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UNIVERSITY OF ILLINOIS
AT URBANA-CHAMPAIGN
369.9
C?66^
1905
NOTICE: Retum or renew ali Library Materíalsl The Mínimum Fe« for
each Lost Book is $50.00.
JAN 2 3 1990
L161— O-1096
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A Lira SertAxNEJa
POESIAS
CExlRA -FORTALEZA
Êòiiorce : - MiLITÃO BiVAR & C.^
líjTxxj.^ M^tjor FBcaiido Rua d'.A oofiiriblée, 37 «^
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FORTALEZA
Ty-p. Minerva — Assis Bezerra
55, Rua Major Facundo, 57
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^aq.-u^ito
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Eu 80 u rude sertanejo :
E se o dono da fazenda
Não é sujeilo estradeiro.
A Lfjra Seríatieja 9
Avizei M vaqueirama
T o d a d aq ii e lias b e r ad as
'
Entretanto já fazião -
Remexendo o snadoí*
De minha sella-gineíe,
Escancbei-a na varanda,
Em cima d'nm cavailete.
Pois, eu cá, não quero arreios,
Que só me sirvão d'enfeite.
A Lyra Sertaneja 11
O tinha eu reservado.
Cavallaria de fama,
Cada qual mais arreiado !
Os vaqueiros, a um tempo.
Com a devida attencão,
Disseram-me : «Deus vos guarde !
Vamicês se desapeiem...
Meu compadre Bastião...
Pendure alli os arreios,
—
N'aquelle chifre o gibão —
Seu Zé Bento, seu Reimundo,
S'abanquem n'este surrão.
12 A Lyra Sertaneja
O Bastião da Josepha,
Com seu Ciilaro da Rita,
S'arriimem p'r'aqiielle canto,
Mais o João da Benedita,
Tudo assim, batendo o chifre,
Fica a coisa mais bonita.
Apenas anoitecendo,
Puchei um couro de gado
Para fora, no terreiro
Bem varrido, e asseiado,
P'ra nelle botar a ceia,
Qu'eu já tinha preparado.
— Gritei a rapaziada
A Lyra Sertaneja iS
E logo se levantando
—
Para o Bem-Dito-Lonvado
Acabando de resarem.
Nem me disserão — obri£s:ado —
Saindo tudo do couro
Como bizerro engeitado
14 A Lyr a Sertaneja
%
r
16 A Lyra Sertaneja
Sigilai —
levada por cima;
—
Pouta troncha a differencía...
— Então não é de minh'ama:
E' da fLWvà Queletiíeiicia.
A veia assigna por baixo :
A Lyra Seríaaeja 17
— Compadre, vi a biscaia
De sua fia, parida,
Lá no '(Morro-do-Chapéo»...
Pasta na «Yarge-Comprida».
Deu cria d'um poldro macho,
E a mãi está bem nutrida.
—E «Sacco-da-Braba)^
lá \\K^
"» '
18 A Lyra Sertaneja
A Lyra Sertaneja 19
De perneiras já calcadas,
Antes de ralhar o dia.
Levei toda a vaqueirama
P'r'o curral da vaccaria,
Tomar leite com farinha
Que de almoço servia.
A hora d'ahiioro-brabo
Já tudo tinha chegado !
22 A Lxjra Sertaneja
Vão f aliando —
no macio
Olhe o boi-vacca fubá,
Que tem feito muito cabra
Botar fora o patoá.
Se pender p"ra ujinha banda,
Quero vêr p'ra quanto dá.
24 A Lxjra Sertaneja
Estendendo o tapity.
Endireitou a carreira;
Passon nas cainbras do freio,
íCntre mim, e o cabeceira.
O tropelão escanchou-se,
Pisando no mocotó
— Morra o boi-vticca, compadre í
26 A Lf/rYt Sertaneja
Porém, me uegaciaudo
O calo, n'mn bi'ocotó,
Só por artes do diabo,
Enganchel-me n'um cipó.
O meu compadre Reimundo,
Quebrou, por fora, o cavallo
Mas, eu, n:ie desembrulhando
Não tardei muito alcancal-o.
E fui logo encommendando,
Como quem quer duvidar :
O boi-vacca, atormentado.
Tudo nos peitos levava.
Com meu compadre nos quartos,
E eu no fundo, socava. -
A Lyra Sertaneja ,27
No saltar d'um riachinho,
O bicho fracatiou :
Desacoando o novilho,
Meteu -se iogo no gado,
Faseando cada vaqueiro
P'ra seu lugar destinado.
E, de novo, se abalou
O gadão da vaquejada,
No rumo de minha casa,
Meia légua, bem puchada.
Porém com geito tocando
O gado devagarzinho, ^
Deixando fazer cordão
Direito, pelo caminho,
A Lyra Sertaneja 29
E depois do estropício,
Já se tendo morto o vicio,
No curral do beneficio
Recollieu-se a vaquejada.
E, na mais doce harmonia.
Revendo as glorias do dia.
Com a devida cortezia,
Despedi n-se a vaqueirada.
A Lyra Sertaneja 31
&¥^
"Se^iaiooo 9'uiu St^joCbeiro
E em salões ornados
De meigas, gentis donzellas,
No compasso da orchestra,
Gosta de walsar com ellas...
Nada: sou papel-queimado,
Sem})re vou taboquiado.
^ '<. í^' >'*
o
A Líjra Seríaneja 3<
A Lyra Sertaneja.
34 A L(jra Sertaneja
A Lyra Sertaneja 35
Já CO 'arma engatilhada,
Pairo com a vista fitada
No angico portentoso,
Notando o jacu firmado
No ramo mais elevado
D'este tronco magestoso.
Na firme convicção
Da certeza e precisão
Do turio, aponto sorrindo;
E, com estampido forte,
—
Arremeço o raio a morte
Qne os ares vão ferindo.
Submissos e medrosos,
São todos vassallos meus
Quem mais feliz cá na terra?
E quem mais poder encerra f
A' cima de mim — só Deus!'
A Lyra Sertaneja 39
Na sorubra da gamelleira,
N'uma cania de palmeira,
Vou deítar-me junto a beira
De fresco uiairuieial;
Ahi (''
que o caeador
(Se líiuito boçal não for)
Adorando ao Creador
Do Ceu, da terra, do dia,
Admira a natureza,
Obra de tanta grandeza,
De tanta graça e belleza,
Que embriaga, qu' extasia!
E me sentindo eiilevado
N'esse todo apriuioradí»,
Gontemplandí extasiado, >
O saber Omnipolente,
;^<5í!t:'^'
"
•
A Lyra Sertaneja M
Me embriago nos olores,
Que desprendem das flores,
se
Sem que pense em meus amores.
Durmo, e sonho docemente.
(Q>^<^
A Lyra Sertaneja.
S. Qoncalio ncí» Scttòei>
Cada um se preparando
Da melhor forma, que pode.
Dentro do surrão de bode
A roupa vae arrumando.
As mulheres, apressadas,
Com as saias encarnadas,
De babados e franzidos.
Alegres pelos caminhos.
Se juntando aos visinhõs.
Vão na frente dos maridos.
'i*í 1-1?*"--V ^ --^fiS <Ã!
^^
44 A Li/raSert€ineJa
Fastidiosos ornatos
De coretos da cidade;
Mas se nota a singelesa,
A verdadeira grandesa,
bo culto da Divindade.
No infrior da Igreja,
Qira chupana representa,
Brilhante altar se ostenta.
Embora tão pobre seja
Sobre elle collocado
Se vê o santo, enfeitado
De mil floresnaturaes,
E garrafinhas bonitas,
Com muitos laços de fitas,
Servindo de casticaes.
Parallelos as paredes.
Sobre o terreno fincados,
Singelos arcos formados
De grossas tabocas verdes.
De fio, e cera amarella.
Com graça, geito e cautela,
Accesos rolos sustentão,
Dispostos com symetria.
Produzem luz, qu'allumia
Onde as mulheres s'assentão.
-í&i<
A Lyra Sertaneja
Com bolos, doces, bananas
Entrelaçados^ com arte
Tem, alíi, um arco a parto,
No terreiro da cabana.
Deve ser arrematado
Depois do terço resado,
S'annunciando em leilão
E d'elle a som ma apurada
Será p'r'o Santo applicada
Na futura festa, então.
Do bacamarte o troar
Que rebombando, desacta,
Annuncia a hora exacta
Do terço principiar.
De mulheres tão somente,
Vê-se a casa inteirament^e^
Replecta n'aquella hora
Pois os homens, respeitosos,
Discretos e cautelosos,
Ficão do lado de fora. .
A Lijra Sertaneja 47
A cereinonia acabada,
Com respeito e alegria,
Se conduz em romaria
O Santo á sua moi*ada.
Voltando o povo, contente,
Para a festa, novamente.
No espaçoso terreiro,
'Dos velhos, o mais esperto,
E' acclamado, de certo,
P'ra servir de leiloeiro.
'
— Duas e doze lhe dou,
(Diz um matuto roceiro)
P'ra mode o Chico Pitomba,
Não comer bolos primeiro.
« Duas e doze Valeu »
! !
E no correr do leilão.
Com pilérias semelhantes.
Se ouvem muitas risadas
Dos alegres circumstantes.
Nem se faz ostentação,
Nem desfeitas iumiilhantes.
'( Cinco patacas e quatro
« Pelo arco !... E' do senhor;
(( O ramo na mão' lhe meto,
« Sem pena, pesar nem dor;
« A'fora a penca maior.
« Que é do velho gritador.
E este, sapatiando
No compaeo do baião,
Atira, com perfeição,
A castanhola estalando.
E a moça preferida
Se mostra desentendida.
Se conservando sentada
Mas o rapaz, persistindo,
Outro tiro disferindo.
Faz ella vir acanhada.
— Senhoras me dê licença,
Licença me queirão dar,
Licença para eu dizer,
Licença p'ra eu lovar.
— Licença para lovar
Debaixo do mancidáo :
52 A Ltjra Sertaneja
— Estando na cusinlia,
lá
Mode coisa qne já vem,
Trazendo a branca p'ra nós
Tomarmos qnati*o i^^iiitem.))
Eajuiza apparece ^
Com a garrafa snrtida;
E da coité de medida^
De cujuba, não s'esqnece.
E ambos os cantadores,
Em paga dos seus louvores,
Recebem a brazi leira :
A Lyra Sertaneja 53
— Mas eu já teconsidero
Como trahira na lama,
Como eaitatú tia toca.
Como doente na cama.
Antes qu'o dia amanheça,
Juro, que perdes a fama.
E assim continuando
No desafio travado,
E no baião pontiado,
A noite vae se passando.
Corre muito diligente
A juiza, assas contente.
õ6 A LyjYc Sertaneja
(á na cidade, |)orém.
Só os grandes passão bem
Kntre as ^"alas do salão.
A patativa canora,
Dos ramos da pitombeira^
Trinando, voa ligeira
Ao encontro da aurora;
E nos ocos do páo-rouxo
S'occulta nocturno niôxo,
—
Que ciiamanios curujão—
Em fim, quando a natureza
Ostenta maior belleza.
Que só se vè no sertão.
Naquella liora o café,
Com rapadura adoçado,
E' por todos esperado
Na tijella, ou na coité.
Na peneira de taboca
Os bijús de tapioca,
E macacheiras gostosas,
S em ceri m onia s oft' rece
'
Destinados ao jantar;
Alli s'atea a fogueira
A mercê da cusinlieira,
Que não pode descançar.
Já fermentado, e cheiroso,
Grande pote, mais alem,
No frio bojo contem
Fresco alua saboroso.
E entretanto a foneão,
Subindo d'animacão,
Pela moral presidida,
Entre o delirio da dança,
Que sobrevem a festança,
Toma mais vulto, mais vida.
Na corrente execução
Dos instrumentos tocados,
Inda nos bancos, sentados,
(3s violeiros estão.
E se vê, sob a latada,
A poeira levantada
Pelos pés dos dançadores;
Mais aferrados, jocosos,
Se disputão, calorosos.
Ainda os dois cantadores :
—
Onde pico urubu come
Sou raio, fogo, curisco
Onde não tem San Jir orne.
— Tu és a cascavel veia
Eu sou a ea§eat3elinha
60 A Lyra Sertaneja
62 A Lyra Sertaneja
« Já mastiguei um leitão,
<( Mas gallinha não comi ».
No remate de eleição.
Que, no banquete da praça,
O interesse desfarça.
Com a mais vil adulação.
A saúde da comadre,
E de toda sua gente,
64 A Lyrx Sertaneja
A Lyra Se/Hcuieja 65
E então, se despedindo
Dos juizes da fonção,
Com pesar no coração.
Agrupados vão saindo.
Lança dos olhos faceiros
Os olhares feiticeiros.
De saudade trespassada,
A moreninha formosa,
Pela sorte caprichosa
Do amante separada.
A Lyra Sertaneja,
66 A Lyra Sertaneja
Lá na mãtta verdejante, t
Por onde cruza a estradai,-
Se ouve ainda a toada '<
« —
Adeus, adeus vou m 'embora!
« —
Adeus, adeus vou m'embora»
(5XXD
í?r**-/ ' 'p'^^^ «*( -i -'^ ^^Víí-í-T ,
Qanto do ^eòtc^tzado
68 A Ltjra Sertcuieja
E do queixoso carpido
Da queixosa jurity.
Tenho saudades, também,
Do vigilante quem-quem.
Da «mãe-da-lua», chamada.
A Lyra Sertaneja 69
E da tiinida raposa
Da «Chapada-das-Mangueiras»,
E dos velozes caititús
Das mattas das «CabeceiraS'>,
E do macaco ladrão
Das roças do «Batalhão».
(2X0
SlecozdaçBc^ de^ ^y\aa&m
A Lyra Sertaneja 71
Massudo da montaria,
E do calor que fazia,
Tendo dado ineio-dia.
Fui descançar nos '(Moe-ós,»,
Porém, desviei-me
leitor,
Do assumpto narraçãoe
Peço desculpa. Perdoas'^
Não foi por gosto— perdão
Foi não sei o que senti,
Que fez-me abusar de ti.
A Ljjra Seríarieja
E chegando no terreiro
Da chupana, fui parando.
Segundo a praxe da roça :
— O' da casa —
fui gritando-
!
« Ou de fora... Cas-tou-eu »
A fobiistez osciilpida,
Em (Jiija fronío so lia
inteira j[)az, doce vida!
E a cabeea coçando,
Elle assim foi me (aliando
A Ljjra Sertaneja 75
Recostado na forquilha,
Qu'a cumieira sustinha
Da cabana no terreiro,
Enfiando um dedo index
Na correia d'alpargata.
Assim fallou-me o roceiro :
Em que assados me vi
Nas unhas do tal roceiro !
—
Tire o chápéo vá passando
Freche de ponta n'um morro.
Que fica alli, s' avistando,
Até bater co'o nariz
Bem na frada da raiz.
A Lyra Serxaneja 77
(rAdiente um liocadinho, .
A Lyra Sertaneja 79
rr Vá furando, vá fiircUido,
(( Qiuiiido subir lui ('iiapad^i,
(T Bcni !io meio do caminho,
ff Vancè repare a ossada
ff (Fallando coni |)oueí) eiisiiio)
(T Da brivana da cinihada,
ff Que morreu escambiehada,
ff Nas per ir IS do sen Rufino.
(( mão direita
Alii (|nebi'e a
ff N'uma varèda a}>ag'ada,
(( S'empurre por elía a arriba
(( Aíé cair na estrada,
ff 'Que é a cuja qu'o patrão
(( Deixou pa'a cã da [)icada.
ff Caindo n'esíe estradão,
(( Nem que queira se perder...
(( Só a resa de cigana
(( Poderá isto fazer.
(( Feixe os oios, vá descendo
(( Como quem (pier-querendo,
nã(j
(( Escutando os baco-bacos;
(( Quando o sol for se mettendo,
(( Vance vae, também batendo
ff Com a testa nos « Boracos. »
Estranhando o sertanejo,
E sua boa intenção,
Ficaria encalistrado,
Co 'o pobre homem zangado,
(5XXS)
mma noitC' de íuaz
Escolliendo a posição,
Que melhor me pareceu
Contra o vento do nascente,
Em alto pâo subi, logo,
E atei nos galhos fortes
A rede, mui firmemente.
E depois, verificando
S'a rede estava firmada
Com inteira segurança,
N'ella sentei-me de frente -
A Lyra Sertaneja 83
Vi o quadro primoroso,
Que o crepusc'lo produzia
Lá entre os ramos metido,
Moribundo, amortecid(j,
S'occultava o rei do dia.
Entretanto, no levante,
Entre a matta verdejante.
No espesso pahiíeiral.
Da noite o astro se via.
Que pouco, e pouco sul)ia
No espaço sideral.
Já tendo o caximbo acceso,
E meu espirito preso
Em vaga meditação.
Esquecido d'onde estava,
Não via o que se passava
Bem perto de mim, então.
A Lyra Sertaneja 85
J
A Lyra Sertaneja. 12 -i
90 A Lrjra Sertaneja
Vf:?<~^,
>'?í9-'^\ -" Ji^«"-~^»-
94 A Lyra Sertaneja
VI um combate horroroso!
D 'um inimigo poderoso,
Valente, ágil, forçoso.
Mas sem poder se firmar,
Contra m tos, valorosos,
i i i
Reum*dos, nunierosos,
— Os queixadas rancorosos—
Que teníavão se vingar.
Faiscas phosphorescentes
Se desprendião, luzentes.
Pelo atrito dos dentes
T3a multidão de queixadas.
Que, se pouco recuavão,
De novo s'arremessavão,
E de furor redobra vão,
Rasgando o tigre a dentadas.
Este,porém, corajoso.
Imponente, magestoso,
Resoluto, caprichoso,
A grosso tronco apoiado,
ítg^Siív
A Lyra Sertaneja 95
E estes, se reunindo,
Julgaram o combate tindo;
Somente, agora, s'ouyindo
Os bacorinhos gritarem,
Qu 'extraviados do bando,
ião correndo, saltando.
Entre as moitas, doudejando.
Até as mães encontrarem.
1^ quando a
lua escondeu-se
ÍMitre a matta verdejante.
Grata aurora, em rumo opposto,
Appareceu radiante
K o jacii, gargalhando,
Batia as azas voando ;
&^
A Lyra Sertaneja.
&ytc munco í imi -ceí>o{c
Os homens, amoiadores,
Trabalhão de coíeleíro.
Principiando do alto,
Do Chefe d 'esta Nação,
Vè-se o mestre director
Nas artes d 'amolação.
Contra-mestres no officio,
Ministros, seus delegados.
Que amolão todo mundo,
Mas também são amolados.
A Ltjra Sertaneja 99
Os juizes preguiçosos,
Nos dias de audiência.
Dos empregados e Partes,
Amolão a paciência.
O astuto advogado,
D'accoi"do co'o escrivão,
São perfeitos no officio,.
Ou arte d 'amolação.
Nas thesour árias publicas,
E^n'outras repartições,
Em cada banda s'encontra
Um rnasw d 'amolações.
Nas boticas, nos hotéis,
E no commercio em geral,
E' um freguez amolado
D 'uma maneira fatal.
Na tribuna o deputado
(A custa do seu dinheiro)
Com a lingua de ferrugem,
Amola o mundo inteiro.
K no púlpito sagrado
O vigário ignorante.
Com pragas e maldições
Nos amola a todo instante.
- /v-'-
As visitas repetidas,
Sem motivo imperioso.
São amolações tremendas,
D' um caracter perigoso.
Na véspera da eleição,
Proximamente passada.
Quando ia ser travada
Do interesse a ([uestão,
Ayjparece um figurão.
De mui alta jerarcliia,
Onde o pobre residia
Esquecido, humildemente,
E, o saudando contente,
Lhe diz:« Amigo, bom dia!
A Líjra Senaaeja 103
« A fò fa f r m a d cid e
(3 1 i
E r e q u n tad a ti n e sa
i
Tri>cados os cumpiMmentos,
Que mencionados,
flcão
Em bancos desmantellados,
Tomaram, ambos, assentos.
Pois nos pobres aposentos
Dos jurados-eleitores,
Cadeiras, aparadores,
\í mais outras trapalhadas
() futuro deputado,
Perspicaz, intelligente,
Comprehendeu, promptainente,
Qu'o momento era chegado.
A Lyra Sertaneja. _ 14
106 A Lijra Seríaaeja
E, cabalista aineslrado
A illudir, sem r)ie(lade,
Visou a sinipJicidade
Do homem com quem h'atava;
E tudo quanto notava
Dizia — necessidade —
S'a el(,)queiu'ia ií;1o í)oder
Este biuto (M)nven(:er,
O interesse luuro fazer
Votar em quem eu quizer.
Tem elie íillios, mulher
(Segundo estou informado),
E vive aqui enforcado
Na corda da precisão.
Pois é boa occasião
De ser, agora, «empregado».
E usando, incontinenti,
Do ardil, que preparou,
.\o pobre s'achegou,
Assiiii como o tigre faz :
/
í;^'-'> "-^^ - --?*;" -^-'^^^,'-r-;;*r"'
Infeliz, desprotegido, •
E batendo levemente,
No hombro de seu amigo,
Lhe disse Porém eu conto
: <(
Pois, do contraríM^4iâ(3^f«DiSSo^iHí)
Exigir do-iiiíeSidonftíí-nMi; ')n / "A
Favores ']f>'ra^um-amígò,'U mí-víoM
Que votou eortí'04itra geí^tejí ''^I i
— Mas
K
a comadve se zanga,
Seu doutor, e.cQm. rasão ; , ,
-.
De professor, se ([uizer,-
Alesnroiitro qualquer empi%!go,
Que melhor lhe convier.
Os s e ti s e xam
ad ores i i i
Serão^ especialmente
ICscoliiidos, ncuiieados
Pelo nosso presidente.
11 A Lyra Sertaneja
.\,....:,a.
í'
E sahio precipitado
O cabalista adestrado,
Limpando o rosto sulcado
Pelo suor que corria.
Deixando ver, claramente,
A satisfação ingente,
Que no semblante ridente,
De su^alma transluzia.
(( Apre ! (Diz elle) suei!
«Mas afinal o domei...
«O jumento encabrestei;
«Porém caro me custou I » -
E tirando d 'algibeira
A volumosa carteira.
Correndo a vista ligeira,
- Varias notas consultou.
A Lyra Sertaneja, 15
114 A Lyra Sertaneja
« Urge o tempo ! corre, passa
(Diz o futuro comparsa)
(( Perdel-a! Oh! que desgraça
« Para mim nesta eleição...
« Inda me falta dar palhas
« A muitos d 'estes canalhas,
« Eleitores das fornalhas
« Do Saraiva— Cidadão — .
K o relógio revendo,
—
Sempre canalhas dizendo, —
Pelas calçadas Ijatendo
Com os saltos das botinas.
Sempre, sempi'e nnn^nnirando,
Novos planos formulando.
Mais o passo 'celerando
Das ruas dobrava as quinas.
o voto promettido
1^]
E depois, acrescentando,
Com certo tom d 'amargura :
« Além da descompostura...
SXKS)
(n'um sekão e>e farinhada)
Na casa do Zé da Matta
Tinha grossa í'ai'inhada ;
Na tacanica do rancho
Sibilla a roda cortante,
Sobr'os eixos discorrendo,
Entre os pulsos vigorosos
De dois roceiros robustos,
Na matraca rebatendo.
r A Lyra Sertaneja 121
No banco do cevador,
Orgulhosa do trabalho,
Naturalmente escanchada,
Uma matuta gorducha
Applica no cai tatu
Grossa mandioca raspada.
A cevadeira reclama
Outro cófo de mandioca,
Que nas pernas agasalha.
Tendo, antes, o cuidado
De arranjar sobr'as coxas
As dobras d'uma toalha.
Entretanto, os puchadores.
Deixando, por um momento,
O férreo veio da mão,
Limpão bagas de suor,
Amarrando na cintura
A camisa d'algodão. •á
'%
A Lyra Sertaneja. 16
12"^ A Lyra Sertaneja
Grande tulha de raízes,
iNo centro do ranchosinho,
Se eleva á cuniieira.
Reforçada pelos cofos,
Que se despejão, cantando,
Conduzidos na carreira.
As moças, aproveitando
. O calor da discussão,
'
Baixo criticão das velhas, .
A mulher da urupêma.
Com as que espremem massa,
Reprehendem o forneiro.
Ralhando contra a fumaça.
E este, por contra-senha.
Se desculpa com a lenha.
A Lyra Sertaneja 12Ò
Os meninos, despresando
O veloz João-Gualamaío§,
Na «manchado mucambê»
S' escondem lá pelos matos,
Deixando cá no terreiro,
Qu#m ficon prisioneiro.
Prestemos noss'attencão
Ao gtupo, novamente,
Dos roceiros, na latada,
No serão da farinliada. »
E as vistas curiosas,
Pelo trilho s'estenderam;
E os caximhos das velhas
Dos queixos se desprenderam.
Ella, com
terna expressão,
N'um sorriso venturoso.
Com os lábios entreabertos
E tendo o peito ancioso,
Deixava os oliios cravados
No caminho tortuoso.
Effectivamente alli,
Transpondo o limpo terreiro,
Aproximou-se da roda
Um iijpo, andando ligeiro,
Que, pelo trajar singelo.
Se via qu 'era roceiro.
A Lyra Sertaneja 129
c< — Já
vou... esperem... já vou»,
Respondeu com cortezia,
Fitando os olhos, risonho.
Na seductora Maria,
E lhe fazendo um signal,
Que só ella o entendia.
E logo, seguidamente,
Tira a camisa, também,
Amarrando-a na cintin^a,
Sem licença de ninguém,
Deixando, no largo peito,
Se ver a força que tem.
« Um
seu criado, senhores !
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Então Manoel-Baixa-F'ria,
Sua camisa vestindo,
Tendo limpado o suor,
Disse baixinho, surrindo
— De meu
pae, mais da mamãe
Tirei licença de tarde
E a respeito da moça,
Vou lhe fallar a verdade ;
A Lyra Sertaneja 139
E eu um paspaião !
feito
Mesmo atiçando vocês
P'ra este tanto... « Perdão— :
E o mesmo reservava
Maria da Conceição.
A velha Fihcidade,
Com voz pausada, tremente.
Entrecortando as palavras
—
Com accênto o mais pungente;
(( E tu ingrata I tyranna !
Falia com
a bôcca tu queres : ?
x\nda depressa, desata. »
E a moça, lacrimosa,
Cravando os olhos no chão,
Balbuciou, soluçante,
Com humilde entonação :
A Lf/ra Sertaneja 143
Na primeira desobriga,
Que seu vigário Ji^è,
Este será teu marido,
E esta sua nniè.
(2>^<2)
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Cl \na tdita q uôviciccita
6í:a9elíi
Se ha inferno na vida.
Antes do homem morrer,
S' existe acerbo soffrer,
Antes da morte temida;
Se noss'ahna é constrangida
A merguhiar na caldeira
Fervente, na tal fogneira,
De que falia a tradição,
E*, com
toda a precisão,
A niakUía quebradeira.
E batata de babosa,
Sabendo quanto é (joslosa.
A nialdila quebradeira.
A Ltira Sertaneja. 19
1ÁC> A Lifra Sertaiieja
—
Té nos corta as relações
A nialdiia quebradeira. »
Se o tífpo é namorado,
E passa lá pela rua
Da bella menina sua,
De quem era apreciado.
Apenas sendo avistado,
Sae da janella, ligeira,
A formosa feiticeira,
Dizendo mui desdenhosa :
'» *» í^V '
E no ninho conjugal
A serpente penetrando,
Se desenrola, silvando,
Mordendo a paz do casal...
Pelo portão do quintal
Foge a lionra na carreira,
Quando, da porta fronteira.
Penetra no corredor
Um tal espectro d'horror
— A fiiaJdiía. quebradeira —
S'é homem ambicioso
De gosos materiaes,
Sente as angustias fataes
Do infiliz invejoso.
O prazer do venturoso
Irrita de tal maneira
Su 'ambição altaneira,
Que lhe gera mil torturas.
E' causadas amarguras
A mal dita quebradeira.
Ao contrario se elle tem :
Retirando-me saudoso,
De minha terra querida,
Rompendo os laços mais doces
{Se ha doçuras na vida),
Vou disíirir este canto
De saudosa despedida. A
Do «Chico-preto'- saudoso,
Qiu^. lá na moita cantava.
Na florida ribanceira
Da corrente, que passava;
D'aquenas notas sublimes,
Qu'aos micus suspiros juntava;
(5:\kS)
ao:> iavax-c^:> òo fteiItCÒ
,
Eis [\ Forca mais liorrivcl,
Qiic sataiiaz invcMií» «ii :
. Priis c íraramc-iarpadõ,
()ii(lc,í udas s"ciirorcou.
Q^xS)
.tsSs^-
(31 inazacm dó Slio ^Z-cq/vo
«o VAQUEIRO DO PIATHY
Mez da mutuca—Maio— quando aparece a raosca
aseiín denominada.
Sortes— Partilhas -Bizerros que cabem ao vaqueiro
como salário.
. Estradeiro — Velhaco, trapaceiro.
Vaqueirama — Corrup. do coilect. de vaqueiros.
Beradas — Por beiradas, cercanias.
A segunda é das ahnas, etc— Dia aziago.
—
Infucas Tentativas de importância.
Rêgo aberto— Muito gordo.
Sungavfi —Montava.
Arrenegar—Reprovar, com despreso.
Garupas de capoeiro —
Correias compridas de couro
do viado d'este nome.
Bacalháo Chicote.—
Liforme Uniforme,
Em folha Não servido.
Folias^Brinquedos, escaramuças com o gado.
Riscar —
Pairar o cavallo. de súbito.
Obrigação - -Familia.
Vamicê, vancê, suncê —
Corrup. e abv. do tratamento
— vossa mercê.
Bastião —
.\brv. de Sebastião.
Seu -Abrv. de senhor.
. •
Zé —
Abrv. de José.
—
Reimundo Corrup. de Raimundo.
Cularo —
Corrup. de Claro.
II
Mutuqueiro---Co]lect. de mutucas.
Biscaiís, brivana. tijella-~Ea'oa. ~ ('
Varge— Várzea. fí:
.
—
Alvação Quasi branco, *
:,.
III
.; Droiui ~ Dormir.
De —
Ccibo-á-rabo De piiiieipio a fim.
—
Por qui Por aqui, " ;*.J
Com Deus amanheça- -Em })az. - Í^i
•
- '.
Marro;i---ToiTro. -f
Fumos -Fomos- -
,;|
Trincar— Tinir ^
Pr'a mode—Para que, para este fim, etc.
Fonção —
Função, lesta, batuques de viola.
—
Castanheta Castanhola, estallo com os dedos.
—
Lovar Louvar, lisong-ear, elog-iando.
—
Mode coisa Parece que... *
Branca— Cachaça.
Coité de medida— Pequeno vaso. em que so bebe
a cachaça. Feito da fructa «cujúba»
Brazileira-A mesma bebida.
Siá ousá--Abrev, do tratamento de Senhora.
Cuma— Corrupção do adv. Como.
Desafiar — Cantar ao desafio
Adevão De batalha, corajoso, etc.
Cão— Demónio.
Em redor — Em torno, em derredor.
Fachiar— Quebrar-se, fazendo achas. i
«RECORDAÇÒKS DK VIAGEM ^
,
|
Desapeia— Corrup. do verbo apear.
Filosustria— Physionomia.
Pavoaçâo— Lugar povoado.
—
Baruio Barulho. Os sertanejos despresào, em certos
vocábulos as terminações em In, e accrescenrão em
outros, como arelha. papagalhos, melhas, etc.
:
Canhota — Esquerda.
Sumitero — Por cemitério.
Dizidero - Desiderio.
Lotero — Eleuterio.
Quebradas d'uma g-rota -Ribanceira d'um riacho-
sinho, ou vertente.
No brando— Successivam ente, som vexame.
Banda que deserab(;sta--Lado esquerdo.
Abeia sanharó— Abelha, que, accommettendo aos
cavallos, os faz desembestar.
—
Não se areia Não se perturba.
Chão de caçuada — Muito ou grande terreno ; exten-
ção considerável.
Jatobasim— Dim. da arvore jatobá.
Quebrar a mão esquerda— Tornar esta direcção.
Escambichada — Desquadinhada.
Resa de cigana —Attribuem feiticeria a esta gente.
/ BacD-bacos -Tropel sonoro do cavallo.
,*
« SERÃO DE FARINHADA »
trj, .jj-.aMû
i^'íg^7tr-'^-^:
VII
—
Já dez bancos desmancharam Dez vezes ra:aram
as raízes, que comporta o espaço do cevadouro.
Mancha do mxiçambé Brinquedo da mancha, cir-
culo feito na areia.
Quiri— Cacete.
Rosca da venta— Na face, sem rebuço, francamente.
—
Veio Manivella.
—
Baixar a grimpa Moderar o enthusiasmo.
Abrenuncio— Amaldiçoar, cam horror.
Antão— Corrup. do adv. então.
Parieeiro -Parceiros.
Quebrar as unhas no caminlio— Tudo empenhar, não
olhor sacrificios.
—
Aparar Fazer parada, aposta.
Broca— Primeiro serviço do roçado.
Pucha-macaco, e quebra-mourão— Formas de tan-
ger a roda.
—
Entrar no brêdo Occultar-se no mato.
Amodes— Por parece. ,
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Vaqueiro do Piauhy
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Lyra Sei*taiieja
1.- .
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5/ EDIÇÃO
BIBLIOTECA CRIOLLA
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Nova Zici Eleitoral e respectivos formtãarios de aliata-
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