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Executive MBA

Estudo de caso Percy Barnevik


Asea Brown Boveri
2018
PERCY BARNEVIK E O CASO DA ASEA BROWN BOVERI

1. A ORIGEM DE PERCY BARNEVIK

Percy Barnevik nasceu em uma família relativamente próspera, em 13 de fevereiro de 1941,


ao sul da Suécia, no mar Báltico. Foi o caçula dos três filhos, tendo um irmão e uma irmã mais
velhos. Seu pai trabalhou inicialmente para o jornal local, antes de abrir sua própria empresa
gráfica. Percy Barnevik passou a sua infância na estéril e gelada costa ocidental da Suécia,
onde foi diariamente catequizado numa ética luterana de trabalho pelo seu ambiente e pelos
pais. O desperdício, a ineficiência, a indecisão e a má conduta eram condenáveis: ganha-se o
pão com o suor do rosto. O próprio Barnevik trabalhava como chapista nas suas folgas. O seu
trabalho na pequena gráfica deu-lhe os instrumentos para sobrevivência e sucesso, que
utilizou durante toda a sua vida. Ele aprendeu o valor do comprometimento, dos prazos e da
rapidez e, acima de tudo, do atendimento ao cliente. Aprendeu também sobre o estresse e
como enfrentá-lo.

Essa forma de trabalho motivou-o durante sua carreira acadêmica. Barnevik estava
determinado a ser o melhor aluno da turma. Ele era o aluno que sempre tinha uma resposta
pronta quando o professor formulava uma pergunta. Mesmo naquela época já era intolerante
ao desperdício de tempo. Diferentemente de muitos de seus contemporâneos ele preferia
familiarizar-se com o currículo escolar bem antecipadamente, tipicamente estudando as
matérias muito antes do início das aulas. Até hoje, sabe-se que ele odeia fazer qualquer coisa
sem antes saber preparar-se bem, e está sempre pronto com as informações que precisa,
sempre que necessário. Na escola Barnevik impacientava-se quando as discussões viravam
digressões, ou quando as aulas andavam devagar demais para ele. Não é que ele fosse
arrogante nem se sentisse superior aos outros, menos dotados, provavelmente era porque
ele achava que estavam desperdiçando tempo, que poderia ser aplicado com maior
produtividade em outros afazeres. Ele tem plena consciência de que esse comportamento
continua até hoje. Eberhard von Koerber, um de seus colegas no Konzernleitung (Equipe
Dirigente), chama esse padrão de comportamento de “impaciência construtiva”. Barnevik
sabe que nem todos conseguem reagir tão rapidamente ou ser tão bem preparados quanto
ele, e isso o torna um chefe exigente. Apesar de seus esforços para controlar sua impaciência,
seus colaboradores mais antigos sempre lhe dizem que ele continua tão impaciente como
sempre.

Barnevik sempre foi competitivo. Na Escola de Economia de Goethenburg, ele


constantemente definia a si próprio metas cada vez mais ambiciosas de realização acadêmica.
Até hoje, odeia perder ao jogar tênis com seu velho amigo Arne Bennborn, vice-presidente
sênior de grandes fábricas de compósitos.

Barnevik jamais se considerou pessoa sociável. Matriculou-se em escolas de dança, mas nunca
aprendeu a dançar direito. Nunca fumava, e raramente bebia. As pessoas o achavam
excessivamente sério e distante. Sempre parecia estar preocupado e com pressa. As pessoas
reconheciam, contudo, assim que o conhecessem melhor, que ele tinha certo senso de humor
seco.

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Ele tinha apenas 18 anos quando foi aceito pela exclusiva Escola de Economia de Gothenburg.
Nessa ocasião, realizou seus estudos com o mesmo vigor, tenacidade, perfeccionismo e
dedicação com que havia feito tudo o mais na vida. Afiou suas competências analíticas e
avaliativas, e, conforme dito por seus colegas, fazia isso avaliando novas ideias, em vez de
produzi-las ele mesmo. Barnevik tinha a tendência de afirmar que ele queria ser reprovado
caso não fosse o melhor aluno em todas as matérias.

Durante seus estudos ele parecia não pensar muito na carreira que gostaria de seguir. Estava
interessado em pesquisa, contudo resolveu matricular-se na Licenciatura em Filosofia, curso
que o ligaria mais profundamente com o meio acadêmico.

O programa de Licenciatura exigia um estágio, que ele fez na Molnlycke, grande produtor de
polpa e papel na Suécia. Nessa empresa teve muita sorte. Os modelos que criou durante seu
estágio impressionaram um grupo de consultores do Stanford Research Institute de tal forma
que eles conseguiram para Barnevik uma bolsa de estudos na Universidade de Stanford (1965-
1966), onde se especializou em administração de empresas e ciências da computação, tendo
ainda a oportunidade de viajar por todos os Estados Unidos. Sua permanência em Stanford o
convenceu de que não desejava uma carreira acadêmica. Ao voltar para casa, para grande
desapontamento de seus professores, interrompeu seus estudos na Licenciatura em
Gothenburg. Em retrospectiva, ele percebe essa decisão como o primeiro maior ponto de
virada em sua vida.

2. INÍCIO PROFISSIONAL

Ao voltar da Califórnia em 1966, Barnevik decidiu entrar para uma empresa de consultoria
recentemente formada, chamada Datema. A Datema era administrada por um empresário
que estimulava seus funcionários a tomarem decisões próprias e a assumirem
responsabilidades. A empresa estava desfrutando de um crescimento explosivo e os
consultores mais jovens, em grande medida, estavam por conta própria porque realmente
não havia a quem recorrer. O tempo que Barnevik passou na Datema foi uma verdadeira
experiência de aprendizagem. Com a sua usual disposição de se apresentar como voluntário
para fazer as coisas, ele recebeu cada vez mais responsabilidades, e finalmente foi solicitado
a gerenciar o desenvolvimento de sistemas para o conglomerado Grupo Axel Johnson.

O presidente da Datema gostava da seriedade, franqueza e capacidade de assimilação de


dados que Barnevik tinha. Ele frequentava amiúde a biblioteca, onde acumulou vastos
conhecimentos que o apoiavam em seus argumentos com colegas e clientes, e permitiu-lhe
manter um ritmo de trabalho que poucos conseguiam acompanhar. Até hoje, a rapidez e
longas jornadas de trabalho caracterizam seu desempenho em todos os seus empregos.

Barnevik tinha o hábito de agendar duas e até três coisas ao mesmo tempo, de tal forma a
selecionar apenas os compromissos que parecessem ser mais interessantes. Às vezes marcava
reuniões com seus colegas em horários estranhos e com durações esdrúxulas, por exemplo

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uma reunião às 12h07, mas na realidade ele sempre tinha mais tempo disponível caso o
assunto em discussão o interessasse.

Depois de três anos de casa na Datema, Barnevik foi consultado pela Sandvik, grande
produtora sueca de aços especiais e ferramentas, que estava tendo alguns problemas com o
desenvolvimento de seus sistemas de informações. Dias depois da reunião inicial com a
Sandvik, ele produziu um relatório com importantes recomendações. O resultado foi que a
empresa lhe fez uma proposta (muito acima do que ganhava na Datema) para a
implementação de suas recomendações. Barnevik aceitou a proposta apenas quando a
empresa lhe concedeu a liberdade de selecionar as pessoas que iriam trabalhar com ele. Não
pretendia adentrar a primeira situação de vida real com suas mãos atadas e sob qualquer tipo
de confinamento do espaço operacional. Entrou para Sandvik em 1º de dezembro de 1969.

3. O BARNEVIK EXECUTIVO

Barnevik contratou cerca de 150 pessoas durante o período 1969-1970. Contatou algumas
dessas pessoas antes de entrar oficialmente para a Sandvik. Utilizou a vasta rede que havia
cultivado na Datema, e sua capacidade de convencimento de pessoas a aceitarem suas ideias,
para atrair um grupo de pessoas altamente qualificadas. Uma das pessoas contratadas por
Barnevik na ocasião lembra:

“(...) era impossível resistir ao Percy. Ele me telefonou e disse que queria conversar
comigo no dia seguinte, numa entrevista. Eu disse a ele que era impossível, porque
eu estava de partida para a Austrália. Aí ele me disse que eu teria de mudar a reserva
do voo porque a entrevista já estava marcada e ele já tinha até verificado qual trem
eu poderia tomar. Fui à entrevista, consegui o emprego, e nunca, jamais, tive
qualquer motivo para me arrepender”. 1

Barnevik contratava pessoas com que podia contar, pessoas para quem podia delegar e
pessoas em quem podia confiar. Algumas dessas pessoas, como Bengt Skantze (atualmente
chefe de desenvolvimento corporativo da ABB), que ele havia conhecido na Datema, estão até
hoje trabalhando para ele. Devido à sua longa associação com colaboradores mais íntimos, as
comunicações tendem a exigir poucas palavras. Ele sempre pode contar com essas pessoas
para executar qualquer sugestão que faça.

Como chefe do desenvolvimento corporativo, ele foi contratado para desenvolver os novos
sistemas de informação da empresa e racionalizar suas funções administrativas. Tipicamente
ele ampliou o papel e se atribuiu algumas outras responsabilidades. O trabalho original de
desenvolvimento administrativo e sistemas de informações rapidamente foi engavetado,
porque ele passou mais tempo endireitando e reestruturando as empresas Sandvik na Ásia,
África, Europa e Américas do Norte e do Sul. Para uma empresa que até o momento tinha sido
muito tradicionalmente gerenciada, Barnevik era como um furacão. Ele agia assim não porque
queria fazer seu nome ou sua carreira, mas porque estava convicto de que havia tantas coisas
erradas na empresa que ele precisava mudar para que ela fosse mais eficiente.

1
Entrevista com Anders Vrethem, subordinado de Barnevik na Sandvik

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4. ATINGINDO O TOPO

Em 1975 Barnevik aceitou a designação de primeiro-executivo da subsidiária americana do


grupo Sandvik, a Sandvik Steel Inc., cujo desempenho no mercado naquela ocasião andava
fraco. Ele conseguiu racionalizar as operações e triplicar o faturamento, que chegou a
US$ 250 milhões, e tornar a empresa rentável nos quatro anos em que lá permaneceu. Em
retrospectiva, contudo, parece que ele cometeu alguns erros estratégicos. Porém, ele jamais
teria aprendido que eram erros sem que os cometesse. Isso confirmou sua opinião de que é
melhor agir do que não fazer nada. Há alguma coisa a aprender com os próprios erros. Numa
entrevista, ele declarou o seguinte:

“Você precisa aceitar uma parcela razoável de erros. Eu digo ao meu pessoal que se
nós tomarmos 100 decisões e 70 delas estiverem certas, já basta. Para mim é melhor
estar mais ou menos certo do que ser lerdo... por que destacar a rapidez às custas
da precisão? Porque os custos do atraso são muito maiores do que um erro
ocasional.” 2

Ele gostava de atuar no campo, e uma de suas grandes realizações foi “comer” participação
de mercado de concorrentes temíveis como a US Steel e a General Electric, e no próprio
quintal deles. Retornou à Suécia para assumir a posição de vice-presidente executivo de
Finanças e Administração da Sandvik, com a oportunidade de se tornar primeiro-executivo do
grupo dentro de poucos anos, porém não permaneceu muito tempo no cargo. Um ano depois
de seu retorno, foi convidado para ser o primeiro executivo da ASEA.

5. A REVOLUÇÃO NA ASEA

Em 1979, a ASEA sueca estava crescendo devagar, mas era respeitada, sendo uma das dez
maiores empresas de engenharia elétrica do mundo e tecnicamente uma empresa de classe
mundial com cerca de 40 mil funcionários, 30 mil dos quais na Suécia. Econômica e
financeiramente, contudo, a ASEA ia mal. Havia excesso de capacidade instalada em seus
mercados, a demanda estava enfraquecendo e os lucros da ASEA estavam caindo
continuamente. Além desses fatores externos, a empresa tinha uma estrutura centralizada e
burocratizada, e enfrentava sérios problemas de moral interno.

A ASEA proporcionava aos seus funcionários um emprego seguro, cuidava deles de uma forma
patriarcal e selecionava e promovia seus gerentes de acordo com sua competência técnica, e
não pelo tino para negócios. Ninguém havia sido demitido desde os anos 30, política que foi
rigorosamente mantida mesmo durante os difíceis anos da década de 70. A empresa tinha,
porém, produtos de ponta em várias áreas em crescimento e que eram lucrativas.

Era desse tipo de convite que Barnevik gostava. O desafio era impor a si próprio, um não
engenheiro numa empresa dominada pela engenharia, mudar as atitudes de complacência e

2
TAYLOR, William. The logic of global business: an interview with ABB´s Percy Barnevik. Harvard Business Review,
Marc.-Apr. 1991,p.99,101,104

|5|
apatia que prevaleciam na equipe de trabalho e promover uma reviravolta na empresa o mais
rápido possível. Ele era de opinião que tinha de agir depressa, porque precisava reposicionar
a empresa e trazê-la de volta à boa saúde, de tal forma a conseguir beneficiar-se do esperado
contraciclo positivo do mercado de produtos elétricos pesados nos últimos anos do século.

Como sempre, Barnevik preparou-se intensivamente antes de assumir suas


responsabilidades. Ele leu tudo que havia disponível a respeito da empresa e fez com que
alguns engenheiros da ASEA lhe ensinassem a respeito do negócio, muito antes de deixar a
Sandvik. Um de seus colegas lembra-se de que se reuniu com ele naquela ocasião: “Eu o
encontrei numa área recreativa, acompanhando seus dois filhos, que estavam esquiando. Ele
segurava seu cachorro pela guia com uma das mãos e com a outra segurava um livro de física,
que lia absortamente”.3

Ao assumir sua posição, ele selecionou a dedo um pequeno grupo de executivos da ASEA, que
representavam uma multiplicidade de disciplinas, para serem seus consultores e catalisadores
pessoais. “Os Garotos do Percy” (incluindo uma mulher), como eram chamados, tinham a
missão de ajudá-lo a analisar as questões com que se defrontava a empresa.

Barnevik sabia, ao assumir sua nova posição, que uma mudança gradativa não teria qualquer
efeito sobre sua empresa. A ASEA precisava de uma sacudida radical, que chocasse a empresa
e a recolocasse nos trilhos. Também não queria que o processo se arrastasse muito e criasse
grandes incertezas, impedindo a empresa de se refocalizar com rapidez. Fazer isso foi difícil,
porém ele realizou duas mudanças estruturais.

A primeira delas foi reduzir o número de níveis organizacionais e reorganizar a empresa em


termos de uma matriz global, uma vez que a empresa havia crescido internacionalmente; a
segunda foi eliminar a burocracia da sede da empresa. Ele fez isso aplicando um “macete”
simples – as regras dos 30%. Ele acreditava apaixonadamente que a burocracia gera
desperdício e, por esse motivo, ele a desdobrou supondo que 30% do estafe central poderia
ser remanejado para centros de lucro separados e independentes, outros 30% poderiam ser
transferidos para as empresas operacionais fazendo parte do overhead delas, mais 30%
poderiam ser eliminados, por serem supérfluos às necessidades da empresa, e os restantes
10% seriam mantidos como o mínimo necessário. Ele era motivado pela convicção de que
eram necessárias unidades de negócios que fossem autônomas, situadas o mais próximo
possível do cliente final. Esta cirurgia radical na sede da empresa, onde ele reduziu o número
de funcionários de 2 mil para 200, exemplificou essa filosofia em ação.

Na Suécia esse período de downsizing e redução de camadas hierárquicas ficou conhecido


como “O Reinado de Terror do Barnevik”, epíteto que o irrita até hoje. Outros o chamaram de
revolução cultural da ASEA. De acordo com Barnevik, as pessoas não pareciam entender bem
sua angústia em tomar essas decisões. Ele achou que elas não entenderam que apenas uma
empresa delgada e eficiente poderia sobreviver num mundo muito competitivo.

3
com Frederyk Byatrand, subordinado de Barnevik na Sandvik

|6|
Barnevik teve sorte porque o clima na ASEA estava mais aberto a mudanças do que antes,
devido à deterioração da situação econômica. Havia uma grande vontade de aceitar o fato de
que a antiga maneira de agir já não funcionava mais.

Enquanto se dedicava ao processo de transformação, Barnevik fez um grande esforço para


comunicar o que estava fazendo ao maior número possível de pessoas, para evitar a
disseminação de rumores e de incertezas. Isso incluía conversas com líderes sindicais e
políticos, explicando o que ele queria realizar, abordagem muito diferente do regime anterior,
que havia considerado esses grupos de interesse mais como ameaças. Eventualmente, suas
mudanças radicais geraram resultados positivos. Nos sete anos em que esteve à frente da
ASEA, o faturamento da empresa quadruplicou, os lucros aumentaram 800% e sua
capitalização de mercado multiplicou-se 20 vezes.

Mas Barnevik não parou por aí. Estudando as tendências de mercado, ele acreditava piamente
que haveria um reordenamento no setor elétrico, e que a ASEA teria de se internacionalizar
ainda mais. A única forma de fazê-lo seria por meio da aquisição de empresas onde quer que
as encontrasse. Dois ou três anos depois do saneamento da ASEA, ele começou a aumentar a
presença nos países vizinhos, para transformar a Escandinávia inteira num mercado
doméstico único.

Ele também estava de olho nos Estados Unidos, e tentou comprar negócios de um dos seus
principais concorrentes, a General Electric, frustrado, contudo, pelo preço exigido por Jack
Welch. Foi nesta altura que ele resolveu abordar a empresa suíça Brown, Boveri&Co., e
subsequentemente concluiu a maior fusão interfronteiras da Europa deste século.

A decisão de Barnevik de ir conversar com a BBC estava baseada na lógica pura do encaixe
entre duas empresas. A ASEA operava em áreas geográficas e em algumas órbitas de produto
que no total complementavam, em vez de concorrer com os produtos da BBC. Em algumas
áreas, como transmissão de energia elétrica, havia uma grande superposição; porém, se
adequadamente reestruturada, a nova empresa desfrutaria de uma evidente liderança em
termos de porte e competitividade. A fusão agregaria valor a ambas as empresas, que eram
pilares sólidos e tradicionais de seus ambientes locais e, caso permanecessem isoladas, mais
cedo ou mais tarde teriam de permitir sua encampação ou fechar as portas. Além disso, havia
semelhanças entre os suíços e os suecos: não haveria grande pirotecnia de temperamentos
explodindo.

As duas empresas juntas representavam uma temível força global. O principal problema que
Barnevik percebeu na fusão foi que ambas as empresas tinham de ser integradas
rapidamente, sem agregar muita burocracia ou incertezas. Ele sabia muito bem que, quanto
mais longo o “namoro” entre as duas, mais vulnerável ele estaria a críticas de natureza
política. A fusão poderia assumir contornos mais complicados se fatores tais como o orgulho
nacional (dilapidar o “patrimônio nacional” de um país), debates sobre a perda de tecnologias
centrais e desemprego em potencial, por meio de reestruturação, fossem levantados não
apenas pelos empregados e gerentes, como também pelos políticos, líderes sindicais e
imprensa.

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Quando a fusão foi anunciada em 10 de agosto de 1987 em entrevistas coletivas simultâneas
à imprensa em Estocolmo e em Baden, na Suíça, a notícia foi uma surpresa total. Ambas as
empresas mantiveram rigorosa confidencialidade durante todo o processo. Barnevik
conseguiu completar o processo inteiro em apenas seis semanas. Ele dispensou praticamente
todos os aspectos dos levantamentos cadastrais, atendo-se apenas aos mais básicos,
procedimento muito arriscado em qualquer circunstância, porém ele achava que o risco era
mínimo e os retornos em potencial, enormes.

6. A FUSÃO DERRADEIRA

A rapidez era um fator da maior importância tanto antes quanto depois da fusão. Barnevik
queria encerrar o processo de integração o mais rapidamente possível, porque achava que era
melhor evitar confusão e perda de participação de mercado4 e acreditava ser “melhor andar
depressa e corrigir um ou outro erro depois, ao invés de deixar o pessoal na incerteza sobre
seu futuro”.5

Ele agiu com extraordinária rapidez. Arne Olsson, chefe de recursos gerenciais da ABB, lembra-
se:

“Eu achava que ele (Barnevik) já estava correndo em velocidade máxima e


estourando os giros do motor. Eu achava que ele já estava em quinta e perto da faixa
vermelha. Mas quando a fusão começou a acontecer ele engatou mais uma marcha
e acelerou.”

Assim como fez ao entrar para a ASEA, Barnevik começou a buscar os executivos-chave que
seriam seus lugares-tenentes para fazer a nova empresa funcionar. Ele decidiu que esses
executivos globais deveriam ser “(...) pessoas capazes de se tornarem superestrelas –
indivíduos resistentes, ágeis, com boa formação técnica e comercial e que tivessem
demonstrado capacidade de liderança”.6

E suas características mais importantes seriam:

“paciência, bom domínio de idiomas, perseverança, experiência profissional em pelo menos


dois ou três países, e, ainda mais importante, humildade e respeito por outras culturas”.7

“Os gerentes globais têm um descortino excepcionalmente amplo. Eles respeitam a


forma pela qual diferentes países fazem coisas diferentes, mas também sabem
aprender porque estes países o fazem assim. Mas também são incisivos, e levam a
cultura aos seus limites. Os gerentes globais não aceitam passivamente quando
alguém diz ‘Você não pode fazer isso na Itália ou na Espanha por causa dos

4
FLORIN, M.; FRANKEL, H.; WILKE, B. Vi ingadesattbortsefranallaliklasten. Veckans Affarer, p.62,20 de agosto de
1987.
5
ARBOSE, Jules. ABB: The new international powerhouse. International Management, 43(6),p.
6
ARBOSE, op. Cit., p.27
7
RAPOPORT, Carla. How Barnevik makes ABB work. Fortuine, p. 27, 29/6/92.

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sindicatos’, ou ‘Você não pode fazer isso no Japão por causa do Ministério das
Finanças’. Ele vasculham o entulho das desculpas culturais e descobrem
oportunidades de inovar. Os gerentes globais são também generosos e pacientes.
Eles conseguem enfrentar as frustrações das barreiras idiomáticas”. 8

“Porém, além destas características eles precisam de outra qualidade: eles


desenvolvem seu pessoal. Esta pessoa é ‘doadora’ ou ‘receptora’? O doador
disponibiliza pessoas para outras partes da organização, e o receptor precisa de
gente o tempo todo”.9

“Ao mesmo tempo ele achava que milhares de gerentes globais são desnecessários.
Ele acreditava que para funcionar bem a ABB precisaria de mais ou menos 500
gerentes globais, pessoas que fossem de orientação internacional, mas que também
estivessem à vontade com sua nação de origem”.10

Durante esse período ele e sua equipe dirigente, bem como pessoas dos departamentos de
recursos humanos de ambas as empresas, virtualmente entrevistaram pessoas 24 horas por
dia, para identificar aqueles que melhor se adequassem para serem gerentes globais. Barnevik
calculou que ele próprio realizou perto de 500 entrevistas, e não se lembra de haver
trabalhado tanto em sua vida.

Então, em 1988, depois de terminar as entrevistas e identificar suas superestrelas, veio o


episódio de Cannes.

Barnevik achava que precisava compartilhar sua visão de empresa com seu pessoal e dar-lhes
um referencial dentro do qual realizar seus negócios. Apenas cinco meses depois da fusão, ele
convidou 250 executivos para um seminário de três dias em Cannes, em cuja ocasião ele
apresentou sua maneira de ver a ABB, que seria o novo nome da empresa. Mostrou cerca de
198 slides, trabalho pesado até mesmo para ele, e impressionou profundamente seu pessoal
explicando os princípios pelos quais as empresas fusionadas operariam, apresentando uma
bíblia corporativa de 21 páginas, e pedindo ao seu público que transmitisse tudo aquilo que
haviam ouvido ao nível subsequente de gestão, 30 mil pessoas no total em todo o mundo, nos
sessenta dias seguintes. Ele sempre acreditou que comunicações abertas eram a chave para
um negócio bem-sucedido.

Seu trabalho seguinte foi dinamizar a ABB. Exatamente como fez na ASEA, buscou a redução
do efetivo na sede, usando a mesma regra dos 30%, e começou a descentralizar as operações
da maioria das subsidiárias, formando centros de lucros independentes. Apenas 150 pessoas
permaneceram na sede. Não se admira que essa política tenha encontrado resistência da força
de trabalho e daqueles que perderiam seus empregos. Foram dias difíceis, mesmo para
Barnevik. Nunca é fácil dizer a alguém que ele é supérfluo à empresa, e menos ainda quando
se acha que, em outras circunstâncias, essa pessoa seria um de seus melhores recursos. No

8
TAYLOR, op.cit.,p.94
9
Entrevista com Percy Barnevik, feita pelo autor
10
TAYLOR, op.cit., p.94

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final a empresa saiu do processo melhor, mais enxuta e mais pronta a competir nos mercados
mundiais.

Muito trabalho havia sido desenvolvido, contudo, para fazer funcionar esta megafusão
interfronteiras. Provavelmente a mudança de mais longo alcance implementada por Barnevik
na nova empresa tenha sido a introdução da matriz global que ele já tinha utilizado na ASEA.
A ABB agora tinha uma equipe de 250 executivos “globais” (incluindo 136 gerentes nacionais
e 50 gerentes de áreas de negócios), chefiando 210 mil funcionários em 1.300 empresas que
estavam divididas entre cinco mil centros de lucros localizados em quase 150 países em todo
o mundo em pelo menos sete diferentes segmentos de negócios. Sob certo aspecto, o modelo
transformou a ABB numa federação de empresas. O próprio Barnevik, e 12 vice-presidentes
executivos (mais tarde reduzidos para sete) formavam o supremo corpo decisório da empresa,
o Konzernleitung.

Para controlar essa gigantesca operação, Barnevik exigia de cada centro de lucro balancete e
demonstração de resultados mensais, que deveriam ser entregues na matriz todo dia 10 de
cada mês. Para reduzir o tempo perdido no processo decisório, cada região tinha sua própria
controladoria. As questões mais importantes, contudo, eram resolvidas em Zurich. A cada três
semanas havia uma reunião do Konzernleitung, em que um dia inteiro era dedicado a
questões estratégicas e operacionais.

Contudo, Barnevik criou uma organização que era não apenas enxuta e flexível e
descentralizada o suficiente para atuar em qualquer local do mundo (graças ao sistema de
informações ABACUS, que fornecia dados para as operações de linha de frente e ajudava a
gerência de grupo a avaliar o desempenho), mas que também se beneficiasse de economias
de escala advindas de se considerar o mundo como um mercado único. O sonho que ele teve
quando nos Estados Unidos, de operar num único mercado mundial, já era quase uma
realidade.

7. DINAMIZANDO A ABB

Para estar presente em todas as áreas do mundo, Barnevik adquiriu empresas em todos os
locais onde a ABB não é forte. Ele conseguiu estabelecer a presença da ABB em todos os
grandes mercados mundiais através dessas aquisições e sempre adotou as mesmas táticas
que empregou na aquisição da Stromberg ou durante o processo de fusão que criou a ABB.
Ele tem orgulho do fato de que pode às vezes decidir, negociar e comprar muito antes que
seus concorrentes tomem conhecimento do que está acontecendo. Já foi dito que ele age
mais por razões “ideológicas” do que devido à lógica empresarial pura. Barnevik acha que não
precisa de desculpas para suas ações junto aos acionistas, visto que a maioria das empresas
adquiridas foi saneada em dois anos e o leste europeu atualmente é rentável. Algumas das
primeiras empresas adquiridas são altamente lucrativas.

Uma de suas maneiras preferidas de manter seus executivos no desempenho máximo é


periodicamente remanejar as responsabilidades de tal forma que ninguém tenha tempo para

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ficar complacente e ineficaz em seu trabalho. Ele não perdoa nível hierárquico algum dessa
mudança constante, nem o Konzernleitung. Em agosto de 1993, o Konzernleitung foi
racionalizado visando fortalecer a competitividade da ABB e ajudar a empresa a ajustar-se ao
aumento dos blocos comerciais regionais. O número de assentos do Konzernleitung foi
reduzido de doze para oito, e as seis divisões operacionais foram reduzidas para quatro.
Barnevik mudou as responsabilidades de cada membro do Konzernleitung pelo menos uma
vez, e acrescentou ou eliminou nomes da lista de membros que compõem o Konzernleitung.
Ele acredita que se as pessoas em todos os níveis da organização estiverem alerta, a
organização como um todo é estimulada a ser flexível.

A administração da ABB atualmente centra-se na operação de dois eixos – a expansão e a


manutenção do vetor inercial da empresa, que depende de uma cultura de revolução
permanente. Isso produz problemas muito específicos. Fica difícil manter o sentido de
empolgação e padrões de alto desempenho quando as pessoas se sentem inseguras, como
inevitavelmente o fazem numa empresa que está em constante estado de mudança,
permitindo pouco tempo para o processo de integração e de formação de uma estrutura
estável. Em certa medida, os problemas desse segundo eixo são resolvidos pelo primeiro: os
novos empreendimentos da ABB na Polônia e na China e seu engajamento como
enfrentamento de problemas ambientais no antigo Bloco Oriental são uma fonte de orgulho
e de motivação para os funcionários. Apesar disso, existem reais dificuldades que são
encontradas quando se trabalha para a ABB, e a legendária preferência de Barnevik pela
rapidez é responsável por muitas delas. A visão dele foi assimilada? Foi transmitido o sentido
de engajamento? A moldagem de empresas adquiridas em um todo cultural leva tempo – e
Barnevik não faz segredo de sua preferência pela rapidez em relação a outros fatores no
processo de aquisição.

A resposta de Barnevik a essas dificuldades pode ser o destaque de sua crença na importância
da comunicação. Esta foi a motivação por trás da conferência de Cannes, em que ele definiu
os cinco valores centrais da empresa e iniciou o procedimento que pretendia transmiti-los a
todos os níveis gerenciais. Os valores da ABB – Atendimento das Necessidades do Cliente,
Descentralização, Empreender Ação, Respeito à Ética e a Cooperação – são reforçados por
meio de programas internos de treinamento de executivos, em que Barnevik e outros
membros do Konzernleitung investem grande parte do seu tempo. Os principais valores, do
ponto de vista de Barnevik, são o Atendimento às Necessidades do Cliente e a
Descentralização. O primeiro deles destaca que o cliente sempre vem em primeiro lugar, e
que todos na empresa têm a responsabilidade de satisfazer os desejos do cliente. Todos os
funcionários devem conhecer os clientes, mesmo quando isso não é uma parte óbvia da
descrição do cargo do funcionário. Barnevik percebe a Descentralização como a única forma
de derrotar a burocracia, à qual ele sempre teve profunda aversão. Dessa forma a
responsabilidade é transmitida pela hierarquia até os níveis mais baixos, dando ao pessoal
mais moderno motivação e proporcionando a utilização mais eficiente de recursos no nível
em que são exigidos. É vital que esse processo seja combinado com uma comunicação
eficiente e com supervisão adequada.

Empreender ações talvez seja o valor mais motivado por questões pessoais, dentro dos cinco
valores básicos: preparar meticulosamente, não se atrapalhar com os detalhes, não investigar

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as coisas até a raiz e, acima de tudo, ser rápido. Isso com certeza elimina o gerenciamento por
comissões. Comissões são avis rara na ABB. A forma pela qual Barnevik normalmente defende
o Respeito à Ética é “(ser) considerado confiável, cumprir nossa palavra, não tentar ser esperto
e enganar as pessoas, seja tratando de assuntos internos, seja tratando com os clientes”. Pode
ser idealismo esperar que todos cooperem de acordo com um sentimento de honra e
honestidade, mas na realidade o princípio funciona. A cooperação é o valor mais
frequentemente citado sempre que a mudança é imposta sobre a organização. Barnevik
insiste que realmente não importa onde alguém trabalha, desde que este permaneça dentro
do grupo ABB. É a aplicação desse valor que provoca a transferência de uma tremenda
quantidade de papel entre as mesas das pessoas. Há uma tendência de se tomar o princípio
muito ao pé da letra, com as pessoas informando a todos sobre tudo. A operação pode ser
contraprodutiva; quando estão afogadas em informações, as pessoas tendem a parar de ler.
Um investimento maciço feito numa rede eletrônica de comunicações é uma forma de reduzir
o problema do papel.

Barnevik pode esperar que o princípio da comunicação estabelecido na reunião de Cannes


evolua e se torne o aglutinador que manterá a empresa coesa. Ele ainda precisa ser testado:
será que o aglutinador resistirá às tensões que necessariamente acompanham a expansão, as
mudanças, as metas de desempenho em constante mutação e as inerentes contradições da
estrutura organizacional da empresa? Os observadores duvidam que uma empresa que
consiste de grupos de interesse tão diversos, em diferentes países, sem uma primeira língua
comum, possa ser moldada num todo coerente. Um ambiente fluido, em que as pessoas
constantemente se deslocam, pode fazer com que as pessoas se tornem cínicas e pouco
responsivas. A aparente insatisfação de Barnevik com os resultados é outra ansiedade. Bons
resultados recebem a exigência de serem ainda melhores; ele e seu Konzernleitung
consistentemente elevam as metas diante de bons desempenhos. Isso é conhecido na
empresa como a “visão do stretch”, e, em alguns casos, contribui para o medo e a
desmoralização que parecem solapar seu poder motivador.

Quando essas dúvidas e críticas são levantadas, inevitavelmente é o líder da empresa que
deve respondê-las. Barnevik tem tanta força na empresa que há um sentimento de que se é
possível fazê-lo, é ele o homem certo. Mas como é ele? Uma impressão inegável de admiração
acompanha os relatos de seus feitos – talvez numa mistura igual de medo e admiração. Isso
corrobora a ideia de que ele seja talvez o principal ingrediente do aglutinador que mantém
coesa a empresa, fato que não é despido de certa ironia, porque grande parte de sua filosofia
gerencial está baseada nos princípios de descentralização e processo decisório localizado.

As reflexões feitas sobre Barnevik como uma estrela em ascensão tendiam a destacar sua
excessiva seriedade; Carl-Eric Bjorkegren da Sandvik precisou ensiná-lo a rir; outros o achavam
chato e observavam que ele somente dava sinais de vida quando empolgado com
quantitativos e lucros. Ele não gosta de grandes festas, preferindo contato com pessoas em
pequenas reuniões mais íntimas. Sua aversão pelo contato social superficial é
contrabalançada por sua convicção de que a comunicação pessoal é uma das maneiras mais
eficazes de motivar pessoas, por sua determinação de estabelecer uma atmosfera aberta, de
confiança e respeito na ABB.

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Às vezes ele tem um efeito desmoralizador sobre seus subordinados. Um de seus colegas da
Sandvik disse:

“Quando você se reporta ao Percy depois de haver realizado um bom trabalho, você
ainda tem a impressão de que ele poderia tê-lo feito melhor. Isso no longo prazo é
muito desgastante. Tendia a criar um sentimento de inferioridade entre seus
subordinados, um sentimento de insuficiência. Ao mesmo tempo, é preciso ter em
mente que Percy raramente critica alguém. Pelo contrário, ele sempre tenta motivar
seu pessoal. Sua competência, contudo, faz você sentir-se inadequado”.11

As críticas a Barnevik quase sempre são misturadas: sua exigência, impaciência e ritmo são
desgastantes, e simultaneamente despertam admiração. Seu colaborador de longa data Arne
Bennborn comentou:

“... e tem o ritmo dele. É implacável. Só para exemplificar, se você viaja com ele, tem
que levantar-se às 6h30 e eles te apanham de carro às 7h30. Depois você tem uma
manhã cheia de reuniões; tem reunião durante o almoço, depois mais reuniões,
depois do jantar e os clientes. Aí você volta para o hotel entre 23 e 23h30 para se
levantar outra vez às 6h30 da manhã. Acontece que o Percy acorda às 3h da manhã
porque esta é a hora que eles abrem o sistema de comunicação para a Europa. Ele
telefona para o pessoal na Europa entre 3 e 6 horas da manhã. E ele faz isso todo
dia, a semana inteira.”

A relutância de Barnevik em falar sobre seu próprio estilo de liderança pouco fez para
contrabalançar os relatos quase míticos de sua extraordinária capacidade de trabalho; na
realidade, sua vida de globetrotter perpétuo de até duzentos dias por ano, e seus comentários
meio jocosos, tais como “Estou no escritório normalmente dois dias por semana: sábado e
domingo”, reforçam essa postura. Ele é encontrado na sede apenas uma semana por mês,
quando trabalha doze horas por dia, das 8 horas da manhã até as 20 horas. Ele consegue
sobreviver com apenas quatro horas de sono por noite. Todos os verões ele sai de férias por
quatro semanas com a família, metade das quais velejando; nesse período ele está em contato
constante com a sede da empresa por fax ou por telefone. Ele também sai com a família duas
ou três semanas por ano, no Natal e Ano Novo. Apesar das constantes dificuldades de
controlar uma organização de tamanho porte, Barnevik sempre esteve aberto a ouvir os
pontos de vista de seus colegas, e está sempre pronto a contornar os relacionamentos
hierárquicos normais e explorar a rede da matriz da ABB para coletar informações de
diferentes origens. Arne Olsson da ABB traça um vívido retrato dele:

“Vendo o homem em ação, você tem a impressão de que são dois maçaricos
atravessando você (...). As pessoas sentem sua intensidade, esta quase radiação
saindo do homem. Isso o torna um superior muito exigente em termos de fazer as
coisas. Ele tem a capacidade de tratar de uma multiplicidade de coisas ao mesmo
tempo e de ajustar grandes volumes de trabalho. E tem também a capacidade de
chegar implacavelmente ao âmago da questão, e rápido. Quando você leva até ele
um problema para discutir, é melhor você estar bem preparado, porque você sabe
que ele vai identificar a sua fraqueza. Ele quer ver a coisa toda se encaixando bem
(...) e ele é brusco, fala em linguagem muito franca.

11
Entrevista com Leif Sunnermalm, subordinado de Barnevik na Sandvik, confirmado numa entrevista com
Frederik Bystrand.

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Do jeito que ele é, precisa ter muita coragem para dizer a ele: ‘Olha, tenho outra
opinião’. Mas quando você ousa fazê-lo, ele olha para você, com olhos escuros que
perfuram o seu (...) e se o que você diz é bom, você receberá dele um memorando,
num referencial maior. Daí você fica feliz porque o que você disse não foi
desprezado.

Ele é dotado de capacidades e competências que não são normais. Ele tem uma
capacidade analítica absolutamente fantástica, um bom discernimento, atenção ao
detalhe e intuição. A capacidade de alternar entre o cenário maior e dar atenção ao
detalhe é realmente um dom. Além disso, ele tem uma real capacidade de cotejar as
pessoas com as necessidades específicas da empresa (...) e tem esta força incessante
para ir à frente (...) O que motiva é a necessidade tremenda de desenvolver e
construir alguma coisa, de mudar as coisas, de levar as coisas à frente, de fazer a ABB
a principal empresa de engenharia elétrica do mundo. Ele tem uma premência de
fazer acontecer.”

O foco deste caso foi principalmente as responsabilidades de Barnevik como primeiro-


executivo da ASEA e em seguida da ABB. Contudo, deve-se observar que ele também é o
chairman do Conselho de Administração da Sandvik, e de uma grande empresa construtora
sueca, a Skanska. Ele é também membro do Conselho de Administração e da Comissão
Estratégica do gigante químico americano Du Pont, e também da empresa holding dos
Wallenberg, a Inventor.

8. BARNEVIK E O FUTURO DA ABB

Em 1993, Barnevik, com 53 anos de idade, gozava de excelente saúde, e adorava tocar a ABB.
Ele tem a satisfação de saber que sacudiu forte a complacência de empresas rivais no mesmo
campo, muito embora a ABB tenha níveis de lucratividade significativamente abaixo das
melhores empresas do setor. Quando perguntado sobre os retornos para os acionistas nos
catorze anos em que ele está à testa da ASEA e da ABB, Barnevik responde que o valor da ação
da ASEA aumentou 41 vezes desde 1979, ou seja, 30,5% por ano, o que representa quase três
vezes o índice do mercado (A ASEA e a Brown Boveri são listadas separadamente nas bolsas
de valores de seus respectivos países).

Contudo, manter a empresa exige uma dose enorme de energia – e muito embora Barnevik a
tenha em quantidades extraordinárias, ele não conseguirá sustentar esse ritmo
indefinidamente. O que acontecerá com a ABB se ele não estiver mais à sua testa? Uma gestão
forte é vital para manter coesa a empresa que Barnevik criou. Ele pode considerar seu
Konzernleitung adequadamente preparado para isso, mas e os outros? Com tamanha atenção
concentrada nele e tanta coisa dependendo de sua presença pessoal, deve-se levantar a
questão do que seria a empresa sem ele.

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ANEXO

Principais políticas da ABB

1. Missão da ABB

A missão da ABB é atender à demanda por energia elétrica confiável e assim garantir
crescimento sustentável, respeitando ao mesmo tempo as exigências ambientais.

2. Processo de fusão – considerações importantes

O processo de verdadeira fusão não acontece automática nem naturalmente – exige


determinação gerencial.

 Combater a síndrome “nós” e “eles” vigorosamente.


 Lutar para mesclar talentos e experiências dos parceiros.
 Ouvir e dedicar tempo ao entendimento de outros pontos de vista.
 O inglês, enquanto idioma de grupo, é idioma estrangeiro para 80-90% do pessoal –
atenção para problemas de comunicação.
 Mostrar respeito e reconhecimento. Não “jogar na cara” fracassos anteriores e
desempenho fraco. Olhar para o futuro.
 Informar repetidamente – “superinformar”.

3. Políticas de mudança

 Devemos mesclar talentos e experiências de todas as nossas empresas. O envolvimento


de pessoas de outras unidades organizacionais é uma forma de angariar confiança, criando
novas alianças e criando consenso.
 As mudanças necessárias identificadas devem ser implementadas o mais rápido possível.
Precisamos concentrar-nos naquelas com o maior potencial de aumento de lucros (regra
dos 80/20).
 Post facto, raramente se arrepende de que a velocidade da mudança foi alta demais; com
frequência, reclama-se de que foi lenta demais.
 O risco das consequências negativas das mudanças frequentemente é exagerado porque
as forças naturais tendem a resistir à mudança, argumentando contra elas e tentando
atrasá-las.
 Evitar a síndrome de mais investigações, que com frequência torna-se uma forma de pelo
menos atrasar, senão evitar, mudanças necessárias.
 Fazer as mudanças “negativas” imediatamente e evitar o prolongamento do processo,
dividindo-as em partes.

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 A maioria das principais mudanças deve ser iniciada no primeiro ano, porque aquilo que
não é iniciado no primeiro ano será difícil de implementar depois. Uma “lua de mel” de
pequenas mudanças na ABB seria prejudicial ao nosso desenvolvimento.

4. Foco no cliente

O foco no cliente é essencial para nosso crescimento e lucratividade. A gestão pela qualidade
total e gestão baseada em tempo (TBM) são elementos fundamentais de nossos esforços para
atender aos nossos clientes.

 Devemos ouvir cuidadosamente para entender outros pontos de vista. Devemos


permanecer flexíveis, abertos e generosos no debate de questões complexas.

5. Pesquisa e desenvolvimento

A pesquisa e desenvolvimento têm alta prioridade na ABB para garantir a liderança nas
tecnologias críticas. Devemos reunir nossas informações e desenvolver nossa base de
conhecimento global.

6. Políticas organizacionais

A organização da ABB deve permitir-nos seguir nosso princípio de “pensar global, agir local.”
As funções e as responsabilidades de nossa organização matricial devem ser claramente
entendidas.

 Um princípio diretor fundamental é a organização do grupo em centros de lucros com


responsabilidade individual.
 Os muitos centros de lucro refletem uma descentralização de responsabilidade e de
autoridade de amplo espectro, configurando, na medida do possível, unidades
supervisórias “autônomas e gerenciáveis”.
 Minimizar o overhead e custos alocados. Projetos especiais de redução do staff serão
realizados para salvaguardar uma base de funções de staff central, financiadas por
alocações. O método será;
- eliminação da função (30%);
- descentralização da função em centros de lucros (30%);
- criar centros de serviços que faturem serviços às taxas de mercado (30%);
- estafe central remanescente (10%).

 Lutar para manter a organização plana – sem fazer um “sanduíche de pessoas”.


Especialmente durante o processo de mudança, é desejável que haja uma grande
amplitude de controle. É necessário que também a alta direção tenha contatos e
conhecimentos na organização com quem tem a “mão na massa”.

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7. Princípios básicos do comportamento gerencial

 É obviamente melhor empreender ações (e arriscar o próprio pescoço) para fazer as coisas
certas.
 O segundo melhor comportamento é empreender ações para fazer as coisas erradas
(dentro do razoável e um número limitado de vezes).
 Não empreender ações (e perder oportunidades) é o único comportamento inaceitável.

8. Políticas de pessoal

Foco no empregado na ABB significa justiça, abertura e respeito em todas as nossas relações
com nossos empregados.

 O único critério de seleção dos gerentes deve ser a competência, em amplo sentido.
 Nosso sucesso no grupo ABB dependerá de nossa capacidade de recrutamento,
manutenção e desenvolvimento dos melhores gerentes do setor.
 Não teremos a consideração de manter um gerente de baixo desempenho no cargo por
mais tempo do que absolutamente necessário.
 Grandes esforços serão aplicados para fomentar a caça aos talentos internos e
aumentaremos os esforços no planejamento de pessoal e desenvolvimento gerencial em
todos os níveis.
 Devemos lutar para ter gerentes que sejam “doadores”. Eles atraem e desenvolvem gente
de talento e, portanto, oferecem candidatos não apenas para si mesmos, como também
para outras áreas da ABB. Não podemos nos dar ao luxo de ter “receptores”, que sempre
precisam recrutar de outras áreas ou externamente. Devemos promover a mentalidade
do “doador” entre nossos gerentes de tal maneira que possamos manter nossa política de
normalmente recrutar e promover de dentro do grupo.
 Com seu amplo escopo multicultural e sua organização complexa, o Grupo exige gerentes
de nível superior com competências que exorbitam a competência técnica e a eficiência
gerencial. Os gerentes da ABB devem ter um conhecimento excepcional das diferentes
tradições, culturas e ambientes. Devem ser protagonistas de equipes que consigam
compor contradições, montar apoio mútuo e chegar ao consenso.
 Devemos acelerar o fluxo de gerentes entre as fronteiras organizacionais e geográficas.
Nos níveis mais elevados, os remanejamentos horizontais devem ser utilizados para criar
desafios e oportunidades. Apenas em casos excepcionais é que as transferências serão
impedidas, porque a pessoa é extremamente necessária onde está.
 O grupo precisa de um número crescente de gerentes com experiência internacional para
sua expansão global. Programas de estagiários internacionais, participação em forças-
tarefa de áreas de negócios, missões de curta duração no exterior e trabalho em outros
países durante vários anos são exemplos de como garantir um fluxo contínuo de gerentes
internamente.

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 Buscar-se-á um sistema de remuneração agressivo, orientado para bonificações.
 Exige-se lealdade e integridade dos nossos gerentes para com a ABB. Isso significa, por
exemplo, que a manipulação de dados ou conluio com nossos clientes etc. para chegar a
uma solução ensejará demissão.
 O desenvolvimento de pessoal é missão-chave para nossos gerentes, e devemos dedicar
mais tempo e fazer um trabalho melhor. (sic)

Normalmente o princípio do “avô” deve ser utilizado no recrutamento e demissão


(significando que a gerência dois níveis acima deve ser envolvida).

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