não pode ser um simples poder ou
influência, mas tem que ser uma pessoa. Ele é apresentado como
mantendo tais relações com outras pessoas, que implicam Sua
-6- Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

própria personalidade.Ele é colocado em justaposição com os


apóstolos (At 15.28); com Cristo (Jo 16.13); e com o Pai e o Filho
(Mt 28.19; 2Co 13.14; 1Pe 1.1,2; Jd 20,21). Uma boa exegese exige
que nestas passagens o Espírito Santo seja considerado uma
pessoa. Também há passagens em que se distinguem entre o
Espírito e Seu poder (Lc 1.35; 4.14; At 10.38; Rm 15.13; 1Co 2.4).
Tais passagens seriam tautológicas, sem sentido e até absurdas,
se fossem interpretadas com base no princípio de que o Espírito
é pura e simplesmente um poder impessoal. Pode-se ver isto
substituindo o nome Espírito Santo pela palavra ‘poder’ ou
‘influência’.” (Berkhof, p.97).

Evidências bíblicas

Vimos, então, que o Espírito Santo possui personalidade e, por


isso, podemos concluir que Ele é uma pessoa. Passemos agora a
analisar evidências bíblicas de que Ele realmente seja uma pessoa.
Vejamos.

O Consolador: O Espírito Santo foi descrito por Cristo da


seguinte maneira: “E eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro Consolador, a
fim de que esteja para sempre convosco, o Espírito da verdade, que o mundo
não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; vós o conheceis, porque
Ele habita convosco e estará em vós”(Jo 14.16,17). Esse texto mostra que
existem dois fatos a serem observados.

Jesus Se autodenomina consolador: Ao falar sobre Sua


partida, Jesus diz que enviaria outro consolador, deixando claro que
Ele era também um consolador, como os profetas já haviam predito
(Lc 2.25-32) e Ele mesmo já havia afirmado acerca de Si mesmo. Se
Jesus fala de “outro” é sinal de que Ele não era único, se referia ao
consolador que viria, o Espírito Santo.

Consolador da mesma espécie: O termo grego utilizado aqui


nos dá bem a ideia de quem seria este outro consolador: o Espírito
-7- Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Santo. João usa o termo grego para outro (allos), que se refere a outro
da mesma espécie, dando ao Espírito Santo características de uma
pessoa, visto que ele seria outro (allos) consolador da mesma espécie
que Cristo. Alguém ousaria duvidar que Cristo foi uma pessoa e que,
por isso, possuía personalidade?

Se o Espírito Santo fosse outro consolador de uma espécie


diferente da que fora Cristo, ou seja, se Ele fosse, por exemplo, uma
força ativa, João teria usado o termo grego heteros, que é usado para
se referir a outro de espécie diferente. Este étimo está diretamente
associado à palavra heterossexual, isto é, de um sexo diferente;
heterônomo, de um nome diferente; heterodoxo, de uma doutrina
diferente, estranha.

Parakletos – defensor: O Espírito Santo é chamado de


Consolador, termo derivado do grego parakletos, que tem sentido de
defensor, auxiliador, ajudador. Vejamos o que diz o Dicionário Grego de
Strong sobre este termo:

“Parakletos: chamado, convocado a estar do lado de alguém,


especialmente convocado a ajudar alguém; alguém que pleiteia
a causa de outro diante de um juiz, intercessor, conselheiro de
defesa, assistente legal, advogado; pessoa que pleiteia a causa
de outro com alguém, intercessor; no sentido mais amplo,
ajudador, amparador, assistente, alguém que presta socorro; do
Santo Espírito, destinado a tomar o lugar de Cristo com os
apóstolos (depois de Sua ascensão ao Pai), a conduzi-los a um
conhecimento mais profundo da verdade evangélica, a dar-lhes
a força divina necessária para capacitá-los a sofrer tentações e
perseguições como representantes do reino divino.”2

2 Léxico Grego Strong, Bíblia Online 3.0, Módulo Avançado.

-8- Doutrina do Espírito Santo


1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Identificação com a Trindade

Ninguém duvida que Cristo tenha sido uma pessoa com todas
as características que O distinguem: “Portanto, ide, ensinai todas as
nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”
(Mt 28.19). Da mesma forma podemos dizer de Deus, o Pai; no
entanto, há quem duvide da pessoalidade do Espírito Santo.

O texto supracitado é claro ao relacionar o Espírito Santo às


duas pessoas da Trindade. Cristo, ao relacionar o Espírito Santo a Ele e
ao Pai, dá-nos uma clara visão de que Ele, o Espírito Santo, é uma
pessoa.

Tradução do Novo Mundo: Vejamos como esse texto é


expresso pela Tradução do Novo Mundo da Bíblia Sagrada: “Ide por
todo mundo, e fazei discípulos de pessoas de todas as nações, batizando-as
em nome do Pai, e do Filho, e do espírito santo”3. (Mt 28.19).

Quando se refere ao Espírito Santo, as Testemunhas de Jeová


usam o termo em minúsculo, pois não acreditam na pessoalidade do
Espírito Santo e, por isso, Seu nome não é tratado como um nome
próprio. É, entretanto, claro o antagonismo nesta tradução, visto que
o próprio texto diz: “em nome” e enumera do Pai, do Filho e,
obviamente, do Espírito Santo, aí também se referindo como nome de
alguém por estar seguindo uma sequência enumerativa.

O Espírito Santo na Trindade: Este texto de Mateus não é


único onde o Espírito Santo está diretamente relacionado às outras
duas pessoas da Trindade Santa.

Vejamos outros exemplos: “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o


amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com vós todos.
Amém!” (2Co 13.14).

3 Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas, Edição Brasileira de 1984.

-9- Doutrina do Espírito Santo


1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

“Eleitos segundo a presciência de Deus-Pai, em santificação do


Espírito, para a obediência e aspersão do sangue de Jesus Cristo: graça e paz
vos sejam multiplicadas.” (1Pe 1.2).

“Mas vós, amados, edificando-vos a vós mesmos sobre a vossa


santíssima fé, orando no Espírito Santo, conservai a vós mesmos na caridade
de Deus, esperando a misericórdia de nosso Senhor Jesus Cristo, para a vida
eterna.” (Jd 20,21).

Todos esses versículos supracitados nos mostram claramente a


relação direta que há entre o Espírito Santo e as demais pessoas da
Trindade, levando-nos a crer, com isso, que Ele é uma pessoa e não
uma simples força ativa de Deus. Se assim fosse, a tradução de
Mateus 28.19 seria: “Ide por todo mundo... batizando-as em nome do Pai, e
do Filho e da força ativa de Deus”. Não é possível digerirmos uma
tradução desta natureza e um pensamento deste alvitre. Portanto,
fiquemos com a clareza da Bíblia, ao invés da obscuridade das
heresias.

Atributos e atividades de uma pessoa: Quando defendemos


que o Espírito Santo é uma pessoa, não estamos querendo dizer que
Ele seja um ser humano, possuindo uma forma corpórea, mas, sim,
que, apesar de incorpóreo e não possuir um corpo definido devido à
Sua própria essência, Ele pode ser classificado como uma pessoa
porque apresenta características que somente uma pessoa possui.

Se utilizássemos o critério corpo para definir uma pessoa,


teríamos que dizer que Deus também não é uma pessoa, mas, sim,
uma influência, visto que a Bíblia diz que Ele é invisível e é Espírito
(Jo 4.24; 1Tm 1.17). Mas como está claro que, apesar de Deus, o Pai,
não possuir um corpo definido, (porque a única pessoa da Trindade
que o possui é o Filho e isto devido à Sua encarnação - Fp 2.8), o
Espírito Santo, da mesma forma, apesar de não possuir um corpo
definido, também é uma pessoa, com atributos inerentes à
pessoalidade.
- 10 - Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Atributos pessoais do Espírito Santo

Vejamos a seguir os atributos inerentes a uma pessoa e, da


mesma forma, à pessoa do Espírito Santo.

Ele pensa: O Espírito Santo tem a capacidade de discernir,


pensar, julgar as intenções que procedem do coração; essa realidade é
expressa quando a Bíblia registra que: “E aquele que sonda os corações
sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele
intercede pelos santos.” (Rm 8.27).

Este termo, “mente”, é derivado do grego phroneo, que é


pronunciado como froneo, e, de acordo com o Dicionário
Internacional de Teologia do Novo Testamento, pode ser traduzido
como pensar, julgar, prestar atenção a, fixar a mente em, ter opinião.

Ele faz julgamentos: Esta capacidade do Espírito Santo dá-nos


uma evidência clara de Sua personalidade, visto que Ele pode pensar
e fazer julgamentos sobre algo que é certo ou errado. Isto fica óbvio
quando falamos que Ele está em nós e nos adverte quando erramos,
pois, somente por ter esta capacidade de pensar e fazer julgamento
sobre o certo e errado, é que Ele pode fazer juízo de valores e nos
advertir quando erramos.

Ele faz advertências: Caso contrário, como Ele nos advertiria


se não fosse capaz de fazer juízo de valores, que é algo característico
de quem pensa, porque atribuímos valores às coisas por sermos seres
pensantes. Assim, fazemos distinção, por exemplo, qual determinado
alimento é melhor que outro.

O animal, pelo contrário, como não tem capacidade de atribuir


valores às coisas, estando com fome, basta que aquilo faça parte de
seu cardápio de forma genérica, para se alimentar.

Será que uma onça prefere carne de capivara à de boi? Para


ela basta estar com fome e ser carne, ao passo que nós, que somos
- 11 - Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

seres humanos, fazemos juízo de valor, justamente porque pensamos,


e não agimos de forma instintiva. Devido a isso temos cardápios em
restaurantes. Será que alguém, por acaso, já viu um cardápio na
floresta?

Portanto, a capacidade que temos de pensar faz com que


sejamos aptos a fazer juízos de valor entre “A” ou “B”. Da mesma
forma o Espírito Santo, possuindo personalidade, é capaz de julgar
entre duas alternativas e nos indicar a que seja mais adequada, de
acordo com a vontade divina.

Ele tem vontade: “Mas um só e o mesmo Espírito opera todas essas


coisas, repartindo particularmente a cada um como quer” (1Co 12.11). O
termo para “quer”, aqui, deriva do grego boulomai, que significa ter
vontade, desejar, querer, almejar. Vejamos um comentário feito pelo
Novo Dicionário Internacional do Novo Testamento sobre este termo:

“No Novo Testamento, ‘boulomai’ pode designar os dois tipos


de volição, assim como ocorre no grego helênico e na
Septuaginta, especificação do escritor. ‘Boulomai’ pode,
portanto, denotar a volição consciente como consequência da
reflexão específica, uma decisão de vontade. Esta volição
sempre pressupõe a possibilidade da liberdade da decisão.
Denota volição humana (1Tm 2.8; 5.14; Tt 3.8), ‘quero que faças...’
a exigência apostólica; mas principalmente sem qualquer
relevância teológica (Mc 15.15), ‘Então Pilatos, querendo contentar
a multidão...’; (At 12.4) ‘tencionando apresentá-lo ao povo depois da
Páscoa’; (Tg 4.4) ‘aquele, pois, que quer ser amigo do mundo,
constitui-se inimigo de Deus’. Mas pode também denotar a
volição de Deus (Lc 22.42; Hb 6.17; Tg 1.18; 2Pe 3.9) ou de Jesus
(Mt 11.27;10.22) ou do Espírito Santo. (1Co 12.11).”4

4 Dicionário Internacional do Novo Testamento, Volume II, p. 2676.


- 12 - Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Sendo assim, são-nos dadas evidências claras de que o querer


do Espírito Santo é uma das características de Sua personalidade. O
texto supracitado relaciona o termo original à vontade de Deus, o Pai,
e de Cristo, o Filho, demonstrando com isso que as três pessoas
possuem vontade.

Ele sente tristeza: “E não entristeçais o Espírito Santo de Deus, no


qual estais selados para o Dia da redenção.” (Ef 4.30). O termo grego para
“entristeçais” é lypeite, derivado do verbo lypeo, que tem o sentido de
causar dor, sentir dor, estar triste5.

Nossas atitudes pecaminosas, segundo o contexto de Efésios,


podem entristecer e causar dor ao Espírito Santo de Deus – isto seria
impossível caso Ele não fosse uma pessoa.

O Espírito Santo exerce atividades

O Espírito Santo exerce atividades que são atribuídas a


pessoas: está na dimensão humana de alguém que, além de ter
personalidade, executa as obras que são inerentes a pessoas. Vejamos
algumas.

Conduz a revelação: A revelação se dá através da inspiração:


“porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas
os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (2Pe 1.21
- ARC). Apesar de a tradução acima dizer que os profetas foram
inspirados, uma melhor tradução seria a da Almeida Revista e
Atualizada, que usa o termo - “movidos” -, ou seja, diz que os profetas
foram movidos pelo Espírito Santo.

Sopro de Deus: O termo “movidos” no texto grego de Pedro


(2Pe 1.21), pheromenoi, derivado do phero, que tem o sentido de
carregar, levar uma carga, ser estimulado, ser movido interiormente, é

5 Dicionário Internacional do Novo Testamento, Volume I, p. 1144


- 13 - Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

diferente do usado para se referir às Escrituras ao dizer que elas


foram inspiradas: “Toda Escritura é divinamente inspirada”(2Tm 3.16).

Neste texto de Timóteo, o termo grego usado para “inspiradas”


não tem o sentido de algo somente interno, como ocorre com o de
Pedro (2Pe 1.21), mas é derivado do grego theopneustos, que seria
sopradas por Deus. O termo grego theopneustos, que nossas versões em
português traduzem como “inspiradas”, seria mais bem traduzido por
soprado por Deus, ou seja, toda Escritura foi soprada por Deus sobre
seus escritores, não em forma de ditado, mas respeitando a
personalidade e a individualidade de cada escritor.

O significado de inspirar: Para nós, o termo inspirar tem mais


de um significado. Possui o sentido de influência externa, por
exemplo, quando dizemos que determinada pessoa nos inspirou, ou
seja, seu comportamento levou-nos a ser diferentes do que éramos.
Também tem o sentido de inalar algo, como ar nos pulmões; outras
vezes, as pessoas utilizam-na com o sentido de algo inato à pessoa,
como uma capacidade criativa do ser humano em atividades
artísticas; por exemplo, ao dizermos que determinado pintor, ator,
cantor foi inspirado ao fazer aquela obra.

Movidos pelo Espírito: Quanto ao texto de Pedro (2Pe 1.21),


que diz que os escritores foram movidos pelo Espírito Santo, este tem
sentido de um impulso sobre eles, enquanto que em Timóteo é-nos
dito que Deus soprou sobre os escritores a Palavra. Em Pedro vemos
que o Espírito Santo moveu interiormente, despertou, estimulou para que
os escritores bíblicos viessem a escrever.

Portanto, há uma atividade conjunta: o Pai sopra o assunto


sobre os escritores e o Espírito Santo os estimula a escrever o que lhes
fora soprado. Sendo assim, podemos concluir que o Espírito Santo
teve autonomia para trabalhar na revelação dos escritores bíblicos, ao
conduzi-los a escrever.

- 14 - Doutrina do Espírito Santo


1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Ensina: Ensinar exige conhecer, entender para explicar; sendo


assim, o Espírito Santo tem mais essa ação que O distingue como
uma pessoa: “Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará
em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto
vos tenho dito.” (Jo 14.26).

O termo para ensinar nesse texto é o grego didaxei,


pronunciado como didaksei, derivado do étimo grego didasko, que
pode ser traduzido como: “Ensinar, conversar com outros a fim de
instruí-los, pronunciar discursos didáticos, ser um professor,
desempenhar o ofício de professor, conduzir-se como um professor,
ensinar alguém, dar instrução, instilar doutrina em alguém, algo
ensinado ou prescrito, explicar ou expor algo, ensinar algo a
alguém.”6

Vejamos que as atividades supracitadas são específicas de um


mestre aos seus discípulos, o que nos leva a concluir que a atividade
do Espírito Santo é a de um verdadeiro mestre a nos ensinar. Isto
seria impossível se Ele não fosse uma pessoa, mas uma simples
influência ou força ativa de Deus. Ele é para o cristão, além de
paracletos, isto é, auxiliador, advogado, defensor, um verdadeiro
pedagogo, que o ensina na jornada cristã.

Testemunha: O Espírito Santo testemunha a nossa filiação com


Deus: “E, para mostrar que vocês são seus filhos, Deus enviou o Espírito do
seu Filho ao nosso coração, o Espírito que exclama: Pai, meu Pai”7 (Gl 4.6).
O termo grego para exclamar é krazo, que quer dizer gritar, berrar,
vociferar, falar com uma alta voz. Esta atitude do Espírito Santo está
diretamente relacionada à Sua capacidade de comunicação, algo que
só é possível a alguém dotado de personalidade. Fosse Ele uma
simples força não teria capacidade de comunicação.

6 Léxico Grego Strong, Bíblia Online 3.0, Módulo Avançado.


7 N T L H, Sociedade Bíblica do Brasil, Barueri, São Paulo, 2002.

- 15 - Doutrina do Espírito Santo


1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

Intercede: Intercessão é um ministério atribuído ao Espírito


Santo: “E da mesma maneira também o Espírito ajuda as nossas fraquezas;
porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo
Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis.” (Rm 8.26).

Se Ele é nosso paracleto (advogado), nada mais justo que


interceda por nós. Outra evidência clara de Sua pessoalidade, o
intercessor deve possuir autonomia para formular sua defesa e
argumentar. A intercessão significa que há uma ação advinda de
alguém que tem peculiaridades de uma pessoa:

1) Ele fala: “Quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às


Igrejas.” (Ap 2.7).

2) Ele comanda: “Foram impedidos pelo Espírito Santo de anunciar


a palavra na Ásia (...) mas o Espírito de Jesus não lho permitiu” (At 16.6,7).

3) Ele testifica sobre Jesus: “aquele Espírito da verdade, que


procede do Pai, testificará de mim” (Jo 15.26).

O Espírito Santo é descrito na Bíblia como exercendo relação


pessoal e não impessoal, pois Ele é suscetível de ser afetado pelos
relacionamentos da mesma forma que uma pessoa. Vejamos.

Pode-se tentar mentir para Ele: Apesar de Pedro dizer que


Ananias havia mentido ao Espírito Santo, devemos entender isso
como uma tentativa do próprio Ananias, “Disse, então, Pedro: Ananias,
por que encheu Satanás o teu coração, para que mentisses ao Espírito
Santo?” (At 5.3). Como o Espírito Santo é onisciente, seria impossível
que alguém pudesse mentir para Ele; isto é tão evidente que quem
revelou o golpe de Ananias e Safira a Pedro foi o próprio Espírito
Santo.

Pode-se blasfemar contra Ele: O Espírito Santo está sujeito a


ser ofendido: “Mas a blasfêmia contra o Espírito não será perdoada (...) se
alguém falar contra o Espírito” (Mt 12.31,32). Mais uma vez
- 16 - Doutrina do Espírito Santo
1 – O Espírito Santo e a Igreja primitiva

constatamos que o Espírito Santo é uma pessoa e não uma mera força
ativa de Deus.

Esta doutrina para nós deve ser um conforto, pois como seria
se tivéssemos um auxiliador, um advogado, que fosse impessoal,
insensível à nossa dor? Seria terrível, pois, por mais que estivéssemos
sofrendo, isso para ele não significaria nada, uma vez que seria
destituído de sentimentos.

Como seria difícil! Mas Deus, por Sua soberana bondade, deu-
nos um consolador, o qual possui personalidade e, portanto,
sentimento como nós, que nos entende e pode interceder por nós
junto ao Pai com gemidos inexprimíveis (Rm 8.26).

- 17 - Doutrina do Espírito Santo

Você também pode gostar