Você está na página 1de 20
Pedro Fortuna Outra vez... muitas vezes. Repeticao no contexto ceramico 1. Mostra-me outra vez ~ fundamentos da repeticao 549 551, . 554 557 . 559 561 2. Um sentido e muitas faces — do miltiplo como sentido em 3. Encontro numa roda ~ processo e repeticao 4, Dois exércitos distantes 5. Agnes Martin e um bat de azulejos ~ 6. Um bater de coragao -- REPETICAO 549 1. Mostra-me outra vez — fundamentos da repeticao A utilizagio de elementos plisticos de modo repetido no contexto ceramico acompa- nha a produgao desde o inicio da sua pritica. Os espélios reduzidos tornam arrisca- das especulagées de quantidade, mas nao hé dtividas relativamente A sua recorréncia na producao. Se por um lado a igualdade de formas se explica pela igualdade da fungio a que se destinaram, a utilizagao de maneira agrupada e repetida de incisdes ou pinturas, lineares ou punctiformes, coloca-nos na contingéncia de avaliar os impulsos expressivos da produgio / avaliagao da marca plastica e da sua carga expressiva e comunicacional, ainda que sabendo da circulagio especifica das solugées dentro de determinado qua- dro cultural e requerendo um prisma antropoldgico de observacio que nio é 0 nosso. Da leitura desse espélio fica-nos a sua discursividade propria ¢ a reflexio acerca do valor desses programas, bem como 0 seu enraizamento animico e poético, colocando em tiltima instancia 0 autor perante o barro ¢ o pigmento resistente ao fogo numa atitude exploratéria e impulsiva, familiar Aquela que alguns ceramistas escolhem para se colocar perante os mesmos materiais — impulsos e exploragdes tém por vezes respostas trans- civilizacionais. O formalismo puro que esses objectos mostram pode levantar duividas filosdficas enquanto fundamento pottico, por ventura maiores do que para as correntes contemporaneas, mas a recensao de virias expressdes artistico culturais — plisticas, mas também potticas e musicais — regista a repetig4o como recurso retdrico inquestionivel’. No fundamento desta opgio esto estruturas psicolégicas promotoras da inte- racgio com os materiais (golpeando, riscando) e da comunicago (retendo memérias, guardando marcas, mostrando sinais) nfo s6 no contexto da experiéncia individual, mas também do grupo. A marca, 0 desenho, a forma, sio reproduzidos dentro de um determinado grupo ¢ a sua utilizagio satisfaz um apelo téctil ou visual, a0 mesmo tempo que é um garante de incluso social e de efectivacio do contacto entre os seus elementos. Identificar-se com uma marca significa repetir interiormente os significa~ dos admitindo-os como seus, constituindo experiéncias comuns as artes plasticas ¢ a esctita, de um modo valido para as linhas que bordejam uma taga votiva, um grito de guerra ou um poema fiinebre. Quem o faz reitera experiéncias naturais de carécter ciclico (dias, estagdes, a geragao da vida) até a concepgao de uma historiografia circular (fenémenos repetidos dando lugar a efeitos verificados anteriormente) muito comum em culturas pré-industriais. A profundidade hist6rica onde encontramos a repeti¢ao é acompanhada e, por ventura, justificada pela profundidade psicolégica desta pritica, Isto é, a experimen- tacio da marca na pasta ceramica, solitéria, e depois repetida imtimeras vezes, con~ duz posteriormente, de forma inata, 4 sua avaliacéo e do seu conjunto. Decorre desse olhar comparado a consciéncia de padrio: a aquisigio de uma imagem de natureza 550 COM OU SEM TINTAS: COMPOSICAO, AINDAE fracciondria que eventualmente com o sacrificio da individualidade disponibiliza uma mais valia decorrente da percepgio de conjunto; uma alteracio variivel da relagio for- ma fundo, que torna activo ao nivel semidtico um componente formal secundarizado como ¢ 0 fundo e cria em cada unidade do padrao, condigées de expansio que possi- bilitam a sua repercussio ad infinitum. Nessa nova combinagio, forma e fundo podem equivaler-se, substituindo a expectativa de cheio/ vazio pela experiéncia da presenga. Porque a percepgio fisica ¢ cultural do mundo nao é fraccionada, chegam até nés experiéncias diversas e a avaliagio da possibilidade de uma certa correspondéncia: comparamos essas experiéncias, comparamos a natureza de uma fisicalidade (de duas pedras chocando repetidamente) com a de outra diferente (de tragos marcados na lama). Do modo como se percepcionam essas acgoes nao decorre nenhuma igualdade, mas a in terpretagao de ambas, a perscrutago ¢ a apreensio desses sinais’, mesmo afigurando-se- -nos ingenuamente como um acto de inteligéncia primério, deve ser equacionado porque contém em si o essencial de um impulso interpretativo (lendo um texto dentro do outro texto, como dizia R. Barthes) permitindo que o tempo de um batimento (ocorrendo de modo aciistico) corresponda ao espaco que separa as marcas (de modo visual e tactil). Uma outra linha de fundamentos identifica a repeti¢io como uma atitude da maior importincia ao nivel psicoldgico. A repetigio faz parte das acgées primérias da aprendizagem, tanto no desempenho de um procedimento (transforma-se uma pela de barro numa tigela usando a roda de oleiro) na aquisigao de uma linguagem oral ou escrita (desenhando repetidamente uma “bolinha com um pauzinho”, até que timi- damente dai nasa um a, com o seu valor codificado, integrado depois na mensagem) como no préprio acto de reconhecimento dos individuos e das formas (a mac, os fami- liares préximos, os sons ¢ os objectos). Por tris da teoria gednica (geometrical ions) de Biderman’ para o reconhecimento, esta a identidade entre a forma padrio ¢ a forma nova, repetindo uma na outra, De todo 0 modo percebemos que um novo “objecto” que experimentamos requer uma retoma dos ja conhecidos, visando a sua incorporagio progressiva, antes de cumprir uma fungéo estruturante ou comunicadora. Outro tanto se pode dizer do afecto: quando dizemos que s6 se pode gostar daquilo que se conhece, incluimos aquela familiaridade que resulta de “outras vezes ter visto, outras vezes ter escutado” ¢ nfo apenas um contacto analitico ¢ reflexivo, pressupondo a existéncia de um mundo prévio, cuja aquisigo requer visitas repetidas. O surgimento consecutivo da imagem reduz progressivamente o hiato de no- meagio da forma apresentada, permitindo ganhar fluidez na comunicagao € 0 acesso sumério a grupos de ideias mais ou menos latos. Paralelamente mecanismos seme- Ihantes de apreensio, comparasio ¢ avaliagéo estio na base do estabelecimento de pontes para ideias/ imagens associadas a partir de formas parcialmente identificadas € 0s impulsos criativos usam motivagdes hidico/ cognitivas que de modo progressiva~ mente auténomo dio lugar a novas formas. Uma grande parte da aprendizagem faz-se PEDRO FORTUNA - OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 561 de modo ideografico, utilizando equivaléncias grosseiras que servem de ponte entre temas ou figuras que teriam outro rigor € resultado se tratadas de modo analitico. Mas parte dos processos criativos dependem da diletincia livre e afectiva do pensamento, niio podendo subsumir-se a modos logicos e portanto algumas igualdades séo de facto criativas, acompanhadas por referéncias filiadoras inconscientes entre ideias e proces- sos de maturagao racional incompleta — nao sabemos se vimos antes, se imaginamos, nem que parte da ideia € nova, mas podemos dizer que, em muitos casos, a originali- dade é baseada na refundagio. De um ponto de vista estritamente comunicativo uma apresentagio facilita o reconhecimento de uma imagem posterior semelhante. Comporta-se como um rasti- Iho ignidor, tanto mais eficaz quanto a coincidéncia seja perfeita e 0 contetido claro ou reduzido; inversamente, perde eficécia quando um exemplo da mesma categoria, mas com um modelo estrutural diferente, ¢ observado de um outro ponto de vista. O prego uma progressiva dessensibilizagao fomentada pela insisténcia no mesmo sinal ao fim de algum tempo, dando lugar ao enfado € & rejeigio. Os mecanismos da repetigao, fa- vorecendo primeiro a apreensio répida, conduzem a banalizagio ¢ a impermeabilidade do observador, sendo entio expectavel que, mantendo relagao com a imagem anterior, © conjunto se modifique incorporando a diferenga ¢ criando um sinal de evalugao’. Deste ponto de vista, estamos em presenga de recursos necessariamente ponderaveis cuja utilizagao inoportuna ou consecutiva conduz ao enfraquecimento da propria obra. Analisando a fungio psiquica da repetigio as observagdes freudianas alertam para o fundo fantasmagérico da repetigao que, do ponto de vista da criagio, se satisfaz gragas 4 economia da sublimagao. Esse constrangimento organizacional e de fundo absorve a diferenga, no como acidente extrinseco ou demanda ontoldgica, mas numa espiral centripeta fechada, que nas piores situagées adquire um sentido mecanico neu- tro, transformando-se num esterestipo patolégico e numa esterilidade inventiva. 2. Um sentido e muitas faces — do miltiplo como sentido em si A fruigao estética da obra plistica evidenciando a repetigao é hesitante. A repetig¢ao entendida na propria corporalidade da obra quando reaparece ou retomada, quando alude a aco de refazer muitas vezes a mesma coisa, tem valores contraditérios na arte. Em parte, isto sucede porque a produgio artistica ocidental se organizou em torno da ideia de objecto que visa substituir ou complementar uma presenga fisica ou espiritual, partindo de um sentimento estético intrinseco que ocorre antes de mais, e nao s6 do ponto de vista historiogrifico, na apreciagio do excepcional e da forma insélita, como consequéncia da entrada na ideia de universo organizado que o homem tem de formas do mundo natural, materializadas nos fésseis ou em formagdes geolégicas excepcionais que darao lugar ao propésito coleccionista. 552 COM OU SEM TINTAS: COMPOSICAO, AINDAE Essa construgao formal consubstancia-se numa obra que os autores enuncia~ ram numa diversidade de propostas, aludindo a uma identidade que institui ao mesmo tempo uma unidade, uma nio diferenga ¢ uma indivisio. As referéncias sécio-culturais véem reconhecida a sua alusio a identidade ¢ ao Uno, na medida em que tornam credivel a seu contributo para a interpretagao da esséncia do “objecto” tratado — quer seja Deus, 0 patrono, o amor ou a guerra — € em iiltima instancia ao Ser, onde radica o valor de unidade, perfeigio ¢ particularidade, oposta a0 outro (a cépia) a0 nao ser. Vemos adicionado 4 sua produgio um valor plistico espe- cifico € uma tangibilidade (intimamente ligada & rarefacgao e ao impulso coleccionista) que Ihe assegurou (como ainda hoje) uma investidura significativa no contexto social € uma nomeagio cultural especifica. Estas caracteristicas (imagética, plasticidade poética ¢ tangibilidade) edificaram-se em torno da necessidade humana de “ver representado” e da capacidade reconhecida a “alguns” de formular uma imagem que é em si um poder. Requerendo a representagio plastica (pictérica e escultérica) uma preparagao longa ¢ fortemente corporativizada, ainda assim, encontrou sempre na dinamica da linguagem plastica alguma inovagio e criatividade, alguma deriva pessoal, coroada pela ideia de originalidade; ora a originalidade discursiva e plistica, por forga da propria solidariedade com a tangibilidade da obra, tornou-se indissocidvel da unicidade fisica, procurando assegurar a intimidade com 0 momento irrepetivel. Num quadro de valores como o referido, as solugdes de repetigao que encontra- ‘mos inicialmente tém um valor parcial ¢ acessério, empenhados em contribuir para a mais valia do objecto simbélico ¢ estatutario — da taga fainebre, do adorno de poder — ou participando numa obra unitaria mais vasta, como no caso de frisos arquitectnicos (Porta de Ishtar, c. 575 a.C. Babilonia’). A repetigao satisfaz de resto a necessidade de aumentar niveis de informacdo sem aumentar os sintagmas visuais, sem adicionar novas formas, e perfilando-se como vantagem cognitiva duradoura e de vocagio universal. No caso da cerimica, uma estreita intimidade liga um desempenho tecnolégico a um discurso artistico, levando a mal entendidos e dificuldade de demarcagio de territérios. A reprodutibilidade técnica seriada do objecto cerimico é uma aquisigéo cultural antiga, de tal modo eficaz ¢ enraizada que de certa forma a valéncia artistica tem que reivindicar espaco conceptual majorado e justificar-se. © conhecimento de que as caracteristicas morfoldgicas das pastas cerimicas permitem 0 estabelecimento de protocolos técnicos especificos com vista produg’o em série, nomeadamente pela utilizagio de moldes de terracota ¢ posteriormente de gesso para a conformagao de pasta liquida ou plastica, bem assim a utilizagao de fer- ramentas como rodizios gravadores que produzem incisdes na pasta construindo um friso, ou aplicagdes exdgenas ao corpo principal, a partir de conformagées acessérias, no seu conjunto multiplicando um gesto que podia ser tinico, criou um estigma de ad- judicagao & funcionalidade que a reflexio contemporinea veio desmontar: no sentido PEDRO FORTUNA - OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 553 da tipificagao de caracteristicas meramente técnicas que podem ser usadas em contex- tos de produgio industrial tipica, onde a repeticao tem uma natureza, mas simultane- amente no contexto especifico da linguagem autoral, quando a repeti¢ao tem na obra um valor morfossintictico, afectando a construgi0/ composicao da prépria retérica plistica, mas sobretudo pelo reforco do papel do conceito na formulagio do discurso que acolhe a utilizagao do objecto industrial nas priticas artisticas. Uma outra contaminagdo vulgar no entendimento da repetigaio é aquela que trata as produgdes pensadas para séries a partir de um projecto tinico, como acontece na serigrafia. ‘Trata-se de uma situago em que o autor assume um compromisso com o piiblico, aceitando este a existéncia de um niimero de obras predefinido, de igual qualidade material e formal entre si, contra um valor de troca consideravelmente inferior aquele que teria a obra do mesmo autor produzida por métodos individuais,enquanto o autor pode equacionar meios opera- tivos adequados & quantidade e expressio requerida. Como se percebe facilmente cruza-se aqui uma ordem econémico-produtiva com outra valorativa’, implicando valores distintos. Niio sendo os métodos técnicos de produgaio em série que definem a peca — po- dendo mesmo dar lugar a um tinico exemplar — associamo-los & produgio seriada de uma dada quantidade de exemplares. O grau de proliferagio, baseado no mimero editado e numa produgo mais expedita, repercute-se em cada c6pia, sendo trocada por um valor de mercado inferior e promovendo a tangibilidade da pega. Neste sistema de trocas, é aposto pelo autor uma espécie de “selo” que é 0 proprio conceito de “edigao original”, onde se assume uma Squase contradigao” linguistica nos termos’, materializada na “ga- rantia” da numeragio diferenciada e assinatura individual de cada pega. Podemos dizer que se verifica aqui uma repeticao exdgena, totalmente projectada no exterior, a partir de um projecto pensado para muitos exemplares. O conceito pressupée a indivisibilidade de cada pega em si ¢ a indiferenciagao das unidades dentro do conjunto. As quest6es levantadas por esta op¢ao sio sobretudo de caricter sociolégico e no so pouco importantes — prendem-se com 0 acesso ¢ a posse da “obra de arte” e, inversamente, denotam uma certa forma de publico que o autor privilegia. A circulagao de pecas tinicas tende a sinalizar estratificagdes sociais de forte verticalidade, onde um grupo reduzido tem condigdes para possuir as obras, contra uma mais plana, no caso da distribuicao da obra miltipla, onde um valor de troca inferior permite 0 acesso por parte de um grupo mais alargado. A digo da obra em milltiplos nao pode ser confundida de um modo simplista com a replicagao da obra tinica. A prépria génese e maturagio do projecto sio forte- mente marcadas pelos meios e modo como o autor os prevé, ou aceita. Evidentemente, © processo marca e conforma a obra, sendo apropriado de resto consideré-la na sua fisicalidade miltipla e nao no seu projecto. Se considerarmos sinteticamente 0 gesto como o produtor, a sua dindmica é distinta na sua individualidade bem como no seu objectivo final. O corpo da obra é 0 corpo milltiplo. 554 ‘COM OU SEM TINTAS: COMPOSICAO, AINDAT 3. Encontro numa roda — processo e repeticéo A ceramica, como eventualmente outros médios, causa nas primeiras abordagens uma mistura de sentimentos. Entre expectativas e inseguranga, vontade e inibicao, projecto ¢ destreza, progressio técnica e versatilidade discursiva, apresenta-se muitas vezes uma marcha irregular das emogGes face ao meio técnico especifico. Na maioria dos autores, © quotidiano da sua pritica empurra o processo para o centro da obra (para o centro da produgio, dir-se-ia de uma forma pleondstica). Se quisermos ser muito objectivos cairemos na evidéncia do protocolo técnico, quer dizer, por muitos e variados que se- jam 0s resultados finais, complexas as condigées de os atingir, encontraremos o modo segundo 0 qual, passo a passo, devemos proceder para produzir determinado resultado. Esse € um sentido técnico que s6 nao teremos presente se no quisermos arcar com a informacio que antecede cada resultado — ou se esse peso nos tolher a poesia do gesto! Cada vez que apelarmos a determinado resultado repetiremos 0 percurso que fizemos antes ou citaremos a bula dos que nos ofereceram a chave de um caco®. Esse desde logo um sentido estreito, mas rigoroso, que tem o processo. Um outro sentido decorrente dessa mesma sucessio de gestos e atengdes é aquele que nos liga Aqueles que como nés tiveram certa preocupacio ¢ objectivo. Mais do que um sentido corporativo ¢ histérico, evidencia-se a entrada na corrente de quem identificou um modo de prolongar o pensamento no gesto adequado para produzir algo até entio inexistente. De certa forma o contentamento com algo ja feito, repetido no sentido reducionista do termo, assombra esta satisfagio, mas esse sentimento é ul- trapassado pela nogio de contacto com a chave do comportamento dos materiais. Mais do que isso, a conformago da pega pressupde algumas rotinas comuns, envolventes, no sentido animico, mas também redondas, no sentido gestual e muscular, que contornam cada obsticulo com determinado procedimento, preparando 0 autor para as opgdes que fara no continuo proceso de (auto) avaliagio, contando com a reedigio de gestos que nesta fase equivalem & propria obra e criando em conjunto um pathos que faz parte do seu entendimento. A repeti¢ao surge como uma qualidade, integradora e promotora de energias construtivas essenciais eclosio da obra. De um modo mais objectivo, é comum a coexisténcia de varias cépias de pecas (ou de partes delas) em progressio no atelier do ceramista, embora por razées de mera razoabilidade produtiva. A mesma observagio se da quando é possivel a coabitagio com alguém dedicado 4 cerimica funcional ou num projecto em espago industrial. Garth Clark’ assinala que os valores do minimalismo (¢ da repetigo) fazem “parte da tradigdo e do proceso cerimico, mesmo que nao sejam conscientemente apreciados ¢ reconhecidos”. O cenirio onde nas tabuas se perfilam malgas repetidas, canecas cuja suave diferenga no tom de cinzento ecoa"” “infinitamente”, sé marcando ligeira dife- renga na presenga de agua, é uma escola, onde a confrontagao com essa simultaneidade de objectos pode desencadear novos caminhos, impondo a contribuigao de elementos PEDRO FORTUNA ~ 555 iguais ¢ a repeticao para a construgao de uma obra tinica. Esta composigao torna-se a necessaria para um sentido subitamente pertinente, ou por ventura até entao num estidio inferior ao possivel. Zdenek Manina. (n. 1961 Rep. Checa) fala desse stibito sentido enquanto trabalhava na pega They May Not Even Hope in Death, um grupo escultérico de figuras sentadas, cujas bocas abertas ¢ contor- nadas de vermelho pronunciam um grito surdo, Obras posteriores como We te going to fly, 1998, ¢ Exemplaries, 2004, perfilham solugdes discursivas semelhantes, em que a re~ petigio é uma figura primordial da estratégia retérica na produgio de énfase e clarezay Originally there was only supposed to be one figure but for technical reasons while creating the mould I made more casts and began to group them together in various compositions. I discovered that multiplying the number of statues had a much stronger impact, and that the effect cached to levels that I had not originally considered. (...) looking back through my notes I discovered that I have exhibited They May Not Even Hope in Death about four times, and every time with a different grouping of the individual statues". Freisleben defende um valor subtextual que tem esta repetigio, acentuando a indaga- gio constante pelo homem das suas causas e imperfeigdes, em gestos que simultane~ amente nos provocam e desvendam nas nossas verdades!”. Aqui, a repetigio tem um sentido estrutural e imediatamente nos lembramos da construgao mecanica das ima- gens animadas (tirando partido da nossa fisiologia e criando um movimento ilus6rio) onde o que se modifica é 0 lugar relativo do/s personagem. Subitamente a vontade de um personagem torna-se mais evidente quando comungada por varios ¢ a determi- ago de todos (redutivel & postura de um) evidencia a urgéncia desse desejo. A sua presenga é dupla, tem um lado coreogréfico, quase cinético, e outro iconogrifico, sendo a convivéncia (antagénica) entre os dois assegurada pelo mecanismo da repeti¢ao. Esta postura revela, para além da obra terminada, uma linha de reflexio com consequéncias mais vastas e coincidentes com o testemunho de R. Motherwell quan- do afirmava que “Pintar € um acto cognitivo, através do gesto e do acto de pintar vou perceber 0 que sinto”; nela a acg’o pressupde a acumulacio e a insisténcia que torna © precario em permanente, através de uma absorgao do conhecimento paulatina e vagamente endosmético. Outros conjuntos de trabalho sio menos acidentais, como é 0 caso dos as- sinados por autores habitualmente inscritos no minimalismo. Em comum colocam interrogagées formais e espaciais usando como sujeitos quasi contentores — resul- tantes de uma mutacao no sentido da obra cerimica da funcionalidade tipica para a fruigao estética — observamos que em comum tiram partido de um mesmo conceito de pega, as mesmas estratégias de conformacio, ou até uma mesma forma de base, 556 ‘COM OU SEM TINTAS: COMPOSICAO, AINDA? para em seguida a desenvolverem de modo particular. Geert Lap” e Pippin Drysda- le", de modo individual 0 primeiro, na forma de instalagao a segunda, tm obras que se entendem mutuamente na austeridade do volume e no rigor da forma. Enquanto a exuberdncia de Adrian Saxe", quase neo-barroca, busca uma iconografia cultural, critica maneirismos decorativistas e cultiva variagées dentro de cada série, o trabalho de Gail Nichols" é uma teimosa procura da pele cerimica, reformulando e acumulan- do conhecimento que faz da sua repetigao uma busca da matéria, como se fosse uma viagem, cujo resultado fisico é sempre diferente. Observando o recurso a repeti¢ao, enquanto ferramenta lingufstica que ultra~ passa as artes-plisticas, usada de uma forma consciente e persistente, constatamos uma utilizagdo que nao exclui a diversidade. O que acontece é diferente do que reaparece, € © aparecimento afirma-se como um regresso reiterado, afirmado como uma figura de retérica que permite insistir voluntariamente numa ideia, reforgada pelo mimero, pela intensidade e menos pela configuragao exacta, Sem grande esforso sentimos o pa- ralelismo entre a sonoridade"’ de Steve Reich, Philip Glass ou John Adams. Quando a materializacao estrita que qualquer linguagem requer é ultrapassada, desenvolve-se um prazer estético, ao entender que, a um nivel conceptualmente superior, estas obras se ligam numa insisténcia epistemoldgica. Em todos, mtisicos ¢ ceramistas, a repeti¢a0 introduz no padrio repetitivo a variedade incessante, segundo uma regra pré-definida que permite engendrar a partir de um motivo dado, nfo a repetico mas a diferenga tratada por uma linha de discurso composta por sinais iguais, a que se juntam subita- mente pequenas transformagées que, modeladas, acabam por modificar a primeira ou, subitamente, fazer-se interromper, criando no vazio o fantasma da sua presenga. Esta flexibilizagio nio € pacifica. Deleuze chama a atengao para a diferenca de natureza entre semelhanga ¢ repetigao, defendendo que as duas se apresentam em ordens diferentes: a qualitativa, das semelhangas, é simbolizada pelo ciclo, compreende uma generalidade permutivel e funciona como analogia do natural e do mundo; a quan- titativa, a que afecta a repeti¢do ¢ a equivaléncia, é simbolizada pela igualdade e nasce de um pensamento abstracto. Para Deleuze a condigio geral da Natureza é a mudanga que caracteriza as criaturas particulares, a condi¢ao Moral é outra e é nela que se ins- creve a repeti¢ao, uma tarefa recomegada, um quotidiano como reafirmagio do Dever. Comparada com esta anilise, a abordagem que defendemos parece demasiado abrangente e genética, mas funda-se na repetigao do impulso essencial que fundamen- tao grau seguinte. Encontramos ao nivel da linguistica literdria abordagens especificas titeis para particularidades no uso da repetigio. Conscientes que generalizagées destas analises entre linguagens tio diferentes sio evidentemente arriscadas, mas a percepgio do seu valor sintdctico e a capacidade estruturante de convocar recursos que permitem a versatilidade do discurso, entenderemos melhor as propostas das artes-plasticas que PEDRO FORTUNA ~ OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 857 requerem uma abordagem preparada, Certa mancha reincidente apresenta um valor equivalente ao de um refrio, um filme sobreposto em variagdes miltiplas, sobre um tema tinico, com uma capacidade de equacionar problemas como o espago (criando ligagdes em referéncias visuais) e 0 tempo (criando expectativas no ressurgimento do sinal) de modo anaférico, anteriormente inexistente. A dissertagio acerca do tempo foi feita nas artes plisticas recorrendo a me- taforas e a paribolas, cuja aplicagéo a cada conceito subjacente se fez (faz!) de modo substitutivo, enriquecidas de resto por essas ligagdes interpretativas requeridas para a fruigéo do discurso. Intrinsecamente a linguagem plastica expde-se num sé momento ¢ de forma imediata; a aquisigao dos instrumentos repetitivos representa por um lado uma argumenta¢io nova, comprometida por vezes com a instalagao, e por outro, um enorme ganho conceptual, na medida em que torna mais abstracta a propria lingua- gem enquanto tal. A. Dois exércitos distantes Considerando varios modos de operar na repeticao, dois conjuntos de peas, instala~ ‘s6es, convidam a sua andlise e merecem argumentagio, pelas respectivas particularida- des. Dois exércitos, separados por centenas de anos: primeiro'’, o Exército de Terracota do Imperador Qin Shi Huang Di”, estima-se que tenha sido criado ha cerca de 2200 anos num contexto de glorificagio funerdria mistica a quem “uniu” o grande império. Composto por cerca de 8000 figuras em tamanho natural, com soldados ¢ cavalos em cortejo, exibe diversificadas indumentérias militares, etnias e fisionomias, foi desco- berto em 1974 e supde-se que tera requerido o contributo de 700 artesios ¢ 40 anos para produzir, utilizando pastas elaboradas com materiais locais e oficinas operacionais no perimetro circundante. Enterrado a 5 metros de profundidade, guarda certamente dezenas de leituras (e hist6rias) inaudiveis exorbitantes a este artigo. Interessante a muitos niveis, 0 Exército de Terracota € tinico no sentido da totalidade da obra e nas suas particularidades. A medida que as leituras progridem modifica-se a nossa anilise: primeiro a genérica, composta por um conjunto alargado, imenso, de figuras semelhantes, cuja presenga policromitica se foi esbatendo e dando lugar a cor terracota da multidao; depois o enriquecimento do detalhe, a mais-valia da individualidade (conseguida utilizando moldes, cujas produgées foram, em “verde”, modificadas e individualizadas) 0 contributo especifico da composicao instalatéria e monumental, contando com a presenga vizinha do “individuo” de igual condigio limitando 0 espago do anterior com o seu préprio espago, projectando na imobilidade do elemento seguinte a sua sombra e cujas consequéncias ecoam até ao final de cada coluna de soldados. Sem esquecer essa diferenga do individuo, a leitura regressa a0 conjunto que afirma a unidade. Nao lembramos um soldado, um heréi do império, 558 COM OU SEM TINTAS: COMPOSIGAO, AINDAE lembramos um exército, cuja frac¢fo interna se repete e anima, cuja repeti¢ao, nao transbordando para outras obras, € essencial para a afirmagio da peca e para o modo como ocupa o lugar. Podemos chamar endégena a esta repeti¢o que esta presente no modo como a pega, 0s seus componentes, ocupa o campo plistico, sendo esta repeti¢io consumida internamente e nao se repetindo noutra formulagio insistente, noutra pega com os mesmos elementos. Sintetizada permanece na comunicagio entre os observa~ dores ¢ na sua meméria. Esta figura do “exército” tem de resto uma semintica fecunda. Aparece antes de mais como o modo de multiplicar por vitrios a forca de um s6, deparando-se de segui- da com a necessidade de se organizar, de fazer funcionar as suas partes optimizando a sua eficdcia, maior do que a soma dos seus individuos. A sua existéncia afirma uma massa critica que nao se confunde com outros agrupamentos; nfo é um bando, nao é uma milicia, é uma forma social icénica e activa. A personalizagio de um exército ganha-se pela despersonalizagio do individuo. Tornando uniforme a aparéncia dos seus constituintes ¢ dispersando pelo todo a acco que em concreto é individual, a res~ ponsabilidade que sendo de todos nio é de ninguém; um soldado, sob o olhar de Qin Shi Huang Di, ou de uma bandeira de um estado contemporineo, é potencialmente um desconhecido. Um outro “exército” foi proposto por Antony Gormley (UK), nas séries Fields, 1991- 2003, em que cada instalacao, normalmente de grandes dimensoes”, é constitu- fda por um grande niimero de figuras “humanéides” de cerimica vermelha, com pouco mais de 20 cm de altura, que a partir do nivel do pavimento, como uma grande massa humana, “observam 0 observador”. O conceito foi colocado em produgo em momen- tos diferentes, em virias comunidades ¢ instalado outras tantas vezes em exposiges auténomas. A nosso ver, a obra exemplifica o processo de repetigio, mantendo ao mes~ mo tempo a mutabilidade que a formulagao mais sofisticada do conceito pressupée, mas requerendo a reflexio acerca das fronteiras do proprio conceito. Sem abordar a riqueza semantica da obra, de um ponto de vista marcadamente formal, a énfase é colocada no proceso colectivo e na tomada de consciéncia social da arte. Ao transferir a produgao do individual para 0 grupo, o autor endossa a responsa- bilidade produtiva a terceiros, nao especialistas® de um modo agregado, em que a soma dos contributos individuais 6 se torna uma unidade quando vista pelo lado conceptual do autor (Antony Gormley, neste caso) ou, no final, pelo observador. Each one of these works comes from a lived moment. It is a materialisation of a moment of lived time, in the same way that my other work is a materialisation of a lived moment in time, and they have a very particular presence, each of them." PEDRO FORTUNA ~ OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 559 A “plataforma de trabalho” realga também uma opsao pela extrema elementaridade das figuras, a desnecessidade de habilitagio técnica especifica (ao contrario do Exército do Imperador Qin Shi Huang Di) ¢ 0 convite a uma abordagem da matéria aparen- temente lidica. Enquanto antes mostramos 0 processo como um protocolo técnico que a emogio tempera (para quem espiritual seja um termo demasiado forte) aqui afirmamo-lo como uma condi¢io operativa minima comum, desvalorizada pelo pré- prio ceramista. ...this direct touch, bodies formed not so much as a representation but more as an event —thisact of squeezing of forming in the space between the hands.(...) One's sense of one’s own body, and perhaps of one’s identity, loses itself in what the mind is trying to comprehend; we become only an eye, reaching into the distance; but it is an eye whose gaze is returned, multiplied, reduplicated thousands of times.?5 Os gestos de construgao repetem-se, na certeza de que o resultado provavel é a dife- renga: aquela que reside na comparagio especifica das medidas, das formas de cada figura, mas simultaneamente na adaptagao a cada lugar onde é exibida, preenchendo o pavimento como um liquido ou uma multidao invasora. Neste entendimento alargado da repetigio reside a condigao do seu contributo para a grande manifestagéo que é Field, podemos dizer que, de um modo paradoxal, a sua unidade depende da multiplicidade dos seus elementos. 5. Agnes Martin e um bad de azulejos Dos campos que na ceramica so cruzamentos entre tecnologia ¢ funcionalidade, lin guagem e arte, a cerimica mural tem em Portugal um espélio produzido e particula- ridades expressivas desenvolvidas que mereceram a reflexio de varios autores, a par do empenho de outras tantas instituigdes. Se considerarmos a superficie mural como um suporte que por raz6es plisticas e/ou de qualificagao técnica, constitui um enunciado ao qual a ceramica esti habilitada a responder (impermeabilizando ¢ fixando um programa plistico durante centenas de anos) mas cuja técnica nao permite produzir pegas inteiras de grandes formatos” ou construidas in situ, deparamo-nos com determinantes decisivas para o desenvolvimen- to do painel ceramico na sua variante de médulo regular e produgio acessivel, técnica ¢ economicamente — ou seja, 0 painel de azulejos. Quer 0 médulo utilizado favorega certo relevo, modelando a reflexio da luz (quase sempre com maior contengio cromé- tica), quer faga do gesto pict6rico puro o seu canal expressivo (inicialmente lembrando tapegarias ¢ depois exaustos ¢ aberrantes subprodutos duma industrializagao impen- sada) ou mesmo quando a superlatividade de ambos se combina (nos atrevimentos 560 ‘COM OU SEM TINTAS: COMPOSIGAO, AINDAT quase feéricos de Pallissy e seus herdeiros, entre eles Bordalo Pinheiro) a cerimica, nos melhores exemplos da azulejaria de repetigio, ocupa o espago como uma rede opaca donde se desprende um reflexo fraccionado, 4 medida do passo do observador, rece- bendo a luz “contaminada” pela cor. Quando se percorre em vertigem lenta as paredes da cozinha do Mosteiro de Alcobaga”, essa rede estendida lembra-nos as observagées feitas sobre a “grelha” por R. Krauss’, enquanto estratégia promotora do siléncio e da recusa do discurso: a sua falta de hierarquia, de centro, de inflexdo, enfatiza no s6 o cardcter anti-referencial, mas sobretudo a sua hostilidade a narrativa, vivendo de uma estrutura impenetravel ao tempo ¢ ao incidente, que nao permite a projeccio da linguagem no dominio do visual, tendo como resultado o siléncio. Que faria Agnes Martin com uma centena de azule- jos num bat? O exercicio sera abusivo, até porque esta riqueza que sub-lemos nao foi propositada, sabemos isso, resulta de pecas que absorveram imponderaveis e variantes de fases particulares do processo” usadas como solugao funcional, mas que ha muito tempo se apresentam didacticamente como versatilidades da linguagem plistica. Se cortarmos a parede de Alcobaga um metro quadrado desses azulejos ¢ 0 mostramos sobre a isengio dignificante de um fundo branco de museu, sentiremos o latejar da vanguarda, a0 mesmo tempo que o retorno ao lugar original expée a sua verdadeira natureza e a contingéncia da produgio subjacente. Nos melhores exemplos dos padrées pintados, a fitomorfia que domina muitos dos programas herda modelos de outros contextos ¢ a repetigio que permite a rever- beragio ao olhar (constituindo objectivamente diferengas) é, por sua vez, uma fracgio do gesto de pintar ecoando meses a fio sobre 0 quadrado de terra cozida e vidrada. Nos programas modernistas a rarefacgdo é maior e, mantendo o objectivo decorativo, 0 exercicio dedicado sonda sobreposigées da forma simples geométrica, beneficia do alargamento da paleta e voluntaria-se em obras ptiblicas que, apesar de escassas ¢ ge ograficamente assimétricas, noticiam a vontade de renovar e 0 prazer de dar a fruir a combinagio das formas que afugenta 0 vazio. Esse exercicio formal ¢ infindavel, uma declinagao abundante como a dada nas propostas de Manuel Cargaleiro, onde se observam de modos diferentes: na produgio do atelier na fabrica Vitiva Lamego, 1994-96” em que o convivio com arquétipos da azulejaria (flores, estruturas) € assumido decorativamente na progressio e multiplica- go da forma, sendo a visibilidade dessa procura o seu modo de ser; ou inversamente, em 7 Propostas para Arquitectura™, ocultando toda a hesitagao, propondo gestos finais, limpos, em que a modelagao volumétrica desafia 0 espaco da arquitectura, repetindo-se indiscutivelmente no rigor do corte. A formulago que propée, escudada na igualdade do médulo ¢ no ritmo primario que esta subjacente, tem a ambigio de repetir-se em permanéncia, ao mesmo tempo que cria uma diivida — a de saber se a sua dedicasao a0 volume construido por meio de um enunciado de expresso numérica regular formula PEDRO FORTUNA - OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 561 uma infinitude, ou se a previsio de que essa aplicagao efectiva ao volume a transforma- r4 numa animagio finita e centripeta, comprometida pela grelha. Como se a promincia em abstracto se desfizesse com a respectiva imanéncia construfda. 6, Um bater de coracao O elemento formal mais evidente da repeti¢ao sera por ventura o ritmo, que constitui o resultado de uma leitura analitica do proprio fenémeno da repeti¢io e gragas ao qual a linguagem plistica acede a tertitérios para os quais, possuindo a vocacao poética ¢ perceptiva, nao tinha encontrado ainda a chave prépria. A sua justificagio nao esta tanto na constatagao da existéncia de fenémenos repetitivos mas na criagio da ordem segundo a qual o fazem. ‘A par de uma percepsio do mundo natural marcado pela ciclicidade, prisio- neira da rotagao da Terra em torno do seu proprio eixo e da sua transla¢o em torno do Sof”, o homem age no quadro de uma operatividade tipificada por uma estrutura (esqueleto ¢ dinamica muscular) ¢ um animo psico-volitivo. A. primeira define-nos como “maquina”, capaz de determinada prestagio fisica — 0 alcance de um brago, a amplitude de um passo, a forga mobilizdvel para um langamento — adquirindo e despendendo energia em alternancia de acgao e repouso, cuja ampliagao para além da capacidade unitéria individual requer a repetigao da acco: a corrida multiplicando o passo; os gestos de cavar e ceifar, deixando atris um relevo desenhado e animados por cantigas de trabalho, elas préprias repetindo estruturas métricas e melédicas; a forga de um, multiplicada por “muitos”, num exército. O segundo predispde-nos para uma acgao que utilizando 0 mesmo padrao se modifica ligeiramente até nos permitir, aprender, resolver...andar de bicicleta, tocar um instrumento, dominar uma caligrafia. Quando este método de interac¢o com 0 meio visa a ultrapassagem de uma dificuldade ou realizagao de uma tarefa nova culminando numa aquisigao de conheci- mento, chamamos-lhe tentativa ¢ erro. O pensamento analitico associado as alteragdes metodolégicas ¢ da comunicagao didactica permitiu civilizacionalmente dominar uma quantidade de conhecimento incomparavelmente mais vasto e seguro do que aquele resultante da “curiosidade ¢ experimentagao” intuitiva; todavia, esse impulso representa uma aptidao nata do individuo, em confronto com uma nova situagio, de ascender a um patamar de desempenho superior, reagindo a uma curiosidade ou necessidade. O movimento ritmico do braco institui a acgdo criadora da forma (através do bater e do raspar) ¢ a capacidade de a controlar, ao mesmo tempo que desenha a frontei- ra entre o mundo natural e o humanizado. Embora a manifestacao aciistica e a muscular déem lugar a percursos afastados, uma e outra manifestam a percep¢io do ritmo natural. Sobretudo na vertente aciistica, manifesta um lado interpretativo que propés emotiva- mente uma origem extraordinaria para o controlo de um modo repetido de produzir. 562 COM OU SEM TINTAS: COMPOSIGAO, AINDAE O ritmo surge como uma leitura criadora de relagées do espago com o tempo®. A colocagao sucessiva de uma pega num espaco ligeiramente diferente, permite-lhe ser lida como mével — fi-la deslocar-se nesse espaco, associnda numa percepsio grosseira 4 matriz do fotograma e do desenho animado. As formulagdes mais simples sio de natureza linear, resultando da combinagao de uma ocorréncia fisica com outra temporal, como acontece num friso ou no toque de um instrumento. Em muitas lin- guagens artisticas é comum a coexisténcia de varias emissées, ocupando um campo pict6rico ou um espaco tridimensional e cuja percep¢ao é um exercicio de abstraccio mais ou menos criativo. Estas situagdes dao lugar a existéncia de varias linhas ritmi- cas interactivas, que complexificam e enriquecem o discurso ritmico, permitindo as artes-plasticas uma ficgao diacrénica num dominio que é estruturalmente sincrénico. Nas instalagées que produziu, Plots 1-4 e First Harvest, Juan Granados *, usa o ritmo como uma experiéncia primaria de mutagio, consistindo em intervalos de duragio (espago) regular entre acontecimentos, fazendo da ritmica um valor plistico (ritmo pictérico) e permitindo considerar a dinamica como um valor da composi¢ao. A distribuigdo dos varios elementos da instalagao num plano baixo, que abordamos com a perspectiva picada de um jogo de mesa, permite ligar os elementos numa rede de conexdes mtituas, formada a partir da oposigao de direcgdes e dimensoes, aparecendo essa relagio como uma emogio estética fundamental. Nesta dinamica particular, a unidade do ritmo é assegurada pela subordinacao da relago métrica 4 mesma formula matemitica. Adivinhamos que uma ordem inicial proposta seja mutvel, melhor ainda se formos nds autores — iludidos — dessa mudanga. A medida que a forma se autonomiza do natural € se torna um sinal cru, parte de um alfabeto, disponibiliza-se simultaneamente para duas comunicagées encriptadas: uma directa, com a respectiva correspondéncia fonética, outra plastica. Quando tocamos a sucessiio rigorosa de pequenos relevos, sobretudo se desconhecermos a linguagem braille,o nosso entendimento enche-se de dtividas, incapaz. de penetrar nesse texto, cons- ciente da sua ignorancia, mas reconhecendo a possibilidade de um sentido — que pode ser falso, Tal néo acontece em Finding Home, 2004, ou Cottonmouth, 2005, de Ingrid Lilligren’® onde a transeri- gio de um poema em braille, convive com 0 siléncio de — Figura 71. Juan Granados. First Harvest, 1992. Instalacao com uma forma plistica austera pecas texturadas, engobadas e vidradas. 4.26 x 2.43 « 0.30 m. PEDRO FORTUNA ~ OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 863 — Figura 72. Ingrid Lilligren. Finding Home, 2004 (com transcri¢ao do poema October Snowpea de June Jordan). Grés, porcelana, cadeira de Madeira e cabelo, 84 x 64 cm. ce absorvente. Para além da carga literdria, textual nao explicita, da cerimica decorre uma inquietacao poética paralela simbistica & primeira e, ainda assim, sempre auténoma. A afinidade com uma linguagem ¢ a sua adopgao ultrapassa, porém, a clareza no entendimento da sua sintaxe, a estruturagio, ou mesmo a respectiva justificagao en- quanto retérica. Para que a obra se coloque em vez do autor é necessario que este tenha encontrado naquela a parte necessaria, a valéncia que, combinada com o conceito ¢ a relagao industriosa particular — hoje fortemente posta em causa — dé lugar & obra. Esse encontro e identidade funda-se na concorréncia de particularidades culturais e afectividades individuais, suficientes para vencer a inércia do siléncio, ou do vazio, propondo uma representagao/apresentagao. A modernidade nas artes-plasticas foi marcada, entre outras caracteri pela necessidade de mostrar pensamento humano abdicando da descrigio, sentindo que a analogia ¢ a metéfora eram ja insuficientes ¢ olhando para a linguagem nio figurativa como portadora de valores plasticos em si. No contexto deste patriménio ja adquirido, a repetigio tem sido usada em formulagées estilisticas diversificadas, pro- curando a possibilidade de dar novas configuragées ao inconfiguravel, dando corpo ao que nao tem fisicalidade® que, como desiderato permanente ¢ absoluto da arte, jé exis~ tia e nfo se alterou. Esse exercicio construiu novos corpus artisticos ¢ a autonomizagao icas, 564 COM OU SEM TINTAS: COMPOSIQAO, AINDAT de recursos até entio considerados acessérios ou secundarios. A novidade coloca-se nao ao nivel das questdes referenciais — a dor, 0 medo, o prazer, 0 espanto, sio os mesmos — mas ao nivel dos modelos de linguagem, onde se criam novas necessidades. Inserem-se aqui as reflexes que procuram responder ontologicamente ao pro- cesso de “tornar-se”, na eclosio da forma a partir da ideia. Kate Armstrong sublinha 0 contributo de Kirkegaard e da relevancia da proposta que traz para a leitura, através da qual a transcendéncia se converte em imanéncia. No quadro da cultura crist, 0 autor toma o modelo da encarnagio de Deus em Cristo como um modo de transformar o Outro, transcendente, no Humano (Eu) imanente. A conversao da potencialidade em actualidade ¢ inserida num contexto em que defende o conceito circular de interpre- tagio da histéria, por oposigao a concepgao linear, conservando a repetigo como um principio da sua operacionalidade”, Simultaneamente, a autora defende que a ima- gem, em autores como Warhol, pela forca da repetigao, transcende a sua representa- 40, aniquilando o seu valor unitétio ¢ acedendo desse modo ao nao-representivel. Este dominio do nio-representivel induz as questées do ausente transcendente e da impossibilidade da representacéo, pelos meios tradicionais da pintura pelo menos, como particularmente caras ao pés-modernismo e & pintura de autores como Warhol. O cristianismo, que tem como outras religides uma pratica littrgica rotativa sa~ zonal, alinha varios eventos de renovagio da Alianga de Deus com os Homens, segundo uma ideia de percurso exposto a desvios, mas também ao resgate do individuo. A recon- ciliacao é a chave desse ligagao e conduz 4 nogio de perdéo como um elemento fractu- rante relativamente ao judaismo de que ¢ herdeiro cultural directo. No evangelho, Ma- teus refere que quando Pedro perguntou a Cristo quantas vezes devia perdoar a quem pecasse contra si, se sete vezes; Cristo lhe responde “nao te digo sete vezes, mas setenta vezes sete”, Nesta resposta ¢ interpretacao corrente entender-se um ntimero infinito de vezes e as implicacdes de ordem teolégica e moral sio vastissimas, uma vez que da a0 amor um peso na relagio inter-humana e humana-divina que até ento era impensivel. Sem poder avangar com conclusdes para um assunto cujas diividas e contributos permanentemente se repetem e refazem, importa reter que a identificagao do ntimero como categoria sucedanea para a ideia de infinito, simultaneamente tangivel e abstracta, permite estendera ocorréncia para lé da fronteira do humano e definindo-se na categoria do imediatamente perceptivel como equivalente — procurando acompanhar o pensamento de Deleuze. A repeticao manifesta-se como modo pritico conversor do acto imanente em esta~ do transcendente, ou ao menos em estado comunicacional ¢ participante na transcendéncia. Livre do quadro religioso, parece importante reconhecer 0 papel que a renova¢ao tem, paralela ao caracter inaliendvel da liberdade e decorrente do reconhecimento do erro, da insatisfaco, ou construtor de uma relago fenomenolégica com o mundo. Sem poder cumprir a pureza ideal, 0 gesto e a forma confinam-se na falibi- lidade da proposta e na declinagao factual. A identidade apropria-se da igualdade ¢ PEDRO FORTUNA - OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 565, transforma a repeticdo em unidade, fundindo os elementos a quem retira o ser; nesse Gutesho € a imperfelgto da semethanga que gatants a igualdade'dé finde, tomuands tuma qualidade anafériea em que depende do segmento variante para validagao do sy mento permanente e indiferente. A renovasio, enquanto repetigio modificada, hebil- ta a0 prosseguimento do caminho daquilo que o autor tem como imperativo. Bstamos perante uma repetigio do desiderato do conhecimento, como razio para a arte, em que cada objecto formalmente diferente procura uma resposta para a mesma pergunta. 1 RIBEIRO, Anna Christina — “Intending to repeat: a definition of poetry”, in The Journal of Aestheticsand Art Criticism ol. 65. Malden, EUA: Blackwell Publishing, 2007. Sugerem-se, adicionalmente, como referéncias deste texto: AMSTERDAMSKY, Stefan —“Repetisio”, in Enciclopédia Einaudi, vol.33, ed. port. Lisbon: INCM, 1996. CAPUTO, John D. — Radical hermeneutics: repetition, deconstruction and the hermeneu- tical project. Bloomington: Indiana University Press, 1988. DELEUZE, Gilles — Diferenga erepetgio. Lis ‘boa: Relégio d’Agua, 2000. KIERKEGAARD, Soren — Fear and trembling/ Repetition. Princeton: Princeton University Press, 1983. MANINA, Zdenek —“We are going to fly”, in Clay in Art International. Nea Smayeni (Gr.): Kostas Tarkasis, 2006. PUIGIITARRECH, Armand — Pardé i recon ciliacié en la tradicié cristiana. Barcelona: Pu- blicacions de Abadia de Montserrat, 2004. TARDE, Gabriel — Les is de imitation (1890), 2 ed, 1895 versio electronica em hetp:// lassiques.ugac.ca/classiques/tarde_gabriel/ 566 COM OU SEM TINTAS: COMPOSICAO, AINDA? itation/tarde_lois_imitation_1.pdf (07.09.2008). LEROI-GOURHAN, A.— Ogestoea palavra. Vol. 2- Meméria e ritmos (trad. port.) Lis- boa: Edigdes 70, 1987, pp. 180 e ss, RAMANI, §. ed al (Ed.) — Knowledge Based Computer Systems: International Conference KBCS °89. Bombay, India: Springer, 1990, pp. 363-374, A teotia propde para o reconhecimento formal dos objectos uma abordagem baseada em algu- ‘mas caracteristicas volumétricas. Considera a cexisténcia de 12 formas tridimensionais padrio a que chama geées (cubo, paralelepipedo, esfera, toro, cone, cilindro...) € com os quais compara 105 objectos dados a experimentar, Estabele- cendo uma hierarquia de reconhecimento, si0 consideradas arestas, vértices, forma do plano, fracgio do objecto, afirmando-se que as unida- des celulares do conhecimento sio sensbilizadas quando certas configuragies ou suas fracgies sio percebidas, por comparagio com os gedes dados. A igualdade entre dois objectos verifica-se quando um resulta da translagio, dilagio ou rotasio do outro. A verificagio da igualdade ¢ requerida nos termos da sua posigio, dimensio ¢ orientagio. Enquanto a igualdade da forma em termos de posigo e volume se verfica facilmente,a igual dade da orientasio ¢ conseguida pela utilizaso de planos caracteristicos do objecto. O grau de verificagio simultinea nos vtios critérios condiz A “sobreposigio" dos objectos. As diferengas sio consideradas como margens de desconformidade entre 0s objectos em causa. Experimentamos na publicidade intimeros exem- plos deste comportamento. Porta de Ishtar na Babilénia construida c. de 575 4.C. O espélio encontrado (placas cerimicas e baixo relevos de figuras animais com ¢ sem vidrado) foi restaurado € montado no Museu Pergamon de Berlin. Tera sido uma das portas processionais da cidade, dando acesso ao recin~ to consagrado a deusa Ishtar. Va. http://www, smb.spk-berlin.de/smb/sammlungen/details. php2lang-en8cobjlD=23&p=24 (28.09.2009). 6 _ Naose confunda valor ontolégico e plistico com valor de mercado, Um refere-se& avaliagio critica, de acordo com critérios essencialmente estéticos, ‘outro com eritérios econémicos de trocas sobre tudo de mercado, Em rigor, substantivo edigao refere um colectivo de objetos. Apés a distribuig%o, o observador frui um dos exemplares que constituem a edigio e nfo a propria. Giria para referir uma amostra pseudo-displicente feita numa chacota partida 9 CLARK, Garth — Shards, Garth Clark On Ce- ramic Art, John Pagliaro (ed). New York: D.A.P/ Ceramic Arts Foundation, 2003, p. 95. Mis inspirador ser lembrar 0 mito de Eco, a ninfa que Hera condenou por ctime, Apaixonada por Narciso, apenas podia reper iltima palavra que the dirigiam, sem nunca conseguir da sua parte a retribuigio do afeto, 11 Cit por FREISLEBEN, Zdenek — Clay Art In- ternational Year Book, 2005-6. Nea Smyrni (Gr): Kostas Tarkasis, 2006, p.208 e ss. 12 Ibid. 13 KOPLOS, Janet —*Geert Lap at Garth Clark— ceramics exhibition”, New York,: Art in America, Setembro 1993, New York: Brant Publications, ‘Vd. tb. heep://www.metmuseum.org/toah/ho/11/ ceuwl/ho_2001.724.1.htm (03.02.2009). 14. Kimberly Series, 200 pindrysdale.c ‘Vd. http://www.franklloyd.com/dynamic/artist. asp2ArtistID=25 (22.12.2008). 5 Va. tb. http:/Awww.pip- m/ (28.12.2008). 16 VA. http://www.craftact.org.aw/portfolios/artst. php?id=298 (30.08.2008). PEDRO FORTUNA ~ OUTRA VEZ... MUITAS VEZES 17 KIVY, Peter — The fine art of repetition: essays in ‘the philosophy of music. Cambridge: Cambridge Univ. Press, 1993, 18 PORTAL, Jane (Ed.) — The First Emperor: Chinas Terracotta Army. London: British Mu- seum Press, 2007. BLANSDORF, Catharina, EMMERLING, Erwin, PETZET, Michael, ed. — The Tervacota Army of the First Chinese Emperor Qin Sbibuang. Patis: ICOMOS, Monuments and Sites: IT, 2001. Vd. http://whe.unesco.org/pg.cfin?cid=318cid_ site=441 (03.10.2009). AA fase crua da pega, neste caso ainda plistiea, 21 Vd. hetp://www.antonygormley.com/sculpture/ item-view/id/245#p0 (05.09.2008). Asian Field foi constituida por 190,000 figuras de barro vermelho, do tamanho de uma mio, pro- duzidas por cerca 350 pessoas de idades variadas, entre 18 ¢ 22 de Janeiro de 2003 para uma drea de exposigio de cerca de 2000 m?, 22 Nao constituindo aqui nenhuma inovagio, antes perfilhando a larga corrente conceptual da arte contemporanea. SPENS, Michael — “Antony Gormley: Field for the British Isles”, in Studio International, 22.01.2003. _http://www.studio-international. co.uk/sculpture/gormley_a.asp (10.09.2008). SEARLE, Adrian — Field For the British Isles (pamphlet). London: Hayward Gallery, 1996. Embora esta limitagao tenha sido sucessivamente ultrapassada pela combinago das pastas préprias e dos meios mecinicos disponiveis — nomeada- mente pressio. Embora o mosteiro sea anterior, revestimento data do Sée. XVI, 567 28 KRAUSS, Rosalind —“Originality as Repetition: Introduction”. October 37, 1986 — The Originali- ty of Avant-Garde and Other Myths. Cambridge, ‘Mass.: MIT Press, 1994, p. 158. As variagdes de matérias-primas equivalentes, a composigo das pasta cerimicas ¢ dos vidrados, além das particularidades virias das cozeduras sio factores objectivos de variabilidade dos resultados. 30 PEREIRA, Joio Castel-Branco, (pref) — Manuel Cargaleiro — Azulgjas. Lisboa. Roche/ ‘Manuel Cargaleiro, 1998, p. 6-8. HENRIQUES, Paulo (Coord,) — Manuel Car galeivo- 7 Propostas para a Arquitectura, Lisboa: ‘Museu Nac. Azulejo, 2007, p.19 ess. Criando o dia e a noite, condicionando tempera tura e humidade, pressdes atmosféricas e atracges Junares que sao 0 meio fisico de desenvolvimento de todos 0s organismos. Vd. BARATTA, Gino — “Ritmo”, in Enciclopedia Einaudi, vol.11, ed. port. Lisboa: INCM, 1987, _"espago € tempo s6 existem como vividos na me- dida em que se tenham materializado num invs~ lucro ritmico,”— Leroi-Gouthan, Op. cit, p.117. hitp:/Avww.depts.ttu.edu/art/granados/ Va. (23.07.2008). Vad. http://www.ingridlilligren.com/portfolio/ findinghome.shtml (08.12.2008). ARMSTRONG, Kate — Crisis and Repetition East Lansing: Michigan State University Press, 2001, p. 8 Ibid, p.9. BIBLIA SAGRADA. Lisboa: Edigoes Paulistas, 1978 — MT 18, 21-22.

Você também pode gostar