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Filosofia de Educação 2022 1

Apontamentos de Filosofia
 Objecto, Método da Filosofia,
 Etimologicamente, isto é, indo à origem da palavra,  "Filosofia" significa: amor à Sabedoria.
  Consiste numa investigação racional sobre a totalidade do real, com o propósito  de encontrar a sua
explicação última.
  Nascida na Grécia no século VIº A.C.,  aspira ao conhecimento dos princípios imutáveis que presidem
aos fenómenos transitórios.
 É uma actividade dogmática e sistemática nalgumas áreas, como na Lógica Formal.
 A radical imperfeição do saber humano obriga porém a Filosofia a ser mais interrogativa noutros
domínios, como na Teoria do Conhecimento.
 A contemplação da harmonia expressa no Universo induz o homem à admiração e eclode o filosofar.
  A Filosofia é assim a ciência da totalidade das coisas pelas suas causas últimas e adquirida pela luz da
razão.

Os restantes Textos incidem sobre as Divisões ou Partes fundamentais da Filosofia.


Texto 2
Conhecer o Ser

 A Filosofia da Realidade comporta  a Metafísica Geral e a Metafísica Especial.


 A Metafísica Geral ou Ontologia é o núcleo da Filosofia. Tem por objecto o Ser em si, as suas
propriedade e os modos pelos quais este se manifesta.
 Essa é a Filosofia Primeira, tida por Aristóteles como a ciência dos primeiros princípios.
 Trata-se de um conhecimento geral e abstracto que se ocupa da essência dos seres.
 O que são as coisas em si mesmas,  apesar das aparências que possam assumir e das mudanças
acidentais que nelas possam ocorrer?
 A Ontologia estuda portanto a substância dos entes: a sua realidade íntima, verdadeira e permanente.
O objecto da Metafísica Especial é tripartido: debruça-se sobre o mundo, a alma e Deus.

Exponho a seguir cada uma destas partes.


 A Cosmologia Racional versa sobre o Universo. Já os Pré-Socráticos se dedicavam à Física,  estudo da
Natureza (do Grego "Physis").
 A Psicologia Filosófica ocupa-se da origem, da natureza e do destino da alma do homem.

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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 Princípio da vida e do movimento corpóreo, a alma humana é imortal e indecomponível. Constitui a


sede do "eu" pensante e livre.
 A Teologia Natural, tendo Deus por objecto, serve-se apenas da razão e da experiência.
 Labor puramente filosófico, a Teodiceia distingue-se da Teologia Revelada por não recorrer às luzes da
Fé.
Introdução ao Estudo da Filosofia da Educação
Educação, Ensino e Aprendizagem

Pode haver ensino sem que haja educação? Pode haver aprendizagem sem que haja educação? Para
respondermos a essas perguntas é necessário que investigue o conceito de educação.

Uma investigação exaustiva, que descreva e analise os vários conceitos de educação existentes em nossa
cultura, ou em outras culturas, distantes de nós no tempo ou no espaço, não é possível dentro do escopo do
presente trabalho. Os conceitos são tantos, e tão variados, que somente poderíamos discuti-los com algum
proveito dentro de um livro dedicado especialmente ao assunto. A alternativa que nos resta é a de propor uma
caracterização do conceito de educação que seja suficientemente ampla, que faça sentido e seja justificável. A
partir dessa caracterização tentaremos responder às perguntas formuladas no parágrafo anterior, bem como às
suas correlatas: Pode haver educação sem que haja ensino? Pode haver educação sem que haja aprendizagem?

O Conceito de Educação

Entendemos por "educação" o processo através do qual indivíduos adquirem domínio e compreensão de certos
conteúdos considerados valiosos.

Vamos esclarecer o sentido dos principais termos dessa proposta de definição, pois sem esse esclarecimento a
proposta fica muito vaga.

Conteúdos: o termo "conteúdo" tem sentido bastante amplo, podendo designar coisas as mais variadas.
Quando falamos em conteúdos, no contexto educacional, temos em mente não só conteúdos estritamente
intelectuais ou cognitivos, mas todo e qualquer tipo de habilidade, cognitiva ou não, atitudes, etc. Note-se,
porém, que na nossa proposta de definição o termo "conteúdos" está qualificado (falamos em "certos conteúdos
considerados valiosos"), facto que já é indicativo de uma certa restrição no tocante aos conteúdos que podem ser
objecto do processo educacional. Mas falaremos sobre isto mais adiante. Aqui é suficiente indicar que quando
falamos de conteúdos estamos nos referindo a coisas tão diferentes umas das outras como geometria euclidiana,

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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teoria da relatividade, habilidade de extrair a raiz quadrada ou calcular a área do círculo, habilidade de amarrar
os sapatos, de mexer as orelhas sem mover outros músculos da face, atitude positiva para com a vida, a morte,
para com os outros, etc.

Adquirir domínio: Estamos usando a expressão "adquirir domínio" como basicamente equivalente ao termo
"aprender". Adquirir domínio de um dado conteúdo é, portanto, aprendê-lo, no sentido mais amplo do termo.
Neste sentido, alguém adquiriu domínio da habilidade de calcular a área de um círculo quando aprendeu e é
capaz de ("sabe") calcular a área de qualquer círculo que lhe seja apresentado.

Adquirir compreensão: Em nossa proposta de definição dissemos que a educação é o processo através do qual
indivíduos adquirem domínio e compreensão de certos conteúdos considerados valiosos. Nossa intenção ao
acrescentar "e compreensão" não foi a de simplesmente dar maior ênfase. Cremos que algo diferente e muito
importante foi acrescentado à definição com a inclusão dessas duas palavras. Para que um processo seja
caracterizado como educacional não basta que através destes indivíduos venham a dominar certos conteúdos: é
necessário que esse domínio envolva uma compreensão dos conteúdos em questão.

Uma coisa é saber que a fórmula para calcular a área de um círculo é P r 2 e mesmo ser capaz de aplicá-la. Outra
coisa é compreender porque é que se utiliza essa fórmula para calcular a área de um círculo. Uma coisa é saber
que não se deve tirar a vida de uma outra pessoa. Outra coisa é compreender porque é que não se deve fazer
isso. Uma coisa é assimilar, pura e simplesmente, os valores de uma dada cultura. Outra coisa é aceitá-los,
criteriosamente, após exame que leve à compreensão de sua razão de ser. Quando falamos em educação não
estamos falando simplesmente em socialização ou aculturação, por exemplo. O processo de assimilação de
normas sociais e de valores culturais pode ou não ser educacional: se essas normas e esses valores são
simplesmente incorporados pelo indivíduo, ou inculcados nele, sem que ele compreenda sua razão de ser, o
processo é de mera socialização ou aculturação, não havendo educação. Para que haja educação é necessário
que o indivíduo, além de dominar certos conteúdos, que no caso são normas sociais e valores culturais, venha a
compreendê-los, venha a entender sua razão de ser, venha a aceitá-los somente após investigação criteriosa que
abranja não só as normas e os valores em questão, mas também possíveis alternativas.

Conteúdos considerados valiosos: Esta expressão talvez seja a mais problemática na proposta de definição feita
por nós. O domínio, mesmo com compreensão, de certos conteúdos não é parte integrante de um processo
educacional se os conteúdos em questão são considerados perniciosos ou sem valor algum. O domínio da
habilidade de mexer as orelhas sem mover outros músculos da face não é, em nossa cultura, parte integrante do
processo de educação dos indivíduos. O valor dessa habilidade é considerado virtualmente nulo. O
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desenvolvimento de uma atitude positiva, de aceitação, de relações sexuais entre irmãos também não é, em
nossa cultura, parte integrante do processo de educação dos indivíduos, pois essa atitude é vista como
perniciosa. Há, portanto, uma importante restrição no tocante aos conteúdos que podem ser objecto do processo
educacional, como mencionamos atrás, e essa restrição diz respeito ao valor que se atribui a esses conteúdos,
em determinados contextos. Essa introdução de um elemento valorativo na definição de educação limita os
conteúdos que podem ser parte integrante do processo educacional. Ao mesmo tempo que faz isso, essa
referência ao valor dos conteúdos coloca a educação dentro da problemática maior do chamado relativismo,
pois o que é tido como valioso em uma dada cultura pode não ser assim considerado em outra, e vice-versa. Foi
por isso que tivemos o cuidado de dizer "conteúdos considerados valiosos", e não simplesmente "conteúdos
valiosos", pois ao optar pela segunda possibilidade estaríamos nos comprometendo com um dos lados de uma
controvérsia que está longe de ser resolvida.

É perfeitamente concebível que a habilidade de mexer as orelhas sem mover outros músculos da face seja
considerada valiosa em algumas culturas, como é claramente possível que o desenvolvimento de uma atitude
positiva para com o incesto entre irmãos seja considerado valioso em outras culturas. Se isso é verdade, então o
domínio daquela habilidade e o desenvolvimento desta atitude seriam parte integrante do processo educacional
nessas culturas, do mesmo modo que não o são na nossa. É possível, para citar outro exemplo, que o
desenvolvimento de uma atitude crítica para com as opiniões de outras pessoas, incluindo-se aí os mais velhos,
ou aqueles em posição de autoridade, seja considerado algo indesejável em algumas culturas e algo altamente
valioso em outras.

Se este for o caso, o desenvolvimento dessa atitude não será parte integrante do processo educacional nas
primeiras culturas e o será nas outras. E assim por diante. Não nos compete aqui discutir a questão da
objectividade ou não dos valores, embora este seja um tópico fascinante. Também não entraremos na
complicada questão que é colocada pela coexistência de valores conflituantes dentro de uma mesma cultura
(concebendo-se o termo "cultura" aqui em um sentido bastante amplo): em caso de conflito, deverão ter
prioridade e prevalecer os valores de quem? Os dos pais do educando? Os dos professores? Os dos
governantes? Os da igreja? Ou os do próprio educando?

Tendo em mente essa caracterização do conceito de educação, retomemos as perguntas formulados no início
desta secção: Pode haver ensino sem que haja educação? Pode haver aprendizagem sem que haja educação?

Pode Haver Ensino e Aprendizagem sem que Haja Educação?

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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Parece óbvio que, se a educação é o processo através do qual indivíduos adquirem domínio e compreensão de
certos conteúdos considerados valiosos, naturalmente pode haver ensino e aprendizagem sem que haja
educação, ou seja, ensino e aprendizagem não-educacionais. Basta que as condições estipuladas na
caracterização do conceito de educação não sejam cumpridas, para que o ensino e a aprendizagem deixem de
cumprir função educacional.

Já observamos atrás que o domínio de habilidades às quais não se atribui valor, ou o desenvolvimento de
atitudes consideradas perniciosas, em um dado contexto, não são partes integrantes do processo educacional,
dentro daquele contexto. Em uma cultura semelhante à nossa, por exemplo, o facto de um indivíduo aprender a
mexer as orelhas sem mover outros músculos da face, ou de desenvolver uma atitude de aceitação ou tolerância
para com relações sexuais entre irmãos, não é visto como uma contribuição para o seu processo educacional.
Consequentemente, se alguém ensina a uma outra pessoa aquela habilidade ou esta atitude, esse ensino estará se
realizando fora do contexto educacional, pois esses conteúdos não são considerados valiosos em nossa cultura.
Igualmente, ensinar a alguém a arte (ou técnica) de arrombar cofres-fortes, ou de bater carteiras, ou de mentir
com perfeição, não é contribuir para sua educação, em um contexto cultural em que esses conteúdos não são
considerados valiosos, como, queremos crer, seja aquele em que vivemos.

Pode haver, portanto, ensino e aprendizagem sem que haja educação, quando os conteúdos ensinados e
aprendidos não são considerados valiosos.

Contudo, mesmo o ensino e a aprendizagem de conteúdos considerados valiosos podem ser não-educacionais
se, por exemplo, levam ao domínio sem compreensão (no sentido ilustrado) desses conteúdos. Alguém que
aceita normas sociais e valores culturais sem examinar e compreender sua razão de ser, sem dúvida aprendeu
um certo conteúdo (possivelmente até através do ensino), mas o fez sem compreensão: a aprendizagem, neste
caso, foi não-educacional, e se a aprendizagem foi decorrência de um ensino que estava interessado apenas na
aceitação das normas e dos valores, e não na sua compreensão, o ensino também foi não-educacional (tendo
sido, possivelmente, doutrinacional). O chamado condicionamento, na medida em que produz um certo tipo de
comportamento que não é acompanhado de compreensão, não pode ter lugar dentro de um processo
educacional.

Quer nos parecer, pois, que não resta a menor dúvida de que o ensino e a aprendizagem podem ser não-
educacionais, ou porque os conteúdos ensinados e/ou aprendidos não são considerados valiosos ou porque
levam ao domínio sem compreensão. É por isso que se pode criticar o ensino que insiste na mera memorização
ou a aprendizagem puramente mecânica, automática, não-significativa. O ensino e a aprendizagem, nesses
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casos, não estão contribuindo para a educação do indivíduo, mesmo que os conteúdos ensinados e aprendidos
sejam considerados valiosos, porque não estão levando o indivíduo a compreender esses conteúdos.

Da mesma maneira, perece-nos bastante impróprio falar em educação de animais, por exemplo, embora não
reste dúvida de que animais possam aprender, frequentemente em decorrência de actividades de ensino. Muitos
animais são perfeitamente capazes de dominar habilidades às vezes bastante complexas. É difícil imaginar,
porém, que esse domínio seja acompanhado de compreensão (no sentido visto). Não o sendo, é impróprio
afirmar que foram educados: parece ser bem mais correcto dizer que foram meramente treinados, ou talvez,
condicionados.

De igual maneira, o ensino e a aprendizagem de conteúdos que consistam de enunciados falsos, ou de


enunciados que a melhor evidência disponível indique terem pouca probabilidade de serem verdadeiros (e,
consequentemente, grande probabilidade de serem falsos), ou, talvez, de enunciados acerca dos quais a
evidência, favorável ou contrária, seja inconclusiva, não devem ser parte integrante do processo educacional,
pois quer nos parecer que em nossa cultura não seja considerado valioso um conteúdo que consista de
enunciados falsos, ou contrários à melhor evidência disponível, ou acerca dos quais a evidência seja
inconclusiva. O ensino de conteúdos deste tipo parece bem mais próximo da doutrinação do que da educação.
Devemos ressaltar, para evitar mal-entendidos, que ensinar que um dado enunciado, ou conjunto de enunciados,
é falso ou não-evidenciado é afirmar algo verdadeiro, se os enunciados em questão forem realmente falsos ou
não-evidenciados, e se constitui, portanto, em uma actividade que pode, legitimamente, ser parte integrante do
processo educacional. O que não pode ser visto como educacional é o ensino (e a aprendizagem) de enunciados
falsos ou não-evidenciados como sendo verdadeiros ou evidenciados.

Filosofia de Educação

A filosofia da educação é um ramo do pensamento que se dedica à reflexão sobre os processos educativos, à
análise do(s) sistema(s) educativo(s), sistematização de métodos didácticos, entre diversas outras temáticas
relacionadas com a pedagogia. O seu escopo principal é a compreensão das relações entre o fenómeno
educativo e o funcionamento da sociedade.

A educação sempre foi, ao longo da história, e ainda hoje o continua a ser, objecto de preocupação do homem.
Tanto maior é essa preocupação do homem pela educação quanto mais agudo é o seu sentimento de viver um
tempo crítico, um período histórico de crise. Nestes momentos críticos, em que a incerteza, o atordoamento e a
angústia estão presentes e em que desejamos escapar à ansiedade, pode dizer-se que o homem, antes de estar

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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ocupado já está pré-ocupado com o(s) objecto(s) da(s) sua(s) inquietações, neste caso, a educação. E esse
objecto -a educação foi primeiro tratado filosoficamente e só depois cientificamente. Continuam a ser estas,
hoje, as grandes abordagens de que a educação é alvo: Filosofia e Ciência.

Como se sabe, historicamente, a abordagem filosófica antecedeu a abordagem científica. E a Filosofia ocupou-
se, então, (e também), logo nas suas origens, da educação. E isso porque a filosofia quer responder a todas as
grandes questões que perturbam, espantam, afligem e torturam o homem: Que é o ser? E porque há o ser e não o
nada? Que é a vida? E a morte? Que é o homem? Que é conhecer? E quem pode negar que a educação não é
uma dessas grandes questões, uma dessas colossais questões? De facto, quem pode negar que a educação não é
uma paixão? Um pathos, algo que sofremos, quer queiramos quer não, um inelutável destino? Pensar nela é
pensar em nós, é pensar no homem, no que somos, no que nos tornamos, no que podemos ser.

Por isso, no seu primeiro momento de maturidade, a filosofia tomou como objecto de eleição, precisamente, a
educação. Eis Sócrates, cujo problema crucial é o problema educativo 3 e cuja missão divina é a de educar,
assim ele o confessa. Mas, para Sócrates, pensar a educação é pensar o homem. Ou pensar o homem é pensar a
educação. Indissoluvelmente, homem e educação estão intrínseca e umbilicalmente ligados. Não é possível
pensar um sem o outro.

A educação é, portanto, a grande paixão do homem. E o homem a grande paixão da educação. O homem cria a
educação mas esta, por sua vez, cria o homem (ou não fosse este um dos sentidos etimológicos da palavra). E
toda a prática educativa remete para uma concepção de homem que, implícita ou explicitamente, consciente ou
inconscientemente, lhe é imanente, a move e a regula.

TAREFAS DA FILOSOFIA DE EDUCAÇÃO

A tarefa do educador, e quiçá do filósofo da educação, não termine com a análise e clarificação dos conceitos
educacionais básicos e das pressuposições que sustentam a actividade educacional. A tarefa clarificatória da
filosofia é apenas um preâmbulo à tarefa mais normativa de examinar, questionar, e propor objectivos e valores.
À filosofia da educação como aqui caracterizada deve, portanto, seguir uma teoria da educação que tenha como
principal tarefa o exame dos princípios básicos, objectivos, valores, etc., que prevalecem em nossa cultura e que
norteiam, actualmente, a educação em nosso país, a reflexão crítica sobre eles e sobre a realidade social,
económica e cultural que envolve o processo educacional, e, se necessário for (e quase sempre o é), a proposta
de novos princípios básicos, objectivos e valores para a nossa cultura e para a nossa educação.

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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A teoria educacional, embora possa (e talvez deva) ser considerada científica, tem uma finalidade que vai além
da mera explicação e interpretação da realidade educacional: ela procura orientar e guiar a prática
educacional. É por isso que a teoria da educação, além de estudar e examinar a realidade educacional, tem a
função de criticar esta realidade e de propor novas direcções a seguir. A teoria da educação, para usar uma
expressão que se torna comum, não tem como tarefa simplesmente constatar qual é a realidade educacional: ela
vai além e contesta esta realidade, não em função de um espírito puramente negativista, mas em função de uma
proposta de realidade diferente. E esta proposta envolve, inevitavelmente, valores diferentes. Portanto, a teoria
educacional, em sua tarefa de orientar e guiar a prática educacional, envolve, necessariamente, um ingrediente
de valores.

OBJECTO DA FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO

A filosofia da educação, como aqui caracterizada, é uma actividade reflexiva de segunda ordem, que tem como
objecto as reflexões de primeira ordem feitas sobre os vários aspectos do processo educacional; a teoria
educacional é uma actividade reflexiva de primeira ordem, no nosso entender, que tem por objecto básico a
realidade educacional e não reflexões que tenham sido feitas sobre esta realidade; estas reflexões servirão de
subsídios ao teórico da educação para que este elabore suas próprias conclusões, mas ele tem, basicamente, que
"debruçar-se sobre a realidade educacional", para entendê-la, explicá-la, criticá-la e propor sua reformulação.

Na medida em que a teoria educacional tem que se valer das contribuições das várias ciências que estudam a
educação, ela extrapola os domínios da filosofia e, consequentemente, da filosofia da educação. A filosofia da
educação, como aqui concebida, deveria ser vista, como observamos, como um prolegómenos, um preâmbulo à
teoria educacional, cuja tarefa principal seria fornecer ao teórico da educação os instrumentos conceituais
básicos para a sua teoria.

A IMPORTÂNCIA E A CONTRIBUIÇÃO DA FILOSOFIA PARA A EDUCAÇÃO

Acredita-se que a Filosofia leva ao trabalho de pensar, reflectir, raciocinar e, assim, despertar o senso crítico e,
consequentemente, auxiliar a construir uma nova visão de sociedade, onde se pressupõe que a educação é a
principal responsável pelas transformações da mesma. Desse modo, este trabalho visa pesquisar e compreender
a importância e a contribuição da filosofia para a educação. Mais especificamente, consistem em apontar as
características do pensamento filosófico, os principais filósofos que contribuíram para os fundamentos da
Educação e ainda, relatar a importância do ensino da Filosofia na escola.

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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Filosofia da Educação cumpre um papel fundamental dentro da escola, enquanto detentora do processo
educativo. A filosofia da educação propõe um movimento de auto-reflexão, isto é, uma postura reflectida da
educação, onde a educação não se deve desvincular da realidade, mas se propõe a buscar seus fundamentos na
praxis.

Assim, a educação se auto-avalia e é avaliada a partir de uma filosofia da educação. Esta auto-avaliação preveja
todos os espaços próprios do mundo educacional e apresenta sugestões à optimização da educação enquanto
processo de tomada de consciência e transformador do mundo. A filosofia instiga um olhar crítico, nesse caso o
foco deste olhar é a educação. Quando a crítica da filosofia é avaliada pela educação, surge a possibilidade de
construção de um projecto educativo com bases mais sólidas.

Estas bases são dadas pelo confronto que filosofia propõe, atraindo a vida ordinária para a escola. Quando são
estreitados os laços entre a vida ordinária e a escola, irrompe a possibilidade da produção de um conhecimento
válido e útil. Uma escola sem crítica e sem auto-avaliação tende a afastar-se da vida, com isso aparece a
produção de um conhecimento obsoleto e sem sentido prático, ou seja, surge um conhecimento para ninguém,
conhecimento que enche livros, mas que não transforma o mundo nem se abre para a conscientização.

AXIOLOGIA

A Axiologia é uma parte importante do estudo filosófico. Axiologia pode ser denominada como Teoria dos
Valores, pois, o sentido do termo axiologia indica, etimologicamente, o estudo que se ocupa com a consideração
dos aspectos valorativos.

Toda filosofia é a busca da compreensão de certas respostas em relação aos problemas fundamentais suscitados
pela experiência humana, isto é, qualquer estudo filosófico se apresenta como verificação de certas respostas, ou
ainda, se estas resolvem estas questões que são propostas de modo problemático. Neste sentido, é possível dizer
que cada experiência é consequência de um juízo de valor. O juízo de valor é prévio em relação à acção
individual, pois, estabelece um modo de encarar as coisas que não só antecede, mas determina um modo de agir.
Os juízos de valor são constitutivos da estrutura cognitiva e resultam directamente, como parte integrante,
naquilo que denominamos como experiência. E isto, desde a mais tenra infância na vivência individual.

Assim sendo, a valoração é, na verdade, um acto subjectivo de valorar. Subjectivo é o que se refere ao sujeito
que pensa, questiona, sente, imagina, compara, quer, ou ainda, o sujeito que escolhe uma opção mediante sua
própria condição. Valorar é conferir valor, seja a alguém, a uma situação ou mesmo a uma idéia (trata-se de
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buscar o motivo do valor ou de sua ausência). O acto de valorar é determinante no modo como cada indivíduo
observa o mundo, e, por isto mesmo, tal acto está directamente relacionado com as próprias escolhas de vida
que uma pessoa pode ter. O vocábulo valorar não é o mesmo que valorizar, pois, este sugere uma associação da
ideia do valor com um sentido materialista.

A tematização da noção de liberdade, a partir da referência com a Axiologia, indica que tal discussão confere
humanidade às nossas acções. Por esta razão, a Axiologia pode ser tematizada propriamente como Teoria dos
Valores. A abordagem de tais aspectos pode ser desenvolvida em dois sentidos, a saber, no sentido moral e no
sentido ético. Portanto, ao mencionarmos as palavras ‘ética’ ou ‘moral’, já estamos tentando compreender, de
modo axiológico, ou melhor, de modo valorativo as ações humanas. Examinar alguma consideração valorativa,
indica falar em termos de busca do significado.

Contudo, se um indivíduo observa a lei e as regras (que, supõe-se, pretendem uma validade universal), e
procura respeitar este limite, temos uma conduta baseada na ética. Kant enunciou a ‘regra de ouro’ da ética do
seguinte modo: “Age de tal modo que a sua vontade possa valer sempre ao mesmo tempo como princípio de
uma legislação universal”. Basicamente, as acções morais são motivadas por interesses individuais, enquanto as
acções éticas se orientam por questões que apelam para compreensão de razões em comum. Em relação à ética,
não se trata exactamente de um respeito forçado ou condicionado, pois, para ser ético, um indivíduo precisa,
antes, compreender o significado da regra, aceitar isto por sua própria vontade e reconhecer a importância da
ética para o bom funcionamento da convivência em sociedade.

Do ponto de vista ético, as acções humanas só possuem valor quando representam autenticamente o que uma
pessoa aceita como um valor seu. A internalização da regra ética pressupõe a aceitação da mesma por meio da
livre vontade do sujeito. A aceitação, por parte do sujeito, do argumento em prol da ética, deveria ser através de
um convencimento das razões que sustentam a petição por uma acção ética.

O PENSAMENTO FILOSÓFICO NA ANTIGUIDADE GREGA

Esparta e Atenas

Esparta e Atenas, ao mesmo que foram as principais cidades gregas, formaram uma das maiores antíteses da
Idade Antiga. As duas cidades eram totalmente diferentes: a maneira de fazer política, a importância da guerra,
das artes, da cultura, a mentalidade, etc.

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Esparta fora uma cidade fundada pelos dórios durante o século IX a.C, totalmente diferente de todas as cidades
da época. Na verdade, Esparta parecia mais um acampamento militar do que uma cidade. Essa era a principal
característica dos espartanos: o seu carácter essencialmente militar.

Para se ter uma ideia, os espartanos eram educados segundo uma rigorosa disciplina; o objectivo da educação
espartana era transformar seus cidadãos em guerreiros fortes, obedientes e competentes.

Diferentemente de Esparta, que focava na guerra, Atenas valorizava a educação de seu povo. Isso fez com que a
cidade tenha se transformado no centro cultural e intelectual do Ocidente. É em Atenas que surge a filosofia e a
democracia, ou seja, a cidade foi o berço do Mundo Ocidental.

A educação espartana 

A educação dos espartanos visava a fazer de cada indivíduo um soldado. O recém-nascido que apresentasse
defeito para a vida militar era morto por ordem do Estado. Quando os meninos alcançavam os setes anos de
idade, tornavam-se recrutas e passavam a fazer parte de uma pequena tropa que, sob as ordens de um monitor,
praticavam diariamente exercícios atléticos e ginástica. Aos vinte anos, o jovem ingressava no exército, aos
trinta, podia casar-se e participar da Ápela. A vida militar só findava quando o homem espartano chegava aos
60 anos de idade. Todos, mesmo os monarcas, antes dessa idade, eram obrigados a tomar parte nos exércitos
militares, que, periodicamente, se levavam a efeito em tempos de paz.

A educação espartana, que recebia o nome técnico de agogê, apresentava as particularidades de estar
concentrada nas mãos do Estado e de ser uma responsabilidade obrigatória do governo. Estava orientada para a
intervenção na guerra e a manutenção da segurança da cidade, sendo particularmente valorizada a preparação
física que visava fazer dos jovens bons soldados e incutir um sentimento patriótico. Nesse treinamento
educacional eram muito importantes os treinamentos físicos, como salto, corrida, natação, lançamento de disco
e dardo. Nos treinamentos de batalha, as meninas se dedicavam ao arco e flecha. Já os meninos eram
especialistas em combate corporal, assim como em tácticas defensivas e ofensivas.

Desde o nascimento até à morte


De acordo com Plutarco (50-120 d.C.), quando nascia uma criança espartana, pendurava-se na porta da casa um
ramo de oliveira (se fosse um menino) ou uma fita de lã (se nascesse uma menina). Havia rituais privados de
purificação e reconhecimento da criança pelo pai, além de uma festa de nascimento conhecida como genetlia, na

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qual o recém-nascido recebia um nome e presentes de parentes e amigos. (Cf. Maria Beatriz B. Florenzano.
Nascer, viver e morrer na Grécia antiga).

Desde o nascimento até à morte, o espartano pertencia ao estado. Os recém-nascidos eram examinados por um
conselho de anciãos que ordenava eliminar os que fossem portadores de deficiência física ou mental ou não
fossem suficientemente robustos (uma forma de eugenia). As crianças Espartanas eram espancadas pelos pais
para se tornarem mais fortes, e, se não fossem, morreriam.

A partir dos 7 anos de idade, os pais (cidadãos) não mais comandavam a educação dos filhos. As crianças eram
entregues à orientação do Estado, que tinha professores especializados para esse fim. Os jovens viviam em
pequenos grupos, levando vidas muito austeras, realizavam exercícios de treino com armas e aprendiam a
táctica de formação. Nessa época, as meninas teriam de tirar seus mamilos para poderem correr mais rápido e
mirar melhor com seu arco.

A educação espartana, supervisionada por um magistrado especial, o paidónomo, compreendia três ciclos,
distribuídos por três anos:
Dos sete aos onze anos;
Dos doze aos quinze anos;
Dos dezasseis aos vinte anos (a efebia).

Vejamos alguns dos métodos da educação espartana, tendo como base o relato dos historiadores gregos
Xenofonte (A constituição dos lacedemônios) e Plutarco (A vida de Licurgo).

Em lugar de proteger os pés com calçados, as crianças eram obrigadas a andar descalças, a fim de aumentar a
resistência dos pés. Usavam um só tipo de roupa o ano inteiro, para que aprendessem a suportar as oscilações do
frio e do calor.

A alimentação era bem controlada. Se algum jovem sentisse fome em demasia, era permitido e até estimulado
que furtasse para conseguir alimentos, pois acreditava-se que esta desenvoltura o auxiliaria durante a guerra.
Castigavam-se, entretanto, aqueles que fossem apanhados roubando - não por terem roubado, mas por terem
sido apanhados.

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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Uma vez por ano, os meninos eram chicoteados em público, diante do altar de Ártemis (deusa grega vingativa, a
quem se ofereciam muitos sacrifícios). Essa cerimónia constituía uma espécie de concurso público de
resistência à dor física.

Na adolescência, os jovens eram encarregados dos serviços de segurança na cidade. Qualquer cidadão adulto
podia vigiá-los e puni-los. O respeito aos mais velhos era regra básica. Às refeições, por exemplo, os jovens
deviam ficar calados, só respondendo de forma breve às perguntas que lhes fossem feitas pelos adultos.

Com sete anos, o jovem espartano entrava no exército. Mas só aos trinta anos de idade adquiria plenos direitos
políticos, podendo, então, participar da Assembleia do Povo ou dos Cidadãos (Apelá).

Depois de concluído o período de formação educativa, os cidadãos de Esparta, entre os vinte e os sessenta anos,
estavam obrigados a participar na guerra. Continuavam a viver em grupos e deviam tomar uma refeição diária
nos chamados syssitia.

Para o historiador italiano Franco Cambi, a educação desenvolvida em Esparta e Atenas constitui dois modelos
educativos diferentes. Em Esparta, a perspectiva militar orientava a formação de cidadãos-guerreiros,
defensores do Estado. Já em Atenas, predominava um tipo de formação mais livre e aberta, que, de modo mais
amplo, valorizava o indivíduo e suas capacidades. (Cf. Franco Cambi. História da pedagogia.)

A educação dos homens


Os homens (esparciatas) eram mandados ao exército aos sete anos de idade, onde recebiam educação e
aprendiam as artes da guerra e desporto. Aos doze anos, eram abandonados em penhascos sozinhos , nus e sem
comida. Aos 18 anos, voltavam a Esparta, e até os 30 anos de idade eram considerados cidadãos de segunda
classe, sem direito a voto, por exemplo. Podiam ser agredidos por qualquer esparciata acima de 30 anos,
ficavam nus e recebiam pouca comida[6][7] Os jovens poderiam atacar a qualquer momento servos (hilotas), a
fim de lutar e se preparar para a guerra, mas, se fossem mortos por ele, o servo receberia dois dias de folga (por
conseguir matar alguém que não era bom o bastante para o exército espartano). Existia uma temporada de caça
aos hilotas, para treinarem os jovens para a guerra.

O homem que conseguisse viver até os trinta anos tornava-se um oficial, voltando ao quartel com todos os
direitos de cidadão espartano, além de direito ao voto, direito a ter relações sexuais com mulheres e direito a

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casar. Os homens engravidavam suas mulheres, casavam-se com elas e voltavam ao quartel depois de deixá-las
grávidas em suas casas. Aos sessenta anos, poderiam ir para a casa de suas esposas para viver com elas.

A educação das mulheres


As mulheres recebiam educação quase igual à dos homens, participando dos torneios e actividades desportivas.
O objectivo era dotá-las de um corpo forte e saudável para gerar filhos sadios e vigorosos. Consistia na prática
do exercício físico ao ar livre, com a música e a dança relegadas para um segundo plano (ao contrário do que
tinha sucedido na Época Arcaica). Assim como os homens, também iam aos quartéis quando completavam sete
anos de idade para serem educadas e treinadas para a guerra mas dormiam em casa, onde recebiam da mãe aulas
de educação sexual, assim que atingiam a chamada menarca (primeira menstruação), começavam a receber
aulas práticas de sexo, para gerarem bons cidadãos para o estado, aulas onde se usavam escravos, com coito
interrompido para não engravidarem de hilotas (servos) e recebiam também uma educação mais avançada que a
dos homens já que seriam elas que trabalhariam e cuidariam da casa enquanto seus maridos estivessem servindo
ao exército.

Assim que atingiam a maturidade (entre dezanove e vinte anos) elas pediam a autorização ao estado para
casarem, passando por um teste para comprovar sua fertilidade (engravidavam de um escravo que era só para a
reprodução, sendo muito bem tratado e alimentado e morto aos 30 anos, pois era considerado velho. O filho que
ela tinha com esse escravo era morto e a mulher conseguia sua autorização para casar), caso elas não
conseguissem engravidar, era mandada aos quartéis para, assim como os homens, servir ao exército espartano.

A mulher espartana podia ter qualquer homem que quisesse, mesmo sendo casada, já que seus maridos ficavam
até os 60 anos de idade servindo ao exército nos quartéis, e podia também requisitar o seu marido ao general do
quartel, mas o mesmo não poderia ser feito pelos homens.

Muitos filhos era sinal de vitalidade e força em Esparta, assim, quanto mais filhos a mulher tivesse, mais
atraente ela seria, podendo engravidar de qualquer esparciata, mas o filho desta seria considerado filho do seu
marido.

Educação em Atenas

A organização social de Atenas 

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A população de Atenas dividia-se em três classes: cidadãos, metecos e escravos.

A cidadania era um privilégio que se adquiria  pelo nascimento. Somente filhos de pai e mãe atenienses se
reservavam o direito de serem cidadãos. Os estrangeiros e seus descendentes, domiciliados em Atenas,
formavam a classe dos metecos, excluídos, como os escravos, da vida política. Diz-se em resumo, que em
Atenas, todos cidadãos tinham direitos políticos, mas nem todos habitantes eram cidadãos.   

A organização política de Atenas  

Tal como nas demais cidades da Hélade, havia em Atenas a classe dos aristocratas, os eupátridas (bem
nascidos), como ali eram chamados. Estes, após a morte de Codro, elegeram um magistrado vitalício, com o
título de Arconde, responsável pelo governo, mas despojado das prerrogativas reais. Mas tarde, tornaram aquele
cargo temporário, limitando-o a dez anos de mandato. Por fim, o Arcontado foi anual e passou a ser exercido
por nove arcondes, um dos quais chamado arconde-rei, encarregado das funções religiosas.

Ao lado do Arcontado, com poderes administrativos militares e religiosos, funcionava o Aerópago, assembléia
ou conselho formado pelos ex-arcondes, com poderes judiciários e também políticos.  

Educação
Já em Atenas, após a adopção do alfabeto iónico, totalmente fonético, que se tornou comum a toda Grécia, teve
um esplêndido florescimento em todos os campos: da poesia ao teatro, da história à filosofia. No século V,
Atenas exercia um influxo sobre toda a Grécia: tinha necessidade de uma burocracia culta, que conhecesse a
escrita. Esta se difundiu a todo o povo e os cidadãos livres adquiriram o hábito de dedicar-se à oratória, à
filosofia, à literatura, desprezando o trabalho manual e comercial. Todo o povo escrevia como atesta a prática
do ostracismo. Afirmou-se um ideal de formação mais culto e civil, ligado à eloquência e à beleza,
desinteressado e universal, capaz de atingir os aspectos mais próprios e profundos da humanidade de cada
indivíduo é destinado a educar justamente este aspecto de humanidade, que em particular a filosofia e as letras
conseguem nele fazer emergir e amadurecer.

Assim, a educação assumia em Atenas um papel-chave e complexo, tornava-se matéria de debate, tendia a
universalizar-se, superando os limites da polis. Numa primeira etapa, a educação era dada aos rapazes que
frequentavam a escola e a palestra, onde eram instruídos através da leitura, da escrita, da música e da educação
física, sob a direcção de três instrutores: os gramatistas (mestre), o kitharistes (professor de música), o
paidotribes (professor de gramática). O rapaz era depois acompanhado por um escravo que o controlava e

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guiava: o paidagogos. Depois de aprender o alfabeto e a escrita, usando tabuinhas de madeira cobertas de cera,
liam-se versos ricos de ensinamentos, narrativas, discursos, elogios de homens famosos, depois os poetas
líricos”que eram cantados. O cuidado com o corpo era muito valorizado, para torná-lo sadio, forte e belo,
realizado no gymnasia. Aos 18 anos, o jovem era “efebo” (no auge da adolescência), inscrevia-se no próprio
demo (ou circunscrição), com uma cerimónia entrava na vida de cidadão e depois prestava serviço militar por
dois anos.

A particularidade da educação ateniense é indicada pela ideia harmónica de formação que inspira ao processo
educativo e o lugar que nela ocupa a cultura literária e musical, desprovida de valor prático, mas de grande
importância espiritual, ligada ao crescimento da personalidade e humanidade do jovem.

A questão educacional nas duas cidades também apresentava diferenças entre si. As instituições atenienses se
preocupavam em desenvolver um equilíbrio entre mente e corpo. Dessa forma, a educação buscava conciliar a
saúde física e o debate filosófico. Já em Esparta, dada sua intensa tradição militarista, privilegiava-se o
treinamento do corpo. Os jovens espartanos aprendiam a escrever aquilo que era estritamente necessário. Dessa
forma, o cidadão espartano deveria ser forte e resistente, um indivíduo apto para as batalhas militares.

Com toda certeza, não poderíamos julgar quais dessas duas diferentes culturas do mundo clássico foi mais
“desenvolvida” ou “sofisticada”. Nem mesmo poderíamos concluir que os atenienses eram simples antíteses dos
espartanos. As diferenças entre as experiências vividas por Atenas e Esparta podem nos explicar tantos
contrastes. Dessa forma, as comparações aqui desenvolvidas apenas nos dão uma amostra da riqueza dos
costumes, tradições e histórias que envolveram as cidades-Estado do Mundo Grego.

Educação dos Sofistas


Os sofistas ensinavam técnicas que auxiliavam as pessoas a defenderem o seu pensamento particular e suas
próprias opiniões contrárias sobre o mesmo para que dessa forma conseguisse seu espaço. Por desprezarem
algumas discussões feitas pelos filósofos, eram chamados de céticos até mesmo por Sócrates que se rebelou
contra eles dizendo que desrespeitavam a verdade e o amor pela sabedoria. Outros filósofos ainda acreditavam
que os sofistas criavam no meio filosófico o relativismo e o subjetivismo.

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Protágoras difundiu a frase: “O homem é a medida de todas as coisas, das coisas que são, enquanto são, das
coisas que não são, enquanto não são”. Por meio dela e de outras, foi acusado de ateísta tendo seus livros
queimados em praça pública, o que o fez fugir de Atenas e refugiar-se em Sicília.

Sofista significa educador. Não educação popular, mas formação de elites (educação dos nobres), de chefes
políticos. Para se ter esta instrução, pagava-se, por vezes, bastante caro. Esses mestres eram itinerantes,
circulavam de terra em terra, tinham acesso a várias formas culturais, aos usos e costumes de diferentes povos e
lugares. Desse contacto tiveram oportunidade de comparar as diversas instituições políticas, éticas e religiosas.
Constataram a convenção humana, por acordo e pelo hábito, na cultura, costumes e leis; em consequência dessa
observação, acabaram difundindo a ideia de que tudo é relativo.

Segundo COTRIM, os sofistas destacaram-se como mestres do saber político e da retórica. Eles deveriam
propiciar aos alunos habilidades da polémica e da oratória, sem as quais um político estava privado de sua
principal virtude. Esta é a capacidade da oratória de cada um que determina o que é justo e não o conhecimento
profundo das leis. As técnicas de discurso não procuravam a verdade, mas provar um determinado ponto de
vista; em alguns casos, falseavam-na conscientemente. Essa indiferença ao tema de que se tratava e a tese que
se defendesse levou ao desprezo às doutrinas, devendo o aluno ser capaz de defender qualquer tese, verdadeira
ou falsa, boa ou ruim. Assim, atribuíram relatividade a todas as noções, regras básicas e valores humanos.

O aluno deveria conhecer as disciplinas que consideravam a palavra como tal: gramática e retórica. Persuadir
era tão importante que Protágoras chegou a afirmar: "Devemos tornar a parte mais fraca em mais forte". E,
segundo Górgias, a palavra é o dom com o qual podemos fazer tudo, envenenar e encantar. O trabalho com a
palavra dependia do ensino da gramática, de que eles são os iniciadores, da crítica literária, da prosa artística,
com o ritmo próprio e distinto da poesia, que é também criação deles, tudo isso tendo em vista a eloquência.
Não descuravam, porém da Matemática, Aritmética, Geometria, Astronomia e Música.

Dentre os principais sofistas destacam-se: Protágoras de Abdera, Górgias de Leôncio, Trasímaco de Calcedónia,
Pródigo de Cléos, Hípias de Hélade, Crítias de Atenas, Cálices, Antifonte, Lécrafonte, Alicidamos, Hipódamos
de Mileto. Os sofistas contribuíram para o abandono da filosofia da natureza, não somente pela mudança na
circunstância filosófica, mas também pelas necessidades criadas pela prática democrática da sociedade
ateniense. O advento da democracia trouxera consigo uma notável mudança na natureza da liderança: já não
bastava a linhagem, mas a liderança política passava pela aceitação popular. Numa sociedade em que as

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decisões são tomadas pela assembleia do povo e onde a máxima aspiração é o triunfo, o poder político, depressa
se fez sentir a necessidade de se preparar para ele. Qual era a preparação idónea para o ateniense que pretendia
triunfar na política? Um político necessitava, indubitavelmente ser um bom orador para manipular as massas.
Necessitava, ainda, possuir algumas ideias acerca da lei, acerca do que é justo e conveniente, acerca da
administração e do Estado. Este era, precisamente, o tipo de treino que os ensinamentos dos sofistas
proporcionavam.

Como contribuição dos sofistas tem-se o abandono do pensamento mitico-religioso; a aceitação do racionalismo
Heracliteano da ordem do universo (uso da razão); a convicção de que as leis e as instituições são resultados do
acordo ou decisão humana: convencional. Os sofistas eram relativistas, isto é, não acreditavam na possibilidade
de os seres humanos chegarem a um saber objectivo, universal, de modo que, "tudo é relativo". Esta posição - o
relativismo - combinava com a sua forma de ensinar a argumentar: não interessava tanto o conteúdo científico,
mas a capacidade de convencer os demais. Os filósofos foram severos adversários dos sofistas, exactamente por
não concordarem com o seu relativismo.

Os sofistas (literalmente, "sábios") eram todos estrangeiros. Excluídos assim da condição de cidadãos, não se
interessavam directamente pelos destinos da cidade. Assim, não se preocupavam com o que uma argumentação
poderia ter de justo ou injusto, moral ou imoral - isso é assunto dos cidadãos. Bastava-lhes que seus discípulos
aprendessem a falar - não importava o quê, mas bem, de modo convincente - e que os remunerassem pelo
ensino. Dizia-se até que um aluno, para se considerar apto, devia convencer o mestre a não receber o
pagamento; se não conseguisse convencê-lo, a lição fora mal ministrada e não merecia remuneração. Se o
conseguisse, não haveria por que pagar. Os mais conhecidos são Hípias (nascido na Élida no séc. V a.C.),
Górgias (c. 487-380 a.C.) e Protágoras (c. 485-410 a.C).

Os sofistas ensinavam aos jovens e aos adultos no que compete à arte de convencer e eram itinerantes, indo de
cidade em cidade.   Os demais filósofos, por sua vez, criavam instituições (como no caso de Platão, que criou a
Academia, e Aristóteles, que criou o Liceu) para formar os jovens no que compete ao raciocínio filosófico.   Os
governos das cidades gregas desenvolviam Ginásios para os jovens, com o objectivo de que pudessem
aprimorar sua forma física e também aprender algumas noções de poesia, literatura e filosofia.   O modelo
pedagógico ensinado nos ginásios era conhecido como ARETHÉ (palavra grega que significa um equivalente à
honra), e o objectivo dos Ginásio era a formação dos KALOIKAGATHIA (o homem ao mesmo tempo belo e
bom).

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Mas fica a pergunta:   quem ensinava às crianças? Na Grécia antiga nem todos eram livres, existindo então
escravos, os quais geralmente eram adquiridos ao serem comprados ou mediante alguma vitória militar na qual
pessoas dos territórios perdedores eram escravizadas.   Na Grécia da época de Sócrates (século 3 A.C.) era
comum que as famílias tivessem entre seus escravos um tipo especial chamado PAIDAGOGOS (que em
português teria uma tradução aproximada para condutor de crianças).   Este escravo tinha como função tomar
conta das crianças, bem como conduzí-la até os ginásios e ensinar-lhes histórias referentes à formação moral e
às virtudes mais valorizadas nesta época.   Coube aos pedagogos (cuja palavra se origina da expressão grega
que vimos acima)  complementar a educação ministrada pelos familiares e preparar a criança para a entrada no
ginásio.

Deste modo, podemos perceber que o modelo de formação pedagógico grego consistia em uma junção entre o
desenvolvimento físico e intelectual, tendo como referências o equilíbrio das formas físicas e o conhecimento
de política, arte e filosofia (no que diz respeito à formação intelectual).

A TEORIA EDUCACIONAL DE PLATÃO

Platão (428 – 347 a.C.), exerceu uma grande influência na educação grega, tendo sido o mais importante
discípulo de Sócrates. Ele o principal responsável pela transmissão escrita dos ensinamentos do seu mestre.
Além disso, criou as suas próprias ideias, demonstrando possuir um notável zelo pelo saber. A teoria dos dois
mundos (“mundo sensível e mundo inteligível ou mundo das ideias”) destaca-se como o cerne do pensamento
platónico e se encontra explicitada no famoso “Mito da Caverna”.

Platão defendia que toda educação era de responsabilidade estatal e, ainda, reivindicava o acesso universal à
educação e a mesma instrução para meninos e meninas. Platão defendia essas ideias por ser opositor ao sistema
democrático que vigorava em Atenas, principalmente porque ele dava poder a pessoas despreparadas para
governar.

Platão promulgava que a educação tinha o objectivo final deformar moralmente o homem para viver em estado
justo. Rejeitava e educação grega praticada pelos sofistas que eram encarregados de transmitir conhecimentos
técnicos, principalmente de oratória, para os jovens da elite, que deveriam se tornar aptos para ocupar as
funções públicas.

"Nunca existiu uma grande inteligência sem uma veia de loucura."

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A teoria do conhecimento de Platão tem sua grande ilustração com a Alegoria da caverna desenvolvida no livro
VII de A república, nessa alegoria o que é sustentado é a forma como o conhecimento humano se desenvolve
passando progressivamente do mundo das sombras e das aparências, isto é, do mundo da doxa para o mundo
das ideias das essências da verdade. Buscando o mundo das ideias no qual se encontra o eterno e o imutável.
Dessa maneira a função da educação é levar o homem a sair das aparências do mundo sensorial e mutante
para alcançar as essências, o verdadeiro ser que é a contemplação da realidade pura. Assim a educação deve
realizar a arte da conversão. Essa busca pelas verdades seria construída por meio de um método dialéctico
contrapondo as opiniões com a crítica para purificar os equívocos do mundo das aparências que são
contraditórios.

A contemplação da verdade será alcançada por meio da educação e somente a essas pessoas que transcenderam
os limites do sensorial, ou seja, os que passaram pelo processo da educação, lhes cabem a tarefa de administrar
a polis.

“Aos que não receberam educação nem experiência da verdade jamais serão capazes de administrar
satisfatoriamente a cidade” (519c).

A educação tem a função de levar ao conhecimento a verdade e isso se assemelha ao bem. Portanto quem
conhece é capaz de reconhecer e realizar o sumo bem.

A educação em Platão tem a tarefa de relembrar conhecimentos que a alma traz de maneira inata, isso chama-
se reminiscência cada qual traz conhecimentos inatos e esses conhecimentos é a virtude de cada um.

As pessoas segundo Platão podem aprender e realizar várias coisas, no entanto, apenas uma coisa se pode
realizar com excelência, ao realizar a função para a qual se nasceu, a pessoa é feliz e todos na polis ganham com
isso, pois realizará as acções de maneira correcta e todos ganharão e será alcançada a harmonia na polis. O
indivíduo será feliz e todos serão felizes porque terá um serviço prestado com excelência.

Cada qual nasce uma com uma aptidão natural e a educação tem a tarefa de identificar quem nasceu para o quê.
“... Cada um de nos não nasceu igual a outro, mas com naturezas diferentes, cada um para a execução de sua
tarefa”. (370b). Dessa maneira surge uma divisão social e de trabalho que é dada de maneira inata ao realizar
esse inatismo a justiça será realizada na polis, dessa maneira surge a necessidade do estado e do convívio social,

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porque não somos autárquicos e não podemos nos prover de todas os serviços e bens e a educação elucidará
essas aptidões já existentes.

As aptidões inatas dividem a hierarquia social da seguinte maneira existem três classes sociais a saber as almas
de ouro cuja virtude é a sabedoria e a sua função na sociedade é a de administrar a república ou seja a coisa
pública, essa classe entre todas deve ser a que mais estudou, ou seja deve ser o mais sábio. Esse grupo de
pessoas não poderão ter bens ou acumular bens para evitar a corrupção e além do que somente podemos realizar
uma coisa com excelência ou se é político ou se é agricultor.

A segunda classe social é formada pelas almas de prata, os guardiões, cuja virtude é a temperança, a obediência
“devem ser brandos para com os compatriotas, embora acerbos para os inimigos”(375c) a função dos guardiões
é militar devem fiscalizar a classe anterior, afim de verificar se não estou deturpando suas funções , como
acumular bens e a classe seguinte dos concuspiscentes. Os guardiões devem cultivar o corpo e o intelecto assim
também como a classe dos filósofos. Se dedicar somente ao físico vem o embrutecimento e cultivar somente o
intelecto corre-se o risco de ficar efeminado e fraco. Por último as almas de bronze são os concuspiscentes
formados por aquelas pessoas que se dedicam ao comercio e a produção de bens e serviços, esses são
necessários e são o alicerce da polis no que se refere a sua estrutura e formação, deverão ser a maioria, pois um
pequeno grupo será formado pelos guardiões e uma elite aristocrata deverão ser os dirigentes da cidade. As
almas de bronze poderão acumular bens, no entanto não podem ficar demasiadamente ricos ou pobres, se
ficarem ricos podem almejar uma ascensão social o que não é desejável em Platão haja visto que a mobilidade
social leva a uma desarmonia pois não se pode fazer duas coisas bem cada qual deve se dedicar uma função
para a qual nasceu. A pobreza por outro lado pode gerar insatisfações e violência.

A educação em Platão é fortemente influenciada pela estrutura educacional de Atenas e Esparta. Atenas se
dedica as intelectualidades e sucumbe Esparta se dedica ao culto ao corpo e as acções bélicas e não tem melhor
destino. Sendo assim, Platão mescla aspectos da educação ateniense do culto ao intelecto e da educação
espartana do culto ao corpo.

Para falar da educação é necessário além da compreensão da teoria das ideias do conhecimento inato e da
busca das essências e da formação do estado, é importante falar da estrutura familiar.

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O casamento para Platão deve ser abolido, pois um casamento entre pessoas da aristocracia poderia ou não gerar
filhos cujas aptidões naturais seriam ou não voltadas para a virtude da sabedoria. Dizendo de outra maneira dois
almas de ouro podem ter filhos almas de bronze, no entanto os pais poderiam usar as sua influências para
colocar esses filhos para desempenharem funções para as quais não nasceram, dessa maneira seriam infelizes,
incompetentes e dessa maneira a polis perderá a harmonia.

Assim, o sexo para a procriação acontecerá segundo a referendação do estado em dias determinados pelo estado
onde todos se relacionarão com todos, os filhos nascidos fora desse prazo não teria o apoio do estado. Dessa
maneira os pais não sabendo quem são seus filhos tratarão a todos como se fossem seus filhos e respeitando
suas aptidões naturais sem pretender valorizar um em detrimento de outros por motivos passionais. Embora
Platão sugira que o rei filósofo deve encontrar mecanismo para que a elite se relacione com a elite para que
houvesse um melhoramento da raça uma espécie de eugenia.

O estado por volta dos seis anos assumiria a educação dessas crianças a principio todos receberiam a mesma
educação e a medida que demonstrassem aptidões para uma áreas seus estudos seriam canalizados para essa
área. Assim, quem se interessasse pela filosofia, política etc., continuaria estudando, e quem demonstrasse
facilidade e interesse pela agricultura e comércio receberia uma formação compatível com essa tarefa diferente
daquela destinada aos que serão os reis filósofos e continuarão seus estudos por mais tempo.

Assim a educação tem papel crucial em Platão por que é ela que identifica quem nasceu para o que. A alegoria
da caverna é emblemática no sentido que ela serve como um modelo de sair das aparências e tem a figura de
Sócrates como um ideal do que seria a função do professor.

Imaginemos a caverna como a própria Atenas os homens que lá vivem, os cidadãos atenieneses e o homem que
sai da caverna é Sócrates. Ele transcende as aparências contempla o real e não se contenta em saber somente
para ele, volta a caverna e pretende alertar aos outros sobre os limites da visão da caverna. Ele é mal
compreendido e levado à condenação a morte. O papel de Sócrates é a tarefa do pedagogo, do professor, aquele
que aprende e volta para conduzir os demais mesmo correndo o risco do outro não querer o só sei que nada sei
socrático consiste numa abertura ao conhecimento e a fala do outro dentro da perspectiva da maiêutica de não
dar respostas mas levar o outro a dar a luz as suas própria ideias.

TEORIA EDUCACIONAL DE ARISTÓTELES

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Resgatando os escritos aristotélicos, principalmente os referentes à educação, procuramos considerar a


importância da formação holística do ser humano num mundo transformado e em transformação.

Se, em Aristóteles, a educação está na base da construção política da democracia, é porque ela pode ser lugar de
instituição da "virtude total", que é a justiça,

E isso pela paideía, a "educação", o exercício tendo em vista os negócios comuns, a criação plena do cidadão, a
transformação do pequeno animal em homem na cidade. A justiça total é constituição/instituição da
comunidade e, de acordo com o fim desta instituição, sua mais pesada tarefa é a que concerne à paideía, à
formação do indivíduo tendo em vista sua vida na comunidade, a socialização do ser humano.

A principal tarefa da educação é, pois, a formação ética de seus cidadãos, que, numa democracia, supõe a
construção, por parte de cada um, das condições a partir das quais ele poderá participar plenamente da vida
comum, deliberando e reflectindo sobre o que é a felicidade de todos.

Para Aristóteles, essa educação deve ser prerrogativa do Estado, pois "(…) é bom que as coisas que interessam à
toda a comunidade sejam objecto de um exercício comum." Aristóteles antecipa, assim, sem conseguir vê-la
realizada em sua época, uma exigência que, séculos mais tarde, levará à criação da Escola pública - esta forma
de educação comum que, em nossas democracias sem participação política, torna-se um outro desafio.

A primeira dessas condições é, evidentemente, a criação de uma base ética comum: no seio de uma sociedade
dilacerada pelas diferenças e pelas injustiças, essa tarefa se transforma, porém, num verdadeiro dilema, num
formidável desafio do qual dependem os ideais democráticos que inspiram o sonho revolucionário. Mas não se
havia dado o passo mais importante, ao tornar de uma só vez todos os indivíduos cidadãos de pleno direito, e
iguais perante as leis? Essa convicção está claramente presente.

Parte-se da seguinte constatação: Há duas espécies de virtude: a intelectual e a moral. A primeira deve, em
grande parte, sua geração e crescimento ao ensino, e por isso requer experiência e tempo; ao passo que a virtude
moral é adquirida em resultado do hábito (Aristóteles, 2005).

Assim, há mais dois mil anos, Aristóteles já compreendia o ensino educacional como uma virtude democrática a
ser construída com base na disciplina e no hábito. A Educação do homem, em sua integridade, deveria abranger

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os diversos campos do saber, com um enfoque sobre o desenvolvimento moral e cívico, além do aprimoramento
dos valores internos.

O hábito da virtude moral dignifica o ser humano, porque os bons hábitos são fundamentais para realizarmos as
actividades quotidianas com excelência. O professor, responsável pela democratização do conhecimento,
depara-se diariamente com situações embaraçadoras, como das crianças que não utilizam de boa educação e
equilíbrio nas atitudes para com os próprios professores e colegas.

"A educação, para Aristóteles, é um caminho para a vida pública". Cabe à educação a formação do carácter
do aluno. Perseguir a virtude significaria, em todas as atitudes, buscar o "justo meio". A prudência e a sensatez
se encontrariam no meio-termo, ou medida justa - "o que não é demais nem muito pouco", nas palavras do
filósofo.

Para Aristóteles a educação parte da imitação e visa levar o educando a adquirir hábitos que formarão nele
uma segunda natureza. Nesse processo o educador deve expor o assunto, fazer com que o educando retenha
aquilo que foi exposto, e, enfim levá-lo a relacionar os diversos conhecimentos adquiridos à custa de
exercícios. Trata-se de uma educação que leva em consideração todas as faculdades que integram a natureza
humana, para que o educando alcance a finalidade específica de sua existência, a felicidade. Segundo
Aristóteles a educação deve ser pública e comum, porque só o estado pode garantir a formação adequada.

Platão (2001) percebe a educação como uma arte capaz de suportar a contemplação do ser e da parte mais
brilhante do ser. Sendo assim, a natureza da educação permite ao homem, através dos bons hábitos, obter uma
concepção política correcta por meio do auto-conhecimento. Por exemplo: o que uma pessoa julga estar errado
e o é, tomará para ela tal decisão e através de seu exemplo, influenciará outras pessoas.

O desenvolvimento da educação integral como virtude permite ao homem superar as expectativas sociais, bem
como quebrar as regras teóricas e superficiais da sociedade alienada.

Não é, portanto, nem por natureza nem contrariamente à natureza que as virtudes se geram em nós; antes
devemos dizer que a natureza nos dá a capacidade de recebê-las, e tal capacidade se aperfeiçoa com o hábito
(Aristóteles, 2005).

O bem é a finalidade do hábito. Todo hábito visa a um bem qualquer. Em todas as acções quotidianas, há
implicações, e de acordo com o grau de instrução de cada pessoa, faz-se ou não o uso de bons hábitos. A

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excelência moral e intelectual pode ser adquirida por meio da educação em uma propensão muito maior pelo
exemplo oferecido pela sociedade, pelos amigos e familiares.

Conclui-se que para Aristóteles o potencial humano se desenvolve a partir do aprimoramento dos valores
internos. Por ter potencialidades múltiplas, o ser humano só será feliz e dará sua melhor contribuição ao mundo
se desfrutar das condições necessárias para desenvolver o talento. A organização social e política, em geral, e a
educação, em particular, têm a responsabilidade de fornecer essas condições.

A virtude não é um conhecimento abstracto a respeito do que é ser virtuoso, como afirmou Platão, mas a prática
da virtude em todos os hábitos que envolvem as acções humanas. Portanto, o educador, como um divulgador do
conhecimento, deve desenvolver em seus alunos o aprendizado através de bons hábitos, em paralelo com a
teoria, preparando-os para os desafios do mundo contemporâneo, ao mesmo tempo em que desenvolve a
excelência moral e educacional.

Pensamento Educacional de Platão e Aristóteles


Platão e Aristóteles são os pensadores que mais nos influenciaram. A partir deles, temos as bases necessárias
para a discussão filosófica sobre a educação, ou seja, algumas questões pensadas por eles há muito tempo ainda
servem para pensarmos o papel da educação e sua relação com a sociedade como um todo.

Educação grega, tendo sido o mais importante discípulo de Sócrates. Ele o principal responsável pela
transmissão escrita dos ensinamentos do seu mestre.

É possível afirmar que Platão foi o fundador da teoria da pedagogia, seu pensamento foi fundamentado na
reflexão pedagógica, aliada à política.

No livro VII de A República, Platão relata o mito da caverna, o qual pode ser analisado sob pelo menos sob dois
pontos de vista: Primeiro, o epistemológico que está relacionado ao conhecimento, assim ele compara o
acorrentado ao homem que fica dominado pelos sentidos e não atinge um conhecimento perfeito da realidade.
Segundo, o político, nesse aspecto o homem se livra dos grilhões, indo além do mundo sensível, atingindo
então, o mudo das ideias, da opinião à essência. É responsabilidade do sábio conduzir, sendo-lhe reservada a
alta função da acção política.

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Para Platão, o conhecimento é resultado das lembranças das contemplações da alma no mundo das ideias. Desse
modo, a educação é o despertar do indivíduo do que ele já sabe e não o apropriar de um conhecimento que está
fora. Ele destaca também, a necessidade da educação física no sentido de que esta proporcione ao corpo uma
saúde perfeita, evitando que a fraqueza atrapalhe a vida superior do espírito.

PLATÃO valoriza os métodos de debate e conversação como formas de alcançar o conhecimento. De acordo
com Platão, alunos deveriam descobrir as coisas superando os problemas impostos pela vida.

Em Aristóteles podemos perceber um outro aspecto da pedagogia grega. Aristóteles desenvolveu, ao contrário
de Platão, uma teoria voltada para o real, onde procurava explicar o movimento das coisas e a imutabilidade dos
conceitos. “A educação, para Aristóteles, é um caminho para a vida pública”. Cabe à educação a formação do
carácter do aluno. Perseguir a virtude significaria, em todas as atitudes, buscar o “justo meio”. A prudência e
a sensatez se encontrariam no meio-termo, ou medida justa – “o que não é demais nem muito pouco”, nas
palavras do filósofo.

No conhecimento, sob a perspectiva aristotélica encontramos um modo de pensar sobre a prática. Uma teoria
que nasce da contemplação, mas que é aplicação, praxis. Em Aristóteles, temos uma compreensão dialéctica da
educação e, ao mesmo tempo, uma espécie de sistemática de tudo o que foi dito e entendido sobre o assunto na
Grécia Antiga e Clássica. Para ele, não há problema com a política (Platão) ou com o discurso (Sócrates), desde
que esses sejam acompanhados pela ética.

Aristóteles mostra o facto de que a educação, ou o processo do conhecimento leva o ser humano a buscar o
meio termo, a temperança, nem muita festa nem de menos. Percorrido pelo bom uso do conhecimento, isso só
acontece pela virtude obtida pela educação das novas gerações, numa perspectiva de construção interior da
pessoa.

TEORIA EDUCACIONAL DE SÓCRATES


O pensamento do filósofo grego Sócrates (469-399 a.C.) marca uma reviravolta na história humana. Até então,
a filosofia procurava explicar o mundo baseado na observação das forças da natureza. Com Sócrates, o ser
humano voltou-se para si mesmo. Como diria mais tarde o pensador romano Cícero, coube ao grego "trazer a
filosofia do céu para a terra" e concentrá-la no homem e em sua alma (em grego, a psique). A preocupação de
Sócrates era levar as pessoas, por meio do autoconhecimento, à sabedoria e à prática do bem.  

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Nessa empreitada de colocar a filosofia a serviço da formação do ser humano, Sócrates não estava sozinho.
Pensadores sofistas, os educadores profissionais da época, igualmente se voltavam para o homem, mas com um
objectivo mais imediato: formar as elites dirigentes. Isso significava transmitir aos jovens não o valor e o
método da investigação, mas um saber enciclopédico, além de desenvolver sua eloquência, que era a principal
habilidade esperada de um político.  

Sócrates concebia o homem como um composto de dois princípios, alma (ou espírito) e corpo. De seu
pensamento surgiram duas vertentes da filosofia que, em linhas gerais, podem ser consideradas como as grandes
tendências do pensamento ocidental. Uma é a idealista, que partiu de Platão (427-347 a.C.), seguidor de
Sócrates. Ao distinguir o mundo concreto do mundo das ideias, deu a este status de realidade; e a outra é a
realista, partindo de Aristóteles (384-322 a.C.), discípulo de Platão que submeteu as ideias, às quais se chega
pelo espírito, ao mundo real.

Ensino pelo diálogo

Nas palavras atribuídas a Sócrates por Platão na obra Apologia de Sócrates, o filósofo ateniense considerava sua
missão "andar por aí (nas ruas, praças e ginásios, que eram as escolas atenienses de atletismo), persuadindo
jovens e velhos a não se preocuparem tanto, nem em primeiro lugar, com o corpo ou com a fortuna, mas antes
com a perfeição da alma". Defensor do diálogo como método de educação, Sócrates considerava muito
importante o contacto directo com os interlocutores – o que é uma das possíveis razões para o facto de não ter
deixado nenhum texto escrito. Suas ideias foram recolhidas principalmente por Platão, que as sistematizou, e
por outros filósofos que conviveram com ele. Sócrates se fazia acompanhar frequentemente por jovens, alguns
pertencentes às mais ilustres e ricas famílias de Atenas. Para Sócrates, ninguém adquire a capacidade de
conduzir-se, e muito menos de conduzir os demais, se não possuir a capacidade de autodomínio. Depois dele, a
noção de controlo pessoal se transformou em um tema central da ética e da filosofia moral. Também se formou
aí o conceito de liberdade interior: livre é o homem que não se deixa escravizar pelos próprios apetites e segue
os princípios que, por intermédio da educação, afloram de seu interior.

O papel do educador é, então, o de ajudar o discípulo a caminhar nesse sentido, despertando sua cooperação
para que ele consiga por si próprio "iluminar" sua inteligência e sua consciência. Assim, o verdadeiro mestre
não é um provedor de conhecimentos, mas alguém que desperta os espíritos. Ele deve, segundo Sócrates,

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admitir a reciprocidade ao exercer sua função iluminadora, permitindo que os alunos contestem seus
argumentos da mesma forma que contesta os argumentos dos alunos. Para o filósofo, só a troca de ideias dá
liberdade ao pensamento e a sua expressão – condições imprescindíveis para o aperfeiçoamento do ser humano.

Ao eleger o diálogo como método de investigação, Sócrates foi o primeiro filósofo a se preocupar não só com a
verdade mas com o modo como se pode chegar a ela. Eis por que ele é considerado por muitos o modelo
clássico de professor. Quando você prepara suas aulas, costuma levar em conta a necessidade de ajudar seus
alunos a desenvolver procedimentos para que possam pensar por si mesmos?

Método de Sócrates

É a parte polémica. Insistindo no perpétuo fluxo das coisas e na variabilidade extrema das impressões sensitivas
determinadas pelos indivíduos que de contínuo se transformam, concluíram os sofistas pela impossibilidade
absoluta e objectiva do saber. Sócrates restabelece-lhe a possibilidade, determinando o verdadeiro objecto da
ciência.

O objecto da ciência não é o sensível, o particular, o indivíduo que passa; é o inteligível, o conceito que se
exprime pela definição. Este conceito ou ideia geral obtém-se por um processo dialéctico por ele chamado
indução e que consiste em comparar vários indivíduos da mesma espécie, eliminar-lhes as diferenças
individuais, as qualidades mutáveis e reter-lhes o elemento comum, estável, permanente, a natureza, a essência
da coisa. Por onde se vê que a indução socrática não tem o carácter demonstrativo do moderno processo lógico,
que vai do fenómeno à lei, mas é um meio de generalização, que remonta do indivíduo à noção universal.

Praticamente, na exposição polémica e didáctica destas ideias, Sócrates adoptava sempre o diálogo, que revestia
uma dúplice forma, conforme se tratava de um adversário a confutar ou de um discípulo a instruir. No primeiro
caso, assumia humildemente a atitude de quem aprende e ia multiplicando as perguntas até colher o adversário
presunçoso em evidente contradição e constrangê-lo à confissão humilhante de sua ignorância. É a ironia
socrática. No segundo caso, tratando-se de um discípulo (e era muitas vezes o próprio adversário vencido),
multiplicava ainda as perguntas, dirigindo-as agora ao fim de obter, por indução dos casos particulares e
concretos, um conceito, uma definição geral do objecto em questão. A este processo pedagógico, em memória
da profissão materna, denominava ele maiêutica ou engenhosa obstetrícia do espírito, que facilitava a parturição
das ideias.

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Teoria Defendida por Sócrates Maiêutica


Maiêutica Socrática tem como significado "Dar a luz (Parto)" intelectual, da procura da verdade no interior do
Homem. Sócrates conduzia este parto em dois momentos: No primeiro, ele levava os seus discípulos ou
interlocutores a duvidar de seu próprio conhecimento a respeito de um determinado assunto; no segundo,
Sócrates os levava a conceber, de si mesmos, uma nova ideia, uma nova opinião sobre o assunto em questão.
Por meio de questões simples, inseridas dentro de um contexto determinado, a Maiêutica dá à luz ideias
complexas. A maiêutica baseia-se na ideia de que o conhecimento é latente na mente de todo ser humano,
podendo ser encontrado pelas respostas a perguntas propostas de forma perspicaz.

A auto-reflexão, expressa no nosce te ipsum - "conhece-te a ti mesmo" - põe o Homem na procura das verdades
universais que são o caminho para a prática do bem e da virtude.

Há certa divergência historiográfica sobre a utilização de tal método por Sócrates. Historiadores afirmam que a
denominação e associação de tal método ao filósofo decorre da narração, não necessariamente fiel, da vida de
Sócrates por Platão. Deve-se chamar, então, a instrumentação argumentativa do filósofo de elenkhos.

Sócrates foi, sem sombra de dúvida, um dos Homens mais sábios que já passaram pela Face da Terra. Ainda o
é, uma vez que suas ideias se perpetuam até hoje em nossa sociedade, já que ele mesmo dizia que o Sócrates
que seus discípulos conheciam ou deviam conhecer não morreria nunca, que a Ideia que ele encarnava, não era
dele, mas imortal e universal. Foi um Homem simples, roupas nada ostentadoras, que a dava por Atenas
aplicando a maiêutica em suas conversas com o propósito de descobrir a Verdade, encontrar o saber.
Considerava-se nada sapiente. Considerá-lo seria não o ser! Ele desmanchava os conceitos e definições alheias
com perguntas. Desconstruía todas as construções com alicerces de vento, ia mais fundo. Quanto mais fundo ia,
mais percebia que o Saber não tem fim.

A Maiêutica de Sócrates consiste em perguntar, em interrogar, em inquirir: “O que é isto? O que significa?” E
isto ele faz andando pelas ruas, pelas praças, indagando das pessoas.

Ao general ateniense que encontra – ele está preocupado em averiguar o que é a coragem – diz para si: ”Aqui
está: este é quem sabe o que é ser corajoso, visto que é o general, o chefe.” Aproxima-se e diz: “Você que é um
general do exército ateniense, tem que saber o que é a coragem.” Então o outro lhe diz: “Mas é claro! Como não

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vou saber o que é coragem? Ela consiste em atacar o inimigo e nunca fugir.” Sócrates para, pensa, coça a
cabeça e lhe diz: “Sua resposta não é totalmente satisfatória.” E faz ver ao general que muitas vezes é preferível
retroceder para atrair o inimigo a uma posição mais favorável para destruí-lo. O general concorda e dá outra
definição ou complementa a anterior. E Sócrates exerce, outra vez, sua crítica interrogativa e nunca está
satisfeito com as respostas que vão sendo dadas.

Dessa forma, faz com que a definição inicial vá passando pelo crivo das indagações e aperfeiçoando-se por
extensões e reduções até ficar o mais exacta possível, mas nunca a ser definitiva. Para a Maiêutica, o
conhecimento está latente no homem, só e necessário criar condições para que ele passe da potência ao ato,
aflore, numa espécie de recordação, reminiscência. Educar no sentido verdadeiro e superior. Educação vem do
latim educere, literalmente trazer para fora, sobressair, emergir do estado potencial para o estado de realidade
manifestada.

Nos diálogos platónicos, que reproduzem cenas da actuação de Sócrates, nenhum deles chega a uma solução
definitiva: todos se interrompem dando a entender que é preciso continuar perguntando, perguntando e
continuar encontrando dificuldades, novos desafios e mistérios na última definição dada e que o assunto nunca
se esgota. Esse método é típico de tudo que Platão nos deixou escrito nos diálogos socráticos.

Para Platão, quando não sabemos nada, ou aquilo que sabemos, o sabemos sem tê-lo procurado como a opinião,
é um saber que não vale nada, mas quando queremos saber, aproximar-nos do conhecimento elevado, reflexivo,
temos mais chances de compreender. Opinião, crença, doxa em grego, é o que pensamos que sabemos, mas não
fundado no conhecimento racional, portanto, não é nada. A Dialéctica platónica consiste exactamente na
discussão de todos os aspectos, todos os prós e contras de um determinado tema até que possamos depurá-lo e
chegar perto de seu verdadeiro significado, autêntico, real e que ele chama de episteme, ciência.

A TEORIA EDUCACIONAL DE QUINTILIANO

MARCOS FÁBIO QUINTILIANO, por volta de 35- depois de 96. Nasceu em Calagurris, Espanha. Estudou
retórica e leccionou em Roma durante 20 anos. Nos últimos anos de sua vida, dedicou-se a botar por escrita a
sua rica experiência, na famosa obra Instituto oratória, em doze livros, sobre a educação do orador.

Nela Quintiliano não se limita à didáctica e à metodologia da retórica. Trata do problema do talento, das tarefas
do educador e do professor, do estilo correcto de ensino e de educação e de inúmeras questões pedagógicas.

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Defendia o ideal educacional da eloquência perfeita. Tinha em mente um homem ao mesmo tempo eloquente e
sábio.

Não se contentava com um homem apenas eloquente, que poderia defender-se ou responsabilizar-se
pessoalmente por aquilo que defendia. Também não lhe bastava um indivíduo apenas sábio: era necessário que
fosse eloquente.

A descoberta da Infantilidade na Modernidade (O pensamento Educacional na Idade Moderna

TEORIA EDUCACIONAL JEAN JACQUES ROUSSEAU

Seu nome completo é Jean Jacques Rousseau e nasceu em Genebra, Suíça, a 28 de Junho de 1712; faleceu em 2
de Julho de 1778. Os seus 66 anos de existência tiveram uma enorme influência na educação. Rousseau
combateu ideias que prevaleciam há muito tempo. Entre elas, a de que a teoria e a prática educacional, junto à
criança, deviam focalizar os interesses do adulto e da vida adulta. Ele também chamou a atenção para as
necessidades da criança e as condições de seu desenvolvimento. Como consequência, a criança não podia ser
mais entendida como um adulto em miniatura. E se a criança era um ser com características próprias, não só as
suas ideias e seus interesses tinham de ser diferentes dos adultos; também o relacionamento rígido mantido
pelos adultos em relação a elas precisava ser modificado.

Com as suas ideias, Rousseau desmentiu de que a educação é um processo pelo qual a criança passa a adquirir
conhecimentos, hábitos e atitudes armazenados pela civilização, sem qualquer modificação. Cada fase de vida:
infância, adolescência, juventude e maturidade foi concebida como portadora de características próprias,
respeitando a individualidade de cada um.

Frederick Eby expressa com precisão as idéias de Rousseau: "A bondade e a felicidade do indivíduo são mais
essenciais que o desenvolvimento de seu talento. Colocando as necessidades e os interesses do indivíduo acima
dos da sociedade organizada, Rousseau inverteu a ordem universal. Na sociedade ideal e natural, onde a

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natureza conserva sua simplicidade e inocência originais, todos os indivíduos seriam educados juntos e
participariam de interesses comuns."

No seu livro Emílio, Rousseau destaca que o adulto, sabendo quais são os pensamentos, sentimentos e
interesses das crianças, não irá impor os seus. Para compreender a infância, o homem precisa olhar a vida com
simplicidade. Enquanto o mundo físico é harmonioso, o mundo humano é egoísta e cheio de conflitos. Os males
sociais e a educação oferecida aos jovens são os responsáveis por esses conflitos.

Tanto a sociedade quanto o desenvolvimento do homem se modificam e é por isso, que a educação é
fundamental a essa adaptação. Para Rousseau o indivíduo não deve ser sacrificado aos caprichos da sociedade, a
educação assume um papel de destaque.

Embora as fases no desenvolvimento da vida do indivíduo já tivesse sido reconhecido por vários pensadores, foi
Rousseau quem mostrou a importância das mesmas para a educação.

A primeira fase, até os 5 anos, era como uma fase animal, com o aparecimento do primeiro sentimento de si
mesmo; aos 12 anos, o indivíduo torna-se consciente de si mesmo, é o momento da vida em que o racional
desperta; sendo um ser isolado, a criança não desfruta ainda da vida moral. E na fase seguinte, a puberdade, o
sexo é visto por Rousseau como o factor mais importante da vida do indivíduo; com isso, surge a vida social do
indivíduo. Com o surgimento dos mais altos sentimentos, a vida moral evolui naturalmente.

Se cada fase da vida tem a sua existência própria, a educação inicial não mais poderia ser considerada uma
preparação à vida. A contribuição de Rousseau para a educação infantil é inestimável. O método da natureza
vale para todas as coisas, lembrou às mães a importância da amamentação aos seus filhos. Disse que não se
deveria moldar o espírito das crianças de acordo com um modelo estabelecido. Mostrou que a criança devia
fazer, sem a ajuda dos outros, aquilo que ela é capaz de fazer por si mesma; o período do nascimento aos 12
anos é a época em que nascem vícios, os carinhos exagerados provocam vícios. Rousseau afirmou que a
educação não vem de fora, é a expressão livre da criança no seu contacto com a natureza. Ele foi um crítico da
escola de seu tempo, da rigidez da instrução e do uso em excesso da memória.

Rousseau propôs a criança, primeiro, o brinquedo e desporto. Na agricultura - primeiro e mais útil emprego do
homem -, a criança aprende a usar a pá e os instrumentos de outros ofícios. Através dessas actividades, a criança
estaria mentindo, contando, pesando e comparando. Além dessas tarefas, a linguagem, o canto, a aritmética e a
geometria seriam desenvolvidos como actividades relacionadas com a vida.

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Se Rousseau for analisado no contexto da sua época, teremos de concordar que ele formulou, com raro brilho,
princípios educacionais que permanecem até os nossos dias.

A proposta educacional de Rousseau para as crianças

Rousseau combatia a educação dada às crianças de sua época, que tinha por função refazer a natureza da
criança, que era má e corrupta, de forma a moldá-la dentro das formas tradicionais de agir e sentir, tudo aquilo
que era natural da criança era substituído por um formalismo religioso, social e intelectual (NISKIER, 2001).

Revoltado contra as desigualdades sociais da época, Rousseau pregou um novo evangelho de fé na natureza, no
homem do povo e na capacidade do homem em realizar seu próprio bem na vida. A tarefa desse momento
voltou-se para desencadear um novo ideal na sociedade e restabelecer uma base para a religião natural, que,
acreditavam os naturalistas, era parte essencial da sociedade porque resultante da experiência humana.
Rousseau enfatizava os benefícios da vida primitiva e acreditava ser o progresso uma ilusão. Para ele, o
conhecimento corrompia o homem, e, educacionalmente, tudo dependia da sabedoria do coração, de modo que
a criança não fosse corrompida pelos falsos padrões da sociedade (NISKIER, 2001, p.130).

Rousseau buscava formar o cidadão que seria capaz de atender as necessidades de sua sociedade e transformá-la
por meio da educação. Pretendemos referenciar na obra do autor “Emílio: ou da educação”, a educação proposta
por ele para as crianças da sua época e a forma pela qual deveriam ser ensinadas para viver em sociedade
quando adultas, diferente daquilo que se ensinava.

Rousseau questionava a educação que era dada ao homem, a qual buscava desnaturalizar o homem, tirando dele
aquilo que lhe era natural, inerente ao ser humano, e educando-o para viver em sociedade. O autor acreditava
que não era possível formar o homem e o cidadão de forma única, se formava um ou outro,

Nascemos sensíveis e, desde o nascimento, somos afectados de diversas maneiras pelos objectos que nos
cercam. [...] essas disposições estendem-se e firmam-se à medida que nos tornamos mais sensíveis e mais
esclarecidos; forçadas, porém, por nossos hábitos, elas se alteram mais ou menos segundo nossas opiniões.
Antes de tal alteração, elas são o que chamo em nós natureza. Portanto, é com essas disposições primitivas que
deveríamos relacionar tudo, e isso seria possível se nossas três educações fossem apenas diferentes; que fazer,
porém, se são opostas, se, em vez de educar um homem para si mesmo, queremos educá-lo para os outros? Este
acordo torna-se, então, impossível. Forçado a combater a natureza ou as instituições sociais, é preciso optar

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entre fazer um homem ou um cidadão, pois não se podem fazer os dois ao mesmo tempo (ROSSEAU, 1995,
p.11).

Antes de Rousseau, a tarefa de ensinar a criança se baseava em controlar seus impulsos naturais, substituindo
sua natureza considerada má e corrupta por aquela desejada pelo formalismo religioso, os sentidos eram
considerados enganosos e não poderiam ser utilizados para o ensino (NISKIER, 2001). A criança não era vista,
era entendida como um adulto em miniatura, toda sua natureza era negada de forma a lhe serem inculcados os
valores da vida adulta.

Rousseau foi o primeiro a perceber a diferença entre a mente do adulto e da criança e reconhecer a infância
como idade distinta, e sua pedagogia é naturalista no sentido do autor buscar o homem primitivo, natural,
anterior a tudo quanto é social, neste sentido convém falar do humanismo de Rousseau ao invés do naturalismo
(LUZURIAGA, 1973).

Para Cambi (1999) Rousseau colocou a criança no centro da sua teoria e opôs-se a todas as ideias correntes da
tradição e do seu século. Ainda, elaborou uma nova imagem da infância vista como próxima do homem por
natureza, autónomo, variando as capacidades cognitivas dependendo da fase em que a criança se encontra, e
acreditava que a educação deveria ocorrer de modo “natural”, longe das influências do ambiente social e sob a
direcção de um pedagogo iluminado, que orientasse o processo formativo.

Para Rousseau existem três tipos de mestres ou três educações: a educação da natureza, a educação das coisas e
a educação dos homens. A natureza dá o princípio activo à criança (fazer perguntas e aprender), e não se deve
sufocar esse princípio. A educação pelos livros não é aceita por ele, pois os livros trabalham com ideias prontas
e isso é prejudicial ao indivíduo, não lhe dá a capacidade de reflexão (STRECK, 2004).

A educação é um processo individual e, portanto devem-se respeitar as particularidades de cada um, muitas
vezes o que é bom para um aluno, não é bom para o outro.

Não se conhece a infância; no caminho das falsas ideias que se tem quanto mais se anda, mais se fica perdido.
Os mais sábios prendem-se ao que aos homens importa saber, sem considerar o que as crianças estão em
condições de aprender. Procuram sempre o homem na criança, sem pensar no que ela é antes de ser homem. Eis
o estudo a que mais me apliquei, para que, mesmo que meu método fosse quimérico e falso, sempre se

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pudessem aproveitar minhas observações. Posso ter visto mal o que se deve fazer, mas acredito ter visto bem o
sujeito sobre o qual se deve agir. Começai, pois, por melhor estudar vossos alunos, pois com toda certeza não os
conheceis. (ROUSSEAU, 1995, p, 06).

O autor separa as diferentes idades da criança, acreditando que em cada fase de maturação da criança seria
necessário agir de maneira específica, pois esta tem necessidades diferenciadas em cada etapa da vida, facto
antes negado por seus contemporâneos.

O livro I trata da educação do bebé e o autor cita que a responsabilidade pela educação da criança dos 0 a 2 anos
é de responsabilidade da mãe. Quando a mãe se exime de cumprir seu dever, busca encontrar uma ama-de-leite,
mas Rousseau acredita que três pessoas (mãe, pai e a ama-de-leite) para educar uma criança, já é demais. O que
observa-se no Livro I é a forma como Rousseau valorizou a infância e as peculiaridades desta fase. Neste livro,
ainda, relaciona o papel dos pais na educação dos filhos e como deve ser a relação dos adultos com as crianças,
caracterizando como se dava a educação às crianças desde o nascimento, e dizendo que depois após mimá-las,

Ao nascer, uma criança grita; sua primeira infância passa chorando. Ora a sacodem e a mimam para acalmá-la,
ora a ameaçam e lhe batem para que fique quieta. Ou lhe fazemos o que lhe agrada, ou exigimos dela o que nos
agrada; ou nos submetemos às suas fantasias, ou a submetermos às nossas: não há meio termo, ela deve dar
ordens ou recebê-las. Assim, suas primeiras ideias são as de domínio e de servidão. Antes de saber falar ela dá
ordens, antes de poder agir ela obedece e, às vezes, castigam-na antes que possa conhecer seus erros, ou melhor,
cometê-los. É assim que cedo vertemos em seu jovem coração as paixões que depois imputamos à natureza, e
após nos termos esforçado para torná-la má, queixamo-nos de vê-la assim (ROUSSEAU, 1995, p.21).

Os significados de natureza para Rousseau se referem à oposição aquilo que é social, sobre a valorização das
necessidades espontâneas das crianças e dos processos livres de crescimento e o contacto com um ambiente
físico não urbano (CAMBI,1999).

A função do preceptor, nesta sociedade, para Rousseau é fundamental, uma vez que este formará o cidadão que
irá seguir as leis do seu país e será guiado pelo coração. A educação deveria proporcionar à criança estas
características necessárias ao homem social e deveria iniciar-se desde cedo no seio familiar. Logo a seguir, seria
função do preceptor continuar com a educação da criança. Para Rousseau dos 2 aos 12 anos é o período em que
a pessoa se torna um ser moral. É a ocasião em que a criança passa a ter consciência de si mesma e inicia sua
vida como indivíduo. Neste momento o preceptor entra em cena de forma mais directa, seja para ensiná-la as
regras de boa convivência ou a leitura (STRECK, 2004).

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Rousseau inicia o livro II tratando da questão do choro da criança, mostrando que há o choro normal que é
aquele que é manifesto pela dor que a criança sente e aquele comparado a birra. Para o autor, a criança quando
estava sozinha e se machucava não chorava, só quando tinha certeza de que teria alguém por perto para ouvi-la.
O autor neste livro enfatiza a importância do preceptor para a criança. Para Rousseau a criança deveria aprender
pela própria experiência e não por aquilo que lhe diziam ser certo ou errado. Deveria ser criada livre na
natureza, e não privá-la de sentir dores, pois nem tudo que ela aprende com outra pessoa é o correcto.

O primeiro papel do educador é proteger o seu aluno das influências da sociedade e dos julgamentos dos outros
para que possa desenvolver a capacidade de pensamento e julgamento. O preceptor também deve dar liberdade
à criança, porém sendo necessário estabelecer limites, pois é preciso que ela entenda quem está no comando.
Não é necessário punir a criança e nem ficar fazendo discursos infundados, pois ela aprenderá com sua própria
experiência. Os castigos devem ter finalidades educativas, sendo sempre explicados os seus porquês
(ROUSSEAU, 1995).

A educação proposta por Rousseau para o homem deveria atender tanto ao aspecto físico, intelectual e moral, a
vida afectiva deveria ocupar lugar importante, como a razão. Em suma, a educação deveria ser integral, total,
humana (LUZURIAGA, 1973). Rousseau aponta que tudo que o sujeito não tem ao nascer é aprendido pela
educação, não se deve lamentar o estado da infância, pois a raça humana deve entender que toda a humanidade
teria perecido se não tivesse começado pela infância. Assim, o autor justifica que a educação deveria ser moral e
intelectual, nomeada por ele como educação negativa,

A educação primeira deve, portanto, ser puramente negativa. Ela consiste, não em ensinar a virtude ou a
verdade, mas em preservar o coração do vício e o espírito do erro. Se pudésseis conduzir vosso aluno são e
robusto até a idade de doze anos, sem que ele soubesse distinguir sua mão direita de sua mão esquerda, logo às
vossas primeiras lições os olhos de seu entendimento se abririam para a razão. Sem preconceitos, sem hábitos,
nada teria ele em si que pudesse contrariar o resultado de vossos cuidados. Logo ele se tornaria, em vossas
mãos, o mais sensato dos homens; e, começando por nada fazer, tereis feito um prodígio de educação
(ROSSEAU, 1995, p. 80).

É importante destacar que Rousseau ocupa um lugar central na pedagogia moderna. Para ele, mais importante
do que especificar as matérias a serem dadas aos alunos, é essencial observar e estudar as crianças. De acordo
com Streck (2004) Rousseau inicia o estudo sistemático da infância como parte do estudo do homem e várias
correntes psicológicas e sociológicas da modernidade o tem como precursor.

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A partir de Rousseau a infância passa a ser valorizada e reconhecida como uma época própria da fase do
desenvolvimento do ser humano. Para a autora, o que ainda permanece do pensamento de Rousseau é a ideia de
que a infância é um tempo à parte, separado, que deve ser preservado e resguardado das influências sociais
(MUNIZ, 1999).

TEORIA EDUCACIONAL DE PESTALOZZI

Almeida (2008) destaca ainda que no Século XVIII, no auge da Revolução Francesa, destaca-se a figura de
Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), considerado o “educador da humanidade”.

Influenciado por Rousseau, preocupou-se com a formação do homem natural, contrariamente ao seu antecessor,
buscou unir esse homem à sua realidade histórica. O autor também reagiu contra o intelectualismo excessivo da
educação tradicional, considerando que a força vital da educação estaria na bondade e no amor. Para ele, o
aluno passa da posição passiva para uma posição activa, onde a acção significa: observação, investigação,
colecta de material e experimentação.

O sistema pedagógico de Pestalozzi tinha como pressuposto básico propiciar à infância a aquisição dos
primeiros elementos do saber, de forma natural e intuitiva. Foi considerado um dos precursores da educação
nova que ressaltou a importância de se psicologizar a educação e defini-la em função das necessidades de
crescimento e desenvolvimento da criança. Com isso Pestalozzi inovou os métodos didácticos com o uso do
lápis, lousas individuais, letras do alfabeto em cartões, excursões de observação e colecta de material, instrução
simultânea em classe, também destacou o valor educativo do trabalho manual, bem como a importância da
criança desenvolver destreza prática.

De acordo com Oliveira (2002, p. 14), Pestalozzi em 1774, criou um orfanato para crianças pobres em Stanz, e
defendia que a educação deveria ocorrer em um ambiente o mais natural possível, sob um clima de disciplina
estrita mas amorosa, o que contribuiria para o desenvolvimento do carácter infantil.

Para Pestalozzi a organização da escola era feita da seguinte maneira: uma classe com os que tinham menos de
oito anos, outra com os meninos de oito a onze anos e a terceira com os alunos de doze a dezoito anos.

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Frederick Eby resume com clareza os princípios educacionais de Pestalozzi, relacionados a seguir:

1) Pestalozzi tinha uma fé indomável e contagiante na educação com o meio supremo para o aperfeiçoamento
individual e social. Seu entusiasmo obrigou reis e governantes a se interessarem pela educação das crianças dos
casebres. Democratizou a educação, proclamando ser o direito absoluto de toda criança ter plenamente
desenvolvidos os poderes que Deus lhe havia dado.

2) Psicologizou a educação. Quando não havia ciência psicológica digna desse nome, e embora ele próprio
tivesse apenas as mais vagas noções sobre a natureza da mente humana, Pestalozzi viu claramente que uma
teoria e uma prática correctas de educação deviam ser baseadas numa tal ciência.

3) Foi o primeiro a tentar fundamentar a educação no desenvolvimento orgânico mais que a transmissão de
ideias.

4) Pesquisou as leis fundamentais do desenvolvimento.

5) A educação começa com a percepção de objectos concretos, o desempenho de acções concretas e experiência
de respostas emocionais reais (...)

6) O desenvolvimento é uma aquisição gradativa de poder. Cada forma de instrução deve progredir de modo
lento e gradativo.

7) A religião é mais profunda do que dogmas, ou credos, ou a memorização do catecismo ou das Escrituras.
Pestalozzi exigia que os sentimentos religiosos fossem despertados antes que palavras ou símbolos viessem a
ser levados à criança.

8) Vários recursos metodológicos novos devem sua origem a Pestalozzi. Empregava as letras do alfabeto presas
a cartões e introduziu lousas e lápis. A inovação mais importante foi a da instrução simultânea, ou em classe.
Isso não era novo, mas não havia sido posto em prática de um modo generalizado.

9) Pestalozzi revolucionou a disciplina, baseando-a na boa vontade recíproca e na cooperação entre aluno e
professor.

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 39

10) Deu novo impulso à formação de professores e ao estudo da educação como uma ciência".
Para Pestalozzi a família constitui a base de toda a educação por ser o local em que encontramos o afecto e o
trabalho comum. Afirma também que a experiência religiosa íntima e não-confessional despertam o sentimento
religioso na criança.
 
A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da
criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a
acção da família e da comunidade. (LDB 9394/96, art. 29).

TEORIA EDUCACIONALDE FROEBEL

Viveu na Rússia de 1782 a 1852, sendo destacado como o fundador de Jardins de Infância, enfatizando o amor à
natureza e à criança no processo educacional.

Trabalhou com Pestalozzi por alguns anos, depois, em 1837, abriu o primeiro Jardim de Infância e continuou
durante toda a sua vida a criar estes educandários, à elaboração de métodos e equipamentos para eles e à
formação de professores.

Formalizou os seus próprios princípios educacionais, sendo totalmente independente e crítico, embora tenha
recebido influência de Pestalozzi. Para ele a educação é um processo pelo qual o homem, auto consciente,
desenvolve-se com todos os poderes, funcionando harmoniosa e completamente, tanto em relação à sociedade
como à natureza.

A doutrina de Fröebel foi a da “Parte-Todo” ou da unidade, a qual considera o homem como uma unidade, que
para actuar exige a integração dos órgãos sensoriais, dos músculos, dos nervos com a vontade, raciocínio,
percepção e memória, mas a mesma unidade, cada objecto do Universo, é parte de algo mais geral.

O desenvolvimento, para Fröebel, ocorre em fases que são a infância, a meninice, a puberdade, a mocidade e a
maturidade. Para ele todas possuem a mesma importância.

No Jardim de Infância, por ele criado, o professor era considerado um jardineiro e as crianças plantinhas de um
jardim. As actividades de linguagem, de percepção sensorial e de brinquedo seriam as formas da criança

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 40

expressar-se, enquanto a linguagem oral estaria associada à vida e à natureza. Para ele, os ritmos e o movimento
eram muito importantes, por isto, deu importância ao desenho e à actividade lúdica - o brinquedo.

A preparação para ter uma vontade firme e a instrução eram enfatizadas no período da meninice, que se estende
dos seis aos dez anos.

Valorizou, também, a família, como fez Pestalozzi, cuja função abordaria os planos biológico, religioso,
educacional e social. Captou, sendo neste aspecto o primeiro, o significado da família nas relações humanas.
Constatou, inclusive, o valor dos símbolos para as crianças e, por isto, ressaltou o simbolismo. Para integrar o
crescimento dos aspectos moral, mental e físico, o principal meio é a actividade construtiva. Afirmou, ainda,
que a base para os currículos das escolas deve ser os interesses e as actividades em cada fase da vida da criança.

TEORIA EDUCACIONAL DE HERBART

JOHANN HEINRICH HERBART: (1776-1841) Filósofo, teórico da educação e psicólogo alemão, estudou na
Universidade de Lena, onde foi discípulo de Fichte. Em 1797 esteve na Suíça e visitou a escola dirigida por
Pestalozzi. A partir de 1809, ensinou filosofia e pedagogia na Universidade de Konigsberg. Para Herbart, a
filosofia apresentou a elaboração e a análise da experiência. A lógica tinha por objectivo a classificação dos
conceitos, enquanto a metafísica e a estética referia-se ao conteúdo do pensamento. A análise lógica revelava as
contradições dos conceitos que a metodologia procurava resolver. Como teórico da educação defendeu a ideia
de que o objectivo da pedagogia e o desenvolvimento do carácter moral. O ensino deve fundamentar-se na
aplicação dos conhecimentos da psicologia. Criou o sistema que denominou “instrução educativa”. Esse
sistema, segundo educador brasileiro Lourenço Filho, propõe um ensino que, através de situações sucessivas e
bem reguladas pelo mestre, fortalece a inteligência e, pelo cultivo dela, forma a vontade e o carácter. Herbart
sugeriu que cada lição obedece-se a fases estabelecidas ou passos formais. Seriam eles: o da clareza da
apresentação dos elementos sensíveis de cada assunto; o de associação; o de sistematização; e, por fim, o de
aplicação.

TEORIA EDUCACIONAL DE DECROLY

Decroly, educador belga, ressaltou que a criança deve solucionar os problemas e viver os momentos de
existência infantil plenamente: esse é o destaque que colocou na educação infantil, compreendendo as

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 41

condições do desenvolvimento infantil e não a preparação para a vida adulta, como era o pensamento
educacional em vigor, na sua época.

Decroly ajustou a escola à psicologia da criança, transformando o ensino, sendo que seu método é chamado por
centros de interesse, destinado principalmente aos alunos das classes primárias, porque procura associar os
interesses infantis com os conhecimentos.

Para ele os centros de interesse se modificam com a idade. Isto é, dos três aos seis anos de idade, no Jardim,
através do contacto com o meio. A isto se associava a ideia de conhecimento, pela criança, de defender-se de
perigos e acidentes, de lutar contra as dificuldades, de suas necessidades de se alimentar, de ter alegria e de
trabalhar e agir em grupo. Conhecendo o meio, a criança estaria satisfazendo suas necessidades. Sendo assim, a
sala de aula está presente no dia-a-dia da criança: na cozinha, no jardim, no museu, no campo, na oficina, nas
viagens etc.

Para Decroly, a criança passava por três momentos nos seus centros de interesse: o da observação, o da
associação e o da expressão. A duração dos centros de interesse pode variar muito, até meses, sendo, portanto,
flexível, por motivo da riqueza dos conhecimentos a serem trabalhados.

Não se preocupou em escrever uma obra fundamental, porque pensava, ao expor suas técnicas, que elas
poderiam se cristalizar: preocupou-se mais em apresentar princípios educacionais do que com fórmulas rígidas.

TEORIA EDUCACIONAL DE MONTESSORI

Montessori, educadora italiana, estudou medicina, tendo-se doutorado nesta ciência pela Universidade de Roma,
dedicou-se, a partir dos 25 anos, às crianças anormais na clínica daquela Universidade.

Na Itália, nesta época, vivia-se um movimento da educação nova em oposição aos métodos tradicionais, que
não respeitavam as necessidades e a evolução do desenvolvimento infantil.

Nesse contexto, Montessori fundou a primeira Casa da Criança em 1907, sendo locais de educação e de vida,
não somente de instrução, visando à educação completa da criança. Utiliza um método activo quanto à criação e
a aplicação, tendo como centro as actividades motoras e sensoriais, especialmente na educação pré-escolar,
embora o tenha estendido também à segunda infância. Respeitava as necessidades e a evolução do
desenvolvimento infantil, sendo um método de trabalho individual, embora tenha um cunho social, porque as
crianças, com o grupo social, devem colaborar com o ambiente social.

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 42

Concentrou seus conhecimentos à formação de professores para a educação de anormais. Experimentou em


crianças normais os procedimentos usados na educação de anormais, após observar os defeitos das escolas
comuns.

Da educação terapêutica partiu para as fases de desenvolvimento infantil e as diferenças individuais,


preocupando-se com o corpo e o espírito do aluno e o seu processo de adaptação à vida social. Assim, a “escola
deveria girar em torno do aluno”.

No sistema Montessoriano de educação os ruídos são considerados prejudiciais e, portanto, o silêncio é muito
valorizado. Até o professor não precisa falar alto e a criança fala apenas quando seu trabalho exigir.

Montessori defendeu uma concepção global de educação e, também, deu ênfase à relação da criança com a
natureza, daí, resultando, as ciências que mereceram um papel de destaque.

TEORIA EDUCACIONAL DE WALLON (1879-1962)

Médico francês desenvolveu vários estudos na área da neurologia. Wallon propôs o estudo do desenvolvimento
infantil, contemplando os aspectos da afectividade, da motricidade e da inteligência. Para ele, o
desenvolvimento da inteligência depende das experiências oferecidas pelo meio e do grau de apropriação que o
sujeito faz delas. Assim sendo, os aspectos físicos do espaço, as pessoas próximas, a linguagem, bem como os
conhecimentos presentes na cultura contribuem efectivamente para formar o contexto de desenvolvimento.

Para este educador há uma profunda diferença entre o desenvolvimento da criança e o desenvolvimento do
adulto, porque a transição da infância para a fase adulta envolve uma total transformação do ser humano, bem
como do ambiente no qual a criança está sendo introduzida; é o mundo dos adultos, o que explica uma certa
uniformidade nas estruturas de cada estágio que a criança vive em seu processo de desenvolvimento,
enfatizando nele dois elementos importantes, a imitação e o brinquedo.

Ele destaca as emoções e a linguagem como domínios funcionais no desenvolvimento da criança e como
factores associados a esses domínios enfatiza as questões da confusão entre o EU e os OUTROS e da
descontinuidade no processo de desenvolvimento.

Buscou enfatizar na sua teoria a indissociabilidade entre uma concepção de Sociedade, Educação e Psicologia,
afirmando que o desenvolvimento da criança pode ser visto, tanto por seus atributos inatos quanto como um
reflexo dos valores sociais.

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Para Wallon o desenvolvimento acontece de forma descontínua, sendo marcado por rupturas e retrocessos. A
cada estágio de desenvolvimento há uma reformulação e não simplesmente uma adição ou reorganização dos
estágios anteriores, ocorrendo a interacção entre o sujeito e o ambiente.

TEORIA EDUCACIONAL DE FREINET (1896 – 1966)

Este importante educador, cujo nome completo era Celestin Freinet, nasceu na França, onde viveu toda a sua
vida. Preocupou-se com a modernização da educação e em como melhorar as técnicas a ela aplicadas, para que
se relacionasse com a vida, tendo suas ideias penetrado em todo o mundo.

Introduziu modificações nas salas de aula, como os cantinhos pedagógicos e as “aulas-passeio”. Sendo
professor primário, levava os alunos a observar a natureza e todo o mundo exterior e, depois da “aula-passeio”,
a uma análise dela. Freinet introduziu o texto livre infantil, dando assim a oportunidade para a criança construir,
expressar-se e pensar mediante vivências. Para as crianças pequenas era dado destaque ao desenho, o qual
substituía o texto livre oral. Os melhores desenhos ou textos eram escolhidos por todos e então colocados no
“Livro de Vida”.

Iniciou, também, a correspondência interescolar entre os alunos de sua escola com outra, em Saint Philibert.
Depois houve a troca de produtos da produção agrícola, enriquecendo a experiência anterior.

Esse tipo de actividade enriquecia as aulas constituindo-se em verdadeira cultura. E, em vez de a voz do
professor ser o mais importante, ele se associou a experimentação e à observação. Era adepto da disciplina na
escola e da autoridade do professor, mas para isto enfatizava a necessidade de existir um ambiente humano,
educativo e organizado.

As práticas de ensino propostas por Freinet são fruto de suas investigações a respeito da maneira de pensar da
criança e de como ela construía o conhecimento. Observava muito seus alunos para perceber onde tinha de
intervir e como despertar neles a vontade de aprender. Para Freinet a criança não avança sozinha, sendo assim, a
“cooperação” é um dos pontos fundamentais de sua Pedagogia.

TEORIA EDUCACIONAL DE VYGOTSKY (1986-1934)

Estudioso russo na área de história, literatura, filosofia e psicologia. Vygotsky dedicou-se à docência de 1920 a
1934, auxiliando na constituição de novos laboratórios de investigação, contribuindo para a criação e a

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Filosofia de Educação 2022 44

organização de instituições de atenção às crianças portadoras de necessidades especiais e também escrevendo


cerca de 200 trabalhos científicos.

Vygotsky é o representante principal da tendência que privilegia os pressupostos sócio-históricos ou sócio-


interacionistas, a qual aponta para uma posição oposta à perspectiva evolucionista do conhecimento apontada
por Piaget, pensando, portanto, em uma Psicologia historicamente fundamentada através dos processos de
mudança na história do sujeito. As preocupações de Vygotsky centram-se em buscar quais os aspectos da
dinâmica da cultura e da sociedade que teriam influência no curso de desenvolvimento do sujeito. Vygotsky
procura compreender de que maneira se dá a interferência do mundo externo no mundo interno, ou como a
natureza sociocultural se torna a natureza psicológica.

Vygotsky defende uma abordagem teórica e, consequentemente, uma metodologia que privilegia a mudança. A
cada estágio do seu desenvolvimento a criança adquire os meios para interferir de forma competente no seu
mundo e em si. Destaca a importância da criação e do uso de estímulos auxiliares ou “artificiais”. Através
desses estímulos uma situação inédita e as relações ligadas a ela são alteradas pela intervenção humana activa.
Os homens introduzem esses estímulos auxiliares como uma maneira de adaptar-se activamente. O autor
considera os estímulos como altamente diversificados: eles incluem os instrumentos da Cultura na qual a
criança nasce, a linguagem das pessoas que se relacionam com a criança e os instrumentos produzidos pela
própria criança, incluindo o uso do próprio corpo. Vygotsky enfatiza a importância do brinquedo e da
brincadeira, do faz de conta para o desenvolvimento cultural da criança.

Na sua teoria educacional é necessário enfatizar o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal que significa
a distância entre aquilo que a criança sabe fazer sozinha (o desenvolvimento REAL) e o que é capaz de realizar
com o auxílio de alguém mais experiente (o desenvolvimento POTENCIAL). Dessa forma, o que é Zona de
Desenvolvimento Proximal hoje vira nível de desenvolvimento real amanhã. O bom ensino, portanto, é o que
incide sobre a Zona Proximal.

TEORIA EDUCAIONAL DE PIAGET (1896 – 1980)

Esse educador nasceu na Suíça, realizou profundas pesquisas no desenvolvimento da criança, tendo escrito mais
de 50 livros e monografias, além de centenas de artigos.

Estudou com afinco o processo de adaptação do homem ao meio pelo uso do conhecimento e, por isso, deu
muita importância ao processo de interacção do indivíduo ao meio ambiente, que resulta em estruturas lógicas,

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Filosofia de Educação 2022 45

produzidas pelo indivíduo, que permitem ao ser humano actuar sobre o mundo de formas cada vez mais
complexas e flexíveis. A interacção da criança com a realidade, operando activamente com pessoas e objectos,
impulsiona-a a criar estruturas mentais e adquirir formas de colocá-las em funcionamento.

Para Piaget há vários estágios e períodos do desenvolvimento da inteligência, que caracterizam as formas
diferentes do indivíduo interagir com a realidade, pois é o indivíduo que, desde criança, vai construindo o seu
desenvolvimento mental. Estes estágios, segundo Piaget, são os seguintes: I – de 0 a 2 anos: estágio sensório
motor; II – de 2 a 6 anos: estágio pré-operacional; III – de 7 a 11 anos: estágio de operações concretas; IV – de
12 anos em diante: estágio das operações formais.

- Os conhecimentos sobre as estruturas mentais que se encontram em cada faixa etária e sobre o modo de
funcionamento específico dessas estruturas, em cada fase do seu desenvolvimento, para serem utilizados
pedagogicamente, necessitam de estudo aprofundado.

O modo de raciocinar da criança é diferente do adulto, pois ela não raciocina por dedução ou por indução, mas
por analogia, sendo, também, um ser com uma capacidade adaptativa muito elevada, sob o aspecto tanto social,
como mental, emocional e físico. Seus sentidos captam o concreto com elevada capacidade o que resulta em
descobrir o mundo, portanto, o exercício livre de suas capacidades físicas e mentais é a condição básica e
indispensável ao bom desempenho de sua aprendizagem.

Além disto, a criança pré-escolar é egocêntrica, pensando que tudo existe em função dela, também é incapaz de
manejar ideias abstractas e não tem uma visão panorâmica das coisas.

Quanto à descoberta do real esse não é concebido como algo que se impõe, objectivo e universal existem vários
reais e não um real que se modifica segundo as etapas do desenvolvimento do ser humano. Há um processo
dialéctico, semelhante a uma espiral, na construção do real, no qual há a participação activa do sujeito de uma
forma mais importante do que o objecto, presente ou não. É após o nascimento, através de acções
sensoriomotoras, que se inicia a construção do real, bem como de sua apropriação, completando-se na idade
adulta, quando o ser humano repensa sobre ela, sobre o aqui e o agora, libertando-se dela através da actividade
intelectual abstracta.

Antes de completar quatro anos, conforme a fase do seu desenvolvimento, a criança torna-se capaz de usar
palavras para designar eventos e objectos, de formar símbolos mentais representando objectos reais, de agrupar
objectos de forma rudimentar e, num nível muito simples, de raciocinar. Ela, de acordo com Piaget, aos quatro

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Filosofia de Educação 2022 46

anos, começa a possuir um pensamento intuitivo, entretanto, apesar dos avanços conquistados, encontra
dificuldades em apreender as sequências, a ordem do aparecimento dos acontecimentos, em compreender a
linguagem das outras pessoas e as regras delas e, também, em entender o conceito de número.

Através da sua experiência a criança constrói, a partir do agrupamento rudimentar, critérios classificatórios,
chegando a estabelecer as colecções que correspondem as suas necessidades, cativando seu interesse.

Piaget enfatizou a moralidade autónoma da criança, isto é, que a pessoa torna-se capaz de se governar e, desta
forma, é preciso que a pré-escola compreenda o que as crianças são capazes de realizar e o que não são de
acordo com o estágio do seu desenvolvimento. Como consequência os professores não punirão os educandos,
porém dialogarão com eles a fim de que compreendam os porquês dos seus erros.

A teoria de Piaget, ao enfatizar a actividade do sujeito e a iniciativa do mesmo, nos conduz a adoptar uma
atitude diante da criança que reconhece a sua individualidade, a sua autonomia, permitindo-lhe o uso da
experiência directa e a sua participação na organização da administração escolar o que resultará em torná-la
mais adaptável às transformações da vida, mais apta a enfrentar e a solucionar problemas, a colaborar com os
outros e a tomar decisões.

Por sua teoria psicogenética reconhecer que o processo de desenvolvimento pressupõe uma sucessão de etapas,
Piaget foi um incentivador da educação pré-escolar, dando apoio às acções espontâneas da criança, objectivando
à organização do ato de conhecer voltada à preparação das operações da inteligência, respeitando, ao mesmo
tempo, sua criatividade e sua espontaneidade.

Em resumo as propostas teóricas de Piaget têm como pressupostos básicos o interacionismo, a ideia do
construtivismo sequencial e os factores que interferem no desenvolvimento.

Pretende pelo interacionismo superar as concepções inatistas, por um lado, e as teorias comportamentalistas, de
outro lado. Para ele o desenvolvimento resulta de combinações entre as circunstâncias oferecidas pelo meio e
aquilo que o organismo traz.

De acordo com Kramer (1991) uma pré-escola fundamentada na teoria de Piaget necessita seguir os princípios
básicos que, em geral, orientam a prática pedagógica baseada na teoria deste educador que são:

1. Tudo necessita de acção;

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 47

2. Permitir que a criança expresse seu simbolismo e, portanto, toda actividade na pré-escola deve ser
semiotizada (representada);

3. A pré-escola necessita promover actividades em grupo, possibilitando o desenvolvimento da criança na


interacção e no contacto com outras crianças;

4. Por intermédio da actividade a criança se organiza e, desta forma, a noção de organização é adquirida;

5. Ao criar “problemas” e “dificuldades” para a criança resolver, o professor exerce o papel de desafiador do
educando e a pré-escola passa a ser um espaço criativo, ao invés de ser vista como passatempo, valorizando a
iniciativa, a inventividade e a curiosidade da criança, promovendo a sua autonomia e permitindo a ampliação e
a diversificação de suas experiências. Na pré-escola é essencial haver um clima de expectativas positivas em
relação às crianças, elevando a autoconfiança delas, vencendo os aspectos negativos, para que tenham iniciativa
de experimentar, de descobrir, de se comunicar, etc;

6. As actividades são o eixo central do currículo da pré-escola e, por isto, são integradas às diferentes áreas do
conhecimento humano (ciências sociais e naturais, matemática, linguagem).

Podemos afirmar que a pré-escola, ao adoptar a teoria educacional de Piaget, necessita criar as condições
necessárias para a criança construir o seu conhecimento do real, não através das palavras, mas da acção, de
acordo com a fase do seu desenvolvimento.

A teoria psicogenética de Piaget entende que o processo de desenvolvimento ocorre em etapas, conduzindo-o a
interessar-se pela educação pré-escolar, pois nela há um clima favorável de liberdade de exploração, porque
respeita a criatividade e a espontaneidade da criança, bem como um ambiente rico em desafios. A pré-escola
comporta ensino na medida em que exige uma organização das actividades dos alunos, enfatizando a
necessidade de existir um ambiente humano, educativo e organizado.

Houve muitas modificações na sociedade humana que se reflectiram nos vários enfoques, nas formas de
visualizar a infância e, também, a Educação Infantil. Cada educador contribuiu muito, logo, podemos destacar,
Piaget, Vygotsky e Wallon, os quais tentaram mostrar que a capacidade de aprender se constrói a partir das
trocas estabelecidas entre o sujeito e o meio. As teorias sócio-interacionistas defendem o desenvolvimento
infantil como um processo dinâmico, pois as crianças, não são apenas receptoras das informações, sendo que o
desenvolvimento motor, afectivo, cognitivo, a capacidade afectiva, a sensibilidade, a auto-estima, o raciocínio e
a linguagem acontecem de forma integrada e simultânea.
Elaborado pela docente Gracilia Manso
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Os estudos desses teóricos possibilitaram uma nova compreensão do desenvolvimento infantil, embora nem
sempre concordantes em todos os aspectos. Com o desenvolvimento histórico da sociedade brasileira houve
uma progressiva inserção dela no sistema capitalista e, com ela, mudanças na área educacional, inclusive na
Educação Infantil, gerando as modificações nas políticas educacionais públicas: assim primeiramente
predominou o assistencialismo e depois, ao lado dele, a educação.

A Teoria Educacional de Comenius

JOÃO AMÓS COMÊNIO (1592-1670): É educador tcheco, nasceu na Morávia. Criador de um sistema
educacional que até hoje não foi superado, foi pioneiro do ecumenismo. Estudou teologia e ocupou a reitoria de
um colégio, antes de ser ordenado padre. Vítima da Guerra dos Trinta Anos, passou grande parte de sua vida no
exílio, primeiro na Polónia, onde foi bispo, mais tarde na Suécia, na Prússia e na Holanda, onde veio a falecer.
Superando definitivamente o pessimismo antropológico da Idade Média, com seu optimismo realista Comênio
influenciou as pedagogias das épocas posteriores, fortalecendo a convicção de que o homem é capaz de
aprender e pode ser educado. Seu trabalho está registado em vários livros, entre os quais: Pródromus da
Ponsofia, de 1630, na qual defende a generalização do ensino, subordinado a um órgão de controlo universal,
como meio de pôr fim às guerras; Porta aberta das Línguas, de 1631, onde apresentou um novo método de
ensino do latim por meio de ilustrações e lições objectivas, que foi logo traduzido em 16 línguas; A grande
didáctica, de 1633, em que faz uma tentativa de criar a ciência da educação utilizando os mesmos métodos das
ciências físicas.

As teorias educacionais de Comênio surpreendem pela actualidade. Defendeu-se nelas uma educação que
interpretasse e alargasse a experiência de cada dia e utilizasse os meios clássicos, como ensino da religião e da
ética. O currículo, além das matérias citadas, incluía música, economia, política, história e ciência. Na prática de
ensino, Comênio foi o pioneiro na aplicação de métodos que despertassem o crescente interesse do aluno.

A DEMOCRACIA E A EDUCAÇÃO

O que acabamos de dizer aplica-se, a nosso ver, mutatis mutandis, à relação entre educação e democracia. Em
um contexto sócio-cultural em que a democracia é um valor básico, e o exercício da cidadania democrática é
tido como algo valioso, o processo educacional vai ser visto como (pelo menos em parte) preparação para o
exercício da cidadania democrática, facto que levará, sem dúvida, o sistema educacional a apresentar certas

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 49

características que poderia não apresentar em outros contextos, onde diferentes fossem os valores.
Naturalmente, a democracia, enquanto valor, é plenamente compatível com outros valores, e um processo
educacional que prepara o indivíduo para o exercício da cidadania democrática pode também prepará-lo para o
exercício de uma profissão, para a apreciação das artes, para o gozo dos momentos de lazer, etc.

Voltamos a enfatizar: se não concordamos com os valores de uma determinada cultura, devemos criticar e
combater esses valores, e não condenar o seu sistema educacional por incorporá-los.

A questão difícil que pode ser colocada, entretanto, é como mudar valores sem atuar na educação?

WHITEHEAD

ALFRED NORTH WHITEHEAD (1861-1947): Filósofo, matemático e educador inglês, foi professor em
Cambridge e Harvard. Colaborou com Berthand Russell no monumental livro chamado Principia mathematica .
Whitehead afirmava frequentemente ser mais importante mostrar-se interessante do que estar efectivamente
correcto. A educação só nos tornava maçantes e desinteressantes, quando não atingíamos os objectivos dela.
Insistia muito na imaginação como motor da educação e no novo espírito científico. Em seu livro A ciência e o
mundo moderno mostrou profundo interesse pelo progresso da ciência, concluindo que a ciência podia auxiliar
o progresso da educação. Segundo ele, nenhum aluno poderia terminar o segundo grau ou a universidade sem
dominar o método científico e sem conhecer a história da ciência. Suas ideias pedagógicas, embora tenham
alcançado uma influência limitada na teoria educacional, colocam-no entre os maiores pensadores
neopositivistas contemporâneos.

Todavia, educação não é apenas informação. Alfred North Whitehead (1969, p. 13) já disse com propriedade
que “um homem meramente bem informado é o maçante mais inútil na face da terra.” Se educação é
actualização histórico-cultural, supõe-se que os componentes de formação que ela propicia ao ser humano são
algo muito mais rico e mais complexo do que simples transmissão de informações. Como mediação para a
apropriação histórica da herança cultural a que supostamente têm direito os cidadãos, o fim último da educação
é favorecer uma vida com maior satisfação individual e melhor convivência social.

A educação, como parte da vida, é principalmente aprender a viver com a maior plenitude que a história
possibilita. Por ela se toma contacto com o belo, com o justo e com o verdadeiro, aprende-se a compreendê-los,
a admirá-los, a valorizá-los e a concorrer para sua construção histórica, ou seja, é pela educação que se prepara
para o usufruto (e novas produções) dos bens espirituais e materiais. E tudo isso não se dá como simples
aquisição de informação, mas como parte da vida, que forma e transforma a personalidade viva de cada um,
Elaborado pela docente Gracilia Manso
Filosofia de Educação 2022 50

nunca esquecendo que “cada um” não vive sozinho, sendo então preciso pensar o viver de forma social, em
companhia e em relação com pessoas, grupos e instituições.

A educação se faz, assim, também, com a assimilação de valores, gostos e preferências, a incorporação de
comportamentos, hábitos e posturas, o desenvolvimento de habilidades e aptidões e a adopção de crenças,
convicções e expectativas. Esses elementos nem sempre são passíveis de medição pelos tipos de testes e provas
disponíveis, aferidores de conhecimentos e informações: uma coisa, por exemplo, é responder positivamente a
uma questão sobre a importância da participação política, ou dos aspectos deletérios da corrupção ou do
preconceito racial; outra bastante diferente e muito mais complexa é desenvolver, na vida real, as convicções, as
posturas e os comportamentos adequados a essas verdades.

Mas a educação para a democracia não pode reduzir-se à preocupação com a mera formação egoística do
consumidor que tem direitos, como dá a entender muito discurso estereotipado sobre a formação do cidadão,
especialmente aquele de origem oficial. Como enfatiza Maria Vitória Benevides, ao falar sobre democracia e
ética, lembrando Hannah Arendt, “o que permanece inarredável, como pressuposto básico, como direito
essencial, é o direito a ter direitos.” (Benevides, 1998, p. 168; grifos no original.) Isto implica a necessidade da
efectiva participação na vida pública que, para a mesma Benevides, representa a “expressão maior da cidadania
activa”. Acrescenta ela que isso “significa organização e participação pela base, como cidadãos que partilham
dos processos decisórios em várias instâncias, rompendo a verticalidade absoluta dos poderes autoritários.
Significa, ainda, o reconhecimento (e a constante reivindicação) de que os cidadãos activos são mais do que
titulares de direitos, são criadores de novos direitos e novos espaços para expressão de tais direitos,
fortalecendo-se a convicção sobre a possibilidade, sempre em aberto, da criação e consolidação de novos
sujeitos políticos, cientes de direitos e deveres na sociedade.” (Benevides, 1998, p. 170, grifos meus.)

Se a verdadeira democracia caracteriza-se, dentre outras coisas, pela participação activa dos cidadãos na vida
pública, considerados não apenas como “titulares de direito”, mas também como “criadores de novos direitos”,
é preciso que a educação se preocupe com dotar-lhes das capacidades culturais exigidas para exercerem essas
atribuições, justificando-se portanto a necessidade de a escola pública cuidar, de forma planejada e não apenas
difusa, de uma autêntica formação do democrata. Benevides destaca três elementos que considera
“indispensáveis e interdependentes para a compreensão da educação para a democracia”, os quais retratam com
propriedade o sentido que estamos dando a esse aspecto. São eles:

“1. A formação intelectual e a informação — da antiguidade clássica aos nossos dias trata-se do
desenvolvimento da capacidade de conhecer para melhor escolher. Para formar o cidadão é preciso começar por

Elaborado pela docente Gracilia Manso


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informá-lo e introduzi-lo às diferentes áreas do conhecimento, inclusive através da literatura e das artes em
geral. A falta, ou insuficiência de informações reforça as desigualdades, fomenta injustiças e pode levar a uma
verdadeira segregação. No Brasil, aqueles que não têm acesso ao ensino, à informação e às diversas expressões
da cultura lato sensu, são, justamente, os mais marginalizados e ‘excluídos’.

2. A formação moral, vinculada a uma didáctica dos valores republicanos e democráticos, que não se aprendem
intelectualmente apenas, mas sobretudo pela consciência ética, que é formada tanto de sentimentos quanto de
razão; é a conquista de corações e mentes.

3. A educação do comportamento, desde a escola primária, no sentido de enraizar hábitos de tolerância diante
do diferente ou divergente, assim como o aprendizado da cooperação activa e da subordinação do interesse
pessoal ou de grupo ao interesse geral, ao bem comum.” (Benevides, 1998, p. 167-168)

Essa concepção que releva a importância da participação na vida pública, contemplando a necessidade de
formação para a democracia, é coerente com o pensamento democrático de António Gramsci que, ao criticar o
ensino profissional por preocupar-se apenas com a formação técnica do trabalhador, afirmava que “a tendência
democrática, intrinsecamente, não pode consistir apenas em que um operário manual se torne qualificado, mas
em que cada ‘cidadão’ possa se tornar ‘governante’ e que a sociedade o coloque, ainda que ‘abstractamente’,
nas condições gerais de poder fazê-lo.” (Gramsci, 1978, p. 137)

Certamente, ser governante numa sociedade que leva o conceito de democracia à radicalidade não implica
necessariamente ter um cargo formal de governante. Mais importante do que isso, ao se pensar nas grandes
massas da população, é que diuturnamente o cidadão comum sinta que sua vida está integrada a um todo social
para o qual ele contribui com suas acções, com suas opiniões e sua participação em múltiplas instâncias do
tecido social, em que seus interesses e sua vontade manifesta sejam levados em conta. Mas, para que isso
aconteça é preciso, dentre outras coisas, que ele seja formado para assim agir e interagir. Em termos daquilo que
a escola pode oferecer, parece procedente exigir desta que suas práticas sejam orientadas para esse tipo de
formação. Tudo isso, obviamente, empresta grande relevância a toda investigação que intenta reflectir a respeito
dessas questões e investigar as perspectivas de a escola desempenhar essa função e as dimensões que pode
assumir esse desempenho.

O terceiro ponto diz respeito à necessidade de levar na devida conta a concretude das práticas escolares, com a
clareza de que é dos diversos atores aí envolvidos, e das acções e relações que aí se desenvolvem, que depende
em última instância a realização de qualquer projecto de escola pública de qualidade. Trata-se de, na busca de
objectivos, não perder de vista as mediações necessárias para concretizá-los, o que constitui uma autêntica
Elaborado pela docente Gracilia Manso
Filosofia de Educação 2022 52

questão administrativa, se por administração entendermos a “utilização racional de recursos para a realização de
fins determinados.” (Paro, 1986, p. 18). A esse respeito, embora não seja incomum tratar-se a administração
como uma disciplina essencialmente formal, ocupada meramente com métodos e técnicas e preocupada com o
controle do trabalho alheio, é preciso dar ênfase a sua intrínseca dimensão mediadora, para não perder de vista a
necessária adequação das acções, recursos e processos aos fins perseguidos. No caso da administração escolar,
tenho insistido em que, quando consideradas em sua função de buscar a realização dos fins educativos, tanto as
atividades-meio quanto as atividades-fim que se desenrolam na escola — e não somente as actividades de
direcção — são objecto de estudo da administração escolar.

Daí a importância de, no subsídio a políticas educacionais, se acercar da concretude dos fatos e relações que se
dão no quotidiano da escola fundamental, se se pretende estudar formas de melhorar seu desempenho e propor
políticas que reorientem suas acções. Isso exige investigar a anatomia das práticas pedagógicas e das demais
relações sociais que acontecem no dia-a-dia da escola, de modo a compreender seus problemas, considerar suas
virtudes e avaliar suas potencialidades. Ao mesmo tempo é preciso conhecer a opinião dos atores (professores,
alunos, pais, direcção, demais funcionários), seus interesses e expectativas, sua visão da educação e dos
problemas a ela correlatos, bem como os determinantes de suas posturas e sua disposição para aderir a novas
propostas.

Por isso, é preciso estar atento à relativa negligência com que as políticas públicas educacionais, em geral, têm
contemplado essa questão. Conforme já afirma, na medida em que qualquer proposta educativa escolar só se
efetiva por meio da prática que tem lugar nas escolas, parece evidente que não se pode traçar políticas realistas
de provimento de um ensino de qualidade sem que se considerem as dimensões dessa prática. Na perspectiva de
uma proposta de melhoria da qualidade do ensino, a pesquisa e o conhecimento dessa realidade são necessários,
quer para se considerarem as potencialidades da escola, sabendo-se com que mediações se pode contar para se
conseguir o que se deseja, quer para se identificarem os obstáculos existentes, propondo-se medidas que
modifiquem a própria realidade escolar.

Com relação às pessoas envolvidas no quotidiano escolar, parece que as políticas educacionais têm passado à
margem da opinião, da vontade e da disposição daqueles de quem o ensino depende inquestionavelmente para
ser realizado, quais sejam, os atores da prática educativa escolar, especialmente professores e estudantes. Mas,
convém assinalar que o empreendimento educacional — entendida a educação não como mera passagem de
informações, mas no sentido em que estamos adoptando aqui — não é idêntico a outros empreendimentos do
sistema produtivo convencional, em que é possível relativo rigor no controle do desempenho dos produtores
directos. Em primeiro lugar, porque a separação entre concepção e execução do trabalho não é passível de se
Elaborado pela docente Gracilia Manso
Filosofia de Educação 2022 53

dar com a mesma intensidade e dimensão em que é realizada, por exemplo, na típica empresa produtora de
mercadorias.

No processo educativo, como já demonstrado em outros trabalhos (v., p. e., Paro, 1986), a necessária presença
do saber “enquanto cultura de que se apropria”, e não como mero “saber fazer” (este sim ao alcance da divisão
técnica do trabalho), aliada à condição subjectiva dos elementos envolvidos no processo de trabalho (o próprio
objecto de trabalho – o aluno – é, e precisa ser, sujeito), supõe certa imprevisibilidade das acções e maior dose
de autonomia dos agentes envolvidos, não inteiramente controláveis remotamente, nos moldes da divisão
pormenorizada do trabalho.

Em segundo lugar porque, conforme já realçamos, a qualidade da educação não é passível de verificação
imediata e relativamente rigorosa por meio de mecanismos convencionais de aferição, aplicáveis à maioria dos
produtos postos à venda no mercado. Por esse motivo, no empreendimento educacional, necessita-se, mais do
que em outros sectores, uma significativa adesão dos agentes aos objectivos e às formas de realizá-los. Numa
empresa comum podem-se conseguir produtos de boa qualidade com trabalhadores (produtores) descontentes
(embora menos eficientemente); na escola não: aqui, a não identificação dos agentes com os objectivos
compromete a qualidade dos resultados, fato que pode permanecer oculto, pela dificuldade de avaliação
imediata do produto pelos métodos convencionais.

Parece evidente, portanto, a importância determinante da adesão dos agentes escolares a quaisquer propósitos
que se pretendam atingir por meio da prática escolar. A escassez de estudos sobre essa realidade visando
subsidiar políticas públicas é, assim, uma das razões que justificam investigações que objectivem captar os
determinantes imediatos dos factos e relações que se dão no dia-a-dia da escola bem como aquilatar as
potencialidades dessa realidade e as perspectivas de sua transformação.

A desconsideração desse aspecto tem sido também uma das causas do fracasso de mudanças educacionais ou de
tentativas pontuais de introdução de mecanismos democráticos na escola, visto que “não adianta gerir
democraticamente estruturas antidemocráticas, estruturas excludentes.” (Arroyo, 1996, p. 17) Assim, políticas
públicas comprometidas com objectivos democráticos, constituintes de uma nova qualidade do ensino, não
podem ignorar a necessidade de propor os meios adequados para a realização desses objectivos, dentre os quais
se incluem mudanças na própria estrutura escolar, ou mesmo a instituição de uma estrutura didáctica e
administrativa inteiramente nova. Isto porque, como a prática tem demonstrado, “é impossível assegurar a
democratização da escola sem facultar às unidades escolares condições político-constitucionais favoráveis.”
(Pepe, 1995, p. 106)

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 54

Em síntese, o que parece essencial na defesa da escola pública de qualidade é que esta se refira à educação por
inteiro, não apenas a aspectos parciais passíveis de serem medidos mediante provas e exames convencionais.
Como processo de actualização histórico-cultural, a educação envolve dimensões individuais e sociais, devendo
visar tanto ao viver bem pessoal quanto à convivência social, no desfrute dos bens culturais enquanto herança
histórica que se renova continuamente. A democracia, como meio para a construção da liberdade em sua
dimensão histórica, faz parte dessa herança cultural. Entendida como processo vivo que perpassa toda a vida
dos indivíduos, laborando na confluência entre o ser humano singular e sua necessária pluralidade social, ela se
mostra imprescindível tanto para o desenvolvimento pessoal e formação da personalidade individual, quanto
para a convivência entre grupos e pessoas e a solução dos problemas sociais, colocando-se, portanto, como
componente incontestável de uma educação de qualidade.

Para as políticas públicas em educação isso deve significar uma afirmação radical da função escolar de
formação para a democracia, com projectos e medidas que adoptem essa função de forma explícita e planejada.
Isso implicará, em termos de sua viabilidade, a necessidade de se levar em conta a concretude dos fatos e
relações que se dão no quotidiano da escola, tendo em vista a superação dos obstáculos à mudança e o diálogo
com as potencialidades de transformação que aí se verificam. Por outro lado, para que essa função se realize de
fato, a necessária coerência entre discurso e realidade exige que a organização didático-pedagógica e a estrutura
administrativa da escola se façam de acordo com princípios e procedimentos também democráticos.

JOHN DEWEY
A democracia é um tema central no pensamento de Dewey. Segundo o autor, é ela que supera a dicotomia entre
indivíduo e colectividade e propicia o florescimento da inteligência, já que toda actividade reflexiva está
submetida à experiência de organizar o mundo concreto de acordo com as necessidades da vida humana. A
satisfação dessas necessidades, mesmo em suas dimensões individuais, se dá na vida compartilhada, na
"experiência", da qual surgem os fins colectivos que permitem ao indivíduo desenvolver o espírito de integração
social.

Para compreender o pensamento de Dewey e, especialmente, sua orientação pragmatista, é preciso partir do
significado que atribui à "experiência". Esta é, segundo ele, a própria vida, não existindo separação entre ela e
natureza. A experiência é um modo de existência da natureza. No âmbito da vida humana, a experiência gera
modificações de comportamento, ou seja, gera aprendizagens, mais ou menos conscientes, que modificam as
experiências subsequentes. Em outras palavras, experiências ensejam mudanças que são transformações mútuas
nos elementos que agem uns sobre os outros. Por isso, o autor considera que experiência é aprendizagem, é
Elaborado pela docente Gracilia Manso
Filosofia de Educação 2022 55

transformação, é um modo de existência, não sendo possível dissociar tais elementos. A vida humana é uma teia
de experiências e, portanto, de aprendizagens variadas.

Entretanto, para Dewey, há vários tipos de experiência. A conexão entre a sua fase activa, ou seja, a fase em que
ela é tentativa, e a fase passiva, em que ela é sofrer alguma coisa, é o que dará a medida de seu valor.

Na descoberta minuciosa das relações entre os nossos actos e o que acontece em consequência deles, surge o
elemento intelectual que não se manifestara nas experiências de tentativa e erro. À medida que se manifesta esse
elemento, aumenta proporcionalmente o valor da experiência. Com isto muda-se a qualidade desta; e a mudança
é tão significativa que podemos chamar reflexiva esta espécie de experiência – isto é, reflexiva por excelência.
(Dewey, 1959, p. 159)

Podemos, portanto, segundo o texto, escalonar as experiências, das menos às mais significativas. As mais
significativas, ou "reflexivas", como ele as chama, são aquelas que levam a transformações conscientes e
intencionais nas partes que dela participam. O valor da experiência reside na percepção das relações ou
continuidades a que nos conduz, enfim, nas possibilidades que abre para o pensamento. E as experiências que
levam ao pensamento são as mais significativas para a vida humana.

O pensamento é, segundo o autor, o "discernimento da relação entre aquilo que tentamos fazer e o que sucede
em consequência" (idem, ibid., p. 158). Assim, o "acto de pensar que não se prenda a aumento de eficiência na
acção e a aprender-se mais coisas sobre nós e sobre o mundo em que vivemos, será muito pouco pensamento"
(idem, ibid., p. 167). A educação constitui este processo de contínua reconstrução e reorganização da
experiência, por meio da reflexão. São as experiências "reflexivas" que a escola deve propiciar. Dewey
questiona tanto as concepções que vêem a educação como desenvolvimento de algo previamente existente no
ser, quanto as concepções que a vêem como uma aplicação de forças externas sobre um ser passivo. Para estas
concepções, os fins da educação e a educação em si tornam-se dissociáveis, ou seja, os objectivos a serem
alcançados e os procedimentos para tal são momentos isolados. Para ele, essa dissociação não pode ser feita. Se
viver é educar-se e educar-se é viver, os objectivos educacionais e os processos pelos quais se educa são
indissociáveis. A escola e suas práticas deixam de ser apenas um instrumento para se alcançar objectivos. A
escola passa a ser um ambiente onde se vivem experiências em si mesmas educativas, com significado próprio.
Abandona-se assim o sentido prioritário de preparação para algo que virá depois.

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 56

O contraste essencial da ideia da educação como uma reconstrução contínua, com as outras concepções
unilaterais (...) é que ela identifica o fim (o resultado) com o processo. Verbalmente, isso parece contraditório,
mas só o é verbalmente. Em rigor significa que a experiência como um processo activo prolonga-se no tempo e
que seu período ulterior completa o período antecedente; projecta luz sobre as conexões nele implicadas, mas
até então despercebidas. (Idem, ibid., p. 85)

De acordo com estas ideias, a formalização da educação por meio de uma instituição – a escola – não deve
significar que o fenómeno que dentro dela ocorra seja qualitativamente diferente do fenómeno global de
vida/experiência/aprendizagem que caracteriza a própria condição humana. A educação escolar é uma
necessidade das sociedades complexas e um excelente meio para o desenvolvimento das "experiências
reflexivas". Ela pode actuar como guia ou como direcção, sendo que nunca uma direcção arbitrária, pois
segundo Dewey,

(...) toda direcção é apenas redirecção; ela modifica o rumo da actividade que já fluía, por outro álveo. A não ser
que se conheçam as energias que já se acham a operar, toda a tentativa para dirigir se tornará quase
infalivelmente inútil. (Idem, ibid., p. 11)

Embora a escola seja um ambiente intencionalmente instituído, no qual as aprendizagens são planejadas e
seleccionadas, isto não significa que a forma "natural" da aprendizagem deva ou possa ser rompida. O processo
educacional caracterizado pela integração entre acção, interesse, compartilhamento e pensamento continuará se
realizando da mesma forma e em condições ainda melhores.

Para o pensador americano, é preciso que a vida escolar seja uma selecção daquelas experiências que possam
constituir "modelos vivos" de uma sociedade almejada. Este é um dos pontos mais típicos de seu pensamento (e
também mais contestado) e consiste em imbricar a análise dos fenómenos com a perspectiva de transformá-los.

Sobre isso gostaríamos de ressaltar que nossa disposição, acima anunciada, de reflectir sobre a educação
integral – que nos levou ao pensamento de Dewey –, também imbrica reflexão e perspectiva de transformação.
Tem como objectivo extrair dessa concepção possíveis contribuições ao pensamento e a acção sobre a escola
fundamental brasileira. Trata-se de uma abordagem em si mesma influenciada pela maneira
pragmatista/deweana de pensar. E, tal como o autor adverte no trecho acima, preocupa-nos que não sejam

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Filosofia de Educação 2022 57

proposições surgidas do nada, mas sim redirectivas de algo que já flui, como, por exemplo, o fenómeno social,
que descrevemos na abertura deste texto, de ampliação das funções da escola fundamental brasileira.

Voltando ao autor, destacaremos a seguir sua proposição de transformar a escola em uma "micro-sociedade".
Isso significa propor uma prática escolar onde experiências reais, com fins em si mesmas, e não apenas
"preparatórias", ocorram; onde relações interpessoais se estabeleçam em diversos níveis e onde os aprendizados
científicos e para as vidas pública e privada aconteçam de maneira integrada. Como o pensamento de Dewey
justifica tal proposta?

Segundo ele, a aprendizagem é sempre indirecta e se dá através de um meio social. No caso da escola, um meio
social intencionalmente preparado e, em suas palavras, simplificado e purificado (op. cit., p. 21). Essa noção da
aprendizagem através do meio, o que significa através de vivências e não da transmissão directa e meramente
formal de conhecimentos, é uma das características típicas das diversas concepções de educação integral.
Entretanto, o autor acrescenta que a "grande diferença existirá em permitirmos a acção casual do meio e em
escolhermos intencionalmente o meio para o mesmo fim" (idem, ibid., p. 20).

A casualidade está, portanto, sempre em jogo. Mas também o estão a escolha e a decisão, estas, inevitavelmente
marcadas pelas visões de mundo daqueles que as conduzem. Dewey observa essa questão e afirma que é sobre
uma base mínima de compartilhamento sempre existente que se construirá um padrão de julgamento inicial que,
por sua vez, será também permanentemente transformado desde que a experiência seja mais e mais
comunicável.
Assim, para que o ambiente escolar possa favorecer as "experiências significativas", aquelas que segundo
Dewey são pensamento, deverá este ambiente ser capaz de favorecer o mais diversificado e intensivo
compartilhamento da experiência.

O ambiente escolar, tal como Dewey o prefigura, não está constituído em função de objectivos fechados ou de
projectos pré-determinados, mas em função de esboços de objectivos a se tentar executar. Essas tentativas
modificam o próprio esboço que nunca chega a se cristalizar, pois "o fim em vista não é o alvo, e, sim, atingir-
se o alvo" (idem, p. 114). Seu projecto de escola é fundamentalmente um projecto de comunidade
intersubjectiva, democraticamente estruturada, na qual se possibilitará, por meio da comunicação da
experiência, a construção de alguma identidade colectiva.

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Filosofia de Educação 2022 58

Uma micro-sociedade intencionalmente preparada necessita de uma permanente e intensa troca com a realidade
político-cultural vigente, para que possa actuar como um ambiente de favorecimento da "reconstrução da
experiência". Constituir-se como uma "micro-sociedade" dentro de uma sociedade maior é, ao contrário do que
possa parecer à primeira vista, deixar de ser auto-suficiente e passar a dialogar com as referências das diversas
instâncias desta sociedade maior da qual todos participam. Não se organiza uma "meta-sociedade" sem reflexão
e escolha sobre algum modelo. A própria busca de um modelo para as relações sociais na escola é uma
experiência desencadeadora de "pensamento" no sentido deweano acima exposto.

Entretanto, sem o funcionamento desenvolvido, reflectido e continuamente recriado das vias de comunicação
entre família, sociedade e comunidade escolar, tal micro-sociedade será tão frágil que tenderá a se tornar um
mundo artificial e socialmente insignificante ou a ser engolida pela força da sociedade estabelecida e suas
exigências. Então, a quem poderá ser atribuída a (suposta) sabedoria ou isenção necessária àquela recriação
selectiva das experiências sociais pedagogicamente relevantes? De onde serão retiradas as razões e as
justificativas para considerar alguma experiência relevante pedagogicamente e outra não?

Sobre o autor, Reboul afirma que: a escola é o único lugar onde nos possamos enganar sem que o erro magoe,
ou torne ridículo. E quando Dewey nos diz que o ensino deve estar aberto para a vida, vejo nisso grande
confusão; (...) em sua escola democrática, não estará a criança livre da exploração, da opressão, do implacável
'struggle for life' – protegida da vida? (Reboul, 1985, p. 60).

Ao tentar captar a contradição, Reboul acaba por captar um aspecto fundamental do pensamento de Dewey
sobre educação: Apesar de ser um ambiente intencionalmente preparado e que "protege a criança da vida",
pode, ao mesmo tempo, manter a permeabilidade à vida social mais ampla. Essa possibilidade aumenta na
directa proporção em que permita que, dentro dela, se desenvolvam as experiências reflexivas, isto é, o
aprendizado de que as relações entre os nossos actos e as consequências deles advindas são antecipáveis e que
entre os dois momentos se interpõe a interpretação, o pensamento.

De facto, a nosso ver, a natureza da escola é ambígua. Necessariamente protege, porque controla a qualidade e
quantidade dos elementos da vida social que lhe adentram. Necessariamente expõe porque esses elementos
seleccionados ultrapassam aqueles a que, normalmente, cada indivíduo isoladamente em sua prática social
extra-escolar tem acesso. Se assim não for, a escola perde seu sentido. No caso brasileiro, um dos motivos da
crise de identidade da escola pública reside na incapacidade desta de oferecer uma experiência que vá além das

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Filosofia de Educação 2022 59

experiências individuais não-escolares, isto é, que conquiste a adesão das crianças pela percepção destas de que
a vivência que ali têm é original, insubstituível e enriquecedora.

Quanto ao equilíbrio entre "protecção" e "exposição" na vida escolar, um elemento que, nos parece, favoreceria
o encontro de um ponto ideal seria a recepção pela escola da criança como um ser integral, ou seja, um
indivíduo em suas diversas dimensões. Desta forma estaria a escola balizando a configuração intencional de seu
ambiente em experiências individualmente e socialmente relevantes, e evitando pré-conceitos e cristalizações
que lhe retirariam a capacidade de promover processos significativos de reconstrução da experiência. Uma das
bases da concepção de educação integral é, justamente, esta predisposição de receber os educandos como
indivíduos multidimensionais.

Queremos destacar por fim um aspecto do pensamento de Dewey cuja superação é importante para que se possa
reelaborar a ideia de uma escola que assuma responsabilidades amplas, seja no processo de criação de
disposições permanentes para o pensamento reflexivo, seja no cultivo do gosto estético, do desenvolvimento
moral, ou da formação de atitudes práticas. Parece evidente que está embutida em seu pensamento a convicção
de que há uma inexorável tendência ao aumento das formas conscientes e racionais de existência. A história da
civilização, entretanto, tem se incumbido de relativizar tal convicção. O desenvolvimento científico, por
exemplo, tão caro a Dewey e aos reformistas da escola em geral, não tem apontado necessariamente na direcção
de uma vida melhor para a humanidade. O aumento das "formas racionais" de existência não leva
necessariamente à solidariedade, à justiça, a uma vida social em permanente aperfeiçoamento.
É nesse ponto que o pensamento de Habermas oferece elementos para um aprofundamento de nossa temática.

PAULO FREIRE

No livro Historia de la Decadência y Caída del Império Romano, Edward Gibbon explica como o Império –
antes da queda se sustentou em três eixos fundamentais: i) a manutenção da paz pela via da preparação da
guerra; ii) a unificação cultural por meio do estabelecimento de uma língua comum; iii) a extensão da cidadania
a todos os povos que eram conquistados e submetidos. Com certa ironia – e, possivelmente, alguma maldade –
Gibbon afirma, relativamente a este último eixo, que houve um momento em que, para contentar os
conquistados, tinham sido produzidos demasiados cidadãos romanos. Foi então decidido que se deveria: a)

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Filosofia de Educação 2022 60

dividir os cidadãos em classes, que seriam diferentes entre si e que gozariam de direitos e privilégios distintos;
b) repensar os critérios de concessão da cidadania, apostando em categorias mais restritivas.

Se não tivéssemos citado o trabalho de Gibbon, possivelmente poderíamos pensar que estávamos a falar dos
nossos tempos, dado que os três eixos e as duas subdivisões de cidadania que Gibbon aponta são actuais. De
resto, assistimos neste momento a um esforço de diversificação dos processos de formação da cidadania que,
apesar da sua inovação, estão longe de alcançar as finalidades de uma educação cidadã.

Autores como Hardt e Negri recuperaram de alguma forma essa noção de Império para explicar as
circunstâncias actuais da cidadania. Assinalaram, por exemplo, que um dos elementos essenciais desta
nova/velha norma imperial se relaciona com a exploração que asfixia toda a vida social e pessoal, a vida laboral
e afectiva das mulheres e dos homens. Uma exploração que não é só física – como no caso da escravidão – ou
económica – como nas sociedades fordistas tradicionais –, mas que é sobretudo alienadora da capacidade de
criação que as mulheres e os homens possuem.

O Império diverso no qual hoje vivemos – tal como o Império Romano – tem revelado uma outra essência
normativa - a homogeneização, a criação de uma única identidade cultural homogénea que é de facto diversa e
uniforme. Desta forma, os e as intelectuais ao serviço do Império – aqueles que Gramsci designou de
intelectuais orgânicos ou que Said chamou de orientalistas – ou ao serviço dos regimes imperialistas que
existiram desde o século XVIII constroem a ideia de que certos grupos e certas pessoas são superiores e outros,
que integram outras mulheres e outros homens, são inferiores. Estas distinções são apresentadas como se da
ordem natural das coisas se tratasse: “Todos os acontecimentos que se atribuem à histórica revolta árabe
reduzem-se às experiências de Lawrence e no que a ela dizem respeito” afirma Said, quando se refere à obra
escrita por Lawrence da Arábia.

Este mecanismo imperial é hoje utilizado em todos os domínios da vida e, nomeadamente, da educação. Por
exemplo, prescreve-se – graças à aprendizagem ao longo da vida – o que deve ser ensinado e aprendido e
utilizam-se processos de educação e aprendizagem para controlar e desvirtuar o desejo e a criatividade das
multidões que querem estudar, aprender e construir uma educação que responda aos seus desejos de liberdade e
potencie a criatividade social e a cooperação.

Por esta razão, devemos recuperar alguns autores como Raymond Williams, António Gramsci, já aqui
mencionado, e Paulo Freire; aliás este último apontou as representações culturais como um aspecto fundamental
para a educação – no fundo, o desenho, por assim dizer, que nos fazem da realidade. Esta realidade, marcada e
construída para ser pensada de uma determinada forma, é definida pelas construções simbólicas imperiais que
delimitam a realidade que se constitui nas relações entre mulheres e homens. Williams assinalava este facto

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Filosofia de Educação 2022 61

com clareza: “Penso que os sistemas de significados e valores que a sociedade capitalista gerou têm que ser
derrotados, em geral e em particular, por uma forma de trabalho educacional e intelectual sustentada. Este é
um processo cultural que designo de “Grande Revolução” e, quando digo “Grande Revolução”, refiro-me a
uma genuína luta na batalha pela democracia e pela vitória económica da classe operária organizada”.

Trata-se portanto de instituir e organizar processos educativos, culturais e sociais que ajudam a construir uma
cidadania real e efectiva – que estão para lá dos direitos políticos, mas que incluem os direitos sociais,
ambientais, produtivos, económicos, etc. Esta cidadania deverá permitir a derrota do modelo de significados que
vigora neste momento; deverá por tal favorecer a expansão do desejo e da vida das multidões a partir de um
marco diferente, mediante acções educativas, éticas e políticas resistentes e criativas. Como referia Lazzarato,
estas acções contemplam e realizam “as condições de cooperação entre cérebros, pois o acto de resistência
actua contra o poder, mas deve ser ao mesmo tempo um acto de criação, de invenção, que actua no plano da
proliferação dos possíveis”.

Configuram uns territórios numas comunidades e uns dispositivos nos quais estão em jogo (e no lugar de) uma
outra democracia, substantiva e absoluta, e uma outra cidadania, activa, radical suportada por uma educação,
emancipadora e dialógica. Enfim, uma educação que permita sustentar uma cidadania activa, crítica e
emancipadora, que possa favorecer a edificação de democracias mais atentas aos direitos e aos deveres, às
oportunidades de aprendizagem e de formação e à vida.

Se é a transformação que queremos provocar no mundo, devemos iniciar acções que impliquem “A construção
de poderes democráticos (como) alternativa real desde o ponto de vista da pessoa e da comunidade”, que
suponham real e actualmente o “Poder democrático na cidade, na escola, na fábrica, levando à construção de
relações sociais novas e equilíbrios de poder distintos”? Aqui e agora, agora e aqui: educação, cidadania e
democracia.

IVAN ILLICH
Seu livro mais famoso é Sociedade sem escolas (1971), uma crítica à institucionalização da educação nas
sociedades contemporâneas. Através de exemplos sobre a natureza ineficaz da educação institucionalizada,
Illich se mostrava favorável à auto-aprendizagem, apoiada em relações sociais intencionais, e numa
intencionalidade fluida e informal:

A educação universal por meio da escolaridade não é possível. Nem seria mais exequível se se tentasse
mediante instituições alternativas criadas segundo o estilo das escolas actuais. Nem novas atitudes dos

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 62

professores para com os seus alunos, nem a proliferação de novas ferramentas e métodos físicos ou mentais (nas
salas de aula ou nos dormitórios), nem mesmo a intenção de aumentar a responsabilidade dos pedagogos até ao
ponto de incluir a vida completa dos seus alunos, teria como resultado a educação universal. A busca actual de
novos canais educativos deverá ser transformada na procura do seu oposto institucional: redes educativas que
aumentem a oportunidade de cada um transformar cada momento da sua vida num outro de aprendizagem, de
partilha e de interesse. Acreditamos estar a contribuir trazendo os conceitos necessários a quem realiza tais
investigações sobre as grandes linhas na educação – e também para quem procura alternativas para outros tipos
estabelecidos de serviços.

As últimas frases deixam claro o que o título do livro sugere, que a institucionalização da educação marca uma
tendência de institucionalização da sociedade, e as ideias de desinstituicionalização da educação poderiam ser
um ponto de partida para a desinstitucionalização da sociedade.

Como pensador holístico, de inteligência formidável e erudição católica ampla, Illich sempre propôs as suas
análises nos termos mais amplos possíveis. O livro é mais do que apenas uma crítica, contém propostas para
reinventar toda a aprendizagem em várias instâncias da sociedade e também na esfera individual. Possui
destaque a sua proposta, feita em 1971, de criar as "redes de aprendizagem" ("telarañas de aprendizaje")
apoiadas em tecnologias avançadas. Muitas das características das "redes de aprendizagem" recordam o uso da
internet em geral e em particular o trabalho e idéias da própria Wikipedia.

A obra de Ivan Illich compreende numerosos temas da relação entre o indivíduo, a sociedade com a ciência e a
técnica. "Não há movimento de verdadeira libertação que não reconheça a necessidade de adoptar uma
tecnologia de baixo consumo energético."

"Diga-me a que velocidade se move e te direi quem és? Se não pode contar com seus próprios pés para se
locomover, é um marginal, porque o veículo se converteu em símbolo da segmentação social e em condição
para a participação da vida social. Ao conseguir propiciar aos motoristas a quebra de uma nova barreira de
velocidade a indústria do transporte está patrocinando, inevitavelmente, novos privilégios para uma minoria e
agonia para a maioria."

"Chegou a hora de tirar das mãos do médico a seringa, como se tirou a pena das dos escritores durante a
Reforma. A maioria das doenças que temos hoje em dia podem ser diagnosticadas e tratadas por pessoas

Elaborado pela docente Gracilia Manso


Filosofia de Educação 2022 63

comuns. Para a maioria essa declaração é muito difícil de ser aceita, porque a complexidade do ritual médico
lhes ocultou a simplicidade de seus próprios instrumentos básicos..."

"A escola parece estar destinada a ser a igreja universal de nossa cultura em decadência..." "A escola é um rito
iniciático que introduz o neófito à carreira sagrada do consumo progressivo..."

Email.graciliamanso@gmail.com
Tel: 829673795

Elaborado pela docente Gracilia Manso

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