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CHICO

BUARQUE
texto original

SERGIO
BARDOTTI

ilustrações

música

LUIS ENRIQUEZ
BACALOV
© Autêntica Editora. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução.

i n f or m aç õe s pa r a t e x t ua i s

OS SALTIMBANCOS
Este livro é uma peça de teatro inspirada na fábula Os músicos de Bremen, dos Irmãos
Grimm. Conta a história de quatro animais: um burro, um cão, um gato e um galo que,
velhos e inúteis, são maltratados por seus donos. O jumento não aguenta mais carregar
peso sem ter recompensa; o cachorro está muito velho para guardar a casa; a galinha não

ÃO
consegue mais botar ovos; e a gata está cansada de servir como companhia de luxo para
a patroa. Os quatro se juntam e partem para a cidade de Bremen em busca do sonho de


se tornarem artistas. Na verdade, estão deixando para trás a brutalidade e a injustiça que
sofrem por parte de seus “patrões” e indo em busca da liberdade. No meio do caminho,
enfrentam uma aventura perigosa e, juntos, descobrem uma nova forma de viver.
OD
OS AUTORES | Sérgio Bardotti nasceu na Itália em 1939. Compositor premiado, criou
canções de sucesso da música popular italiana e trilhas sonoras de filmes. Foi parceiro de
PR
Chico Buarque, Toquinho e Vinicius de Moraes, e é considerado um dos responsáveis
pela divulgação da música brasileira na Itália. Com Luis Bacalov, criou o musical infantil
I musicante, traduzido e adaptado para o Brasil por Chico Buarque como Os saltimbancos.
RE

Bardotti faleceu em 2007, em Roma.

Luis Enriquez Bacalov é um famoso pianista, compositor, arranjador e diretor de or-


A

questra. Nasceu na Argentina em 1933 e se mudou para a Itália em 1959, onde mora
até hoje.
DA

O TRADUTOR/ADAPTADOR | Chico Buarque nasceu no Rio de Janeiro em 1944. Com-


positor de grandes sucessos, cantor e escritor, é conhecido no Brasil e no exterior como
BI

um dos nossos maiores artistas. Já ganhou vários prêmios com livros para adultos e para
crianças, como Chapeuzinho Amarelo, em parceria com Ziraldo. Chico mora no Rio de
OI

Janeiro e continua compondo, escrevendo e cantando.

O ILUSTRADOR | Ziraldo nasceu em Caratinga, Minas Gerais,


PR

em 1932. Pintor, cartazista, jornalista, teatrólogo, chargista, ca-


ricaturista e escritor, sua fama começou na década de 1960 com
A turma do Pererê, sua primeira revista em quadrinhos. É autor
de O menino maluquinho, um dos livros mais lidos pelas
crianças do Brasil. Além dos próprios livros, ele ilustrou
também livros clássicos da literatura infantil brasileira.
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M OS MÚSICOS DE BRE
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SERGIO BARDOTTI G

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T R A D U Ç Ã O E A D A P TA Ç Ã O
CHICO BUARQUE


MÚSICA
LUIS ENRIQUEZ BACALOV

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I LU S T R A Ç Õ E S D E

10 a EDIÇÃO ∙ 2 a REIMPRESSÃO
© Autêntica Editora. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução.
Copyright © Francisco Buarque de Holanda, Luis Enriquez Bacalov e herdeira de Sergio Bardotti
Copyright das ilustrações © Ziraldo Alves Pinto
Copyright © 2017 Autêntica Editora

Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora. Nenhuma parte desta publicação
poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópia xerográfica,
sem a autorização prévia da Editora.

editora responsável
Maria Amélia Mello
editora assistente
Cecília Martins
assistente editorial
Rafaela Lamas

ÃO
capa e ilustrações
Ziraldo
revisão
Maria Theresa Tavares
Carla Neves


diagramação
Diogo Droschi

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
A

Bardotti, Sergio
Os saltimbancos / Sergio Bardotti ; tradução & adaptação, Chico Buarque ;
música, Luis Enriquez Bacalov ; ilustrações Ziraldo. – 10. ed. – 2. reimp. – Belo
Horizonte : Autêntica Editora, 2018.
DA

"Fábula musical inspirada em Os músicos de Bremen, dos irmãos Grimm"

ISBN: 978-85-513-0108-1
BI

1. Ficção - Literatura infantojuvenil I. Buarque, Chico. II. Bacalov, Luis


Enriquez. III. Ziraldo. IV. Título.
OI

16-07214 CDD-028.5

Índices para catálogo sistemático:


1. Ficção : Literatura infantil 028.5
PR

2. Ficção : Literatura infantojuvenil 028.5

Autêntica Editora LTDA.


Rua Carlos Turner, 420
Silveira . 31140-520
Belo Horizonte . MG
Tel.: (55 31) 3465-4500
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A
encenação começa com a música Bicharia (em off ), cujo texto está
na página 32. O jumento, sozinho no palco, diz:
Jumento – Eu, eu sou um jumento. Não sou bicho de estimação.
Não tenho apelido, não tenho nome, nem estimação. Sou jumento e
pronto. Na minha terra também me chamam de jegue. E me botaram pra trabalhar
na roça a vida inteira. Trabalhar feito jumento. Pra no fim... nada.
Minha pensão, nenhuma cenoura. Acho que é por isso que às vezes me chamam

ÃO
de burro. Eu não me incomodo. Mas outro dia, eu estava subindo um morro com
quinhentos quilos de pedra no lombo. Estava ali, subindo, quando um pai d’égua
disse assim: “Mas que mula preguiçosa, sô!”. Fui ver, e a mula


era eu. Aí eu parei – “Mula? Ah! É demais” – e resolvi dar no
pé. Tomei a estrada que leva à cidade e fui seguindo, naquela
humilhação, naquela escuridão, naquela solidão que nem sei.
OD
Não sou disso não, mas me deu uma vontade retada
de chorar... e chorar e chorar aos soluços.
PR

E pensava com meus borbotões:


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O JUMENTO
Jumento não é,
jumento não é,
o grande malandro da praça.

ÃO
Trabalha, trabalha de graça.
Não agrada a ninguém,
nem nome não tem,


é manso e não faz pirraça.
Mas quando a carcaça ameaça rachar,
OD
que coices, que coices,
que coices que dá.
O pão, a farinha, o feijão, carne-seca,
PR
quem é que carrega? Hi-ho.
O pão, a farinha, o feijão, carne-seca,
limão, mexerica, mamão, melancia,
RE

quem é que carrega? Hi-ho.


O pão, a farinha, o feijão, carne-seca,
limão, mexerica, mamão, melancia,
A

a areia, o cimento, o tijolo, a pedreira,


quem é que carrega? Hi-ho.
DA

Jumento não é,
jumento não é,
BI

o grande malandro da praça.


Trabalha, trabalha de graça.
OI

Não agrada a ninguém,


nem nome não tem,
PR

é manso e não faz pirraça.


Mas quando a carcaça ameaça rachar,
que coices, que coices, que coices que dá.
Hi-hooooooooooooooooooooo.

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Jumento – Pois é, onde que eu estava mesmo? Ah! Estava indo pra cidade.
“E fazer o que na cidade?” – eu pensava. Quando alguém não sabe fazer
mais nada, nada mesmo, pode ser artista. Hoje todo mundo canta, como
dizem aqueles que não sabem cantar. Então eu estava ali andando,
quando, de repente, quem é que eu vejo escondido no barranco da
estrada? Um pobre cachorro. Estava mesmo a perigo, todo roto, todo
esfarrapado, parecia que tinha chegado da guerra. Estava dormindo e
tinha sonhos terríveis, pesadelos de cão.
Jumento – Ei, cachorro, ei, cachorro, acorda. Um, dois, três.

ÃO
Cachorro – Sim, senhor, é pra já.


UM DIA OD
DE CÃO Apanhar a bola-la,
estender a pata-ta,
Sim, senhor.
Cão policial,
PR
sempre em equilíbrio-brio, sempre estou
sempre em exercício-cio. às ordens, sim, senhor.
Corre, cão de raça,
RE

Bobby, Lulu,
corre, cão de caça, Lulu, Bobby,
corre, cão chacal. Snoopy, Rocky,
Sim, senhor.
A

Rex, Rintintin.
Cão policial,
Bobby, Lulu,
sempre estou
DA

Lulu, Bobby,
às ordens, sim, senhor.
Snoopy, Rocky,
Bobby, Lulu,
BI

Lulu, Bobby, estou às ordens


Snoopy, Rocky, sempre, sim, senhor.
OI

Rex, Rintintin. Fidelidade


Lealdade eterna-na, à minha farda,
PR

não fazer baderna-na, sempre na guarda


entrar na caserna-na, do seu portão.
o rabo entre as pernas-nas. Fidelidade
Volta, cão de raça, à minha fome,
volta, cão de caça, sempre mordomo e
volta, cão chacal. cada vez mais cão.

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Jumento – Acabou? Calma, companheiro, eu não sou teu patrão.


Cachorro – Como, senhor? Vossa Excelência não quer ser meu patrão?
Jumento – Deixa disso, eu sou um pobre coitado, sou um pau de arara.
Cachorro – Sim, senhor, pau de arara, às ordens, em que posso servi-lo?
Onde quer que o leve?
Jumento – Não me leve a lugar nenhum, rapaz. Eu vou à cidade.
Vou procurar emprego como músico. Você também pode vir.
Dois animais cantando juntos, acho que vai ser a maior sensação.

ÃO
Aparece a galinha.

Galinha – Có, có, có, có, có, có. Três animais cantando juntos, acho que vai ser


mais fantástico. Vocês me levam também?
Jumento – O quê? Uma galinha?
Cachorro – Bom-dia, Vossa Galinência.
Galinha – Có, có, como vão, companheiros? OD
Jumento – Já vi tudo, você também fugiu, né?
PR
Galinha – E como não?
Jumento – Por quê?
Galinha – Não consigo mais botar ovos.
RE

A GALINHA
A
DA

Todo ovo de noite, É esse o meu troco


que eu choco só sonho por anos de choco.
BI

me toco gemada. Dei-lhe uma bicada


de novo. A escassa produção e fugi, chocada.
OI

Todo ovo alarma o patrão. Quero cantar


na ronda,
é a cara, As galinhas sérias
PR

na crista
é a clara jamais tiram férias.
da onda.
do vovô. “Estás velha, te perdoo, Pois um bico a mais
Mas fiquei tu ficas na granja só faz mais feliz
bloqueada em forma de canja.” a grande gaiola
e agora, Ah!!! do meu país.

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Jumento – Bom, já que você quer ser uma cantora,


pode entrar no nosso conjunto, afinal, para
uma galinha, até que você, bem... é bem-apanhada.
Certo, cachorro?
Cachorro – Apanhadíssima. Vossa Galinidade.

ÃO
Galinha – Obrigada, vamos lá então.
Jumento – Sabe o que eu digo a vocês? Começo a me sentir
melhor, agora que somos três.


Aparece a gata.

Gata OD
– Qua-qua-quatro. Somos quatro.
Cachorro – Epa, quem falou? Quem está aí?
PR
Gata – Estou aqui na árvore. Sou uma gatinha.
Cachorro – Au, au, au.
Jumento – Calma, cachorro, espere aí e não faça
RE

mais isso, entendeu?


Cachorro – Sim, sim, senhor jumento.
A

Jumento – Primeira lição do dia: “O melhor amigo do bicho é


o bicho”. E você, gata, desce da árvore.
DA

Gata – Nãoooooooooooooo, depende do programa.


Galinha – Nós vamos à cidade, vamos fazer um conjunto.
BI

Você também sabe cantar?


Gata – Ah! Sim, infelizmente!
OI

Jumento – Como? Infelizmente?


Gata – Porque fazer um som não foi nada joia pra mim.
PR

Cantar uma música me custou muitíssimo.


Jumento, Galinha , Cachorro – Ah! Conta.

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HISTÓRIA
DE
UMA
GATA

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Me alimentaram, Senhor, senhora, senhorio,
me acariciaram, felino, não reconhecerás.
me aliciaram, De manhã eu voltei pra casa,


me acostumaram. fui barrada na portaria,
O meu mundo era o apartamento. sem filé e sem almofada,
Detefon, almofada e trato, por causa da cantoria.
todo dia filé-mignon
ou mesmo um bom filé... de gato.
OD Mas agora o meu dia a dia
é no meio da gataria
Me diziam, todo momento: pela rua virando lata.
PR

Fique em casa, não tome vento. Eu sou mais eu, mais gata,
Mas é duro ficar na sua numa louca serenata,
RE

quando à luz da lua que de noite sai cantando assim:


tantos gatos pela rua Nós, gatos, já nascemos pobres,
toda a noite vão cantando assim: porém, já nascemos livres.
A

Nós, gatos, já nascemos pobres, Senhor, senhora, senhorio,


porém, já nascemos livres. felino, não reconhecerás.
DA
BI
OI

Jumento – Àquela altura da estrada, já éramos quatro amigos.


Queríamos fazer um conjunto? Bem. Queríamos ir juntos à cidade?
PR

Muito bem! Só que à medida que íamos caminhando, quando


começamos a falar dessa cidade, fui percebendo que os meus amigos
tinham umas ideias muito esquisitas sobre o que é uma cidade.
Umas ideias atrapalhadas, cada ilusão, negócio de louco.

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A
CIDADE
IDEAL
Cachorro – A cidade ideal dum cachorro Tem sardinha num bonde de lata,
tem um poste por metro quadrado. tem alcatra no final da linha.

ÃO
Não tem carro, não corro, não morro,
e também nunca fico apertado. Jumento – Jumento é velho,


Galinha – A cidade ideal da galinha velho e sabido,
tem as ruas cheias de minhocas. e por isso já está prevenido.
A cidade é uma estranha senhora
A barriga fica tão quentinha
que transforma o milho em pipoca. OD que hoje sorri e amanhã te devora.
Crianças – Atenção que o
Crianças – Atenção porque nesta cidade
PR
jumento é sabido,
corre-se a toda velocidade
é melhor ficar bem prevenido,
e atenção que o negócio está preto,
e olha, gata, que a tua pelica
RE

restaurante assando galeto. vai virar uma bela cuíca.


Todos – Mas não, mas não, Todos – Mas não, mas não,
o sonho é meu e eu sonho que o sonho é meu e eu sonho que
A

deve ter alamedas verdes, deve ter alamedas verdes,


a cidade dos meus amores. a cidade dos meus amores.
DA

E, quem dera, os moradores E, quem dera, os moradores


e o prefeito e os varredores e o prefeito e os varredores
BI

fossem somente crianças. e os pintores e os vendedores


Deve ter alamedas verdes, fossem somente crianças.
OI

a cidade dos meus amores. Deve ter alamedas verdes,


E, quem dera, os moradores a cidade dos meus amores.
PR

e o prefeito e os varredores E, quem dera, os moradores


e os pintores e os vendedores e o prefeito e os varredores
fossem somente crianças. e os pintores e os vendedores,
as senhoras e os senhores
Gata – A cidade ideal duma gata e os guardas e os inspetores
é um prato de tripa fresquinha. fossem somente crianças.

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Jumento – Então, vamos começar os ensaios?


Cachorro – Sim, senhor maestro.
Galinha – Vamos.
Gata – Falou, bicho.
Jumento – Ótimo, vocês conhecem as notas?
Cachorro – Sim, senhor, conheço duas.
Galinha – Eu conheço três.
Gata – Eu? Umas trinta e nove.

ÃO
Jumento – Eh! Ainda bem que o burro aqui sou eu. Vamos ao trabalho,
eu toco a escala e vocês cantam as notas, tá?
Galinha – Dó, tem dó, quem viveu junto, não pode nunca viver só.


Cachorro – Ré, reza uma prece, ave-maria...
Galinha – Mi, milho verde, milho verde...

OD
Gata – Fá, faró, faró, faró, faró, fá, fá, fá.
Cachorro – Sol, ó sol, tu que és o rei dos astros.
Galinha – Lá, lava roupa todo dia, que agonia.
PR
Gata – Si, siiiiiiiiiiiii...
Jumento – Tá certo, já entendi, vamos desistir.
Gata – Ah! Não, a gente ‘tava só brincando!
RE

Jumento – Brincando, brincando, isso aqui é música.


Galinha – Ah! Vamos tentar de novo?
Jumento – Tá bem, repitam comigo, dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó.
A
DA
BI

MINHA Dorme a cidade.


Resta um coração
Doce a música
silenciosa,
OI

CANÇÃO misterioso,
faz uma ilusão,
larga o meu peito,
solta-se no espaço,
PR

soletra um verso, faz-se certeza,


larga melodia, minha canção.
singelamente, Réstia de luz onde
dolorosamente. dorme o meu irmão.

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OD
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A POUSADA
DO
A

BOM
– Vamos tratar uma hospedagem pra
Todos
DA

descansar e seguir viagem.

BARÃO que se chama Pousada do Bom Barão.


– Olha que linda aquela pensão,
Gata
BI

Jumento – Pra mim, esse nome, não sei não.


OI

Galinha – Já ‘tou por aqui de tanto barão.


Gata – Mas vamos, mas vamos, não custa tentar.
PR

É só pr’uma noite e depois se mudar.


Cachorro – Ai, ai, ali tem uma placa
que cheira a uma bruta urucubaca.
Todos – Proibida a entrada.
Exijo gravata e dados pessoais.
Proibido aos mendigos e aos animais.
Ahhhhhhhhhhhh!!!

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Jumento – Puxa, puxa, que desacato,


eu, afinal, sou jumento ou rato?
Cachorro – Poxa, poxa, que desrespeito,
se duvidar, eu entro no peito.
Galinha – Cacilda, cacilda, que bela tramoia,
já ‘tava pensando numa boa boia.
Gata – Que bode, que bode, mas isso é o fim,
parece que todos ‘tão contra mim.
Crianças – Tentem olhar ali pela janela,

ÃO
quem sabe não tem ninguém dentro dela,
e se for assim, vocês podem entrar,
fazer uma boca e depois se arrancar.


OD
PR
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Jumento – Puxa, puxa, o que é que estou vendo?


Vivendo e aprendendo, vivendo e aprendendo.
Tem quatro pessoas naquele salão,

ÃO
e uma das quatro é o meu patrão.
Cachorro – Poxa, poxa, vejam vocês:


é o meu patrão já co’os outros três.
Gata – Que grilo, que grilo, não é uma boa,
aquela coroa é a minha patroa.
OD
Galinha – Cacilda, cacilda, coisa de maluco,
é o meu patrão que tá co’o trabuco.
PR
Crianças – Caramba, caramba, como é que é,
eu acho que é hora de dar no pé.
Pra quem não quiser entrar de gaiato,
RE

o melhor negócio é dormir no mato.


Todos – Caramba, caramba, como é que é,
eu acho que é hora de dar no pé.
A

Pra quem não quiser entrar de gaiato,


DA

o melhor negócio é dormir no mato.


Jumento – Porém, porém, já ‘tou fulo da vida,
ter toda razão e nenhuma comida.
BI

Cachorro – A minha barriga não se acostuma,


a ter toda razão e comida nenhuma.
OI

Galinha – Porém, porém, já me sinto aflita,


me sinto assada, acho que ‘tou frita.
PR

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– É já,
Gata é já, vamos sentar a pua,
botar os safados no meio da rua.

ÃO
– Quatro juntos, braços dados,
Todos
damos o fora nesses safados,


braços dados, juntos quatro,
chutar os safados pra fora do teatro,
dados juntos, quatro braços,
e esses safados já ‘tão no bagaço.
Quatro braços, dados juntos,
OD
e esses safados vão virar presunto.
PR

Música A batalha (instrumental)


RE

– Mas
Gata eles fugiram.
A

Cachorro – É mesmo.
Todos – Vitória! Vitória! Vitória?
DA

Gata – Mas como é que a


gente conseguiu?
BI

Jumento – Vocês estão vendo só?


Nós expulsamos os barões!
OI

Gata – E a casa é nossa. Onde é


que tem almofada?
PR

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Jumento – Calma, calma, vamos procurar entender alguma coisa.


Nós estávamos juntos, certo?
Todos – Certo.
Jumento – Juntos entramos na casa.
Todos – Sim.
Jumento – E juntos atacamos sem medo.
Todos – Sim.

ÃO
Jumento – Segunda lição do dia: “Um bicho só é só um bicho”.
Agora todos juntos...
Todos – Somos fortes.


TODOS OD
JUNTOS Uma gata, o que é que tem?
PR

– As unhas.
E a galinha, o que é que tem?
RE

– O bico.
Dito assim, parece até ridículo
um bichinho se assanhar.
A

E o jumento, o que é que tem?


– As patas.
DA

E o cachorro, o que é que tem?


– Os dentes.
Ponha tudo junto e de repente
BI

vamos ver o que é que dá.


Junte um bico com dez unhas,
OI

quatro patas, trinta dentes,


e o valente dos valentes
PR

ainda vai te respeitar.


Todos juntos somos fortes,
somos flecha e somos arco,
todos nós no mesmo barco,
não há nada pra temer.

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– Ao meu lado há um amigo


que é preciso proteger.
Todos juntos somos fortes,
não há nada pra temer.
Uma gata, o que é que é?
– Esperta.
E o jumento, o que é que é?
– Paciente.

ÃO
Não é grande coisa realmente
pr’um bichinho se assanhar.
E o cachorro, o que é que é?


– Leal.
E a galinha, o que é que é?
– Teimosa.
Não parece mesmo grande coisa, OD
vamos ver no que é que dá.
PR
Esperteza, paciência,
lealdade, teimosia,
e mais dia, menos dia,
RE

a lei da selva vai mudar.


Todos juntos somos fortes,
somos flecha e somos arco,
A

todos nós no mesmo barco,


não há nada pra temer.
DA

– Ao meu lado há um amigo


que é preciso proteger.
Todos juntos somos fortes
BI

não há nada pra temer.


...E no mundo dizem que são tantos
OI

saltimbancos como somos nós.


PR

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(narração) – Fomos dormir felizes e contentes.


J umento
No dia seguinte decidimos que ir à cidade já não era mais
tão importante. A casa era bonita, cômoda, a horta
cheia de coisas boas.
Gata – Eu? Detesto verduras...
Jumento – Gata, pra você tem a despensa...
E depois, como músicos... bem, enfim,
como músicos, não éramos lá grande coisa.
O problema é conseguir defender a casa.

ÃO
Gata – Por quê? Eles vão voltar?
Jumento – Última lição do dia:


“OS HOMENS VOLTAM SEMPRE”.
Lembrem-se disso, é preciso estar
sempre de olhos abertos.
Cachorro – Então a gente vai se defender. OD
Jumento – Como?
PR
Galinha – Olha, eles estão aí, chegando.
Jumento – Venham cá, cada um no seu esconderijo.
A RE

ESCONDE-ESCONDE
DA

Crianças –
Esconde-esconde,
BI

cabra-cega,
tá aqui? Ou lá?
OI

Esconde-esconde,
cabra-cega.
PR

Vai sair uma refrega.


– Venha, venha, quem me pega.
Gata
‘Tou escondida aqui na adega,
e assim que você chega,
se você não para,
vai pensar
que tem uma bruxa que te arranha bem na cara.

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OD
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A RE
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Tá esquentando,
tá esquentando,
tá esfriando,
cadê? Cadê?
Esconde-esconde,
bicho-papão!
Vai dar uma confusão.
Cachorro – Vem chegando, meu barão,
‘tou atrás do teu portão.

ÃO
Vais tomar uma lição,
se te aproximares,
vais pensar


que tem um diabo te mordendo os calcanhares.
Crianças – Tá escondido no curral,
não vai ser muito legal,
quem é? Quem é?
OD
Tá aqui? Ou lá?
PR
Jumento – Venha, venha, meu rival,
‘tou escondido no curral,
não vou ser muito legal.
RE

Se sair dos trilhos,


vai pensar
que tem um fantasma que te chuta nos fundilhos.
A

Galinha – Venha, venha co’o trabuco,


DA

‘tou escondida atrás do cuco,


preparando uma arapuca.
Se tu me cutuca,
BI

vai pensar
que tem um dragão dando bicada na tua cuca.
OI

Gata – Vocês viram?


Galinha – Co-co-como eles co-correm!
PR

Cachorro – Agora eles não voltam mais?


Jumento – Não!
Todos – Vivaaaaaaaaa!

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TODOS JUNTOS
Personagens cantam novamente a música da página 26.

Jumento – E assim, caro amigo, vamos ficando por aqui. Não é preciso ir à cidade,
se aqui na nossa casa estamos tão bem. Além do mais, a gente não é muito
exigente. O que é que a gente faz? A gente trabalha. Você, cachorro,
o que é que faz?
Cachorro – Eu? Faço sentinela.

ÃO
Jumento – E você, galinha?
Galinha – Eu? Arrumo a casa, faço uma comidinha...
Jumento – E eu? Eu pra variar trabalho feito um jumento, certo, há muito o que


fazer. Preciso trabalhar pra valer. Quanto à gata... bem, a gata,
pra falar a verdade...
Gata – Miau, sou meio preguiçosa...
OD
Jumento – Mas mantém a gente alegre, de noite ela se espicha na almofada e canta
um bocado de coisa bonita pra valer. Ela sim; virou realmente uma su...
PR
uma... su, como é mesmo?
Gata – Uma superstar!
A RE
DA
BI
OI
PR

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BICHARIA
Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.
Miau, miau, miau. Cocorocó.
O animal é tão bacana,
mas também não é nenhum banana.

ÃO
Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.
Miau, miau, miau. Cocorocó.


Quando a porca torce o rabo,
pode ser o diabo.
E ora vejam só.
OD
Au, au, au. Cocorocó.
Era uma vez (e é ainda),
certo país (e é ainda),
PR
onde os animais eram tratados
como bestas (são ainda, são ainda).
RE

Tinha um barão (tem ainda),


espertalhão (tem ainda),
nunca trabalhava e então achava
a vida linda (e acha ainda, e acha ainda).
A

Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.


DA

Miau, miau, miau. Cocorocó.


O animal é paciente,
mas também não é nenhum demente.
BI

Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.


Miau, miau, miau. Cocorocó.
OI

Quando o homem exagera


bicho vira fera.
PR

E ora vejam só.


Au, au, au. Cocorocó.
Puxa, jumento (só puxava).
Choca, galinha (só chocava).

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Rápido, cachorro, guarda a casa,

ÃO
corre e volta (só corria, só voltava).
Mas chega um dia (chega um dia)


que o bicho chia (bicho chia).
Bota pra quebrar e eu quero ver
quem paga o pato,
OD
pois vai ser um saco de gatos.
Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.
Miau, miau, miau. Cocorocó.
PR
O animal é tão bacana,
mas também não é nenhum banana.
RE

Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.


Miau, miau, miau. Cocorocó.
Quando a porca torce o rabo,
pode ser o diabo.
A

E ora vejam só.


DA

Au, au, au. Cocorocó.


Au, au, au. Cocorocó.
Au, au, au. Cocorocó.
BI

FIM
OI
PR

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ÃO

OD
PR
A RE
DA
BI
OI
PR
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CHICO BUARQUE nasceu em 1944. Compositor, cantor e


escritor, sua vasta obra começou a obter reconhecimento nacional e
internacional a partir da música “A banda”, uma das vencedoras do
Festival da Música Popular Brasileira de 1966. Traduziu e adaptou
para o português o musical de sucesso Os Saltimbancos, que teve
estreia histórica em agosto de 1977, no Rio de Janeiro. Também
para as crianças, escreveu Chapeuzinho Amarelo. Recebeu três vezes

ÃO
o Prêmio Jabuti de Melhor Livro do Ano: em 1992, com Estorvo,
em 2004, com Budapeste, e em 2010, com Leite derramado.
Mora no Rio de Janeiro, sua cidade natal, e continua se dedicando


à música e à literatura.

ZIRALDO nasceu em Caratinga, Minas Gerais, em 1932. Pintor,


OD
cartazista, jornalista, teatrólogo, chargista, caricaturista e escritor, sua
fama começou na década de 1960, com A turma do Pererê, sua primeira
revista em quadrinhos. É autor de O Menino Maluquinho, um dos
PR
maiores fenômenos editoriais do país. Além de suas obras autorais,
contribuiu com ilustrações para clássicos da literatura infantil brasileira,
como Os Saltimbancos e Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque.
RE

SERGIO BARDOTTI nasceu em Pavia, Itália, em 1939. Compositor


premiado, assina canções de sucesso da música popular italiana e trilhas
A

sonoras de filmes. Foi parceiro de Chico Buarque, Toquinho e Vinicius


de Moraes, e é considerado um dos responsáveis pela difusão da música
DA

brasileira na Itália. Com Luis Bacalov, foi criador do musical infantil


I musicante, posteriormente trazido para o Brasil por Chico Buarque
como Os Saltimbancos. Faleceu em 2007, em Roma.
BI
OI

LUIS ENRIQUEZ BACALOV é um renomado pianista, compositor,


arranjador e diretor de orquestra, famoso por suas composições para
PR

trilhas sonoras do cinema italiano. Nasceu na Argentina, em 1933, e


chegou à Itália em 1959, onde reside até hoje. Indicado duas vezes ao
Oscar, venceu o prêmio de música original para o filme O carteiro e o
poeta, em 1996. Atualmente é o maestro principal da Orquestra della
Magna Grecia, em Taranto.
© Autêntica Editora. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução.

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Este livro foi


composto com
tipografia Bembo
e impresso na
Gráfica Formato.
“Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.
Miau, miau, miau. Cocorocó.
O animal é tão bacana,
mas também não é nenhum banana.
Au, au, au. Hi-ho, hi-ho.
Miau, miau, miau. Cocorocó.
Quando a porca torce o rabo,
pode ser o diabo.
E ora vejam só.
Au, au, au. Cocorocó.”

ISBN 978-85-513-0108-1

9 788551 301081

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