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FOLHA DE ROSTO
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Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
Lúcia Maria Vaz Peres
Andrisa Kemel Zanella
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Organizadoras
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Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
ESCRITAS DE AUTOBIOGRAFIAS
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EDUCATIVAS... O QUE DIZEMOS
E O QUE ELAS DIZEM?
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par
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EDITORA CRV
Curitiba - Brasil
2011
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
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Coordenação Editorial: Simone Santos
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Diagramação: Marcos Roberto P. de Aguiar
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Capa: Roseli Pampuch
Revisão: Os Autores
Fotos: iStockphoto Brasileiro
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
129p.
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10-03666 CDD-670
2011
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
Todos os direitos desta edição reservados pela:
Editora CRV
Tel.: (41) 3039-6418
www.editoracrv.com.br
E-mail: sac@editoracrv.com.br
Sumário
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Apresentação.........................................................................7
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Prefácio
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Reflexividade autobiográfica:
jogos do imaginário, esquecimento e memória......................9
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Onde está a biografia do meu corpo?..................................13
Andrisa Kemel Zanella
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
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Uma conversa à sombra das memórias
e outros percursos autobiográficos......................................97
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Marcio Xavier Bonorino Figueiredo e Rita de Cássia Tavares Medeiros
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A afetividade como facilitadora do ensino
e da aprendizagem............................................................. 111
aC
Raquel Bastos Trindade
Sobre os autores................................................................137
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APRESENTAÇÃO
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A publicação deste livro é resultado de um projeto desenvolvido
ao longo de quatro anos, no Curso de Pedagogia da Universidade Fe-
deral de Pelotas, direcionado às imagens autoformadoras na formação
R
de aprendizes de professoras. Intitulado “Garimpando imagens, me-
oa
mória, representações e arquétipos nas trajetórias e (auto)biografias
de alunas em formação inicial do Curso de Pedagogia da UFPEL:
um estudo longitudinal (2006/2009)”, o projeto teve como objetivo
“realizar um estudo com um grupo de 07 alunas, no período de 4 anos
aC
(2006/2009), a fim de garimpar imagens da infância, representações e
arquétipos presentes no processo de formação inicial”.
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REFLEXIVIDADE
AUTOBIOGRÁFICA:
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jogos do imaginário,
oa
esquecimento e memória
aC Quando penso nos meus primeiros anos, reconheço em
primeiro lugar os temores, de uma riqueza inesgotável.
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
1 Elias Canetti, A língua absolvida. História de uma juventude. 5ª. reimp. São Paulo: Companhia
das Letras, 2005, p.65-66.
2 George Perec, W ou le souvenir d´enfance , citado por Ute Heidmann, em L´Hstoire avec sa
grande hache, In: Arcadia,Walter de Guyter: Berlin, New York, Band 38, 2003, p.55.
3 Lucimar Oreques, Resgatando a infância: valorizando as lembranças e a criatividade, nesta coletânea.
mãos dadas, com Lúcia Maria Vaz Peres. A coletânea coloca lado a
lado as autobiografias educativas, elaboradas pelas alunas-autoras, e
textos escritos por professores-pesquisadores-formadores, reconheci-
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r
dos em âmbito nacional e internacional por seus estudos em Educação.
uto
A riqueza e originalidade da coletânea residem no diálogo entre os auto-
res que entrelaçam o retorno sobre si com diversas perspectivas teóricas
e práticas de formação, partilhando um ponto comum: as potencialida-
R
des formadoras das escritas de si para os narradores da vida que somos
a
cada um de nós. Nesse sentido, cada texto aponta férteis caminhos na
direção das indagações que compõem o título do livro.
do
O que dizemos nas autobiografias educativas? E o que essas
escritas nos dizem? Aprendemos nesses textos que nelas dizemos
aC
o que também nos forma. E elas nos dizem, por sua vez, como se
4 Prefácio, que não pudemos recusar, pela honra e a alegria de nos juntar às organizadoras - Lúcia
Maria Vaz Peres e Andrisa Kemel Zanella - e a tantos outros amigos e autores desta coletânea,
entre eles, Maria Helena Menna Barreto Abrahão, Cleuza Sobra e Valeska Fortes Oliveira.
5 Isabel Allende, Meu país reinventado, trad. Mário Pontes, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003, p.13.
6 Michel Foucault, Tecnologias del yo y otros textos afines. 2ª ed. Barcelona: Ediciones Paidós
Ibérica, S.A., 1995, p.48.
“Tecnologias do Eu”. A escrita se si seria uma das técnicas pertinen-
tes a essas tecnologias por permitir aos indivíduos efetuar operações
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r
sobre seu corpo, sua alma, seus pensamentos e (trans)formar a si mes-
mos. A autora lembra também, com apoio em Nietzsche, o lugar do
uto
esquecimento, nos jogos do imaginário, como possibilidade de cria-
ção, de invenção, de geratividade. Nesse sentido, Elias Canetti, nos
fala da riqueza inesgotável dos temores da infância, que ele só desco-
R
bre no momento de escrever a sua vida. Essa riqueza “esquecida” o
oa
constitui como ser em devir. Os outros temores, “que jamais encontrei
devem construir o mistério que me provoca o desejo de uma vida
eterna”, nos ensina Canetti sobre a força do que tememos sem saber.
aC
Para Georges Perec, que perde, na guerra, aos quatro anos, o
pai judeu, e aos seis anos, a mãe nos campos de exterminação, a
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tura memória. Se aceitarmos o que nos diz Foucault7, eles seriam apren-
dizes de outra forma de cultura, que poderia se chamar de “cultura de
são
fizeram com eles, por outro lado, que histórias deixarão de herança para
os pequenos aprendizes dos ofícios e das artes do humano.
7 Michel Foucault, A hermenêutica do sujeito. Trad. Márcio A. da Fonseca, Salma T. Muchail, São
Paulo: Martins Fontes, 2006, p.58.
Para não concluir, retomamos as perguntas de Nietzsche8, cita-
das por Valeska Fortes Oliveira.
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Até que ponto o indivíduo pode se desligar do seu passado?
uto
Até onde for capaz? E se ele se der conta de que nesse passado
atuavam falsos julgamentos e falsas considerações em favor
de mera utilidade? E se percebermos que a auréola ao redor do
bem e o brilho sulfuroso ao redor do mal desaparecem com ele?
R
E se os motivos mais fortes, extraídos da honra e da vergonha
a
do próximo, não exercerem mais nenhuma influência, já que
ele pode contrapor a verdade a esse julgamento?
do
No trabalho de biografização, nós buscamos para nossas me-
aC
mórias outros sentidos que venham avivar ou apagar interpretações
Coordenadora do GRIFAR|UFRN-CNPq
Universidade federal do Rio Grande do Norte
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8 Friedrich Nietzsche. Sabedoria para Depois de Amanhã, São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 70.
ONDE ESTÁ A BIOGRAFIA
DO MEU CORPO?
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Andrisa Kemel Zanella
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Este texto tem por objetivo problematizar a vivência corporal
como um elemento biográfico e (auto) formador de futuras profes-
soras. Tal problemática é resultado de minha inserção na pesquisa
aC
longitudinal realizada com as acadêmicas do Curso de Pedagogia da
Universidade Federal de Pelotas, a partir de uma proposta focada
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deveria satisfazer as expectativas da família, talvez por isso, anos
uto
mais tarde escolhi cursar Artes Cênicas, que de algum modo foi dan-
do vazão “às coisas” guardadas.
Ao longo dos cinco anos do Curso, minha atenção esteve volta-
R
da totalmente para o corpo, uma vez que é através dele que se concre-
a
tiza o trabalho do ator. Além dessa intensa vivência corporal, muitas
foram as oportunidades de inserção no ambiente escolar com projetos
do
de extensão. Por meio do teatro buscava outras maneiras de dar vazão
à expressividade dos estudantes que mesmo sem saber estava dando
aC
vazão aos meus próprios guardados. Parafraseando Antonio Cícero
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PIEM) inicio as primeiras experimentações em torno deste foco, atra-
vés da Prática de Pesquisa realizada no 1º semestre de meu ingresso.
uto
“Garimpando imagens, memória, representações e arquétipos nas tra-
jetórias e (auto) biografias de alunas em formação inicial do Curso
de Pedagogia da UFPEL: um estudo longitudinal (2006/2009)”, foi
R
onde realizei minha primeira experimentação. A inserção neste estudo
oa
trouxe a possibilidade de iniciar a problematização do corpo como um
elemento biográfico e formador da futura professora.
Abordo o biográfico a partir da perspectiva de Delory-Mom-
aC
berger (2008)
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cializadores na instauração de um processo de apropriação e tomada
uto
de consciência corporal, visto que o corpo, habitáculo de todas as
representações (JOSSO, 2009), é a matéria onde ficam impressas as
memórias do ser humano decorrente das suas experiências vividas.
R
A proposta de trabalho caracterizou-se por proporcionar uma
a
vivência que se embasou na experiência e reflexão sobre ela, num
processo (auto) formativo. Para Josso (2004, p. 48), uma experiên-
do
cia é considerada formadora quando “ela simboliza atitudes, com-
aC
portamentos, pensamentos, saber-fazer, sentimentos que caracteri-
zam uma subjetividade e identidades”9. E, (auto) formadora quando
competência” (op.cit.).
Para a autora, a partir do momento que há uma tomada de
or
9 A exemplo deste livro que tem como intuito dar espaço para as representações das acadêmicas
que participaram da pesquisa juntamente com outros pesquisadores.
10 Em entrevista intitulada “Conversando com Josso: encontros autoformadores”, realizada em Por-
to Alegre durante o ENDIPE.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 17
nadora para cada pessoa olhar para si, centrar-se no seu eu-corpo e
explorar seus guardados. Esta experiência revelou-se como uma pos-
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sibilidade de reflexão sobre o próprio viver, levando cada acadêmica a
deparar-se consigo mesmo e descobrir vivências que foram marcantes
uto
ao longo da sua trajetória de vida, podendo ser ou não fundantes na
maneira como cada uma vem se constituindo. Ao abrir espaço para a
linguagem corporal na formação inicial de professores, diversas pos-
R
sibilidades corporais foram exploradas, deixando o corpo ser o fio
oa
condutor das ações, dos pensamentos, das lembranças, dos sons, dos
gestos... Buscou-se na relação com o corpo, dar vazão para a sub-
jetividade corporal, como um possível caminho à visibilização das
aC
marcas biográficas que ficaram impressas nos seus corpos.
A proposta desenvolvida com o grupo de acadêmicas do Cur-
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gestos. Escolhi este gesto porque, sempre que falo, uso as mãos
para me ajudar. São elas que, muitas vezes, dão o tom para meu
assunto. É um gesto simples, que caracteriza/representa muitos
outros usados a cada conversa, briga, reivindicação, momento
ver
11 Utilizam-se ao longo do texto nomes fictícios para cada acadêmica participantes desta pro-
posta de trabalho.
18
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r
mana” (DURAND, 2001, p.41). Ao trabalhar com o jogo do gesto
uto
no contexto da formação de professores, buscou-se dar vazão para
o universo simbólico que motiva as ações dos seres humanos e os
constitui, enfatizando a representação que este tem de si mesmo
R
diante do outro. Esse processo pode se caracterizar como a via de
a
acesso a apropriação de nossas ações, ou seja, nossos gestos.
Os nossos gestos são construídos a partir das vivências no
do
meio (social, cultural e histórico) que estamos inseridos, bem
como pelo movimento subjetivo da relação do homem com e no
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mundo, a partir do pensamento simbólico. Cabe ressaltar que eles
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Figura 1 – Eu e o outro
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Lembrei-me do jardim, de uma festa junina com meu tio
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Samuel, minha irmã gêmea e eu, posando para uma foto.
Eu estava brava com o penteado que minha mãe tinha feito,
uma colinha só pra um lado.Também lembrei do pátio do
R
recreio que era enorme, e de um dia que tive de cuidar da
a
minha irmã na hora do recreio, pois, ela não podia pegar
sol, tinha um ferimento, um corte na cabeça, daí minha mãe
do
disse: “cuida dela na hora do recreio, não pode ir pra o sol”.
Me senti super responsável e importante, cuidei. Mas nunca
aC
disse a ela que aquele recreio, foi o maior que já tive e que
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lidade observar o que os objetos marcantes suscitavam nos corpos
de cada uma, quando era estabelecida uma relação com eles.
uto
O objeto que eu escolhi foi a boneca da Mônica, a qual eu
ganhei quando eu fiz o meu 1º aninho. Adorei a oportuni-
R
dade de poder estar revivendo alguns momentos da minha
oa
infância, pois cada gesto, cada movimento me fazia lem-
brar das brincadeiras, dos diversos cheiros, dos sabores que
sempre se fizeram presente na minha infância. A boneca
aC
da Mônica sempre me acompanhou, e com ela vivenciei as
mais diferentes situações, ela era a minha companheira para
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Desde que me tornei mãe, isto a 9 anos atrás, não consigo ima-
ginar e pouco me lembro da minha vida sem a companhia do
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meu filho. E hoje não foi diferente, lembrei de momentos mar-
cantes junto a ele. Quando rolei no chão lembrei de quando
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vamos para fora – interior de Canguçu, e brincamos juntos de
descer a ladeira coberta de capim/grama, rolando junto, ou ain-
da quando brincamos de “rolo-compressor”, onde um vem de
R
encontro ao outro na cama e quem é mais rápido passa por cima
oa
do outro. Às vezes quando to assistindo TV ele me convida:
“mãe vamos nos divertir?” e lá vamos nós brincar de cosqui-
nhas, rolo compressor, guerra de travesseiro... É muito bom.
Outra coisa que chamou minha atenção foram as bolachas Ma-
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rias. Lembrei das merendas que comia na escola, as bolachas
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eram ótimas, mas o leite era terrível! Hoje vi que ainda tenho
muito pique e que ainda vou brincar muito!
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Penso que a experiência de olhar para si e explorar os reser-
vatórios interiores a partir de um trabalho corporal, possibilitou às
acadêmicas, num exercício de reconhecimento e reflexividade, dar
visibilidade às vivências que foram fundantes ao longo dos seus tra-
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são e importância de considerá-lo como elemento fundamental na
uto
formação do ser humano. A partir das escritas do grupo, foi possível
perceber que o corpo tem voz e que conforme ele é escutado, abre-se
espaço para todo um reservatório de imagens, lembranças, senti-
R
mentos, sensações que compõe a história de cada ser humano que se
a
disponibiliza a viver um processo de aproximação e exploração das
potencialidades do seu corpo e sua corporeidade.
do
Penso que ao tomar consciência do corpo, o ser humano dilata
a sua percepção, apreendendo as relações que o envolve, estando
aC
mais disponível às interações com o mundo a sua volta. Diante dis-
Referências
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r
BOIS, Danis. Da fasciaterapia à somato-psicopedagogia – análi-
uto
se biográfica do processo de surgimento de novas disciplinas. In:
BOIS, Danis; JOSSO, Marie-Christine; HUMPICH, Marc (orgs.).
Sujeito sensível e renovação do eu – as contribuições da Fasciate-
R
rapia e da Somato-psicopedagogia. São Paulo: Paulus, Centro Uni-
oa
versitário São Camilo, 2008.
CÍCERO, Antônio. Guardar. Rio de Janeiro: Record, 1996
DELORY-MOMBERGER. Christine. Biografia e Educação – figuras
do indivíduo-projeto. Natal, RN: EDUFRN; São Paulo: Paulus, 2008.
aC
DURAND, Gilbert. As Estruturas Antropológicas do Imaginá-
rio. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
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ESCRITA DE UM DIÁRIO
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Bárbara Pires Wegner
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Uso a palavra para compor meus silêncios [...]
aC Só uso a palavra para compor meus silêncios.
(Manoel de Barros, 2003)
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sitar ali, naquelas linhas, os sentimentos que não cabiam mais em
uto
mim. Dores causadas pela distância de casa, saudade das pessoas
amadas, “necessidade” de permanecer longe, insegurança, medo da
perda, estranhamento ao novo, etc. Tudo que era sentido precisa-
R
va ser compartilhado e o diário pareceu-me um confidente perfeito,
a
pois tudo sabia sem julgar-me.
Aos poucos, esses sentimentos foram diminuindo, como se “sain-
do
do de mim” e sendo guardados no meu diário. Relendo-o, percebo
que essa escrita funcionava (e funciona) como uma válvula de escape.
aC
Como se fosse possível tirar de mim esses sentimentos de dor e sofri-
nário, relicário é:
or
13 Atualmente essa escrita não acontece todos os dias, pois, como será elucidado a seguir, não
sinto necessidade de fazê-la diariamente. Ela ocorre conforme as vivências me afetam.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 29
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para o vivido. Brinquedo pelo imenso prazer que sinto ao fazê-la,
bem como por essa escrita dar novo sentido principalmente aos fatos
uto
tristes vividos.
Nesse sentido, encontro a função formadora de minha escrita
resumida nas palavras de Rubem Alves: “As ferramentas não nos
R
dão razão para viver. Elas só servem como chaves para abrir a caixa
oa
de brinquedos” (p.15). Penso assim, que cada um deve procurar a
chave para abrir a sua caixa.
aC
Contexto teórico...
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para os outros” (p. 202). Essa narrativa pode ser feita de diferentes
maneiras: oral/escrita/imagética, pública/particular... O “gênero”
que me movimentou para a narrativa foi o diário. Escrever sobre
meus dias, angústias, desejos, alegrias, sonhos..., contar para mim
par
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r
de nossa vida porque temos uma história; temos uma história por-
uto
que fazemos uma narrativa de nossa vida” (p. 97). Pensando assim,
valorizo a fala e a escrita de histórias de vida, neste caso voltada
para minha trajetória escolar, uma vez que este é um dos caminhos
R
possíveis de conhecimento sobre o singular e o plural, parafrasean-
a
do Josso (2004).
Acreditando, então, no vivido como conteúdo formativo; refle-
do
tir sobre a experiência pode auxiliar no processo de conhecimento
de si com vistas a ajudar em outras situações; saber como se aprende
aC
e o que foi formador, de forma a interferir nesse processo de cons-
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r
não só no das emoções - com o mesmo sentido/sentimento ou não, de-
pendendo do “repertório” atual. Ou seja, o sentido dado a essa escrita é
uto
feito de acordo com o que se está vivendo no presente; nas palavras de
Waschauer: “é com olhar de hoje que construo o sentido dessa história.
O distanciamento permite um olhar panorâmico e a descoberta [...]”
R
(p.22). Por isso há uma ressignificação, revaloração do vivido.
oa
Além de Warschauer, as autoras citadas, Josso e Delory-
-Momberger, refletem sobre a importância da escrita narrativa para
o processo de reflexão. Na medida em que vamos transferindo para
aC
o papel um determinado fato (ou mesmo “toda” nossa história14),
podemos organizar nossos sentimentos, emoções, valorações e re-
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14 Vale destacar que não acredito ser possível uma narrativa que traga todos os fatos e/ou sen-
timentos vividos. Sempre que contamos uma história alguns fatos serão suprimidos, seja pelo
momento vivido, que evidencia algumas coisas deixando outras de fora, seja pela nossa memó-
ria que não armazena tudo.
32
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r
que a gente aja de uma maneira e não de outra.” (idem).
uto
As imagens ali depositadas são reais e fazem parte da cons-
trução deste sujeito, mostrando que valor ele atribuiu e quais suas
representações acerca do vivido. Pois o imaginário é algo construído
R
a partir das experiências vividas, logo, variando de acordo com o
a
que se vive em determinado momento. Nas palavras do autor citado
“todo Imaginário é real e todo real é Imaginário” (p.21).
do
Essa ferramenta, a escrita do diário, é um meio de presentificar
o passado, a qual auxilia e faz uso da memória, podendo ser vista
aC
como a memória registrada. Memória essa que favorece o conhe-
od V
r
zação para o aprendiz que fui e o (re)conhecimento de que há uma
história de vida a ser valorizada reorientam a prática docente.
uto
Essa sabedoria citada acima pode ser representada pela capa-
cidade de (re)conhecer os limites próprios e saber os limites que têm
os alunos, aceitando a realidade da sala de aula, possibilitando que
R
os diferentes tipos de professora que habitam em ti possam emergir
oa
em diferentes situações/alunos.
É a sensibilidade para ter conhecimento sobre si e sobre os
alunos, sabendo os limites e as diferenças que há entre esses dois
aC
seres. No que ele me afeta? Por que o trato assim? O que há em mim
que faz emergir esse sentimento? Sendo possível, então, repensar a
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Cabe dizer que acredito que a (auto)formação alarga o leque de
uto
caminhos a ser seguidos, mostrando, numa revisitação ao passado,
quais as possíveis consequências ao assumir este ou aquele papel.
Lembrando sempre que o significado dessas ações para os alunos
R
dependerá do repertório de cada um; o que poderá nos tornar bruxa
a
ou fada frente a eles.
Penso, então, que esse caminho de conhecer a si, reflexiva-
do
mente, e valorizar a história do aprendiz, com todas as subjetivida-
des existentes, permita, a exemplo do que Warschauer propõe:
aC
Referências
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r
uto
ABRAHÃO, Maria Helena M. B. In. ABRAHÃO, M. H. M. B.
(org). A aventura (auto)biográfica: teoria e empiria. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2004.
R
ALVES, Rubem. Educação dos Sentidos e mais. Campinas, São
oa
Paulo: Verus Editora, 2005.
BARROS, Manoel. Memórias Inventadas: a Infância. São Paulo:
Planeta, 2003.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da
aC
Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
JOSSO, Marie-Christine. Experiência de vida e formação. São
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imagens-lembranças em processos
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narrativos de (auto)formação
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Cleuza Maria Sobral Dias
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O presente texto foi elaborado para apresentação no “III Ciclo
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15 Este evento foi organizado por pesquisadores e acadêmicos que integram o Grupo de Estudos
e Pesquisas sobre Imaginário, Educação e Memória (GEPIEM), da Universidade Federal de
Pelotas (UFPel).
38
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adesão. A formação passa pelas contrariedades que foi preciso
uto
ultrapassar, pelas aberturas oferecidas (1988a, p. 60).
R
a
formação. É preciso oportunizar-lhes espaços e tempos para rever
memórias, como possibilidade de autoformação, pois são elas – as
memórias – um “agregado de energias que nos fez e nos faz viver no
do
hoje” (PERES, 2010, p.83).
aC
Decorre desta perspectiva o fundamento para que, ao falar e
mostra que ela não tem tempo cronológico, mas o tempo da necessi-
dade de restabelecer sentidos e significações” (2010, p.82).
Assim, envolvida por este processo de ressignificação, ao reler
ara
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Mas, vamos a minha história...16
uto
Trajetórias: lugares, saberes e sabores
R
turmas de alfabetização, uma em escola pública e outra em escola
oa
privada. Meus saberes sobre a docência e a alfabetização, na época,
se resumiam às aprendizagens elaboradas no curso de Magistério e,
ainda, aos saberes acerca da alfabetização adquiridos no convívio
aC
com a minha escola e com a escola dos meus filhos, o qual me fez
conhecer os limites, sucessos e fracassos que envolvem a alfabetiza-
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16 Parte dos fragmentos da história narrados neste texto integram o capítulo inicial da Tese
de Doutorado Processo Identitário da Professora-Alfabetizadora: mitos, ritos, espaços e
tempos (DIAS, 2003).
17 Sobre o Método Natural, ver Rizzo (1992).
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dológicas o ensino da leitura e da escrita.
uto
Benditos diários!!! Fazia-me muito bem tê-los comigo. Eram
como uma receita, que orientava passo a passo o modo como eu de-
veria ensinar. E eu seguia rigorosamente, como forma de segurança
R
para meu trabalho docente.
a
Hoje, quando relembramos, eu e a dona dos diários, damos
boas risadas. Os diários e as experiências de vida eram fontes
do
valiosas de um saber que sustentava e legitimava minha ação no
momento inicial da vida profissional. Estes fatos vêm à lembran-
aC
ça quando participo de encontros com professoras-alfabetizadoras.
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r
minha infância, quando chegava pela primeira vez no espaço esco-
lar, com seis anos de idade, numa turma de 1ª série. Afinal, como
uto
não lembrar desta experiência? Tudo isso me constituiu.
R
oa
... neste espelho,
no fundo desta fria luz marinha...
nadam meus olhos à minha procura...
aC Cecília Meireles
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18 Planta aquática, da família das “algas”, encontrada próximo das praias, estuários e lagoas,
por todas as costas.
42
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Celita, dos saberes aprendidos e do sabores sentidos...”.
uto
A vivência enquanto aluna em processo de alfabetização é,
dentre outras, uma experiência que constitui meu modo de ser pro-
fessora. São imagens-lembranças que compõem um repertório de
R
saberes e fazeres da minha formação.
a
São marcas da minha vivência, presentes através das palavras
e dos gestos, e transportadas, também, para o início da minha ação
do
docente, quando os conflitos cotidianos não encontraram respostas
nas teorias estudadas. A formação se faz neste processo dialético,
aC
nesta trama de aprender ensinar aprender. E, por isso, podemos dizer
que incluem” (p.32). São palavras que precisavam ser ditas e escri-
tas, como as que seguem:
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- O curso de Magistério teve muitas deficiências na área da
uto
alfabetização. Eu só senti quando fui dar aula na 1ª série, pois
só trabalhamos com atividades do período preparatório e com
cartilhas que usam o método silábico. O resto foram só conteú-
R
dos de 2ª, 3ª e 4ª séries...;
oa
- (...) o período destinado ao estudo sobre alfabetização é muito
restrito, na Pedagogia, e a prática, nenhuma...;
- (...) no curso de Pedagogia, faltou uma visão mais detalha-
da sobre as teorias construtivistas, que embasam as novas
aC
propostas de alfabetização. Por isso eu tenho medo de sair
do tradicional. 19
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
V
r
po nossa história. Cada rascunho é sempre diferente do outro, pois a
uto
cada narrativa os significados produzidos carregam o olhar do mo-
mento em que a lembrança é capturada.
Mais uma captura, mais um “pedacinho”...
R
É o período em que ingressei como professora na Universi-
a
dade, atuando no curso de Pedagogia. Nesta mesma época tam-
bém assumi a direção do Centro de Atenção Integral à Criança e ao
do
Adolescente (CAIC)20, experiência de extrema relevância na minha
formação profissional, uma vez que ocupei um lugar que me exi-
aC
gia tomada de decisões, não mais como professora, mas sim como
od V
r
mundo e afirmar a nós mesmos como agentes sociais ativos, com
vontade e um propósito – podemos começar a transformar o signifi-
uto
cado daquelas experiências, ao examinar criticamente os pressupos-
tos sobre os quais elas estão construídas” (p.26).
Neste Centro, entre as ações de direção, também desenvolvi
R
oa
um projeto de alfabetização com as mães dos alunos e, neste perí-
odo, passei a compreender os processos formativos para além dos
espaços acadêmicos. A experiência com as mães dos alunos: mu-
lheres trabalhadoras do lar, domésticas, agricultoras, pescadoras....,
aC
cada uma delas com histórias de vida singulares e ao mesmo tempo
coletivas por participarem de espaços comuns e de situações tam-
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ciplina de Metodologia da Alfabetização, tendo como fio condutor as histórias escolares das
alunas, principalmente aquelas referentes às experiências enquanto alunas em processo de
alfabetização. As histórias narradas no grupo constituíram-se em um primeiro conhecimento a
respeito do ensino e da aprendizagem da língua materna.
46
V
r
suas histórias, mas as reinventavam, trazendo outras possibili-
uto
dades de vida e de escolhas. Ao contar, surpreendiam-se pela
forma como escolheram caminhos ou desistiram deles e pas-
savam a traçar novos percursos, novas possibilidades. Este é o
sentido da abordagem (auto)biográfica como possibilidade de,
R
ao narrar sua história, reconstruí-la, dando outros significados e
a
sentidos para as experiências vividas, e também reconstruindo
suas identidades (DIAS, 2008, p. 228) .
do
Somente depois que iniciamos o processo narrativo das his-
aC
tórias de vida das mulheres, por meio do qual elas podiam contar e
a sua realidade, o que não será possível se não tomam a história nas
mãos para, fazendo-a, por ela serem feitos e refeitos” (p. 16).
Na vivência do CAIC situo a origem da defesa que tenho feito,
ao longo dos últimos anos, acerca do processo narrativo enquanto
possibilidade de formação, o que implica a “importância de conhe-
cer-se para formar-se”, temática da palestra ministrada no evento
citado no início deste texto.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 47
od V
r
de vida enquanto possibilidade de formação e de informação sobre
os processos educativos vividos nas trajetórias de vida.
uto
Minhas experiências no contexto da escola e as histórias vi-
vidas por mim e por outras professoras me levaram a continuar
investigando acerca da formação profissional das professoras-al-
R
fabetizadoras, da natureza do seu conhecimento e do seu processo
oa
identitário, no Doutorado. Outras memórias-lembranças:
A partir das ideias de Giddens (2001), Dubar (1997) e Nóvoa
(1992), que entendem a construção das identidades como um pro-
aC
cesso dinâmico que se (re)constrói em meio a uma rede de sociali-
zações, analisei as trajetórias de vida de professoras-alfabetizadoras
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V
r
início da escolaridade (DIAS, 2003).
uto
Outros tempos, outras trajetórias, muitos saberes
R
Num jogo dialético entre o presente e o passado, o agora ganha
a
espaço e vem interpelar meus pensamentos, colocando-me no lu-
gar que ocupo agora como educadora, pesquisadora e gestora: outro
do
tempo, outro lugar, outra trajetórias, outras histórias.
Penso nos processos de formação, penso nos professores, pen-
aC
so nos estudantes, penso nos espaços educativos – a escola, a uni-
volvidas a autora diz que ‘as escolas são casas sem alma’23
rev
23 Esta afirmação foi escrita, há alguns anos, por Arsélio Martins, em um jornal da cidade de Aveiro/
Portugal e está citada no livro da autora (SÁ-CHAVES, 2000).
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 49
od V
r
uto
Mas o que tudo isso tem de importante no contexto do tema
abordado aqui e no evento citado no início deste texto?
É esta a possibilidade que vislumbro, no trabalho com a formação
R
de professores, uma prática pedagógica voltada para a história de vida:
oa
tomar a palavra e a história nas mãos, com todas as paixões, sentidos e
sentimentos que ficaram aprisionados na história oficial, para, fazendo-
-a, (re)fazê-la, para serem feitos e refeitos, parafraseando Freire (1982).
É isso que podemos chamar de um “caminhar para si”, como diz Josso
aC
(2004). Eu me atreveria a dizer “caminhar para si com o outro”, o que
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Referências
V
r
ALARCÃO, Isabel. Reflexão crítica sobre o pensamento de D.
uto
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nE, Aveiro, p. 5-22, dez. 1991.
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ENGERS, Maria Emília. O professor alfabetizador eficaz: análise
de fatores influentes na eficácia do ensino. Porto Alegre, 1987. Tese
aC
(Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, 1987.
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V
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uto
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TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petró-
do
polis: Vozes, 2002.
aC
od V
r
que aprendizado ficou das
uto
duas experiências?
R
oa
Jiani Torres Alvaro
aC
Este artigo vem com a intenção de refletir sobre a importância
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uma sala de aula é o de não aprender nada com meus alunos. A ma-
gia da profissão está em ter vivenciado os dois lados da instituição
escola: ser aluna e ser professora.
ver
V
r
Durante a auto (re)descoberta foi possível realizar uma viajem profun-
uto
da onde nos deparamos com nossos mais profundos anseios, medos,
lacunas, marcas... E desta forma é possível identificar a professora que
quero ser e principalmente a professora que não queremos ser.
R
A experiência nos dois papéis mostrou-me a importância e o po-
a
der que uma palavra tem. Pois elas podem ferir e refletir ou acarinhar
e refletir, que qualquer maneira, as palavras sempre voltam, com todo
do
seu peso. A maneira como que são proferida, podem causar danos ir-
reparáveis, e muitas vezes imperceptíveis em um primeiro momento.
aC
Uma vez pronunciadas não podem ser recolhidas, neste contexto é in-
efeito construtivo desta atitude, pois sei que podem ser um instru-
mento de libertação e de autoafirmação, mas também podem ser as
portadoras de angustias, construtoras de medo e ódio.
25 O trecho refere-se a crônica “A Força das Palavras” de Lya Luft publicado na edição 1886 de
14 de julho de 2004 na seção Ponto de Vista. Disponível em <http://veja.abril.com.br/140704/
ponto_de_vista.html> Acesso em: 25/05/1010.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 55
od V
r
como não fui escutada quando estava atrás da carteira escolar, mas
também falei, disse que eles poderiam mais, que cada um deles era
uto
especial em sua individualidade e no seu coletivo, para tanto usei
não apenas as minhas palavras, mas também de autores renomados
da literatura infantil, como Ruth Rocha, Ana Maria Machado, Mon-
R
teiro Lobato, Ziraldo, dentre outros. Aprendi que definitivamente a
oa
palavra tem poder e usá-la é um dom do ser humano, um dom que
não deve ser desperdiçado ou usado para desterrar, humilhar, ame-
drontar, mas para exaltar e brindar a vida.
aC
A comunicação é primordial a existência humana e a vida em
sociedade. Devemos usar este dom com sabedoria, acredito que este
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pos pelos quais passei, quando fiquei a frente de uma classe decidi
que era hora de crescer, de acreditar mais em mim e neste dom que
é nato ao ser humano. A (re)descoberta através da minha própria
história de vida, de minhas experiências e lembranças, algumas es-
par
V
r
no entanto, muito prazerosa.
uto
O caderno de metacognição, chamado pela turma de “meu ca-
derno de descobertas”, me revelou situações incrivelmente comple-
xas e mostrou o que muita gente adulta esquece: crianças também
R
têm seus dramas. Os dramas vivenciados na infância chegam a ser
a
mais perturbadores dos que aqueles vivenciados na idade adulta.
Através deste caderno, que hoje eu acredito ser “mágico”, os alunos
do
se descobriram e conseguiram entender e até mesmo superar seus
alguns de seus dramas e medos. A auto (re)descoberta é primor-
aC
dial em todas as etapas da vida, desde que o indivíduo esteja aberto
od V
r
dade é construída no cotidiano e mais exatamente no respeito e na
confiança. Em um grupo heterogêneo como a sala de aula o elo de
uto
uma turma, principalmente um grupo de séries iniciais onde a crian-
ça começa a sair do seu egocentrismo, é o professor. Logo acredito
que a turma será e terá a “cara” do professor, ou seja, se o professor
R
não escutar seus alunos estes também não escutarão aos colegas,
oa
o professor, e tão pouco escutarão a si próprios, se ocorre a ação
contrária, a sala ficará aberta a discussões e acessível a mudanças.
Entretanto, entendo e concordo que o professor deve mostrar sua
aC
liderança. Além de ser um amigo o professor deve ser um exemplo para
as crianças, no entanto, esta liderança deve ser conquistada e não im-
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posta, acredito que este status deva vir naturalmente a partir do respeito
e da admiração e não do medo. Quando esta cumplicidade é alcançada
visã
as aulas fluem de maneira suave o que facilita o processo de ensino-
-aprendizagem e a troca de experiências de vida. Para que o estágio
fosse realmente formador e recompensador foi necessário entender a
profissional em educação e sobre tudo, a pessoa que sou.
Para pensar na minha formação e no que realmente almejava foi
a re
itor
tornar uma professora. Confesso que ainda não entendo o motivo pelo
qual me tornei uma profissional em educação, ou seja, ainda há alguns
baús a serem abertos, apesar disto sei que fiz a escolha certa. No ca-
minho da minha (re)descoberta recordei momentos prazerosos vividos
Ed
estar escondido a minha terceira série e junto com ela o motivo pelo
qual me tornei professora. Contar a minha história a mim mesma é e
está sendo gratificante, finalmente começo a entender a minha comple-
xidade, que é natural do ser humano, como diria JOSSO (2004) enten-
ver
V
r
vida. Está ai a necessidade de relatar a si próprio a trajetória vivida,
uto
rever fatos bons ou ruins não nos dirá o porquê de sermos quem
somos hoje, mas ajudará a refletir sobre as escolhas feitas, e a vivê-
-las da melhor maneira possível. Esta busca da compreensão passa,
R
de acordo com Josso, por quatro eixos essenciais que são a busca
a
pela felicidade, a busca de si em nós, busca do conhecimento e a
busca do sentido, durante o trajeto que percorri na pesquisa a busca
do
do conhecimento do meu eu foi a mais difícil. Pesquisar a história
particular exige atenção e observação, exige escutar-se, sobre tudo,
aC
exige respeitar-se e ter humildade consigo mesmo, é uma tarefa
lembre desta fase e diga que nunca chorou e que não passou por
momentos de angustias.
or
od V
r
eu estava acostumada, pude observar que a grande maioria dos
professores esqueceu como é difícil ser criança. É possível ver
uto
nos olhos dos alunos quando se questionam do motivo pelo qual
devem respeitar embora muitas vezes sejam desrespeitados.
É comum ver alguém falando “como é bom ser criança”,
R
mas esqueceram que durante a infância viveram muitos momen-
oa
tos, que hoje são lembrados em forma de piada, da mesma forma
que vivem hoje os dramas da fase adulta. Iniciar a vida esco-
lar não é nada fácil, principalmente se a criança é tímida. Nesta
aC
fase da existência o superego ainda encontra-se em formação e
a criança ainda não tem discernimento do certo e do errado, ou
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V
r
rego de seus pais; os conteúdos que ele encerra são os mes-
uto
mos e torna-se veículo da tradição e de todos os duradouros
julgamentos de valores que dessa forma se transmitiram de
geração em geração.
R
Desta forma devemos estar atentos aos exemplos que damos
a
as nossas crianças, uma vez que o adulto, com suas convicções,
anseios, frustrações e medos, está sendo formado, no entanto esta
do
construção não é apenas de responsabilidade da família, mas tam-
aC
bém da escola. Pequenas ações são detentoras de grandes transfor-
mações, o afeto e o relacionamento com a criança é fundamental
onde o aluno vive e sim conhecer sua história de vida, mais do que
isso conhecer seus anseios, medos, traumas, entender o aluno na
od V
r
sua individualidade e ao mesmo tempo em seu coletivo. O convívio
com as crianças e com suas famílias me possibilitou conhecer as
uto
diferentes realidades de uma sala de aula, a multiplicidade de histó-
rias, de conflitos, me permitiu compreender o papel, que até então eu
julgava ser o mais complexo dentro de uma sala de aula: o professor.
R
Agradeço muito a pesquisa de formação que me convidou a um pas-
oa
seio por minhas memórias infantis, pois vejo que estava errada, hoje
creio que o lado mais complexo, mais conflitante desta dualidade é o
aluno. Percebo que além de educador das letras, o professor é funda-
aC
mentalmente um auxiliar para a construção psicossocial da criança
e para ser um profissional de sucesso neste eixo é primordial gostar
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V
r
muito de mim que desconheço, ainda sou aluna do meu próprio ser,
uto
e descobrir aos poucos porque sou quem sou, será um lento e deli-
cioso caminho.
Compreender de onde vêm os incômodos, os medos e as frus-
R
trações fazem uma enorme diferença para compreender quem re-
a
almente se é, e se for o caso, encontrar um novo caminho que nos
torne pessoas mais felizes. Se hoje aos trinta e poucos anos o mun-
do
do, por vezes, me parece esmagadoramente grande e aterrorizante,
na infância o peso destes medos é duplamente maior, na chamada
aC
“vida adulta” adquirimos alguns traquejos para enfrentá-la, quando
to, que sou aluna, que tenho muito de mim a entender e sobre tudo,
rev
Referências
od V
r
uto
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nário da língua portuguesa. 7ª Ed.. Curitiba: Editora Positivo, 2009.
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vista. Ed. 1862. São Paulo: Editora Abril, 2004.
aC
PERES, Lúcia Maria Vaz. Narrativas na formação inicial de professo-
ras: Presentificação de Saberes. In: ENDIPE, 14, 2006, Recife. Anais
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od V
r
UM PROCESSO DE
uto
(AUTO)FORMAÇÃO
R
oa
Lúcia Maria Vaz Peres
V
r
doutoramento (PERES, 1999). Naquele momento cunhei o concei-
uto
to de matriciamento aplicado ao campo da formação docente, com
o intuito de mostrar que somos movidos por forças que ainda não
tornamos consciente30. Atualmente, venho aprofundando-o com o
R
intuito de problematizar as matrizes existenciais e simbólicas que
a
regem as escolhas profissionais. Em linhas gerais, o conceito de
matriciamento refere-se aos conteúdos existenciais que se tornam
do
motores de buscas e projetos de vida (JOSSO, 2004).
Inicialmente, esse conceito foi forjado (como enunciei) com
aC
base na Antropologia do Imaginário de Gilbert Durand (1989), Lá
de... Não sei quando isso começou... Aprendi que é preciso manter
um pé nas coisas do mundo que nos afeta – as intuições primeiras
30 Óbvio é que Sigmund Freud já havia descoberto o inconsciente como mola propulsora das ações
humanas. Ele elaborou a hipótese de que a causa da doença era psicológica, não orgânica,
servindo de hipótese e base para os conceitos do inconsciente. Suas ideias são frequentemente
discutidas e analisadas como obras de literatura e cultura geral em adição ao contínuo debate
ao redor delas no uso como tratamento científico e médico. A ideia de matriciamento está sendo
tratada com foco educativo e autoformativo.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 67
od V
r
a pessoa e o pesquisador, pois quem produz o sentido são as intima-
ções da pessoa revestida do profissional que a habita. No meu caso, a
uto
professora-pesquisadora.
Meu processo de constituição como professora-pesquisadora,
apoiou-se em estudos que foram da epistemologia psicogenética até
R
as histórias de vida com vistas à formação existencial. Nesse proces-
oa
so, fui entretecendo teorias e epistemologias que me levaram a enten-
der que o ser humano é, fundamentalmente, um “animal simbólico”,
ideia que Ernst Cassirer (1994) já havia proposto no âmbito da An-
aC
tropologia. Traduzindo tal premissa, para pensar a formação inicial
de professores penso que ela aposte numa formação que ultrapasse a
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V
r
eu nem preciso ler em voz alta”. Mas, ao contrário da menina, como
uto
professora-pesquisadora pertencente ao locus acadêmico, algumas
destas palavras necessitam soar em voz alta em forma de escrita.
Como no poema inicial de Rilke intitulado “Iniciação”, o que
R
importa é deixar as alcovas que muitas vezes não nos permitem
a
olhar para o nosso entorno, talvez tenha sido isso a grande meta
da professora/pesquisadora com a sua pesquisa “Garimpando, ima-
do
gens, memórias... No vai e vem da vida a escrita de si como um
processo de (auto)formação, “desculpa ou o mote”, utilizo-me das
aC
palavras e das questões que estão em minha cabeça na tentativa de
não é tão nova (data desde a década de 80, na Europa) mas, que ain-
da hoje, é pouco conhecida como objeto de investigação-formação
ver dit
31 Esta criança é uma menina que chamo de “a menina dos meus olhos”. Ela me instiga a
mais pensar e fortalece a certeza de que o imaginário é a força aonde estão assentados os
“conceitos primeiros”.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 69
od V
r
sobre o que é essencial no percurso de autoformação e no convívio
com os demais. Entretanto, isso não é decorrente de uma ação sim-
uto
ples e linear, mas de imensas e profundas complexidades. Seja pelas
demandas decorrentes das lições que o meio vem me oferecendo, seja
pelas interações pessoais e profissionais que venho buscando ou que
R
me buscaram? Segundo a pesquisadora Suíça, Marie-Christine Josso
oa
(2004), todo o ser humano passa por quatro buscas: a busca de fe-
licidade, a busca de si e de nós, a busca de conhecimento ou busca
do ‘real’ e a busca de sentido. Sintonizada com esta ideia apresento
aC
recortes das buscas que se tornaram obra até aqui.
Em 1977, chegava eu na cidade de Pelotas em busca do novo...
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V
r
de ser professor.
uto
Minha trajetória como sujeito no mundo do conhecimento, sem-
pre me apontou que ser é fazer e criar! Sabendo, entretanto, que nossa
existência, porém, não depende unicamente de nossa vontade própria,
R
porque o nosso fazer e criar depende em grande parte do inconsciente
a
e de uma trama de relações exógenas; Tão complexa quanto difícil.
Tal complexidade situa-se numa rede tão tênue quanto invisível, situ-
do
ada aqui, lá e acolá... Mas apesar de tudo, muito depende do sentido
ou significado segundo o qual aprendemos, reproduzimos e criamos
aC
ou, em outras palavras, do sentido segundo o qual vivemos. O não sei,
tar ao formando sobre: Aonde você quer ir? Qual o seu projeto hoje?
Quais são seus motivos, necessidades, desejos? Como você sabe
que fez uma boa escolha ao vir aqui? O que você espera de mim?
Pelo que você quer começar?
Espera-se que tenhamos sabido exercitar tais questionamentos
e reconhecer que estamos no ponto do caminho em que conhecemos
esse pedaço de rota. E, assim tais problematizações sobre os proje-
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 71
tos de cada um, podem ser os meios que colocamos a disposição dos
alunos e alunas em processo de autoconhecimento para lhes ajudar a
od V
r
fazer o próprio caminho. A história de um ser humano em devir, se-
gundo Josso (op.cit) é a tarefa a que se propõe o formador-condutor
uto
ou o professor-condutor respondendo à demanda de formação que
lhe é dirigida implícita ou explicitamente.
Que ministério teria sido isso o de acompanhar a história de
R
vida em formação de oito alunas do Curso de Pedagogia no período
oa
de quatro anos?
Talvez a de ser uma formadora-condutora, a partir de uma pes-
quisa que teve como intuito epistemológico a investigação-formação
aC
(NÓVOA, 2010). Por certo, um sentimento me acompanhou no de-
curso desses quatro anos: o de pensar a necessidade de chegar mais
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32 O precursor desse movimento na Europa foi o grupo de Antônio Nóvoa através do projeto PRO-
SALUS 86, onde a tônica era o trabalho com as histórias de vida na formação de gestores
da formação para o estabelecimento e serviço do Ministério da Saúde. Este projeto surgiu da
necessidade de dar a conhecer o público português a problemática das Ciências da Educação
e da formação de adultos. Daí surge o importante livro organizado por Antônio Nóvoa e Mathias
Finger e reeditado como clássico no IV CIPA, 2010: O método (auto)biográfico e a formação.
72
V
r
para tal virada, podemos citar com Antônio Nóvoa, Mathias Finger,
uto
Franco Ferraroti, Pierre Dominicé, Michael Hubermann, Ivor Good-
son e, posteriormente Marie-Christine Josso, dentre outros.
Estes autores plantaram a semente fecunda, até os dias atu-
R
ais, sobre o uso das histórias de vida e de narrativas autobiográficas
a
como alternativas que possibilitam formar o indivíduo a partir da
tomada de consciência de si e da história de seu tempo. Desse modo,
do
possibilitando uma conjunção da história de sua vida com o seu fa-
zer pedagógico e, por consequência, a construção da autoria. Isso
aC
porque as narrativas autobiográficas, além de estar inseridas num
od V
r
e Formação, as histórias de vida tornaram-se, há uns vinte anos, um
material de pesquisa muito em voga nas ciências humanas, pois em
uto
todos os simpósios, colóquios ou encontros científicos este enfoque
tem sido recorrente. Ou seja, parece que está se buscando uma sen-
sibilidade para a história do aprendiz e de sua relação com o conhe-
R
cimento. Além disso, numerosos procedimentos biográficos foram
oa
introduzidos para acompanhar, orientar, suscitar ou facilitar a elabo-
ração dos projetos pessoais de indivíduos em busca de uma orientação
ou de uma reorientação profissional. Isso se deve ao fato de pensar-
aC
mos ser este momento a pedra angular para a futura prática docente,
dada a complexidade dos movimentos autoformativos garimpados ao
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
pelo Curso de Pedagogia não foi por acaso (...) E agora paro
para pensar nas pessoas, nos lugares, nos acontecimentos, nos
sentimentos que de uma certa forma ou de outra contribuíram
para a minha construção enquanto SER. Ser este que ri, que
ver
V
r
sultado. Epistemológica, por tratar de pontos de vistas teóricos que
uto
vão tentar dar conta, da melhor forma possível, do que vem a ser
efetivamente formação. No entanto, não existe a mais certa, mas sim
filiações que fazemos a partir de nossas próprias histórias. Gosto da
R
ideia anunciada por Dominicé (2010, p. 95) inspirada em Jean Paul
a
Sartre, quando diz:
do
A formação depende do que cada um faz do que os outros
quiseram, ou não quiseram, fazer dele. Numa palavra, a for-
aC
mação corresponde a um processo global de autonomização
od V
Na primeira série, o que me marcou foi a falsa promessa fei-
r
ta pela professora, que prometeu voltar à escola e nunca mais
uto
apareceu. Acredito que este fato me tornou uma aluna tímida
com relação ao meu comportamento voltado àss professoras
das séries seguintes. (Luisa)
R
Também vou falar um pouco da professora Jacira de história.
oa
Acho que foi na 7ª série[...] a minha irmã estava de aniversário,
aí as colegas falaram para a professora que tínhamos que cantar
os parabéns. Eu falei: - Ela está ficando (mais velha) um ano
mais velha.[...] A professora tirou os óculos do rosto e disse: To-
dos nós sempre ficamos mais velhos, ninguém fica mais novo,
aC
a cada dia que passa ficamos mais velhos, etc... Bem, como a
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que algum dia um aluno pode dizer isso de mim. Ah! Aquilo
dói. Dá vontade de mudar isso. (Afrodity)
revela-se através das crenças, valores, dos nossos sonhos, dos signi-
ficados atribuídos aos fatos. Sendo assim, o ir e vir em busca de um
projeto de (auto)formação pode passar pelo trabalho com histórias
Ed
V
r
prática pode ser o caminho para a autoria, uma vez que esta é uma das
uto
formas de ressignificação do mundo das professoras na perspectiva
de que “o ingrediente que vem faltando é a voz do professor”, (GOO-
DSON, 1992, 69). E, assim, ao escrever eles podem valorizar suas
R
histórias e suas práticas, bem como compreender suas representações.
a
Inseridos nas atividades investigativas-formativas as alunas e
também nós, professores envolvidos na pesquisa, fomos desenvol-
do
vendo estratégias de apropriação e de aprimoramento sobre o que é
possível fazer do que queriam fazer de nós . Enquanto estratégia de
aC
autoformação as alunas envolvidas, através do relato, da escuta e da
to, imagina poder vir a ser um sempre outro. Assim, é preciso poder
imaginar ser – e tornar-se efetivamente – tanto único porque singu-
ver dit
Referências
od V
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uto
BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo: Martins
Fontes, 1998.
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Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
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uto
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cotidiano. Pelotas: Editora e Gráfica Universitária/UFPEL, 2004.
aC
PERES, Lúcia Maria Vaz; KUREK, Deonir Luís. Teias de Anima:
od V
r
e a criatividade
uto
R
Lucimar Oreques
oa
A criança que fui...
aC
Sempre acreditei que a infância me tinha sido negada. O tra-
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V
r
minha identidade e representação própria(no meu eu).
uto
A descoberta de si - Transformação
R
A partir da descoberta da existência da possibilidade35 de dar
a
novo sentido ao que foi vivido pude tornar-me “outra pessoa”. Des-
cobrir como acontece o processo (auto)formativo de uma professo-
do
ra36, resgatar lembranças de infância, dos primeiros anos escolares,
da primeira professora... foi uma verdadeira revisitação ao passado.
aC
Ao narrar minha história fui percebendo que aquela menina
od V
r
vés da narrativa da história de vida, onde o sujeito tece sua própria teia
de acordo com as lembranças mais sutis, faz com que ele ressignifique
uto
cada momento com um olhar diferente e dando um valor maior, ou não,
às brincadeiras e pessoas com as quais conviveu.
Ao narrar sua história vivida o sujeito tem a oportunidade de
R
repensar seus atos, questioná-los e dar-se a chance de trilhar dife-
oa
rentes caminhos bem como de valorizar-se como formador de sua
própria história. É um exercício de reflexão sobre o que foi vivido,
transformando as vivências em experiências, conforme Josso (2004)
aC
defende: “estas vivências atingem o status de experiências a partir
do momento que fazemos um certo trabalho reflexivo sobre o que
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V
r
põe a “valorização da história de vida de cada educando, realizando
uto
um trabalho que leve em conta a singularidade de cada um, com
vistas à organização do coletivo” (PERES, 2010).
Um professor, ao permitir que seus alunos falem sobre suas
R
experiências vividas, valoriza-os como ser e oferece a oportunidade
a
deles voltarem para si, falarem de si percebendo-se como ativos no
seu processo de aprendizagem. Mais ainda, proporciona aos mes-
do
mos aprender através da experiência dos outros, entendendo que os
conhecimentos trazidos “de casa” são tão importantes quanto os sa-
aC
beres formais da escola, pois aqueles dão sentido a estes.
od V
r
tros, dando oportunidade então, dele tornar-se diferente a partir do
que viveu no passado.
uto
Pode-se inferir então que a valorização do conhecimento
de si, como ser e como profissional, através do trabalho (auto)
formativo, tem papel fundamental para tornar essa pessoa mais
R
confiante e humanizada. Permitindo à professora perceber seus
oa
alunos de forma sensível, valorizando sua subjetividade, adotan-
do uma prática que trata o aluno como um ser composto por cog-
nição, mas também por emoções e desejos.
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
visã
a re
itor
par
Ed
são
ver
84
Referências
V
r
DELORY-MOMBERGER, Christine. Biografia e educação: figuras
uto
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aC
ENDIPE - Convergências e Tensões no Campo da Formação e do tra-
balho docente: políticas e práticas educacionais,15, 2010, Belo Hori-
od V
r
(re)significadas em
uto
Seminário de Investigação-
Formação37
R
oa
Maria Helena Menna Barreto Abrahão
aC
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
Aporte teórico-metodológico
37 Desejo agradecer à querida colega Drª. Lúcia Maria Vaz Peres, líder do grupo de pesquisa
GEPIEM, o honroso convite para esta participação.
38 No caso, eram todas do sexo feminino.
ver
39 Dada a extensão proposta para os textos – no máximo 10 páginas – apenas lembraremos alguns
aspectos, de forma pontual, sem necessariamente apresentá-los em uma tecedura que lhes
conforma a trama que os torna coerentes.
40 ABRAHÃO, M.H.M.B. Metamemória-memórias: memoriais rememorados/narrados/refletidos
em Seminário de Investigação-Formação. In: PASSEGGI: M.C. & BARBOSA, T. M. N. (orgs.).
Memórias, memoriais: pesquisa e formação docente. Natal/São Paulo: EDUFERN/PAULUS,
2008.p. 253-176.
86
V
r
mentos da própria formação. Ademais, espera-se que esse processo
uto
promova o momento da narrativa (também ele) como uma experiên-
cia essencialmente formativa. Trata-se de o narrador, elaborador do
próprio memorial, ser realmente o sujeito da narração, consciente de
R
que a reflexão empreendida é elemento sine qua non para a compre-
a
ensão do próprio processo de formação.
A trama da narrativa, conforme a entendemos, terá sentido
do
ao urdir os fatos relacionando-os ao contexto sócio-político e cul-
tural vivencial do narrador. Essa trama também enlaça, na mesma
aC
urdidura, o contexto espacial com o temporal, de tal forma que
ro, razão pela qual o próprio discurso narrativo não procura neces-
sariamente obedecer a uma lógica linear e sequencial.
ara
od V
r
ções concretas pelo relato em que aflorem as percepções de sujeitos
históricos a possibilidade de (re)significá-las, por abstrações mais
uto
críticas no seio dos processos de formação. Essa metodologia tem,
segundo Santamarina e Marinas (op.cit), uma dimensão ética e po-
lítica na medida em que “aposta na capacidade de recuperar a me-
R
mória e de narrá-la desde os próprios atores sociais” (p. 259), rom-
oa
pendo com formas cristalizadas de investigação que valorizam mais
o dado acabado e partindo para a intenção de capturar sentidos da
vida social que não são facilmente detectáveis … (buscando) o sen-
aC
tido do tempo histórico e o sentido das histórias submetidas a muitos
processos de construção, de re-elaboração de identidades individu-
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
42 Diferentemente, do que denomino de Memorial Institucional, como por exemplo, o memorial que
os hoje mestrandos e doutorandos escrevem para compor o naipe de documentos exigidos pelo
edital que preside o processo de seleção à Pós-Graduação stricto sensu. Este é construído para
ver
V
r
ção, com professores em processo de formação43, tem em vista a
uto
reconstrução do sentido do trabalho de professores enquanto pro-
fissionais reflexivo-crítico-transformadores da sua própria prática,
repensada e sopesada e de práticas sociais, dentro das possibilidades
R
concretas do trabalho do educador, identificado como tal. Esse en-
a
tendimento estriba-se no pensamento de Shulman e Colbert (1989),
que consideram as narrativas das práticas de professores como ele-
do
mentos catalisadores que induzem à reflexão dos professores em ge-
ral sobre sua própria profissão.
aC
Para o desenvolvimento da pesquisa pela vertente da Investi-
-REFERÊNCIAS, de Josso44.
Para atingirmos os objetivos que se referem à investigação-
-formação, os dados e informações têm sido produzidos simultane-
op
43 A quase totalidade de nossos alunos da Pedagogia já trabalha como docentes. São, portanto, profes-
sores em formação. Realizam um curso de formação de professores – o curso de Pedagogia.
44 Por exemplo: JOSSO, M-C. Caminhar para si. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2010, P. 156-157.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 89
od V
r
gas esse material; concomitantemente e após a leitura, integrantes da
turma reagem interagindo entre si e com a colega cujo material está
uto
em análise, fazendo aproximações com suas próprias experiências. A
partir dessas reflexões, a graduanda adenda, remodela (ou não) seu
memorial, (re)significando o entendimento do que havia escrito. Ao,
R
(re)visitar o memorial possibilita reconstruí-lo com novas e ricas sig-
oa
nificações hauridas pela experiência ao longo da trajetória já efetuada
e, especificamente, no Seminário de Investigação-Formação.
Essas questões foram antes negociadas com as integrantes do
aC
grupo (fase do acordo). Interessam ao grupo, em seu conjunto, como,
igualmente, há tópicos de interesse individualizado, mercê das dife-
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V
r
em realização, das aprendizagens havidas, incluindo as perspectivas
uto
de prolongamento da reflexão até então empreendida.
R
a pedagoga em formação
a
Em Josso, podemos entender as “recordações-referências
do
[como] constitutivas das narrativas de formação” (2002, p. 31). As
recordações-referências constituem, portanto, a natureza das narra-
aC
tivas de formação, as quais produzem, pela rememoração que per-
escolhidos intencionalmente.
São alunas que na maioria já têm alguma experiência de do-
ver dit
od V
r
São elas: Lembranças da Infância, com referência à significa-
ção do nome (origem); situação do nascimento; momentos felizes,
uto
momentos tristes, perdas e danos (em especial perdas de parentes
queridos), as brincadeiras, as amizades, a família, a escola, os es-
tudos no Ensino Fundamental e Lembranças da Adolescência, com
R
destaque para a identidade (quem sou eu, como me posiciono no
oa
mundo; o que sou, o que sinto, o que penso), momentos felizes,
momentos tristes, perdas e danos (em especial perdas de parentes
queridos e de amigos, momentos de lazer, os namoros (e, para algu-
aC
mas, o casamento), as amizades, a família, a escola, os estudos no
Ensino Médio, as primeiras experiências docentes.
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Devido ao espaço que nos resta, vamos nos deter um pouco nas
dimensões escolha profissional e prospecção profissional.
visã
As recordações-referências quanto à escolha profissional
V
r
aparecem em mais de uma situação em cada caso. Assim, podemos en-
tender que as alunas significam-nas de forma potente, como dimensões
uto
importantes de suas recordações-referências. Não debitam a escolha
profissional ao acaso, ao “não sei por que vim parar nesse curso”, mas
às recordações -referências que não explicam por si só a escolha profis-
R
sional (certamente houve outras nuances, também), mas que são dimen-
a
sões de positiva referência nas recordações de cada uma.
Note-se que não estamos aqui debitando o estar em curso de Pe-
do
dagogia somente às dimensões trazidas pelas alunas. Temos a consciên-
cia de que condicionantes psicossociais, econômicos e culturais, dentre
aC
outros, atuaram nesse sentido. O que estamos aqui registrando é a esco-
od V
r
ções “em que alunos e professores se completam” e a educação tem
o papel “de educar para um mundo melhor”; de “ensinar as crianças
uto
a ‘pescar’ para que tenham um futuro mais digno”; em que ser pro-
fessora é “poder esperar o retorno afetivo de parte das crianças”; em
que ser professora possibilita “mudar o mundo pela educação”, desde
R
que “a professora exerce um papel singular na vida das pessoas”; ra-
oa
zão pela qual “a atividade docente marca definitivamente o indivíduo
em seu contexto pessoal e social”, portanto o desiderato é “contribuir
para a melhoria da educação no Brasil”; esperando-se, ipso facto “o
aC
reconhecimento da sociedade ao trabalho do professor”.
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V
r
É nessas duas fases que no momento estamos trabalhando
uto
com as alunas e já podemos perceber na prática o sentido de se
retrabalhar os memoriais de formação para a (re)significação das
recordações-referências para a pedagoga em formação, procurando
R
despertar-lhes uma visão menos ingênua e mais relacional.
a
As alunas estão aprendendo na vivência do Seminário de Investi-
gação-Formação que o memorial de formação não é simplesmente um
do
relato do vivido, mas uma narrativa do experienciado, isto é, consubs-
tancia-se no interior do processo de rememoração com reflexão sobre
aC
fatos narrados, formando uma trama com sentido que possa auxiliar na
Referências
od V
r
uto
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morados/narrados/refletidos em Seminário de Investigação-For-
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e a formação. Lisboa: MS/DRHS/CFAP, pp. 37-50, 1988.
PINEAU, Gaston. Germination des histoires de vie en formation de
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do
______. As histórias de vida como artes formadoras da existência.
aC
IN: SOUZA, E. C. de; ABRAHÃO, M. H. M. B. (Orgs.). Tempos,
od V
r
E OUTROS PERCURSOS
uto
AUTOBIOGRÁFICOS45
R
oa
Marcio Xavier Bonorino Figueiredo
Rita de Cássia Tavares Medeiros
aC
O Grupo de Pesquisa: Cultura, Infância e Educação Infantil da
Editora CRV - versão para revisão do autor - Proibida a impressão
45 Uma versão deste trabalho está publicada em espanhol na revista Entremaetr@s (34).
Uma publicação da Universidade Pedagógica Nacional, UPN, México, v.10, num.34,
outono de 2010.p.74-81.
98
V
r
cola e a comunidade, em uma relação profunda e comprometida.
uto
Estar em sintonia com o universo das crianças pressupõe estar
aberto para o universo que elas partilham. Ter coragem para viver
junto às suas emoções, curiosidades, estar disposto para acompa-
R
nhar suas idas e vindas, seu desvio, seus direitos. É admitir que o
a
lugar do protagonismo infantil ainda está calcado na adultez, como
jeito humano de organizar a sociedade: compreender que a relação
do
entre adultos e crianças ainda permanece na obscuridade dos estu-
dos, como se essa questão não tivesse qualquer importância na cons-
aC
trução cotidiana do mundo em que vivemos. A busca por esse lugar
od V
r
amor, a conexão, a confiança, a confidência.
Colo, conhecimento de si e do outro, a cooperação, o cuidado, ex-
uto
pressam a sincronização no convívio com a criança. A ajuda, a doação,
a cooperação, o cuidado consigo e com o grupo, soma-se às condições
de perceber, relacionar-se, dar carinho, dialogar, descontrair-se.
R
Fazer o que se gosta é se valorizar. Fazê-lo com carinho, di-
oa
álogo e consideração pelo grupo, permite gostar das pessoas, do
trabalho, do ambiente de trabalho, e permite o crescimento. A sensi-
bilidade no olhar, no movimento, nos ritmos, nos cheiros, facilita a
aC
interação, o intercâmbio e as trocas.
Assim, interrogamos, em um processo de formação – que prin-
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V
r
ser semelhantes, contraditórias ou sobrepostas. Porém, em
uto
hipótese alguma, as lembranças de duas pessoas são - assim
como as impressões digitais, ou, a bem da verdade, como as
vozes – exatamente iguais.
R
Apoiados em Freire (1992, p.33) e impulsionados por Josso
a
(2004) vamos buscando a construção de perfis esquecidos das cul-
turas lúdicas... as quais temos guardados nos baús do esquecimento.
do
Carregamos conosco a memória de muitas tramas, o corpo mo-
aC
lhado de nossa história, de nossa cultura; a memória às vezes
od V
r
brinquedo, a maneira como brinca e suas preferências indicam uma
produção de sentidos e de ações. Na brincadeira, a criança se apro-
uto
pria dos conteúdos disponíveis, tornando-os seus, através de uma
construção específica. As brincadeiras variam segundo as idades, o
gênero e os níveis de interação lúdica e quando são experimentadas
R
oa
coletivamente expressam apropriações de conteúdos diferentes dos
que estão presentes numa situação individual.
Nessa direção as educadoras são aprendizes de uma cultura do
esquecimento, que precisa ser provocada, para que possam ser per-
aC
cebidos os caminhos das infâncias e para que as educadoras possam
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sua condição de “que um dia já foi criança, pensou como tal” Afi-
nal, do que mais precisamos além de ampliar os horizontes?
Limitamo-nos à cultura lúdica infantil, mas existe também
uma cultura lúdica adulta, e é preciso igualmente situá-la dentro da
ver
V
r
materiais impostas à criança.
uto
Ela também pode ser entendida como igualmente a reação da
criança ao conjunto das propostas culturais, das interações que lhe
são mais ou menos impostas. Daí advém a riqueza e a complexida-
R
de de uma cultura em que se encontram tanto as marcas das con-
a
cepções adultas quanto a forma como a criança se adapta a elas. Os
estudos vêm apontando em alguns o condicionamento, em outros,
do
a inventividade, a criação infantil. Mas o interessante é justamente
aC
poder considerar os dois aspectos presentes num processo comple-
od V
r
cartas escritas a bico de pena... Lugares onde moramos, vi-
uto
vemos, trabalhamos. Assumir a própria vida, transformar os
espaços e permitir expressar-se do seu jeito, com seus ritmos
e possibilidades. Entrar no palco virtual, um mistério a ser
R
desvendado, reconhecido como outras maneiras de se fazer
oa
educador e educadora. E ao garimpar ou peneirar as mani-
festações das memórias e as histórias de vida, através desses
objetos íntimos retirados dos baús do passado, e desta forma
abrindo espaços para muitos conhecimentos e transgredindo
as indiferenças, nos perguntamos: Por que os cenários de nos-
aC
sas memórias, lembranças e vivências - brinquedos, livros,
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V
r
uto
R
a
do
aC
Ilustração 1 - Objetos trazidos pelas educadoras
od V
r
sas muitas vezes não ditas, mas vividas e que marcaram a trajetória
das pessoas. Na perspectiva de adentrar no imaginário social das
uto
educadoras com relação a sua profissão, perpassamos o simbólico,
as significações, os sonhos na tentativa de compreender os sentidos
dados à infância e ao seu fazer pedagógico com as infâncias.
R
oa
aC
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a re
itor
par
V
r
texto espaço-temporal dado, uma (ou, por vezes, mais do
uto
que uma) que se torna dominante. O Estudo dessas concep-
ções, sob a forma de imagens sociais da infância, torna-se
indispensável para construir uma reflexividade fundante de
um olhar não ofuscado pela luz que emana das concepções
R
implícitas e tácitas sobre a infância .
a
Começamos o trabalho com uma escrita decorrente de uma ta-
do
refa: “Escrevam um Livro da Vida (FREINET, 1975; 1976) de suas
lembranças mais marcantes da Infância. Transforme-o num presen-
aC
te, embrulhe e traga para nosso encontro.” As educadoras recebem
que farão parte da obra. Essa visão é concebida por Célestin Frei-
net (1996; 1998). Em noventa por cento das memórias (aqui esta-
or
od V
r
seja pela ausência, pelo desejo ou pela brincadeira em si. Vocês de-
vem escrever a carta, que será lida pelo grupo, silenciosamente, de
uto
mão em mão, mas também deverão trazer o brinquedo, ou o ato de
brincar, ou algum objeto que lembre a experiência vivida”.
Esse tem sido um dos momentos mais fortes do trabalho
R
com os grupos, porque traz à tona as lembranças de momentos
oa
inesquecíveis do brincar e traduz em culturas das mais diferen-
tes em épocas distintas a função e o papel que o brincar tem na
produção da infância, ainda que, como vimos anteriormente, com
aC
as influências do mundo que os adultos “escolhem, preparam e
tentam definir” para as crianças. Por tudo isso, ainda desejamos
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Referências
V
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oa
aC
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visã
a re
itor
par
Ed
são
ver
E
ver dit
sã or op
ara aC
rev
i são R V
do
a uto
r
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A AFETIVIDADE COMO
FACILITADORA DO ENSINO
od V
r
E DA APRENDIZAGEM
uto
Raquel Bastos Trindade
R
oa
Não há educação sem amor. O amor implica
aC luta contra egoísmo. Quem não é capaz de amar
os seres inacabados não pode educar. Não há
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a pensar sobre este tema que ora me proponho a apresentar. Vou discor-
rer a partir dos seguintes questionamentos: qual a importância do afeto
na sala de aula? Como os alunos têm vivenciado suas emoções? Onde
está a ação desejante do aluno no que se refere à escola?
Ed
V
r
hoje, estão presentes e de algum modo são fomentadoras das apren-
uto
dizagens no decurso da formação.
No decorrer da pesquisa, tive a oportunidade de entender que
o mais importante para ser uma educadora, com uma formação mais
R
ampla, era trabalhar o simbólico a partir dos diferentes pontos de
a
vista, os quais são inerentes à Formação do Educador. Ou seja, valo-
rizar os aspectos mais técnicos – métodos – necessários ao oficio da
do
prática docente, bem como os aspectos subjetivos, os quais acabam
por movimentar tais ofícios. Dentre estes cito a afetividade.
aC
Conceituar afetividade sempre foi algo fácil, mas ao mesmo
od V
r
Contudo, o que acontece, em alguns casos, é que alguns educadores
não percebem que estes alunos estão carentes afetivamente e, por
uto
isso, acabam não apresentando um bom rendimento na escola, uma
vez que nossa mente não internaliza somente os aspectos cognitivos,
mas também os emocionais.
R
Com isso, não estou dizendo que somente a afetividade resol-
oa
veria o problema de quem não aprende. Mas, certamente, a constru-
ção de uma boa autoimagem e de vínculos afetivos podem ajudar.
Este tem sido um tema recorrente – o da afetividade – mas tal-
aC
vez pouco exercitado na formação inicial de professores. Podemos
observar que tal formação tem sido exaustivamente estudada; no
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V
r
uto
A análise destas etapas possibilita a reconstrução de nossa ex-
periência de vida e, numa visão autorreflexiva, busca compreender
as trajetórias tanto individuais quanto coletivas, não perdendo de
R
vista o próprio processo de formação, fazendo emergir as repre-
a
sentações sobre ser professor que habitam o imaginário das alunas;
imaginário este que se revela através das nossas crenças, valores,
do
dos nossos sonhos, dos significados que atribuímos aos fatos.
Como poderemos evidenciar nas falas a seguir, os professores
aC
exercem muitas influências na vida de seus alunos:
“Um menino chegou para mim e disse assim: “Eu não quero
passar”. E a gente perguntou: ”Mas porque não quer passar?
Todo mundo quer passar”. Ele disse: “Eu não quero passar por-
que eu não gosto da professora do 2º ano”. Poxa, saber assim,
ara
que algum dia um aluno pode dizer isso de mim. Ah! Aquilo
dói. Dá vontade de mudar isso.” (Afrodity)
ver dit
pois muitas vezes eles são vistos como exemplos a ser seguidos, in-
terferindo não só no aspecto cognitivo de seus alunos, mas também
na construção de seus repertórios.
Escritas de autobiografias educativas...
O que dizemos e o que elas dizem? 115
od V
a construção do ser professor inicia antes de nos inserirmos num
r
processo formal de ensino, temos representações do que seja um
uto
professor, uma escola, uma aula e essas imagens compõem os sa-
beres que serão utilizados na atuação profissional (p.262).
R
Concordando com a autora, pensamos o imaginário como
oa
uma força afetiva que tem suas raízes em nossa infância e, também,
como impulso para apropriação dos futuros saberes.
Nessa perspectiva, temos a oportunidade de ver que nossos
alunos, os quais já tiveram várias experiências ao longo de suas vi-
aC
das, farão uso destas para dar sentido, ou não, aos conteúdos esco-
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ma o autor
V
r
trazem para a sala de aula, já que estes são instrumentos-motores
uto
para uma aprendizagem recheada de sentido e significado e, tam-
bém, são a porta de acesso ao coração dos alunos.
R
Como isso se reflete no projeto-professora?
a
Conforme havia dito anteriormente, começo a ensaiar os meus
do
primeiros passos como professora em uma turma de 3ª série do En-
sino Fundamental de uma Escola Municipal de Pelotas. O estágio
aC
teve início no primeiro trimestre de 2010, decorrente de uma prática
od V
r
sim àquele afeto que também “impõe” limite, que constrói as regras
junto com os educandos.
uto
Sabemos que o estudo sobre afetividade na sala de aula não é
nenhuma nova teoria pedagógica nem tampouco a mais nova desco-
berta científica, porém trata-se de algo que acompanha o ser humano
R
desde seu nascimento. Todavia, em muitos momentos, tem passado
oa
despercebido nas relações humanas.
Nossos impulsos emocionais têm início no afeto. Segundo
Cunha (2008), na sua definição etimológica, o afeto não é neutro,
aC
podendo exprimir um sentimento de agrado ou desagrado em dife-
rentes graus de complexidade.
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V
r
estava sendo dada, encontrava diversos desenhos de dinossauros
uto
acompanhados por algumas poesias.
A partir deste momento, passei a dedicar alguns períodos para
que os alunos pudessem criar as suas poesias, as quais fariam parte
R
do livro da turma. Ao final de cada aula, sempre pedia para um alu-
a
no ler o que havia produzido. Nestes momentos de socialização das
produções, passei a elogiar muito os trabalhos dele, mostrando o
do
quanto ele era inteligente, que ele desenhava e escrevia muito bem.
Os demais colegas sempre gostavam e pediam para que Pedro lesse
aC
suas poesias. Aos poucos, fomos modificando a rotina de trabalho,
entre os alunos.
Sobre a importância da interação para o aprendizado, que para
mim é caminho para a construção de uma boa autoestima, e, portan-
to, de boas relações afetivas, Oliveira afirma que:
E
sã
od V
r
pressarem o que pensam sobre determinado assunto. Com o passar
do tempo, já “era possível perceber as transformações dos relacio-
uto
namentos através dos vínculos afetivos, trazendo a diferença nos
momentos da interação dos encontros” (NEUMANN, 2010, p. 60)47,
estabelecendo-se uma relação de respeito e confiança entre os alunos
R
e a professora. Tal relação só se tornou possível a partir do momento
oa
em que a afetividade começou a ser parte da realidade daquela tur-
ma, fazendo, assim, com que o processo de ensino e aprendizagem
se tornasse mais prazeroso e motivador.
aC
Os alunos tinham mais facilidade de expor suas opiniões e
dúvidas, o que facilitou o rendimento das aulas. Os trabalhos em
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trajetória escolar.
V
r
tadas, respeitar o professor, dentre outros.
uto
Durante minha prática, percebi que só consegui realizar este
trabalho voltado para a afetividade, por ter conseguido unir o que
aprendi em sala de aula durante os quatro anos de Curso com a ex-
R
periência de ser bolsista.
a
A afetividade sempre esteve presente em minhas relações na es-
cola. Ela era tida como o alicerce principal para sustentar o modo como
do
me relacionava com o outro, uma vez que somente isso me transmitia
segurança para que esta relação existisse de forma integral.
aC
Hoje sei que trabalhar os conteúdos escolares de forma mais
Referências
od V
r
uto
CUNHA, Eugênio. Afeto e aprendizagem: relação de amorosi-
dade e prazer na prática pedagógica. Rio de Janeiro: Wak, 2008.
DELORY-MOMBERGER, Christine. Biografia e Educação: figuras
R
do indivíduo-projeto. Natal, RN : EDUFRN; São Paulo: Paulus, 2008.
oa
NEUMANN, Márcia Knabah. Os vínculos afetivos na sala de aula do
Ensino Fundamental: Leituras de uma professora com as lentes do
Imaginário. 2010. 101f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Facul-
dade de Educação, Universidade Federal de Pelotas, UFPel.
aC
JOSSO, Marie - Christine. Experiências de Vida e Formação. São
Paulo: Cortez, 2004.
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od V
r
DE PROFESSORES
uto
R
Valeska Fortes de Oliveira
oa
Primeiras palavras...
aC
A escrita configura-se como um dispositivo48 de formação e
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liza virtualidades e inventa o Novo Radical. (...) Um dispositivo compõe uma máquina semiótica
e uma pragmática e se integra, conectando elementos e forças (multiplicidades, singularida-
des, intensidades) heterogêneos que ignoram os limites formalmente construídos das entidades
molares (estratos, territórios instituídos etc.). Os dispositivos, geradores da Diferença Absoluta,
produzem realidades alternativas e revolucionárias que transformam o horizonte do considerado
Real (BAREMBLITT, Gregório F.; MELO, Cibele R. de . In: BAREMBLITT, Gregório F. Compêndio
de análise institucional e outras correntes: teoria e prática, 1992, p.151)
124
V
r
sempre constituídas pelas redes de poder.
uto
Pensando na possibilidade da experiência ética e estética – co-
locando a vida como “obra de arte” (NIETZSCHE), a escrita de si é
uma experiência na qual o sujeito, a partir de uma máxima: “ocupa-
R
-te de ti mesmo”, através de um movimento que o coloca na cons-
a
trução/ desconstrução de acontecimentos, imagens e representações,
pode produzir a invenção de si.
do
É com esta perspectiva e a partir deste movimento que te-
mos utilizado a produção da narrativa de vida nos espaços de
aC
formação da universidade e fora deles, revisitando imagens,
od V
r
que reconstrói do presente, que esquece, que nega, que se (re)
visita. É a viagem que, como um exercício do desassossego que
uto
está em “por-se” a descoberto.
R
de conhecimento e formação
oa
Como pesquisadores de – e através de – suas histórias de vida,
chegamos aos saberes que os(as) professores(as) em formação vêm
aC
construindo ao longo de suas trajetórias pessoais, nos diferentes espa-
ços / lugares e tempos formativos: a escola, a família, os grupos sociais.
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49 Sobre o uso deste conceito na pesquisa com professores remetemos ao trabalho de KUREK,
Deonir Luís e OLIVEIRA, Valeska Fortes de. O “cuidado de si” na produção da subjetividade
docente. In: VASCONCELOS, José Gerardo e MAGALHÃES Jr., Antonio Germano (orgs.) Um
Dispositivo chamado Foucault. Fortaleza: LCR, 2002. (Coleção Diálogos Intempestivos – 5)
126
V
r
elaboradas a partir da experiência de aluno(a).
uto
De posse dos materiais produzidos pelas narrativas, é possível
questionar as marcas e os modelos, tanto de docentes quanto de prá-
ticas educativas, registrados e reelaborados pela memória, refletindo
R
a partir da sua pertinência no tempo presente e das possíveis inércias
a
que não viabilizam movimentos capazes de instituir outras possibi-
lidades de vida. Nossos processos formativos acontecem em lugares
do
/ tempos diferentes, e a memória realiza um trabalho privilegiado ao
reconstruí-lo como “recordações-referências constitutivas das nar-
aC
rativas de formação.” (JOSSO, 2002, p.31).
od V
r
dele próprio provisório, que termina num sujeito ou em vários sujei-
tos.” (FOUCAULT, 1984, p.137).
uto
O conceito de experiência em Foucault, “aproximando-a de
uma atitude histórico crítica, a partir da qual um indivíduo relacio-
na-se consigo mesmo e com os outros, consistirá um espaço de ação
R
no qual serão constituídos sujeitos históricos segundo processos de-
oa
finidos historicamente.” (NICOLAZZI, 2004, p.104).
Estamos falando de um trabalho “histórico-crítico”(NICOLAZZI,
2004) sobre as relações que o indivíduo estabelece consigo mesmo
e através das quais ele se reconhece e se produz como sujeito, tendo
aC
como referência os jogos de verdade dos quais faz parte. É o processo
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V
r
que a sociedade e o tempo onde este produz a narrativa lhe permite
uto
se movimentar. A experiência se configura também a partir da própria
historicidade e dos limites temporais que a delimitam. “Em uma ex-
pressão, experiência é a dupla construção, a de histórias pelos sujeitos,
R
a dos sujeitos nas histórias.” (NICOLAZZI, 2004, p.109).
a
Na superfície e na profundidade da narrativa, o indivíduo que
se configura em objeto da narrativa traz consigo territórios, paisa-
do
gens, acontecimentos, sendo este sujeito também um acontecimento
datado. É nisso que reside a potência transformadora da atitude ge-
aC
nealógica: em fazer “que intervenham saberes locais, descontínuos,
od V
r
lembranças e também com meus devires, possibilidades que se colo-
cam na experiência da escrita. Nessa relação consigo, em que o pen-
uto
samento é partilhado ou não, o esquecimento não é, segundo Feitosa
(2000, p.18) “desorientador ou desconcertante. Ao contrário, é nesse
estado de suspensão das ocupações e dos valores estabelecidos que
R
se abre a oportunidade para a decisão de tornar-se o que se é.”
oa
A escrita e o esquecimento
Ao pensarmos na produção de narrativa, somos levados
aC
imediatamente à noção de reconstrução, de rememoração, de tra-
balho da memória.
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V
r
Nesta relação da fotografia com a memória, a narrativa e a lei-
uto
tura / escrita, as imagens antes fixadas pelo acervo fotográfico
dialogam com o acervo imagético do pesquisado. Cada histó-
ria, cada fragmento, cada foto, cada olhar constitui-se no mo-
vimento de refotografar as imagens já fotografadas pela lente.
R
a
Nos nossos trabalhos, as “pesquisadoras de si” têm sido as mu-
lheres professoras ou as professoras mulheres. Lembro até hoje que,
do
num dos primeiros projetos que realizamos numa escola municipal
aC
de Santa Maria, uma das colaboradoras perguntou o que ela teria de
tão importante para contar a uma pesquisa da universidade. É como
od V
Define a ‘memória’ como uma faculdade de reter conhecimen-
r
tos ou experiências passadas e o ‘esquecimento’, por oposição,
uto
como a incapacidade de reter as informações, como um certo
‘deixar cair fora’ do controle (“esquecer” deriva-se do latim
“cadere”, que quer dizer “cair”).
R
oa
Assim, associamos memória sempre com a atividade de recons-
truir e nunca com o esquecimento e seus lapsos. Da mesma maneira
que, segundo Feitosa (2000, p.12-14), “nossa capacidade de controle
sobre a memória é limitada, talvez haja inversamente a possibilidade de
aC
que o esquecer seja ativo.” (...) “A técnica de esquecer não tem garantia
de sucesso, porque esquecer parece ser exatamente o contrário de toda
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V
r
No espaço da universidade, muitas(os) das(os) alunas(os) se de-
uto
param com a ideia do esquecimento. Por que não lembramos desta fase
da vida? Por que não me lembro das minhas professoras dos primeiros
anos? Por que não consigo lembrar mais detalhes? Estas são questões
R
frequentes quando desafiamos que escrevam suas narrativas de vida
a
tendo como foco a infância, a adolescência e a escolha da profissão.
O sentido neste movimento – a escrita da narrativa – está na
do
possibilidade de pensarmos nas marcas produzidas – o que fizeram
conosco, para então pensarmos no que podemos fazer conosco a
aC
partir de agora. Os tipos de pedagogias vivenciados por nós, nos
od V
r
A produção das narrativas de vida no tempo e no espaço forma-
tivo da universidade permite à pessoa que escolheu a docência como
uto
campo profissional, revisitar seus repertórios, suas representações sobre
o “lugar” do professor e as figuras construídas em torno deste na sua
vida, possibilitando problematizar modelos, práticas e comportamen-
R
tos na perspectiva da produção de um professor e de uma pessoa que
oa
exercita um “cuidado de si”, se produzindo melhor neste tempo e neste
mundo. É um dispositivo que viabiliza, ainda, conversar com o próprio
pensamento. Colocar o pensamento em movimento.
aC
Neste movimento, não somente reconstruímos nossas lem-
branças através do trabalho da memória e do atravessamento do
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Referências
V
r
BAREMBLITT, Gregório F. Compêndio de Análise Institucio-
uto
nal e outras correntes: teoria e prática. Rio de Janeiro: Rosa dos
Tempos, 1992.
CATANI, Denice Bárbara; BUENO, Belmira Oliveira; SOU-
R
SA, Cynthia Pereira; SOUZA, M. Cecília C.C. (Org.) Docên-
a
cia, Memória e Gênero – Estudos sobre formação. 2 ed. São
Paulo:Escrituras, 2000.
do
DELEUZE, Gilles.Crítica e Clínica. São Paulo: Ed 34, 1997.
aC
FEITOSA, Charles. Da utilidade do esquecimento para a filosofia.
In: FEITOSA, Charles; BARRENECHEA, Miguel A.(orgs.) Assim
od V
r
Paulo: Martins Fontes, 2005.
NICOLAZZI, Fernando. A narrativa da experiência em Foucault e
uto
Thompson. In: Anos 90, Porto Alegre, v. 11, n. 19/20, p. 101-138,
jan./dez. 2004.
OLIVEIRA, Valeska Fortes de. Educação, memória e histórias de
R
vida: usos da história oral. In: História Oral. Recife: Associação
oa
Brasileira de História Oral, v. 8, n. 1, Jan./Jun., 2005.
____. Implicar-se... implicando com professores: tentando produzir
sentidos na investigação / formação. In: SOUZA, Elizeu Clementi-
aC
no (org.) Autobiografias, histórias de vida e formação: pesquisa e
ensino. Porto Alegre: EDIPUC, 2006.
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uto
Andrisa Kemel Zanella
R
Direção Teatral pela Universidade Federal de Santa Maria. Mes-
oa
tre em Educação, pelo Programa de Pós-Graduação em Educação/
UFSM. Pedagoga pela Universidade Luterana do Brasil/Canoas/RS.
Atualmente é acadêmica do Curso de Doutorado em Educação, no
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal
aC
de Pelotas e integrante do Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Ima-
ginário, Educação e Memória (GEPIEM) e do Grupo de Estudos e
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V
r
Coordena o Programa Diálogos em Redes: a Educação de Jovens
uto
e Adultos na perspectiva da Educação Ambiental , financiado
pelo PROEXT/2006, da SESu/MEC. Coordenadora do Fórum de
Pró-Reitores de Graduação da Regional Sul (2008). Coordena-
R
dora da Pesquisa “Diálogos em Rede: sentidos e signficados na
a
alfabetização de EJA”, contemplada com auxilio financeiro do
CNPq, Edital 03/08 Ciências Humanas.
do
aC
Jiani Torres Álvaro
desta coletânea.
rev
or
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tographein. É representante da Associação Brasileira de Pesquisa
(Auto)Biográfica - BIOgraph, na Região Sul e integra a comissão
uto
dos encontros sobre o Poder Escolar referente ao projeto de for-
mação continuada de professores da rede pública do Município
de Pelotas/RS e região.
R
oa
Lucimar Oreques
Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Pelotas
aC
e protagonista da pesquisa objeto desta coletânea.
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visã
Maria Helena Menna Barreto Abrahão
V
r
cas da Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
uto
na área de Psicologia Educacional, e do Programa de Pós-graduação
em Educação, na linha de pesquisa: "História da Educação,
Práticas socioeducativas e usos da Linguagem". É graduada
R
em Letras pela Universidade Federal do Ceará (1969). Obteve o
a
mestrado em Letras Modernas (1976) e Doutorado em Linguística
(1981), pela Université Paul Valéry como bolsista do Ministère des
do
Affaires Étrangères. Realizou estágio pós-doutoral em Fundamentos
da Educação, como bolsista CAPES, na Université de Nantes e na
aC
Université François Rabelais (2004-2005). Desde 1999, é líder do
od V
r
Possui graduação em Educação Física pela Universidade fe-
deral de Pelotas e doutorado em Educação e Filosofia pela Univer-
uto
sidade de São Paulo. É professor Associado II na UFPEL, Escola
de Educação Física e Faculdade de Educação no Curso de Peda-
gogia. Coordena e orienta na Especialização em Educação Infantil.
R
Ministra aulas e orienta no Mestrado em Educação Física - Linha
oa
de Pesquisa: Escola, Educação Física, e Sociedade; Lider Grupo
Pesquisa CNpq: Cultura, Infância e Educação Infantil. Dentre suas
publicações: Corporeidade na Escola: análise de brincadeiras, jo-
aC
gos e desenhos; Educação: Corporeidade nos caminhos da infância;
Educação Biocêntrica: vivências com educadores; A infância dura a
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V
r
Maria (1986) e Doutora em Educação pela Universidade Federal do
uto
Rio Grande do Sul (1995). Atualmente é Professora Titular, do De-
partamento de Fundamentos da Educação, do Centro de Educação
da Universidade Federal de Santa Maria. É professora credenciada
R
no Programa de Pós-Graduação em Educação, integrando a Linha
a
de Pesquisa: Formação, Saberes e Desenvolvimento Profissional. É
líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação e Imaginário So-
do
cial - GEPEIS e vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Ima-
ginário, Educação e Memória da UFPEL-RS. Desenvolve pesquisas
aC
e projetos de formação nas temáticas: Imaginário social, Educação
ver
Ed
são
itor
par aC
a re
visã R
od V
oa
uto
r
V
r
uto
R
a
do
aC
SOBRE O LIVRO
Tiragem: 1000
Formato: 14 x 21 cm
Mancha: 10 X 17 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5/12/16/18
Arial 7,5/8/9
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)