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08/12/2021 18:05 "Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo alemão" – DW – 08/12/2021

"Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo alemão"

POLÍTICA | ALEMANHA

"Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo


alemão"
Cristiane Ramalho

há 7 horas

Novo governo da Alemanha promete mais proteção ao clima. Má notícia para Bolsonaro, avalia Sérgio
Costa, da Universidade Livre de Berlim. Merkel colocou Brasil na "geladeira", e Scholz pode ser mais duro.

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Professor da Universidade Livre de Berlim, e observador da política alemã há mais de 20 anos, o sociólogo Sérgio
Costa aposta que a mudança de governo na Alemanha terá impacto direto sobre o Brasil, tanto nas relações
diplomáticas quanto comerciais: "O Brasil deve ganhar mais espaço na agenda política alemã - mas com sinal
negativo. Não como aliado de primeira instância, mas como um dos governos com os quais é difícil trabalhar."

Três ministérios que interessam diretamente ao Brasil passarão para as mãos do Partido Verde: Economia e
Clima; Meio Ambiente; e Relações Exteriores. O novo governo promete uma política externa voltada para a defesa
do meio ambiente e das minorias. A pressão sobre o governo brasileiro vai aumentar: "Haverá um endurecimento
nas relações", avalia Costa.

O novo enfoque no combate às mudanças climáticas pode levar, por exemplo, a restrições à importação de
produtos que contribuam para o aumento do efeito estufa, como a carne e a soja - inclusive do Brasil. 

https://www.dw.com/pt-br/brasil-deve-esperar-cobranças-mais-duras-do-novo-governo-alemão/a-60037708 1/6
08/12/2021 18:05 "Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo alemão" – DW – 08/12/2021

Em relação ao acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia (UE), as perspectivas também não são boas.
"Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo alemão"
"As coordenadas já não são favoráveis, e agora pode ter uma reviravolta", diz Costa. Pelo menos, enquanto o
atual governo estiver no poder: "O grande fantasma para o acordo entre a UE e o Mercosul se chama Bolsonaro."

Já o Ministério para a Cooperação e Desenvolvimento, responsável pelo Fundo Amazônia, ficará com os social-
democratas do SPD – o que também deve evidenciar ainda mais as diferenças em relação ao governo Bolsonaro,
segundo o professor. 

Também diretor do Instituto de Estudos Latino-Americanos, em Berlim, Costa lembra que SPD, verdes e liberais se
comprometeram ainda a apoiar os movimentos sociais "que defendem a democracia" e a "fortalecer as lutas
contra populistas e autocratas" na América Latina e Caribe. O que pode ser uma boa notícia para organizações
que trabalham com os mesmos valores na região. 

Com 20 livros publicados como autor ou coeditor, o sociólogo diz que não só a Alemanha vai mudar, mas também
a União Europeia - que passará a ter papel mais pronunciado na proteção do clima e do meio ambiente: "Esta
passa a ser uma agenda europeia."

Nesta quarta-feira, o Parlamento alemão confirmou o nome de Olaf Scholz como novo chanceler
federal, colocando fim à era Merkel. É a primeira vez que o país sera governado por numa coalizão formada por
social-democratas, verdes e liberais.

DW Brasil: Como o Brasil será visto pela nova coalizão de governo nessa era pós-Merkel que se inicia?

Sérgio Costa: O Brasil deve ganhar mais espaço na agenda política alemã – mas com sinal negativo. Não como
um aliado de primeira instância, mas como um dos governos com os quais é difícil trabalhar.

Com a nova coalizão, teremos partidos que são muito mais programáticos do que a CDU (União Democrata Cristã,
de Angela Merkel) – especialmente o Partido Verde. Devemos esperar, portanto, mudanças tanto nas relações
diplomáticas quanto nas relações comerciais entre o Brasil e a Alemanha. 

O ministério das Relações Exteriores – uma pasta que interessa diretamente ao Brasil – ficou justamente
com o Partido Verde. Haverá um endurecimento nas relações bilaterais? 

Com a copresidente do Partido Verde (Annalena Baerbock) à frente do Ministério das Relações Exteriores, haverá
uma linha geral de política externa que enfatize o multilateralismo, e o fortalecimento dos direitos humanos e de
minorias, tais como indígenas, negros, mulheres e LGBTQ, e uma posição muito clara em relação a temas de meio
ambiente e clima, no sentido da mudança climática.

E o Partido Verde não estará sozinho. Esses itens são uma pauta importante também para os social-democratas e
os liberais. Em todos esses campos, haverá realmente um endurecimento nas relações com o Brasil. 

Os verdes vão assumir ainda dois ministérios que também dizem respeito ao Brasil: o de Meio Ambiente e o
superministério de Economia e Clima. Como isso deve afetar as relações entre o governo alemão e o
governo Bolsonaro, em meio a recordes de desmatamento na Amazônia? 

É de se esperar cobranças mais duras do governo brasileiro. Com o novo enfoque no clima pode haver, por
exemplo, mais controle sobre as emissões de gases do efeito estufa na cadeia produtiva – o que pode levar a
restrições na importação de produtos do Brasil, como a carne, e também a própria soja, na medida em que fique
configurada a correlação entre o desmatamento e a expansão da soja.

Mesmo que o governo brasileiro tente negar, essa relação é óbvia. Tudo vai depender da capacidade do partido
Verde de impor os seus valores na disputa interna de poder entre os diferentes ministérios.   

O Partido Liberal Democrático, que assumirá a pasta das Finanças no novo governo, não poderá frear essa
pressão em nome dos interesses comerciais da Alemanha – que tem no Brasil seu maior parceiro na
América do Sul? 

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08/12/2021 18:05 "Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo alemão" – DW – 08/12/2021

Nós vamos ver um jogo de forças. O novo ministro das Finanças, Christian Lindner, é a favor da liberdade
"Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo alemão"
completa da economia. E o partido liberal é, por definição, muito favorável aos atores econômicos. Em que
medida esses interesses poderão ser contrariados para atender aos interesses do respeito ao meio ambiente e
das minorias, e à contenção da mudança climática, para que lado vai pender a balança entre essas duas forças, é
algo que ainda está em aberto.

Mas os liberais ratificaram, no acordo de coalizão, a proposta de fortalecimento das sociedades na luta
contra o populismo, os movimentos autoritários e as ditaduras na América Latina. Nesse aspecto, pelo
menos, eles não estão afinados? 

Com certeza. Ainda que possa haver diferenças em relação à economia, no que diz respeito à proteção da
democracia e das liberdades individuais, como na manifestação da sexualidade, o Partido Liberal é tão rigoroso e
intransigente quanto os social-democratas e os verdes.

Nesse sentido, eles têm nos liberais um aliado muito forte. E a parte que se refere à América Latina e ao Caribe diz
claramente que uma das prioridades é apoiar os movimentos sociais que defendem a democracia, e fortalecer as
lutas contra populistas ou autocratas nessa região. Isso indica que o novo governo irá incentivar movimentos que
trabalhem com os mesmos valores que ele, buscando alianças. E isso pode ter consequências, obviamente, em
relação ao Brasil. Sob esse ponto de vista, pode ser esperar uma clareza maior do que nos governos comandados
por Merkel. 

O acordo de coalizão condiciona o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia a compromissos
vinculantes nas áreas de meio ambiente e direitos humanos. Haverá impacto sobre a ratificação desse
acordo?

Sim, as coordenadas já não são favoráveis, e agora pode haver uma reviravolta. Não existe a menor dúvida de que
o grande fantasma – mesmo que não seja mencionado o nome dele – para o acordo entre a União Europeia (UE) e
o Mercosul se chama Bolsonaro.

O medo do que Bolsonaro significa em termos de clima, direitos humanos e democracia é que impede esse
acordo de já estar completamente consolidado e assinado. É de se esperar que a nova coalizão seja ainda mais
intransigente na exigência de compromissos com relação à proteção do meio ambiente e dos direitos humanos.
Não só a Alemanha vai mudar, como a UE deve ter um papel mais pronunciado em relação à proteção do clima e
ao meio ambiente. Com a influência da Alemanha, essa passa a ser uma agenda europeia.

O Ministério para Cooperação e Desenvolvimento, responsável pelo Fundo Amazônia, vai passar para as
mãos dos social-democratas. As diferenças em relação ao governo Bolsonaro devem se aprofundar ainda
mais?

Sem dúvida. Simbolicamente, esse é um ministério muito importante. Ele tem capilaridade e penetração social, e
atinge desde instituições de caridade até ONGs, inclusive na região Amazônica. Nele se define qual o
desenvolvimento que se quer promover e cofinanciar.

E é claramente o desenvolvimento sustentável, não só socialmente, mas também ambientalmente. A discussão


sobre o Fundo Amazônia estava nas mãos do partido CSU (União Social Cristã, conservadora), que detinha o
ministério, e endureceu a relação a ponto de cortar esses recursos.

Duas pautas frequentes das negociações com o Brasil eram a proteção do meio ambiente e de minorias -
sobretudo da população indígena. Mas sempre houve um cuidado de não provocar rupturas. Sob a regência do
partido social-democrata essas exigências devem ser ainda mais enfáticas, com programas de cooperação e
transferência de recursos sendo usados para pressionar o governo brasileiro.

Um novo governo na Alemanha seria capaz de influenciar, de alguma forma, as eleições no Brasil em 2022,
levando em conta a antiga relação entre os social-democratas, que estarão no poder, e Luiz Inácio Lula da
Silva, que hoje desponta como favorito?

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08/12/2021 18:05 "Brasil deve esperar cobranças mais duras do governo alemão" – DW – 08/12/2021

Não acredito que a política externa possa ter uma importância tão grande nas eleições do Brasil, um país
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continental onde os eleitores se preocupam pouco com a política externa. Nas últimas eleições, a Venezuela
ganhou importância. Mas era muito mais porque as pessoas temiam que o Brasil se tornasse uma Venezuela.

Episódios recentes, porém, dão uma boa medida das relações entre Brasil e Alemanha hoje. Por exemplo, a
liderança de um partido de extrema-direita, a AfD, foi recebida no Brasil por Bolsonaro. Este é um partido
marginal na política alemã. Nenhum ator democrático aceita qualquer cooperação com a AfD na Alemanha e na
Europa.

Ao mesmo tempo, Lula foi recebido pelo futuro chanceler federal (Olaf Scholz) quando veio à Europa. Isso tem
uma importância simbólica. Pode ressaltar as diferenças entre Lula e Bolsonaro, que nunca conseguiu ter
receptividade na Europa - a não ser da extrema direita. E pode até ter algum impacto para um eleitorado mais
escolarizado e atento. Mas a influência disso na eleição será muito pequena. 

Bolsonaro também não foi recebido por Angela Merkel – que, por sua vez, nunca visitou o Brasil durante o 
governo dele. Esse distanciamento tende a piorar?

O Brasil, do ponto de vista da política exterior, ficou completamente isolado, sobretudo depois da derrota do
Trump (Donald Trump, ex-presidente americano), que não foi reeleito. Seus parceiros internacionais são hoje
países sem grande expressão. Ninguém quer se aproximar do Brasil na arena internacional. Não é, obviamente,
pelo país, nem pela sociedade, nem pela sua potencialidade econômica e social. É pelo governo que ele tem. Há
um distanciamento claro do governo Bolsonaro.

Os diplomatas, inclusive embaixadores brasileiros no exterior, estão isolados, porque nenhum país democrático
quer cooperar estreitamente com o Brasil. O governo da Merkel não foi diferente. Colocou o Brasil na geladeira.

Apesar do histórico de relações bastante intensas, não só econômicas, mas também políticas e diplomáticas, essa
cooperação estratégica perdeu a importância nos últimos anos. O que pode acontecer agora, com a nova
coalizão, é que esse distanciamento passe a ser ativo. Não como no governo Merkel, que evitou as relações com o
Brasil. Com a nova coalizão, pode haver uma cobrança de fato em relação ao Brasil. 

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