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Ex Tunc
Ex Tunc
REPRESENTANTE
ERASMO PEREIRA DE FARIAS
LEGAL(S)
APELANTE(S) ESPÓLIO DE SEVERINO RAMOS DE FARIAS
Acórdão Nº 1366915
EMENTA
2. Não sendo o espólio capaz de arcar com as custas e despesas processuais decorrentes do trâmite
judicial, é possível aferir a necessidade da concessão da gratuidade de justiça.
3. O deferimento do benefício da justiça gratuita neste grau recursal deve ser concedido com efeitos
retroativos (“ex tunc”), quando existir opedido de gratuidade de justiça no momento oportuno e não
foi apreciado pelo d. juízo a quo.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Na inicial (ID 27050743), narra a autora que é credora do executado no valor de R$ 3.960,00,
decorrente de notas promissórias devolvidas sem o efetivo pagamento, totalizando o débito atualizado
de R$ 4.279,26.
Por tal razão, o d. juízo a quo julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, pela perda superveniente
do interesse de agir, nos termos do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
No mérito, insurge-se quanto aos ônus sucumbenciais, sustentando que o ajuizamento da ação de
execução foi anterior ao incidente de ação de habilitação de crédito e posterior ao óbito, motivo pelo
qual inexistiu manifestação ou resistência do executado.
Aduz que é descabido o ajuizamento de ação de execução posterior ao falecimento do devedor, além de
sua desnecessidade, caso a exequente tivesse promovido o pedido de habilitação na forma da
legislação.
Requer, assim, que seja afastada a condenação do apelante ao pagamento das custas processuais e
honorários advocatícios, em razão do princípio da causalidade.
É o relatório.
VOTOS
Cuida-se de apelação cível interposta por ESPÓLIO DE SEVERINO RAMOS DE FARIAS contra
sentença que julgou extinta a ação de execução extrajudicial movida pela SEGTRACK
SEGURANÇA ELETRÔNICA E SERVIÇOS INTELIGENTES LTDA – ME em desfavor do de
SEVERINO RAMOS FARIAS, em razão da perda superveniente do interesse de agir, nos termos do
art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
No mérito, pugna pela reforma dos ônus sucumbenciais, uma vez que não ofereceu resistência ao
pedido e o ajuizamento de ação executiva em desfavor de executado já falecido é descabida.
I – DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA
Antes de adentrar no Juízo de admissibilidade, faz-se necessário avaliar o pedido de concessão dos
benefícios da Justiça Gratuita efetivado nesta instância.
Nos termos do art. 98 do CPC, “a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com
insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios
tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei”.
Já as normas do art. 99, caput e §§ 2º, 3º e 7º do mesmo diploma legal assim dispõem:
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na
petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.
(...)
2º - O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta
dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes, de indeferir o pedido,
determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
(...)
Nesse passo, no intuito de avaliar da hipossuficiência capaz de fundar a concessão da justiça gratuita
para o espólio deve ser considerado o valor dos bens a inventariar e sua liquidez, não as condições
financeiras do inventariante.
No caso em análise, afere-se nos autos eletrônicos que o acervo hereditário, ainda que estimado em
valor considerável, não tem a liquidez necessária para cumprir com as despesas processuais.
Nesse esteio, o deferimento pretendido não induz à isenção do pagamento das custas processuais, mas
a suspensão da sua exigibilidade, uma vez que, após a divisão do acervo patrimonial, restará cessada a
incapacidade financeira do espólio para fazer frente às custas, momento em que poderão os herdeiros
satisfazer obrigação.
A modulação dos efeitos da concessão de justiça gratuita pode ser verificada nos §§ 5º e 6º do CPC
que dispõem que:
§6º Conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o
beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.
Conclui-se que para a concessão do pedido de gratuidade de justiça com o intuito de beneficiar o
espólio, é necessário que se faça análise sobre o valor dos bens que compõem o inventário e não
quanto as condições econômicas dos herdeiros.
1. Deve o apelo ser conhecido parcialmente apenas em relação às matérias afetas ao direito da parte
indicada como recorrente, não podendo ser objeto de conhecimento alegações atinentes a direitos
relativos à empresa, por ser vedado, nos termos do artigo 18 do CPC, pleitear-se direito alheio em
nome próprio.
4. Em se tratando de ação em que o espólio é parte, a gratuidade de justiça postulada em seu favor
deve ser averiguada com amparo no valor dos bens a serem objeto de inventário.
I. Na ação em que o espólio é parte, a gratuidade de justiça não pode ser aquilatada à luz da
capacidade financeira do inventariante ou dos herdeiros, mas do valor dos bens que compõe o
acervo hereditário.
II. De acordo com o artigo 99, § 2º, do Código de Processo Civil, se não estiver convencido do direito
ao benefício legal ou se detectar indicativos de que a hipossuficiência declarada não corresponde à
realidade dos fatos, ao juiz cabe, antes de se pronunciar a respeito, proporcionar que a parte
comprove a veracidade da sua declaração (pessoa física) ou a sua precariedade financeira (pessoa
jurídica e congêneres).
No caso vertente, verifica-se que, além da declaração de hipossuficiência apresentada (ID 27051137),
o inventário do caso fático tem como bem um único imóvel localizado na Asa Sul (ID 27051138, pág.
11), e bens móveis que não superam o valor das dívidas existentes.
Dessa forma, é possível aferir a necessidade da concessão da gratuidade de justiça, pois o espólio não
é capaz de arcar com as custas e despesas processuais decorrentes do trâmite judicial.
Nesse sentido:
Da análise dos autos, verifica-se que a empresa devedora requereu sua habilitação no crédito do
espólio no dia 29/05/2019 (ID 27051107, pág. 25), sendo deferido o pedido no dia 17 de maio de
2021, conforme consulta via PJe da Habilitação de Crédito nº 0714259-23.2019.8.07.0001 (sentença
do ID 91898288).
A presente demanda executória foi ajuizada em 02/03/2018 (ID 27050743, pág. 2), data anterior ao
requerimento de habilitação de crédito e seu deferimento.
Julgada extinta a execução, o d. juízo a quo condenou a parte executada ao pagamento das custas e
honorários advocatícios.
Segundo o princípio da causalidade, “aquele que deu causa à propositura da demanda ou instauração
de incidente processual deve responder pelas despesas daí decorrentes”[1].
No caso dos autos, o ajuizamento da ação de execução se deu em razão do inadimplemento das notas
promissórias emitidas ao executado.
Portanto, considerando que o executado contribuiu à causa superveniente para a extinção da execução,
devem ser por ele suportados os ônus sucumbenciais.
1."A responsabilidade pelo pagamento de honorários e custas deve ser fixada com base na
sucumbência e no princípio da causalidade, segundo o qual a parte que deu causa à instauração do
processo deve suportar as despesas dele decorrentes"(STJ, AgRg no AREsp 38.930/PR, Rel. Ministro
RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 30/03/2015).
2. Tendo em vista a extinção do processo sem resolução de mérito, haja vista a perda superveniente
do objeto, impõe-se a observância do princípio da causalidade como baliza para a fixação dos
honorários advocatícios, consoante o disposto no artigo 85, § 10, do Novo CPC.
3. Considerando-se que a pretensão deduzida na inicial somente foi satisfeita após o ajuizamento
da ação, denotando a necessidade de se invocar a tutela jurisdicional, não há que se falar em
condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios, após a extinção do processo por
perda superveniente do objeto, em razão da aplicação do princípio da causalidade.
Vale salientar, ainda, que descabe falar em impossibilidade de ajuizamento de ação executiva contra
pessoa falecida, quando foi procedida a retificação da autuação, após a ciência do óbito, para que no
polo passivo passasse a constar o “ESPÓLIO” do de cujus (ID 27051072).
Outrossim, ressalte-se que, embora o apelante alegue que não ofereceu resistência, verifica-se, dentre
outras, a apresentação da petição do ID 27051103, a qual demonstra sua insurgência quanto ao feito,
revelando a resistência nos autos.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, apenas para deferir os benefícios
da justiça gratuita ao apelante, com efeitos “ex nunc”.
Majoro os honorários advocatícios para 11% sobre o valor atualizado da causa, com fundamento no §
11 do art. 85 do CPC, suspendendo, entretanto, a sua exigência, em virtude da concessão dos
benefícios da Justiça Gratuita.
É como voto.
[1] NERY, Júnior, Nelson e Rosa Maria de Andrade Nery. Código de Processo Civil Comentado e
legislação extravagante, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery. 10ª Ed. rev., amp. e atual.,
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, pag. 222.
DECISÃO