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Principais Características do Sistema Tributário Nacional

1) Regressivo

Por que o sistema tributário brasileiro é considerado regressivo? Porque existe


forte impacto negativo dos impostos indiretos, aqueles embutidos no preço de
produtos e serviços, sobre a renda das populações mais pobres. Os mais pobres
pagam relativamente mais impostos que os mais ricos, pois, embora eles não
paguem Imposto de Renda (IR), ou paguem menos, as famílias mais pobres
consomem bens com alta carga de impostos indiretos, a exemplo do ICMS, que
incide sobre os produtos da cesta básica.

Em relação ao ICMS, recente estudo do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica


Aplicada) apurou que os trabalhadores mais pobres pagaram três vezes mais
imposto que os mais ricos, no período de 2002-2003. Enquanto os 10% mais
pobres do País desembolsaram 16% de sua renda com ICMS, os mais ricos
pagaram apenas 5,7%.

Peso dos Tributos na Renda da População, 2002-2003.


Impostos
População TOTAL Diretos Indiretos
TOTAL TOTAL ICMS
10% mais pobres 32,80% 3,70% 29,10% 16,00%
10% mais ricos 22,70% 12,00% 10,70% 5,70%
Fonte: IPEA (2008)
Nota: Impostos Diretos (renda e patrimônio) e Indiretos (consumo)

Ademais, a atual legislação tributária nacional define apenas duas faixas de IR


para pessoas físicas: 15% e 27,5%. Se o número de faixas de tributação de IR
fosse aumentado, os ricos pagariam proporcionalmente mais, com alíquotas
crescentes quanto mais alta fosse a renda. Desta forma, haveria correção de
injustiças na arrecadação e o aumento da progressividade da carga tributária
nacional.

2) Complexo, Superposto e Fragmentado


Outro aspecto importante é a simplificação. Nosso sistema tributário nacional é
complicado e pouco prático, com um grande número de tributos, taxas e
contribuições incidindo sobre a produção. Para se ter uma idéia, além do Imposto
Territorial Rural e do Imposto de Renda, incidem sobre o setor agropecuário
outros impostos indiretos: ICMS, IPI, IOF, Imposto de Importação, PIS/PASEP,
COFINS e contribuição previdenciária sobre o valor da produção.

De forma a ilustrar parte do impacto dessa tributação sobre o setor produtivo,


apresentamos no quadro a seguir um resumo das principais obrigações do
produtor rural, no exercício de sua atividade, pessoa física e jurídica, em relação
ao pagamento das contribuições fiscais.

Contribuição Social Previdenciária


Sobre o Valor Bruto da Comercialização da produção Rural (ex-FUNRURAL) INSS SENAR
Produtor Rural Pessoa Física (segurado especial) 2,10% 0,20%
Produtor Rural Pessoa Física (contribuinte individual) 2,10% 0,20%
Produtor Rural Pessoa Jurídica 2,60% 0,25%
Outras Contribuições Previdenciárias
Produtor Rural Pessoa Física (contribuinte individual)
Recolhimento próprio sobre o salário-contribuição declarado para fins de aposentadoria (carnê)
Retenção e recolhimento da contribuição do segurado empregado
Recolhimento da alíquota de 2,7% de Terceiros (salário-educação e INCRA) sobre a folha de pagamento
Recolhimento de 20% sobre a contratação de contribuinte indivual (autônomo)
Retenção e recolhimento de 11% quando da contratação de empresa de mão-de-obra
Recolhimento de 15% sobre o valor da nota Fiscal relativa à contratação de cooperativa de trabalho
OBS: Segurado especial é aquele que exerce em regime de economia familiar atividade rural, sem empregado
Contribuinte indicidual é o produtor rural, com empregados
Demais Contribuições Fiscais
Sobre o Faturamento mensal (não incide no caso de pessoa física) PIS/PASEP COFINS
Pessoa Jurídica (Incidência não-cumulativa) 1,65% 7,60%
OBS: A pessoa jurídica submetida à incidência não-cumulativa poderá descontar créditos
Contribuição sobre o Lucro Líquido
Sobre o resultado ajustado, presumido ou arbitrado CSLL
Pessoa Jurídica 9%
Fonte: Receita Federal do Brasil e Previdência Social

Dos impostos citados, o ICMS, sem dúvida, é o que apresenta a maior


participação sobre os preços finais dos produtos agropecuários, constituindo-se na
principal fonte de arrecadação de recursos financeiros do Estado. Em 2007, o
valor arrecadado com o ICMS atingiu R$ 61,5 bilhões, em São Paulo, cerca de
64% da receita tributária anual do Estado.
Receita tributária anual do Estado de São Paulo
RECEITAS 2007 2006 2005 2004
Receitas Correntes 92.275.644.134,75 82.078.569.162,03 73.870.648.069,75 64.789.056.201,53
Receita Tributária 71.538.997.386,05 63.419.902.854,59 57.066.142.762,12 51.192.595.119,75
Impostos 68.744.284.265,26 61.019.728.890,10 55.010.035.696,70 49.506.514.793,41
Patrimônio e Renda 7.201.393.215,18 5.994.226.767,75 5.021.414.057,82 4.283.436.046,96
IPVA 6.695.767.170,29 5.558.687.517,40 4.672.047.339,84 3.947.300.190,94
C.MORTIS E DOACAO BENS 505.626.044,89 435.539.250,35 349.366.717,98 336.135.856,02
Produção e Circulação 61.542.891.050,08 55.025.502.122,35 49.988.621.638,88 45.223.078.746,45
ICMS 61.542.891.050,08 55.025.502.122,35 49.988.621.638,88 45.223.078.746,45
Taxas 2.794.709.332,82 2.400.170.340,91 2.056.094.947,18 1.686.080.011,52
Condições de Melhorias 3.787,97 3.623,58 12.118,24 314,82
Receitas de Capital 306.575.283,63 2.355.687.572,82 2.239.362.905,88 983.859.230,10
Receitas Correntes Intra-Orçamentárias 3.252.460.403,56 - - -
Receitas de Capital Intra-Orçamentárias 401.865.667,87 - - -
TOTAL 96.236.545.489,81 84.434.256.734,85 76.110.010.975,63 65.772.915.431,63
Fonte: Relatório de Execução Orçamentária da SEFAZ/SP

Na maioria dos casos, em São Paulo, o ICMS embutido no preço dos produtos
corresponde ao percentual de 18%. Para certos alimentos básicos, incluídos na
cesta básica, como arroz, feijão, carnes e leites, o ICMS cobrado é de 7%. Em se
tratando de produtos supérfluos como cigarros, cosméticos e perfumes, cobra-se o
percentual de 25%.

No tocante à tributação dos produtos da cesta básica, salientamos, mais uma vez,
o maior comprometimento da renda dos mais pobres com os gastos de
alimentação. Conforme estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário
(IBPT), em 2004, o percentual de tributos incidentes sobre o preço final de
produtos agropecuários selecionados atingiu, na maioria das análises, valores
superiores a 18%. No caso do açúcar e do café, observou-se valores extremos,
atingindo 40,50% e 36,25%, respectivamente.

Percentual de Tributos sobre o Preço Final dos Produtos – Produtos selecionados


Produtos % Tributação sobre Preço Final
Açúcar 40,50%
Arroz 18,00%
Café 36,52%
Carne Bovina 18,67%
Feijão 18,00%
Frango 17,91%
Frutas 22,98%
Leite 19,24%
Ovos 21,79%
Peixe 18,02%
Fonte: Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário - IBPT (2004)
Destacamos que para obter o percentual de carga tributária total incidente sobre o
preço final de venda, o estudo levou em consideração a tributação em três bases
de incidência, com o cálculo dos seguintes tributos: i) tributação sobre as vendas -
ICMS, IPI, PIS/PASEP e COFINS no regime não-cumulativo; ii) tributação sobre
os custos e despesas – INSS, FGTS e CPMF; e iii) tributação sobre o lucro - IRPJ
e CSLL.

Pelo lado do produtor rural, o diferimento que o Fisco paulista concede na


comercialização não significa, necessariamente, uma desoneração tributária.
Como o poder de negociação dos produtores junto às indústrias é pequeno e o
valor do imposto é considerado como um item na estrutura de custos desses
agentes, na prática, a indústria desconta do valor da mercadoria, adquirida dos
produtores, todas as despesas e tributos previstos nas operações subsequentes.

A unificação da legislação do ICMS e o combate a guerra fiscal entre os Estados


também se fazem necessários a fim de evitar a concessão de benefícios fiscais
que distorcem custos de produção, criam desvios de comércio e alteram
sensivelmente as relações econômicas. A preocupação é tão evidente que a
própria Secretaria da Fazenda de São Paulo, por meio do Comunicado CAT-
36/04, listou os benefícios fiscais concedidos pelos demais Estados, não
autorizados por convênio, portanto, ilegais e não reconhecidos por São Paulo.

Mas os benefícios persistem, tanto que, recentemente apuramos que outras


Unidades da Federação têm estimulado o desenvolvimento da aqüicultura (criação
de peixes, moluscos, crustáceos, quelônios, répteis e plantas aquáticas) em seus
territórios, por intermédio da concessão de benefícios fiscais, a exemplo da Lei nº
8.684, de 20.07.2007, do Estado de Mato Grosso, que isentou às operações de
comercialização e de industrialização, internas e interestaduais, com peixes, suas
carnes e demais partes in natura.

Como em São Paulo, com exceção da isenção concedida as vendas de moluscos


e pós-larva de camarão, em estado natural, as demais operações com pescados,
moluscos e crustáceos são tributadas, o produtor e a indústria paulista certamente
perderão competitividade frente ao incentivo fiscal concedido pelo Mato Grosso,
caso a SEFAZ/SP não viabilize ações para resguardar e fortalecer a cadeia
produtiva paulista.
ICMS incidente sobre pescados, moluscos e crustáceos, em São Paulo.
Segmento Em Estado Natural Processado
Pescados 7% 12%
Moluscos Isento 12%
Crustáceos 18% 12%
Pós-larva Camarão Isento 12%
Fonte: Regulamento do ICMS de cada Estado e Consultoria Tributária IOB Thomson.

Em relação à tributação federal do PIS/PASEP e COFINS, embora as recentes


alterações na legislação tenham tido por objetivo evitar a cumulatividade das
contribuições e diminuir a carga tributária, atingi-los tem sido uma meta difícil
frente à calibragem das alíquotas que foram fixadas e das distorções identificadas
em algumas cadeias produtivas do agronegócio, no que se refere ao
aproveitamento do crédito presumido. Em 2004, o IPEA já apontava que as
alterações iriam produzir um aumento de 0,8% na carga tributária nacional.

Como exemplo prático de distorção, temos as rações, concentrados e


suplementos minerais utilizados na alimentação animal, que não foram
contemplados pela isenção, em relação ao PIS/COFINS, estabelecendo uma
disparidade entre produtores integrados e não integrados. Como criadores de
frango e suínos não-integrados (independentes) adquirem sua própria ração no
mercado, ao invés de obtê-la da integradora, eles assumem um ônus maior em
relação aos integrados, pois não têm como recuperar o valor do PIS/COFINS
pagos na compra desse insumo.

A pecuária de corte é um outro exemplo, pois, apesar de ter uma dependência


menor sobre a utilização de rações, a atividade é também intensiva no uso de
suplementação mineral. Somente o sal mineral responde por 15% do custo total
de produção. Estudos da CNA comprovam o substancial peso do custo com
rações na formação do custo operacional das atividades animais. Na suinocultura
este valor representa 75% dos custos envolvidos na criação, não tão distante dos
73% na avicultura, enquanto que, na pecuária leiteira as rações e suplementos
representam 42,3% do custo de produção. Em suma, é imediato e quase que
proporcional à elevação das alíquotas do PIS/COFINS, o aumento do custo de
produção de carnes e leite e, por conseguinte, o repasse de preços aos
consumidores.
3) Não Seletivo

Conforme relatos anteriores, a carga tributária incidente sobre os alimentos é


elevada, o que demonstra falta de seletividade tributária em função da
essencialidade de bens e serviços. Até chegar ao consumidor, o preço do alimento
é onerado pelos tributos que incidem sobre insumos agropecuários, o maquinário
agrícola, a terra, a mão-de-obra, a renda do produtor, a comercialização, a
produção industrial, a movimentação financeira e o lucro.

E quem acaba por sentir mais intensamente o impacto desse custo sobre sua
renda são as famílias de baixa renda. Considerando o trabalho do IBGE sobre a
distribuição das classes de rendimento mensal das famílias brasileiras (PNAD),
conclui-se que 86,3% das pessoas têm renda de até 3 salários mínimos. Fazendo
uma ponderação em relação aos gastos com alimentos, pode-se afirmar que, em
média, a população brasileira gasta 38,3% dos seus rendimentos com o grupo
alimentação.

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