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Artigo: Ciclos econômicos e estratégias de gerenciamento de resultados contábeis: um estudo

nas companhias abertas brasileiras.


Autores: Edilson Paulo e Renato Henrique Gurgel Mota
Revista Contabilidade e Finanças – USP, São Paulo, v. 30, n. 80, p. 216-233, mai./ago. 2019.
O artigo apresenta uma análise das estratégias de gerenciamento de resultados contábeis, em
especial auxilia na identificação de comportamentos discricionários distintos entre os ciclos
econômicos. O artigo é de autoria de Edilson Paulo e Renato Henrique Gurgel Mota.
Edilson Paulo, Pós-doutor é professor associado III da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC), diretor científico da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação
em Ciências Contábeis - ANPCont (mandato 2020-2021), avaliador de instituições de Ensino
Superior e de Cursos de Graduação do Ministério da Educação (MEC/SINAES). Possui
experiência profissional na área de contabilidade e controladoria em companhias abertas e
fechadas. Autor de artigos científicos e capítulos de livros, sendo sua principal área de
interesse os temas: macroeconomia e contabilidade, assimetria informacional, qualidade das
informações contábeis, gerenciamento de resultados contábeis e normas e práticas contábeis
nacionais e internacionais.
Renato Henrique Gurgel Mota, Doutor é professor do curso de Ciências Contábeis da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e do Curso de Pós-Graduação em
Ciências Contábeis da UFRN (PPGCCon/UFRN). 

RESENHA
A qualidade das informações contábeis pode ser impactada por diversas questões,
sejam elas macroeconômicas, manipulação de resultados e comportamento oportunista. Ao
abordar os estudos anteriores, os autores citam estudos seminais e contemporâneos, sendo que
o foco apresentado é naqueles relacionados ao comportamento oportunista dos gestores e nas
práticas de gerenciamento de resultados.
Com relação ao comportamento oportunista os estudos anteriores identificam uma
redução em períodos de crises financeiras. Por outro lado, com relação ao gerenciamento de
resultados há um aumento observado em períodos de crise. Os autores justificam essa
divergência encontrada na literatura, pela existência de um trade-off entre o gerenciamento de
resultados por meio de accruals (AEM) ou de decisões operacionais (REM) e o envolvimento
do gestor.
Diante disso, são apresentados os diferenciais do estudo, ou seja, os pontos explorados
e que não foram considerados pela literatura anterior. Em primeiro lugar, os autores destacam
a análise do gerenciamento de resultados por meio de accruals entre as fases do ciclo
econômico, uma vez que a fase econômica que a empresa se encontra pode influenciar na
decisão de divulgação de resultados positivos ou negativos. Em segundo lugar, a avaliação do
trade-off entre acrruals (accruals earnings management – AEM) e decisões operacionais
(real earnings management – REM), pois os interesses pessoais ou organizacionais podem ser
alvo dos gestores, principalmente em períodos de crises.
Além dos dois pontos apresentados, os autores argumentam a existência de restrições e
incentivos nos quais os gestores estão dispostos a se envolverem e afirmam que a fase em que
a economia se encontra é um potencial indicador de propensão para o envolvimento dos
gestores com o gerenciamento de resultados. Diante disso, Paulo e Mota, buscam responder a
seguinte questão: qual a influência dos ciclos econômicos sobre as estratégias de
gerenciamento de resultados pelas firmas abertas brasileiras?
Avançando com as informações do artigo, os autores apresentam no referencial teórico
o conceito e a delimitação do ciclo econômico, afirmando que eles têm origem na flutuação
do nível da atividade econômica do país, sendo geralmente medido pelo PIB. Com relação a
divisão dos ciclos, são apresentadas três abordagens:
 NBER – (órgão norte americano) identifica que os ciclos econômicos podem ser
divididos em recessão e expansão.
 Schumpeter (1939) - defende a existência de um ciclo de quatro fases: recuperação e
expansão (crescimento) e recessão e depressão (redução).
 Burns e Mitchell (1946) – classificam os ciclos econômicos em quatro fases:
expansão, recessão, contração e recuperação.
Nesse sentido, os autores argumentam que os estudos anteriores direcionaram esforços
para abordagens binárias e com a utilização de variáveis dummies, sendo um diferencial do
presente artigo a utilização dos ciclos econômicos a partir de quatro fases.
Ainda no referencial teórico os autores apresentam as pesquisas anteriores que
embasaram a formulação de suas hipóteses de pesquisas. Para isso, enfatizam a ausência de
estudos sobre relação entre o nível de gerenciamento de resultados e as fases dos ciclos
econômicos (H1). E apresentam evidências de mudança nas estratégias entre AEM e REM e o
comportamento discricionário nas fases do ciclo econômico (H2). As hipóteses formuladas
são as seguintes:
 H1: o comportamento discricionário sobre as escolhas contábeis (accruals) das firmas
brasileiras de capital aberto é influenciado pelo ciclo econômico do país.
 H2: o ciclo econômico impacta a escolha da estratégia de gerenciamento de resultados
contábeis, por accruals ou por atividades reais, das firmas brasileiras de capital aberto.
Para condução da pesquisa, os autores delimitam os procedimentos metodológicos
exemplificando de modo separado a população e amostra, as variáveis, a estimação do
comportamento anormal do REM e dos Accruals, bem como os modelos de regressões.
A população e amostra do estudo foi selecionada na BMF&BOVESPA entre os anos
de 2000 e 2015. Os autores argumentam a escolha dos anos por abranger momentos de crises
econômico-financeiras e a expansão da economia brasileira, abrangendo os quatro ciclos
propostos para análise (tanto crescimento, quanto redução). Além disso, a escolha das
companhias ocorre devido a obrigatoriedade de publicação das suas demonstrações contábeis
anuais, com ênfase na exclusão das empresas financeiras que possuem estrutura patrimonial e
operacional diferenciada. Por fim, são apresentados o número de 247 empresas-ano e um total
de 2.501 observações, distribuídos em um total de 14 setores.
Com relação as variáveis da pesquisa, destaca-se que os autores seguem a classificação
dos ciclos econômicos proposta por Schumpeter (1939): expansão, recessão, contração e
recuperação, utilizando as variações do PIB para o período de análise para identificar os picos
e vales dos ciclos econômicos. Para identificação dos picos e vales os autores utilizaram o
algoritmo aplicado por Claessens, Kose e Terrones (2012), sendo que cada fase foi
identificada a partir de variáveis dummies.
Paulo e Mota apresentam ainda os modelos para estimação do REM e dos accruals.
Para o cálculo do REM foram utilizados os modelos propostos por Roychowdhury (2006),
responsável por mensurar os níveis normais de atividades de uma empresa e utilizar o erro de
estimação para encontrar seu comportamento anormal, com o destaque de que o estudo não
utiliza a estimação do comportamento do fluxo de caixa operacional. Já os acrruals foram
estimados a partir do modelo proposto por Paulo (2007), os autores afirmam que o modelo
possibilita reduzir problemas relacionados a correlação entre os accruals, os fluxos de caixa e
o resultado contábil, entre outros. Além disso, os autores também apresentam a utilização do
modelo de Pae (2005) como teste de robustez.
Por fim, são apresentados os modelos de regressões utilizados na pesquisa. Para
alcance do objetivo da pesquisa, os autores utilizam o modelo de McNichols e Wilson (1988)
para detecção do EM. No modelo, são adicionadas variáveis dummies que representam as
fases dos ciclos econômicos, bem como variáveis de controle, as quais os autores delimitam e
justificam cada uma delas.
Após os procedimentos metodológicos, os autores iniciam a apresentação e análise dos
dados. O tópico é dividido em três partes, sendo a primeira responsável pela análise descritiva
dos dados, a segunda pela análise do gerenciamento de resultados nas fases dos ciclos
econômicos e a terceira pela análise do trade-off entre as estratégias de gerenciamento de
resultados nas fases dos ciclos econômicos.
Os resultados da análise descritiva demonstram que há indícios de gerenciamento de
resultados (por meio de accruals) para cima nas fases de expansão e recessão econômica e
para baixo na contração e recuperação. Com relação a proxy de gerenciamento de decisões
operacionais os dados apresentam sinais negativos nas fases de expansão e recessão e
positivos nas fases de contração e recuperação indicando maior uso dessa estratégia pelos
gestores nessas fases. Além disso, foram evidenciados a existência de trade-off na escolha da
estratégia utilizada pelos gestores de acordo com o ciclo econômico.
A partir dos dados do estudo, os autores afirmam que ambas as estratégias (AEM e
REM) caminham juntas do ano 2000 até 2005, quando há uma relação inversa entre as
estratégias de gerenciamento de resultados. A relação entre ambas volta a ser positiva no final
de 2012 até 2013, em que os níveis de gerenciamento de resultados inverte-se novamente. Os
autores argumentam que esse fato ocorre devido ao período de contração, em que a economia
brasileira apresente PIB com crescimento negativo.
Com a finalidade de apresentar robustez nas análises, os autores utilizam um painel
desbalanceado para os ciclos econômicos. São apresentados os testes de especificidade dos
modelos, como o Breusch-Pagan, Hausman, Chow, Jarque-Bera, Wald e Wooldridge. Com
relação aos resultados, os autores verificam que a um baixo poder de explicação das variações
dos accruals estimados em ambos os modelos.
A relação entre o gerenciamento de resultados e as fases dos ciclos econômicos deu-se
da seguinte forma durante as fases:
 Contração: durante o período há forte desaquecimento da economia, com variações
negativas do PIB, nesse momento, as empresas envolvem-se em manipulação dos
resultados aumentando o nível de gerenciamento com accruals discricionários.
 Recuperação: no momento que a economia apresenta crescimento do PIB, há
indícios de que os gestores reduzem o nível dos accruals discricionários.
 Recessão: na fase em que a economia apresenta variação negativa do crescimento
do PIB, há indicações de uma redução no nível da estratégia de gerenciamento de
resultados por meio de accruals.
Além disso, os autores encontraram evidências para afirmar que os accruals
discricionários e o comportamento anormal das atividades reais têm relação com as fases do
ciclo econômico, não sendo, portanto, com o comportamento discricionário dos gestores. Com
relação ao gerenciamento por meio de atividades operacionais, Paulo e Mota identificaram a
influência dos fatores macroeconômicos e não somente pelo comportamento oportunista dos
gestores.
Por fim, os autores apresentam as análises do Trade-Off entre as estratégias de
gerenciamento de resultados nas fases dos ciclos econômicos e concluem que os resultados
sugerem a confirmação de trade-off entre gerenciamento de resultados por accruals e por
atividades reais. Ainda, Paulo e Mota afirmam que os resultados possibilitam concluir que nas
fases de expansão e recuperação (crescimento do PIB) os gestores preferem não se envolver
em gerenciamentos do tipo REM, o qual é mais caro do que o AEM, pois impacta diretamente
no caixa da firma.
Diante dos resultados apresentados os autores concluem que não podem rejeitar ambas
as hipóteses da pesquisa e corroboram seus resultados com pesquisas anteriores.
Adicionalmente, afirmam que os resultados do estudo acrescentam novos conhecimentos
relacionados ao gerenciamento de resultados nas flutuações da economia, principalmente pela
classificação adotada pelos autores. Para concluir, Paulo e Mota apresentam as limitações da
pesquisa e as sugestões dos estudos anteriores.
A partir da análise do artigo podemos observar que o sucesso da publicação em um
periódico renomado no contexto brasileiro deu-se principalmente pela qualidade do artigo,
tanto em aspectos teóricos, quanto metodológicos. Os autores utilizam estudos anteriores
publicados em journals de alto impacto no cenário internacional, para embasar os seus
achados e argumentar os resultados, além de realizar testes de robustez para garantir a
qualidade dos resultados e a replicabilidade do estudo. Além disso, verifica-se que houve uma
resiliência dos autores em apresentarem quatro versões com correções do artigo até a versão
final aprovada e publicada em 2019.

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