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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL
CURSO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL

Andressa Roana Costa Schley

POLÍTICAS PÚBLICAS E MOBILIZAÇÃO SOCIAL NO ACESSO


AO SANEAMENTO BÁSICO: O CASO DA NOVA SANTA MARTA,
SANTA MARIA, RS

Santa Maria, RS
2018
Andressa Roana Costa Schley

POLÍTICAS PÚBLICAS E MOBILIZAÇÃO SOCIAL NO ACESSO AO


SANEAMENTO BÁSICO: O CASO DA NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA,
RS

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao curso de Engenharia
Sanitária e Ambiental da Universidade
Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como
requisito parcial para a obtenção do título de
Engenheira Sanitarista e Ambiental.

Orientadora: Denise Ester Ceconi

Santa Maria, RS
2018
Andressa Roana Costa Schley

POLÍTICAS PÚBLICAS E MOBILIZAÇÃO SOCIAL NO ACESSO AO


SANEAMENTO BÁSICO: O CASO DA NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA,
RS

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao curso de Engenharia
Sanitária e Ambiental da Universidade
Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como
requisito parcial para a obtenção do título de
Engenheira Sanitarista e Ambiental.

Aprovado em 19 de julho de 2018

________________________________________
Denise Ester Ceconi, Profª Drª. (UFSM)
(Presidente/Orientadora)

_________________________________________
Ana Maria Thielen Merck, Profª. Drª. (UFSM)

_________________________________________
Suelen Aires Gonçalves, Socióloga Mª. (UFRGS)

Santa Maria, RS
2018
AGRADECIMENTOS

Agradeço a todas as pessoas envolvidas na caminhada que culminou neste


trabalho. Não me atrevo a conseguir expressar todos os sentimentos a minha
família, minha inspiração de vida. Uma infinita gratidão à fortaleza, ao amor, ao
apoio e aos ensinamentos. O empenho e o desprendimento de vocês que tornaram
possível eu realizar essa graduação. Obrigada.
Graduação que só foi possível graças ao Programa de Reestruturação e
Expansão das Universidades Federais (REUNI) do governo federal em 2007, que
criou o curso de Engenharia Sanitária e Ambiental na UFSM. Graças aos
investimentos em educação, em assistência estudantil e em programas sociais que
eu e milhares de jovens tivemos a oportunidade do ensino superior. Graças aos
investimentos públicos dessa época que tivemos avanços também no acesso ao
saneamento básico no país, que inspiraram este trabalho. Que a população possa
ter novamente essas oportunidades. Deixo desejos de democracia, liberdade e
justiça.
Agradeço a todos os professores e professoras que contribuíram na minha
formação. Em especial à Denise Ester Ceconi pela orientação e pelo incentivo e
acolhimento de temas sociais ao longo do curso.
O presente trabalho é também fruto da formação interdisciplinar possibilitada
pelo movimento estudantil. O Diretório Central dos Estudantes (DCE) foi uma
experiência muito rica. Inspiração à criação do Diretório Acadêmico da Engenharia
Sanitária e Ambiental (DAESA) e de mobilizações estudantis no Centro de
Tecnologia (CT). Tive o prazer de vivenciar no CT a organização de estudantes em
prol de uma ciência e uma tecnologia mais inclusiva, representativa e popular. Entre
as muitas atividades, me marcaram a Semana Feminista no CT, a Semana de Arte e
Cultura no CT, o III Encontro Regional Sul de Engenharia e Desenvolvimento Social
(EREDS), as participações nos demais EREDS e nos Encontros Nacionais de
Engenharia e Desenvolvimento Social (ENEDS), a criação do Estuda CT e do Curso
de Formação em Engenharia Popular. O VER-SUS e o EIV tiveram um papel
fundamental no aprendizado sobre extensão interdisciplinar e educação popular. A
inserção na Rede de Engenharia Popular Oswaldo Sewá (REPOS) acolheu os meus
anseios por uma profissão socialmente comprometida. A aproximação com os
movimentos sociais, principalmente com o MNLM e o MST, significou aprendizado e
vínculo. Ao participar destes espaços aprendi a ser uma profissional crítica, com
responsabilidade social, que acredita na construção coletiva, popular e democrática.
Agradeço profundamente a todas companheiras e companheiros que dividiram
essas caminhadas comigo. E a todas e todos que se dispuseram a construir esse
caminho antes de mim.
Sou grata ao Núcleo de Extensão em Desenvolvimento Territorial do Território
Centro Serra (NEDET CS) pelo acolhimento na academia, pela oportunidade de
aprendizado e de experiências cruciais em minha formação.
À Suelen, Cristiano, Lourdes, Vinicius, Liane, Tânia, Ary e Ivo, obrigada por se
desprenderem e acreditarem nesse trabalho.
A todas e todos entrevistados, obrigada por tornarem esse trabalho possível.
Grata às companheiras de curso e de vida Melissa e Letícia pelo
compartilhamento de todos esses anos e pelo apoio e inspiração nesse trabalho.
Vocês foram base, referência, acolhimento e amor. Obrigada por todos os
aprendizados na vida pessoal, espiritual, profissional e coletiva. Allison e Alice,
vocês também foram base nessa caminhada. Fran, tua companhia, especialmente
nesse último semestre, foi bem importante. Grata à companheira Laurem pelo
auxílio neste trabalho. Bruno, obrigada pelo incentivo e inspiração nesse trabalho e
na vida, vida longa à construção do companheirismo. Ao meu irmão Rodrigo
obrigada pela inspiração para lutar e construir um mundo melhor, incentivo de
liberdade e perseverança durante os anos de faculdade e nesse trabalho. Bia,
companheira de apartamento e de vida, obrigada pelas conversas, pelo apoio, pelo
feminismo e pelos rolês. Sem você esse trabalho teria sido bem mais difícil. Crescer
junto contigo foi ótimo, sentirei sua falta. Aos amigos e amigas da JAE, minha
inspiração e força para transformar a sociedade, obrigada pelo companheirismo na
luta e na vida. Às pessoas que nos identificamos durante essa caminhada, todos
vocês fazem parte disso, muito obrigada.
Ou os estudantes se identificam com o
destino do seu povo, com ele sofrendo a
mesma luta, ou se dissociam do seu povo, e
nesse caso, serão aliados daqueles que
exploram o povo.

(Florestan Fernandes)
RESUMO

POLÍTICAS PÚBLICAS E MOBILIZAÇÃO SOCIAL NO ACESSO AO


SANEAMENTO BÁSICO: O CASO DA NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA,
RS

AUTOR: Andressa Roana Costa Schley


ORIENTADOR: Denise Ester Ceconi

O saneamento básico no Brasil ainda é um serviço de abrangência deficitária, sendo


que praticamente 50% da população não tem acesso ao esgotamento sanitário,
quadro característico dos locais mais pobres. Para mudar tal realidade são
necessárias políticas públicas e ações que promovam o desenvolvimento
socioambiental. Em uma situação de acentuada desigualdade social em 1991 o
Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) articulou uma ocupação que se
transformou no atual bairro Nova Santa Marta, em Santa Maria, RS. O presente
trabalho tem por objetivo analisar o acesso ao saneamento básico no bairro, ao
longo dos anos, considerando a intervenção da organização social e a execução de
políticas públicas. Para isso foi realizada uma pesquisa exploratória de abordagem
qualitativa a qual envolveu levantamento bibliográfico, visitas de campo, relatos de
histórias de vida com atores sociais envolvidos nos processos de acesso ao
saneamento básico, sendo eles moradores e representantes públicos. O acesso ao
saneamento básico na Nova Santa Marta é resultado do engajamento social dos
moradores e das ações de políticas e investimentos públicos. As gestões
governamentais que se propuseram a trabalhar inseridos diretamente no bairro, de
forma democrática e participativa, cooperaram no desenvolvimento social e na
autonomia da comunidade. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) tornou
possível em 100% do bairro obras de esgoto doméstico, esgoto pluvial, atendimento
de água, luz e pavimentação.

Palavras-chave: organização social; PAC; esgotamento sanitário.


ABSTRACT

PUBLIC POLICIES AND SOCIAL MOBILIZATION: THE ACCESS TO BASIC


SANITATION IN THE NEW NEIGHBORHOOD SANTA MARTA, SANTA MARIA,
RS

AUTHOR: Andressa Roana Costa Schley


ADVISOR: Denise Ester Ceconi

Basic sanitation in Brazil is still a service with deficient coverage. Nearly 50% of the
population does not have access to sanitary sewage, a common characteristic of the
poorest places. To change this reality, public policies and actions that promote social
and environmental development are needed. In a situation of marked social
inequality in 1991, the National Movement for Struggle for Housing (MNLM)
articulated an occupation that became the current neighborhood of Nova Santa
Marta, Santa Maria, RS. The present study aims to analyze access to basic
sanitation in the neighborhood over the years, considering the intervention of social
organization and the implementation of public policies. For this purpose, a qualitative
exploratory research was carried out, which involves bibliographical survey, field
visits and interviews with social actors involved in the processes of access to basic
sanitation, being residents and public representatives. Access to basic sanitation in
Nova Santa Marta is a result of the social engagement of the residents and the
actions of public policies and investments. Government efforts to work directly in the
neighborhood, in a democratic and participatory manner, cooperated in the social
development and autonomy of the community. The PAC (Growth Acceleration
Program) made possible in 100% of the neighborhood works of domestic sewage,
storm drainage, water, lighting and paving.

Key words: social organization; PAC; sewage system.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Domicílios atendidos pelos serviços de saneamento básico nos anos


2014 e 2015. ............................................................................................................. 21
Figura 2 – População atendida com água em Santa Maria ....................................... 22
Figura 3 – População atendida com esgoto em Santa Maria .................................... 23
Figura 4 – Foto do acampamento que deu início à ocupação da Fazenda Santa
Marta ......................................................................................................................... 31
Figura 5 – Mapa de localização de Santa Maria, RS, e do bairro Nova Santa Marta.
.................................................................................................................................. 33
Figura 6 – Unidades residenciais do bairro Nova Santa Marta, Santa Maria, RS. .... 33
Figura 7 – Placa da Avenida Secundária, primeira rua a ser loteada na Nova Santa
Marta ......................................................................................................................... 40
Figura 8 – Exemplo de patente (a) e de chuveiro de lata (b). ................................... 42
Figura 9 – Barracos de residências durante o acampamento da ocupação. ............. 43
Figura 10 – Casa de uma família na ocupação Nova Santa Marta. .......................... 43
Figura 11 – Tampa de esgoto da Corsan. ................................................................. 53
Figura 12 – (a) e (b) Avenida principal asfaltada. ...................................................... 54
Figura 13 – Rua com revestimento primário, esquina com rua asfaltada com boca de
lobo. .......................................................................................................................... 54
Figura 14 – Área de expansão da ocupação sem a cobertura dos serviços, com
esgoto a céu aberto. .................................................................................................. 59
Figura 15 – (a) e (b) Residências sem ligação à rede de esgoto doméstico. ............ 60
Figura 16 – Nova ocupação na Nova Santa Marta. ................................................... 62
LISTA DE ANEXOS

ANEXO A – PLANTA DE REMANEJAMENTO DE REDES ELÉTRICAS DO


BAIRRO NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA, RS. ........................................... 76
ANEXO B – PLANTA DE REDE DE ESGOTO DO BAIRRO NOVA SANTA MARTA,
SANTA MARIA, RS. ................................................................................................. 77
ANEXO C – ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS ESTAÇÃO DE BOMBEAMENTO E
LINHA DE RECALQUE DE ESGOTO DA NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA,
RS. ............................................................................................................................ 78
ANEXO D – ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS REDES COLETORAS DA NOVA
SANTA MARTA, SANTA MARIA, RS. ..................................................................... 80
ANEXO E – PLANTA DE PAVIMENTAÇÃO DO BAIRRO NOVA SANTA MARTA,
SANTA MARIA, RS. ................................................................................................. 81
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Número de municípios em relação aos serviços de saneamento básico,


por região do país. .................................................................................................... 20
Tabela 2 – Número de municípios sem atendimento de serviços de saneamento
básico no Brasil, e a porcentagem de cobertura de cada serviço. ............................ 20
Tabela 3 - Caracterização das pessoas entrevistadas pela pesquisadora. .............. 38
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 13
1.1 OBJETIVOS .............................................................................................. 14
1.1.1 Objetivo Geral ......................................................................................... 14
1.1.2 Objetivos específicos ............................................................................. 14
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA................................................................ 15
2.1 SANEAMENTO BÁSICO PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAÍS ........ 15
2.1.1 Desenvolvimento .................................................................................... 15
2.1.2 Saneamento básico ................................................................................ 17
2.1.3 Situação do saneamento básico no Brasil ........................................... 19
2.1.3.1 Situação do saneamento básico em Santa Maria, RS .............................. 22
2.1.3.2 Caracterização social do acesso ao saneamento básico ......................... 24
2.2 LEGISLAÇÃO VIGENTE........................................................................... 25
2.2.1 Legislação Nacional ............................................................................... 25
2.2.2 Legislação de Santa Maria, RS .............................................................. 26
2.3 POLÍTICA PÚBLICA ................................................................................. 26
2.4 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA ........................................................ 27
2.5 A HISTÓRIA DA OCUPAÇÃO NOVA SANTA MARTA ............................. 30
3 MATERIAL E MÉTODOS ......................................................................... 32
3.1 ÁREA DE ESTUDO .................................................................................. 32
3.2 METODOLOGIA ....................................................................................... 34
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................ 39
4.1 PARTICIPAÇÃO SOCIAL E O ACESSO AO SANEAMENTO BÁSICO ... 39
4.1.1 Primeiras políticas públicas para saneamento .................................... 45
4.1.2 Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ................................. 50
4.2 OBRAS E PROJETOS .............................................................................. 57
4.3 SITUAÇÃO ATUAL ................................................................................... 59
4.3.1 Percepção sobre o saneamento ............................................................ 59
4.3.2 Conflitos socioambientais ..................................................................... 61
4.3.3 Regularização fundiária urbana ............................................................. 63
4.4 MELHORIAS NECESSÁRIAS A PARTIR DA PERCEPÇÃO DOS
ENTREVISTADOS .................................................................................................... 64
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................... 66
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 70
13

1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal do Brasil prevê a garantia de desenvolvimento e


saneamento para a população como direito básico e de responsabilidade do Estado.
Desde 2007 a Política Nacional de Saneamento Básico prevê a universalização do
acesso, da integralidade, da articulação com políticas públicas de desenvolvimento,
de habitação, de combate à pobreza, de proteção ambiental, promoção de saúde e
melhoria da qualidade de vida (BRASIL, 2007).
Para Silva (2009) o ser humano necessita ter condições básicas adequadas
para ser capaz de produzir trabalho de forma plena, sendo papel do Estado garantir
essas condições de forma igualitária a toda população. O desenvolvimento de um
país deve visar a qualidade de vida, a busca pela justiça social, a distribuição de
renda, o acesso à educação, à saúde, à moradia e ao saneamento, para o
desenvolvimento pleno da população (SILVA, 2009).
Porém, o desenvolvimento baseado em um sistema de crescimento
econômico pautado pela exploração, cria uma sociedade de classes com relevante
desigualdade social. Intensificado pela globalização, os espaços livres para moradia,
lazer e trabalho foram reduzindo, e quando estes ainda são encontrados não
apresentam possibilidade para a plena desenvoltura humana. O direito à vida digna
passou de direito de todos para apenas direito dos mais favorecidos (SANTOS,
2013).
Mais de um bilhão de pessoas no mundo não tem acesso a condições
mínimas de saneamento básico, dado esse responsável pela proliferação de
doenças e degradação do meio ambiente, situação concentrada nos cinturões de
miséria das metrópoles (FUNASA, 2006). No Brasil apenas metade da população
tem acesso ao esgotamento sanitário, e esse cenário se mantém no município de
Santa Maria, Rio Grande do Sul (SNIS, 2015).
Situações de acentuada desigualdade social geram conflitos e disputas por
condições de vida. Nesse contexto, em 1991 o Movimento Nacional de Luta pela
Moradia (MNLM) articulou o que é conhecida hoje por ser a maior ocupação urbana
da América Latina: a Nova Santa Marta em Santa Maria, RS (SILVEIRA, 2014). A
partir da mobilização social, a população do que hoje é o bairro Nova Santa Marta,
14

teve acesso a políticas públicas e obras de saneamento básico, principalmente a


partir do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo federal.

1.1 OBJETIVOS

1.1.1 Objetivo Geral

Analisar como se deu o acesso ao saneamento básico no bairro Nova Santa


Marta, considerando a intervenção da organização social e a ação de políticas
públicas.

1.1.2 Objetivos específicos

Relatar o acesso ao saneamento básico do bairro Nova Santa Marta.


Analisar o efeito de políticas públicas na universalização do saneamento
básico no bairro Nova Santa Marta.
Analisar o efeito da participação social na universalização do saneamento
básico no bairro Nova Santa Marta.
15

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 SANEAMENTO BÁSICO PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAÍS

2.1.1 Desenvolvimento

Desenvolvimento social, ambiental e econômico transmite a ideia de aliar o


crescimento econômico à promoção de justiça social e de preservação ou
recuperação do meio ambiente (THELS; STRELOW; LASTA, 2017).
Uma das definições filosóficas para "desenvolvimento" está ligada a ideia de
"evolução”, "movimento em direção ao melhor". Porém, a partir da Revolução
Industrial, no século XVIII, o termo "desenvolvimento" começa a ser sinônimo de
crescimento econômico, a partir de acumulação de riquezas, de material de bens,
em capital ou produção, associado ao avanço tecnológico. Entretanto, crescimento
econômico sem a preocupação de acessos igualitários a essas riquezas e
tecnologias não garante melhoria dos indicadores sociais e a evolução da sociedade
(FRANCO, 1994; BURSZTYN, 2006; VEIGA; ZATZ, 2008; SILVA, 2009).
O desenvolvimento pautado apenas pela estrutura econômica gera efeitos
negativos sobre a sociedade, como: concentração de renda, manutenção da
desigualdade social como estrutural da sociedade, a desvantagem e até cortes das
políticas sociais à mercê da balança econômica, os efeitos da regressão econômica,
e a participação desigual da sociedade nas decisões (SILVA, 2009). Segundo Sen
(2000) o crescimento econômico global atual nega a possibilidade da população
pobre ter as necessidades mais básicas atendidas, assim como nega o acesso aos
serviços públicos ou às liberdades políticas e civis. Soares (2011) defende que o
desenvolvimento econômico deveria estar subordinado ao desenvolvimento social, e
não o contrário. A economia é apenas um dos componentes para expandir o
desenvolvimento, este último é um processo muito mais rico e complexo (SEN,
2000; SOARES, 2011).
Albuquerque (1995) compreende o desenvolvimento como um processo
global envolvendo múltiplas e complexas relações entre econômico, social e político,
que busca conciliar a eficiência, a equidade e a liberdade. O desenvolvimento visa à
qualidade de vida a toda população, e não somente parte dela, busca a justiça
social, a distribuição de renda, o acesso à educação, à saúde, à moradia e ao
16

saneamento para o pleno desenvolvimento das capacidades humanas em equilíbrio


com o meio ambiente. Somente com essas condições adequadas o ser humano é
capaz de produzir trabalho de forma plena e contribuir nas atividades, inclusive
econômicas do país (ALBUQUERQUE, 1995).
A ONU, em 1986, emitiu a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento.
Nessa declaração reconhece o desenvolvimento como um direito inerente a todo ser
humano e de todos os povos, expressando a soberania de cada povo sobre suas
riquezas e recursos naturais. Reconhece também o desenvolvimento como um
processo econômico, social, cultural e político abrangente, que visa o aumento
contínuo do bem-estar de toda a população, com base em sua participação ativa,
livre e significativa, e na distribuição justa dos benefícios. Coloca como
responsabilidade dos Estados a garantia do direito ao desenvolvimento, através de
políticas, assegurando a igualdade de oportunidades no acesso aos recursos
básicos como à saúde e ao saneamento, entre outros (ONU, 1987).
Da Conferência de Estocolmo nasce em 1987 o Relatório de Burdtland,
“Nosso Futuro Comum”, o qual conceitua o “desenvolvimento sustentável” e é
apresentado na Rio-92 em 1992, como a conciliação entre crescimento econômico e
conservação do meio ambiente. Porém, assim como “desenvolvimento” pode ter
diferentes concepções não neutras, o “desenvolvimento sustentável” também
carrega uma carga histórica de interpretação, a qual nasceu em momento de
expansão do modo de produção acelerado a excedentes lucros, marcado pelas
desigualdades sociais (GADOTTI, 2005; SILVA, 2009).
Moacir Gadotti (2005) entende que não há compatibilidade entre o modo de
produção capitalista atual e a sustentabilidade, coloca ainda que a sustentabilidade
tem sido usada com um mero rótulo, sem realmente ser a essência. Existem muitas
críticas ao Relatório de Burdtland, nas quais afirmam que esse “desenvolvimento
sustentável” objetiva “a manutenção e a reprodução do capitalismo e sua
consolidação global no controle da natureza enquanto “recurso”, e a manutenção da
pressão centro/periferia na gestão dos recursos naturais dos países “dependentes”
(OLIVEIRA, 2005, p. 45). Se assemelha mais a um “desenvolvimento sustentável de
mercado”, com uma abordagem da economia liberal, buscando resolver problemas
ecológicos através de soluções de mercado. Sendo assim, esse “desenvolvimento
sustentável não estaria comprometido com a satisfação das necessidades humanas
presentes e futuras, mas, sim, com as necessidades do capital”. O ambiente vira
17

recurso como uma moeda de troca, essa redução do meio ambiente a valores
econômico causa a destruição irresponsável (SOUZA, 2000; GADOTTI, 2005;
OLIVEIRA, 2005).
É inviável alcançar mudanças substanciais sem transformar as estruturas que
regulam o sistema econômico e político, principalmente os que tangem a
propriedade, o controle, o acesso e o uso dos recursos naturais, ou seja, é preciso
encarar interesses e poderes. Outra crítica à sustentabilidade é quanto à visão
ambientalista de tratar as questões ambientais separadamente das questões sociais.
O verdadeiro desenvolvimento sustentável deve considerar igualmente as questões
sociais, as ambientais e as econômicas (VEIGA; ZATZ, 2008).
Celso Furtado (2000) defendia um Projeto Nacional de Desenvolvimento no
qual o Estado tem o papel de garantir as condições básicas à população e conduzir
o desenvolvimento. O combate à pobreza é estratégico para o desenvolvimento dos
países, e para isso, é necessária a adoção de políticas públicas de saúde, habitação
e saneamento básico, entre outras, prioritárias para a população de classe baixa, e
de forma que envolvam os estados, os municípios e as próprias comunidades
beneficiadas. Logo, a presença do Estado é essencial para a comunicação entre
povo e governo, da qual deve resultar menos pobreza e mais cidadania. Na
ausência do Estado, a economia ao invés de diminuir, aumenta as desigualdades
sociais (ALBUQUERQUE, 1995; FURTADO, 2000).
O não atendimento das necessidades básicas da população representa uma
ameaça ao desenvolvimento, é necessário encarar a política social como parte
integrante do processo de desenvolvimento de um país, e não mais acreditar que
será uma consequência natural do crescimento econômico (ALBUQUERQUE, 1995;
SOARES, 2011).

2.1.2 Saneamento básico

Sendo o saneamento básico, então, essencial para a qualidade de vida da


população, para o pleno desenvolvimento das capacidades humanas, para a
proteção do meio ambiente e para o desenvolvimento de uma nação mais equitária,
rica e sustentável, debruça-se a estudar como tornar esse serviço um direito
universal.
18

Saneamento básico é o conjunto de serviços de abastecimento de água,


esgotamento sanitário, drenagem e limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos,
visando à proteção do meio ambiente e a saúde pública (BRASIL, 2007). É essencial
na prevenção de vetores e doenças, principalmente em locais de aglomeração
populacional (IBGE, 2011).
Santos (2013) ao estudar a moradia como um direito fundamental do ser
humano encara a moradia não apenas como as 4 paredes e um teto, mas engloba a
presença de condições para o perfeito desenvolvimento da dignidade da pessoa
humana. Pansieri (2008) diz que:

O direito a uma moradia adequada significa dispor de um lugar onde se


possa asilar com espaço adequado, segurança, iluminação, ventilação,
infraestrutura básica, uma situação adequada em relação ao trabalho e o
acesso aos serviços básicos, todos a um custo razoável.

Ao citar os serviços básicos Pansieri (2008) inclui o saneamento básico como


um fator fundamental a uma moradia adequada, afim do ser humano poder gozar de
seus direitos e capacidades. Duarte (2015) também trata do direito à moradia
intimamente ligado à plena consecução da dignidade humana, mas também à plena
consecução de um Estado Democrático.
Considerado condição básica para qualidade de vida e saúde do ser humano,
está garantido pela Constituição Federal, pelas legislações federais, estaduais e
municipais, que serão descritas a seguir, e demais declarações sobre saúde, direitos
humanos e desenvolvimento, como já citados anteriormente (SAKER, 2007).
Entretanto, a realidade mundial ainda é preocupante: mais de um bilhão de
pessoas no mundo não tem acesso a condições mínimas de saneamento, e esse
quadro é característico dos locais mais pobres e excluídos da sociedade (FUNASA,
2006). A Organização Mundial da Saúde declarou que 1,7 milhão de crianças
morrem por ano devido à falta de saneamento (ONU, 2017).
Na ideia de que desenvolvimento social, ambiental e econômico se dá através
do compromisso do Estado em garantir o acesso à educação, à saúde, à moradia e
aos serviços de qualidade e do equilíbrio com o meio ambiente, o saneamento
básico torna-se um serviço indispensável à população no que tange garantir
condições mínimas de desenvolvimento das capacidades humanas dos indivíduos e
povos (SAKER, 2007; SILVA, 2009).
19

2.1.3 Situação do saneamento básico no Brasil

Segundo o Atlas de Saneamento de 2011 o esgotamento sanitário é o serviço


menos alcançado pela população brasileira, sendo realidade para grande parte dos
municípios com menos de 50 mil habitantes. A Pesquisa Nacional de Saneamento
Básico – PNSB, 2008, apontou 2.495 municípios sem rede coletora de esgoto. Ao
mesmo tempo em que apontou um avanço nos últimos anos na proporção de
domicílios com acesso à rede coletora, sendo 33,5% em 2000 para 45,7% em 2008
(IBGE, 2011).
O Ministério da Saúde afirma que a cada R$ 1,00 investido em saneamento
deixa-se de gastar R$ 4,00 na remediação de saúde (FUNASA, 2006).
A garantia de saúde através de estruturas de saneamento básico adequadas
não pode ser entendida como uma questão individual, mas um problema coletivo de
responsabilidade pública. É necessária uma conscientização da população acerca
do uso sustentável dos recursos naturais e a construção de políticas e de um novo
modelo de desenvolvimento oposta à relação utilitarista do meio ambiente de sanar
o ritmo crescente de produção e consumo, com poluição e degradação da natureza
(FUNASA, 2006).
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística publicou em 2008 a Pesquisa
Nacional de Saneamento Básico na qual conseguiu montar um panorama da
abrangência dos serviços de saneamento básico no Brasil (IBGE, 2008). A Tabela 1
compara o número de municípios, por região do país, que possuem algum tipo de
serviço de saneamento nos anos de 2000 e 2008.
20

Tabela 1 – Número de municípios em relação aos serviços de saneamento básico,


por região do país.

Grandes Municípios Municípios com:


Regiões e com algum Rede geral
Total de Rede Manejo de Manejo de
Unidades tipo de serviço de
municípios coletora de resíduos águas
de de distribuição
esgoto sólidos pluviais
Federação saneamento de água
2000 2008 2000 2008 2000 2008 2000 2008 2000 2008 2000 2008
Brasil 5507 5564 5497 5564 5391 5531 2877 3069 5475 7762 4327 5256
Norte 449 449 446 449 422 442 32 60 445 449 222 403
Nordeste 1787 1793 1782 1793 1722 1772 767 819 1769 1792 1227 1615
Sudeste 1666 1668 1666 1668 1666 1668 1547 1586 1666 1667 1468 1643
Sul 1159 1188 1157 1188 1142 1185 451 472 1149 1188 1094 1172
Centro-
446 446 446 446 439 464 80 132 446 466 316 423
Oeste

Fonte: IBGE, 2008 - Pesquisa Nacional de Saneamento Básico. Adaptado pela autora.

Pode-se observar que praticamente todos os municípios do Brasil possuem


algum tipo de serviços de saneamento básico. Em geral o crescimento dos serviços
de saneamento básico oferecidos à população entre os anos de 2000 a 2008 foi
pequeno, havendo um avanço maior na rede coletora de esgoto e no manejo de
águas pluviais. A região norte é a que possui menor infraestrutura de saneamento
básico, seguida da região centro-oeste. A Tabela 2 mostra o número de municípios
sem atendimento de serviços de saneamento básico no Brasil, e a porcentagem de
cobertura de cada serviço. É possível observar que houve um avanço nas
coberturas de saneamento básico entre os anos 2000 e 2008, mas ainda há a
necessidade de ampliar, principalmente quanto ao esgoto.

Tabela 2 – Número de municípios sem atendimento de serviços de saneamento


básico no Brasil, e a porcentagem de cobertura de cada serviço.

Manejo de resíduos Manejo de águas


Água Esgoto
sólidos pluviais
2000 2008 2000 2008 2000 2008 2000 2008
Municípios sem 116 33 2630 2459 32 2 1180 308
atendimento
Cobertura em
número de 97,89% 99,41% 52,24% 55,16% 99,42% 99,96% 78,57% 94,46%
municípios
21

Fonte: IBGE, 2008 - Pesquisa Nacional de Saneamento Básico. Adaptado pela autora.

Segundo o estudo “Situação do Saneamento Básico no Brasil” da Associação


Brasileira de Engenharia Sanitária (ABES) publicado em 2015 houve um
crescimento na cobertura dos serviços entre 2014 e 2015, expressado na Figura 1
por domicílios atendidos (ABES, 2015).
Houve um crescimento em todos os serviços, sendo mais expressivo em rede
de esgoto com aumento de 4,5%, atingindo uma cobertura de 65,3%. A cobertura de
água e de coleta de resíduos manteve a mesma porcentagem entre 2014 e 2015
sendo 85,4% e 89,8%, respectivamente (ABES, 2015).
Na região sul a cobertura de abastecimento de água chegou a 88,3%, de
esgoto a 65,1% e a de coleta de resíduos a 94,1% em 2015 (ABES, 2015).

Figura 1 – Domicílios atendidos pelos serviços de saneamento básico nos anos


2014 e 2015.

Fonte: ABES, 2015.


22

2.1.3.1 Situação do saneamento básico em Santa Maria, RS

Segundo o Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS) o


índice de atendimento de abastecimento de água de Santa Maria é de 100%,
portanto, em 2015 os 276.108 habitantes eram atendidos, sendo 108.692 economias
ativas de água. Já o índice de atendimento de serviço de esgotamento sanitário é
54,88%, com 151.541 habitantes atendidos em 2015, sendo 60.351 economias
ativas. Percebe-se que o atendimento em esgoto é mais deficiente que o
atendimento de água em Santa Maria. As Figuras 2 e 3 demonstram a porcentagem
de população atendida com água e esgoto, respectivamente, entre os anos de 2002
a 2015 (SNIS, 2015).

Figura 2 – População atendida com água em Santa Maria, RS.

Índice acesso a água


105,00%

100,00%

95,00%

90,00%

85,00%

80,00%

75,00%

Fonte: SNIS, 2015. Elaborado pela autora.


23

Figura 3 – População atendida com esgoto em Santa Maria, RS.

Fonte: SNIS, 2015. Elaborado pela autora.

A partir de 2008 houve um ritmo crescente no atendimento de ambos os


serviços. Segundo o Plano Municipal de Saneamento Ambiental de Santa Maria
(Plamsab, 2015), no período de 2002 a 2011, houve um aumento de 23% no número
de economias com ligação de esgoto, devido nesse mesmo período a prefeitura
municipal, em parceria com o Governo Federal, ter investido cerca de 25 milhões de
reais em obras de ampliação da rede de esgoto sanitário no município,
principalmente via recursos financeiros do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC)1 do Governo Federal.
Estudar a situação de acesso ao saneamento básico no Brasil requer também
compreender a situação social que permitiu, ou limitou, esse acesso da população
ao longo da história. Assim como a contribuição do Estado nos investimentos ao
passar dos governos.

1 O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi criado em 2007 pelo Governo Federal através
do decreto nº 6.025. Foram destinados recursos públicos a obras de infraestrutura social, urbana,
logística e energética do país, a fim de aumentar o crescimento da economia através da renda e
consumo dos trabalhadores, visando o desenvolvimento acelerado e sustentável. Em 2011 houve a
segunda fase do PAC com aprimoramento e mais recursos (PAC, 2017).
24

2.1.3.2 Caracterização social do acesso ao saneamento básico

De acordo com a FUNASA (2006), cerca de 50% da população brasileira não


tem acesso ao saneamento básico. Destes, grande parte se concentra nos cinturões
de miséria dos grandes centros urbanos, sendo, portanto, os que mais necessitam
de atendimento atualmente. Desta forma, quando se fala em saneamento básico, o
foco deve estar na população mais pobre.
Essa população mais pobre é bem caracterizada, tem cor e história. Enquanto
54% da população brasileira é negra, 75,5% da população pobre é negra (IBGE,
2016). “A pobreza brasileira tem cor e é preta” diz o título de uma reportagem do
Jornal Nexo em novembro de 2017. Ao mesmo tempo, a proporção de indígenas
vivendo em situação de pobreza extrema é seis vezes maior do que a proporção
verificada no restante da população do país (ONU, 2016).
Um país historicamente marcado pela exploração colonial não tem por
coincidência níveis de desigualdade social tão grandes. As políticas de imigração e
de branqueamento adotadas no Brasil por Dom Pedro I, nos séculos XIX e XX,
aprofundaram o processo de exclusão. Uma sociedade marcada pela diferença de
raça e cor, as negras e os negros, e as e os indígenas são os que mais sofrem a
desigualdade social no país, herança da escravidão e do genocídio praticado pelos
europeus durante a colonização (ONU, 2016).
A liberdade aos negros oficializada pela abolição da escravatura não garantiu,
no entanto, condições de acesso à terra deixando os ex-escravos à mercê do
racismo. Segundo reportagem do G1 (2008), a Secretaria Especial de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial (Seppir) declarou estarem em processo de
reconhecimento mais de 3,5 mil comunidades quilombolas, onde vive um total de 1,7
milhão de negros ainda sem condições de moradia. Forçados pelo processo de
urbanização, como disse o ministro da Igualdade Racial, Edson Santos, em 2008: “o
negro deixou a senzala para morar na favela” (G1, 2008).
Já os indígenas sofreram um extermínio desde a chegada dos portugueses
ao Brasil, seja pela disputa pela terra, seja pela escravidão. Expulsos de suas terras,
cerca de 800 mil índios ocupam apenas 13% do território brasileiro. As disputas por
terra e riquezas naturais, bem como os genocídios, colocam esses povos em risco,
relegados à miséria, até os dias de hoje. A invisibilidade faz com que raramente a
população saiba e até debata essa situação (AGÊNCIA PÚBLICA, 2016).
25

Foi com base nessa formação social que se deu a transição para o sistema
capitalista no Brasil. “A opressão de uma raça sobre outra serve aos interesses da
exploração de uma classe sobre outra” (AFONSO, 2018). O racismo oprime e divide
a classe trabalhadora, e, assim, serve à consolidação e manutenção do sistema
capitalista, que perdura até hoje. Associa-se a essa realidade uma série de outras
desigualdades permeadas pelas relações de gênero, condição de saúde, orientação
sexual e, ainda, desigualdades regionais (GUIMARÃES, 2017). Ou seja, os mais
atingidos pela exploração e pela desigualdade social atual são os historicamente
mais explorados. Por isso, há a necessidade urgente de formulação de políticas
públicas que reparem essa dívida histórica e promovam de fato um desenvolvimento
social equitário (MOTTA, 2013).

2.2 LEGISLAÇÃO VIGENTE

2.2.1 Legislação Nacional

A Constituição Federal (1988) atribui, no artigo 21, a competência do Estado


em instituir diretrizes de desenvolvimento e saneamento básico. No artigo 23 a
competência do Estado, dos Distritos e dos Municípios, de proteger o meio ambiente
e combater a poluição, promover programas de construção de moradias e a
melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico. No artigo 255 diz
que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”. No artigo 6º, que trata dos
direitos sociais, prescreve o direito à moradia e à saúde, entre outros, e atribui
igualmente à União a responsabilidade pela assistência aos desamparados da
população. Como direitos fundamentais estão intimamente ligados ao direito
fundamental à vida (BRASIL, 1988).
A Lei nº 11.445 de 2007 dispõe sobre a Política Federal de Saneamento
Básico, baseada nos fundamentos da universalização do acesso, da integralidade,
da articulação com políticas públicas de desenvolvimento, de habitação, de combate
à pobreza, de proteção ambiental, promoção de saúde e melhoria da qualidade de
vida. Estabelece competências do governo federal, estado e prefeituras e
regulamenta a participação de empresas privadas. Atribui ao Ministério das Cidades
26

a responsabilidade pelo Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) (BRASIL,


2007).
A Lei da Política Urbana nº 10.257 de 2001, em seu artigo 2º, traz como
diretriz a garantia do direito ao saneamento e estabelece, também, a competência
da União nas questões da Política Urbana (BRASIL, 2001).
A Lei nº 8.080, que institui o SUS, traz o saneamento básico como central na
política de saúde (BRASIL, 1990).

2.2.2 Legislação de Santa Maria, RS

No município de Santa Maria a lei que estabelece a Política Municipal de


Saneamento Básico, cria o Sistema Municipal de Saneamento Básico e institui o
Plano Municipal de Saneamento Básico, é a lei orgânica nº 6.027 de 2015. Ela
pretende “assegurar a proteção da saúde da população e a salubridade do ambiente
urbano e rural, além de disciplinar o planejamento e a execução das ações, obras e
serviços de saneamento básico do Município”. A lei tem também como princípios
fundamentais a universalização e integralidade do acesso aos serviços. Em seu teor
visa “contribuir para o desenvolvimento e a redução das desigualdades locais, a
geração de emprego e de renda e a inclusão social”, priorizar populações de baixa
renda, proporcionar salubridade sanitária às populações rurais e de pequenos
núcleos urbanos isolados, assegurar retorno social (SANTA MARIA, 2015).
A concessionária responsável pelos serviços de água e esgoto no município é
a Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN), empresa pública do
estado.

2.3 POLÍTICA PÚBLICA

Políticas públicas podem ser entendidas como o “Estado em ação” sob a


sociedade. O Estado é o conjunto das instituições permanentes: órgãos legislativos,
tribunais, forças armadas, funcionalismo público, etc. É o responsável pela
implementação e manutenção das políticas públicas, atua através de programas e
de ações voltadas para setores específicos da sociedade. O Governo é quem atua
no Estado. Atua baseado em uma determinada orientação política específica
(HÖFLING, 2001).
27

No caso do Brasil, os governantes são eleitos democraticamente, havendo


eleições a cada quatro 4 anos. A Constituição Federal de 1988 regra o Estado
Brasileiro descrevendo sua responsabilidade em garantir os direitos básicos da vida
da população, assim como a assistência aos desamparados (BRASIL, 1988). Cabe
aos governantes criarem políticas públicas para efetivar suas responsabilidades.
A partir da perspectiva de classes de Marx, a análise do Estado considera-o
como parte de uma sociedade que concentra e manifesta as relações sociais de
classes e seus conflitos. Em seu papel de regular a sociedade, o Estado acaba
tendo um caráter dúbio. Atua a serviço da manutenção das relações capitalistas em
seu conjunto, garantindo a produção e reprodução de condições favoráveis à
acumulação do capital e ao desenvolvimento do capitalismo, ao mesmo tempo em
que atende às reivindicações dos trabalhadores. Ou seja, o Estado Capitalista por si
só é uma instituição de manutenção do sistema desigual vigente, ao mesmo tempo
em que é essencial para garantir direitos às classes desfavorecidas (GOUGH, 1979
apud PEREIRA, 2009).
Considerando, então, a contradição dialética do Estado, e sua transformação
histórica, cada política pública depende das características do Estado vigente, do
programa do Governo que a propõem e das ideologias envolvidas. Depende
também das relações e interesses existentes na sociedade. Essas distinções
resultam em diferentes concepções de política pública. As contradições da
sociedade desenham um Estado complexo e políticas públicas multifacetadas.
Nesse sentido, os atores políticos possuem um papel determinante na
implementação de cada política (PEREIRA, 2009; SILVA et al., 2017).
Políticas públicas sociais são usualmente entendidas como as de educação,
saúde, previdência, habitação e saneamento. Visam efetivar uma redistribuição de
serviços e direitos com intuito de diminuir a desigualdade social produzida pelo
sistema econômico. Segundo Höfling (2001) “as políticas sociais têm suas raízes
nos movimentos populares do século XIX, voltadas aos conflitos surgidos entre
capital e trabalho, no desenvolvimento das primeiras revoluções industriais”.

2.4 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

O “milagre econômico” tentado pelos governos militares na década de 70 foi o


momento de grandes investimentos em multinacionais e abertura ao mercado
28

internacional, intensificação da industrialização e da produção para exportação e


grandes investimentos em obras de infraestrutura. Foi investido na mecanização do
campo e na intensa urbanização baseada nas indústrias, o que levou ao marcante
processo de êxodo rural no Brasil. Os resultados foram uma enorme da dívida
externa, dependência de outros países, principalmente dos Estados Unidos, grandes
encargos às importações, falência de indústrias, arrocho salarial e aumento da
desigualdade social (SANZ; MENDONÇA, 2017).
Os anos seguintes, anos 80 a 90, foram marcados pelas altas inflações,
desemprego e pobreza. A economia brasileira não conseguia acompanhar os
modelos econômicos mundiais, que estavam caminhando a passos largos para as
diretrizes da política neoliberal. A década de 80 é conhecida como a "década
perdida" devido às crises econômicas vividas na América Latina: índices de inflação
extremamente elevados, retração da produção, perda do poder de compra da
população, aumento da dívida externa e do déficit fiscal. Conhecida também como
uma época de muitas trocas de moedas, vários planos econômicos tentaram salvar
a economia do país e controlar a inflação que chegou a 235% em 1985
(MAGALHÃES, 2012). O Estado teve, assim, uma redução dos investimentos
públicos e das políticas sociais (SIEBERT, 2009).
Com o esgotamento do “Estado Desenvolvimentista”, e o agravamento da
crise econômica, o presidente Fernando Collor (1990-1992) começou uma mudança
na forma de Estado do país. De forma retardatária começou a implantar o projeto
neoliberal no Brasil. Seguido de Fernando Henrique Cardoso o projeto opta pelo
estado mínimo: corte de despesas públicas (inclusive sociais); privatização;
desregulamentação do setor financeiro; congelamento dos salários;
supervalorização do mercado e negação da participação do Estado; flexibilização
das leis trabalhistas, abertura econômica repentina, substituição do Estado pelo livre
mercado (MAGALHÃES, 2012).
Eis que inicia a ideia de competição e individualismo na cultura brasileira.
Tem-se uma naturalização das desigualdades, as políticas passam a ser focalizadas
e assistencialistas, resultando assim, na mercantilização das políticas sociais
(SIEBERT, 2009).
A pobreza absoluta em 1990 foi uma das maiores registradas na história. Em
1991 a inflação atingiu o percentual de 1.476,56% (MAGALHÃES, 2012). A partir
dos anos 90 tem-se moeda estável, porém ainda com ausência de crescimento
29

econômico, elevação do endividamento externo, queda da participação nacional no


comércio exterior, aumento do desemprego, baixo poder de compra dos trabalhadores
e elevação da concentração da renda (POCHMANN, 1998). Segundo um estudo do
IPEA, em 1990, trinta e dois milhões de pessoas, totalizando nove milhões de
famílias, estavam em situação de indigência. E do total das pessoas cuja renda não
permite sequer acesso a uma cesta básica, metade localiza-se nas cidades
(SOARES, 1995). SOARES (2014) descreve sobre a desigualdade social na
América Latina:

A principal manifestação da estrutura social latino-americana é a


desigualdade. Sua constituição tem raízes históricas que vão desde o
colonialismo e, em alguns países como o Brasil, a escravidão; raízes
políticas, ligadas ao profundo conservadorismo das elites mantenedoras do
poder econômico e político, e raízes econômicas, determinadas por um
padrão de desenvolvimento capitalista tardio, periférico e dependente, cujo
modelo econômico sempre foi concentrador e gerador de desigualdades.
Essas raízes se combinam entre si e seus componentes estruturais se
reproduzem ao longo da história dos países latino-americanos.

Em resposta à exploração, à pobreza, à falta de dinheiro, à falta de condições


mínimas de viver e sustentar a família, e ao descaso do Estado, a população se
organiza em busca de soluções. Quando as contradições sociais se tornam mais
intensas e sofrem com a violência de Estado, ressurgem as ocupações de terra.
Embalados pelas lutas pela democratização do país, e cansados da miséria, surgem
os movimentos sociais no país. Propondo um projeto de sociedade mais igualitário,
com reforma urbana e reforma agrária (SILVEIRA, 2014).
Os pequenos agricultores protagonizaram as lutas e ocupações,
principalmente no Rio Grande do Sul, em torno de 1980. Em todo o país focos de
resistência à ditadura das armas e das terras surgiram: posseiros, arrendatários,
assalariados, meeiros e atingidos por barragens. No 1º encontro nacional de
camponeses sem-terra, em 1984, fundam o Movimento dos Trabalhadores Rurais
sem Terra (MST, 2018).
Na luta urbana formavam caravanas de moradia à Brasília realizadas com o
objetivo de levar ao governo federal as reivindicações de um grande número de
sem-teto, inquilinos e favelados, representados por associações, federações
estaduais e movimentos locais. Houve a realização do I Seminário Nacional de
Moradia Popular promovido pela Confederação Nacional de Bispos do Brasil
(CNBB). Os debates envolta da elaboração da Constituição Federal implementaram
30

a Emenda Popular da Reforma Urbana apresentada pelo Fórum Nacional de


Reforma Urbana. Então em julho de 1990 ocorre o I Encontro Nacional dos
Movimentos de Moradia, com representação de 13 estados, e fundam o Movimento
Nacional da Luta Pela Moradia (MNLM) (MNLM RIO GRANDE, 2009 e MNLM-RS).
O movimento descreve seus objetivos da seguinte forma:

A luta pela moradia não se restringe ao simples acesso a um pedaço de


chão ou à casa própria, mas que ela é algo mais amplo, mais plural, pois
engloba o direito pelo acesso aos serviços e equipamentos urbanos, o
direito a um ambiente urbano saudável, enfim, o direito à cidade
(OCUPAÇÃO 20 DE NOVEMBRO, 2007).

O debate da Reforma Urbana compreende não apenas a questão da casa,


mas todo o seu contexto: Educação, saúde, economia, trabalho,
comunicação, meio ambiente, mobilidade urbana, relações humanas, etc.
Propomos discutir e construir a cidade que queremos, democrática,
participativa, sustentável e que respeite as diversidades (MNLM RIO
GRANDE, 2009).

Foi nesse contexto de intensa desigualdade social, demandas concretas de


parcela significativa da população e mobilizações nacionais que, em 1991, foi
fundado em Santa Maria o MNLM. A sua primeira grande ação foi a ocupação da
abandonada Fazenda Santa Marta, a qual se constituiu como a maior ocupação
urbana da América Latina até hoje (SILVEIRA, 2014).

2.5 A HISTÓRIA DA OCUPAÇÃO NOVA SANTA MARTA

A estagnação na construção civil levou a pouca oferta de imóveis para


locação e uma grande especulação imobiliária em Santa Maria entre 1980 e 1990. A
crise econômica somada à falta de políticas e investimentos públicos resultou em
uma considerável parte da população de Santa Maria estar na linha da pobreza, sem
moradia. Uma parcela dessa população começou a se organizar a partir do
Movimento Nacional da Luta pela Moradia (MNLM) em busca de alternativas à
moradia. Articularam reuniões da população na cidade e plenárias na Câmara de
Vereadores com o objetivo de estabelecer negociação entre Prefeitura Municipal,
Caixa Econômica Federal, COHAB/RS (Companhia Estadual de Habitação do
Estado do Rio Grande do Sul) e vereadores. Entretanto os órgãos não
demonstraram interesse em dialogar e solucionar o problema (FARIAS, 2011).
31

As terras da Fazenda Santa Marta eram de aproximadamente 1.200 hectares


ociosos, a qual os proprietários não faziam uso da terra, até que em 30 de novembro
de 1978 ela foi desapropriada pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul.
Destes, 39 hectares foram utilizados para a construção do Conjunto Habitacional
Santa Marta (COHAB). Em 1985, cerca de 343 hectares foram repassados para a
Companhia Estadual de Habitação do Estado do Rio Grande do Sul (COHAB/RS)
com o acordo de construir um conjunto habitacional conforme o Plano Nacional de
Habitação. Após 5 anos a obra não foi executada e retornou ao Estado (SCHERER,
2005 apud FARIAS, 2011).
Na década de 90 as terras da fazenda eram rodeadas pela Cohab Santa
Marta, Cohab Tancredo Neves e as vilas Caramelo, Prado e Jockey. Era um vazio
urbano em uma região de expansão da cidade. Foi então que em 1991 o MNLM
articulou a ocupação das terras da Fazenda Santa Marta, se valendo do
descumprimento da função social da terra garantida na constituição. A ocupação
iniciou na madrugada do dia 7 de dezembro de 1991 com 33 famílias, ao amanhecer
já eram cerca de 100 pessoas e ao passar dos dias continuou em crescente
expansão (Figura 4). O que comprova a extrema necessidade de uma boa parcela
da população do município.

Figura 4 – Foto do acampamento que deu início à ocupação da Fazenda Santa


Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: Cardozo, 2013.


32

3 MATERIAL E MÉTODOS

3.1 ÁREA DE ESTUDO

O município de Santa Maria está localizado no centro geográfico do Rio


Grande do Sul, na latitude sul a 29º41’02” e longitude oeste 53º48’25”, a 293 km da
capital Porto Alegre. A cidade é conhecida como o “Coração do Rio Grande”, possui
261.031 habitantes, sendo maior parte urbana, 248.347, enquanto 12.684 residem
na área rural. Possui uma área total de 1.781,757 km2, tendo uma densidade
demográfica de 145,98 hab km2 (IBGE, 2010).
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) do município é 0,784 (2010), o
Índice de Gini é 0,44 e o Produto Interno Bruto (PIB) per capita é R$ 23.561,62
(2014). Da população, 12,02% vivem com até meio salário mínimo, 23,9% com 1/2 a
1 salário mínimo e 28,59% de 1 a 2 salários mínimos, totalizando 64,51% da
população que vivem com no máximo dois salários mínimos.O índice de pobreza é
25,26%, a taxa de desemprego é 7,40% e a População Economicamente Ativa(PEA)
é 157.269 habitantes (2010) (IBGE, 2017).
No município, 234.825 pessoas são alfabetizadas, restando 10,04% da
população que não é alfabetizada. Do total de domicílios, a cidade possui 13.464
domicílios particulares não ocupados (IBGE, 2017).
Nova Santa Marta é um bairro de Santa Maria que está localizado a oeste da
cidade. O bairro foi constituído após uma ocupação organizada da população. Hoje
possui uma população de 12.722 pessoas (SIDRA, 2017), em uma área de 1,95
km2, resultando em uma densidade demográfica de 6.532 hab. km-1 (PLAMSAB,
2015). A Figura 5 é a localização de Santa Maria em relação ao Rio Grande do Sul,
e a localização do bairro Nova Santa Marta em relação aos bairros do município,
ambos estão destacados com a cor vermelha.
O bairro é composto por sete unidades residenciais, sendo elas: 07 de
Dezembro, 18 de Abril, 10 de Outubro, Pôr do Sol, Núcleo Central, Alto da Boa Vista
e Marista I e II (CARDOZO, 2013) (Figura 6).
33

Figura 5 – Mapa de localização de Santa Maria, RS, e do bairro Nova Santa Marta.

Fonte: Dados IBGE, 2016. Elaborado por SCHREINER, B. T. (2017).

Figura 6 – Unidades residenciais do bairro Nova Santa Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: FARIAS (2011).


34

A região é drenada pela bacia dos Arroios Cadena e Ferreira e possui


vegetação original de campos. O solo predominante é classificado como Argissolo,
que devido a suas características é bastante suscetível a erosão hídrica,
apresentando em sua superfície deposição fluvial mais clara, tipicamente arenosa e
que favorece bastante a expansão do processo de voçorocamento, e abaixo deste,
evidencia-se um material mais argilo-siltoso (FIGUEIRÓ, et al., 2001).

3.2 METODOLOGIA

Uma pesquisa permite a aproximação e o entendimento de uma realidade


(GERHARDT; SILVEIRA, 2009). A interpretação do mundo à nossa volta se dá a
partir das referências sociais e culturais em que estamos inseridos, e se define como
conhecimento (FONSECA, 2002). Segundo Freire (1985) o conhecimento se
constitui nas relações de transformação, na qual transforma tanto aquilo que se
conhece como também o conhecedor, e se aperfeiçoa na problematização crítica
destas relações através do diálogo, da comunicação em cooperação. Através desse
diálogo é possível aproximar o conhecimento técnico-científico do conhecimento
empírico. Gerhardt e Silveira (2009) assinalam com vigor a importância da
experiência do empírico na origem dos nossos conhecimentos.
Segundo Gil (2007) uma pesquisa serve para responder um problema. O
problema, ou pergunta, do trabalho em questão pode ser resumido como: “Como se
deu o acesso ao saneamento básico na Nova Santa Marta?”. Dentro dessa
pergunta, ainda podemos procurar questões mais específicas como: “Qual foi a
relevância da organização social no acesso ao saneamento básico?” e “Teve
políticas públicas? Qual o impacto?”.
Para responder às questões se optou por realizar uma pesquisa exploratória
de abordagem qualitativa a qual envolveu levantamento bibliográfico, visitas de
campo, relatos de histórias de vida e análises. A pesquisa foi realizada entre agosto
de 2017 até julho de 2018.
A pesquisa qualitativa não se preocupa com representatividade numérica,
preocupa-se mais com o aprofundamento da compreensão de um grupo social.
Trabalha com aspectos da realidade que não podem ser quantificados nem
reduzidos à operacionalização de variáveis. O objetivo da amostra, seja ela pequena
35

ou grande, é produzir novas informações, aprofundadas e ilustrativas (GERHARDT;


SILVEIRA, 2009).
O levantamento bibliográfico foi realizado de forma exploratória buscando
referências teóricas, principais conceitos e levantamento de dados que auxiliassem
na fundamentação do trabalho e na interpretação da realidade.
A segunda etapa da pesquisa foram as visitas de campo, visando observar o
local de estudo, analisar as condições atuais de saneamento básico no bairro Nova
Santa Marta, realizar registros fotográficos e coletar os relatos de histórias de vida.
A história de vida é um método utilizado em pesquisas qualitativas através do
qual é possível compreender o que acontece na intersecção do individual com o
social (PAULILO, 1999). Haguette (1987) diz ser a melhor técnica para “dar sentido
à noção de processo”. Estudar processos “requer uma compreensão íntima da vida
de outros, o que permite que os temas abordados sejam estudados do ponto de
vista de quem os vivencia, com suas suposições, seus mundos, suas pressões e
constrangimentos” (HAGUETTE, 1987 apud PAULILO, 1999, p. 141). Nesse método
a pesquisadora interage constantemente com os informantes e a pessoa
entrevistada é livre para contar e refletir sobre o assunto questionado, sem
perguntas fechadas. São valorizados os pontos que o entrevistado deseja abordar
sobre o assunto, a fim de o entrevistador se colocar no papel de aprendiz
(SPINDOLA, 2003).
A opção por relatos de histórias de vida para análise da pesquisa se deu pelo
objetivo de buscar compreender a questão a partir dos principais sujeitos atingidos,
ou seja, compreender o acesso ao saneamento básico a partir do conhecimento
empírico de quem mais necessitava desse serviço: os moradores do Bairro Nova
Santa Marta. A fim de buscar compreender o todo, buscou-se contatar também
representantes de órgãos públicos envolvidos com o acesso do bairro ao
saneamento básico. Desse modo, foram entrevistadas 12 pessoas, sendo: seis
moradores da Nova Santa Marta, um representante da primeira gestão (1999-2003)
da Secretaria Especial de Habitação do Estado do Rio Grande do Sul (Sehab), um
representante da gestão 2001-2009 da Prefeitura Municipal de Santa Maria, um
engenheiro responsável pelas obras do PAC na prefeitura, um engenheiro
responsável pelas obras do PAC na Corsan, um engenheiro responsável pelas
obras do PAC na empresa contratada pela Corsan (Magma Engenharia) e uma
representante do Instituto de Planejamento de Santa Maria (IPLAN). O IPLAN foi
36

criado em 2013 (IPLAN, 2018), portando não existia quando foram realizadas as
obras do PAC na Nova Santa Marta, entretanto o contato foi realizado em busca de
dados e mapas.
As entrevistas com moradores do bairro foram realizadas no local de moradia
das pessoas, exceto duas que foram realizadas por telefone. A entrevista com o
representante da Sehab, da Corsan e da empresa Magma Engenharia foram
realizadas por telefone. A entrevista com o representante da gestão 2001-2009 da
prefeitura foi realizada na Universidade Federal de Santa Maria, e as entrevistas
com o engenheiro da prefeitura e a representante do IPLAN foram realizadas em
seus respectivos locais de trabalho. As respostas das entrevistas foram devidamente
anotadas, sendo que algumas foram gravadas e posteriormente transcritas conforme
consentimento da pessoa entrevistada.
A porta de entrada ao bairro foi através de pessoas conhecidas pela própria
autora da pesquisa. Foram entrevistados, então: moradores, lideranças, moradores
indicados pelos próprios entrevistados e moradores que se aproximaram da autora
durante as visitas de campo. Todos os entrevistados moram na Nova Santa Marta
desde o início dos anos 90, sendo alguns desde o acampamento em 1991, outros
desde os primeiros anos de ocupação. Das entrevistas realizadas no bairro 2/3 eram
mulheres.
Para obter os relatos de história de vida nas entrevistas foi pedido à pessoa
entrevistada contar como foi o acesso ao saneamento básico no bairro. As
entrevistas foram guiadas de modo a compreender como era o acesso à água e ao
esgoto durante o acampamento, como era esse acesso nos primeiros anos de lotes,
qual era a situação do esgoto pluvial, quais eram os problemas gerados pela falta de
saneamento, o que foi mudando ao longo dos anos, quais foram as primeiras obras,
quando e como foi cada processo. Essas entrevistas possibilitaram coletar dados
quantitativos das obras e acesso a arquivos fotográficos. Além disso, buscou-se
compreender com as entrevistas o que motivou as pessoas a ocuparem, e qual a
participação delas com a organização social do bairro.
Com base nas entrevistas dos moradores foram procurados os órgãos
públicos envolvidos com o acesso do bairro ao saneamento básico. Por isso, foram
entrevistados representantes da primeira gestão (1999-2003) da Secretaria Especial
de Habitação do Estado do Rio Grande do Sul (Sehab), representantes da gestão
2001-2009 da Prefeitura Municipal de Santa Maria, engenheiros responsáveis pelas
37

obras do PAC na prefeitura, na Corsan e na empresa contratada pela Corsan, e


representantes do Instituto de Planejamento de Santa Maria (IPLAN).
Nas entrevistas com as gestões da Sehab e da prefeitura solicitou-se um
relato da relação do órgão com o bairro Nova Santa Marta, quais foram as principais
políticas públicas em relação ao saneamento básico e como elas ocorreram. Através
das perguntas buscou-se compreender também a relação pessoal do entrevistado
com o bairro, e a percepção do entrevistado sobre as políticas públicas.
Nas entrevistas com os engenheiros responsáveis e com o IPLAN, também
solicitou-se um relato de como foram as obras do PAC no bairro Nova Santa Marta,
como foi a relação do órgão com os moradores do bairro durante as obras e
principais dificuldades enfrentadas durante as obras. Nesses órgãos foi possível
coletar dados técnicos mais específicos e plantas das obras.
Em todas as entrevistas procurou-se compreender qual a percepção do
entrevistado sobre o saneamento básico no bairro e possíveis sugestões de
melhorias.
Na tabela 3 a seguir consta um resumo da caracterização das pessoas
entrevistadas.
38

Tabela 3 - Caracterização das pessoas entrevistadas pela pesquisadora.

Entre- Local da
Descrição Gênero Ligação com o bairro
vistada entrevista
Mora no bairro desde o acampamento
1 Moradora Masculino Casa da ocupação em 1991, quando tinha 5
anos de idade
Mora no bairro desde o acampamento
2 Moradora Feminino Casa da ocupação em 1991, com marido e
filhos. Foi liderança
Mora no bairro desde 1992 com marido.
3 Moradora Feminino Casa
Foi liderança
Mora no bairro desde o acampamento
4 Moradora Feminino Casa da ocupação em 1991, com marido e
filhos
Morou no bairro desde 1995 com a mãe
e irmãos. Se mudou para estudar na
5 Moradora Feminino Telefone
UFRGS. A família continua no bairro. É
liderança
Acompanha a ocupação desde o início
quando era estudante da UFSM,
morador da CEU II. Foi morar no bairro
6 Moradora Masculino Telefone
em 1997. Se mudou recentemente para
trabalhar pelo MNLM em outra cidade.
É liderança
Fundador nacional do MNLM. Se inseriu
Sehab
7 Masculino Telefone no bairro através dos trabalhos da
1999
primeira gestão (1999-2003) da Sehab.
Morador da Tancredo Neves,
acompanha a ocupação desde o início
Prefeitura
8 Masculino UFSM em 1991 através de apoio solidário.
2001-2009
Trabalhou com o bairro durante as
gestões da prefeitura de 2001 a 2009
Engenheiro Engenheiro da prefeitura responsável
9 Masculino Prefeitura
prefeitura pelas obras do PAC no bairro
Engenheiro Engenheiro responsável da Corsan
10 Masculino Telefone
Corsan durante as obras do PAC no bairro
Engenheiro que acompanhou uma parte
Engenheiro
11 Masculino Telefone das obras de esgoto realizadas pela
Magma
Magma Engenharia no bairro
12 IPLAN Feminino IPLAN Arquiteta representante do IPLAN

Fonte: Elaborado pela autora.


39

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 PARTICIPAÇÃO SOCIAL E O ACESSO AO SANEAMENTO BÁSICO

Ninguém deu nada pra nós, tudo foi conquistado


(Entrevista)

No contexto de crise econômica e aprofundamento da desigualdade social na


década de 1990, o Movimento Nacional de Luta Pela Moradia articulou uma
ocupação das terras sem função social da Fazenda Santa Marta em Santa Maria,
RS.
Quando questionados sobre o que motivou a ocupação da fazenda, o relato
acerca da falta de condições financeiras para a obtenção de casa própria ou mesmo
de realizar pagamentos referentes ao valor de aluguel estava sempre presente na
fala dos entrevistados e entrevistadas. Nesta situação, vislumbravam que o futuro
seria se perder em mais dívidas, morar na rua ou ocupar. Viram na ocupação uma
esperança, dispostos a enfrentar as dificuldades, em busca de moradia e condições
para suas famílias. A fala de um dos entrevistados descreve a situação que levou à
ocupação:

Tem que entender um pouco os anos 90, por um lado no meio rural o MST
no auge das ocupações, uma época ruim, governo do PSDB, desemprego
lá em cima. Em Santa Maria, se tu olhar para a Nova Santa Marta, tu
imagina que aquilo era um vazio urbano gigantesco, em volta tinha
população, duas Cohabs grandes, rodeado de vilas mais pobres, então tava
pedindo para ser ocupado.

No documentário “Nova Santa Marta: 25 anos” (DIÁRIO DE SANTA MARIA,


2017) uma das líderes do movimento explica a ocupação de terras enquanto
garantia do direito à moradia:

Está na constituição que todos têm direito à moradia. Se todos tem direito à
moradia é dever de quem? Do Estado. Mas só está na Constituição porque
quem garante são os movimentos sociais. E a gente garante com a
ocupação.

Na madrugada do dia 7 de dezembro de 1991 mais de 30 famílias,


organizadas através do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), subiram
para ocupar as terras abandonas, desapropriadas pelo Estado desde 1978, da
40

antiga Fazenda Santa Marta. As 33 famílias logo se tornaram 100, 200, 300 pessoas
até o amanhecer (Entrevista). Uma entrevistada define a diferença entre invasão e
ocupação e relata:

Não é invasão, eu não fui lá invadir tua casa, é ocupação. A gente ocupou
um terreno, eu ocupei uma área. Invasão é invadir uma área privada. O
governo tomou a terra da fazenda Santa Marta por falta de pagamento e a
área ficou aí sem uso. O gado que tinha era de outras pessoas que se
utilizavam. Os proprietários nem existiam mais. Aí o movimento e mais
outras pessoas se reuniram para ocupar.

De forma coletiva e organizada, cada família montou uma barraca de lona e


madeira. Foram mais ou menos nove meses de barraca para as primeiras famílias
se alocarem em lotes devidamente planejados, em terrenos demarcados de 10 x 25
m, delimitados, pela própria ocupação, em quadras e ruas de tamanho padrão. Os
acampamentos do MNLM, em geral, seguem essa característica de planejamento,
como relatado a seguir. Os lotes foram sorteados entre as famílias cadastradas e
presentes nas reuniões da ocupação. A Figura 7 mostra a placa da primeira rua a
ser loteada, a chamada Avenida Secundária.

Figura 7 – Placa da Avenida Secundária, primeira rua a ser loteada na Nova Santa
Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: Autora.
41

A seguir alguns registros de falas sobre a organização do processo de


ocupação:
No início da ocupação, não abriam rua que não fosse em tamanho padrão,
com viabilidade para entrar carro, ambulância, etc. Pensaram todas as
demarcações de ruas pensando em tamanhos mínimos. A avenida grande
também foi planejada, para ser mão dupla, então não houve nenhuma
desapropriação para obra, tudo foi planejado antes.

Em 2004, em Salvador, eu fazendo mobilização pelo movimento, mostrava


a foto e não acreditavam que era ocupação. Por causa do respeito ao
traçado urbanístico inicial, as quadras são parecidas, as ruas se ligam umas
nas outras, se acha fácil. Os acampamentos do movimento (MNLM) tem
essa característica. Primeiro acampa, abriga, negocia, conquista área,
marca lote em cima de um planejamento, e aí que vai pros lotes. Construído
com as famílias, na ideia do coletivo.

Os entrevistados relatam que durante os primeiros anos de ocupação até a


organização dos lotes o território era envolto de campo e o acesso à água era
através de uma bica pública na Vila Jockey, na qual, principalmente as mulheres,
formavam filas enormes com latas para encher, panelas e roupas para lavar.
Quando faltava água na bica, então era comum que os vizinhos compartilhassem os
estoques de água. A dificuldade e preocupação com a água por vezes levava a
tensionamentos e discussões nas filas da bica. Relatam também o quanto era
comum utilizarem as sangas para o acesso à água.

As primeiras bicas públicas de água era um negócio muito precário, as


pessoas buscavam água de balde, água para alimentação, banho e tudo.

Para o banheiro cada família havia construído sua patente externa à barraca,
barraco ou a casa (Figura 8a). O banho era de bacia e caneca, no inverno
esquentavam a água no fogão à lenha. Ao longo do tempo algumas famílias
improvisaram chuveiros de lata (Figura 8b).
Silva (2017) relata o quanto as mulheres são as mais afetadas pela falta de
saneamento. Algumas especificidades relevantes são a dificuldade de higiene nos
banhos de balde e caneca, principalmente no período menstrual, e para lavar os
cabelos. Além disso, são as mulheres que dedicam a maior parte do seu tempo a
buscar água e limpar a casa – como pode ser observado no relato de filas de
mulheres com baldes na bica para buscar água, sendo esse um trabalho de intenso
desgaste físico.
42

Figura 8 – Exemplo de patente (a) e de chuveiro de lata (b).

Fonte: (a) MAIOR DE 60 (2015); (b) MLSTATIC (2018).

As entrevistadas relataram que o receio de não conseguir água para suas


famílias gerava uma enorme tensão nas filas, o que por vezes resultava em
discussões e brigas entre as mulheres, afetando a socialização das mesmas. Fatos
como estes, são intensificadores dos níveis de stress e comprometem a qualidade
de vida das mulheres. A autora pontua que as políticas públicas de saneamento
devem ser sensíveis às relações de gênero para trazer resultados mais eficientes e
equitativos (SILVA, 2017).
No que diz respeito à iluminação, utilizavam lampião com diesel, com banha e
candeeiro. Segundo os entrevistados, este tipo de iluminação provocava reações
alérgicas, principalmente nas crianças.
São inúmeros os relatos acerca das dificuldades enfrentadas pelas condições
precárias nas quais se encontravam. Segundo os ocupantes, quando chovia os
barracos inundavam, comprometendo todas as comidas, roupas e móveis. As ruas
“eram um atoleiro só”, usavam sacos plásticos nos pés para proteger do frio e da
umidade. Quando ventava seguravam o telhado para a casa não voar. Quando
desabava a casa, ou inundava, iam para uma Igreja na Santa Marta, onde se
abrigavam com vizinhos. A Figura 9 mostra barracos de residências precárias nos
anos seguintes à ocupação, e a Figura 10 mostra uma das casas da ocupação, já no
lote, na década de 90.
43

Figura 9 – Barracos de residências durante o acampamento da ocupação, Nova


Santa Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: FARIAS, 2011.

Figura 10 – Casa de uma família na ocupação Nova Santa Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: Arquivo de entrevistados.


44

A falta de saneamento era foco de reprodução de vetores e afetava a saúde


da comunidade. Entrevistadas lembram haver muito escorpião no campo, muitos
cachorros pela vila e infestações de pulgas, sarna e bicho de pé. As crianças
adoeciam: “tinha criança com bicho de pé na orelha, na cabeça, no saco...
brincavam no chão e pegavam... enchiam o corpo de pulga, sarna”. O protagonismo
da comunidade e o acesso à informação propiciou a busca pelas resoluções do
problema. Lideranças da comunidade articulariam então a realização de um projeto
em parceria com o os estudantes do curso de Medicina Veterinária da Universidade
Federal de Santa Maria onde seria realizada a aplicação de vacinas nos cães da
região. Além disso, contataram o Setor Imunológico da Prefeitura de Santa Maria
para realizar dedetizações nos pátios. Este relato nos mostra a importância da
população conseguir identificar os dispositivos existentes no combate a infestações,
principalmente por se tratar de questões de saúde pública.
A ocupação de terra se dá devido aos conflitos entre direitos, deveres do
Estado e desamparo da sociedade. Uma vez que o Estado não cumpre seu papel, a
sociedade se organiza para solucionar suas demandas, de forma precária
(DUARTE, 2015). Assim, a ocupação da Nova Santa Marta se constitui, e é
justamente neste contexto que o poder público deve efetivar aquilo que está posto
em lei – garantindo condições necessárias à moradia digna sem disparidade com
outros bairros da cidade. Ao contrário disso, segundo relatos, inúmeras foram as
tentativas de despejo, o indeferimento de acesso à água, luz e esgoto, além da
omissão quanto ao direito à saúde, educação e segurança.
Como estratégia de organização do movimento, sempre houveram grupos de
trabalho organizados para pensar, planejar e reivindicar as diferentes demandas da
comunidade, como água e luz. Durante a ocupação grupos de moradores foram
diversas vezes à Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) e à
Companhia de energia elétrica a fim de conseguir acesso à água e luz para a
comunidade.
Em 1993, dois anos após a ocupação, alguns moradores tiveram acesso à
rede municipal de água e energia elétrica. Segundo os entrevistados, a autorização
das ligações se dava de forma lenta, o que se apresentava como uma forma do
Estado deslegitimar e evitar a expansão da ocupação. A partir daí era comum os
próprios moradores ampliarem a rede e seguido disso a companhia responsável,
45

Corsan, ir finalizar as instalações. Em 1998, após muitas reivindicações, os


ocupantes conseguiriam finalmente a construção de uma adutora que tornou
possível o abastecimento do lado alto do bairro: vilas “Alto da Boa Vista”, “7 de
Dezembro” e “Pôr-do-sol”.

4.1.1 Primeiras políticas públicas para saneamento

Muitos entrevistados relacionaram as melhorias do bairro com o momento


político, relatando que o período onde obtiveram maiores melhorias foi durante a
gestão de Valdeci de Oliveira na prefeitura do município, Olívio Dutra no estado e
nas gestões Lula e Dilma na presidência do país. Elencando como um fator positivo
ter tido um prefeito e um governador eleitos do mesmo partido (Partido dos
Trabalhadores).
Em 1999 foi criada a primeira Secretaria Especial de Habitação do Estado do
Rio Grande do Sul (Sehab). Foi a partir da ação dessa secretaria que a Nova Santa
Marta viu as primeiras obras de infraestrutura e saneamento básico. A implantação
dessa secretaria foi construída a partir da 1ª Conferência Estadual da Habitação, a
qual teve a presença de movimentos sociais e mais de seis mil participantes, com a
diretriz de desenvolver uma política habitacional de interesse social de combate ao
déficit habitacional em conjunto com os municípios e cooperativas habitacionais
(BOA LUTA!, 2011). O primeiro secretário nomeado foi Ary Vanazzi, o qual era
coordenador nacional e fundador do Movimento Nacional de Luta pela Moradia
(MNLM). Em entrevista um representante da Sehab descreveu:

Na época se pensou uma política habitacional dentro de novos padrões,


uma nova visão. Não era só fazer casa, mas era fazer a construção de uma
política que respeitasse a construção da casa, mas também a questão do
saneamento, a questão ambiental; era construir uma nova política a partir
da constituição de 88.

O caso da ocupação da Nova Santa Marta chamou atenção no Estado do Rio


Grande do Sul. “Era muito emblemático. Era uma ocupação em andamento e depois
que o novo governo assumiu ela explodiu” (Entrevista). Era um contexto de forte
organização social e de trabalho com o seminário das freiras dentro da comunidade.
A nomeação de um Secretário de Habitação que tinha vínculo orgânico com a causa
46

foi fundamental para alavancar as pautas do movimento. Em entrevista um


representante da Sehab declarou:

Nós construímos ali na Nova Santa Marta um caso onde a gente jogou as
nossas energias, na articulação democrática, no pensar coletivo com a
sociedade, para as definições do projeto urbanístico, do projeto ambiental,
do projeto de saneamento com a comunidade. Construímos um grupo de
trabalho, com a comunidade, com os técnicos do estado, com os técnicos
da prefeitura. E transformar a experiência da Nova Santa Marta em uma
experiência inovadora, era esse o objetivo.

Uma das políticas adotadas a partir deste período foi montar uma equipe de
técnicos e assistentes sociais no bairro e construir um Conselho Popular do bairro. O
conselho é uma instância democrática de diálogo e atuação conjunta entre a
administração pública e a sociedade civil. Portanto, o conselho era formado por
moradores e representantes do governo. Segundo relatos dos entrevistados, as
reuniões ocorriam a cada 15 dias na sede da comunidade.
A organização dos conselhos se dava da seguinte maneira: Cada quarteirão
tinha um representante eleito (titular e suplente) e reuniões do “Conselho de Quadra”
e cada uma das sete vilas também tinha uma espécie de diretoria. As escolas, por
serem locais de concentração de muitas famílias, eram um canal de diálogo
importante da comunidade. O processo decisório passava, então, pelos conselhos
de quadra e de vila, pelas reuniões com todas as vilas, pelas reuniões com as
escolas e pelo Conselho Popular. Significava o acolhimento das demandas
populares e a decisão democrática das ações do Estado.
Esse processo é pontuado como um momento de muitos avanços no bairro:
“Conselho é desde a primeira vez de governo do Olívio, foi quando deu um up”, “Foi
quando mais avançou a Nova Santa Marta, só não tinha dinheiro”.

De fato se avançou muito, se fez todos os projetos urbanísticos que levou


um tempo grande. Mas não tinha política nacional, então o recurso era
muito escasso. A desgraça é que depois nós perdemos o Governo do
Estado e daí o projeto foi abandonado. Ficou só a prefeitura sem o estado,
com a intervenção da união.

A Prefeitura de Santa Maria (gestão 2001-2009) implantou o Programa “Pé no


Bairro”, o qual se caracterizou por ser um projeto de aproximação da instância
administrativa pública municipal com a população. O objetivo era o conhecimento
das demandas específicas de cada bairro e a participação popular na gestão
47

(PTSLG, 2011; OLIVEIRA, 2015). A partir deste projeto, o prefeito passou a


frequentar os bairros, as associações comunitárias e as casas dos moradores
buscando construir a política municipal. No bairro da Nova Santa Marta o trabalho se
deu em conjunto com o Governo do Estado do Rio Grande do Sul e com o Conselho
Popular da Nova Santa Marta, como relata uma entrevistada:

Veio o “Pé no Bairro”. Eles vinham nas ruas e passavam patrola. Final de
semana ele (Valdeci) vinha no bairro, nas casas, visitava. Empedrou as
ruas, fez orçamento participativo, tinha uma pesquisa, que foi aí que nós
escolhemos o ginásio na escola. Nós tínhamos o conselho da Nova Santa
Marta. A gente conseguiu caminhar melhor na rua, não atolava mais.

Através dessas reuniões que a comunidade construiu o Planejamento


Urbanístico e o Plano Diretor de Desenvolvimento da ocupação da Nova Santa
Marta, elaboraram plantas, pensaram a regularização fundiária e decidiram os
investimentos e obras. Os órgãos dos governos iam até o bairro participar das
discussões e encaminhar as decisões. Relatos pontuam essa ser uma das primeiras
experiências de orçamento participativo no Brasil. Naquele momento decidiriam
sobre a implementação da escola estadual no bairro e sobre a construção de um
ginásio esportivo. Segue abaixo uma declaração sobre as reuniões do Conselho
Popular:

Era legal, era frequente o Rosetto, o Olívio, o Ary Vanazzi que era
secretário de habitação. No primeiro Fórum Social Mundial uma das oficinas
foi na ocupação.

Informações dos entrevistados revelam que na gestão de 1995 a 1999 do


Governo Estadual a Companhia de Habitação do Estado do Rio Grande do Sul
(Cohab) cobrava uma taxa de ocupação por terreno de cada morador. Na gestão
seguinte foi suspensa a cobrança dessa taxa, onde a Cohab acabou por devolver o
dinheiro arrecadado. Esse fundo, então, foi administrado coletivamente pela
comunidade, através do Conselho Popular, a fim de investir no bairro. Os
investimentos eleitos para esse fundo foram: R$ 30 mil em iluminação pública, R$ 40
a 50 mil em topografia, R$ 30 a 40 mil em travessias para drenar e mais de cem mil
em empedramento. Esse empedramento foram os primeiros 6 km de rua revestida
do bairro, pela qual pode passar o ônibus durante anos (Dados coletados em
entrevista).
48

Foi possível constatar, a partir dos relatos, que toda a estruturação e


desenvolvimento que houve no bairro foi realizado a partir das demandas que a
própria comunidade levantou. Vale ressaltar que necessidades sociais não são só
infraestrutura civil, mas também áreas de lazer, esportes, organização e integração
da comunidade.
Como parte do planejamento urbano de desenvolvimento que o conselho
elaborou, a Nova Santa Marta delimitou uma parte urbana, uma parte de sítio
industrial, uma parte rural do Assentamento da Reforma Agrária Carlos Mariguella
(ao extremo oeste), e aos fundos, no alto, um local de preservação ambiental e
ocupação de baixo adensamento.
Para além de atender as demandas imediatas, foi pensado no futuro do
bairro. Para isso, foi realizado um planejamento urbanístico que previa a possível
expansão do bairro. Tomou-se o cuidado de construir ruas que suportassem um
aumento de circulação de pessoas. A fala a seguir relata a experiência:

O que era possível foi feito dentro de um debate coletivo, que envolvia o
técnico, envolvia a política e envolvia orçamento. A visão do bairro, tamanho
da praça, onde vai ser a praça, onde vai ser a Igreja, onde vai ser o salão
comunitário, tamanho das ruas. Daí o cara dizia assim: faz uma rua mais
estreita pro lote ser maior, sim, mas daqui 10 anos a gente vai ter mais
casa, mais gente e a rua fica muito estreita. Então tu já ia pensando o bairro
pra 30 40 anos. Porque tu olhava todo o entorno dela, toda aquela área. Vai
ser área rural? vai ser área urbana? Dá pra fazer espaço que seja
rural/urbano. Teve debate de toda aquela região da cidade, não envolvia só
o loteamento ali de 200 - 500 famílias, envolvia todo o entorno também.

A primeira obra de infraestrutura mais perceptível na Nova Santa Marta foi o


empedramento das ruas, segundo relatos, em meados de 2000. Foi uma obra
significativa, pois as ruas de terra causavam um grande transtorno aos moradores
sujando os calçados, as roupas e as casas. Quando chovia o deslocamento ficava
praticamente impossível em algumas regiões.
Pode parecer um detalhe pouco importante a sujeira que ruas de chão batido
causam, mas há um fator social importante envolvido nessa situação. Ao acessar o
centro urbano e locais mais elitizados os calçados sujos chamam atenção da maioria
das pessoas e, frequentemente, os que usam calçados sujos são taxados de pobres
e todos os outros adjetivos pejorativos que se associa a esta população. E sofrem
exclusão social por isso, sendo excluídos, inclusive, de oportunidades de trabalho.
Excluídos somente pelo estereótipo criado pelo preconceito da sociedade, sem
49

nenhuma relação com as aptidões reais do indivíduo. Como é possível uma


população ascender socialmente, se as oportunidades de trabalho e de relação
social lhe são negadas baseadas em aparências e preconceitos? Portanto, se
enquadrar nos padrões de beleza e limpeza da sociedade torna-se oportuno e até
necessário, a fim de tentar garantir oportunidades menos desiguais.
Ainda, na estratégia de organização através dos grupos de trabalho da
comunidade, agora com apoio e orientação da Secretaria de Habitação do Estado
do Rio Grande do Sul, havia grupos para fazer algumas tarefas pensando cada
questão da urbanização da ocupação. O governo ofertou oficinas para a
comunidade efetivar as demandas. Foi então que um dos grupos de trabalho
construiu os primeiros bueiros e encanamentos para água pluvial. Outro grupo
construiu pontes e passarelas para cruzar os recursos hídricos de forma mais
segura, principalmente porque atravessar uma sanga era o acesso para a escola do
bairro, e as madeiras colocadas, improvisadamente para cruzar, representava um
perigo para as crianças. Uma entrevistada relata esse processo:

A gente fazia coletivamente aquilo ali. Nós tínhamos oficinas com o


governo. Então tinham grupos de trabalho pensando cada questão da
ocupação, tinham grupos pensando nas escolas, nas creches, outros
pensando os debates, outro pensando algumas vias de acesso porque
tinham sangas, então a gente construiu passarelas de madeira, bueiros em
cada esquina. O povo mesmo foi fazendo, a gente aprendeu e foi fazendo.
Tudo foi feito pelo povo. A gente juntou dinheiro para comprar material e
fomos fazendo. Então não tinha mais nenhuma vala aberta. Conseguimos
construir isso no governo Olívio.

A drenagem da água pluvial e o empedramento das ruas diminui a produção


de lama, a inundação de casas e pátios, o carreamento de solo e de resíduos e a
proliferação de vetores como mosquitos, ratos, baratas, etc. Estas obras tornam-se
importantes, principalmente, por se tratar de uma zona de muito declive, logo havia
muito carreamento. Além disso, a saúde dos moradores também pode ser afetada
pela poeira das ruas de chão batido em dias secos, causando problemas
respiratórios. A existência de cursos d’água cruzando o bairro acentuava a
importância de haver medidas de controle de erosão do solo e carreamento de
resíduos, a fim de proteger contra a poluição dos recursos hídricos.
Outra ação do poder público relatada foi a realização das limpezas das
valetas que, devido à falta de saneamento, produzia acumulação de esgoto e lodo, o
50

que causava mau odor forte e proliferação de vetores e doenças. A fala a seguir
relata esse episódio:

Esse negócio das caçambas vir aqui, imagina assim ó, era tirando aquelas
terras de esgoto, abrindo as valeta e tirando aquelas terras que não
prestava, fedida das valetas, era caçamba saindo era caçamba entrando,
era todo mundo na rua feliz.

Foi nesse momento que houve uma política de acesso universal à água e luz
e colocação de iluminação pública. Houve a construção da caixa d’água. Os
banheiros passaram a ser dentro de casa com a utilização de fossa séptica.
Também surgiram os primeiros postos de saúde da região. O governo
municipal (2001-2009) fez um contrato no qual selecionou algumas lideranças da
comunidade para capacitação e trabalho como agentes de saúde do bairro. Neste
mesmo período houve também a conquista do passe-livre aos domingos e a
liberação de recursos para a creche comunitária e o espaço físico do CRAS (Centro
de Referência da Assistência Social) os quais foram construídos e inaugurados anos
depois.
Além de protagonizar o planejamento, realizar algumas construções, a
comunidade realizava a fiscalização das obras.

Aí a gente tinha que fiscalizar as caçambas de brita. Porque dentro de uma


caçamba vem 6m³ de brita, tinha que fiscalizar se vinha mesmo. Às vezes
não vinha e tinha que mandar de volta. Para fiscalização contaram com as
lideranças.

Junto disso, a comunidade organizava bailes e mateadas para arrecadar


dinheiro.

4.1.2 Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)

Segundo relatos de entrevistas, somente em 2007, após 16 anos de


ocupação, que ocorreram obras definitivas de saneamento básico e infraestrutura,
contempladas pelo PAC do Governo Federal. Política inédita no Brasil dava a
oportunidade de investimento federal para grandes projetos municipais, priorizando
ações para populações de baixa renda. Dentre as áreas, o programa objetivava
melhorar as condições de habitação e mobilidade em centros urbanos precários
51

através de obras de infraestrutura (PAC, 2017). Na Nova Santa Marta o PAC só foi
possível graças a muita luta e organização da própria comunidade, como é relatado
a seguir:

Única comunidade do Brasil que se mobilizou para entrar nas obras do


PAC, boa parte das obras do PAC foram definidas de cima a baixo, não
foram demandas apresentadas pela comunidade, a Nova Santa Marta tem o
diferencial que foi um projeto apresentado pela comunidade.

A Nova Santa Marta sempre foi uma ocupação de presença nacional, sempre
participando do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) e das atividades
nacionais. Em 2004 o Governo Federal criou o Conselho Nacional de Cidades para
ser um órgão colegiado de caráter consultivo e deliberativo, parte do Ministério das
Cidades, e o MNLM teve cadeiras de conselheiros representantes (IPEA, 2018).
Dado o exposto, a organização ativa da comunidade, o movimento social de
amplitude nacional, somada à relação direta com o governo federal, foram
essenciais em tornar a informação sobre o PAC acessível à comunidade.
Entrevistados contam que dentro da organização da comunidade sempre
houve uma Comissão de Regularização Fundiária na Nova Santa Marta. Essa
comissão é composta por moradores, lideranças, escola, Igreja, etc., e se reúne
frequentemente a fim de planejar as questões inerentes ao tema. Um representante
da Comissão de Regularização Fundiária conta que, após uma das reuniões da
comissão, viram na televisão noticiar as experiências do PAC na Rocinha e no Morro
do Alemão, no Rio de Janeiro:

No fim dessa reunião começou a noticiar a experiência do PAC da Rocinha


e do Alemão, umas imagens extraordinárias das obras, e aí começamos a
conversar entre nós que se não for agora é nunca mais.

Então algumas lideranças do movimento foram até Brasília para conhecer o


Programa (PAC), saber quais seriam os critérios para participar, e ver a viabilidade
para a Nova Santa Marta. O programa era direcionado aos municípios que tivessem
áreas com desenvolvimento urbano sem infraestrutura e que necessitassem de um
investimento superior a R$ 10 milhões (Entrevista).
A articulação do movimento social, a auto-organização da comunidade e o
conhecimento adquirido durante as experiências de planejamento e de obras
conquistadas com a Secretaria Estadual de Habitação, possibilitaram que a
52

comunidade chegasse ao momento do PAC com experiência e condições suficientes


de propor um projeto viável, como relata o entrevistado: “Quando eu e o
companheiro fomos para Brasília já sabíamos as informações e valores, demos a
letra do projeto. Isso foi acúmulo dessa época do Olívio”.
Um entrevistado conta que o movimento já estava há anos tentando resolver
os problemas de infraestrutura junto a prefeitura e ao governo estadual, porém
ninguém tinha capacidade de investir e construir: “Já tinha uma história de décadas
de “empurra-empurra” entre governo do estado e municipal, porque ninguém tinha
capacidade de fazer R$ 50 milhões pros sem-teto”. Com o conhecimento das
demandas do bairro em mãos, o programa do PAC era a oportunidade perfeita.
A Comissão de Regularização Fundiária foi a responsável por difundir as
informações sobre o PAC dentro do bairro. Há relatos de que foram realizadas
diversas reuniões e apresentações nas escolas e de que não tinha dúvida de que
seriam beneficiados pelo PAC. Como conta um dos entrevistados:

Como que a maior ocupação organizada da América Latina, que está


precisando de infraestrutura, e que não tem recurso do Estado para fazer,
não vai estar contemplada?

O projeto do PAC incluía, então: esgoto cloacal, pavimentação com meio fio,
esgoto pluvial, remanejamentos de rede de água e rede elétrica, e regularização
fundiária. Considerando que, nessa época rede de água e luz já eram serviços
alcançados pelas famílias, seriam somente remanejadas as redes que fossem
interferidas pelas novas obras (Entrevista na Prefeitura). No anexo A consta a planta
de remanejamento da rede elétrica disponibilizada pela prefeitura.
A primeira obra iniciada em 2008, de acordo com informações da prefeitura,
foi a rede de esgoto (Figura 11), a qual contemplava 100% das moradias do bairro.
Previa três estações de bombeamento, toda a rede, até a caixinha de calçada. A
ligação do esgoto à rede ficou a cargo de cada morador. Foi finalizada em 2009 com
mais ou menos 45 km de rede de esgoto cloacal. A planta do projeto do sistema
coletor de esgoto, disponibilizada pela prefeitura, consta em Anexo B. Assim como
as especificações técnicas das estações de bombeamento, linhas de recalque e
redes coletoras de esgoto projetadas em Anexo C e D respectivamente.
53

Figura 11– Tampa de esgoto da Corsan em rua da Nova Santa Marta, Santa Maria,
RS.

Fonte: Autora.

Atualmente há um conflito sobre as estações de bombeamento. Os


moradores do bairro informam que as estações de bombeamento não estão
funcionando. Quando questionada sobre o assunto, a Corsan afirmou estar em
funcionamento.
Segundo a prefeitura, as demais obras de infraestrutura começaram em 2009
e foram até 2012. Tiveram dois tipos de pavimentação: revestimento com manta
asfáltica e revestimento primário com rachão e brita. Uma vez que não teria verba
suficiente para manta asfáltica em todas as ruas, a comunidade elegeu as principais
vias para tal (Figura 12). Escolheram as ruas em que passavam ônibus e as que
tinham muito declive. As demais ruas adjacentes receberam o revestimento primário.
Todas essas obras com meio fio e rede de drenagem pluvial com tubulação e boca
de lobo. Foram projetados 42 mil m2 de pavimentação asfáltica, 174 mil m 2 de
pavimentação primária, totalizando 36.236,22 metros lineares de pavimentação total,
e 21 km de rede de drenagem pluvial. A planta de projeto, disponibilizada pela
prefeitura, consta no Anexo E.
Na Figura 13 é possível observar uma rua com revestimento primário esquina
com uma rua asfaltada, e a presença de boca de lobo.
54

Figura 12 – (a) e (b) Avenida Malman Filho asfaltada, bairro Nova Santa Marta,
Santa Maria, RS.

Fonte: Autora.

Figura 13 – Rua com revestimento primário, esquina com rua asfaltada com boca de
lobo, bairro Nova Santa Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: Autora.
55

A prefeitura reconhece o padrão de planejamento urbano na ocupação da


Nova Santa Marta, como pode ser possível constatar na seguinte fala:

A ocupação foi feita de forma muito organizada, que facilitou o processo de


regularização quando chegou as obras. Quando chegou pra fazer obras de
pavimentação não precisou derrubar casa porque já estavam organizados
em lotes de 10 x 25 m bem bonitinhos.

A regularização fundiária consistia no cadastramento de todas as famílias,


mapeamento de áreas verdes e áreas de risco, reassentamento de famílias que
estivessem nessas áreas e recuperação de áreas degradadas. O mapeamento foi
realizado, as casas foram identificadas, mas até hoje essa etapa não foi concluída,
as famílias em áreas verdes e áreas de risco não foram reassentadas, e as certidões
de posse ainda não foram entregues às famílias. Uma moradora de um local
classificado como área de risco relata esse processo:

O PAC pra mim foi as plaquinhas de área de risco. Veio um pessoal aqui e
colocou a plaquinha identificando área de risco, era para gente receber
indenização, mas até hoje nada.

Além disso, nessa época todas as casas passaram a ter relógio de água
individual, como relatado a seguir:

Antes a comunidade não pagava taxa aí, depois do PAC, passaram a


contribuir. Naquele período as famílias não tinham relógio, pagavam um
valor tabelado, aí depois da obra do PAC todo mundo passou a ter relógio.
Era R$ 30,00 a água, hoje não baixa de R$ 100,00.

Assim como toda estrutura da ocupação da Nova Santa Marta até então, o
PAC também foi todo decidido e planejado coletivamente. Os relatos pontuam que
ao elaborar a proposta de projeto ao governo, uma das exigências da comunidade
foi de haver o acompanhamento da obra pela comunidade. Por conta disso a
prefeitura construiu uma sede do PAC no bairro e disponibilizou uma equipe técnica
para executar a obra na Nova Santa Marta que reunia periodicamente com uma
equipe de acompanhamento da comunidade. A comunidade, então, acompanhava
todos os passos da obra, decidiam quando, por onde e de que maneira iriam
começar as obras, acompanhavam o cronograma, sabiam os motivos dos atrasos,
participavam das resoluções de problemas e imprevistos. Segue relato:
56

Foi se pensando cada etapa da obra, como seria, em diálogo com a


comunidade. Então foi bem importante esse primeiro passo em parceria.
Não foi só chegar a obra e começar a abrir rua e botar esgoto. Foi bem
pensado, iam explicando como seria, a gente ia dizendo. Cuidávamos a
escola para não ser em período de aula. Tinha que deslocar ônibus, as
pessoas tinham que se programar. A gente foi pensando junto.

As entrevistas trazem que havia um cuidado com o transtorno e impactos que


a obra provocaria, portanto toda a comunidade era comunicada das fases das obras.
Ocorriam reuniões abertas das quadras, e depois, a fim de atingir mesmo os que
não puderam participar da reunião, confeccionavam um resumo da reunião e
colavam em todos os mercadinhos, bolichinhos, bares, etc., com um aviso “atenção,
comunidade informa que vai ter tal ação em tal quadra”. Quando era uma ação
maior, com maior impacto, contratavam um vizinho que tinha carro de som e saíam
nas ruas avisando. Abaixo uma manifestação de uma integrante da comunidade
sobre as obras do PAC:

A gente se propôs a pensar, já que é para nossas vidas, vamos fazer legal.
Também porque tinha um governo disposto a fazer isso. E as empresas
eram parceiras. Muitos vizinhos que estavam sem emprego começaram a
trabalhar nessa empresa, na obra da própria comunidade, então tinha outra
relação. Era uma relação boa com a vizinhança inteira. A obra em si foi uma
baita experiência.

Segundo informações no site do PAC (2018), das obras do PAC na área de


“saneamento” e “urbanização de assentamentos precários” em Santa Maria, o
projeto da Nova Santa Marta é a única obra que consta como concluída. Quando
questionados sobre qual motivo atribuem a esse fato, os entrevistados relacionaram
às fortes lideranças: “Aqui nós tinha liderança. A organização foi essencial. Uma,
duas a gente botava a boca no trombone. Nós temos o que muitas vilas mais antigas
não tem. Mas era assim: se era pra fechar o trevo, se era pra abraçar o Palácio em
Porto Alegre, nós ia”.
Portanto, graças ao engajamento da comunidade e à oportunidade do PAC,
100% do bairro teve obras de esgoto doméstico, esgoto pluvial, atendimento de
água e luz, pavimentação e o início de um processo de regularização fundiária. Após
2007 houve a expansão da Nova Santa Marta, então existem hoje regiões sem
cobertura 100% de saneamento, pois foram ocupadas depois das obras do PAC.
57

4.2 OBRAS E PROJETOS

O programa do PAC previa que os projetos tinham que ser municipalizados.


As terras da ocupação da Nova Santa Marta, a antiga fazenda, estavam em poder
do Estado, pois ele tomou posse devido à falta de pagamentos e uso pelos donos da
Fazenda. Logo, para haver o PAC o Estado do RS deveria passar as terras para
posse do município. Esse fato foi bem conturbado, entrevistados contam que foram
necessárias dezenas de atos e protestos trancando a BR, fazendo marcha,
ocupando a Câmara de Vereadores de Santa Maria, o escritório da Cohab, o Palácio
Piratini em Porto Alegre, até convencer a Governadora Yeda (2007-2011) de passar
as terras para a prefeitura de Santa Maria, convencer o governo municipal (2011-
2009) de assumir a projeto, e convencer a cidade de Santa Maria, pois apesar da
grande necessidade e urgência da obra, foi motivo de muita polêmica, preconceito e
rejeição na cidade.
De acordo com o informado pela prefeitura, era sua a responsabilidade da
execução e pagamento das obras. Entretanto, a elaboração dos projetos foi
diferenciada: a Corsan ficou responsável pelo projeto de esgoto e a prefeitura
responsável pelos demais projetos de infraestrutura. Para isso, a Corsan e a
Prefeitura contrataram empresas para a concepção dos projetos. A falta de corpo
técnico e equipamentos suficientes na própria Corsan e Prefeitura levaram a
necessidade de terceirizar a elaboração dos projetos. Os engenheiros dos órgãos
públicos ficaram responsáveis por acompanhar e fiscalizar as obras.
A principal dificuldade encontrada nas obras do PAC, na Nova Santa Marta,
foi nos projetos de esgoto, pois a licitação do projeto não incluiu diagnóstico,
levantamento topográfico e sondagem do terreno. A Nova Santa Marta é um local de
muita declividade e o contrato do projeto básico não considerou a sua topografia
atual. Portanto, na execução das obras se depararam com diversos problemas,
principalmente com cotas e pressão. Existiam quarteirões com ponto de pressão
negativo, casas mais baixas que a rua, mas isso não foi previsto no projeto. O que
resultou em atraso na obra, muitos aditivos no financiamento e algumas casas não
atendidas. Esse parece ser um fato comum em todas as obras no país, como
relatam as falas a seguir:
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E aí a primeira empresa de saneamento foi executar a obra e se deu conta


que os cálculos de rede de esgoto não batiam com a dimensão, porque não
considerava subidas e descidas. A empresa fazia pacotinho fechado para
todos os projetos do estado. Tinha projeto pronto era só licitar. Aí algum
engenheiro da prefeitura viu e não deu. E aí nisso já faltou dinheiro.

No Brasil, infelizmente, é um problema sério. Muita coisa tem que refazer,


recalcular. Custo dobrado. Ai vai o estado pagar. É um problema sério
mesmo. A instituição não consegue se organizar para fazer projetos,
levantamentos, diagnósticos de qualidade. Óbvio que toda obra tem
percalços e imprevistos, mas isso pode ser muito minimizado se tiver um
projeto e um levantamento de qualidade.

É Brasil, por isso hoje as obras dá aditivo direto. É básico, não tem uma
sondagem mais precisa. Quando vai abrir o trecho começa a desmoronar, já
dá um volume maior de terra, porque não foi feito uma sondagem.

Isso não dá no orçamento do governo nunca. Por isso que todas as obras
do Brasil dá aditivo. Bom, quando dá aditivo tu acaba a obra. Quando dá
aditivo além do 25% da lei de licitações, tu faz a obra, usa os 25% e tem
que relicitar para acabar. Por isso as obras ficam nessa morosidade. Esse é
o problema, é projeto básico, não é projeto que tu chega lá e sabe onde tá
pisando.

Outra dificuldade na eficiência da obra é que no projeto de esgoto, segundo a


legislação, a responsabilidade do estado é construir a rede inteira até a caixa de
espera em frente a cada residência. Por sua vez o usuário é o responsável por fazer
a ligação do seu esgoto à rede pública através da caixa de espera. Infelizmente isso
não garante que todos os moradores realizem a ligação corretamente. Conforme os
relatos, esse é outro fato muito comum no país inteiro. Diversos fatores influenciam
nesse fato, seja por não saber, pela falta de informação, pela confusão entre rede
cloacal e pluvial, por não saber que é sua responsabilidade e estar esperando a
Corsan ou a prefeitura realizar a ligação, pela dificuldade em alcançar a caixa de
espera, pela dificuldade de realizar a obra de abrir chão e estender a rede, ou até
pela falta de dinheiro para isso. Todos os entrevistados do bairro disseram que o
esgoto doméstico é junto com a rede pluvial, mas segundo a prefeitura existem duas
redes diferentes. Portanto, até hoje existem casas que não realizaram a ligação à
rede cloacal e estão largando seu esgoto direto no solo, na rua, na boca de lobo ou
na rede pluvial.
59

4.3 SITUAÇÃO ATUAL

4.3.1 Percepção sobre o saneamento

De acordo com as entrevistas, as obras de infraestrutura atenderam a


demanda de saneamento básico do bairro. Hoje em dia não é mais considerado um
problema para a maioria dos moradores. “Os moradores já pouco percebem o
esgoto, tu vai andar na comunidade e não vai perceber aquele drama” (Entrevista).
Ao mesmo tempo em que relatam que “ainda tem muita coisa para melhorar no
bairro”.
Devido à expansão da ocupação após as obras do PAC, existem hoje alguns
focos sem a cobertura dos serviços (Figura 14). Em algumas residências antigas
ainda ocorre a não destinação correta do esgoto doméstico devido à falta da ligação
à rede coletora ou ligação incorreta (Figura 15 a, b).

Figura 14 – Área de expansão da ocupação sem a cobertura dos serviços, com


esgoto a céu aberto, bairro Nova Santa Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: Autora.
60

Figura 15 – (a) e (b) Residências sem ligação à rede de esgoto doméstico, bairro
Nova Santa Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: Autora.

“Se tu ir visitar a Nova Santa Marta é capaz de se deparar com a contradição


de patentes ainda e rede de esgoto inoperante”. A fala abaixo demonstra a
percepção dos moradores sobre o esgoto no bairro:

Já foi da ordem porque era esgoto a céu aberto, muita doença, muito
mosquito, naquele período anterior era um problema sério que impactava na
área da saúde. Era visível, nítido, porque estava na tua cara. Hoje algumas
pessoas se preocupam, mas são as pessoas que não tem acesso à rede.
Ninguém mais entrou depois do PAC.

É possível que a rede dimensionada em 2007 não contemple mais a


população atual. As famílias cresceram, já está na terceira geração familiar desde a
ocupação. Em um mesmo terreno ampliaram as residências. Em uma entrevista é
61

relatada a percepção sobre o fato: “A ocupação aumentou e a rede continua a


mesma, precisa de mais. Chove e vira um inferno, parece que tem mais fluxo”.
Existe um conflito de informações quanto à população atual do bairro Nova
Santa Marta. O IBGE consta 12.722 moradores no censo de 2010 (SIDRA, 2017),
entretanto entrevistas relatam que esse dado não corresponde à realidade. Afirma-
se que hoje residem em torno de 25 mil pessoas no bairro.
O escoamento superficial das chuvas nas ruas de pavimentação primária
ocasionou o carreamento de sólidos e, consequentemente, a perda de solo.
Portanto, com o passar do tempo as ruas ficaram em um nível abaixo das entradas
das bocas de lobo. Moradores mencionam que as bocas de lobo não são mais
eficientes.
Os moradores em geral, principalmente os mais antigos, demonstram
consciência sobre a importância do destino correto do esgoto doméstico.
Demonstram também interesse pela preservação ambiental das áreas verdes. Em
uma entrevista foi relatada a preocupação com a área vizinha, a qual foi classificada
como área verde por estar na passagem de um córrego, e recentemente foi ocupada
por uma família. A área foi aterrada, mas já está em processo de erosão, deixando
uma árvore com risco de queda. Relatou ter denunciado à prefeitura e espera que
alguma providência seja tomada. Em outra entrevista o morador lamenta: “É um
pecado, se tu for ver uma comunidade que se preocupou em preservar área verde,
preservar sanga, tem 144 casas que eram para sair da beira do valo e ainda estão”.

4.3.2 Conflitos socioambientais

Foi exposta também, durante as entrevistas, a preocupação com a atual


situação político econômica do Brasil, relacionando o agravamento da situação
social da comunidade com a crise econômica: “os últimos anos tem piorado a
situação das casas, a crise tem abalado todo mundo”.
As entrevistas explicam ainda como a situação de desigualdade social vivida
na cidade reflete também dentro do bairro. No processo de urbanização há uma
tendência de a população mais pobre fixar residência nas regiões menos
valorizadas. É o caso da ocupação de áreas declivosas, áreas de risco e áreas
verdes. “Essa situação em que o ponto de pressão da casa era negativo para a rede
62

de esgoto, era gente que era muito pobre mesmo” (Entrevista). É um processo que
causa impactos sociais e ambientais.
A nova ocupação na Nova Santa Marta, conhecida como 18 de Abril, reflete
os impactos socioambientais vividos. No fundo da ocupação, na área em volta da
caixa d’água, existe uma área de areia e vegetação frágil, na qual aflora água e que
os moradores dizem ser uma área de recarga do Aquífero Guarani (Figura 16).

Figura 16 – Nova ocupação na Nova Santa Marta, Santa Maria, RS.

Fonte: Autora.

O Conselho Popular do bairro, em diálogo com o governo estadual (gestão


1999-2003), já havia pensado em constituir uma reserva ambiental no local. Nessa
área o convento de freiras iniciou uma experiência de agricultura urbana em
conjunto com a prefeitura (gestão 2001-2009) e com a RBS em um programa de
combate à fome.
Porém, ali ocorreu uma nova ocupação a qual ainda está em fase inicial. Hoje
é uma zona de conflito entre ocupação urbana versus ocupação menos adensada.
Uma ocupação menos adensada seria com pequenas chácaras, de meio hectare,
para produção de alimento, com a finalidade de tentar diminuir o impacto da moradia
e preservar a região. O movimento defende que ali seja um assentamento urbano de
baixa densidade.
63

É uma polêmica hoje, é uma das áreas que mais está sofrendo pressão de
ocupação hoje na Nova Santa Marta. O movimento tem a posição de ser
contrário à ocupação adensada dela. Mas é complicado, todo mundo quer
terreno para morar, mesmo sendo banhado, o desespero bate.

Essa ocupação está em processo inicial, estão se organizando e buscando


lotes. Não há atendimento de nenhum dos serviços de saneamento básico. “A nova
ocupação da caixa d’água ainda não tem esgoto. Eles estão começando se
organizar”.
A prefeitura declarou que no momento não há recurso previsto para essa
nova ocupação: “Em algum momento o município vai ter que entrar com obra lá,
mas por hora não tem recurso previsto. A intenção é que a longo prazo tenha”.

4.3.3 Regularização fundiária urbana

A regularização fundiária urbana (Reurb) atualmente é regrada pela Lei


13.465 de 11 de julho de 2017 (BRASIL, 2017). Basicamente é o processo que inclui
medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais com a finalidade de integrar
assentamentos irregulares ao contexto legal das cidades e à titulação de seus
ocupantes (MOURA, 2017). Após 27 anos de ocupação, e mesmo com todos os
cuidados de planejamento urbano e preservação ambiental tomados pelo movimento
ao constituir o bairro, esse processo ainda está em andamento na Nova Santa
Marta.
Uma das medidas necessárias é o mapeamento do bairro com descrição de
cada lote. Segundo relatado, essa foi uma das fases de maior atraso no processo. O
primeiro mapa gerado foi para realização das obras, o qual não continha a descrição
dos lotes. A empresa contratada pela prefeitura para realizar a descrição dos lotes
teve problemas judiciais e não finalizou o serviço. Com novo processo de licitação,
uma terceira empresa realizou o mapeamento do bairro e o memorial descritivo de
cada lote.
Foi relatado que existem mais de 60 lotes localizados em áreas de risco ou
impróprias, os quais não possuem condições seguras de serem regularizados. As
áreas impróprias seriam residências construídas em cima de rede de esgoto, muito
próximas às tampas da rede de saneamento, entre outras.
64

Atualmente a prefeitura está desenvolvendo a fase de emissão das Certidões


de Regularização Fundiária (CRF). O órgão declarou encaminhar em breve mais de
quatro mil solicitações de certidões ao cartório. O plano do cartório é emitir as
certidões por vilas, iniciando pelas mais antigas.

4.4 MELHORIAS NECESSÁRIAS A PARTIR DA PERCEPÇÃO DOS


ENTREVISTADOS

Durante as entrevistas a educação foi apontada como o principal meio para


alcançar melhorias efetivas na área do saneamento básico. Não é toda a população
que sabe a relação da saúde com o saneamento básico. Foi citado o quanto é
necessário ensinar à população de como construir uma estrutura de saneamento
básico adequada e explicar o porquê de algumas estruturas serem inadequadas.
“No momento em que se tem uma população realmente informada de todos os
riscos que ela corre pela falta de saneamento, tu acaba tendo uma população que
vai cobrar mais que isso aconteça”.
Ainda referente à estrutura educacional foi citada a necessidade da população
saber como resolver os problemas existentes na área do saneamento básico:

Falta muito também é informação em relação à onde ir. Se precisam saber,


a quem se direcionar? A população não tem a menor ideia. Se quer resolver
uma situação de saneamento, com quem eles tem que falar? É com a
prefeitura? É com o Estado? É com a federação? Ninguém tem essas
informações. Então fica aquela situação que te falei: fica nessa situação de
abandono, e ninguém sabe pra que lado correr. Então a educação, a
informação, seria essencial, seria a principal arma para todo mundo aqui.
Porque a partir disso se conseguiria correr atrás de outras coisas, pedir
outras coisas mais, fazer outras coisas.

A importância do movimento social acaba ficando evidente nessas situações.


Um movimento social articulado normalmente sabe onde buscar informações e
resoluções. Normalmente tem um contato mais próximo com instituições e com
outros movimentos sociais. Se for um movimento com mais núcleos, uns aprendem
com as experiências dos outros. E normalmente formam-se redes de solidariedade
em volta do movimento, dispostos a auxiliar. O movimento social acaba cumprindo o
papel educacional de ensinar e envolver a comunidade.
Ao avaliar a experiência do PAC a comunidade apontou a necessidade de
existir uma política de manutenção das grandes obras. No projeto de concepção da
65

obra deveria estar previsto a responsabilidade pela manutenção em caso de


deterioração. Como não há esse tipo de previsão hoje em dia, os consertos ficam à
mercê da governabilidade de cada gestão do município, como detalha o relato a
seguir:

Tem lugares que o esgoto já tá saindo, tem bueiro quebrado, tem muitos
pontos precisando de manutenção. Por exemplo, teve uma rua que teve um
acidente, um caminhão caiu, e aí quebrou embaixo, e até hoje tem esgoto
vazando. É uma rua importante que tem esgoto vazando. A gente cobra de
todos os prefeitos mas ninguém faz.

Por parte dos órgãos públicos, o apontamento para melhorar o atendimento


na área do saneamento básico é o acesso aos recursos. Faltam equipamentos e
equipe técnica suficiente para dar conta das demandas. “Precisa mais
equipamentos, aparelhos, desde softwares (software de orçamento), até carros (às
vezes se deslocar fica difícil), passando por estações totais, GPS, tudo isso, pra
qualificação do trabalho”. E faltam recursos financeiros: “O município não tem
recurso pra isso. Depende de vir recursos de cima, ou até internacional”. Cabe
salientar ainda que o recurso internacional foi relatado como uma possibilidade de
difícil acesso, pois a licitação internacional requer traduções e complexidades que,
segundo o relatado, o município não tem pessoas capacitadas para fazer. Foi
pontuada, portanto, a necessidade de haver mais oportunidades de financiamento
como o PAC.
66

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Nova Santa Marta é um caso extraordinário de acesso ao saneamento


básico através da participação social vinculada a políticas públicas. A busca pelo
saneamento básico é a busca por qualidade de vida, sendo este atrelado à saúde e
infraestrutura, por isso é um indicador de condição de vida. Zonas de população de
baixa renda tendem a ser as com piores condições de saneamento básico. Portanto,
saneamento básico também é questão de classe, gênero e raça. O Movimento
Nacional de Luta pela Moradia buscou, ali, superar a condição de pobreza através
da auto-organização da sociedade. E tem colhido os frutos de sua luta com sucesso.
O desamparo do Estado aumenta as desigualdades sociais e leva a
população a condições precárias de moradia e trabalho, como foi o caso que levou a
população a ocupar a Nova Santa Marta. Quando houve ação efetiva do Estado
dentro da Nova Santa, no sentido de atender às demandas do bairro, foi quando
obteve-se um desenvolvimento social mais significativo. As gestões governamentais
que se propuseram a trabalhar inseridos diretamente no bairro, de forma
democrática e participativa, cooperaram no desenvolvimento social e na autonomia
da comunidade.
As principais ações do Estado ocorreram, segundo os relatos obtidos, a partir
de 1999, nos governos de Olívio Dutra (1999-2003) no Estado e de Valdeci Oliveira
(2001-2009) na prefeitura municipal de Santa Maria, e mais tarde com o acesso ao
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), criado pelo governo federal, na
gestão do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011) e concluído na gestão
presidencial de Dilma Rousseff (2011-2016).
Entretanto, ações pontuais não são o suficiente para manter um espaço
urbano em constante expansão, como é o caso de Santa Maria. O projeto popular
democrático dentro da Nova Santa Marta, construído pelo governo do Estado entre
1999 e 2003, foi abandonado pela próxima gestão de governo. E o trabalho que a
gestão municipal construiu entre 2001 e 2009 foi igualmente abandonado pelas
gestões subsequentes. A não continuidade de projetos e programas sociais, na
sucessão de governos, leva a não atender todas as demandas. Esses fatos
prejudicaram muito o desenvolvimento do bairro, deixando-o com inúmeras
demandas em aberto. Atualmente a Nova Santa Marta necessita de novos projetos e
obras de infraestrutura para atender as novas demandas.
67

Quanto aos problemas enfrentados em projetos licitados por instituições


públicas, a principal dificuldade enfrentada nos projetos públicos é a falta da
realização de diagnóstico, levantamento topográfico e sondagem. Esse fato gera
muitos aditivos no financiamento e atrasos nos prazos. Hoje é usado o parâmetro
“menor custo” para vencer a concorrência, pode ser interessante mudar para um
parâmetro “custo-benefício”, no qual seja possível considerar a qualidade do serviço
ofertado e o histórico dos serviços realizados pela empresa. É crucial que os
projetos licitados incluam diagnóstico, levantamento topográfico e sondagem da
área. Além disso, pode ser interessante incluir nos projetos e licitações um programa
de manutenção da obra ao longo dos anos, seria uma forma de garantir a
manutenção das mesmas após concluídas, uma espécie de garantia do serviço
prestado e evitaria desperdício de investimentos públicos.
A construção de rede coletora de esgoto não garante a destinação adequada
do efluente, principalmente em bairros de baixa renda. Portanto, apesar da rede
coletora estar disponível para 100% do bairro, muitas casas na Nova Santa Marta
ainda não realizaram a ligação do seu esgoto à rede pública, ou ligaram de forma
incorreta. Considerando os impactos socioambientais, essa é uma demanda que
precisa ser resolvida com certa urgência. Segundo as informações obtidas, é
responsabilidade da Corsan notificar os moradores sobre a ligação. Pode ser
interessante realizar uma capacitação com os moradores que ainda não fizeram a
ligação, com o objetivo de orientar como fazer corretamente e quais os benefícios.
Além disso, pode ser interessante aplicar uma política de assistência em que o
poder público viabilize a ligação à rede às famílias cadastradas no Cadastro Único
para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
A Nova Santa Marta é um cenário comum no Brasil, considerando a
quantidade de periferias existentes. Sendo assim, seu desenvolvimento pode ser
considerado um modelo a ser construído em outros lugares. É um caso exemplar de
planejamento urbano e de gestão do recurso público de forma participativa e
emancipadora.
Esse caso pode levar reflexões para dentro da universidade, com uma série
de questionamentos: Como estamos preparando nossos futuros profissionais? Será
que estamos preparando profissionais para atender o público de maior demanda?
Será que estamos preparando profissionais para lidar com uma realidade complexa
como periferias e ocupações urbanas? Será que estamos trabalhando a
68

interdisciplinaridade como as reuniões e planejamentos da Nova Santa Marta? Será


que estamos preparando profissionais que olham o todo, e constroem um
planejamento urbano considerando todos os aspectos possíveis, como o MNLM? Ou
estamos em áreas segregadas e aprendemos a realizar somente o projeto da nossa
área, de forma individual? É uma reflexão que vai para além da responsabilidade de
docentes ou discentes. É sobre o modelo de universidade que temos hoje, e qual
queremos.
Foi graças à articulação política do movimento social, da participação da
comunidade nas decisões coletivas e à disposição de alguns representantes
públicos que hoje mais de 12 mil pessoas vivem em um bairro estruturado e
ascenderam socialmente. A comunidade compreendeu a importância de estar ativa
politicamente. O processo de conscientização e participação coletiva da comunidade
fez com que as pessoas soubessem o que precisavam, porque precisavam, como
conseguir, quem cobrar, e fizeram a sua parte no trabalho e na política.
Experiência que nos leva a refletir também o valor que temos dado ao espaço
político. O quanto nós, enquanto cidadãos, enquanto profissionais e enquanto
eleitores estamos contribuindo para uma política dar frutos assim? Nos importamos
com as ações em nosso bairro, cidade, estado ou país? Nos interessamos em
melhorar nosso local de estudo e trabalho? Participamos de Audiências Públicas,
Fóruns, Sindicatos, Congressos, etc.? Escolhemos nossos representantes políticos
com consciência? É um compromisso individual ao mesmo tempo que coletivo.
Quem tem formação técnica pode incidir para transformar o seu conhecimento em
projetos e políticas públicas para a sociedade.
Para combater o déficit de saneamento básico no Brasil precisamos de
profissionais da área que se preocupem e que elaborem projetos apropriados às
populações de baixa renda e seu local de moradia. Precisamos de incentivo às
universidades públicas para criar ciência de baixo custo adaptada à realidade local.
Precisamos de representantes públicos com vínculo orgânico com a causa.
Precisamos de programas de governo que invistam massivamente na área.
Após as obras do PAC na Nova Santa Marta, continuou havendo expansão
no bairro. Seja pelo aumento das famílias, que já estão na 3ª geração, seja por
novas áreas ocupadas para residência. Esse fato faz com que ainda hajam
demandas a serem atendidas, inclusive no acesso ao esgoto e água. Sendo assim,
são necessárias novas políticas de abrangência no local.
69

Dentre as demandas locais, a maior e mais esperada ainda é a regularização


fundiária, com direito à escritura para cada proprietário. Esse processo precisa ser
concluído o quanto antes, visto que os moradores já residem no local há 27 anos e
ainda não possuem certidão de posse do lote. Tem-se a demanda de elaborar
alternativas às famílias que residem em áreas de risco e áreas verdes, assim como
elaborar projetos de recuperação ambiental dessas áreas. Incluso nisso é
necessário que a prefeitura realize a realocação dos moradores que se encontram
em áreas de risco. Importante que essa realocação ocorra de forma participativa,
considerando o desejo ou necessidade do morador continuar, ou não, no bairro.
Esse detalhe é importante porque é comum ocorrer realocações de moradores para
bairros muito distantes de seu emprego e de seus laços afetivos. Se tratando de
uma população de baixa renda, na qual muitas vezes não tem condições de gastar
com locomoção, é importante avaliar bem esse processo a fim de ele ser efetivo.
Caso contrário pode causar uma volta do morador para a antiga área, com o objetivo
de, no mínimo, manter seu emprego.
As novas ocupações existentes na Nova Santa Marta podem ser reflexo de
uma nova fase de acentuada desigualdade social e abandono do Estado na atual
conjuntura política. Precisamos trabalhar pela diminuição da desigualdade social,
para isso são necessárias políticas públicas a fim de garantir as necessidades
básicas da população, visando promover o desenvolvimento.
70

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Anexo A – PLANTA DE REMANEJAMENTO DE REDES ELÉTRICAS DO BAIRRO NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA, RS.
77

Anexo B – PLANTA DE REDE DE ESGOTO DO BAIRRO NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA, RS.
78

Anexo C – ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS ESTAÇÃO DE BOMBEAMENTO E


LINHA DE RECALQUE DE ESGOTO DA NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA,
RS.
79
80

Anexo D – ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS REDES COLETORAS DA NOVA


SANTA MARTA, SANTA MARIA, RS.
81

Anexo E – PLANTA DE PAVIMENTAÇÃO DO BAIRRO NOVA SANTA MARTA, SANTA MARIA, RS.

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