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ESCOLA SECUNDÁRIA JOÃO GONÇALVES ZARCO-402011

GRUPO I
Vem a Mãe, e não na achando lavrando, diz: Lia.
Não sei como tenho siso!
Logo eu adevinhei Jesu, Jesu, que farei?
lá na missa onde eu estava, Não sei se me vá a el-Rei,
como a minha Inês lavrava se me vá ao Cardeal.
a tarefa que lhe eu dei... Mãe
Acaba esse travesseiro! E como? Tamanho é o mal?
Hui! naceo-te algum unheiro? Lia.
Ou cuidas que é dia santo? Tamanho? Eu to direi:
Inês vinha agora pereli6
Praza a Deos que algum quebranto ò redor da minha vinha,
me tire de cativeiro. e um clérigo, mana minha,
Mãe pardeos7, lançou mão de mi.8
Toda tu estás aquela1… Não me podia valer.
Choram-te os filhos por pão? Diz que havia de saber
Inês se era eu fêmea, se macho. (…)
Prouvesse a Deos! Que já é rezão Leixemos isto! Eu venho
de eu não estar tão singela2. com grande amor que vos tenho,
Mãe porque diz o exemplo antigo
Olhade lá o mao pesar3... que amiga e bom amigo
Como queres tu casar mais aquenta que o bom lenho.
com fama de preguiçosa? Inês está concertada
Inês pera casar com alguém?
Mas eu, mãe, são aguçosa4 Mãe
e vós dais-vos de vagar. Até ‘gora com ninguém
Mãe não é ela embaraçada9.
Ora espera, assi vejamos. Lia.
Inês Em nome do anjo bento
Quem já visse esse prazer! eu vos trago um casamento.
Mãe Filha, não sei se vos praz10.
Cal ’te, que poderá ser, Inês
que “ante a Páscoa vem os Ramos.” E quando, Lianor Vaz?
Não te apresses tu, Inês. Lia.
“Maior é o ano que o mês”: Já vos trago aviamento11.
quando te não precatares, Inês
virão maridos a pares, Porém, não hei-de casar
e filhos de três em três. senão com homem avisado12.
Inês Ainda que pobre e pelado,
Quero-m’ ora alevantar. seja discreto em falar,
Folgo mais de falar nisso, que assi o tenho assentado.
− assi Deos me dê o paraíso, − Lia.
mil vezes que não lavrar. Eu vos trago um bom marido,
Isto não sei que o faz... rico honrado conhecido.
Mãe Diz que em camisa vos quer13.
Aqui vem Lianor Vaz. Inês
Inês E ela vem-se benzendo... Primeiro eu hei-de saber
se é parvo, se sabido.
[entra Lianor Vaz] (…)
Gil Vicente, Farsa de Inês Pereira
Lia.
Venho eu, mana, amarela5?
Mãe 1 hoje dir-se-ia “lá estás tu…”; 2 sozinha, solteira; 3 “vejam que desgraça…”(iro
Mais ruiva que uma panela! agarrou-me; 9 comprometida; 10 agrada; 11 arranjo de vida; 12 discreto; 13
ESCOLA SECUNDÁRIA JOÃO GONÇALVES ZARCO-402011
1 – Na primeira frase proferida pela mãe de Inês percebe-se um recurso expressivo que contribui
para a caracterização da sua filha.
1.1 – Diga de que recurso se trata, explicitando o seu valor semântico. (20 pontos)

Trata-se de uma ironia que explicita a negligência da filha e que nos permite visualizar que
se trata de uma pessoa desleixada.

2 – “Hui! naceo-te algum unheiro? / Ou cuidas que é dia santo?” (vv. 7-8)
2.1 – Diga por que razão estas interrogativas são retóricas e explicite o seu valor semântico. (20 pontos)

São perguntas retóricas pois são proferidas pela mãe às quais esta já sabia a resposta. Ao
perguntar “naceo-te algum unheiro” e “cuidas que é dia santo” queria que a filha voltasse ao
trabalho porque não haveria motivo aparente para este ser interrompido.

3 – Refira o motivo pelo qual Lianor surge em cena “amarela” (v. 48). (20 pontos)

Lianor surge em cena “amarela” pois estava indecisa entre o rei e o cardeal (motivo de
palidez).

4 – Perante a proposta de casamento que Lianor lhe traz, Inês traça o perfil de marido que pretende.
4.1 – Identifique as características que ela deseja ver no seu pretendente. (20 pontos)

Inês procura um homem esclarecido, com discernimento, e galanteador, com modos palacianos.

FIM

Ano letivo de 2020/2021

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