Você está na página 1de 20

CLASSIFICAÇÃO DE DELITOS

Segue um estudo com as principais formas de classificação


dos crimes utilizadas pela doutrina e pela jurisprudência. É um
assunto essencial para o Direito Penal, tanto para a aplicação
dos institutos dessa disciplina quanto para a sua própria
compreensão.

O conhecimento sobre a classificação dos delitos permite a


compreensão dos tipos penais e a atribuição, a cada um deles,
de várias características que determinam, por exemplo, o
momento da consumação e a possibilidade ou não de punição
da forma tentada.

É importante ressalvar que os critérios e as denominações


utilizados para classificar as infrações penais podem variar
entre os doutrinadores. Estudaremos os mais utilizados e
consagrados pela jurisprudência, além de mais cobrados pelas
bancas de concursos.

Atualização do conteúdo realizada em 24/07/2020.

Vamos lá!

 Quanto ao sujeito ativo

Os crimes se classificam, quanto ao sujeito ativo, em comuns,


próprios e de mão própria:

Crime comum: é aquele que não exige nenhuma qualidade


específica do sujeito ativo para sua prática.

São exemplos os delitos de homicídio, de furto e de estupro.

Crime próprio: é aquele que exige determinada qualidade do


sujeito ativo para sua prática. A doutrina admite a autoria
mediata, a coautoria e a participação nos crimes próprios.

São exemplos o peculato, no qual se exige a qualidade de


funcionário público (crime funcional); o autoaborto, que só pode
ser praticado pela própria grávida; e o delito de entrega de filho
menor a pessoa inidônea, o qual só pode ser praticado pelos
genitores.

Crime de mão própria: é aquele que somente pode ser


praticado pela própria pessoa, por si mesma. Só se admite a
participação em crime de mão própria, ressalvado o caso de
perícia assinada por dois profissionais, caso em que a doutrina
entende excepcionalmente cabível a coautoria. Também
denominado de delito de conduta infungível.

São exemplos o falso testemunho e a falsa perícia.

 Quanto à necessidade de resultado naturalístico para


sua consumação

Este critério leva em conta a necessidade de resultado


naturalístico para a consumação, distinguindo os delitos em
materiais, formais e de mera conduta.

Crime material: é aquele que prevê um resultado naturalístico


como necessário para sua consumação. São exemplos o delito
de aborto e o crime de dano. Há quem o chame de crime de
resultado.

Crime formal: é aquele que descreve um resultado


naturalístico, cuja ocorrência é prescindível para a consumação
do delito. Também denominado de delito de tipo incongruente.
É o caso da extorsão mediante sequestro e o do descaminho.

Crime de mera conduta: é aquele cujo resultado naturalístico


não pode ocorrer, porque sequer há a sua descrição. Podemos
tomar como exemplo o crime de ato obsceno, assim como o de
violação de domicílio.

  Quanto à necessidade de lesão ao bem jurídico para


sua consumação

Se tomada como critério a necessidade ou não de efetiva lesão


ao bem jurídico, temos a classificação dos delitos em crimes de
dano e crimes de perigo. Esta forma de classificação toma
como base o resultado jurídico do delito.
Crime de dano: é aquele em que se exige, para sua
configuração, a efetiva ocorrência de lesão ou de dano ao
bem jurídico protegido pela norma penal.

São exemplos o crime de dano, o crime de vilipêndio a


cadáver, o próprio crime de dano e o infanticídio.

Crime de perigo: é aquele que, para que se considere


consumado, exige apenas que o bem seja exposto a perigo.
Portanto, a efetiva ocorrência de dano ao bem jurídico
protegido pela lei penal é desnecessária para que o crime se
consume.

São exemplos os crimes de perigo de contágio venéreo, de


omissão de socorro e de tráfico ilícito de entorpecentes.

Os crimes de perigo podem ser subdivididos em:

 De perigo concreto: é o crime de perigo cuja


configuração requer a demonstração de que o bem
jurídico efetivamente foi posto em perigo. É exemplo o
crime de incêndio, em que o perigo deve ser
demonstrado.
 De perigo abstrato (ou puro):é o crime de perigo em
que a sua consumação não depende da demonstração de
que tenha colocado o bem jurídico em risco. O risco é
presumido, de forma absoluta, pela lei. É o caso do crime
de associação criminosa e crime de posse irregular de
munição de uso permitido ou restrito, dos artigos 12 e 14
da Lei 10.826/2003[1].
 De perigo abstrato de “perigosidade” ou
periculosidade real: cuida-se de denominação nova
trazida por alguns doutrinadores. Seria o crime de perigo
em que deve ser demonstrado o risco, mas não a pessoa
certa e determinada. Não é uma denominação utilizada
pela maioria da doutrina, que só distingue os crimes de
perigo, quanto à demonstração do risco, em concretos e
abstratos. Este Professor entende que esta classificação
em nada se diferencia como a seguinte, de crimes de
potencial perigo. Para muitos doutrinadores, seria uma
mistura indevida de categorias, relacionando o perigo
comum ao perigo concreto. Seria exemplo o crime de
embriaguez ao volante, em que bastaria a demonstração
de perigo ao tráfego de pessoas e veículos, sem
necessidade de se comprovar que determinada pessoa
foi colocada em risco.
 De perigo individual: é o delito que causa perigo a uma
pessoa ou a um grupo determinado de pessoas. Pode-se
apontar como exemplo o delito de perigo de contágio de
moléstia grave.
 De perigo comum ou coletivo: é aquele cujo perigo de
dano atinge um número indeterminado de pessoas.
Temos como exemplos o crime de fabrico, fornecimento,
aquisição posse ou transporte de explosivos ou gás
tóxico, ou asfixiante (artigo 253 do CP) e o de incêndio
(artigo 250 do CP).
 De perigo atual: é aquele cujo perigo causado é
contemporâneo à conduta do agente. O crime de
desabamento ou desmoronamento do artigo 256 do CP
tende a ser de perigo atual, pois o desabamento de um
prédio, no momento em que ocorre, já coloca em perigo a
vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem.
 De perigo iminente: é aquele cujo perigo está prestes a
acontecer. O abandono de incapaz, do artigo 133 do CP,
na prática, pode se mostrar um crime de perigo iminente,
já que, ainda que a pessoa sob cuidado não fique em
perigo imediatamente, pode ficar depois de algum tempo
sem cuidado.
 De Perigo futuro ou mediato: é aquele que produz um
risco futuro. Os exemplos são a associação criminosa ou
o porte de munição de uso permitido.

Na Alemanha, há a denominação de crimes de aptidão, de


perigo hipotético ou de crime de perigo abstrato-concreto.
Referida teoria buscaria trazer uma nova classificação entre os
quatro tipos de delitos acima descritos. Crimes de
aptidão[2] seriam aqueles em que o perigo seria parte do tipo, e
não uma fundamentação da própria incriminação. Por isso,
seriam diferentes dos crimes de perigo abstrato. Além disso,
não exigiriam a demonstração de um perigo concreto, razão
pela qual se diferenciariam dos crimes de perigo concreto.
Referidos delitos seriam assim denominados por exigirem a
aptidão da produção do resultado, ou seja, a potencialidade de
causar o dano ao bem jurídico. Exigir-se-ia, assim, a
idoneidade para a produção do resultado, sem exigir sua
comprovação caso a caso, mas a demonstração de que, pelo
que ordinariamente acontece, a conduta era idônea para
colocar o bem jurídico em risco.

 Quanto à forma da conduta

Leva em conta a forma da conduta, se positiva ou negativa,


separando os crimes em comissivos e omissivos.

Crime comissivo: é aquele que é praticado por um


comportamento positivo do agente, isto é, um fazer. São
comissivos os crimes de furto e de infanticídio.

 Crime omissivo: é aquele que é praticado por meio de um


comportamento negativo, uma abstenção, um não fazer.

Os crimes omissivos se subdividem em:

 Omissivos próprios: é aquele previsto em um tipo


mandamental, ou seja, um tipo que já descreve um
comportamento negativo no seu núcleo. O dever jurídico
de agir, naquela situação, decorre do próprio tipo penal,
que é chamado, então, de mandamental, por tornar
criminosa uma abstenção (ou omissão) em determinadas
circunstâncias. O agente, no caso, não tem o dever de
evitar um resultado, mas simplesmente o dever de agir
para não incorrer na prática do crime. Exemplo é o crime
de omissão de socorro.

 Omissivos impróprios: também chamado de comissivo


por omissão, é aquele cujo dever jurídico de agir decorre
de uma cláusula geral, que, no Código Penal Brasileiro,
está previsto em seu artigo 13, parágrafo segundo. O
dever jurídico abrange determinadas situações jurídicas e
se refere a qualquer crime comissivo. O sujeito tem o
dever de evitar o resultado naturalístico. Por isso, tais
delitos são chamados comissivos por omissão. A doutrina
aponta que só abrange crimes materiais, já que o agente
deve ter o dever de evitar o resultado.

São crimes naturalmente comissivos (praticados por um


comportamento positivo, uma ação), como é o caso do
homicídio, mas que podem ser praticados por uma conduta
omissiva, no caso de o sujeito ter o dever jurídico de agir
previsto na cláusula geral.

Os crimes omissivos impróprios possuem as seguintes


modalidades:

 Por dever legal: aquele que tenha por lei obrigação de


cuidado, proteção ou vigilância. É o caso dos pais em
relação aos filhos menores. Se deixarem de alimentá-los,
podem responder pelo homicídio, um delito, no caso,
omissivo impróprio.
 Por dever de garantidor: é o sujeito que, de outra forma,
assumiu a responsabilidade de impedir o resultado. É o
salva-vidas de um clube, que, por vínculo de trabalho, se
obriga a salvar uma criança que se afoga e pode
responder pelo resultado morte, caso se abstenha de agir.
 Por ingerência na norma: é aquele que, com seu
comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do
resultado. O sujeito que pôs fogo na mata, que se
alastrou e não avisa os seus empregados rurais, que
podem ser atingidos pelo fogo, responderá por sua
abstenção, no caso de sofrerem lesão corporal.

 Omissivos por comissão: parte da doutrina entende


existir uma terceira modalidade de delito omissivo, o
omissivo por comissão[3]. Cuida-se de crime tipicamente
omissivo, mas há uma ação, um comportamento
comissivo, que provoca a omissão. Daí decorre a sua
denominação (omissivo por comissão), de modo que
temos um delito naturalmente omissivo, mas que é
praticado em razão da conduta positiva de outrem.

Crime de conduta mista: é aquele cujo tipo prevê uma ação,


seguida de uma omissão, sendo que ambos os
comportamentos são necessários para a sua configuração.
Haveria, portanto, uma mistura entre o crime comissivo e o
omissivo. O exemplo é o crime de apropriação de coisa
achada, do artigo 169, inciso II, do CP. O tipo penal é o
seguinte: “quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria,
total ou parcialmente, [conduta comissiva] deixando de
restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à
autoridade competente, dentro no prazo de quinze
dias [conduta omissiva].”

Crime de esquecimento ou de “olvido”: é o crime omissivo


culposo, sem representação[4]. Em outras palavras, é o crime
omissivo praticado com culpa inconsciente, aquela em que o
agente sequer prevê o resultado, apesar de previsível.

  Quanto ao tempo da consumação

Considera o momento em que o crime se consuma: se de


forma imediata; se há o prolongamento no tempo desta fase do
iter criminis; se, ainda que imediata, a consumação produz
efeitos permanentes; ou, por fim, se há um prazo temporal para
sua consumação.

Crime instantâneo: é aquele que se consuma imediatamente,


em um instante definido. Podemos exemplificar com o furto.

Crime permanente: é aquele cuja consumação se protrai no


tempo, isto é, se prolonga. A fase da consumação
persiste enquanto desejar o agente. O sujeito ativo do delito
consegue prolongar no tempo a fase de consumação do delito.
É o caso da extorsão mediante sequestro.

Crime instantâneo de efeitos permanentes: é aquele que se


consuma imediatamente, em um momento determinado no
tempo, mas cujos efeitos se prolongam no tempo. É uma
subespécie do crime instantâneo. São exemplos o aborto e o
crime de parcelamento ilegal de solo[5].

Crime a prazo: é aquele que depende de determinado prazo


para sua consumação, como o de apropriação de coisa achada
(artigo 162, inciso II, do CP) e o de lesão corporal de natureza
grave com resultado de incapacidade para as ocupações
habituais, por mais de trinta dias (artigo 129, § 1º, inciso I, do
CP).

Roxin, que não utiliza a classificação de crime instantâneo de


efeitos permanentes, traz uma outra categoria, a dos delitos
de estado. Seriam crimes que se consumam com o resultado,
mas não precisam de atuação do autor para manutenção do
estado criado pela conduta típica, mesmo que ele se beneficie
de tal estado. Exemplo seria o da bigamia, delito em que o
sujeito não precisa renovar os atos para se manter casado de
forma ilícita. O homicídio seria outro exemplo [6].

  Quanto à unicidade ou não do tipo penal

Este critério classificatório se fundamenta no fato de o tipo


penal ser único ou se ele resulta da fusão de mais de um
tipo penal:

Crime simples: é aquele que é formado por um único tipo


penal, não resultando da reunião de outros tipos. Exemplos:
infanticídio e furto.

Crime complexo: é aquele cujo tipo é resultante da junção ou


fusão de outros tipos penais, como o roubo, que decorre do
constrangimento ilegal, da ameaça ou do crime relativo à
violência e do furto. Temos, ainda, o latrocínio, resultante da
soma do furto e do homicídio. Por fim, podemos exemplificar
com a extorsão mediante sequestro, delito no qual se fundem
os tipos penais da extorsão e do sequestro.

  Quanto à dependência de outro crime para existir

Considera a relação entre os delitos, se há ou não a


dependência de outra infração para a sua configuração:

Crime principal: é aquele que existe independentemente da


ocorrência de outro delito. Se não possui ligação com outro
delito, pode ser chamado de independente. Exemplos: furto,
homicídio e estupro.

Crime acessório: é aquele cuja ocorrência depende de um


crime anterior. Exemplos: receptação, lavagem de capitais e
favorecimento real. No caso de lavagem de dinheiro, o próprio
agente pode ter cometido o crime anterior, pois se admite a
punição da chamada autolavagem.

Há ainda outra classificação:

De fusão, de conexão ou de anexação: os delitos de fusão


são aqueles que se relacionam a outro delito cometido
anteriormente por terceiro, como o favorecimento pessoal, o
favorecimento real e a receptação. É denominação utilizada por
Eugenio Zaffaroni e Nilo Batista[7]. Entendo que não se
confunde exatamente com o crime acessório, já que os autores
definem essa denominação como o crime praticado por
terceiro. No caso da lavagem de dinheiro, é punível a
autolavagem (crime acessório e delito principal praticados pelo
mesmo agente).

 Quanto à forma de utilização do princípio da


consunção

Cuida-se de classificação que simplesmente diferencia as


modalidades de aplicação do princípio da consunção ou da
absorção, um dos incidentes no chamado concurso aparente
de normas:

Crime progressivo: é aquele em que o agente, para atingir o


seu objetivo, precisa praticar um crime menos grave que é o
caminho para a prática de outro. Cuida-se de
condutas necessárias para a prática do crime desejado. É o
caso do homicida que se utiliza de uma faca para a execução
do crime. Ele pratica várias lesões corporais para se atingir o
homicídio, respondendo apenas por este último crime (norma
consuntiva). Para o entendimento atual do STJ, não se deve
adotar a regra de o mais grave absorver o menos grave, mas
de o crime-fim absorver o crime-meio.

Progressão criminosa: é aquele em que há modificação do


elemento subjetivo do agente, que passa pela realização de
dois ou mais tipos penais, ocorrendo a absorção pelo crime-fim.
É o caso do sujeito que vai até a casa da ex-namorada para lhe
dar uns socos e, lá chegando, resolve matá-la. Neste caso, há
uma modificação do dolo, sendo que a prática das lesões
corporais, previstas na norma consunta, era o objetivo inicial do
agente. Ele, então, o modifica e, buscando a morte da vítima,
torna sua conduta, que inicialmente pretendia, mero meio de
execução de um resultado mais gravoso, a morte da vítima. A
consequência é que o crime de homicídio absorve o crime-
meio, o de lesões corporais.

  Quanto ao número de atos exigidos para sua


consumação

Este critério leva em conta a realização de um só ato ou de


uma pluralidade de atos, pelo sujeito ativo, para a
configuração do crime. O critério, mais tecnicamente, é de
fracionamento ou não da conduta, não se aplicando uma
diferenciação puramente mecânica:

Crime unissubsistente: é aquele que se realiza com um único


ato, como o desacato ou a injúria, ambos praticados
verbalmente. A conduta não pode ser fracionada. A doutrina
majoritária não admite tentativa deste tipo de crime [8]. É o
caso da injúria verbal e, para parte da doutrina, o do crime do
artigo 178 do CP.

Crime plurissubsistente: é aquele cuja prática exige mais de


uma conduta para sua configuração. Em outras palavras, a
conduta do agente pode ser fracionada, possibilitando a
interrupção da execução, por circunstâncias alheias à vontade
do agente, e, com isso, a punição do conatus (modalidade
tentada do crime).  É o caso do homicídio, da extorsão
mediante sequestro e do estelionato.

 Quanto à necessidade de mais de um sujeito ativo

Classificam-se os crimes quanto à necessidade ou não de


mais de um sujeito ativo para sua configuração:

Crime unissubjetivo, monossubjetivo ou de concurso


eventual: é aquele que pode ser praticado por apenas um
indivíduo. A doutrina aponta que este tipo de delito é que torna
importante o estudo do concurso de pessoas, por não ser
necessária a pluralidade de agentes para a própria
configuração do delito.

Crime plurissubjetivo ou de concurso necessário: é aquele


cuja realização típica exige mais de um agente.

O crime plurissubjetivo se subdivide em[9]:

 Crime plurissubjetivo de condutas convergentes ou


bilaterais: as condutas dos agentes devem se direcionar
uma em direção à outra. Exemplo é o delito de bigamia.
 Crime plurissubjetivo de condutas paralelas: as
condutas dos indivíduos devem atuar paralelamente,
possibilitando a prática delitiva. É o caso da associação
criminosa.
 Crime plurissubjetivo de condutas contrapostas – as
condutas dos agentes devem ir de encontro umas às
outras, ou seja, se contraporem. É assim classificado o
crime de rixa.

 Quanto à exigência de forma específica para sua


prática

É o critério de a lei penal prever ou não uma forma


determinada para a prática da infração penal, sendo que só
se configurará o delito se o sujeito ativo agir daquele modo
específico para a realização típica:

Crime de forma livre: é aquele que não prevê uma forma


específica de realização do núcleo do tipo, como o furto e o
homicídio.

Crime de forma vinculada: é aquele que tem forma ou formas


de realização do núcleo do tipo especificamente previstas em
lei. É o caso do curandeirismo, que possui algumas formas
previstas nos incisos do artigo 284 em que o núcleo do tipo
pode ser realizado.

 Quanto ao lugar
Há a classificação dos crimes para denominar aqueles cujo iter
criminis perpassam mais de um local, abrangendo ou não
mais de uma soberania:

Crime à distância ou de espaço máximo: é a infração penal


cujo iter criminis (caminho do crime, com suas fases de
cogitação, preparação, execução, consumação e, ao final,
eventual exaurimento) abrange mais de um país. Ou seja, é
aquela infração penal que, em seu desenvolvimento, percorre
mais de um território soberano. Referido tipo de crime torna
importante o estudo do local do crime que, segundo o Código
Penal, deve ser compreendido sob a ótica da teoria da
ubiquidade.

Crime plurilocal: é aquele que percorre, em sua prática, mais


de um lugar, mas dentro do mesmo território soberano. Sua
importância se volta ao processo penal, especialmente para
determinação da competência ratione loci, ou seja, a territorial.

 Quanto aos vestígios

De maior interesse para o Direito Processual Penal, há a


classificação dos crimes quanto a deixarem ou não vestígios:

Crime de fato transeunte (delicta facti transeuntis): é aquele


que não deixa vestígios, tornando desnecessária a realização
do exame de corpo de delito. É o caso da injúria verbal e do ato
obsceno.

Crime de fato permanente (delicta facti permanentis): é


aquele que deixa vestígios, tornando necessária a realização
do exame de corpo de delito. Classificam-se assim o delito de
estupro, de falsidade de documento público e o de lesão
corporal.

 Quanto à condição objetiva de punibilidade

Classificação de acordo com a necessidade ou não de


condição objetiva de punibilidade:

Crime condicionado: é aquele que depende de uma condição


objetiva de punibilidade, como no caso dos crimes tributários
do artigo 1º da Lei 8.137/90 (dependem da constituição
definitiva do crédito tributário) e dos crimes falimentares
(dependem da sentença que decrete a falência, conceda a
recuperação judicial ou homologue o plano de recuperação
extrajudicial).

Crime incondicionado: é aquele que não possui condições


objetiva de punibilidade para sua configuração e consumação.
De ordinário, é o que ocorre com o roubo e o descaminho.

 Quanto à natureza dos crimes militares

Os crimes militares podem ser de dois tipos, os próprios e os


impróprios:

Crime militar próprio: é aquele que só possui tipificação no


âmbito militar, como é o caso de deserção, previsto no artigo
187 do Código Penal Militar. Se um civil praticar referida
conduta, haverá fato penalmente atípico. A condenação
anterior por crime militar próprio não configura a reincidência,
nos termos do artigo 64, II, do Código Penal.

Crime militar impróprio: é aquele que está previsto na


legislação penal militar, mas possui tipificação também como
crime não militar. Se um cidadão civil praticar a conduta, há
crime; se o agente for militar, há crime previsto na legislação
especial. São exemplos o furto e o homicídio.

 Quanto ao sujeito passivo

No tocante ao sujeito passivo, alguns delitos possuem algumas


peculiaridades e, por isso, possuem nomenclatura específica:

Crime vago: é aquele que possui sujeito passivo imediato um


ente sem personalidade jurídica, como a coletividade. É o crime
de ato obsceno e o de casa de prostituição.

Crime de dupla subjetividade passiva: é aquele que possui


mais de um sujeito passivo imediato. É o caso do aborto sem
consentimento da gestante (artigo 125 do CP) e de violação de
correspondência (artigo 151 do CP).
 Quanto ao número de bens jurídicos atingidos

Apesar de se tratar de classificação menos frequente na


doutrina criminalista, podemos dividir as infrações penais,
ainda, no tocante ao número de bens jurídicos ofendidos com a
realização típica. Seriam as espécies de crime, segundo tal
critério:

Crime mono-ofensivo: é aquele que atinge apenas um bem


jurídico, como furto, que ofende o patrimônio.

Crime pluriofensivo: é aquele que viola a mais de um bem


jurídico. Podemos exemplificar com o latrocínio, que atinge o
patrimônio e a vida.

 Quanto a elementos subjetivos impróprios:

Claus Roxin traz, em sua obra[10], uma subdivisão dos delitos


em razão do seu elemento subjetivo, preconizada por Mezger.
Como o tema tem sido cobrado em concursos, é interessante
compreender essa classificação:

Crimes de intenção: o tipo penal exige um elemento subjetivo


que ultrapasse, transcenda o tipo objetivo, para a sua
configuração. Para alguns autores, são os crimes que exigem
elemento subjetivo especial do tipo. No caso do furto, exige-se
a intenção de apropriação para além da mera subtração. Pode
ser subdividido em duas classes de crimes:

 De tendência interna transcendente de resultado


cortado (separado): Segundo Roxin, o segundo
resultado posterior deve ser produzido como
consequência da ação típica, sem uma conduta
adicional do sujeito ativo. Ele exemplifica com o crime
de envenenamento, previsto na lei alemã, com resultado
adicional de dano à saúde pública. É o caso de o
resultado naturalístico, apesar de ser a intenção do
agente (elemento subjetivo especial do tipo), depender da
conduta de um terceiro. Classifica-se assim o delito de
extorsão mediante sequestro.
 De tendência interna transcendente mutilado
(atrofiado) de dois atos: o agente pratica a conduta para
um resultado posterior, que não é necessário ser obtido
para sua configuração. O resultado naturalístico, não
exigido para a configuração do delito, depende da
vontade do agente, por meio de uma ação posterior.
Pode-se apontar o exemplo da moeda falsa, já que o tipo
não exige que seja colocada no mercado para que o
agente efetivamente se beneficie[11].

Crimes de tendência, também chamados de delitos de


tendência interna peculiar ou intensificada: o delito possui
um elemento subjetivo que é inerente a um elemento típico ou
determina a classe do crime, segundo Roxin[12]. De forma mais
simples, a doutrina os conceitua como aqueles cuja intenção
do agente determina se o fato é típico ou atípico. É o caso da
injúria, em que se exige a intenção e, mais ainda, o animus
injuriandi, ou seja, que a intenção seja de ofender. O crime não
se configura se a ideia foi fazer uma piada, por exemplo, ou
uma crítica literária. Roxin exemplifica com os crimes sexuais.
Podemos pensar: o que diferencia uma consulta séria de um
ginecologista ou um urologista e um crime contra a dignidade
sexual pode ser a intenção do agente ao tocar o paciente.

Crimes de expressão: são os crimes cuja conduta expressam


um processo interno ocorrido na mente do autor. O agente
recebe uma informação e a interpreta, processa, praticando
então a conduta típica. Roxin usa o exemplo do falso
testemunho, em que o agente tem ciência de determinados
fatos e, então, depõe de forma diversa. O crime não está na
contradição entre o que o agente disse e a realidade
(concepção objetiva), pois o agente pode ter percebido a
realidade de forma diversa, mas entre a sua convicção íntima e
sua manifestação ou entre o seu conhecimento dos fato e sua
atitude de calar-se (concepção subjetiva).

 Quanto ao tratamento diferenciado da tentativa:

Há alguns crimes que possuem um tratamento diferenciado


quanto à tentativa e consumação:
 Crimes que só admitem a forma tentada: são os de lesa-
pátria. Estão previstos na Lei de Segurança Nacional, sendo
exemplo o seu artigo 11. O próprio núcleo do tipo é “tentar
desmembrar”, de modo que só a conduta tentada é punida.

 Crimes de atentado ou de empreendimento: é aquele em


que o legislador equipara a forma tentada à forma consumada
do delito, prevendo a mesma pena para ambas as
modalidades. É exemplo o artigo 352 do CP, bem como o do
artigo 309 do Código Eleitoral.

 Quanto ao Núcleo do Tipo:

É possível, ainda, classificar o delito quanto ao número de


núcleos do tipo e a necessidade ou não se sua realização
cumulativa para a sua configuração:

Crime de ação simples: é o crime que possui apenas um


núcleo do tipo, consistente no verbo principal que descreve a
conduta típica. É o caso do homicídio.

Crime de ação múltipla, de ação plurinuclear, de conteúdo


variado ou tipo misto[13]: é o crime que possui mais de um
núcleo do tipo, podendo ser dividido em alternativo ou
cumulativo:

Crime de tipo misto alternativo: é o crime que possui mais de


um núcleo do tipo, sendo que a prática de apenas um deles é
suficiente para a sua consumação e a prática de mais de um
deles, no mesmo contexto, configura crime único. É o caso do
artigo 33, caput, da Lei 11.343/06.

Crime de tipo misto cumulativo: é o crime que possui mais


de um núcleo do tipo, sendo que as condutas não são fungíveis
entre si. Estão no mesmo tipo penal por opção do legislador,
mas poderiam estar em tipos penais diversos. A prática de
cada um deles configura um delito diverso. É o caso do crime
do artigo 242 do CP. Também se exemplifica com o atentado
contra a liberdade de trabalho e boicotagem violenta, previsto
no artigo 198 do CP.

  Quanto à pena prevista


Em razão de benefícios previstos em lei para determinadas
faixas de pena previstas para os delitos, há a seguinte
classificação:

Infrações penais de menor potencial ofensivo: é a infração


penal de competência dos Juizados Especiais Estaduais e
Federais (salvo regras de conexão), com pena máxima não
superior a 2 anos, cumulada ou não com multa. Para tais
delitos, são cabíveis a transação penal e a suspensão
condicional do processo.

Infrações penais de médio potencial ofensivo: é a infração


penal com pena máxima superior a 2 anos, mas cuja pena
mínima seja igual ou inferior a um ano. Para tais delitos, é
cabível a suspensão condicional do processo, razão pela qual
a doutrina criou referida classificação.

Infrações penais de maior potencial ofensivo: é a infração


penal com pena máxima superior a 2 anos e pena mínima
superior a um ano. Em outras palavras, são os crimes para os
quais não são cabíveis a transação penal nem a suspensão
condicional do processo.

 Outras classificações

Neste tópico, seguem outras classificações efetuadas pela


doutrina:

Crime subsidiário: um crime é subsidiário em relação a outro


quando descreve um grau menor de violação do bem
jurídico. A análise, este caso, é feita em concreto, relação
de minus e de plus, ou seja, de maior ou menor intensidade.
Neste caso, havendo conflito aparente de normas, é levada em
conta a análise do fato.

O crime pode ser expressamente subsidiário, como ocorre com


o artigo 132 do Código Penal, que prevê o crime de perigo para
a vida ou a saúde de outrem.

Crime multitudinário: é aquele cometido por uma reunião de


pessoas, no clima de tumulto ou histeria coletiva, que torna os
limites éticos dos indivíduos, temporariamente, menos rígidos.
São, por exemplo, os casos de linchamentos de pessoas
acusadas da prática de um crime que causa comoção na
comunidade.

 Crime de opinião (ou de palavra): é o crime que se configura


com o abuso da liberdade de expressão ou de pensamento,
como o caso da difamação.

É diferente do crime de expressão, analisado acima, que a


conduta delitiva deriva da expressão pelo autor, mas após o
uso de sua atividade intelectual. O exemplo é o falso
testemunho.

Crime habitual: é o crime que exige uma reiteração de atos


para sua consumação, sendo que a doutrina aponta ser
necessária a demonstração do estilo de vida do agente. São
exemplos o rufianismo e a casa de prostituição.

Crime profissional: é o crime habitual, realizado com intuito de


lucro, para parte da doutrina[14]. Para outra parcela, é o crime
cometido por meio da profissão lícita do agente, como meio
para realizar uma conduta criminosa[15].

Crime mercenário: é o crime cometido com intuito de lucro.

Crime gratuito: é aquele cometido sem motivo, o que não se


confunde com o motivo fútil (STJ, HC 369163/SP, Rel. Min.
Joel IlanPaciornik, 5ª Turma, DJe 06/03/2017).

Crime de ímpeto: é aquele cometido no calor da emoção, sem


premeditação. É o que ocorre no caso de homicídio cometido
sob o domínio de violenta emoção, logo após injusta
provocação da vítima.

Crime funcional: é o que é cometido pelo funcionário público.


Se for funcional próprio, só pode ser cometido pelo
funcionário público, como a prevaricação. Por sua vez,
o funcional impróprio consiste em conduta tipificada tanto
para o particular (exemplo: apropriação indébita) quanto para o
funcionário público, de forma especial (por exemplo: peculato-
apropriação).
 Crime de ação violenta: é aquele praticado com emprego de
força física ou com grave ameaça. Os exemplos podem ser o
estupro e o crime de lesão corporal.

Crime de ação astuciosa: é o crime praticado por meio de


astúcia, de uma fraude ou um engodo. É o caso do estelionato.

Crime de circulação: é o crime praticado na condução de


veículo automotor.

 Crime internacional ou mundial: é o crime que o Brasil se


obrigou a reprimir no Direito Internacional, por meio de tratado
ou convenção, como o tráfico internacional de entorpecentes e
o tráfico internacional de pessoas para fins de exploração
sexual. Entretanto, há quem utilize para se referir aos crimes de
lesa-humanidade, de competência do Tribunal Penal
Internacional. É usado, ainda, por alguns, para definir o crime à
distância[16].

Crime obstáculo: é o que se antecipa para determinar a


punição do que seriam atos meramente preparatórios, trazendo
punição autônoma. Exemplos são os crimes de associação
criminosa e de petrechos para falsificação de moeda. Para
Zaffaroni e Batista, cuida-se de previsão de constitucionalidade
duvidosa, por violação do princípio da lesividade e por falta de
legitimidade baseada em evitar o risco ao bem jurídico
tutelado[17]. O STJ já usou o termo “tipo penal preventivo” para
um crime obstáculo, o de porte de arma de fogo[18].

Crime remetido: é o delito cuja definição faz remissão ou


referência a outro tipo penal. É o caso do crime de uso de
documento falso:

Uso de documento falso

Art. 304 – Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou


alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:

Pena – a cominada à falsificação ou à alteração.


Não confundam com norma penal em branco, que pede
complemento do tipo penal por outra norma, e não por outro
tipo penal.

Delito de acumulação: são crimes em que, ainda que a


ofensa ao bem jurídico possa ser ínfima naquele caso, a soma
de várias condutas torna o bem jurídico lesado e, assim,
justifica a sua punição. Blanco Cordero, jurista espanhol, cita a
classificação, mencionando seu uso por Silva Sanchez, para
justificar a punição de pequenas quantias submetidas à
lavagem de dinheiro, caso se defenda que o bem jurídico
protegido é a ordem econômica. Ainda que a lavagem de R$
10.000,00 não ofenda a ordem econômica, o conjunto de todo
o valor “lavado” tem a capacidade de ofender o bem jurídico [19].
Pode-se usar, ainda, em delitos ambientais, em que condutas
somadas levam à perda da qualidade do ambiente apto a nos
proporcionar sadia qualidade de vida.

Existe crime eleitoral, que se traduz em infração contra o


processo eleitoral e que coincide com a competência geral da
Justiça Eleitoral (independentemente de regras de conexão ou
continência). Alguns autores falam, assim, em crimes federais
e crimes estaduais. Apesar de se tratar de nomenclatura
usual, há quem defenda sua impropriedade, já que haveria, no
Brasil, crimes de competência da Justiça Federal e os
de competência da Justiça Estadual, em razão de, como
regra, a competência para legislar sobre direito penal ser
apenas da União. É diferente o sistema dos EUA, em que a
União legisla sobre os crimes federais, enquanto os Estados
promulgam suas leis com os crimes estaduais.

Finalizamos, assim, nosso estudo sobre a classificação das


infrações penais. Cuida-se de assunto indispensável para o
estudo dos crimes em espécie, bem como das contravenções
penais previstas no ordenamento jurídico.

Espero que este estudo contribua para a realização dos seus


objetivos. Desejo sucesso e deixo um forte abraço,

Prof. Michael Procopio

Você também pode gostar