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Civil
Top!
Marco Evangelista
Manaus – 2015
Copyright 2015 © ArkiUltra
O conteúdo desta obra é de responsabilidade do autor,
Titular do direito autoral.
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Evangelista, Marco
PROCESSO CIVIL Top! – 1.a edição
Evangelista – Manaus: 2015
1. Direito processual 2. Direito processual civil – Brasil
I. Título
CDD-347
__________________________
Índice para catálogo sistemático:
1. Direito processual 347
2. Direito processual civil 347
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Sou grato aos
Coordenadores das faculdades onde ministro aula
Por me entregarem a incumbência da disciplina
Direito Processual Civil.
Foram meus primeiros motivadores a escrever esta obra, mesmo sem
saberem.
Fases do processo
Classicamente, o processo possui três fases: postulatória, instrutória e
decisória.
Ocorre que, ao contrário da semântica da palavra “fase”, elas, na prática,
coexistem; a todo tempo se postula, algumas questões incidentais são logo
decididas; e se instrui ao longo de todo o processo.
Na fase postulatória, o autor ajuíza a demanda. Termina com o
recebimento da manifestação do réu (ainda que silenciosa), comportando
todos os atos entre um e outro. É o que se chama, na doutrina, de “formação
do processo”. No procedimento comum, há uma subfase nessa fase: a
conciliatória.
O carreamento e a análise das provas estão na fase instrutória, igualmente
espalhada pelo processo. Inicia, teoricamente, logo após o recebimento da
resposta do réu. Comporta o saneamento, quando o juiz fixa os pontos
controvertidos, que são as questões a serem discutidas e provadas no
processo; então ocorre toda a colheita de provas, com todos os seus
momentos (a proposição, que depende do rito, já foi efetuada na petição
inicial e contestação, produção, apresentação e apreciação). Termina tal fase
quando nada mais existe a ser alegado, provado. Geralmente há ocorrência
de alegações finais (ou razões finais). Diz-se que o processo “está maduro
para sentença” (jargão horrível!) – Vai, então, concluso ao magistrado para
decisão.
A fase decisória igualmente se dá em todo o feito, podendo existir já
imediatamente após à propositura da demanda, no caso em que os
documentos acostados à inicial bastem à própria improcedência liminar.
Os recursos, como processos que igualmente são, também possuem essas
três fases, embora exista quem pensa que o momento recursal nada mais é
do que um desdobramento e um prolongamento da fase decisória.
Por esse motivo, penso que não se pode mais falar em “fase”, mas sim em
momentos postulatórios, instrutórios e decisórios.
Ação
Quando se reúnem os requisitos para que se faça necessária uma prestação
jurisdicional, temos o que se chama “direito de ação” ou, simplesmente
“ação”. No direito material, chamamos a isso de pretensão.
A ação é direcionada contra o Estado, em face de alguém. Assim, quem
ingressa a ação é chamado de autor; e aquele em face de quem se aciona o
Estado é chamado de réu.
É possível que haja direito de ação sem haver processo, como no caso em
que a vítima de um direito violado resolve não processar o autor do dano. E
é possível que haja processo sem ação, como no caso em que, em um
processo, não foram satisfeitos os elementos da ação.
Como eu sempre digo em sala: todos têm direito a um processo; daí terem
direito de ação, são outros quinhentos...
Várias são as teorias que tentam explicar o direito de ação. Em meu livro
“TGP turbinado!” estudamos sobre cada uma delas. No Brasil vige, ainda
que sob alguma controvérsia, a teoria eclética ou mista da ação, que
enuncia que para se atingir patamar jurídico de poder acionar o Estado,
precisam estar presentes os “elementos da ação”.
Elementos da ação
Ter “direito” de ação significa ter direito a uma resposta de mérito. Ou seja,
é o reconhecimento de que, em tese, a afirmada pretensão pode ser
apreciada pelo Judiciário.
Para que haja direito a uma resposta de mérito, precisam estar presentes os
elementos da ação.
Diz-se que há “carência de ação” se ao menos uma das condições da ação
não se fazem presentes (interesse ou legitimidade). Note que o termo é
bombasticamente impróprio! Pois quem tem carência sente falta que precisa
ser suprida; e, se não existe elemento para a ação, não há tal falta, a menos
que quem cunhou tal termo tivesse pensado que a pessoa ficaria sentindo
falta da ação que não pôde ter por falta de alguma de suas condições. Terá
sido isso?
São dois os elementos da ação: interesse e legitimidade.
Interesse – É representado pelo trinômio “adequação, utilidade e
necessidade do provimento jurisdicional reclamado “. A vontade do Estado
é de que a ida à máquina jurisdicional seja a ultima ratio do súdito. Assim,
há de se precisar, efetivamente, do Judiciário para lhe chamar. Ou porque o
Estado precisa chancelar uma situação jurídica (jurisdição voluntária); ou
para dirimir um conflito (jurisdição contenciosa) e se precisa manejar o
meio processual apto à obtenção da tutela requerida.
Legitimidade – Embora seja um item, ela se desdobra em três outros:
legitimidade ad causam, ad processum e jus postulandi –, Podemos afirmar,
então, que a “legitimidade” é a união das “três legitimidades”.
Legitimidade para a causa – Também chamada de legitimidade para ser
parte, ou legitimidade ad causam – É necessário que o ente que busca o
Judiciário possa ser titular de direitos e obrigações. Diferente do que se
aprende em direito civil, em que só pessoas podem ter direitos e obrigações,
existem entes que não são pessoas, mas que podem pleitear direitos e serem
cobrados. Tais institutos chamam-se “entes despersonalizados”, como o
condomínio, o espólio e, no caso do direito empresarial, as sociedades não
personificadas (sociedades em comum e em conta de participação).
Legitimidade para o processo – Também chamada de legitimidade
processual, ad processual ou ainda legitimidade para “ser parte”. Em tal
legitimidade, está a necessidade de ser AQUELE titular DAQUELE direito
invocado ou ser o ente que deva ser cobrado pela incumbência que lhe é
supostamente cabível. Aqui entra o conceito de legitimidade ativa (poder
pleitear determinado direito) e legitimidade passiva (ser o ente com a
incumbência de cumpri-lo).
Quando alguém postula em juízo diretamente um direito seu, dizemos que
há legitimidade ordinária. É a regra no direito brasileiro. Precisa haver
capacidade civil e, no caso dos entes despersonalizados, precisa haver
capacidade processual, ou seja, indicação em lei de quem represente o ente
em juízo. Situações existem em que a lei permite expressamente que
alguém pleiteie como autor em uma ação direito que cabe a outrem; é a
chamada “legitimidade extraordinária”. Determinados entes (como o
Ministério Público e Defensoria Pública) podem atuar em busca de direitos
de outrem. Nesta legitimidade extraordinária ocorre a substituição
processual; e o substituído não está “condenado” a ver tudo de longe; pode
partir para a briga também, integrando a lide como assistente litisconsorcial
do substituto (trataremos disso depois). Podemos afirmar então que há a
“substituição pura ou com adição”, já que nesta há a substituição e mais a
entrada do substituído.
Pressupostos processuais
Pressupostos (ou requisitos, como prefere a doutrina chamar) são elementos
para que um status seja alcançado. Como o nome indica, é aquilo que “está
colocado antes”. Bem! Poderíamos chamar de requisito, mas deixemos
como amplamente ensinado mesmo: pressuposto.
O esquema é simples: temos pressupostos de existência e de validade. Os
primeiros se subdividem em positivos ou negativos. Exemplificando,
podemos dizer que os pressupostos da caipirinha são cachaça, açúcar e
limão. Retirando-se algum desses elementos, deixa de haver caipirinha.
Pode até haver outra coisa, mas caipirinha não é! Assim são os pressupostos
de existência. Se houver cachaça, açúcar e limão, mas o limão estiver
estragado, continua existindo caipirinha, mas não agradará ao degustador,
ou seja, estará com um defeito, inválida. Tecnicamente, será uma
“caipirinha nula”; o limão estar bom é um pressuposto de validade.
Para existir processo, faz-se necessário petição inicial, juiz competente e
citação. Um processo inexistente deve assim ser declarado para que cessem
seus efeitos práticos. Para isso existe a Querela Nullitatis, ou Querela
Nullitatis Insanabilis, uma ação própria para esse fim.
Um processo é válido quando, existindo, está apto a gerar uma decisão
judicial. Para que um processo seja válido, precisa conter determinados
requisitos (pressupostos positivos); e não pode conter alguns institutos
(pressupostos negativos). Precisam estar presentes: Petição inicial válida –
a petição inicial precisa ter toda a regularidade formal que a lei exige, bem
como os requisitos materiais; Juiz imparcial – o juiz precisa estar efetiva,
jurídica e emocionalmente equidistante das partes; e Citação válida, se sua
falta trouxer prejuízo ao réu (Opa! Aqui temos algo importante a ser dito:
essa citação pode ocorrer até depois que houve a sentença, se tiver havido
improcedência liminar, como você lerá nesta obra) – deve haver prova de
que foi regularmente recebida, ainda que de forma ficta (recebimento para
efeitos jurídicos).
Não podem estar presentes (daí são chamados de pressupostos negativos):
Litispendência – que é a ocorrência em que uma mesma causa tramita,
simultaneamente, em processos distintos; incluo aqui a arbitragem, por esta
ter o condão de, sob alegação das partes, afastar a atuação judiciária quanto
ao mérito de seu objeto; Coisa julgada – só se pode discutir uma causa uma
única vez; Perempção – é a perda do direito de ação devido à desídia
(desleixo) do demandante; ou Arbitragem – que é um método de resolução
extrajudicial de conflitos.
Bem verdade é que outras classificações de pressupostos existem, como
intrínsecos, quando se referem àquele próprio processo, e extrínsecos,
quando se referem à relação de prejudicialidade entre o processo em que
ocorre e outro processo (litispendência, perempção e coisa julgada);
Classificação (não acabam!...) outra existe em que os pressupostos são
chamados de subjetivos, quando se referem ao juiz e às partes, e objetivos,
quando se referem ao processo.
Procedimento
É a prática dos atos do processo. Um processo é uma ideia abstrata,
intangível, imperceptível no mundo dos fatos. O que pode ser visto, ouvido,
presenciado é o procedimento. Ingressar a petição inicial, contestar, atuar
em audiência, sentenciar, penhorar, recorrer são procedimentos.
Um procedimento é classificável em comum ou especial.
O procedimento comum, como o nome diz, serve, de forma principal ou
subsidiária, a todas as causas; o especial contém peculiaridades necessárias
a determinados tipos de objetos levados à jurisdição.
Princípios processuais
Essa expressão, “Princípios Processuais”, se refere aos princípios
diretamente aplicáveis ao processo. Trata-se dos princípios da jurisdição e
do próprio processo.
Princípios são as bases fundamentais sobre as quais se erguem todos os
conceitos e as normas de um instituto. São as diretrizes básicas de algo.
Estabeleçamos aqui uma rápida diferença entre princípio e regra: a ideia do
que seja “justo” nasce da própria consciência. O simples fato da existência
da razão, o “sapiens”, já faz nascer a ideia de certo e de errado; e essa ideia
do justo, quando organizada e estruturada, nos traz a ideia de princípio; um
modo de se comportar para se atingir esse princípio chama-se regra. Assim:
O sentimento inato de que viver é bom, importante e valioso para o outro
tanto quanto o é para você é um instituto justo; admitir, portanto, que todos
têm direito à vida é um princípio; e obedecer ao mandamento de “não
matar” é seguir uma regra.
Quando dois ou mais princípios aparentarem incompatíveis para um caso
concreto, aplica-se um, mais de um e se pode mitigar ou, em último caso,
afastar outro de acordo como a situação requeira; diferentemente do
conflito de regras, em que uma regra afasta logo a outra quando com ela
colide, em determinado caso.
Alguns dos princípios estão no texto do Código. O problema de o CPC sair
positivando princípios processuais é que o STF pode aplicar seu
entendimento de que não cabe Recurso Extraordinário contra ofensa reflexa
à Constituição –deixa-se uma porta aberta à cláusula “Não perturbe”
daquele Tribunal, até que uma futura formação derrube a absenteísta
Súmula e entenda que qualquer ofensa à Constituição é ofensa
materialmente direta – isso abre portas a vários casos onde se precisará
ingressar simultaneamente com Recurso Especial e Extraordinário para uma
mesma ofensa.
Princípios da jurisdição
São os seguintes os princípios da jurisdição:
Substitutividade – O Estado emite vontade no lugar do litigante. Isso
posto, não importa se alguma parte quer ou não cumprir algum mandado,
alguma ordem, ou abster-se de fazer algo. Sua vontade “pertencerá” ao
Estado; e este usará a força ou qualquer outro meio que obrigue a parte a
cumprir o que deve.
Definitividade – Cada questão precisa ser resolvida de uma vez por todas.
O instituto da definitividade é obtido com a coisa julgada, tornando
imutável uma decisão. Com isso, estabiliza-se a resolução de um conflito.
Inafastabilidade – Também chamado de indeclinabilidade ou
inevitabilidade; presente no artigo 5.°, inciso XXXV, da Constituição,
enuncia que nada nem ninguém está imune ou acima do poder jurisdicional
do Estado. No máximo, por acordo, os Estados internacionais se
comprometem a julgar determinados cidadãos seus que atuem em outro
Estado, como é o caso da “imunidade diplomática”, que na verdade é uma
transferência, mas não, como o nome possa indicar, uma “imunidade” à
jurisdição.
Aderência – A jurisdição prende-se (adere) ao território, nele encontrando
seus limites. Referimo-nos aqui ao território nacional. Pode atuar
indiretamente em outros territórios, por cooperação internacional ou auxílio
direto, bem como agir indiretamente, pelo mesmo mecanismo, no interesse
de jurisdição de território alienígena.
Indelegabilidade – Não pode o juiz delegar sua jurisdição a outro órgão.
Ele – e somente ele, o juiz – deve colher provas em audiência, presidir
sessões e julgar.
Investidura – O julgador deverá ter ingressado nesta qualidade por meio da
via prescrita. É o caminho da investidura que faz que alguém alce à
condição de julgar seu semelhante. Normalmente é por concurso público de
provas e títulos, mas pode ser por nomeação direta, como nos canos de
ministros dos Tribunais Superiores (STF, STJ, TST, STM e TSE), após
sabatina ou sistema de listas.
Juiz natural – Quando o fato a ser julgado existir, já deve haver um juiz
para julgá-lo. É o registro ou a distribuição (será distribuído se houver mais
de uma vara ou mais de um juiz competente para a causa) da petição inicial
que fixará qual juiz julgará o feito. Se indicar ou escolher juiz após o fato, é
juízo ou tribunal de exceção, vedado no direito brasileiro.
Indeclinabilidade – A parte tem que aceitar o juiz que o Estado lhe deu,
não cabendo a parte alguma escolher quem julgará seu processo; o máximo
permitido é arguir e provar impedimento ou suspeição do magistrado, o que
transferirá o feito para o seu substituto.
Publicidade – Os atos do processo são públicos. Isso inclui sua prática e
sua documentação. É a garantia de que interesses transversos iníquos não
existirão no processo; garantia do jurisdicionado. As exceções, como
veremos adiante, são indicadas em lei, e somente elas. Não sei atualmente,
mas, quando eu advogava, os magistrados de minha cidade não gostavam
de estranhos assistindo às audiências. Permitiam desde que lhes fosse
pedido – que os novos ares soprem naquelas mentes! O CNJ mitigou
(inconstitucionalmente, na minha opinião) esse princípio determinando que
se deva ter justo motivo para acessar autos em que não seja parte ou
advogado, instituindo senhas para os processos – mecanismo só existente há
pouco tempo nos feitos com segredo de justiça. Lá por 1998, até íamos aos
cartórios e pedíamos algum auto de processo de alguma ação específica,
para sabermos como era a petição. Quinze anos depois se podia fazer isso
virtualmente; agora não mais.
Motivação das decisões judiciais – O juiz é livre para decidir, mas é
prisioneiro da lógica e da razão, motivo pelo qual deve aplicar a lei e o
precedente jurisprudencial indicando por que aplica. E, ao afastar um
dispositivo legal ou precedente, deve motivar por que afasta. Sim! Dá
trabalho, mas quem não encarar a função jurisdicional que não se aventure
na função...
Inércia – A jurisdição só funciona quando e se provocada. Não pode sair
procurando o que ou quem processar, sob pena de já se iniciar um feito
imparcialmente, contra alguém. Daí afirmarmos que nemo judex sine
actore (não há juiz sem autor) e ne procedat judex ex officio (o juiz não
procederá de ofício). Iniciado um processo, o juiz pode atuar de ofício
(partindo de iniciativa própria) em várias situações, mas já houve a
provocação inicial – e esta faz que o processo se movimente já até sem
atuação das partes.
Disponibilidade – Ninguém é obrigado a processar ninguém; é a parte que
supostamente foi lesionada em seu direito que decide se haverá ou não uma
demanda. Aliás, não precisa sequer resolver o conflito e, em decidindo
resolver, terá outros meios que não o processo judicial para tal.
Princípio do duplo grau de jurisdição – É o direito de uma decisão ser
reanalisada. É direito da parte, embora a maioria da magistratura e dos
legisladores entenda que não é. Aprenda: de toda decisão cabe recurso; se
não tiver previsto em lei, usa-se Mandado de Segurança; e, se não houve
requisito para este... invente a peça! Já se criou desde “Pedido de
Reconsideração” até “Requerimento de Reanálise” – não importa o nome.
A jurisdição é uma; não possui graus; deveria ser “duplo grau de
julgamento” o nome do princípio. A brecha para discussão foi criada pelo
próprio constituinte de 1988 quando escreveu que é assegurado a todos o
devido processo legal, com os meios e os recursos inerentes a isso. Aqui
temos duas interpretações: querem alguns que sejam “inerentes” no sentido
de que “se houver previsão de recurso para determinada defesa, esse poderá
ser manejado”; ou, como entendo, a TODA defesa é inerente um recurso.
Princípios do processo
São os seguintes os princípios do processo, propriamente dito:
Princípio do devido processo legal – É um princípio que protege a
qualquer pessoa de não ser arbitrariamente considerada condenada sem que
haja um mínimo de atos e garantias até tal resultado. Qualquer modificação
externa à esfera jurídica de alguém precisa passar pelo crido do devido
processo legal (o due process of law) – Trata-se, em suma, de um
julgamento justo, imparcial, com contraditório e possibilidade de recurso.
Como podemos ver, vários outros princípios partem deste.
Princípio do constitucionalismo – Todo processo deve incorporar valores
explícita e implicitamente constantes da Constituição. Deve ser elaborado,
aplicado e interpretado conforme a Carta – na verdade, todas as normas
processuais devem ser subsidiárias às normas processuais constitucionais.
Vedação de decisão surpresa – Não se querem decisões mirabolantes, que
surjam da calada do inconsciente do juiz, o qual até pode trazer matérias de
ofício, mas precisa debater – ou ao menos pré-apresentar – a tese; sei bem
que virão várias decisões que fixarão outras que não precisarão de tal
comunicação prévia. Há quem diga que, no caso de matérias de ordem
pública ou teratológicas (monstruosas), não precisaria ser pré-exposta às
partes a posição do juiz. Esse sistema derruba um cânone antigo que
afirmava que o juiz jamais deveria se manifestar, nem mesmo às partes,
sobre seu posicionamento antes da sentença, sob pena de estar prejulgando.
Mesmo em questões “óbvias”, um bom motivo para que o juiz se manifeste
antecipadamente existe: permitir às partes que transacionem sobre se
dividirão os honorários e custas, caso a matéria tenha sido objeto de
“negociação processual”.
Embora o CPC nos diga “O juiz não pode decidir, em grau algum de
jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às
partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a
qual deva decidir de ofício.” Os magistrados reunidos na ENFAM (Escola
Nacional de Formação de Magistrados) emitiram o Enunciado 1, que nos
diz: “Entende-se por “fundamento” referido no art. 10 do CPC/2015 o
substrato fático que orienta o pedido, e não o enquadramento jurídico
atribuído pelas partes.” – Em outras palavras, entendem os Magistrados que
o dever de consulta é quanto aos fatos, não quanto ao direito envolvido. E o
Enunciado 3 da ENFAM restringe ainda mais o alcance desse dever de
consulta, ao informar que “É desnecessário ouvir as partes quando a
manifestação não puder influenciar na solução da causa.” - Igualmente não
deve consultar as partes quando decidir com base em documentos já
submetidos ao contraditório.
Autonomia da vontade das partes – As partes possuem alguma
autonomia. Podem fixar prazos, suspender processo e negociar ônus da
prova. O que negociarem, sob crivo do magistrado e com o acatamento
deste, vinculará a todos os envolvidos na negociação. Podem inclusive
suspender o próprio feito. O princípio da autonomia da vontade no processo
permite às partes flexibilizar as normas de andamento processual, sob
presidência e limitação do juiz. Assim, podem-se estabelecer prazos,
determinar datas de atos, determinar ônus da prova, suspender
incidentalmente o procedimento – penso que, por extensão interpretativa,
inclusive mudar modos e locais dos atos processuais, sob presidência do
magistrado; podem-se também homologar acordos sobre qualquer matéria
da lide, inclusive envolvendo terceiros, que voluntariamente queiram
ingressar neles.
São admissíveis os seguintes negócios processuais, segundo Enunciados do
FPPC (19, 21, 133, 135, 255,267, 257, 258, 262 e 411):
Pacto de impenhorabilidade;
ampliação de prazos das partes de qualquer natureza;
rateio de despesas processuais;
dispensa consensual de assistente técnico;
retirar o efeito suspensivo de recurso;
não promover execução provisória;
mediação ou conciliação extrajudicial prévia obrigatória,
inclusive com a correlata previsão de exclusão da audiência de
conciliação ou de mediação;
exclusão contratual da audiência de conciliação ou de
mediação;
disponibilização prévia de documentação (pacto de disclosure),
inclusive com estipulação de sanção negocial, sem prejuízo de
medidas coercitivas, mandamentais, sub-rogatórias ou
indutivas;
previsão de meios alternativos de comunicação das partes entre
si;
realização de sustentação oral, acordo para ampliação do tempo
de sustentação oral, julgamento antecipado do mérito
convencional;
convenção sobre prova;
redução de prazos processuais;
convenção processual coletiva;
ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, ainda que essa
convenção não importe ajustes às especificidades da causa.
Sujeitos do processo
O funcionamento da máquina judiciária ocorre graças às pessoas. Quem
realiza a justiça não é a estrutura; são os agentes. Os sujeitos do processo
propriamente dito (partes, Ministério Público, juiz) e os auxiliares da
justiça, que são os demais.
Tratemos sobre os indispensáveis:
Juiz
Como eu escrevi em minha obra “O Corpo e a Alma de Têmis –
Organização Judiciária”, juiz é o agente que desempenha, diretamente, a
função típica do Poder Judiciário.
O CPC usa o termo “juiz” para se referir, na verdade, a um dos tipos de
juízes, a saber, os magistrados, ou juízes togados – os que ingressam na
Magistratura mediante concurso específico de provas e títulos (exceto no
STF, terço do STJ e no “quinto constitucional”). O temo “juiz” empregado
aqui e no CPC é genérico, entendendo-se qualquer decisor do Judiciário
(juiz de direito, federal, do trabalho, desembargador, auditor militar ou
ministro).
O juiz exerce várias funções em sua atuação:
Partes
O conceito de “parte” é controverso na doutrina, e tal assunto, se estudado a
fundo, tenderá ao infinito. Minha preocupação é chegar a um conceito útil e
simples.
Antes de sabermos o que é parte, precisamos descartar um conceito antigo
e simplório que dizia que “parte é quem pede e aquele em face de quem se
pede” . Primeiramente, precisamos cortar o instituto. Existe parte em
sentido material e em sentido formal.
No sentido material, parte é qualquer pessoa (e somente pessoa!) sujeita
diretamente aos efeitos da sentença. Daí a necessidade de citação de todas
as partes. No sentido formal, parte é quem figura nos autos como tais
(autor e réu, requerente e requerido, recorrente e recorrido etc.).
Assim é possível que alguém seja parte em sentido formal, mas não o seja
em sentido material; é o caso da legitimidade extraordinária, em que
alguém pede em nome próprio (é parte formal) direito alheio (para a parte
material).
As partes têm o dever de não mentir, não modificar estado de coisas e
direitos após o início do processo. Devem cumprir fielmente a toda
determinação judicial, inclusive as decorrentes de tutela provisória. Não
podem fazer manobras para obter vantagem ilícita ou ingressar recursos
protelatórios. Enfim, precisam atuar com lealdade processual.
Dois são os danos que a parte por causar: litigância de má-fé e atentado à
dignidade da justiça.
Na litigância de má-fé, a parte é condenada em multa de até um por cento
sobre o valor da causa; se esta for ínfima ou de valor inestimável, valor até
dez salários-mínimos – e indenizar a parte contrária por todos os danos
causados, que serão liquidados por arbitramento, a saber, talvez seja
necessário novo procedimento para amealhar elementos para se saber o
valor de tais danos indenizáveis.
O dano mais grave é atentado à dignidade da justiça, que se dá quando se
manejam meios ilícitos, desleais ou se não forem cumpridas as decisões
judicias, ou caso se mude estado das coisas litigiosas durante o processo.
A multa por tal atentado é de até dez por cento sobre o valor da causa (vale
o que escrevi sobre causa de valor irrisório ou inestimável, o valor sobre um
a dez salários-mínimos); e será determinada a reversão de tudo o que foi
mudado durante o processo – os embaraços causados pela parte serão
“desembaraçados” tanto quanto se possa.
A multa é imposta à parte, não ao advogado. A este é cabível representação
à OAB; e, se for advogado público, à Corregedoria a que estiver
subordinado.
Procuradores
O exercício da advocacia, cabível ao advogado (“advogado” no sentido de
função, podendo o cargo para tal função ter nome diverso, como
“procurador”, “defensor” etc.), é função indispensável à justiça (artigo 133
da CF).
Ok! Estamos acostumados a ouvir isso, mas nunca paramos para,
simplesmente, ler a palavra: indispensável significa que a justiça não pode
funcionar sem ela mesma. Ou seja, a advocacia não apenas integra a
Organização Judiciária, como lhe é essencial.
Ocorre que a própria lei permite ao jurisdicionado atuar em juízo
diretamente, em alguns casos, sem necessitar de advogado. É o caso de
impetração de Habeas Corpus, atuação no primeiro grau da Justiça do
Trabalho e dos Juizados Especiais; nestes últimos, até determinado valor.
A Lei 8.906/94 institui como funções privativas de advogado postulação,
consultoria, assessoria e direção jurídica.
Encontramos no artigo sexto dessa Lei os direitos dos advogados, alguns
tolhidos pelo próprio Judiciário. Por onde advoguei vi muitas prerrogativas
do advogado serem violadas.
Os advogados podem atuar individualmente ou em sociedade; neste último
caso, a inscrição na OAB é que lhe dá a personalidade jurídica
(diferentemente das demais sociedades, que precisam, para ganharem
personalidade, serem inscritas no Cartório de Registro de Pessoas
Jurídicas).
As sanções impostas ao advogado são: censura, suspensão, multa e
exclusão.
Advocacia significa, no sentido simplório da palavra, defesa de interesses.
A advocacia pode ser pública e privada (ou particular), a depender de quem
a contrata. A advocacia pública é aquela remunerada pelos cofres públicos
– divide-se ainda em defesa de interesses públicos e privados.
A Advocacia Pública de Defesa de Interesses Públicos defende o Estado (na
condição de ente público, nas diversas esferas); são a Advocacia Geral da
União e as Procuradorias.
Como advogados públicos que defendem interesses privados, temos os
defensores – ainda que esses interesses privados pertençam a grupos.
Todo advogado se submete, em sua atuação e conduta, à regulamentação da
Ordem dos Advogados do Brasil – OAB.
Defensoria tem prazo em dobro, exceto se houver prazo específico para o
ato. Na advocacia pública, a intimação é pessoal. Bem... não muito, pois
pode ser eletrônica (é a própria “citação pessoal ficta”).
Advogado público só é responsável se agir com dolo ou fraude.
Bem, ser responsável somente por “dolo ou fraude” significa, tecnicamente,
que “pode errar”, ou, em outras palavras, se causar dano por negligência,
imperícia ou imprudência... Ok!
É difícil entrar na mente do legislador e descobrir se esse “dolo” é no
sentido de “ato intencional” ou no sentido de vício civil, ou seja, enganar
alguém. “Fraude”, aliás, é uma espécie de dolo, se entendermos tal como
“ato intencional” – em todo caso, é a pura dicção: “Se errar, tudo bem”; um
resquício da teoria da irresponsabilidade estatal, no melhor estilo “The king
can do no wrong”.
A Defensoria Pública está assumindo o caráter de defesa de interesses
metaindividuais – direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Uma função que até 1990 pertencia ao Ministério Público, depois, com o
artigo 82 do Código do Consumidor, instituindo a ACC (Ação Civil
Coletiva), se estendeu tal legitimidade para várias outras pessoas, incluindo
associações com pelo menos um ano de registro – mas, ao menos em meu
Estado, o Amazonas, a Defensoria tem-se dedicado cada vez mais aos
interesses metaindividuais.
Defensor pode pedir intimação pessoal da parte – isso é importante, pois,
como qualquer serviço público atual, infelizmente, não dispõe de agentes e
estrutura necessária à prestação do serviço que o cidadão merece. A culpa
não é dos defensores; fazem o que podem com o que têm, da forma que
conseguem, mas é uma questão de prioridade política mesmo.
Existe prazo em para a Defensoria, Escritórios Jurídicos de Faculdades de
Direito que atendam à população e Escritórios Conveniados com a
Defensoria – obviamente que prestem assistência jurídica. É uma decisão
inteligente, já que, de fato e na ótica do assistido, são seus “advogados
gratuitos”.
O prazo maior tem uma justificativa: o fato de terem uma demanda
realmente maior e, ao contrário da advocacia particular, não podem ter a
mesma liberdade de escolher – e recusar – causas, haja vista o fato de a
seleção ocorrer por critérios objetivos.
Advogado pode atuar sem procuração se operar em causa própria, se for
advogado público (já que a “procuração” estará na lei) ou em causas
urgentes e para evitar preclusão em desfavor de seu cliente. Neste último
caso, terá 15 dias para apresentar a procuração, sob pena de
responsabilidade pessoal por perdas e danos, despesas; e os atos que
praticou serão tidos como ineficazes.
Advogado que renuncia a uma causa fica ainda vinculado a esta por dez
dias, exceto se o instrumento de renúncia já vier acompanhado de
nomeação de novo causídico. Igualmente não haverá tal vinculação residual
de dez dias se houver outros advogados da mesma parte atuando.
Honorários de sucumbência
A parte que perde paga honorários ao advogado da parte adversária. São os
chamados honorários sucumbenciais. Esse CPC de 2015 foi uma mãe para
os advogados: quase tudo gera honorário de sucumbência; e ainda são
cumulativos e bi e tri-incidentes. São devidos na causa principal, na
reconvenção, na execução, no recurso e no cumprimento de sentença.
Os honorários de sucumbência são multifacetados: representam um ganho
do advogado, um elemento a ser considerado no “custo de demanda” e uma
verdadeira punição por via torta ao derrotado (um equivalente processual ao
“espólio de guerra” na história).
A regra geral é que serão fixados pelo juiz entre dez e vinte por cento.
Os honorários advocatícios têm um câncer escondido: em alguns
momentos, são decididos pelo magistrado. Ora, embora não haja hierarquia
entre membros do Ministério Público, magistrado e advogados (Peraí!
Pausa para rir um pouco... voltei!), é no mínimo uma gripe moral permitir
que surja da caneta do magistrado a determinação de quanto o advogado
receberá. Segundo o CPC, quanto ao grau de zelo, rapidez, localidade,
importância, trabalho, tempo e natureza da atuação, fixará os honorários.
Bem, se for para ser assim, acho que parte do ganho do magistrado deveria
ser determinada pelo advogado também – mazelas da lei.
O artigo 85 nos diz algo sobre a “Tabela Processual de Honorários” quando
a Fazenda Pública estiver em juízo, nela, quanto maior a base de cálculo
para os honorários, menor a alíquota.
A Fazenda Pública não é condenada a pagar honorários em cumprimento de
sentença não impugnada, na qual seja cabível expedição de precatório.
Se o valor da causa for ínfimo ou inestimável, o Código simplesmente é
omisso; talvez valha aqui o antigo CPC, onde os honorários seriam fixados
por arbitramento.
Advogados têm ação autônoma para reconhecimento, fixação e cobrança de
honorários.
Honorários sucumbenciais não se podem compensar, pois os sucumbentes
são as partes; e compensar honorários dos advogados seria compensar
dívidas de terceiros que não são os polos da relação obrigacional.
Honorários advocatícios têm natureza alimentar e (depois dizem que eu
acho que o Judiciário não gosta de advogados – lembram-se de quanto
tempo levou para reconhecerem isso?) como tal, verba alimentar, são
tratados na falência e na insolvência.
Se houver sucumbência mínima de uma das partes, a outra parte assumirá a
totalidade da sucumbência. Não podemos afirmar se “sucumbência”
mínima é questão percentual, pois 1% de uma causa milionária não é
“mínima”.
Em havendo mais de um litigante, a sucumbência será fixada pelo juiz
quanto à parte de cada um; na falta de tal fixação, será solidária – quanto
vocês apostam que, na prática, a regra será que serão sempre solidárias? Por
que o juiz teria tal trabalho se a lei já prevê a possibilidade da
solidariedade?
Ministério Público
O Ministério Público (MP) é fiscal da ordem jurídica ou parte; quando age
como substituto processual, é parte.
Até “ontem”, o MP era chamado “fiscal da lei”; bem, corroborando a nova
sistemática segundo a qual não mais a lei é a única fonte direta do direito,
ao menos de fato (porque, de direito, a jurisprudência só “comanda”,
porque a lei assim ordena).
O Ministério Público, que outrora era obrigatoriamente ouvido em qualquer
ação de família, se manifesta apenas quando houver interesse público,
social, litígios coletivos por posse de área (invasão ou, como ficou chique
falar: “ocupação irregular”).
Regra geral tem prazo em dobro para suas manifestações, exceto se a lei
ditar prazo específico e, assim como o juiz, não pode estar impedido ou
suspeito, precisando atuar com isenção na causa. Detalhe: ainda que atue
como parte, deverá ser “isento” no sentido de ser impessoal, mas
institucional.
Escrivão
O escrivão pratica, basicamente, quatro espécies de atos: documentação,
autenticação, movimentação e gestão. Determina a lei que “Em cada juízo
haverá um ou mais ofícios de justiça” – Como “Ofício de Justiça”,
entendamos vara ou secretaria.
O escrivão deve cumprir as determinações do juiz na exata ordem em que
as receber. Deve haver a lista de tal ordem, acessível a todos. Não tem o
escrivão opção de cumprir primeiro o mais rápido ou mais fácil; muito
menos cumprir primeiro os atos que favoreçam os “amigos do rei”. Bem,
quanto a essa última dicção, isso é óbvio, mas, quanto à primeira, cabe
interpretação. Penso que nada impede que haja uma fila para cada ato, até
para agilizar o trabalho. Por exemplo: uma fila só das publicações, uma só
das intimações, e assim por diante, embora o CPC não tenha separado dessa
forma, querendo dar a entender que é uma fila única. Precisamos entender
que aqui, diferentemente da ordem para sentença, o motivo é diferente; não
é apenas igualar em tratamento os jurisdicionados, mas também racionalizar
a própria operacionalização.
Sim! Assim como lá, há exceções. Urgências, sejam lá como elas se
manifestem. E preferências.
Em havendo alguma vítima de preterição, reclamará ao juiz, que ouvirá o
escrivão em dois dias, determinando a prática do ato, se verificada a
indolência ou a malícia. E já deflagrará o processo administrativo
disciplinar, conforme cada Lei de Organização Judiciária – sendo
geralmente instaurado na Corregedoria.
Ainda dentro dos atos de gestão, está em ser o guardião dos autos; é o
curador das pastinhas virtuais, dos volumes do autos físicos. Segundo a lei,
os autos só saem do cartório para carga de quem deva se manifestar ou
oficiar nos autos; ou quando haja modificação de competência.
Oficial de justiça
Tem a função de ser as mãos da justiça, no melhor estilo “É um trabalho
sujo, mas alguém tem que fazê-lo!” – Quem vai despejar a velhinha do
imóvel? Quem vai tirar o bebê do pai? Ele!
Prisões, penhoras, arrestos, sequestros, arrolamentos, intimações pessoais,
citações e tudo o que o juiz determinar nos autos que demandem efetivação
fática fica nas mãos do oficial para cumprimento. É documento com fé
pública de que o ato está eficaz e, para alguns atos, será o termo inicial para
o cumprimento da determinação pela parte. Lembro que, na quase
totalidade dos casos, para todos os atos que devam ser cumpridos
pessoalmente pela parte, o prazo se inicia da comunicação pelo oficial de
justiça.
Por regra, deve sempre agir sob presença de duas testemunhas em
diligências. De tudo o que praticar, deve lavrar auto detalhado. Tal
documento é sua garantia de resguardo, que agiu com legalidade.
Algo curioso: se durante alguma diligência, a parte alvejada pela diligência
ou a beneficiada pelo ato a ser cumprido quiser conciliar, deve o oficial
certificar isso, e o juiz pedirá manifestação da parte contrária sobre o
requerimento de autocomposição. Se houver aceitação, não é do acordo
ainda, mas sim da marcação da audiência de conciliação e de mediação – é
como entendemos.
Embora, na prática (quem pode o mais pode o menos), o que impede à parte
já deduzir proposta perante o oficial de justiça e a parte contrária já se
manifestar sobre ela no prazo de cinco dias? – A lei não deixa claro se
“proposta de autocomposição” é a vontade de tentar acordar ou já é a
própria proposta, a matéria, de acordo; a lei deixa claro que silenciar quanto
a proposta do outro é igual a “não”.
Perito
É o que efetua a prova técnica pericial. O perito não é de tão livre escolha
do juízo assim. Deve estar cadastrado, com uma regulamentação que,
enquanto escrevo esta obra, ainda não existe. A lei determina que os peritos
estejam habilitados, cadastrados, e sua inscrição precisa ser por alguma
seleção em que todos os habilitados tecnicamente possam ter oportunidade
de atuar. Se na localidade não houve cadastro de peritos, o juiz pode nomear
quem ele ache que seja passível de confiança e capacidade técnica.
Os órgãos, organizações e peritos habilitados devem disponibilizar uma
cota de atuação gratuita para suprir as atuações periciais das causas
gratuitas.
Vou traduzir: todos devem se sacrificar pelas causas gratuitas. O correto em
um país sério seria de que o Estado custeasse todas as perícias de justiça
gratuita para a parte, remunerando os peritos. Que seja assim quando passar
esta e mais duas gerações de otários que somos!
O perito, que deve atuar na maior extensão possível de sua capacidade,
passará periodicamente por avaliações; está sujeito às eras de impedimento
e de suspeição.
Se o perito errar ou for malicioso, atuando de forma incorreta, pode ficar
inabilitado de dois a cinco anos, além das sanções cíveis, criminais e o que
mais caiba; tudo após devido processo legal-administrativo, incluindo sua
aferição de culpa, de forma igualmente técnica.
Depositário e Administrador
O administrador, aqui, é “administrador judicial”, alguém que vai gerir algo
a mando do juiz. Por exemplo, o nomeado para atuação na falência, na
execução onde haja penhora de estabelecimento ou na recuperação
empresarial judicial.
O depositário é guardião de bens. Em caso de causa à perda da coisa
depositada, além da reparação do dano, perderá a remuneração que lhe seria
cabível. No caso de depositário servidor público, penso ser inconstitucional
a perda de remuneração por culpa do desempenho de sua atuação – sendo
cabível a perda da remuneração quando for designado especialmente para a
causa. E, no caso do administrador judicial na falência e na recuperação
judicial, já tem sanção própria para sua má atuação; penso, portanto, ser
incabível qualquer outra penalidade que não a da lei especial. Esse auxiliar
pode contratar prepostos e auxiliares para si. Está sujeito à multa por ato
atentatório à dignidade da justiça, assim como a parte.
Aqui uma observação é importante: não ligar esse depositário ao
“depositário” do Código Civil, aquele dos contratos. Lá, o depósito só
incide sobre bem móvel; já aqui pode envolver qualquer bem, nada
impedindo que um imóvel fique depositado judicialmente.
Tradutor e intérprete
Usa-se tradutor para verter escritos (dados de origem estática); e intérprete
para linguagem falada ou gestual (como linguagem gestual, temos a
LIBRAS – Linguagem Brasileira de Sinais. Cheguei a aprender um pouco
sobre ela em 2001); intérprete traduz a partir de uma fonte de dados
dinâmica.
Partidor
O que faz o partidor? Bem, ele realiza a partilha, dentre os bens de um
acervo (espólio, massa comum, haveres); ele fará tanto quanto possível que
os quinhões físicos se igualem aos quinhões determinados na decisão
judicial; em último caso, vendendo algum dos bens para perfazer a exatidão
dos quinhões ou, se for algo indivisível e em não havendo acordo,
vendendo o bem e dividindo o dinheiro.
Atos processuais
Qualquer conduta positiva idônea a gerar uma influência no processo é
chamada de “ato processual”. Pode estar ou não prevista em lei tanto na
forma quanto no conteúdo. Lembro que os advogados são seres
extremamente criativos; no que toca a defender os interesses de seus
clientes, são mais profícuos em teses e peças do que qualquer doutrinador
possa imaginar. Posso bem me lembrar daquela segunda metade dos anos
90 quando, eu, iniciando na advocacia, “ajudei”, junto com milhares de
tantos outros advogados, a criar algo até então inexistente e, pelos moldes
da processualística até então vigente, impensável: a “Exceção de Pré-
Executividade”. Toda revista jurídica que se prezasse tinha que exibir um
artigo sobre a revolucionária forma de “defesa de execução sem penhora” (é
que, na época, para se embargar uma execução se precisava a famigerada
“segurança do juízo” ou seja, penhora prévia). Não temos qualquer dúvida
de que novas criações surgirão, sob a égide do Novo CPC. Um ato deve
estar revestido da sua forma (alguma, mínima que seja), conteúdo e
oportunidade para gerar efeito.
Comunicação de atos
O processo por ele mesmo já é uma grande comunicação entre todos os
polos envolvidos; os sujeitos devem se intercomunicar o tempo inteiro.
Algumas dessas comunicações são facultativas e informais; outras,
obrigatórias.
Tais comunicações obrigatórias, uma vez atingindo a finalidade, são dadas
por perfeitas.
As comunicações são internas e externas. Chamamos de comunicações
internas aquelas usadas dentro do mecanismo de julgamento. São as cartas
de ordem, rogatória, precatória e arbitral. As externas são as emitidas do
mecanismo de julgamento para pessoas fora dessa estrutura. É a citação, a
intimação e a notificação.
Cartas
Carta rogatória – Refere-se à jurisdição internacional, podendo ser ativa
ou passiva, dependendo se a enviamos ou a recebemos, respectivamente.
Sujeita-se às soberanias envolvidas e às normas de cooperação
internacional. Pede-se, e aqui roga mesmo, a prática de ato processual em
outro Estado estrangeiro. Não gosto de usar a expressão “outro país”, pois
podemos estar falando de país, reino, império, Santa Sé, emirado ou
principado.
Carta de ordem – Refere-se à hierarquia de obediência; é usada sempre
que um órgão jurisdicional superior determina a prática de algum ato a
outro órgão a ele subordinado, administrativa ou juridicamente.
Carta precatória – Refere-se a juízos situados no país e com competências
territoriais diferentes, onde se requer a prática de ato processual; o juízo que
emite é o deprecante; o que recebe é o deprecado; deverá cumpri-la
podendo analisar as formalidades, mas sem dever adentrar o mérito, por ser
um ato do juízo deprecante.
Carta arbitral – Emitida por árbitro, para que, via cooperação judiciária, o
juiz determine o cumprimento de algum ato ou diligência requerida pelo
juízo arbitral. Segundo o Enunciado 417 da ENFAM, “São requisitos para o
cumprimento da carta arbitral: i) indicação do árbitro ou do tribunal arbitral
de origem e do órgão do Poder Judiciário de destino; ii) inteiro teor do
requerimento da parte, do pronunciamento do árbitro ou do Tribunal arbitral
e da procuração conferida ao representante da parte, se houver; iii)
especificação do ato processual que deverá ser praticado pelo juízo de
destino; iv) encerramento com a assinatura do árbitro ou do presidente do
tribunal arbitral conforme o caso.”
Todas as cartas, que podem ser lavradas e assinadas digitalmente, devem ter
a indicação dos juízos ativos e passivos, a localidade; têm caráter itinerante,
ou seja, caso mude a localidade de cumprimento do ato, não é preciso emitir
nova carta, pois a carta original se encontra apta a ser emitida para a nova
localidade. Devem conter ainda a petição que deu origem ao ato, o
despacho do juiz ou do árbitro que ordenou o ato, o mandato do advogado –
o detalhamento do ato que deva ser cumprido e a assinatura do juiz ou
árbitro.
A carta arbitral deve conter a convenção de arbitragem, a prova da função
de árbitro e a prova de sua nomeação a partir da vontade das partes, seja por
escolha direta, seja por designação da câmara arbitral.
Recebida a carta, o juiz deve fixar prazo. A depender da carta, esta poderá
já vir com o prazo assinalado, e as partes serão intimadas para, querendo,
acompanharem a diligência ou ato requerido.
Despesas para a prática do ato devem ser depositadas, no juízo originário,
pela parte a quem aproveite o ato, por quem o requereu. Se determinadas
pelo juiz ou MP, pelo autor.
Assim que a carta for cumprida, deve ser devolvida em dez dias. Pelo
caráter itinerante a que me referi, o juiz que se ache incompetente para o
cumprimento deve remetê-la a quem entender competente. O juízo passivo
pode recusar cumprimento por erro de forma, incompetência ou dúvida de
autenticidade.
Detalhemos um pouco mais sobre citação e intimação, por serem as
comunicações mais corriqueiras no processo:
Citação
Citação é a comunicação ao réu, executado ou interessado de que existe um
processo que abranja sua esfera jurídica, convidando-o a integrar esse
processo para dele participar.
Dispensa-se citação quando há indeferimento liminar da inicial ou
improcedência do pedido, se o autor não recorrer. Fora isso, processo sem
citação é nulo.
Cita-se de forma postal, pessoal e por edital.
A citação válida gera litispendência (faz que outra ação com partes, pedidos
e causa de pedir tenha seu seguimento posterior travado), torna litigiosa a
coisa, imobilizando-a, deixando ineficazes atos de disposição dessa coisa,
inclusive fazendo que quem a adquira possa perdê-la por efeito do processo
já em curso; e constitui o devedor em mora, ou seja, o devedor não pode
mais alegar que não sabia que devia, além de interromper a prescrição
(zerar a contagem desta) ou a decadência, se já não tinha sido interrompida
por outro motivo (dado que a interrupção só pode ocorrer uma vez). Não há
constituição em mora se a obrigação já tinha dia certo de vencimento ou se
era decorrente de ato ilícito, já que aqui a mora já começou desde a prática
do ilícito.
A citação gera seus efeitos ainda que ordenada por juízo incompetente.
Assim, este tem no mínimo o poder de gerar efeitos da citação por ele
ordenada e, claro, o de se declarar incompetente.
Quando o juiz ordenar que se promova a citação, esta deve ser promovida
em dez dias, sob pena de, quando houver a interrupção da prescrição, a data
de tal interrupção ser a data da citação, e não a da propositura da demanda
(o que, em algum raríssimo caso e em um azar supremo, pode fazer que um
réu já seja citado de uma obrigação prescrita).
A citação deve ser pessoal, onde quer que se encontre o citando. Preposto,
mandatário, gerente, empregado que receba correspondência, representante,
advogado, administrador nomeado, advogados públicos, porteiros de
condomínio são aptos a receberem citação, que será reputada válida. Militar
é citado onde servir, se não for conhecida sua residência ou se ele não for
encontrado, segundo a dicção da lei.
Situações existem em que se respeita a fragilidade momentânea do citando,
postergando-se o momento da citação, se isso puder ser feito sem causar
prejuízo pela urgência necessária que esta possua: é o caso de quem esteja
participando de culto religioso, dentro dos sete dias de luto pela morte de
cônjuge, ascendente, descendente, consanguíneo ou afim (leia-se
ascendente e descendente do cônjuge) e em linha colateral até segundo
grau, a saber, irmão; nos três primeiros dias após o casamento; ou no caso
de doente em estado grave.
A lei quis proteger a fragilidade física ou emocional, quis não estragar
algum momento feliz (como no caso do casamento), não atrapalhar a
multiplicação da espécie também, penso, ao proteger a lua de mel. Quanto
ao momento de culto religioso, tem feição de não se aproveitar quem
promove a citação de um momento de vulnerabilidade do citando. Se este
estiver em situação tal que não saiba o que está fazendo, não será citado. O
oficial de justiça certifica isso, a família faz prova da incapacidade do
citando ou tal prova é gerada por ordem do juiz, e nomeia-se curador para
aquele.
A citação eletrônica é a preferencial; exceto microempresa e empresa de
pequeno porte, todos os entes empresariais, bem como os entes públicos,
terão cadastro para comunicação eletrônica. A meu ver, e-mail basta, desde
que se possa obter comprovação de seu recebimento.
A citação pode ser presencial, quando a própria parte comparece em juízo e
qualquer oficial do cartório a cita.
Ações de estado são sempre com citação pessoal. Trata-se das ações que
versem sobre estado civil, como divórcio, anulação de casamento e
separação. Também têm citação pessoal as que tiverem como destinatário
pessoa incapaz, pessoa de direito público, quando não houver entrega de
correio no local do citado, quando for frustrada a citação postal, quando
alguma lei em especial assim o determinar ou simplesmente quando o autor
convencer o juiz de que essa é a forma mais adequada de citação.
Bem, na minha concepção, citação eletrônica é citação postal, e não
pessoal, embora o CPC trate a citação eletrônica ora como espécie
autônoma (“eletrônica” mesmo), ora como citação pessoal. Entranho!
A citação postal ou por oficial de justiça trará os dados das partes,
finalidade da citação, o que se exige ou faculta ao citando fazer (com o
prazo, inclusive), sanção pelo descumprimento, intimação para audiência de
conciliação e mediação com o serviço (hora, local etc.) desta. Se tiver sido
marcada, o mandado de citação irá com a contrafé, que é a cópia da petição
inicial. Já digo que, em se tratando de ação de família, não irá copia da
contrafé, pois o legislador entendeu que o conteúdo da petição, carregada de
ódio e menção a possíveis intimidades da vida a dois, possa acirrar o ânimo
e será prejudicial à ação de conciliação e mediação. Somente o advogado do
citando, se quiser, terá acesso à petição inicial.
Na citação por carta, esta será registrada e terá a assinatura de quem
receber.
Quando efetuada a citação por oficial de justiça, este deve ler o mandado ao
citando (Pasme! Ainda que este seja alfabetizado!).
Existe uma citação via oficial chamada “por hora certa”, que funciona
assim: se o oficial suspeitar que o citando está se escondendo para não ser
citado, depois de procurá-lo por duas vezes, deve intimar “qualquer pessoa
da família ou, em sua falta, qualquer vizinho” de que voltará em
determinada hora, no primeiro dia útil, para citar o dito escondido. O oficial
vai no dia e hora devidos, procura o citando e o cita; se não o encontrar,
simplesmente dará por efetuada a citação e pronto!, deixando a contrafé
com alguém ligado ao citando (a lei fala novamente em “pessoa da família
ou vizinho”) indicando o nome da pessoa que recebeu a contrafé. Se o
citando não foi encontrado, é nomeado para ele um curador especial. Não
terminou ainda! Em dez dias deverá ser enviada ao citando carta contando
sobre o ocorrido – Pronto! Finalmente temos uma citação “por hora certa”
válida.
Até por rádio ou qualquer outro meio de comunicação (Internet, TV,
murais) se pode divulgar citação, se o lugar for inacessível, tornando-se
difícil encontrar o citando.
Conversemos sobre a citação por edital.
Citação por edital é uma daquelas presunções do direito, ou seja, afirmações
sem certeza, mas que se tornam certeza; não é à toa que é chamada de
citação ficta.
O edital pode (penso que deve) ser publicado em jornal de grande
circulação. Entendamos “grande circulação” como jornal que esteja
acessível à aquisição em toda a localidade, não necessariamente com grande
tiragem. Deve ser publicada eletronicamente, na “plataforma de editais do
CNJ”, que, aliás, foi inaugurada em 2015. O prazo para atender ao edital é
de 20 a 60 dias (Sim! Bem mais longo do que a direta e pessoal!); ainda que
havendo mais de uma publicação, não é a cada publicação um prazo, mas
sim um apenas, contando da primeira publicação. Será nomeado curador
especial para o réu citado de forma ficta (por edital ou por hora certa) que
esteja revel, para incapaz sem representante e para réu preso revel. O
curador especial deve ser um defensor público, onde haja.
Edital é obrigatório em usucapião (pode haver interessados não conhecidos
no imóvel; aliás, os confinantes são citados pessoalmente), na “ação de
recuperação ou substituição de título ao portador” – aqui a questão é
delicada: “título ao portador” é um ato unilateral em que alguém se declara
devedor em um título de crédito (documento que contém um direito apto a
ser exigível por quem possui tal documento); e, se o credor foi desapossado
desse título, que não contém o nome do beneficiário (credor), qualquer um
que o tenha em poder pode exigir o pagamento do que constar no título.
Esse edital visa, ainda que de forma ficta, retirar o efeito da declaração de
dívida constante nesse título.
Usa-se edital também para citar desconhecidos ou que estejam em “LINS”
(lugar incerto e não sabido). Caso alguém, por comodidade ou má-fé,
declarar que alguém está em “LINS” sem fundamento, arcará com multa de
cinco salários-mínimos, paga ao citado.
Intimação
Afora citação, é a comunicação geral de um processo. É o aviso sobre atos e
fatos do processo, incluindo ordem para fazer ou deixar de fazer algo.
Pode ser por meio físico ou eletrônico (de preferência).
É dirigida à parte; em alguns casos, aos advogados apenas; e, quanto a
estes, nos próprios nomes e também para a sociedade de advogados à qual
pertençam, desde que regulamente inscritos na OAB.
As próprias partes, via advogados, podem intimar umas às outras,
comprovando nos autos o recebimento da intimação. Pelo princípio da
instrumentalidade das formas, provando-se que a parte tomou conhecimento
do conteúdo da citação, é o que basta. Uma interpretação da história do
CPC (que já é novo, mas a história muda segundo a segundo) me diz que
até intimação via Whatsapp levada à documentação via ata notarial é
plenamente viável e idônea.
Diz-nos a lei que, ainda que não comunicado de ato isoladamente, a retirada
de autos em carga presume ciência de tudo o que houver para ser
comunicado. Intimações devem ser seguidas de certidão nos autos em que
ocorreram.
Intimação não recebida, que gere prejuízo se tal ocorrência não foi por
culpa da parte, é nula, mas precisa ser alegada na primeira ciência dos
autos, ou quando na primeira oportunidade se manifestar nos autos, o que
vier primeiro, sendo daí gerado termo inicial da contagem de prazo (se esta
havia na intimação), se acolhida a alegação de nulidade.
Os atores do processo se comprometem a manter seus endereços
atualizados, pois se presume recebida qualquer intimação recebida nos
locais informados, quando postais. Embora em circunstâncias
especialíssimas, pode-se intimar por oficial de justiça sim (eu mesmo,
quando advogava, já recebi intimações via oficial); e por edital – isso, aliás,
é bem usual, via Diário Oficial e em jornal de circulação comum.
Preclusão
É a perda da faculdade da prática de um ato do processo. É deixar passar a
oportunidade “em branco” (ou ´in albis´ como se diz no jargão forense). Por
exemplo, várias matérias são alegáveis em preliminar de contestação (como
abusividade de cláusula de foro, por exemplo), sob pena de preclusão. O
processo é formado por uma série de momentos, janelas e oportunidades
para atuação de cada parte; diz-se preclusão quando não se aproveitam tais
oportunidades.
O artigo 507 do CPC é cristalino: “É vedado à parte discutir no curso do
processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão”.
Nulidade de atos, transcrições erradas em audiência, qualquer
irregularidade percebida, se não forem arguidas imediatamente ou na
primeira oportunidade em que a parte possa se manifestar nos autos
(lembram-se da “janela” a que me referi?), precluem.
Dentre os casos de preclusão explícitos no Código, estão: o silêncio sobre
incompetência territorial, sobre abusividade de cláusula de foro,
impugnação imediata de transcrição errada de atos de audiência (isso é
dificílimo; faz que o advogado cheque palavra por palavra que vai para o
termo), qualquer nulidade que não seja alegada na primeira oportunidade de
manifestação, impugnação de valor da causa, de suspeição.
Pode o advogado postular sem procuração, para evitar preclusão de direito
de seu cliente (tendo 15 dias para ingressar a procuração).
É importante lembrar, embora isso seja complicado na prática, que decisões
que não comportem agravo de instrumento não precluem até a sentença; e
tais decisões devem ser impugnadas na apelação. Eu prego que, assim que
ocorra a decisão contrária, o advogado registre seu “protesto”, como se faz
na Justiça do Trabalho, ainda que isso não esteja previsto no CPC, para que
ao menos se firme o termo inicial de anulação de outros atos daí
diretamente decorrentes, se for acolhida a matéria, na apelação.
Nulidades
Nulidade é defeito insanável, no direito material. Em processo, até nulidade
é sanada se não alegada em ação rescisória.
Como um ato defeituoso pode gerar decisões dele decorrentes (imagine
uma criança que mentiu a idade ser inquirida como única testemunha),
precisa logo ser atacado. É claro que não pode quem deu causa à nulidade
querer se beneficiar de seu resultado, pelo princípio geral do direito
segundo o qual “ninguém pode alegar a própria torpeza em benefício
próprio”.
Vige o pas de nullité sans grief (não há nulidade sem prejuízo). Como se
busca resultado, e não forma, e ainda assim a forma é um instrumento, e
não uma finalidade, “se atingiu o resultado, foi!”. Simples assim! Ainda que
a lei indique que se precise seguir forma para intimações e citações, leia-se
que, além de não seguir forma, o destinatário não foi citado ou intimado.
Mesmo que tenha havido nulidade, deve-se apontá-la na primeira
oportunidade de manifestação nos autos, embora tal oportunidade tenha
sido gerada por qualquer outro ato, sob pena de “silêncio para sempre”, ou
seja, preclusão.
Conquanto a lei enuncie que não precluem as nulidades que devam ser
pronunciadas de ofício pelo juiz, isso não cola muito na prática. Quando eu
advogava, uma nulidade crassa não tinha sido alegada por um advogado
que atuava em uma causa antes de mim. Era um dos casos em que o juiz
deveria reconhecer de ofício; eu a aleguei, claro, já a destempo; e o juiz
(bem, juíza) despachou: “Era de principal interesse da parte, logo ela
deveria ser a primeira a alegar, não esperando que este juízo o fizesse”.
Bem... Sou obrigado a concordar com a magistrada, pois é a parte a
primeira interessada em vigiar o feito.
O Ministério Público deve ser intimado a participar de processos em que
haja interesse público ou de incapaz. Se o feito tramitou sem sua intimação
e se foi desfavorável a tais interesses, será nulo, senão, apesar da falta da
intimação, o processo é válido – mas o MP deve se manifestar sobre ter ou
não havido prejuízo pela passagem in albis da intimação.
A declaração de nulidade de um ato retira os efeitos do próprio ato e dos
que foram praticados a partir e por causa dele; o próprio juiz deve indicar
na decisão (em que reconheceu a nulidade) quais atos morrem e quais são
bons; se não o fizer, cabe recurso de embargos declaratórios. Se repetem os
atos nulos que forem essenciais ao deslinde da causa, a menos que a decisão
da causa seja a favor daquele a quem o ato nulo aproveitaria, situação em
que não se repete a prática dos atos.
Preciso desmistificar esse “não causar prejuízo à parte” – Trata-se de
prejuízo jurídico, e não meramente processual. É claro que um ato praticado
de forma totalmente diversa da lei (o juiz considerou intimado sobre um ato
pelo fato de o advogado ter tido vista dos autos) e tendo sido arguido sua
nulidade por “A” gerará prejuízo a “A” se o juiz, em vez de decretar
nulidade, decidir que atingiu sua finalidade, visto que “A” estava, na
verdade, usando uma estratégia para anular o processo, ou causar algum
tumulto processual que o fizesse ganhar tempo. Assim, o verdadeiro
“prejuízo” para “A” foi o juiz ter declarado o ato bom. Resumindo: uma
parte de má-fé pode alegar nulidade como manobra, alegando que teve
prejuízo, para tentar fulminar determinadas decisões decorrentes. O juiz, ao
afirmar que “não houve prejuízo”, ainda que decidindo de forma correta,
estará causando “prejuízo” à parte, que esperava beneficiar-se da nulidade
do feito.
Gratuidade de justiça
A justiça é pública, mas é paga. E é cara... bem, é caríssima!
Eu poderia aqui começar a tecer palavras sobre a correção ou não de um
Poder já mantido pelo erário, que ainda cobra para prestar sua função, mas
vou deixar isso para meus posts no EvangeBlog. Essa remuneração se
mostra por meio de custas, taxas, emolumentos. São adiantados por quem o
ato aproveite ou seja requisitado. Em não poucas vezes eu dizia a clientes
que corria o risco de gastar dinheiro bom em cima de dinheiro ruim e
duvidoso. Pois já existe a incerteza de não ganhar; ainda se pode “ganhar, e
não levar”.
A regra é simples: o perdedor paga tudo. Quando digo “tudo”, são as custas,
honorários de sucumbência do advogado adversário e despesas (perito,
assistente técnico, deslocamento de testemunha e quaisquer outras
diretamente ligadas à causa).
Mas como, em tese, só saberemos quem será o perdedor no fim, essas
custas precisam ser pagas durante o processo; chamamos “adiantadas”.
Durante o processo o autor tem maior gasto. Vai adiantar as custas do
processo (seus próprios atos), os atos requeridos e requisitados pelo MP
(quando atuar como fiscal da ordem jurídica, novo nome para “fiscal da
lei”, ou seja, quando não for parte), bem como os atos determinados de
ofício pelo juiz.
O réu adiantará as despesas dos atos a que der causa e requisição.
Excepcionalmente (leia de novo: excepcionalmente!) existe a possibilidade
de promoção de gratuidade de justiça.
A parte que obtiver gratuidade de justiça terá a despesa acobertada pela
gratuidade assumida pelo Estado, pela União (se Justiça federal) ou pelo
Estado-membro, no caso da Justiça Estadual.
A gratuidade pode ser total ou parcial. A gratuidade parcial pode ser quanto
ao valor ou à forma; ou das duas concomitantes: pode-se pagar menos,
pagar em parcelas, ou menos e parcelado.
O bafejado pela gratuidade pode ser alcançado pelos próximos cinco anos
depois do trânsito em julgado, ocasião em que, ocorrendo mudança em sua
situação econômica, pode ser compelido para pagar aquilo de que foi então
dispensado.
Pode ser deferida a gratuidade à pessoa física ou jurídica. Para a pessoa
física se presume a necessidade se ela assim o afirmar; a pessoa jurídica
precisa provar sua hipossuficiência.
A gratuidade de justiça pode ser requerida a qualquer tempo; até no
ajuizamento do recurso; e será apreciada quando do juízo de prelibação. Se
não for acatada, é fixado prazo para o pagamento das custas; caso não
sejam pagas, o recurso não será recebido.
Duas verbas não são acobertadas pela gratuidade de justiça: as multas
processuais e honorários de sucumbência: se em até cinco anos o
beneficiário obtiver condições para efetuar o pagamento, será compelido a
tal. Tal pedido poderá ser alvo de impugnação na preliminar de contestação.
Diz o Enunciado 385 do FPPC que “Havendo risco de perecimento do
direito, o poder do juiz de exigir do autor a comprovação dos pressupostos
legais para a concessão da gratuidade não o desincumbe do dever de
apreciar, desde logo, o pedido liminar de tutela de urgência.” – Ou seja, não
pode o magistrado primeiro “checar se a gratuidade é devida ou não” para
só depois decidir sobre ela. Concede e, se for o caso, nega-se a gratuidade,
independentemente!
O Enunciado 14 da JFRN nos diz: “O juiz pode deferir a gratuidade
judiciária para a prática de determinado ato que implique excessiva
onerosidade para a parte, podendo inclusive facilitar o parcelamento das
despesas processuais”, e algo inusitado afirmam (Enunciado 10) que:
“Não implica a obrigatoriedade de o juízo disponibilizar contador
judicial para a feitura dos cálculos.” – É, isso mesmo: segundo eles, a
gratuidade não inclui isenção das custas do contador.
Provas
Se um processo não gerar um acordo, ou se não couber sequer tentativa de
acordo (caso o processo verse sobre direitos indisponíveis), se partirá para a
“instrução”. Instruir é apreciar provas.
Por meio de cotejo alegações-provas, chegar-se-á à verdade. Ao menos à
verdade processual, necessária ao deslinde da questão posta em juízo.
O processo, sendo meio dialético, é um encontro de teses. Cada tese possui
uma alegação e uma prova. A alegação é uma afirmação, declaração, sem
haver muito a ser explicado sobre isso. Ao conjunto de alegação e prova,
também chamamos de “ponto”. Um ponto é controvertido quando mais de
uma alegação, mutuamente excludente, com suas respectivas provas, incide
sobre ele.
Um ponto incontroverso é aquele deduzido por uma parte, mas não
refutado, ou confessado, pela outra.
Em sendo uma ação judicial (operacionalizada por meio do processo)
resultante de um conflito de interesses, visando resolvê-lo, jamais seria
possível seu correto julgamento caso não existissem elementos que
comprovassem as alegações das partes.
O juiz conhece o direito (e ainda assim só o da área em que judica, nas três
esferas), mas não conhece os fatos. Logo, cabe às partes demonstrar ao
magistrado a existência desses fatos.
Mesmo quando o julgamento é meramente de direito, ainda se faz presente
prova da existência do fato a invocar o direito pleiteado, se for de outro país
ou localidade diversa de onde o juiz atua.
No que toca à prova dos fatos, costumo ensinar em sala que só se prova
algo que ocorreu. Não se pode provar o que não existe. Isso é combatido
por alguns autores, usando como exemplo a certidão negativa, como prova
da inexistência de débito. Bem, uma certidão negativa não prova que
inexiste débito – só declara (alega) que não há registro quanto a eventual
débito.
A seara de prova é tão importante que, como também digo em sala, “uma
verdade sem provas é uma mentira; e uma mentira bem provada vira
verdade”.
Pelo princípio da comunhão das provas, a prova apresentada não pertence a
quem a produziu ou a apresentou, mas sim ao processo, e pode ser usada até
contra quem a apresentou.
Meios de prova
Os códigos de direito materiais trazem as provas admitidas (chamadas meio
de provas), e os códigos processuais elencam o instrumento de produção de
tais provas.
O Código Civil traz o seguinte rol de meios de provas: COnfissão,
DOcumento, TEstemunha, PREsunção e PErícia (em sala, usamos a forma
mnemônica “Codoteprepe”). O que encontramos no CPC é o caminho para
produção dessas provas.
A confissão, na jurisdição cível, é ainda chamada de “a rainha das provas”,
visto que lá vige a “verdade formal”. Pode ser expressa, tácita ou
presumida. A confissão “tácita” é, inclusive, um dos efeitos da revelia. É
uma declaração contrária ao interesse do confitente e favorável ao interesse
contrário; é bifronte, portanto. Pode ser espontânea ou provocada, declarada
diretamente ou por procurador com poderes especiais. Pode ser judicial ou
extrajudicial.
Nos mesmos casos nos quais se precisa outorga do cônjuge para atuar, a
saber, quando há imóvel de pessoas casadas em jogo, igualmente se precisa
da confissão do outro cônjuge.
Direitos indisponíveis, ou feitos por quem não possa suportar as
consequências da declaração, não geram efeitos.
É indivisível para se retirar declarações, até porque é irrevogável, mas é
divisível para se aduzir novos fatos aos já declarados.
Adequação precedental
Para que se possa usar um mesmo precedente para um caso, há de existir
uma subsunção do fato ao precedente. Precisa-se encontrar relação de
identidade entre historicidade, lugar, motivação (pertinência de causa e
efeito), mesmas pessoas envolvidas (igualdade técnica, econômica,
jurídica), mesmo objeto e mesma valoração desse objeto para as pessoas
envolvidas.
Se não houver tais identidades, aquele precedente não cabe àquele caso.
Ao interessado, e isso inclui o próprio juiz, cabe, caso entenda incabível
algum precedente a um caso concreto, invocar e indicar a distinção
(distinguish).
Uma vez que o direito, as pessoas, os valores e as impressões são
dinâmicos, pode ser que um determinado precedente não mais seja
adequado em um determinado momento, o que gerará o fenômeno da
superação (overruling).
Critérios de competência
Várias são as normas que fixam competência. A Constituição cria
competências dos Tribunais Superiores e das Justiças Especializadas
(trabalho, eleitoral e militar) e fixa algumas competências por prerrogativa
de foro (em razão da pessoa). Leis infraconstitucionais fixam competências
territoriais e quanto à matéria; e leis de organização judiciárias dos estados
criam competências quanto à matéria (da Justiça Comum Estadual) e
funcionais (qual vara julga o que, dentre várias para a mesma competência).
Competência em razão da pessoa leva em conta quem será julgado. Tais
prerrogativas de foro (esse é o nome de quem detém tais privilégios) só
podem ser julgadas em determinadas causas neste ou naquele juízo, nesta
ou naquela instância. A ideia é de que algumas pessoas gerariam
animosidades no local em que atuam e, por isso, precisariam ser julgadas
em uma instância superior para que, teoricamente, os julgadores estejam
com os ânimos limpos, imparciais.
Uma autoridade que tem prerrogativa de foro (esse é o nome de quem
detém tais privilégios) possui duas vantagens no julgamento. Uma é aquela
a que eu acabei de me referir: terá julgadores isentos, livres da área de
influência da referida autoridade; a outra vantagem eu conto depois.
Tem também uma desvantagem para o réu: menos recursos manejáveis, já
que o processo (no caso de prerrogativa de foro) começa em instância mais
alta do que aquelas destinadas ao mísero cidadão comum. Ah! A outra
vantagem para o réu? Essa é uma constatação estatística: quanto mais alto o
foro, mais impune fica o réu. Simples assim.
Competência e razão da matéria leva em conta o que está sendo discutido
no processo. Aqui importa o estudo sobre classificação das jurisdições do
capítulo próprio, pois, a cada tipo de jurisdição, corresponde uma
competência em razão da matéria: Comum, Trabalhista, Eleitoral e Militar.
As que não têm competência definida são julgadas na Justiça Comum
Estadual.
Competência em razão do lugar é autoexplicativa; é também chamada de
territorial ou ratione loci; são definidas em lei. Assim, é de dogma legal que
o foro nas ações de alimentos é o do domicílio do alimentando; o crime é
julgado no local da infração etc.
Competência funcional é a que se refere a qual vara julga o que; é uma
divisão “administrativa” dos órgãos julgadores dentro de uma mesma
instância de uma mesma Justiça (comum ou especializada). Assim, no caso
de Manaus, um processo cível da justiça comum estadual será sorteado para
uma das varas cíveis; e, caso haja um impedimento ou suspeição de um
juiz, será direcionado para o próximo juiz da mesma vara; e, em não
havendo outro juiz na mesma vara, será para o primeiro juiz da vara
posterior – isso é um exemplo de competência funcional. Tal competência
encontra-se em leis e regulamentos de cada fórum respectivo.
Competência em razão do valor está prevista principalmente nas
organizações judiciárias dos estados; assim, em São Paulo, causas cíveis
além de determinado valor será julgadas no Fórum Central da Capital, indo
para outros fóruns as demais; e assim por diante. A opção pelos Juizados
Especiais quando se trata de feitos de menor complexidade até quarenta
salários-mínimos pode ser enquadrada também como competência em razão
do valor.
A competência ainda se divide em absoluta ou relativa. A competência
absoluta ofende a ordem pública, o sistema jurídico, a segurança
jurisdicional – é rígida, pois, se for subvertida, pode abrir precedente para
que se julgue qualquer coisa em quer juízo, instalando-se o caos onde se
espera pacificação de conflitos. Ela não muda ou, tecnicamente, não se
prorroga. Detalhe: juiz absolutamente incompetente tem no mínimo o poder
de se dizer incompetente. São competências absolutas: em razão da matéria,
da pessoa e a funcional.
Essa competência absoluta não se prorroga, não se negocia; se o feito
tramitou sob incompetência absoluta é nula e pode ser atacada por
rescisória, pode ser reconhecida de ofício e pode ser alegada em qualquer
grau de jurisdição – bem, em qualquer grau que se possa alegar matéria de
fato e que se possa inovar em alegações; assim é o entendimento dos
cooptados pelas cláusulas “Não perturbe”, que enunciam que, em instâncias
extraordinárias, em que só se discutem teses de direito e não mais
elementos fáticos e documentais dos autos, não se poderia alegar mais
incompetência, nem absoluta. Bem, para mim, “qualquer grau” significa,
simplesmente, “qualquer grau”; acho que até meu cachorrinho entende isso.
Passado o tempo da rescisória, aquela ação, mesmo viciada pelo julgamento
por incompetente, será convalidada.
Na quase totalidade, a competência absoluta é a em razão da matéria,
pessoa, hierarquia, função; e a determinada, em organização judiciária
quanto à distribuição. Decorre também da Constituição e de leis federais e
estaduais.
A competência relativa é prorrogável. São competências relativas a
territorial e em razão do valor da causa. A competência relativa atende aos
interesses da parte. Em caso de distribuição para juiz relativamente
incompetente, a primeira parte interessada deve se manifestar na primeira
oportunidade, sob pena de preclusão (“Preclusão” é a perda da faculdade da
prática de algum ato motivada pelo decurso do tempo; lembre-se!). Assim,
juiz relativamente incompetente pode proferir decisões válidas; basta que
tenha tido a permissão tácita dos atores – não se manifestaram.
Desde que seguida a formalidade, as partes podem escolher a competência
do foro.
O juiz tem poder para tornar ineficaz tal acordo se entender que houve
abusividade, ou seja, se não houve total liberdade, indício de alguma
pressão etc., desde que escute as partes; deve o juiz ter a sensibilidade de
não sacrificar a parte mais fraca para que se faça valer a qualquer custo a
cláusula de foro. Ainda que o juiz não se manifeste sobre tal abusividade, o
réu, em contestação, pode alegar tal fato.
Momento de fixação da competência
A data do registro fixa a perpetuação da competência; se houver mais de
uma vara, a data da distribuição. A regra é simples: uma vez ajuizada uma
ação, sob determinada e correta competência, esta se perpetua; é o que
chamamos perpetuatio jurisditionis – só se muda a competência daí em
diante se for suprimido o órgão julgador (extingue-se determinada vara
especializada, por exemplo) ou se houver mudança em competência
absoluta.
Determinando-se a competência
Podemos seguir estas regras básicas:
Pesquisar se é caso de jurisdição ou de arbitragem. Se for caso de
jurisdição, perquire-se se a jurisdição brasileira é competente, seja de forma
exclusiva, seja de modo concorrente, pelo menos.
De acordo com a causa ou de acordo com o réu, precisa-se saber em qual
instância a causa iniciará seu julgamento.
Ciente da competência de cada uma das justiças, deve-se enquadrar na
cabível. Se for Justiça Especializada, deve-se direcionar, devidamente, para
a Justiça do Trabalho, Eleitoral ou Militar.
Em sendo causa de Justiça Comum, de acordo com o artigo 109 da CF,
deve-se enquadrar o caso na Justiça Federal; ou, não lhe sendo cabível,
direcioná-la para a Justiça Estadual.
De acordo com o local do fato a ser julgado, afere-se o juízo para o qual a
causa será direcionada. Foro significa comarca, região ou circunscrição.
Juízo significa vara, normalmente decidida por sorteio.
E algumas competências são diretamente ditadas ou sugeridas em lei, como
as que seguem:
Exceto competência exclusiva brasileira, foro de eleição
internacional é plenamente admitido.
Competência é do domicílio do idoso para as ações individuais
referentes a direitos previstos no Estatuto do Idoso.
O foro da sede do cartório é onde está prevista a ação de RC
contra o cartório.
No caso de espólio, a competência territorial é o do último
domicílio do de cujus, ou o lugar dos imóveis, se houver; igual
regra vale para o ausente.
O local do domicílio do incapaz é o competente para ações que
o envolvam.
Causas envolvendo posse são julgadas no local do imóvel.
Bem, eu acho isso óbvio, mas há quem pense que não, haja
vista que sequer se sabe “O que é posse”, pois até hoje existem
teorias e teorias que a tentam explicar; algumas delas
enquadrando tal instituto como direito pessoal, o que, de
acordo com essa teoria, faria o feito entrar na competência da
ação pessoal em geral.
Prorrogação da competência
Quando uma competência inicia regularmente em algum lugar e, já com o
processo ajuizado, muda por alguma causa jurídica, diz-se que houve uma
“prorrogação de competência”.
A incompetência relativa se modifica (prorroga) por continência, conexão,
negociação das partes, eleição de foro; o juiz não pode decretar de ofício; e
não pode ser alegada em rescisória.
Questão tormentosa na doutrina é descobrir quais são os casos de
prorrogação. A lei é insuficiente, e autores digladiam-se quanto à
determinação doutrinária dos casos.
Melhor é pensar assim: prorroga-se a competência sempre que possa haver
decisões contraditórias. Decisões em sentidos não necessariamente opostos,
mas diferentes para mesmas questões. Isso geraria insegurança jurídica. A
ideia é simples: unem-se processos para decisão única e coesa.
Unem-se processos também por questão de praticidade; não
necessariamente por possibilidade de decisões incongruentes.
Reunir-se-ão os processos semelhantes, portanto, para julgamento único.
A reunião de processos não ocorrerá se estiverem em instâncias diferentes.
Pode parecer óbvio, mas não é: já que a instância superior tem poder de
julgar mérito, por que não poderia avocar o feito lá de baixo?
Em havendo continência, a ação-conteúdo (menor) será extinta e absorvida
pela maior (continente), não importa se tenha sido ajuizada antes ou após.
Vigera a prevenção quanto à competência (“Prevenção”! Lembre-se: torna-
se competente quem primeiro conhece a causa).
Conexão, na dicção (infeliz) do CPC, se refere a ações conexas que têm
mesmo “pedido ou a causa de pedir” – é o caso do acidente de ônibus em
que cada passageiro requer reparação de danos perante a empresa “Troll”,
por esse mesmo acidente (mesma causa de pedir, portanto). Costumo dizer
que conexão é uma situação em que bem poderia haver um litisconsórcio,
mas as partes assim não o quiseram, então o juiz ajusta os processos por
questão jurídica (evitar decisões conflitantes) e prática (máximo de
resultado com mínimo esforço).
A continência é a ocorrência quando duas ações têm as mesmas partes e o
pedido de uma é mais amplo que a outra.
É o caso em que Charles ingressa ação de investigação de paternidade em
face de Joseph. E depois ingressa outra ação pleiteando e cumulando
investigação de paternidade com perdas e danos por abandono afetivo. Note
que, jugando a segunda ação, estará julgando a primeira por tabela.
Antes que o leitor me pergunte por que alguém ingressaria com essas duas
ações, já aviso que não sei; talvez por conveniência ou simples desatenção
inicial do advogado. A culpa é da redação infeliz do CPC.
Reiterando! Melhor na prática é, simplesmente, esquecer as minúcias de
conexão e continência e promover a reunião de processos pelos motivos já
ventilados.
“Conexão e continência” sempre são matérias chatas e de estudo antipático,
pois se fica no mundo dos conceitos e exemplos, acabando por gerar uma
“decoreba funcional”. Penso que o CPC resolveu esse problema ao
determinar a reunião por afinidade de questão de fato ou de direito; cobre
tudo; faça-se boa interpretação e uso disso e que se dane essa bomba de
“conexão e continência”!
Melhor do que ficar se prendendo a tecnicismo de conexão ou continência é
concentrar-se à ocorrência de “afinidade de ponto comum de fato ou de
direito entre causas”, ou “comunhão de direitos ou obrigações”. Simples
assim.
Superando-se tais conceitos, eis alguns casos de prorrogação que são
ditados em lei:
A União, quando participa de processo, leva este para a Justiça Federal. Se
ela for excluída, voltará o feito para a Justiça Estadual. É o juiz federal que
decide se há ou não interesse da União na demanda – dessa decisão cabe
agravo. O juiz estadual não pode suscitar o conflito negativo se lhe foi
enviado o feito pelo juiz federal, já que não cabe a ele decidir sobre
interesse da União. É plenamente possível cindir competências em uma
mesma ação. Depois de o juiz julgar o que for de sua competência, ele
envia o feito ao juízo competente para o restante.
Em contratos de adesão se pode reconhecer e alegar abusividade de cláusula
de abusividade de foro.
Declaração e arguição de incompetência
Um juiz pode se declarar incompetente de ofício (sem provocação de
quaisquer das partes). Reconhecimento de incompetência absoluta resulta
que os autos vão para o novo juiz; ele decide o que se preserva e não dos
atos já praticados.
Diz o Enunciado 4 da ENFAM que tal declaração de incompetência está
fora do dever de consulta do juiz.
Pode ocorrer de haver incompetência, e o juiz não a perceber ou, ainda que
a perceba, não a declare. Nesse caso, as partes poderão (ou deverão) argui-
la. Alegação de incompetência é por preliminar de contestação. Nos casos
em que o MP intervenha, pode arguir incompetência.
O juiz que recebe processo de outro e rejeita a causa deve suscitar conflito
de competência.
Conflito de competência
Existe a situação em que ocorre “conflito de competência”, podendo ser
positivo ou negativo. O conflito positivo de competência (raríssimo; nunca
vi isso enquanto advoguei por sete anos!) ocorre quando dois ou mais juízes
se dizem competentes para julgar determinada causa. O conflito negativo de
competência (na prática, quase só o único existente) se dá quando dois
juízes NÃO se aceitam competentes para julgar determinada causa; nessa
situação, a autoridade judicial superior decidirá quem julgará a lide.
Litisconsórcio
O litisconsórcio pode ser entendido pela sua etimologia: litis = lide; con =
encontro; sortium = sorte. Algo como “mesma sorte na lide”. Pessoas que
repartem o mesmo destino, mesmo resultado, em um processo.
Em havendo mais de um integrante em qualquer (ou nos dois) polos de uma
lide, teremos um litisconsórcio, e cada um dos integrantes de tal instituto
será chamado de litisconsorte.
Surge por três motivos: eficiência, comunhão de direitos ou porque a lei
manda.
Pode ser ativo passivo ou misto, dependentemente de em qual polo da lide
ele ocorre. Quanto ao momento, pode ser inicial ou ulterior. Quanto ao
efeito da decisão, pode ser simples ou unitário (uniforme); quanto à
obrigatoriedade, pode ser facultativo ou necessário.
É chamado de “necessário” quando houver uma mesma relação jurídica
indivisível – quando a eficácia da decisão depender da participação de
todos, ou simplesmente quando a lei assim o determinar, por política
legislativa mesmo.
Será “simples” quando puder haver decisão diferente para cada litisconsorte
(no caso do usucapião, a lei determina a citação dos vizinhos, mas não
necessariamente a decisão sequer os afetará; e, se o fizer, não será igual
para todos).
Haverá litisconsórcio se houver conexão (mesmo pedido OU mesma causa
de pedir); deve haver litisconsórcio em causas parecidas, para resumir.
Melhor é pensar que, se for para impedir decisões conflitantes, leve-se em
conta a “afinidade de questão de fato ou de direito” – facilita tudo! Ficar
perdido em tecnicismo de conexão ou continência, que só está no texto
porque tais institutos entraram na tradição didática, é querer complicar o
óbvio. Essa afinidade de questão de fato ou de direito é aferível pelas
partes, pelo magistrado, e é chamada de “conexão degradada”; nome
infeliz!
Em havendo muitas pessoas em um polo da lide, o juiz pode cindir a causa
em vários processos. Por conveniência de julgamento, de ofício. Ou a parte
pode pedir a cisão, alegando que haverá demais dificuldade para a defesa ou
embaraços para o próprio julgamento. Imagine o contraditório de uma ação
em que haja dezenas de réus; e a audiência então? Para esses casos, existe o
litisconsórcio multitudinário, em que o juiz cinde a causa em vários
processos com quantidade menor de ocupante dos polos. Se foi o réu que
pediu tal cisão, ser-lhe-á restituído o prazo, tendo ou não havido a cisão;
esse prazo é para que se possa separar e gerar novas iniciais, ou aditar a
inicial conforme o novo número de litisconsortes. Pode até haver multa por
dano processual (litigância de má-fé), mas que o prazo será restituído, isso
o será. Segundo o Enunciado 116 do FPPC, “Quando a formação do
litisconsórcio multitudinário for prejudicial à defesa, o juiz poderá substituir
a sua limitação pela ampliação de prazos, sem prejuízo da possibilidade de
desmembramento na fase de cumprimento de sentença.”
Vamos desmitificar essa palavra “necessário”: significa simplesmente
imposto por lei. Basta lembrar o “Domicílio Necessário” do Direito Civil
(lá no artigo 76 do CCB, que diz que o incapaz tem como domicílio o do
seu representante; o servidor, onde atua; o militar do exército, onde servir; o
da marinha e aeronáutica, na sede do comando; o marítimo, onde a
embarcação está matriculada; e o preso, onde cumpre pena. Lembrou?).
Basta pensar nas “causas necessárias de emancipação” (casamento,
emprego público efetivo, estabelecimento civil com economia própria e
colação de grau em curso superior).
Denunciação da lide
A denunciação da lide é cabível quando a lei permite a um réu, depois de
pagar um débito ou sofrer um prejuízo por devolução de coisa ao
verdadeiro dono, cobrá-lo de outrem (ação regressiva) ou requerer
indenização de quem o enganou.
É cabível quando exista possibilidade de regresso ou quando tenha havido
evicção.
Para garantir tal direito de regresso, deve o réu, no prazo que lhe caiba para
contestar, já denunciar a lide ao futuro ressarcidor para que a sentença que
eventualmente o condenar já sirva de título para cobrança de tal
ressarcimento.
Resumindo: a parte traz para a lide seu garantidor, que é aquele contra
quem poderá exercer direito de regresso, se perder o processo. Esse
denunciado terá a oportunidade aqui para exercer seu contraditório; se não
aceitar a denunciação, não terá essa oportunidade quando for réu na ação
própria, já que a teve aqui.
Não é obrigatória. O denunciante escolhe se atua agora ou se, caso perca a
demanda, ingressa com ação autônoma de regresso; há vantagens e
desvantagens, já que o que se ganha em economia processual aqui será
neutralizado pela demora natural decorrente de haver mais um no processo.
Para entendermos o primeiro caso de denunciação da lide, precisamos
entender o direito de regresso:
Um responsável pela reparação do dano nem sempre é quem o pratica. Há
casos em que o fato é praticado por alguém, mas é outra a pessoa chamada
a reparar, como o empregador que ressarce o dano causado por seu
empregado. Nessas situações, é dado ao responsabilizado o direito de
ressarcir-se do que desembolsou, junto ao autor do fato; é o que chamamos
de “Direito de regresso”, por meio da “ação regressiva”.
A ação de regresso ocorre, em regra, após o pagamento do dano pelo
responsável “inocente”.
Para que este possa desde o início do processo garantir e iniciar o regresso,
existe a denunciação da lide.
Agora, entendamos a evicção:
Ocorre a evicção sempre que algum comprador vier a perder a coisa para
outra pessoa, pelo fato de esta ter direito sobre a coisa anterior à
transferência. Assim, imagine que alguém vende o que não lhe pertence; e o
verdadeiro proprietário ajuíza ação de reintegração de posse, obtendo
medida liminar. O oficial de justiça, então, dando cumprimento à ordem,
toma-a do comprador de boa-fé, o qual a perde. Assim, a evicção tem três
sujeitos: o evicto, o evictor e o vendedor. Evicto é aquele que sofre a perda;
é o azarado (se foi cauteloso), ou “pato” mesmo, se foi descuidado, a
depender do caso. Evictor é quem toma o bem; é o diligente que conseguiu
retomar o seu bem na justiça; o evicto, que perde o bem, tem direito a
receber o preço que pagou, o reembolso de despesas, frutos que deve
devolver ao evictor, custas e honorários advocatícios, além das benfeitorias
necessárias ou úteis que tiver realizado. O alienante é o “malandro” que
vendeu coisa litigiosa (ou o que nem dele era!).
Se o evicto perder judicialmente a coisa, já no prazo de seu contraditório
denuncia a lide a quem lhe vendeu. Simples assim.
As regras iniciam nos dizendo que pode haver denunciação pelo réu (para
“não ficar sozinho na reta”) ou pelo autor (para ter mais uma pessoa de
quem tirar patrimônio quando vencer a demanda); pode existir uma
denunciação da lide sucessiva, ou seja, esse alienante ainda pode denunciar
a lide a quem também lhe vendeu ou quem deva indenizar quem indenize
(por exemplo: resseguro).
Se alguém for denunciado pelo autor, pode escolher entre consorciar com o
réu contra esse autor, ou com o autor contra o réu (podendo aditar a inicial,
inclusive).
Se foi denunciado pelo réu, pode assumir sozinho essa posição; se o réu for
revel, pode contestar junto com esse em litisconsórcio ou defender-se
sozinho se o réu confessar; ou ainda pode também confessar para que possa
exercer o regresso contra seu anterior.
Se o autor vencer, e o denunciado estava consorciado com o réu, a execução
será contra esses dois. Se o denunciante perder, aí que se julga a
denunciação; e, se esse denunciante ganhar, se for réu, não terá a
denunciação por ele formulada julgada, mas pagará ao denunciado as
despesas que este teve pelo infortúnio de ser incomodado para ingressar no
feito.
Chamamento ao processo
Ocorre quando um codevedor (devedor solidário, fiador em relação ao
afiançado, avalista em relação ao avalizado, e destes em relação aos
cofiadores e coavalistas) é instado a pagar judicialmente uma dívida. Então
pode tal réu chamar os outros devedores para arcarem, com ele, o ônus.
Assim, a sentença que o condenar a pagar tal débito já será
instantaneamente aplicável aos outros codevedores também, fazendo que a
execução recaia sobre todos (e não só sobre aquele primeiro devedor
somente); e já servirá para aquele que pagar tudo cobrar a quota-parte do(s)
outro(s).
Ou seja, para “não se ferrar sozinho” na execução e distribuir o ônus da
sucumbência e do próprio processo, o réu pode chamar outros codevedores
para a briga.
A intervenção é requerida no prazo de contestação e, em sendo concedida,
dará a quem chama 30 dias para promover a citação dos chamados (a lei
deixa tal prazo ir até dois meses se os chamados residirem em outro local
longe ou desconhecido).
A sentença determina que quem chamou efetue o pagamento ao credor; e
essa mesma sentença já é título executivo deste que chamou em face dos
chamados, para cobrança integral ou quota-parte, a depender do caso
(garantia ou dívida solidária pura, respectivamente).
Amicus Curiae
Sabemos que existe jurisprudência qualificada, ou seja, vinculante.
Mas, diferentemente dos parlamentares, que são escolhidos pelo povo, os
integrantes não o são; são impostos ao povo; logo, não têm legitimidade
para fazer lei (serem legisladores positivos). Mas, na prática,
“jurisprudência qualificada” nada mais é do que “lei” mesmo!
Precisa-se de um mecanismo que se gere alguma legitimidade para tal
imposição geral. Esse mecanismo é chamado de amicus curiae. Significa
“amigo da cúria”, ou do juiz ou da corte.
Em alguns julgamentos, os que tenham ou possam ter repercussão geral,
que digam respeito a interesse público (no sentido de “interesse de todos ou
grupos de cidadãos”), pode-se aceitar manifestação de pessoa física ou
jurídica representativa; esse é o amicus curiae.
A decisão de admissão ou recusa do amicus é irrecorrível; pode ser
requerida ou determinada (leia-se oferecida, por não haver obrigatoriedade
de manifestação, como entendo) de ofício.
A manifestação deve ocorrer em até quinze dias da intimação.
O amicus curiae tem, em princípio, poder de manifestação, oral ou por
memorial escrito (a figura do amicus existe justamente para isso, ora!), mas
pode ter outros poderes indicados pelo relator. Pode recorrer quanto à
existência ou não de ser caso de demanda repetitiva, inclusive podendo
ingressar embargos de declaração quanto a esse caso.
Os Enunciados 127, 128 e 393 do FPPC ditam que “A representatividade
adequada exigida do amicus curiae não pressupõe a concordância unânime
daqueles a quem representa”; “No processo em que há intervenção do
amicus curiae, a decisão deve enfrentar as alegações por ele apresentadas”;
e “É cabível a intervenção de amicus curiae no procedimento de edição,
revisão e cancelamento de enunciados de súmula pelos tribunais.”
2
O processo funcionando
2O PROCESSO FUNCIONANDO
Petição inicial
É o documento deflagrador do processo. Embora tenha algo derivado de
petitium no nome, por um erro pode até não ter pedido, o que a levará à
inépcia; mas que houve processo, houve!
Essa é a razão pela qual digo sempre em sala que petição inicial deflagra
um processo. O ideal, e sua razão de existir, é óbvio, é que contenha pedido.
Possui requisitos intrínsecos e extrínsecos (ou materiais e formais, como
queiram).
Como conteúdo material, deve conter:
As exigências para a petição inicial já começam pegando pesado: Inicia
com o endereçamento da autoridade, ou seja, já deve o peticionando
conhecer exatamente as regras de competência para que possa endereçar
corretamente a peça, sob pena de tomar uma prorrogação de competência
na melhor das hipóteses (ou indeferimento liminar, no pior). Lembro que
não se direciona a órgão, mas à pessoa, logo é ao Juiz, ao Relator, ao
Presidente.
Identificação da partes – São dois graus de exigências bem diferentes
aqui. Para o autor é exigível a qualificação completa à exaustão: A lei fala
em “nomes, prenomes”... já erra feio aqui, por vários motivos. “Nome é o
conjunto de partículas” que designam uma personalidade, é formado
obrigatoriamente por prenome e sobrenome, e facultativamente por
axiônimo, nome do meio e agnome. O que a lei quis dizer foi “Prenomes e
sobrenomes”, posto serem as partículas obrigatórias do nome. Se não
quisesse escrever tanto, bastava exigir o “nome”, pronto.
Agora exige e lei que indique o estado civil e a existência de união estável.
O CPC reconhece e resolve um problema. Na comunidade de estudiosos,
saber se “união estável” é estado civil é mexer em um vespeiro. Embora
formalmente não o seja... possui regime de bens! Logo, o companheiro
(prefiro mesmo chamar de “convivente”) tem todo interesse processual de
participar da lide. Ao afirmar que deve constar um ou outro, o CPC deixa
claro que união estável não é estado civil, mas resolve o problema
informando textualmente que deve constar tal configuração afetiva.
Entendo que essa união estável não deva estar provada, a menos que a lide
tenha alguma influência sobre direito ou interesse do convivente.
Logo depois se deve fazer constar a profissão; eu sinceramente não sei para
que. O número do CPF ou CNPJ. O endereço eletrônico, ou endereços,
deve ser informado já brindo o flanco, em não se especificar “eMail”, que
pode futuramente haver um cadastro nos tribunais, de partes mesmo, assim
como já o existe para advogados; terminando com a residência e domicílio
– só para lembrar, o que diferencia é que o domicílio possui o requisito da
definitividade. Embora a lei não mencione, deve ser declinado qualquer
outro dado de comunicação que possa figurar útil, incluindo o telefone.
Já para a parte contrária, se deve indicar as informações de que se disponha,
permitindo-se até o requerimento para que o juiz determine o levantamento
das informações da parte contrária para que seja identificada – óbvio que
deve ser este o último recurso (decisões são mais importantes, penso).
Qualquer conjunto de informações tão exatas e personificadas quanto
possível (ainda que sequer nome se saiba, podendo usar alcunha ou
qualquer outro indicativo) que leve até à citação do réu fica apto a satisfazer
esse requisito.
Os fatos do pedido, que devem ser deduzidos de forma objetiva, clara e
direta. Minha experiência na advocacia mostrou que floreios
melodramáticos não ajudam, nada impedindo que sejam colocados em um
tópicos “consequência pessoal dos fatos para o autor”. Assim, tiradas como
“Pasme, Excelência! O serviço não foi prestado! Imagine a ira e a dor
moral causado ao requerente!” devem ser evitado (ok, confesso, já usei
algo parecido, por isso sei que não ajuda).
Fundamentos jurídicos do pedido – Precisa haver a subsunção (ih, falei
difícil, “encaixe” é melhor) do fato do direito (lei – com aplicação direta ou
analógica, jurisprudência – simples e qualificada, doutrina). Pode ser algo
extremamente fácil ou pode ser algo fora do comum em dificuldade, como
quando se quer fazer valer alguma tese jurídica nova, um “leading case”,
algo inusitado que o autor acredite ser direito seu (imagine uma amante,
concubina, pleiteando partilha de bens e enquadrando seu pleito no direito,
o que não teria que invocar?).
O pedido – Devendo ser certo, mas podendo ser único, cumulativo ou
alternativo, como tratarei logo após, em tópico próprio. Lembro que de
nada adianta uma petição bem feita quanto ao restante, se o pedido está mal
redigido; motivo pelo qual, sempre que peticionava, iniciava justo pelo
“pedido”, só depois elaborava os outros elementos da petição.
Esse pedido poderá ser alterado unilateralmente (sem sequer consulta ao
réu) até a citação. E até o saneamento do feito (explicaremos o que é isso
adiante), o autos pode alterar ou aditar, ampliar o pedido, desde que com
consentimento do réu e, se for aceito, terá o réu 15 dias para se manifestar
sobre essa alteração, podendo requerer provas – nada mais é do que uma
contestação ao que foi mudado ou expandido na inicial. O que levaria o réu
a permitir tal ampliação do pedido ou mudança deste? Só vejo um motivo:
não querer se expor a nova demanda, correndo o risco de ser alvo de um
pedido ainda maior.
Valor da causa – Esse elemento, obrigatório, é base para cálculo das
custas. Será base de cálculo se houver multa e para os honorários de
sucumbência, caso haja extinção sem resolução de mérito e alguns outros
determinados casos. Também será tratado em um tópico a seguir, e poderá
ser objeto de impugnação autonomia, no próprio texto da contestação, em
preliminar.
Provas que pretende apresentar – As que já tiver for documental, já
devem estar no anexo. As testemunhas devem desde já serem arroladas,
mas nada impede que tais provas sejas propostas posteriormente, inclusive
sendo suscitadas em audiência. Embora a lei fale em “prova dos fatos”,
lembro que que direito (lei e vigência) também devem ser provados, se
forem de circunscrição diferente da que o magistrado deva conhece-lo.
Se deseja ou não conciliar – Isso aqui é delicado! Se o direito for
disponível e o autor nada disser, presume-se que queira conciliar. Se o
direito for indisponível (paternidade, personalidade), não haverá audiência
de conciliação e mediação ainda que tenha dito que “quer conciliar”. Logo,
para interesses disponíveis e que autor não queria conciliar é que deve
claramente indicar isso na petição inicial.
Direito de emenda
É direito do autor só ver sua peça se indeferida por questão formal depois
de lhe ser oportunizado o prazo e indicação de emenda. O prazo é de 15
dias, em despacho proferido pelo juiz onde ele já indicará o que deva ser
emendado na inicial. Somente em persistindo o erro ou omissão é que se
dará indeferimento liminar da inicial.
Embora não seja mencionado em lei, se o próprio juiz por erro se omitiu
quando ao objeto da emenda, ou não indicou tudo o que deveria ser
emendado, penso que deva ser ministrado novo prazo para emenda, para o
que só depois foi descoberto pelo magistrado.
Documentos anexados à inicial
O termo “Petição inicial” possui dois sentidos: tanto pode se referir à peça
escrita que deflagra a atividade jurisdicional (provocando a jurisdição),
como pode ser entendida como o instituto, ato e, neste caso, corresponder à
peça, documentos essenciais e demais formalidades exigíveis á propositura
da demanda.
Documentos essenciais à demanda devem estar desde já anexados. Pelo
princípio da eventualidade, tudo o que houver de documento já disponível
ao autor deve aqui ser apresentado ou indicado.
Deve vir acompanhada da procuração do advogado, só sendo dispensável
tal procuração se o autor litigar em causa própria, nos casos em que não se
necessite obrigatoriamente de advogado ou em que o causídico atue nas
causas urgentes, naquelas em que a legislação da advocacia permite atuação
sem procuração.
Podem-se anexar documentos posteriormente, desde que produzidos após e
desde que só se saiba da existência deles depois ou sejam referentes a
algum novo ato do processo que necessite de tais documentos.
Pedido
O pedido deve ser certo, indicando exatamente o que se pede. Pedidos não
certos são aceitáveis quando não se saiba a consequência da causa de pedir,
no momento da sentença (como aquele acidente em que se requerem perdas
e danos, mas no momento do peticionamento a vítima está hospitalizada,
não se sabendo se haverá sequelas, morte e quanto se gastará em prótese,
órtese, medicação etc.). Igualmente o pedido não precisa ser certo se
depender de ato do réu, como no caso em que se execute o pagamento de
um título de um contrato cuja existência se saiba, mas está em poder do
próprio executado, e só se saberá o conteúdo das obrigações após este o
exibir.
O pedido deve ter um nexo de causalidade (causa e efeito) entre o que foi
contado nos fatos e o que se requer no pedido. Embora isso pareça óbvio,
em tempos de “cópia e cola”, ou dentre postulantes sem articulação de
frases, podem-se ouvir verdadeiras barbaridades.
O pedido pode ser simples ou plúrimo. Será simples quando for apenas um;
isso é muito raro. Mais usual é ser pedido plúrimo; e este será cumulativo
ou alternativo.
Podem ser cumulativos (cumulação própria ou imprópria), alternativos ou
facultativos.
Pedido com cumulação própria é “A” e “B”.
Com cumulação imprópria, o que em Direito Material chamaríamos de
pedido facultativo, é aquele em que existe uma ordem de preferência pelo
autor; e, caso o anterior não seja possível, que se defira o próximo,
substituto a ele: “A”; se não for possível “A”, que se defira “B”.
Pedido alternativo é aquele com que se deixa ao talante do magistrado
escolher o que deferirá, podendo até ser tal escolha entregue ao réu; o que
importa aqui é que qualquer das prestações satisfaz o autor; é “A” ou “B”;
Para que haja cumulação, os pedidos precisam poder ser julgáveis pelo
mesmo juiz e que o mesmo procedimento possa ser usado para todos os
pedidos. Na cumulação própria os pedidos precisam ter a compatibilidade
de cumprimento sem que um impossibilite o outro.
Além dos pedidos explícitos ou expressos, que são os manifestados pela
parte, existem também os pedidos implícitos, que, mesmo não
mencionados, a lei os considera requeridos; são também chamados de
“corolários”, que são os juros legais, custas e honorários processuais de
sucumbência.
Não confundir pedido com forma de cumprir a obrigação, que é puramente
de Direito Material. Assim, o pedido alternativo é UM pedido, mas pode a
lei material determinar que possa ser cumprido por mais de uma forma.
Valor da causa
O valor da causa é o parâmetro para competência, horário de sucumbência e
eventual multa. Tendo ou resultado consequência econômica (adoção, por
exemplo, não tem resultado econômico), deve-se atribuir um valor,
estimado mesmo.
Como regra geral, deve corresponder ao valor do proveito econômico
esperado com a causa. Prestações futuras devem ser valoradas no
correspondente a um ano.
Em alguns casos a lei tarifa o valor como alimentos (12 prestações); se
envolver divisão, será o valor da área controvertida ou o valor do bem, a
depender do que for afirmado na petição inicial. Em pedidos cumulados, o
valor total; nos alternativos, o de maior valor; em pedidos subsidiários, o do
pedido principal.
No prazo da contestação, a parte contrária pode impugnar o valor da causa,
e o próprio juiz pode, de ofício, corrigi-la.
A falácia da “conciliação”
Enquanto escrevo esta obra, o Brasil vive uma crise política e econômica. A
Presidência tenta jogar para o povo, via aumento de impostos e corte de
benefícios, uma incompetência administrativa que é sua, a começar por ter
uma estrutura perdulária de 39 ministérios.
Exatamente o mesmo o Judiciário faz: é incompetente (no sentido de inábil)
para dar vazão aos processos, e joga a conta para o povo, pressionando para
que ninguém processe ninguém; se o fizer, não recorra – mas não abra mãos
dos gordos salários (chamados “subsídios”, sabemos) e da inexigência de
celeridade e eficiência da própria máquina.
Incomoda-me ver abalizados pensadores jurídicos compactuando com a
ideia de que há excessos de recursos e se precisa diminuir a litigiosidade.
Bem... que tal trabalhar mais, mais rápido e melhor? Simples!
A coisa é jogada tão na cara dura que há multa em caso de ausência
injustificada à audiência de conciliação e mediação. Um castigo por não
querer conciliar, um ato atentatório à dignidade da justiça. Arghhh!
Lembro que, em um processo em que atuei, o juiz aumentou a condenação
do réu porque ele se recusou a conciliar (era Juizado Especial). O CPC está
quase lá; não é absurdo surgirem multas e sanções por recusas de
conciliação; quiçá não surja ainda proibição de se litigar àquele que teve o
acinte de não querer fazer acordo...
Conduta do réu
O réu pode assumir várias condutas.
Uma delas é fazer nada. Por isso não gosto do título “resposta do réu”, já
que teríamos que, quebrando o raciocínio lógico, assumir que “uma das
respostas é não responder”. Ilógico.
Pode o réu ter como conduta a inércia, a contestação ou a reconvenção.
Inércia do réu
A inércia do réu ocorrerá de forma voluntária (rara, mas ocorre) ou
involuntária; esta a mais comum. Será voluntária se o réu decide não
contestar, ainda que regularmente citado. Pode entender que a parte
contrária conta com total razão. Pode entender que o custo da demanda será
maior do que simplesmente sucumbir, confessar tacitamente; até para que
uma demanda não gere publicidade quanto ao objeto, por questões
comerciais, poderá ter interesse um réu em não apresentar qualquer
resistência.
A inércia é involuntária quando o réu não se manifesta materialmente por
ter sido revel em citação ficta. Nesse caso, formalmente se manifestará por
meio de curador especial, mas, no mundo real, nada declarou. Pode ser que
tenha sido realmente citado, com ciência da demanda, porém
operacionalmente falhou na apresentação de sua contestação.
A inércia, após citação regular, ainda que ficta, pode gerar revelia (aliás, o
conceito de “revelia” é, justamente, ausência de defesa). Essa “ausência de
defesa” tem que ser compreendida em todas as suas configurações.
Nas ocasiões em que deva ser deduzida por advogado, a presença do réu no
processo pode levar à revelia, se não houver a apresentação da defesa
técnica, que é a redigida por advogado.
O réu revel não fica de todo indefeso, visto que lhe é nomeado um curador
especial. Cuidado com essa palavra “curador”: é uma das mais traiçoeiras
do direito, devido a seu excesso de significados e aplicações; não confundir
com o curador de incapaz ou o curador de ausente.
Contestação
Com a citação válida, fecha-se o triângulo processual.
Até o décimo dia o réu pode atravessar petição manifestando seu
desinteresse em que haja audiência de conciliação e mediação. Se o autor,
na inicial, requereu dispensa de tal audiência, e agora com a dispensa pelo
réu, tal audiência não haverá (ufa!). Se apenas um deles tiver requerido
cancelamento dessa audiência, ela ocorrerá.
O termo inicial da contestação será o pedido de cancelamento dessa
audiência. Será também a data da última dessas audiências, se for frustrada
a tentativa de conciliar. Ocorrerá, também, se houve “no show” de alguma
ou das partes, a saber, uma ou todas as partes faltaram a tal audiência.
A contestação tem prazo de quinze dias.
A contestação é uma defesa. A depender do processo e do rito, terá sua
forma própria de ser apresentada.
No rito comum do processo civil, será por escrito, elaborada por advogado
e apresentada por este.
Na defesa encontramos o “Ônus da Impugnação Específica”, ou seja,
TUDO o que foi afirmado pelo autor deve ser rechaçado pelo réu, ainda que
pareça óbvio que tal pedido ou acusação sejam indevidos, ainda assim
devem ser repelidos. Não pode haver defesa genérica.
Ainda que a defesa do pedido “A”, por consequência, já seja suficiente para
destruir os pedidos “B” e “C”, deve ser defendido um a um. Assim, se o
autor pede capital e juros, em não sendo devido o capital, deve o réu
também impugnar a cobrança dos juros.
Igualmente, pelo “Princípio da Eventualidade”, deve o réu deduzir toda a
sua defesa no momento único, não lhe cabendo outro instante para defesa.
Um fato sem defesa é chamado de “incontroverso”. Gera julgamento
antecipado, demanda quanto ao que houver de incontroverso ou confessado
expressamente.
O corpo se divide em três partes: preliminares, defesa de mérito e pedido.
As defesas preliminares eu explico no próximo tópico. A defesa de mérito é
tudo o que puder ser alegado, se subdividindo em defesa direta (inexistência
do direito do autor) ou defesa indireta (fato modificativo, impeditivo ou
modificativo do direito do autor, é o famoso “sim, mas...”)
Ah, e sim, contestação tem pedido; no mínimo, a improcedência do pedido
do autor!
Preliminar de contestação
Antes de atacar o mérito, deve o réu atacar o processo ou o próprio direito
de ação, por meio das preliminares de contestação.
São alegações que, se acolhidas, geram um dos dois efeitos: fulminam o
processo (não se irá discutir “quem tem ou deixa de ter” razão) ou dilatam o
prazo da defesa, por vezes restituindo-o integralmente ao réu. As que
retardarem o processo até sua correção são chamadas de dilatórias (como
uma exceção de incompetência absoluta); as que fulminam o processo
(como perempção ou coisa julgada) são chamadas de peremptórias.
Á exceção de incompetência relativa e convenção de arbitragem, todas as
matérias alegáveis em preliminar de contestação podem ser reconhecidas de
ofício pelo juiz mas, acredite, nenhum advogado é maluco de deixei de
alegá-las por esse motivo.
Existe um rol previsto no CPC, mas outros casos podem surgir (e, sendo
honesto, se não houver previsão em lei, nós advogados criaremos, se
entendermos cabíveis, assim como um dia fizemos nos anos 90 criando a
“Exceção de Pré-Executividade”...).
Citação inexistente ou nula – Essa preliminar, na verdade, não fulminará o
processo mas, se acolhida, apenas passará a constituir a própria citação
válida e restituirá ao réu o prazo para contestar (melhor dizendo:
“concederá”, já que contará a partir daqui). Mas isso tem um problema
grave: embora eu entenda (e acho que a melhor lógica deva entender assim
também) que o prazo deva ser dado ao réu, é óbvio que, até por cautela, este
deve ter já se defendido na mesma peça. O magistrado pode incorrer no
risco de pensar “não vou conceder o prazo, já que a defesa já está aqui, e
como não há prejuízo para o réu, acolho a preliminar já considero a
contestação integralmente apresentada”. E agora? O advogado, se tiver
sangue frio e autocontrole, pode provar a nulidade ou falta de citação sem
apresentar defesa, o que irá corroborar sua alegação. Mas, por cautela,
prevendo que o juiz entenda que “tanto houve conhecimento do processo
que a peça defensiva está sendo apresentada”, já deduza a matéria de
defesa, ainda que de forma capenga, tendo sido lavrada em cima do prazo e
sabe-se lá como, muito menos com documentação ou indicação completa de
prova.
Penso que somente no caso de curador de revel é que essa alegação será,
seguramente, garantia de restituição integral de prazo, infelizmente.
Incompetência absoluta e relativa – A depender do caso, gerará
prorrogação (modificação) da competência ou, se houver teratologia
(monstruosidade) de direcionamento, pode até resultar extinção do feito. A
incompetência absoluta, ainda que não seja alegada aqui na preliminar, é
reconhecível pelo juiz; a relativa, não – indicando que o réu aceita que o
processo tramite no juízo corrente.
Incorreção do valor da causa – Essa alegação objetiva a majoração ou
minoração do valor da causa. O ideal é que se prendam às normas de
fixação do valor da causa, mas interesses outros, não necessariamente
ilícitos, podem influir em tal impugnação via preliminar. Pode ser que o
advogado do réu tenha percebido malícia do autor para pagar menos custas
ou saiba que haverá extinção do feito sem resolução de mérito e que
receberá honorários de sucumbência sobre o valor da causa, neste caso, para
ele, quanto mais alto o valor da causa, melhor. Pode perceber o contrário: o
réu, por erro ou dolo, majorou o valor da causa, terá o réu todo o interesse
em reduzi-la.
Inépcia da petição inicial – A peça inicial pode estar incompreensível, de
tal forma defeituosa (defeito esse que “passou batido” pelo juiz) que torne a
causa indefensável até por nem se saber qual é o pedido ou causa de pedir
do feito, restando ao réu requerer inépcia da inicial, bem como se perceber
que não houve carreamento de documento essencial à propositura da
demanda.
Perempção - É a perda do direito de ação devido a desídia do demandante.
É o desleixo da própria parte com sua demanda ingressada. Classicamente
configurada como a terceira vez em que o processo for arquivado por três
vezes devido a descuido do autor;
Litispendência – Não se pode tentar julgar novamente um feito que já está
tramitando em outro juízo (a exceção é se esse outro juízo for estrangeiro,
pois não há liispendência internacional). Não pode a parte, por malícia,
reajuizar a demanda para “ver se é sorteada para juiz que lhe seja mais
amigo que o que está julgando a causa em outra vara”. A regra é simples:
para cada processo, uma decisão e um julgador final, para que não haja
multiplicidade de julgamentos sobre um mesmo fato.
Coisa julgada – Não se pode rediscutir caso encerrado, até para que não
haja ameaça à estabilidade das decisões. “Coisa Julgada” surge quando não
cabe mais recurso em uma demanda. Seja por resignação (a parte não quis
mais recorrer), esgotamento de recursos ou por falha na atuação recursal
(perda de prazo ou falta de regularidade formal no recurso). Em certos e
determinados casos que serão estuados depois nesse livro, se pode sim
tentar “quebrar” coisa julgada, através de “ação rescisória”.
Conexão – Esse fenômeno foi por nós estudado quanto tratamos sobre
litisconsórcio, deverá ser alegado aqui quando se perceber que há
identidade de pedido ou causa de pedir – melhor é aplicar a interpretação
doutrinária: conexão é identidade de ações que possam gerar julgamentos
conflitantes, pronto!
Defeito de apresentação da parte em juízo – Aqui engloba a capacidade
civil da própria parte, sua representação civil (pais, tutor, curador,
administrador, legitimado extraordinário etc), e sua representação
postulatória (advogado ou defensor público). Qualquer desses defeitos
devem ser questionados aqui. Na minha opinião, resultará em possibilidade
de se sanar o vício à parte com tal defeito.
Convenção de arbitragem – Depois de vinte anos (a lei específica de
arbitragem é de 1996), finalmente de forma expressa e direta, há
reconhecimento formal de que esta, quando regular, afasta mesmo a
jurisdição. Lembro que o próprio autor, na inicial, teve oportunidade de
alegar abusividade de cláusula compromissória, se não o fez e esta exista,
cabe aqui ao réu dizer “Não tasca nesta causa, é arbitral! Get away!” –
lembro que o juiz não pode de ofício reconhecer esta preliminar, se não for
alegada, se presume que o réu renunciou à arbitragem e quer mesmo partir
para a jurisdição.
Ausência de legitimidade – Aqui se alega que o autor não é titular do
direito que requer (falta de legitimidade ativa) ou o réu não é a pessoa que
deveria figurar na demanda (falta de legitimidade passiva). Deve aqui o réu,
se souber quem deveria ser demandado, declinar os dados de identificação
do mesmo.
Se o réu souber quem deveria ser o réu e não indicar, arca com perdas e
danos pelo transtorno. Se alegar, o autor (em 15 dias) ou aceita e direciona
o feito à pessoa indicada, continua contra o “´reu” original ou procede à
citação deste outro suposto réu e o posiciona como litisconsorte passivo,
junto ao “réu” original. Usei essas aspas porque não sabemos, neste
momento, se esse ou o outro serão também legitimados mesmo. Se houver a
substituição, o autor ressarce as despesas daquele “réu” original (incluindo-
se aqui os honorários contratuais que tiver pago ao advogado) e paga
honorários para o advogado deste (de três a cinco por cento) – bem poderia
também enviar um cartão de desculpa pelo incômodo causado.
Ausência de interesse processual – É aqui que se alega que o autor “errou
o processo”, errou o rito, não precisava da jurisdição, já tinha o direito pelo
qual briga ou simplesmente o pedido que formula é inútil ao que diz
pleitear.
Falta de caução ou prestação devida para litigar – Situações existem
onde para se inicial a demanda se requer depósito (como quando autor
reside fora do país ou em ação rescisória); se tal não foi satisfeito, se alega
nesta preliminar.
Defeito na concessão de gratuidade de justiça – Ah, quer dizer que o
autor mentiu nos seus motivos para conseguir gratuidade de justiça?
Resolveu “litigar de graça” de malandro? É aqui a impugnação! Onde se
pode demonstrar que a gratuidade, seja total ou parcial, foi indevidamente
concedida; seja por erro de avaliação do magistrado seja por dolo do
requerente.
Lembro que a gratuidade de justiça abrange pagamento de honorários; e não
interessa a advogado algum patrocinar cliente cuja parte contrária goza de
tal benefício legal, visto que tal causídico se verá na possibilidade de ver
sua remuneração diminuída, o que lhe faz ter interesse em impugnar o
benefício da parte contrária. Caso se comprove mentira na afirmação, há
imposição do pagamento das despesas do processo, e gera-se multa de dez
vezes o valor das custas. Se for valor inestimável ou irrisório, dez salários-
mínimos – essa multa não é entregue à outra parte (acho que deveria sê-lo),
mas ao Estado, inscrita e cobrada com dívida ativa; e a apreciação de
qualquer recurso fica condicionada a tal pagamento.
Reconvenção
A reconvenção é um pedido do réu em face do autor. Na própria
contestação deve vir a reconvenção.
Assim, teremos em um mesmo processo duas ações, uma do autor em face
do réu, e outra do réu em face do autor – tudo julgado em uma única
sentença.
O pedido do réu deve ser correlato com o pedido do autor, ou seja, versar
sobre uma mesma matéria (conexão da matéria reconvinda em relação ao
pedido do autor); e só cabe nas ações de conhecimento. Reconvenção é
apresentada na própria contestação.
Para reconvir, precisa haver a causa pendente; deve ser ingressada no prazo
de resposta, no mesmo juízo, mesmo procedimento e afinidade de questão
com a ação.
As partes da reconvenção são réu-reconvinte e autor-reconvindo. O autor-
reconvindo é intimado para responder à reconvenção (ou pedido
contraposto).
A reconvenção tem vida própria: mesmo se o autor da ação desistir desta,
continuará o julgamento da reconvenção.
Segundo o Enunciado 45 do FPPC, “Para que se considere proposta a
reconvenção, não há necessidade de uso desse nomen iuris, ou dedução de
um capítulo próprio. Contudo, o réu deve manifestar inequivocamente o
pedido de tutela jurisdicional qualitativa ou quantitativamente maior que a
simples improcedência da demanda inicial.”
Saneamento
Saneamento é o ato pelo qual o juiz prontifica o processo para a instrução.
Como costumo dizer em sala, é “determinar o campo cirúrgico”.
Nas cirurgias, como você já deve ter visto em cinema ou TV, colocam
aquele pano azul com uma abertura por onde ocorrerá a operação. Aquilo
tem duas funções básicas: centralizar a atenção somente na incisão e isolar
o que houver em volta.
É para isso, também, que existe o saneamento do processo: retirar o que não
importa para ser alvo de atenção e fixar as energias no que realmente
importa.
Com o saneamento:
- Determina-se o que será objeto de prova (pontos controvertidos).
- Determina-se o que está incontroverso.
- Distribui-se o ônus da prova.
Basicamente existem três formas de se sanear o processo:
- Saneamento compartilhado – O juiz saneia o processo, fixando prazo de
cinco dias às partes para se manifestarem sobre o saneamento operado.
- Saneamento homologado – Ou negociado, que é aquele em que as
próprias partes, diretamente, determinam quem provará o que e quais serão
os objetos de prova; em sendo homologado, vinculará às partes o juiz.
- Saneamento colaborativo – Em que o juiz marca uma audiência para, em
conjunto com as partes, determinar os tópicos saneantes.
Não existe previsão de recurso para essa decisão saneatória do juiz. Isso é
bom e ruim. É bom, porque não atravanca o processo (imagine o andamento
travando por causa de se discutir saneamento); e é ruim, porque
saneamento... é um foco de erros futuros se for mal feito! Gerará erros em
cadeia, que gerarão decisão injusta ou perda de boa parte ou até de todo o
trabalho de primeira instância. O fato é que, pelo texto do CPC, recurso
sobre saneamento... só nas razões de apelação.
O Enunciado 299 e 300 do FPPC diz que “O juiz pode designar audiência
também (ou só) com objetivo de ajustar com as partes a fixação de
calendário para fase de instrução e decisão.” e “O juiz poderá ampliar ou
restringir o número de testemunhas a depender da complexidade da causa e
dos fatos individualmente considerados.”
Sentença
Sentença conclui fase de conhecimento ou extingue execução. Surge de
sentire; é o sentimento do julgador a respeito daquela causa.
Sentença que extingue processo com resolução de mérito (falta de condição
da ação ou de pressuposto processual, além de algumas outras situações
pontuais que fulminam o processo) é chamada de definitiva. Se não julgar
o mérito, é chamada de terminativa.
Existem casos atípicos, como o processo de falência (um dos mais difíceis e
detalhados que existem!), em que nós encontramos não uma ou duas, mas
sim três sentenças DURANTE o processo. Não são definitivas, pois não
findam o processo; nem são terminativas, já que julgam mérito.
Até a sentença, várias decisões ocorrerão, chamadas de interlocutórias;
elas não fazem que haja troca de fase no processo, não significando, com
isso, que terão pouca influência sobre as partes – são, às vezes, as decisões
mais drásticas e importantes do processo. Na prática, chamam-se, no fórum,
de “despacho”, embora despacho seja o meio pelo qual tal decisão é
exarada.
Elementos da sentença
A sentença estabelecida pelo CPC é uma das peças mais complexas do
direito brasileiro. Até o novo CPC entrar em vigor, era a sentença de
falência a mais detalhada, mas o novo CPC se superou.
Primeiramente, precisa haver “nexo dos fatos com a causa ou questão
decidida”.
Não podem conter na sentença “conceitos jurídicos indeterminados”. Bem,
isso impedirá aqueles votos quilométricos e verborrágicos que encontramos
vez ou outra no STF? Em primeiro grau penso ser menor a incidência
desses “conceitos jurídicos indeterminados”, por certo magistrado ter mais
o que fazer do que ficar em “Spin-off” sentencial. Não podem ser usados
motivos que serviriam para qualquer outra decisão, ou seja, são vedadas
sentenças genéricas, ctrl+V, chapa, sentenças em série, até porque para
causas em série já existe incidente de resolução de demandas repetitivas.
Deve ser enfrentado tudo que leve ao julgamento; todos os pontos – a
porteira para embargos de declaração foi aberta, e talvez se façam
necessários mais assessores a cada julgador.
Não se deve invocar enunciado de súmula, julgados, enfim, jurisprudência
firmada e precedentes sem indicar sua relação com a causa.
Para que não utilize “jurisprudência qualificada” (acho que precisamos
chamar assim), deve indicar a distinção do caso em julgamento com o caso
da súmula, ou a superação, ou seja, demonstrar o anacronismo e a evolução
dos valores, ideias e expectativas em relação àquele julgamento daquela
causa específica. Na common law, isso se chama, respectivamente, de
distinguish e overruling. O Enunciado 306 do FPPC diz: “O precedente
vinculante não será seguido quando o juiz ou tribunal distinguir o caso sob
julgamento, demonstrando, fundamentadamente, tratar-se de situação
particularizada por hipótese fática distinta, a impor solução jurídica
diversa.”.
É óbvio que, já emanando interpretação que lhes diminua o trabalho
(opinião minha), os magistrados reunidos na ENFAM emitiram o ´singelo´
Enunciado 10: “A fundamentação sucinta não se confunde com a ausência
de fundamentação e não acarreta a nulidade da decisão se forem enfrentadas
todas as questões cuja resolução, em tese, influencie a decisão da causa.” –
Ou seja: não precisa fundamentar tudo, só o “essencial”, e o juiz decide o
que esse essencial. Entendeu?
Coisa julgada
Coisa julgada é a certeza de que aquela decisão se tornou definitiva.
A presunção é a de que, com a coisa julgada, tudo o que havia para ser
deduzido em juízo de parte a parte já o foi – mesmo que não tenha sido –
não importa. Isso apenas torna mais importante o princípio da
eventualidade, a necessidade de afirmar tudo o que precisa no momento
primeiro e, de uma vez, de forma completa e concentrada.
Quando aquela causa jamais pode ser discutida em qualquer processo,
temos a coisa julgada material.
Quando a coisa não mais pode ser discutida somente naquele processo,
temos a coisa julgada formal.
Não só o dispositivo (decisão) transita em julgado, como também sua
motivação. É uma espécie de “ação declaratória incidental” automática.
Imagine que alguém cobra uma dívida de outrem, e a contestação constata
alegação de falsidade de assinatura no suposto título. O juiz reconhece a
nulidade e declara inexistente a dívida.
Caso aquele autor ingresse nova ação, mas requerendo somente juros dessa
dívida, ou compensação de dívida usando tal documento, não conseguirá,
pois a nulidade do título também terá gerado coisa julgada, além da tão
somente inexistência da dívida.
Até dois anos as partes terão certa tranquilidade; é que, só após esse
interregno da coisa julgada, surgirá a “coisa soberanamente julgada”,
momento em que tão somente a causa ficará definitivamente julgada – só
então (ufa!) imutável.
Hã? Só que não! Ainda há uma tal de Querela Nullitatis...
A Querella Nullitatis
Lembra quando escrevi sobre a criatividade dos advogados? Está aqui uma
resultado disso, que existe na doutrina, na jurisprudência, mas não na lei.
E se o processo for inexistente? Se não houve citação, quando devia ter
havido? Formalmente houve processo, houve sentença... gerou até efeito e
foi executada! Como se “formaliza a inexistência”? Com essa peça,
chamada “Querella Nullitatis”, ou “Querella Nullitatis Insanabilis”, que em
bom português nada mais é do que uma “ação declaratória de inexistência
de ato jurídico” (chamar de “Querella Nullitatis” é mais legal, né?) – busca-
se provar que jamais houve causa hábil sequer a gerar coisa julgada.
Intervenção de terceiros.
Desconsideração de pessoa jurídica.
Impedimento.
Suspeição.
Tutela provisória.
Suspensão para conhecimento do mérito.
Arguição de falsidade.
Remoção (inventário).
Arguição de averbação indevida.
Assunção de competência.
Resolução de demandas repetitivas.
Arguição de inconstitucionalidade.
Dano processual
“Dano” é conceituado como “a diminuição ou subtração de um bem
jurídico”; em tese causa prejuízo; digo “em tese”, porque existem danos
sem prejuízos; é a “falta de materialidade mínima”; ou, como se chama no
Direito Penal, “crime de bagatela”. Dano processual é o decorrente de
comportamento de autor do processo.
Não podemos deixar que qualquer medo de causar “dano processual” afaste
o ato de litigar com todas as forças e argumentos disponíveis; assim, é
direito subjetivo da parte usar qualquer meio, alegação, manobra peça ou
instituição processual que existe em favor de seu interesse, desde que
moralmente aceitáveis e legítimos.
Diz-nos a lei que não se pode “peticionar contra lei ou fato”. Bem... pode
peticionar contra lei, desde que de acordo com o direito e outras fontes do
direito (que não é só lei!); e, quanto aos fatos, sabemos não têm só dois
lados, mas vários lados, o que pode tornar difícil – ou impossível –
encontrar a “verdade dos fatos”.
Quanto a usar o processo contra fim ilegal, isso é claro, mas nada impede
que se use processo com finalidade lícita. Não é ilegal ajuizar demanda
legítima só para pressionar alguém a agir de determinada forma. Sim ou
não?
Uma discussão precisa existir quanto à proibição de deduzir alegações
“destituídas de fundamento”. Ora, é claro que o que está em jogo é a boa-fé.
Se não houver fundamento algum, mas a parte credite finalmente que há,
não há que se falar em ilicitude. O instituto do “saber ou dever saber” (que
existe lá no crime de receptação do Código Penal), definitivamente, não se
aplica aqui.
Diz o CPC que, em havendo mais de um litigante de má-fé, serão
condenados “na proporção”. Como assim? Na proporção da má-fé ou do
proveito que tentaram ou conseguiram obter? É um dos exemplos para
liquidação por procedimento comum (chamado antigamente de “liquidação
por artigos”). Existem multas que são direcionadas à parte contrária; outras
que são destinadas ao Fundo de Modernização do Poder Judiciário (federal
ou estadual).
Embora pareça óbvio que o advogado não pode ser forçado a cumprir algo
que incumba à parte, existe ato da parte que é imponível ao advogado:
receber intimações e citações em incidentes e execuções.
O dano processual da parte pode ser imenso. Imagine que, devido a uma
demanda abusiva, uma parte tenha gastado uns 16 mil reais só em uma
perícia na sua contestação...
Suspensão do processo
A regra é não suspender processo; o nome já diz (“processo” é “marcha
para frente”). Em alguns casos, seguir em frente é pior do que suspender,
então se suspende. Lembro que, mesmo havendo suspensão superveniente
de processo, as tutelas provisórias continuam a gerar efeito. Existe a decisão
de suspensão, na quase totalidade dos casos, já com o prazo de tal –
situação em que, “pleno jure” (forma bonita de dizer “de pleno direito”, ou
“automaticamente”), o processo voltará a correr do ponto onde parou. É
raro haver suspensão sem prazo determinado na decisão, o que fará que
haja, nesse caso, outra decisão determinando a volta do processo à
tramitação.
No CPC, são os seguintes casos:
Tutelas definitivas
São aquelas que geram o manto da coisa julgada. Se divide inicialmente em
individual e coletiva.
A tutela individual é aquela requerida por uma ou mais pessoas, mas cada
uma individualmente considerada e qualificada. Nas ações individuais, a
eficácia objetiva da coisa julgada é somente aos que participaram da
demanda.
A ação coletiva tem como litigantes não várias pessoas determinadas, mas
sim um conjunto, uma massa de pessoas, tratadas como um ser coletivo,
visando a proteger interesses metaindividuais (ou transindividuais).
Os interesses metaindividuais são divididos em difusos, coletivos e
individuais homogêneos.
Os interesses difusos são aqueles nos quais não se pode indicar com
precisão quem são seus titulares, nem em que medida podem ser
compartilhados por estes. Os titulares dos interesses difusos se encontram
ligados por circunstâncias meramente de fato. São exemplos de interesses
difusos: o direito de viver em meio ambiente saudável, de ser bem tratado
como consumidor, de ter um governo justo etc.
Os interesses coletivos (ou coletivos estrito sensu ) são os interesses
comuns a uma determinada coletividade de pessoas e somente a elas; são
interesses afetos a um grupo restrito e limitado; dentro de tal grupo as
pessoas estão ligadas por vínculo jurídico, a exemplo de condomínio,
sociedade comercial, associação de moradores etc. Os direitos coletivos se
exteriorizam por meio de tais grupos.
Os interesses individuais homogêneos são aqueles cujo titular é
perfeitamente identificável e cujo objeto é perfeitamente divisível, mas
ganham muito mais força em juízo quando exercidos pelos titulares em
grupo. Os interesses individuais se tornam homogêneos por serem
idênticos, com origem comum, com a possibilidade de serem julgados em
conjunto; por exemplo: clientes de determinada empresa, ou funcionários
de determinada fábrica.
Como meios de atuação em juízo para efetivação dos interesses
metaindividuais, temos as ações coletivas (ou class actions), a saber: a
Ação Civil Pública e a Ação Popular e a Ação Civil Coletiva (ACC); esta
última nos foi trazida pelo CDC.
Os legitimados para essa ação (a ACC) são os do artigo 82 do CDC: União,
Estados, Municípios, Distrito Federal e as entidades e os órgãos da
Administração Pública, direta ou indireta, e associações com mais de um
ano de registro (podendo tal lapso ser dispensado pelo magistrado, em casos
especiais, como as formadas para demandar por determinado acidente.
Imagine como poderiam prever isso com mais de um ano de
antecedência?). É importante notar que é uma das poucas situações em que
o “órgão” tem legitimidade processual. Nessas ações (ACP, AP e ACC), a
sentença não fará coisa julgada se for julgada improcedente por falta de
provas ( secundum eventum probationis ); e o efeito da coisa julgada (é
chamado secundum eventum litis) nas ações de interesses difusos é erga
omnes , pois alcançará a todas as pessoas indistintamente; e, no caso dos
direitos coletivos, será ultra partes , visto que atingirá, para beneficiar,
pessoas enquadráveis naquele determinado grupo. E beneficiará as partes e
os herdeiros na individual homogênea.
Costumo dizer em sala que direitos “individuais homogêneos” são
formados, na verdade, por um “grande litisconsórcio” e que poderíamos
chamar o instituto “litisconsórcio” de algo em que se protege “direito
individual heterogêneo”, portanto.
Se houver litispendência de ação individual, para que o autor de tal ação
(individual) se beneficie da coisa julgada coletiva, é necessário que requeira
a suspensão da sua ação, em até 30 dias a contar da ciência formal da
existência da ação coletiva.
Tutelas provisórias
Imagine uma moto, cuja propriedade é disputada por duas pessoas: Tício e
Mélvio. A posse da moto está com Mélvio.
Uma vez que Mélvio é afoito, vive em excesso de velocidade na moto.
Tício pode requerer que Mélvio seja obrigado a deixar a moto na garagem
durante o processo, para que não a danifique – Isso é uma tutela cautelar.
Nesse caso, é antecedente, mas poderia ser incidental se, só lá pelo meio do
processo, Mélvio passasse a ser um motoqueiro descuidado.
Imagine agora que Tício é motoboy e precisa da moto para ganhar sua
sobrevivência; pedirá ao juiz que lhe seja entregue imediatamente a moto,
já que sua sobrevivência não pode esperar todo o desenrolar do processo.
Em qualquer dos casos, imagine que fique evidente que Mélvio pretende
fugir com a moto, para a possibilidade de o oficial de justiça não mais
encontrá-la; nesse caso, caberá tutela da evidência, para que Mélvio guarde
ou deixe a moto logo com Tício, ainda que se proíba que ela transite.
(O exemplo acima foi criado por mim, inspirado na Aretusa, minha moto,
uma Yamaha Factor).
Tutela antecipada
Pode-se já inicialmente pedir antecipação de tutela, para que se receba logo
o que seria cabível ao fim.
Explica-se a lide, o direito, o perigo de dano que pode advir com a demora
pela falta do objeto.
Concedida a antecipação, o autor adita a inicial para completá-la, juntando
novos documentos e pedindo que a tutela se torne procedente, já indicando
o valor da causa. Tem 15 dias para ingressar esse aditamento, se o juiz não
fixar outro prazo. Se não for aditado, extingue-se sem julgamento do
mérito.
Cita-se para audiência de conciliação, seguindo-se eventual contestação.
Pode-se estabilizar, ou seja, mesmo sem ter-se transformado em ação
principal, pode gerar efeito de coisa julgada sem ter sido coisa julgada, se
não se recorreu dela – é a permanência dos seus efeitos.
Se não for concedida a tutela antecipada, a emenda da inicial se dará em
cinco dias, sob pena de indeferimento ou extinção sem mérito.
A qualquer momento dentro de dois anos, com a medida estabilizada, pode-
se modificar ou invalidar a tutela antecipada.
O Enunciado 18 da ENFAM nos diz que “Na estabilização da tutela
antecipada, o réu ficará isento do pagamento das custas e os honorários
deverão ser fixados no percentual de 5% sobre o valor da causa” e, segundo
seu Enunciado, se admite a tutela antecipada contra essa estabilização de
efeitos, olha só: “Caso a demanda destinada a rever, reformar ou invalidar a
tutela antecipada estabilizada seja ajuizada tempestivamente, poderá ser
deferida em caráter liminar a antecipação dos efeitos da revisão, reforma ou
invalidação pretendida, na forma do art. 296, parágrafo único, do
CPC/2015, desde que demonstrada a existência de outros elementos que
ilidam os fundamentos da decisão anterior.”
E segundo os Enunciados 420 e 421 do FPPC, “Não cabe estabilização de
tutela cautelar” e “Não cabe estabilização de tutela antecipada em ação
rescisória.”
Tutela cautelar
Pode ser antecedente ou incidental.
Para se obter uma tutela cautelar antecedente, a parte precisa indicar a lide e
seu fundamento, o direito a que se funda; indicar o perigo de dano a que
está sujeito o objeto e por que o processo corre o risco de se tornar inútil
pela demora.
A contestação deverá ser feita em cinco dias, sob pena de confissão tácita; o
juiz decidirá em cinco dias.
A cautelar antecedente gera o dever de aditar o pedido, em até 30 dias, para
transformá-lo em petição inicial.
Uma cautelar satisfativa já entrega logo o bem da vida para o requerente
(daí o nome “satisfativa”).
Citada a parte contrária, seguirá o procedimento comum, com audiência de
conciliação e mediação etc.
Termina a eficácia da medida cautelar se o pedido principal não for
ingressado no prazo, se não for efetivado em 30 dias ou se o pedido
principal for improcedente ou extinguir o feito sem julgar o mérito (por
algum defeito processual, por exemplo). Para pedir de novo a medida, só
com outro fundamento.
A menos que o indeferimento seja prescrição ou decadência (ou seja, mérito
mesmo), a não concessão da liminar não impede que a causa seja apreciada
e, ao fim, a parte inclusive consiga por sentença o que pediu, de forma
satisfativa, na cautelar.
A requerida posteriormente é a incidental, sendo um pedido atravessado no
processo em curso.
Tutela da evidência
Tutela da evidência é concedida, como o nome diz, se o direito ficar...
evidente!
Ocorre quando o que se pede está logo de acordo com a jurisprudência
qualificada, se a prova for documental e pré-constituída ou se a parte
contrária tentar ludibriar o juízo com defesa protelatória, abuso de direito de
defesa; também caso se trate de depósito com prova documental; tudo isso
sem que a parte contrária não consiga gerar “dúvida razoável”, ou seja, não
consiga minimamente convencer o juízo de que está com a razão.
Para que esperar sentença para algo já evidente?
Decisão judicial é só papel. Se for eletrônica, bits & bytes. O que a parte
procura não é decisão; é o objeto, a atividade, a cessação de algo – aquilo
que se chama “bem da vida”.
Efetivação é levar a efeito a decisão judicial, em execução, cumprimento de
sentença ou de qualquer outra decisão. É modificar o mundo dos fatos
fazendo surgir resultado, ou o “bem da vida”, ou seja, o benefício desejado.
O ator tem o poder de abrir mão de parte do direito de que deva ser
beneficiário, se não tratar de direito indisponível.
Por várias vezes vi cliente feliz por termos obtido uma decisão favorável,
irrecorrível; e eu sempre continha a felicidade que via: “Calma! Isso é só
papel ainda!” (não existia processo eletrônico à época).
Há tempos se usa o termo “cumprimento de sentença” quando a execução
se refere a ela.
Pensamos ser mais inteligente chamar tudo de execução. Pois esta
abrangeria a decorrente de um título extrajudicial ou judicial; e desta, já
sentença, acórdão, decisão interlocutório, seja lá que nome tenha ou possa
ter o ato.
São princípios da execução:
Efetividade – Em toda extensão do possível se procurará satisfazer a
pretensão do credor, a ponto de só se executar o que for controvertido,
pagando e executando de forma definitiva o que a qualquer momento se
tornar incontroverso.
Celeridade – Busca-se a maior rapidez possível, até para que os bens não
se deteriorem, a execução perca seu valor ou o processo se torne inútil.
Execução menos gravosa ao devedor – Se houver mais de uma forma de
se efetuar a execução, que se escolha a que trouxer menos prejuízo ao
devedor. Não se trata de causar menos dano, mas sim de, no caso de mais
de uma opção de execução, poder escolher a menos pior.
Eficiência – Não se procede à penhora ou à venda do que possa trazer
produto tão pequeno que não tenha valido o esforço para vendê-lo.
Quaisquer medidas para cumprimento ou elucidação de dados podem ser
impostas pelo juiz.
Qualquer embaraço à execução é “ato atentatório à dignidade da justiça”; e,
pela Lei de Falência, se tal embaraço provier de empresa que possa falir,
pode ter sua falência requerida com base nisso.
Pode ser réu na execução o devedor ou quem seja sucessor ou responsável
pelo pagamento; e, se o executado for o mesmo e no mesmo juízo, podem-
se juntar várias execuções na mesma ação.
A execução iniciada pelo titular pode ser continuada por seus herdeiros,
pelo cessionário, substituto ou pelo Ministério Público (se houver interesse
público ou de incapaz envolvido).
Deve-se executar, em princípio, no foro do domicílio do executado; se não
se souber qual é ou onde esteja o executado, pode ser feita no domicílio do
exequente.
Inicialmente se precisa de um título executivo, que é um documento hábil a
gerar o direito contra o executado (contrato, título de crédito, sentença,
laudo arbitral etc.). Precisa ser certo (ter o an debeatur, ou seja, o “se
deve”) e ser líquido (ter o quantum debeatur, que é o “quanto deve”).
Todos os bens do executado, salvo os impenhoráveis, estão sujeitos à
execução – E acredite! O CPC leva quase “a alma” do devedor, alvejando
inclusive os bens que o executado ainda terá no futuro – por isso que, em
princípio, não é necessariamente inútil executar quem não tenha com o que
pagar, pois pode o executado estar em situação deficitária hoje, mas amanhã
pode vir a ter bens.
Um bem que tenha registro cartorário ou administrativo deve ter averbação
em caso de penhora, e a tentativa de venda desse bem é fraude à execução
por presunção; o terceiro que compra bem constrito em relação ao qual não
houve a averbação agiu presumivelmente de boa-fé; e, se adquirir bem que
não tenha registro, sendo este penhorado, deve provar que checou e teve
fundada certeza para acreditar que o bem estava livre para ser vendido. Um
terceiro que seja tido como em conluio para fraudar a execução deve ser
citado e terá 15 dias para embargar de terceiro.
Fiador (aquele que declara, no contrato, “se ele não pagar, eu pago!”) pode
indicar bens do afiançado para serem penhorados antes dos seus; e, se pagar
a dívida, nos próprios autos pode cobrar o devedor afiançado. E sócio pode
indicar bens da sociedade para serem constritos antes dos seus se a dívida
for da sociedade e, assim como o fiador, pode se ressarcir junto à sociedade
no mesmo processo.
Se o devedor faleceu, o herdeiro só responde pela dívida herdada do de
cujus na proporção da quota-parte da herança que recebeu.
Se quer uma execução célere e com o menor prejuízo possível para o
devedor, cabe a este indicar meios menos gravosos para a efetivação da
execução, se alegar excessos nesta.
Realização da penhora
Regra básica: pode-se penhorar qualquer coisa que tenha ou possa ter valor
econômico e não esteja sob alguma impenhorabilidade. Pode haver mais de
uma penhora sobre o mesmo bem. Quem promove penhora primeiramente
tem preferência no produto da arrematação.
A lei traz uma lista de bens impenhoráveis: os voluntariamente declarados
impenhoráveis (bem de família voluntário); os transferidos com cláusula de
inalienabilidade; os materiais de obras nesses bens; utilidades domésticas
necessárias à vida digna no lar, salvo se de elevado valor, ostentosos; bens
de uso pessoal e vestuário, salvo se de alto valor; remunerações (salvo se
for por dívida alimentícia, e por qualquer dívida até o limite de 50 salários-
mínimos); dinheiro em caderneta de poupança até 40 salários-mínimos
(exceto se for para dívida alimentícia, em que se pode penhorar o que
houver depositado); bens usados na profissão do executado; seguro de vida;
pequena propriedade rural, se trabalhada pela família; recursos públicos
recebidos por entes privados e aplicados compulsoriamente em educação,
saúde ou assistência social; recursos de fundo partidário dos partidos
políticos; créditos de venda de imóveis de incorporação imobiliária sob
afetação da obra.
Dívidas alimentícias são as decorrentes de pensão alimentícia (seja de
direito de família, seja de responsabilidade civil), bem como as oriundas de
crédito trabalhista de empregado da própria pessoa física; igualmente não é
impenhorável dívida concernente à aquisição do próprio bem, ainda que
este seja impenhorável; e frutos de bens impenhoráveis são penhoráveis, na
falta de outros bens.
Dentro do que se possa penhorar, uma ordem precisa ser observada:
dinheiro, títulos da dívida pública, títulos e valores mobiliários (debêntures,
bônus de subscrição, partes beneficiárias etc.) com cotação em mercado,
veículos terrestres, imóveis, móveis em geral, semoventes (são os móveis
por força própria; leiam-se animais vivos), navios e aeronaves, ações e
quotas de sociedades simples e empresariais (as simples são as que
trabalham com informação, tecnologia, atividade intelectual, artística; já as
empresariais são as que movimentam insumos, como mercadorias, matéria-
prima, produto acabado ou material de expediente), percentual de
faturamento de empresa devedora, pedras e metais preciosos, direitos em
promessa de compra e venda e alienação fiduciária (algo como o direito de
usar um carro que está financiado ao executado e sendo pago por este), e
outros direitos.
Essa ordem não é taxativa, e pode o executado pedir substituição de
penhora (em dez dias após a intimação desta) pelo bem que tiver liquidez
superior, na lista; para essa substituição, vale como dinheiro o seguro-
garantia e a fiança bancária. Se nada houver para ser penhorado, o oficial de
justiça listará os bens que guarnecem o imóvel, e ficarão estes sob depósito
do próprio executado, esperando decisão do juiz.
A penhora será física ou eletrônica. Bem imóvel penhorado deve gerar
intimação ao cônjuge do executado, a menos que tenha casado em regime
de separação de bens. Dinheiro, documentos com crédito e metais preciosos
ficam depositados no Banco do Brasil, Caixa Econômica ou banco estatal
de estado-membro, ou onde o juiz determinar. Penso que é erro crasso da lei
indicar banco para depósito; ficou parecendo lobby desses bancos na
lavratura do CPC.
O executado, na pessoa do seu advogado, é intimado da penhora efetuada;
será por citação pessoal ou por carta, se não tiver advogado constituído. É o
exequente que precisa promover o registro da penhora em cartórios e
repartições administrativas (quando se tratar de veículo) para que terceiros
não surjam depois protestando por haverem adquirido bem que não sabiam
ser litigioso.
O cônjuge ou o condômino do bem têm preferência na arrematação, em
igualdade de condições. Se o valor da venda não bastar para garantir ao
coproprietário ou cônjuge no valor da avaliação do bem, não haverá a
venda.
Se o executado obstar a entrada do oficial de justiça para a penhora, este
ingressará com força policial; e agora haverá dois oficiais de justiça, que
cumprirão o ato e ainda obterão a assinatura de duas testemunhas que
presenciaram o cumprimento.
A substituição por fiança bancária ou por seguro de garantia judicial terá
30% de acréscimo.
Se os bens tiverem seu valor variado durante o processo, pode haver
modificação e substituição de penhora a qualquer tempo.
Existe nova penhora se houver anulação ou se os bens penhorados não
bastarem ao pagamento da dívida; e, se os bens forem perecíveis ou
deterioráveis, proceder-se-á à venda antecipada ou, para aproveitar alguma
vantagem de ocasião, um preço melhor (a lei fala em “vantagem
manifesta”). A parte que requerer essa medida gerará oitiva da parte
contrária em três dias.
Se o dinheiro estiver depositado ou aplicado, será intimada a instituição;
cabe a ela tornar esse numerário, até o valor da execução, indisponível;
qualquer bloqueio além será desbloqueado por ordem do juiz, emitida em
até 24 horas após (a menos que esse desbloqueio seja automático e
determinado já na ordem inicial; acho que o legislador escutou muito
Grateful Dead e Bob Marley, nos respectivos climas das músicas, para
achar que a atuação judicial será tão pronta e rápida assim no
desbloqueio...).
Após o bloqueio, o executado é intimado, na pessoa do advogado, e terá
cinco dias para provar a impenhorabilidade daquele valor (pode ser o
salário caído na conta, por exemplo) ou que ainda é excessiva. O juiz
determina em 24 horas o bloqueio indevido, se assim a constrição for
enquadrada. Se for rejeitada ou nada alegar o executado, o dinheiro
bloqueado fica penhorado, e a instituição deve transferi-lo em 24 horas para
a conta do juízo. O bloqueio será retirado, e o dinheiro devolvido se, nesse
interregno, tiver havido o pagamento da dívida; qualquer dano causado pela
falta ou mau bloqueio é imputável à instituição, que arcará com as perdas e
danos.
Uma regrinha estranha e que me pareceu casuísta surge na lei: se o
executado for partido político, somente o numerário deste pode ser
bloqueado. Isso protege o valor dos políticos do partido, entendeu?...
Penhora de crédito ou de qualquer coisa que um terceiro tenha que pagar ao
executado, que esteja em posse do executado ou que seja deste, mas esteja
em poder de terceiro, deve ser notificada, via intimação a esse terceiro, bem
como ao próprio executado para imobilizar o direito, para colocá-lo à
disposição do exequente; frutos (aluguéis, royalties, juros) são penhoráveis.
Se o executado tiver algum direito a receber em alguma ação em trânsito,
penhora-se tal vantagem; é o que comumente se chama de “penhora no
rosto dos autos”. Embora tal nome não conste assim na lei, está plenamente
previsto e permitido. Se for tal vantagem diferente de dinheiro, o exequente
pode escolher entre ficar com a vantagem ou vender judicialmente a coisa,
desde que faça tal opção em até dez dias após a penhora.
Em havendo penhora de quotas ou ações de entes empresariais, a pessoa
jurídica tem três meses para liquidar o valor da participação do
sócio/acionista executado e entregar o produto a este. Tal valor virá da
compra da quota pelos sócios (que terão preferência) ou da venda desta a
terceiro.
Penhora de estabelecimentos terá nomeação de “administrador-depositário”,
que em dez dias apresenta plano de administração. Tal administrador é
escolhido pelo juiz ou pelas partes (na verdade, só é escolhido pelo juiz se
não houver acordo das partes), nada obstando que seja o próprio dono ou
sócio, se não houver qualquer oposição. Navios e aeronaves devem ter
seguro para continuarem operando após a penhora.
O que se objetiva é gerar dinheiro par apagar o exequente, devendo entregar
rendimentos e balanços mensalmente.
Embargos à Execução
Se houver qualquer matéria alegável contra a execução ou a penhora,
podem-se ingressar embargos à execução, que são um contraditório a esta.
Independentemente de custas ou de penhora prévia, deve ser ingressado no
prazo de 15 dias a contar da juntada aos autos do mandado de citação
cumprido.
Em sendo vários executados, da juntada de cada mandado individual,
começa a contar cada prazo. Diz a lei que em caso de os executados serem
cônjuges ou companheiros, conta da juntada do último – da juntada, e não
da data da citação.
Não existe prazo em dobro para litisconsorte com diferentes advogados,
nem se forem de escritórios diversos.
Aprendemos que pode haver colaboração de juízos, por meio de carta
rogatório, de precatória e de ordem, certo? Bem, se os embargos se
fundarem em defeitos da penhora, avaliação ou venda dos bens, o prazo de
quinze dias se contará da juntada, nessa carta, da certificação da citação no
juízo rogado, deprecado ou ordenado. Mas, se os embargos tratarem de
outra matéria (como falsidade do título ou inexistência da dívida, por
exemplo), terá como prazo inicial a juntada aos autos do juízo original
(rogante, deprecante, juízo originário) da carta com a citação cumprida.
Vício de penhora ou avaliação não precisam de embargo, sendo alegados
por petição simples, em 15 dias do ato.
Excesso de execução é cobrança mais do que for devido. Excesso de
penhora é causada pelo ato de constrição, embora com valor correto dessa
execução.
Excesso de execução é valor, momento ou modo indevido de execução.
Divergência de valor precisa vir acompanhada de cálculo detalhado; e –
repito –, se for parcial, com pagamento do que entenda cabível, sob pena de
rejeição liminar.
Se o executado tiver feito obras no bem, deve ingressar embargos de
retenção por benfeitorias (se, conforme a lei civil, couber direito de
retenção; em meu livro “Direito Civil sem estresse!” detalho isso);
igualmente já deve constar o cálculo correspondente; isso não impede a
entrada do exequente na posse, desde que preste caução.
Ao menos quando eu advogava, essa balela de “caução idônea” se resolvia
com a juntada de uma nota promissória, por vezes fajuta (sem qualquer
lastro para pagamento), aos autos; era o que eu presenciava vez ou outra.
Embargos para ganhar tempo são tidos como protelatórios e serão
igualmente indeferidos, não terão efeito suspensivo, a menos que requeridos
e sob convencimento do magistrado e com prestação de caução ou penhora
– Isso mesmo! Não precisa penhora para embargar, mas, pela lei, é
necessária para conseguir efeito suspensivo, embora, a meu ver, o juiz possa
dar efeito suspensivo mesmo sem garantia, se entender cabível. Se for
procedente e o bem já tiver sido vendido, “morre” em perdas e danos, como
expliquei.
O embargado (que é o exequente) terá 15 dias para se manifestar sobre os
embargos, que irão para julgamento.
Haverá majoração dos honorários de sucumbência no caso de
improcedência dos embargos (sim, castigo por haver embargado!)m as
lembro que, segundo o Enunciado 51 da ENFAM, a majoração (para 20 por
cento) de honorários advocatícios prevista para rejeição aos Embargos à
Execução (que é usada quando se executa título extrajudicial) não se aplica
à impugnação ao cumprimento de sentença.
Suspensão da execução
Algo que pode ocorrer, e ocorre, é o executado não ter bens penhoráveis ou,
se os tem, não serem localizados. Nesse caso, suspende-se a execução pelo
prazo de um ano, depois do qual o processo é arquivado; e será
desarquivado a qualquer momento, surgindo bens. Aqui surge um
fenômeno: a prescrição intercorrente. O prazo de prescrição da dívida será
zerado, voltando a correr do início. Se prescrever, o processo é baixado
(depois de se ouvirem as partes, no prazo de 15 dias, afinal pode ser que
tenha havido pagamento “por fora” ou que o executado mudou sua situação
econômica e tenha resolvido pagar, mas, pelo tempo transcorrido, já
“esqueceu” o processo), gerando uma “execução negativa”, que é a
execução infrutífera, e terá entrado na conta da margem de risco do
exequente ao ter concedido o crédito, lá na origem deste, ao executado.
Igualmente se suspende a execução se houver embargos com efeito
suspensivo ou se os bens penhorados não forem vendidos e o exequente não
os quiser em 15 dias; ou quando se conceder a “moratória”; ou, ainda, por
simples acordo das partes para que o devedor salde seu débito, por acordo
judicial ou extrajudicial.
O fim da execução decorre de sentença e se dará com o pagamento do
crédito, extinção da obrigação por qualquer meio, renúncia do crédito,
prescrição ou indeferimento da inicial. Quando me refiro à extinção da
obrigação por qualquer meio, aludo à remissão (perdão da dívida),
compensação, confusão, sub-rogação, novação ou dação.
Execução de alimentos
O exequente precisa escolher se fará a execução direta patrimonial ou a
indireta pessoal (mediante prisão). Uma exclui a outra, nessa fase inicial.
Para se promover a prisão do devedor de alimentos, precisa haver
inadimplemento das três últimas parcelas, visto que a prisão é decorrência
do imediatismo da necessidade – presume-se que o alimentando, credor,
esteja em necessidade em último grau, daí se prende o devedor para que ele
pague (não se “pagam os alimentos” com a prisão!); se ele pagar, será solto.
Aqui, pensamos, faltou o vocábulo “imediatamente”. Nos termos estritos da
lei, dá a entender que caberia o prazo geral do CPC, cinco dias, para a
soltura, o que entendo ser um absurdo.
A execução patrimonial tem lugar em dois possíveis momentos: no início
da execução, se o credor assim preferir, ou após a soltura, para que o
devedor pague o restante da dívida (lembre que é só as três últimas
prestações que autorizaram a prisão, podendo a dívida ser bem anterior),
bem como as prestações que se deveram durante a prisão – aliás, se estas
amontarem três meses, autorizam... sim... nova prisão.
Determina o CC que tal preso fique em cela separada – não é um preso
criminal, afinal –, e a dívida de alimentos pode ser anotada diretamente na
folha de pagamento deste, se tiver emprego (civil, estatutário, militar).
A lei permite ainda que o devedor empregue o credor para que receba o
salário como pensão.
Recursos
O inconformismo ocorre por vários motivos, pessoais e práticos.
Quanto à ordem pessoal, é natural do ser humano não se conformar com um
“não”. O primeiro pensamento é que o juiz errou ou dolosamente julgou
contrário ao seu interesse. O recurso, aqui, diminui essa frustração, gerando
o conhecimento de que “é menos provável que tenha havido algum desvio
de certeza, já que dois julgadores pensaram igualmente”.
Para o próprio Estado, é interessante que haja recurso, para que dê a
Leviathan a certeza, ainda que formal, que não foi praticada injustiça contra
o súdito que, na República, é o próprio cidadão.
Gera-se um escopo político de saber qual magistrado tem mais ou menos
suas decisões reformada, abrindo a discussão sobre algum que possa estar
com excesso inaceitável de erros.
Enfim, o recurso não deve e jamais deveria ser satanizado, como fazem os
defensores da preguiça judiciária, aqueles que ficam alegando “excesso de
recurso” para justificar lentidão nos seus trabalhos.
Organização judiciária
O Poder Judiciário, encarregado de exercer a jurisdição, ou seja, manter e
impor o cumprimento das regras de direito, é uma organização, chamada de
“organização judiciária”, que, na verdade, é um sistema.
A forma existente para que haja alguma limitação no exercício do poder
pelas três instituições é conhecida como sistema de “freios e contrapesos”,
ou, como no jargão clássico, checks and balances, em que os dirigentes de
cada um dos Poderes têm, em algum momento da investidura, submissão ao
crivo de outro Poder. Assim, por exemplo, o presidente do STJ é escolhido
pelo presidente da República, dentre nomes oriundos de determinada lista;
há, portanto, uma interação, uma intervenção legalmente prevista de um
Poder nos outros para que nenhum deles se torne absoluto.
Tal sistema possui vantagem e desvantagem.
Há a vantagem de não deixar que cada Poder se feche nele mesmo sem dar
aos demais notícia mínima sobre seus negócios, havendo assim uma
limitação da própria independência, fazendo que nenhum dos Poderes
“esqueça” que é parte de um todo unitário, chamado Estado.
A desvantagem é que, como agente dos Poderes, temos seres humanos,
suscetíveis às fraquezas de tal natureza. Assim, pode acontecer que um
membro do Judiciário ou do Ministério Público sinta-se em débito, devendo
favor para com o chefe do Executivo que o escolheu; isso basta para poder
mitigar a independência e aniquila a liberdade de julgamento e apreciação
que deve existir no Judiciário.
Como eu disse, o Judiciário é um sistema, formado de elementos, e possui
divisões verticais e horizontais; assim, vejamos:
Horizontalmente, o Judiciário se divide em Justiça Comum e Justiça
Especializada. A Justiça Comum se divide em Justiça Estadual e Justiça
Federal. A Justiça Especializada se divide em Justiça do Trabalho, Justiça
Eleitoral e Justiça Militar.
Verticalmente, o Poder Judiciário se divide em instâncias. Horizontalmente
o Judiciário se divide em especialidades. As instâncias (divisão vertical) são
a seguintes: Primeira Instância, Segunda Instância, Instância Especial e
Instância Extraordinária. Existe a expressão “Instâncias Extraordinárias”
quando se quer referir à terceira e à quarta instâncias (em que só se discute
direito e teses, mas não fatos ou provas), em oposição às “Instâncias
Ordinárias”, que seriam a primeira e a segunda, visto que nestas se discute
fato e direito, reanalisando provas, inclusive.
A partir da Segunda Instância, os órgãos julgadores são colegiados, ou seja,
integrados por mais de um julgador; tais órgãos são chamados de Tribunais
(na Justiça Militar alguns são chamados de Conselhos de Justiça).
Grau significa nível de julgamento. Assim, um julgamento inicial é
chamado de primeiro grau. O “rejulgamento” desse caso se dá em segundo
grau. Caso haja um novo julgamento desse “rejulgamento”, haverá um
segundo grau em relação a esse “rejulgamento”. E assim por diante. Ou
seja: só existem dois graus. Primeiro e segundo. Só!
Já instância significa nível do órgão julgador na estrutura judiciária. Assim,
grau relaciona-se com a origem da decisão, ao passo que “instância” se
refere à posição do órgão julgador na organização judiciária; temos quatro
instâncias no Judiciário, em regra.
Relator do recurso
O relator atuará como um verdadeiro juiz de primeiro grau; será ele que fará
o juízo de admissibilidade, medidas urgentes, podendo, desde já, a depender
do recurso, aplicar penalidade de recurso protelatório; pode requisitar
informações, mandar baixar a peça, carrear novas provas se entender
cabíveis, dentre outras medidas.
Diz o Enunciado 81 do FPPC que “Por não haver prejuízo ao contraditório,
é dispensável a oitiva do recorrido antes do provimento monocrático do
recurso, quando a decisão recorrida: (a) indeferir a inicial; (b) indeferir
liminarmente a justiça gratuita; ou (c) alterar liminarmente o valor da
causa.“
Prelibação e delibação
Juízo de “prelibação” é análise de admissibilidade, se foram superadas as
barreiras e atendidas as exigências para ser apreciado (em sede de recurso,
diz-se que foi conhecido ou não conhecido); seguir-se-á agora o juízo de
delibação, ou juízo de mérito (no caso de recurso, será provido ou
improvido).
Recursos em espécie
Apelação
É o recurso cabível de sentença, regra geral, que vale para o procedimento
comum e de execução.
Na tradição forense, uma apelação começa com um frontispício, que é a
petição, em que se requer o acolhimento do recurso para apreciação. Logo
após, temos as razões de apelação. Alguns advogados iniciam com um
resumo da decisão a ser apelada, embora isso não seja legalmente
necessário; isso pode ser indicado em cada tópico das razões.
A parte preliminar da apelação deve conter os motivos de mudança ou
anulação das decisões interlocutórias das quais não caiba agravo, já que não
precluem.
Nas contrarrazões da apelação, que é o contraditório desse recurso, o
apelado igualmente alegará em preliminares as impugnações às decisões
interlocutórias não cobertas por agravo; e, nesse caso, o recorrente será
intimado para seu contraditório sobre essas questões.
São suscitados em preliminar de apelação ou em preliminar de
contrarrazões (1.009, par. 5.º).
Se em grau inferior foi reconhecida decadência ou prescrição, o tribunal
que julgar a apelação julga o mérito, sem mais “mandar baixar o feito”
(1.013, par. 4.o).
A parte da sentença (que chamamos capítulo) da sentença que se refere à
tutela provisória (confirma, concede, modifica ou revoga) é impugnável por
apelação (1.013, par. 5.o).
Apelação adesiva
Não é um novo recurso; é um meio pelo qual se pode recorrer e apelar, caso
não se tenha feito, no prazo das contrarrazões.
Na apelação adesiva, ocorre o previsto na Teoria dos Jogos:
1 - Tício pediu 10 mil reais em face de Caio.
2 - Tício obteve, na sentença, 5 mil – está no prazo de recurso.
3 - Se Tício não recorrer, e Caio não recorrer, Tício terá um título de 5 mil.
4 - Mas, se Tício recorrer para aumentar a condenação para 10 mil, corre o
risco de, com apelação adesiva, Caio recorrer para baixar ou cassar a
condenação.
5 - Tício, então, terá que decidir essa “escolha de Sofia”, em um template
de teoria dos jogos muito parecido com o clássico “dilema do prisioneiro”.
Se eu fosse advogado de Tício, aconselhar-lhe-ia a não recorrer. Pois, se
Caio recorrer para diminuir ou cassar a condenação, Tício poderá apelar
adesivamente, igualmente, para aumentá-la, ficando com o mesmo risco,
em tese, do que se tivesse recorrido inicialmente.
Embargos de declaração (acho mais legal que “Embargos
Declaratórios”!)
É um recurso estranho, pois é indicado na lei como recurso, mas não possui
originalmente o condão de mudar a consequência da decisão, mas sim de
integrá-la.
É cabível contra qualquer decisão obscura, contraditória, ininteligível,
incompleta ou com erro material.
Possui prazo de cinco dias úteis para interposição (e não 15, como os
demais!), a qual interrompe o prazo para os demais recursos (atenção: a
regra dos Juizados Especiais, em que lá suspendem o prazo, continua
valendo!). Geralmente deixa este com raiva, no melhor estilo “Esse
advogado imbecil não entendeu o que eu decidi?”); não tem custas e deve
conter tão exatamente quanto possível o defeito da decisão, para que possa
ser consertada.
Vale o prazo em dobro para litisconsórcio com advogados distintos, sendo
estes de escritórios/sociedades diversas. O julgador, ao receber esse recurso,
poderá admiti-lo, inadmiti-lo.
Os embargos declaratórios interrompem o prazo para o ingresso do próximo
recurso. Não! Nem pense em usá-lo para “ganhar tempo”, pois existe multa
para embargos protelatórios (2% sobre valor atualizado da causa, e 10% na
reiteração do embargo); e – pior! – aplicada sob crivo inquisitório, ou seja,
o próprio juiz “acusa e decide” sobre ela. A interposição do próximo
recurso fica dependendo do pagamento dessa multa, exceto para o
beneficiário da gratuidade de justiça (sim, até para a imunidade à punição
da ilicitude serve tal gratuidade); e, após dois embargos seguidos
considerados protelatórios, um terceiro não será admitido.
Efeito suspensivo nos embargos... poderá haver ou não. Originalmente não
há. Isso depende de pedido e convencimento do relator ou do órgão
colegiado. Quando me refiro a “Órgão Colegiado”, estou-me referindo à
Câmara, Turma, Seção ou Pleno, a depender de quem exarou a decisão
embargada. Em se demonstrando que haverá dano grave ou de difícil
reparação se não houver suspensão do feito para julgamento do recurso,
este continuará a fluir enquanto os embargos são julgados.
Uma curiosidade que nunca engoli é que os sujeitos de tal recurso são
“embargante” e “embargado” embora, em rigor, o embargado seja o
julgador, já que foi ele que lavrou a decisão supostamente incompleta ou
defeituosa.
Os embargos de declaração são formalmente recursos, embora não se
destinem a, diretamente, modificar a decisão.
Podem ser usados, na prática, com efeito modificativo. Nesse caso, o
julgador deve abrir oportunidade de contraditório à parte contrária. Esse
contraditório terá duas naturezas: tanto o embargante defenderá a própria
decisão no que toca à forma (alegando que está completa e inteligível),
quanto ao próprio efeito modificativo, ou seja, quanto ao possível efeito
negativo em sua esfera jurídica. Pode ser que, ao receber os embargos, o
relator entenda que não só incidiria efeito modificativo, como este deve ser
submetido ao pleno. Nesse caso, a lei permite que se transformem os
embargos em agravos internos, desde que se dê à parte contrária a
oportunidade de exarar sua manifestação; dessa feita, já como agravo
interno.
Dentre as várias barreiras “Não perturbe” dos Tribunais Superiores, está a
exigência de pré-questionamento, que, resumidamente, é assim:
Só se podem entregar à apreciação dos Tribunais Superiores situações
inteiramente analisadas pelo julgamento interior.
Era ido dos anos 90 quando alguém descobriu que, se a matéria não fosse
totalmente analisada nas instâncias ordinárias, poderia ser barrada nas
instâncias superiores. Surgiria mais uma barreira: o pré-questionamento.
Como igualmente há outra barreira “Não perturbe”, que manda que não se
admita recurso se houver mais de um fundamento recorrível e não se
recorrer de todos, desde a apelação se precisa recorrer de todo o necessário,
sob pena de sequer haver o que é pré-questionado; e isso possa ser usado
pela instância superior para inadmitir o recurso.
É ingressado como embargos de declaração, mas, se for conhecido para
análise, se transmutará em se; haverá manifestação da parte contrária (cinco
dias).
Lembro que, no termos do Enunciado 360 do FPPC, “A não oposição de
embargos de declaração em caso de erro material na decisão não impede
sua correção a qualquer tempo.”
Agravo de instrumento
Cabe de algumas decisões interlocutórias.
Algumas dessas interlocutórias agraváveis são abertas: “versem sobre...”;
outras são fechadas indicando exatamente o ato agravável.
Basicamente voltamos aos anos 30 e 40. No código de 1939, o rol de
recursos contra decisões interlocutórias era fechado, assim como o era no
Código de Processo Penal de 1941 (naquele processo, tal recurso se chama
“Recurso em Sentido Estrito”).
É que no CPC de 1973, o agravo de instrumento ficou mais simples e
inteligente: era cabível contra qualquer decisão interlocutória, só isso, fácil.
Depois começaram a complicar e criar agravos para fins especiais disso e
daquilo, e a coisa foi tomando proporções detalhadas que beiravam o
ridículo.
Infelizmente, estamos ainda nessa fase de retrocesso, e o Novo CPC não
ajuda: trouxe um famigerado “rol”, um “Cabe agravo de instrumento contra
as decisões interlocutórias que versarem sobre:”. Segue a lista:
Tutelas provisórias – Note que, não é sobre “concessão ou negativa”, mas
“que versem sobre”, aqui é uma cláusula aberta mesmo.
Mérito do processo – É uma “apelação anã” neste caso. Já que questões de
mérito podem ser resolvidas por decisões interlocutória, e classicamente
contra decisão de mérito cabe apelação, mas não se pode apelar aqui porque
não é sentença... cabe agravo de instrumento!
Rejeição da alegação de convenção de arbitragem – Agora temos um ato
específico, já não é “que verse sobre”, mas uma situação pontual. Na minha
opinião, dá para interpretar vários atos que textualmente não seja “rejeição”
como pura rejeição mesmo: como o ato que torne a aceitação da convenção
arbitral tão dificultosa (como exigências de documentos ou justificativas)
que acabe por rejeitá-la de fato.
Incidente de desconsideração da personalidade jurídica – Um prato cheio
para os mal-intencionados ganharem tempo.
Rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de
sua revogação – melhor andaria o texto se tivesse dito “rejeição ou
acolhimento...”.
Exibição ou posse de documento ou coisa – Embora não esteja claro no
texto, podemos entender que abrange a ordem, cumprimento da ordem e
forma da exibição do documento.
Exclusão de litisconsorte – Podendo ser manejado tanto pelo litisconsorte
que não queria ser excluído quanto pelo já participante da lide que não o
quer excluído, isso no caso de determinação de exclusão. Mas entendo que
“exclusão de litisconsorte” pode significar também a que nega a exclusão,
já que o caput do artigo nos diz “que versem sobre”.
Rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio – É naquele caso onde se
requer a cisão de litisconsórcio para, na ótica de quem requer, facilitar a
defesa do processo. Pode dar ensejo até a Recurso Extraordinário, já que, na
prática, a não cisão de litisconsórcio pode representar a própria obstrução
da defesa.
Admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros – O fato de não
constar na lei apenas “intervenção de terceiros”, que nos remeteria a
qualquer versão que tocasse a matéria, pode sugerir que não podemos
discutir sobre o modo ou em qual modalidade a intervenção de terceiro
ocorrerá em uma situação em tela. Penso ser plenamente cabível para
discutir se a intervenção é uma assistência simples ou litisconsorcial, por
exemplo.
Concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à
execução – Penso que deveria versar sobre qualquer efeito suspensivo,
quanto à sua concessão ou negativa, mas preferiu a lei deixar cabível só
sobre esses embargos. Triste.
Redistribuição do ônus da prova – Trata-se de discussão sobre a
dinamização do “ônus probandi”. Basicamente três questões cabem aqui: se
é cabível dinamização ou não no caso em tela; sobre quem prova o que e
quem arca financeiramente com as provas, independente de quem as deva
produzir.
Liquidação de sentença – Seja que trate sobre qual das formas ou sobre a
sua operacionalização, incluindo, penso, metodologia para cálculo de
atualizações de valores.
Processo de Execução – O Código, no parágrafo único do artigo 1.016 nos
diz “contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de
sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no
processo de inventário. ” – Ora, então deixou o flanco aberto para
entendermos que, em qualquer decisão que não seja sentença em execução,
cabe agravo de instrumento!
Inventário – Penso ser cabível em arrolamento ou qualquer processo de
herança. O flanco parece simples, mas não é: em inventário, dezenas de
situações recorríveis, que não seja sentença, podem ocorrer; e se pensarmos
que algumas delas são “enviadas às vias ordinárias”, ou seja, ao
procedimento comum, podemos interpretar que essas decisões, do
procedimento comum, sejam quais forem, estão tratando sobre o inventário,
ora! Ou seja, nessas questões, caberão para tudo o que não for sentença, se
forem processos acessórios ou motivados por inventário. É como penso.
“Outros casos expressamente referidos em lei” – Essa cláusula pode ser
interpretada de “quinhentas” maneiras diferentes, até para a situação de
decisão interlocutória onde não caiba recurso. Basta entender que por sede
constitucional há o duplo grau de jurisdição, então, basta fazer a ginástica
de enquadramento (já que Constituição é Lei, a Lei maior) e... Shazan!
Temos um “caso referido em lei” para o agravo de instrumento.
O agravo é dirigido ao tribunal, e não ao julgador que proferiu a decisão,
deve conter todos os dados, fatos, razões, motivo de mudança da decisão e
dados dos advogados da causa. Deve constar a prova de tempestividade e
todos os documentos necessários a embasar o pleito e do preparo (custas).
O relator pode mandar emendar (3 dias) e, estando conforme, o relator tem
vários posicionamentos: pode atribuir efeito suspensivo, se foi requerido,
antecipar tutela, tomar medidas urgentes, etc.
Intimando o agravado, este terá 15 dias para as contrarrazões, podendo
juntar documentos, intimará o MP se for necessário (causa que envolva
interesse público ou de incapaz), e pede dia para julgamento no tribunal,
segundo o Código “não superior a um mês” a contar da intimação do
agravo.
As decisões interlocutórias proferidas antes da sentença, das quais não caiba
agravo de instrumento, não precluem, e podem ser suscitadas em preliminar
de apelação.
Bem, isso não é tão simples quanto parece.
Existem decisões interlocutórias decorrentes uma da outra, e algumas que
geram consequência direta na sentença.
Precisa-se, sim, de algum recurso para que fique registrado o protesto ao
menos, assim que a decisão for proferida, nem que fique marcada para
todos que poderá ser eventualmente apelada. Esse recurso não foi previsto
no CPC, mas é muito inseguro deixar tudo em aberto. Isso pode gerar
celeuma da qual não duvido que logo surgirá decisão superior organizando
o que bem poderia ter sido feito na lei.
Remessa necessária
A “remessa necessária” (finalmente um nome oficial; minha geração
chamava isso de “duplo grau obrigatório”, “recurso de ofício”, “remessa de
ofício” etc.) era regra até há pouco tempo: decisão contrária à Fazenda
Pública precisava ser confirmada pela instância imediatamente superior,
devido à indisponibilidade do interesse público e da supremacia deste em
relação ao interesse privado do vitorioso.
Agora, não cabe remessa necessária se o julgamento seguiu “jurisprudência
vinculante”, a saber, algo decidido em incidente de resolução de demandas
repetitivas, súmulas de tribunal superior ou jurisprudência administrativa.
Lembro que, quando o Estado não recorre, então é que surge o duplo grau;
se houver recurso voluntário, não há que se falar em “remessa necessária”,
pois será voluntária.
Recurso ordinário
Quando os mandados de segurança, os habeas data e os mandados de
injunção forem originalmente julgados por algum tribunal superior, a
“apelação” para o STF chama-se “Recurso Ordinário”, ou “ROC” (Recurso
Ordinário Constitucional); o termo “constitucional” é para diferenciar do
“Recurso Ordinário” da Justiça do Trabalho.
Da mesma forma, o equivalente à “apelação” para o Mandado de Segurança
quando originalmente julgado na segunda instância, a saber, tribunais de
justiça e regionais federais.
É um cabimento completamente diferente e assimétrico, quando houver
processo em que litiguem como entes internos município ou pessoa
residente aqui no País em um polo da lide, e no outro figure Estado
estrangeiro ou organismo internacional. O recurso é só contra decisão final,
visto que, para as decisões interlocutórias, caberá agravo de instrumento
para o STJ, se a decisão for uma daquelas agraváveis. São ingressados no
juízo de origem e só irão para julgamento para o STJ (sem juízo de
admissibilidade, que caberá ao juízo ad quem) após a juntada das
contrarrazões, apresentáveis no prazo de 15 dias.
Pode-se julgar imediatamente quando se tenha os elementos para tal, até
liminarmente, assim como pode ser concedido, mediante pedido
fundamentado, efeito suspensivo, até liminarmente.
Ao trâmite desse recurso, assim como no agravo, aplica-se a tramitação
regimental.
Embargos de divergência
Esse recurso visa também obter jurisprudência uniformizada. Incide nos
recursos especial e extraordinário, que forem julgados em órgão fracionário
(turma, câmara ou seção) que divergir do julgamento de qualquer outro
órgão do mesmo tribunal, sendo os acórdãos embargados e paradigmas (o
que se toma como referência) de mérito. Divergência entre órgãos, ou
destes com o tribunal, aliás, até do próprio órgão fracionário se este tiver
tido julgado em outro sentido e desde tal julgado tenha mudado mais da
metade de sua composição; em situações que, a depender do caso, será de
admissibilidade, de mérito ou de apreciação de controvérsia. O que importa
é que tenha sido de decisão do tribunal, não importando se era recurso ou
ação originária.
Deve ser divergência sobre a aplicação de direito; jamais sobre fundamento
ou teses filosóficas ou metajurídicas.
A divergência se provará com menção de repositório autorizado, físico ou
eletrônico, com julgados e certidões, se precisar, bem como a narrativa e o
enquadramento, o mais detalhado quanto se faça necessário, do nexo entre o
fato sob julgamento e aquele que deu origem ao paradigma.
A inadmissão de recurso não pode ter fundamento genérico de que “os fatos
apresentados diferem os precedentes invocados”. Deve-se, nesse caso,
descrever a distinção suficientemente detalhada que justifique a inadmissão.
Não nos iludamos: várias e várias súmulas surgindo para impedir subida e
admissão de recursos em 3... 2... 1...
Não se imiscui o Código no procedimento do julgamento, jogando o rito
para os regimentos internos.
No âmbito do STJ, embargos de divergência interrompem o prazo para o
recurso extraordinário. E, se “A” ingressa com recurso extraordinário, e a
parte contrária ingressou com embargo de divergência, em sendo este
improvido, se destrava o julgamento do recurso extraordinário.
Só cabe para julgamento de órgão fracionário.
Agravo interno
É um recurso que cabe contra decisão monocrática, para que esta seja
submetida à votação do órgão colegiado. Com o apontamento preciso da(s)
falha(s) alegada(s) e razões da modificação, seguirá o regimento da Casa
para julgamento.
Tem prazo para interposição de 15 dias, com manifestação da parte
contrária em igual prazo, podendo o autor da decisão retratar-se ou enviar a
matéria para o julgamento colegiado.
Esse agravo pode ser reputado manifestamente inadmissível (quanto ao que
seja isso, só Bob Dylan para responder de novo, cantando “The answer, my
friend, is blowing in the wind...”); ou se, por unanimidade, for julgado
improcedente, haverá condenação do agravante em multa entre 1% e 5% do
valor atualizado da causa, no espírito “Pega, leso! Quem mandou recorrer?”
que se possa imaginar – novamente o beneficiário da justiça gratuita está
isento dessa pena, digo, do cumprimento dela, e a Fazenda Pública só
pagará tal multa ao fim.
Diz a lei que “é vedado ao relator limitar-se à reprodução dos fundamentos
da decisão agravada para julgar improcedente o agravo interno” – isso
significa que das duas uma: ou o relator carreia mais razões para
fundamentar sua anterior decisão, ou se vale de fundamento trazido pela
parte recorrida (que, obviamente, vai sustentá-la) para “perfumar” o que
decidiu.
Mandado de segurança
Um meio de impugnação de decisão judicial, em que não caiba
originalmente recurso, é o mandado de segurança (Lei 12.016/2009). É
usado para proteger direito “líquido e certo”. Direito “líquido e certo”,
como me ensinou meu professor João Braga, é o que “se prova de plano”; é
o que já tem prova pré-constituída, documental, pronta. Não cabe onde se
possa usar habeas corpus ou habeas data.
Precisa haver uma autoridade que cometa alguma ilegalidade, ou esteja para
cometê-la, como pressuposto básico. “Autoridade” aqui é agente público
com poder de comando sobre o cidadão.
Não cabe contra ato de gestão empresarial, por já ser questão de estratégia
de mercado, não de ato de império estatal.
Pode ser individual ou coletivo.
Não pode ser usado como substituto recursal, nem para conseguir efeito
suspensivo a recurso cuja norma desse recurso contenha a hipótese de
concessão de efeito suspensivo. Nem cabe contra coisa julgada.
A petição deve ser elaborada em duas vias, sendo a segunda com cópias dos
documentos, inclusive. Se já existir documento, mas estiver em poder
alheio, o juiz pode emitir ordem para que seja apresentado em dez dias.
Qualquer defeito processual que autorizaria extinção de processo sem
julgamento de mérito (é só lembrar do que possa ser alegado em preliminar
de contestação) igualmente fulmina MS. Se for extinto sem julgamento de
mérito, mas ainda estiver no prazo de 120 dias da violação, ainda se pode
reingressar o MS.
O prazo para ingresso é de até 120 dias da ciência da violação do direito.
Não cabem honorários advocatícios de sucumbência, segundo a lei, mas é
cabível condenação por má-fé.
O juiz, no despacho inicial, já pode conceder liminar, exigindo ou não
caução do impetrante. O coator prestará informações em dez dias. O recurso
cabível aqui é agravo.
Envolvendo dinheiro, vantagem a servidores públicos ou liberação de
mercadorias do exterior, não se concede liminar.
Concedida a liminar, não pode o impetrante se acomodar, atrasar por mais
de três dias atos que lhe caibam praticar para dar andamento ao processo;
decreta-se a perempção e revoga-se a liminar.
A autoridade pública, em 48 horas da notificação da ordem, envia o caso à
sua procuradoria jurídica, para tentar impugná-la. A sentença é apelável.
Tem duplo grau obrigatório. Recurso voluntário pode vir da entidade ou da
autoridade. A menos que seja vedada medida liminar, pode ter execução
provisória.
A lei do MS está cheia de mecanismos para tirar o menos dinheiro possível
do erário, se houve violação funcional de servidor público.
Há mecanismo político de impedir eficácia de MS, por meio de “suspensão
de segurança”. Não basta ser legal e jurídico; se a ordem gerar “grave lesão
à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas”, o presidente do
tribunal cassa a execução da liminar, e – pasme! – cabe novo pedido desse à
próxima instância. E liminares iguais podem ser suspensas com uma
canetada apenas; e recurso contra essa suspensão não tem “efeito
suspensivo”, ou seja, não tem o condão de “destravar” a suspensão senão
após total julgamento.
É uma briga desigual mesmo.
Os recursos são diferentes: se a instância originária for tribunal, o recurso é
Extraordinário ou Especial; se for concedido, Recurso Ordinário (também
chamado de “Recurso Ordinário Constitucional” ou ainda “ROC” – tudo
isso para diferenciar do “Recurso Ordinário” da Justiça do Trabalho).
Ainda que não tendo conseguido a ordem, o impetrante pode tentar obter
seu direito por ação ordinária.
Partido político, sindicato, associação com mais de um ano podem impetrar
MS coletivo, ao qual só se concede liminar após oitiva da parte contrária,
previamente.
Descumprir ordem originada de mandado de segurança é crime de
desobediência, com pena de 15 dias a seis meses de detenção e multa.
5
Procedimentos
Especiais
5 PROCEDIMENTOS ESPECIAIS
Por qual razão existem “procedimentos especiais”? Não seria mais simples
jogar tudo para “ritão”? Bem, alguns existem por questões histórias, outros
(a maioria deles) devido às peculiaridades de cada caso. Aliás, se lermos
direito, perceberemos que procedimentos especiais nada mais são do que
partes determinadas do procedimento comuns contendo a especialidade –
geralmente no início.
O fato é que nenhum – nenhum! – dos procedimentos especiais existe
isoladamente. Ou se trata de procedimento comum com a especialidade do
procedimento específico ou um procedimento começa especial e se torna
comum; ou, em algum momento do procedimento especial, ele se socorre
do procedimento comum. Lembro que, segundo o Enunciado 422 do FPPC,
“A tutela de evidência é compatível com os procedimentos especiais.”
Ações possessórias
Posse é o exercício de fato de um ou alguns dos poderes da propriedade
(usar, gozar, dispor ou reaver o bem). A posse que deve ser repelida é a
posse injusta, ou seja, a violenta, clandestina ou precária. Como afirmei em
meu livro “Direito Civil sem estresse!”, “Posse violenta é a posse mediante
força ou grave ameaça. Posse clandestina é a posse sorrateira, tomada de
inopino, em segredo, “na calada da noite” ou algo parecido. Posso precária
é aquela que se originou de um ato de confiança, em que o detentor se
arvorou a tornar-se possuidor, quebrando a confiança nele depositada – é
não devolver no momento devido.”
Essa posse injusta que tenha até um ano e um dia (inclusive) é chamada de
posse nova (ou de força nova); a que tiver mais desse tempo é chamada de
posse velha (ou de força velha) – essa divisão teria efeito processual, visto
que a posse nova permite, em princípio, liminar; já após tal lapso, só gerará
efeito ou por outro tipo de tutela provisória ou após o trânsito em julgado.
Socorrendo-me ao meu livro “Direito Civil sem estresse!”, explico que “A
posse está sujeita a esbulho, turbação e ameaça. O esbulho ocorre quando o
possuidor é despojado do poder físico sobre o bem. Para tal infortúnio,
existe a ação de reintegração de posse. A turbação ocorre quando o
possuidor é despojado parcialmente do poder físico sobre o bem (é o caso
do invasor que não expulsa o possuidor, mas passa a habitar no bem junto
com ele, contra a vontade deste). Para tal infortúnio, existe a ação de
manutenção de posse. A ameaça é o infortúnio de promessa de esbulho ou
de turbação perpetrada por alguém. Para a proteção contra o possível futuro
ato violador, existe a ação “interdito proibitório”.” A ordem resultante do
interdito proibitório é para que cesse acompanhado de cominação de multa
em caso de descumprimento. É uma multa única ou periódica.
Existe a fungibilidade das medidas possessórias, pois pode ser que, no
momento do protocolo, tenha havido uma ameaça; e, até a petição ser
apreciada pelo juiz, a invasão já se consumou; nesse caso, por simples
petição, na mesma ação, pede-se a medida de reintegração ou manutenção
de posse. O contrário é verdadeiro: pode ser que a ação tenha sido ajuizada
como reintegração de posse; e, até a análise da inicial pelo magistrado, o
invasor saiu do imóvel, mas ficou ameaçando voltar – nesse caso se pede a
convolação em interdito proibitório.
Trata-se de ação dúplice, em que o juiz, ao negar a tutela possessória a um,
afirma que a posse é do outro; e, a menos que o bem em disputa seja
reivindicado por terceira pessoa ou se deseje provar que não cabe a
propriedade à terceira pessoa além das partes, não pode uma parte contra a
outra alegar propriedade. A lei tutela mais quem usa e cuida do que quem se
diz dono, a ponto de ser possível a propriedade caber a um deles, mas a
posse legítima caber ao outro.
Se a ocupação foi coletiva, cita-se quem se conheça do local; e, por edital,
os demais invasores; digo, ocupantes irregulares; informa-se também ao
Ministério Público, além da defensoria pública, se forem hipossuficientes.
O autor pode requerer – e o ideal é que o faça – a ordem de expulsão ou
proibição de ameaça, e já a indenização por danos causados e pelos frutos.
Volto a invocar minha obra de Direito Civil: “ (...)
As benfeitorias necessárias e úteis
são sempre indenizadas, sejam feitas de boa, sejam de má-fé (sim, sempre
me perguntam em sala: “Mesmo a de má-fé é indenizada? Sim!). A lei
garante tal indenização porque se trata de conservação do bem. Assim, se
alguém do MST (Movimento dos Sem-Terra) invade sua fazenda, conserta
o portão e o estábulo, a lei presume que você faria isso mais cedo ou mais
tarde; assim, seria enriquecimento ilícito não indenizar a quem o fez. As
benfeitorias úteis (que tornam o bem mais cômodo ou funcional) só são
indenizadas se feitas de boa-fé (cuidado com a locação, pois, nesse caso,
serão tais benfeitorias regidas pelo contrato!), cabendo direito de retenção
também a quem as fez. A ação cabível para se manter legalmente no bem
ou com o bem é o “embargo de retenção por benfeitorias. As benfeitorias
voluptuárias (de embelezamento) nunca são indenizadas, e o motivo é
simples: a beleza é subjetiva. Mas até aqui a lei premia o benfeitor de boa-
fé: se este puder levar as benfeitorias consigo sem causar dano ao bem
(como uma estátua destacável, por exemplo), poderá levá-las consigo (a lei
usa o termo “levantar”)
No que toca aos frutos, a sistemática é esta: os frutos pendentes
pertencerão sempre ao proprietário; não ao possuidor que deixa o bem, mas
lhe são devidas despesas de produção e de custeio. Os frutos colhidos de
boa-fé pertencem a quem os colheu; os colhidos de má-fé devem ser
restituídos (se foram consumidos, devem ser indenizados). Os frutos
consumidos de má-fé devem ser indenizados; os de boa ficam sem efeito; o
mesmo cabendo aos frutos percipiendos (já deviam ter sido colhidos, e não
o foram, restando-se inúteis). A lei presume que todo fruto colhido por
antecipação o foi de má-fé, razão pela qual deve sempre ser restituído ou
indenizado”.
Se requeridas dentro de um ano e um dia do esbulho ou turbação (ou seja,
se a posse é nova), cabe liminar para desocupação imediata.
Mas, uma vez que se trata de contraditório diferido, pode ser que o réu saia
vitorioso, e o autor não tenha como custear os danos que o processo lhe
causou, por isso, se o réu provar que o autor pode “dar cano” na
indenização por falta de dinheiro, pode requerer que o autor caucione,
dando garantia real ou fidejussória; em não havendo garantia, o próprio
bem ficará depositado como garantia. Embora a lei enuncie “ressalvada a
impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente”, acho que tal
possibilidade não ocorrerá, já que se está litigando sobre um bem, logo
algum “bem” (esse!) haverá para ser depositado, ora!
A petição inicial, além dos requisitos gerais, trará a prova da posse – Se
posse é fato, exercício, podendo ou não estar documentada, a prova se fará
por fotografias, testemunhas; se houver sorte de haver documento, este é
indício, mas não prova, já que a posse está no puro mundo dos
acontecimentos.
Quanto à prova do ataque perpetrado pelo réu, precisa-se qualificar se a
injustiça da posse do réu se deu com violência, clandestinidade ou
precariedade (quebra de confiança), com a completa descrição de como o
réu entrou na posse do bem.
A data do ataque – É um essencial para se definir se o ataque é mais ou
menos de ano e dia, de forma que caberá ou não a liminar. Lembro que não
necessariamente a data do ataque é a data da ciência pelo autor (aliás, até
aqui, essa data é irrelevante, podendo, se for muito demorada, até ser um
argumento contra ele próprio; e, em situação extrema, até gerar usucapião
do bem pelo réu.
A perda da posse ou a turbação desta – É a própria causa de pedir da
demanda. Se houve desapossamento parcial, se há de provar que a posse do
autor continuou, mas que este não mais pôde fruir de toda a extensão dela,
já que está sendo incomodado pelo réu.
Em estando em termos essa petição inicial (pode ser que haja emenda,
entendemos, mesmo que, nesse caso, não se trate de uma primeira decisão
de mérito), o juiz emitirá mandado liminar para que o bem seja entregue
livre ao autor; só após é que haverá o contraditório (o autor terá cinco dias
para promover a citação do réu). Caso o teor e os documentos da inicial não
bastem ao seu convencimento, o juiz determinará que o autor justifique o
pedido – eu não entendo: se o juiz não entendeu ou não bastaram os
argumentos da inicial, o magistrado deveria mandar emendar ou negar a
liminar, simplesmente! E pode marcar audiência de justificação e, ao fim
desta, conceder ou não a liminar. Entendo que essa ordem é qualquer coisa,
menos “liminar”, já que não foi “na porta de entrada” do processo, mas sim
após a audiência.
Não haverá liminar sem ouvir a parte contrária se o réu for pessoa jurídica
de direito público, e a liminar será condicionada à audiência de mediação
em dois casos: em se tratando de invasão (ok! Como diz a lei, “litígio
coletivo pela posse de imóveis”), quando esta já se tenha tornado posse
velha (mais de um ano e dia); ou se, ainda que concedida a liminar, esta
demorou mais de um ano para ser cumprida, a contar da propositura da
demanda.
Quis o legislador proteger o direito de habitação dos “pobres invasores e
vítimas da sociedade” entendendo que, se já se passou mais de um ano, já
existe uma moradia – ainda que irregular – estabelecida no local.
Penso que se essa demora foi por culpa do próprio Estado; não há porque
punir o autor com a necessidade dessa famigerada audiência de mediação;
nesta, haverá presença obrigatória do Ministério Público (aqui como
defensor do interesse social) e da defensoria pública, se tiver obtido
gratuidade de justiça; comparecerão ainda órgãos responsáveis por
ordenamento e regularização de área.
Em ação possessória movida pelo proprietário é possível ao réu alegar a
usucapião como matéria de defesa, conforme o Enunciado 443 do FPPC e,
nos termos do Enunciado 178, “O valor da causa nas ações fundadas em
posse, tais como as ações possessórias, os embargos de terceiro e a
oposição, deve considerar a expressão econômica da posse, que não
obrigatoriamente coincide com o valor da propriedade.”
.
Ações de herança
A vida termina, mas o patrimônio continua; e este deve ter novos titulares
após a partida de seu antigo dono ou possuidor: a isso chamamos sucessão
causa mortis. Precisa-se então regularizar e formalizar essa transmissão de
patrimônio. Digo “formalizar”, porque, pelo fenômeno da saisine, já desde
a morte (chamada tecnicamente de “abertura da sucessão”), a transmissão
de titularidade já ocorre no direito, faltando apenas a documentação e o
registro de tal fenômeno: são as ações referentes à herança.
São os seguintes os procedimentos referentes à herança: se houver herdeiro
conhecido, teremos a adjudicação (se houver um só herdeiro), inventário (se
houver litígio), arrolamento (se houver litígio, para herança com bens até
mil salários-mínimos) e arrolamento sumário (quando houver acordo,
qualquer que seja o valor da herança; inclusive se houver sucessor incapaz);
e, extrajudicialmente, via escritura pública, se não houver sucessor incapaz
e houver acordo. Caso não se apresente herdeiro, haverá um procedimento
chamado de “herança jacente”.
Se os bens hereditários amontarem até mil salários-mínimos (enquanto
escrevo este livro, algo equivalente a 228 mil dólares), o inventário é via
arrolamento (note que é só “arrolamento”, e não “arrolamento sumário”!),
em que não há termo de compromisso do inventariante; e já nas suas
declarações este avalia e apresenta a partilha dos bens. Se as partes
impugnarem a partilha apresentada (como a lei não fixa prazo, é de 15 dias
o lapso para manifestação), nomeia-se perito, que, em dez dias, apresenta
laudo de avaliação, e o juiz decide sobre o que for questionado.
Em se pagando os tributos e as dívidas, sentencia-se e expedem-se os
formais de partilha; pagamento de valores trabalhistas pendentes não
dependem de formal de partilha, mas de simples alvará judicial.
Qualquer tutela provisória antecedente em inventário e partilha, caso haja,
perderá efeito se a ação não for proposta em 30 dias e quando o inventário
for extinto, com ou sem mérito julgado; pode a sentença, penso, apenas dar
efeito permanente e gerar o manto da coisa julgada à eventual tutela
provisória concedida, visto que aqui se trata de procedimento especial; e os
requisitos dessa sentença – penso – já deveriam estar presentes quando da
emissão da decisão provisória.
Ainda que tudo esteja partilhado, pode haver nova partilha, chamada
sobrepartilha, caso existam bens sonegados (que foram ocultados), caso só
se descubram pens posteriormente, se havia bens embaraçados em outros
processos, em lugar inacessível – e, embora não mencionado no artigo
próprio do CPC, se surgir herdeiro não conhecido à época da partilha. Essa
sobrepartilha ocorrerá nos próprios autos do inventário e da partilha
anteriores.
Ausente e incapaz cujo representante gere conflito de interesses com este
terão curador especial – não confundir, portanto, a atuação do MP como
fiscal da ordem jurídica e como representante mesmo da parte e, por
analogia, como o curador especial do revel – penso que deverá ser um
defensor público esse curador especial, se outro não houver.
Se os herdeiros forem comuns a mais de uma pessoa, pode-se ingressar
apenas uma ação, bem como se os de cujus eram cônjuges ou
companheiros; ou ainda se uma partilha depender da outra, como quando os
de cujussão o pai e o avô de herdeiro .
Inventário e Partilha
O inventario pode ser extrajudicial (com assistência de advogado), exceto
se houver interessado incapaz ou testamento.
O inventário deve ser instaurado em até dois meses após a morte do de
cujus, devendo, em princípio, ser finalizado em doze meses.
Tenta o CPC evitar ao máximo levar questão para procedimento comum,
devendo o juiz decidir na maior extensão possível quanto os documentos
permitam.
Aquele que gere o patrimônio do falecido é chamado de “administrador
provisório” e deverá atuar até a prestação de compromisso do inventariante,
devendo bem conservar os bens, colher os frutos (lembre-se de que isso
inclui os frutos civis, ou seja, rendimentos: aluguéis, juros, royalties, direito
autoral etc.), devendo pagar os danos decorrentes de sua má atuação, se
houver.
Quem tiver administração do espólio ou em posse dos bens pode requerer a
abertura do inventário, juntando certidão de óbito do de cujus. Também são
legitimados concorrentes (sem qualquer ordem de preferência) entre
cônjuge, companheiro, sucessores, testamenteiro, cessionário do herdeiro
(que tenha recebido cessão de quinhão por herdeiro), credores (do de cujus
e de herdeiro), fazenda pública, Ministério Público (se houver incapaz
envolvido) ou administrador judicial, se havia falência do de cujus ou
qualquer favorecido com a sucessão.
Nomeação do inventariante
Será nomeado o inventariante; e, aqui sim, existe uma ordem de
preferência: cônjuge ou companheiro, herdeiro, testamenteiro, cessionário
do herdeiro, inventariante judicial ou qualquer pessoa idônea. Em cinco
dias após a nomeação, há a prestação de compromisso.
O inventariante vira representante do espólio, seu administrador; prestará as
declarações (primeiras e últimas), guardião dos documentos e gestor da
herança, enquanto não partilhada, podendo pagar dívidas, vender bens
perecíveis do espólio ou que possam se desvalorizar; e pode negociar sobre
bens do espólio, sempre de forma favorável e no interesse deste.
Deve o inventariante prestar as primeiras declarações em 20 dias após o
compromisso.
Em tais declarações, deve o inventariante listar os herdeiros, os bens e
apresentar todos os dados do de cujus e seu local de falecimento.
O juiz determina a apuração patrimonial que depender de ordens do juízo.
O inventariante que ocultar bens que saiba existir, mas não declare é
enquadrado em sonegação.
O inventariante será removido se não agir no interesse do espólio, se ocultar
bens, se não prestar as declarações, se não prestar contas, se não cuidar dos
bens, se não cobrar dívidas para o espólio, se protelar atos ou se suscitar
dúvidas infundadas. Se for pedida tal remoção, o inventariante é ouvido em
15 dias, e o juiz decide. Se removido, deverá entregar bem e documentação
sob pena de multa até três por cento dos bens inventariados.
Impugnações das declarações
Feitas as primeiras declarações, citam-se os herdeiros, cônjuge e intimam-se
as fazendas públicas para se manifestarem, no prazo comum de 15 dias.
Qualquer impugnação à qualidade de herdeiro se vai para o procedimento
comum para resolução (pode ser que haja alguma negatória de paternidade
incidente, por exemplo); e aqui também pode haver o pedido de ingresso de
quem se ache preterido, ou seja, se ache aquinhoado pela herança, mas não
figurou nas primeiras declarações.
Se houver impugnação, após esse prazo se ouvirá o impugnado em 15 dias.
Nesses próximos 15 dias também, independentemente de impugnações, as
fazendas públicas devem indicar o valor dos imóveis que constem nos
autos, segundo seus cadastros. Nessa fase, caso algo vá para o
procedimento comum, o juiz procede à reserva da herança em favor daquele
impugnado, para a hipótese de ele sair vitorioso na discussão do
procedimento comum.
Avaliação e tributos
Após a manifestação sobre as primeiras declarações, se houver
concordância sobre o valor dos bens, já se dará tudo por avaliado. Caso
contrário, já se procede à avaliação pericial dos bens da herança. Tudo
avaliado, as partes se manifestam em 15 dias, podendo haver nova
avaliação. Julgada boa a avaliação pelo juiz, procede-se ao termo de últimas
declarações, onde o inventariante pode confirmar ou modificar suas
primeiras declarações.
Ouvidas as partes em 15 dias, calcula-se o que houver de tributo a ser pago.
Após tal cálculo, ouvem-se as partes em cinco dias – diz a lei,
indevidamente a meu ver, que tal prazo corre em cartório. Ora! Isso vai
contra o próprio sistema do Código.
“Correr em cartório” significa que iniciará tal prazo independentemente de
intimação, devendo as partes ficar atentas para quando ocorrer o termo
inicial. Ilegalidade do CPC, deveria haver intimação para tal manifestação,
sem dúvida!
Será ouvida a fazenda pública, e o CPC dá a entender que tal prazo é de
cinco dias, embora não o dia expressamente, o que dá margem a se pensar
que esse prazo seja em dobro (dez dias, portanto). Impugnação recebida,
será tudo enviado ao contador para recálculo.
Colações
No prazo em que deva se manifestar sobre as primeiras declarações, deve o
herdeiro levar ao inventário bens que devam ser colacionados. São
basicamente três: os que o herdeiro receber como presente antes da morte
do de cujus, os bens do de cujus cuja posse é de herdeiros e os que tenham
recebido doação inoficiosa, ou seja, aquelas cujo valor supere o que o de
cujus poderia ter doado, a saber, além da metade dos bens deste.
É que a lei civil determina que toda doação que herdeiro recebeu do de
cujus importa em adiantamento da herança legítima. Então pode ser que os
herdeiros tenham doações a declarar; se a tiverem, é no prazo da
manifestação sobre as primeiras declarações que devem fazê-lo. Até o que
tenha renunciado à herança, ou tenha sido excluído, deve colacionar bens se
os tiver para tal.
Caso haja negativa de colação, as partes serão ouvidas em 15 dias, e o juiz
determinará que esse herdeiro entregue ou declare o bem ao inventário,
tendo 15 dias para isso. Se não o fizer, os bens serão sequestrados, se ainda
existirem, ou o valor deles será imputado no quinhão desse herdeiro, para
dedução – qualquer análise mais complicada vai para o procedimento
comum, e tal herdeiro só recebe seu quinhão (se houver algum) após o
julgamento final dessa questão incidente.
Pagamento de dívidas
Amealhado o patrimônio, os credores podem se habilitar para receberem o
pagamento de suas dívidas, a partir do espólio. Se não o fizerem aqui, ainda
poderão cobrar diretamente dos herdeiros, mas agora só na proporção do
quinhão hereditário de cada um. Pode tal pagamento ser em dinheiro ou em
bens diretamente.
Caso haja qualquer impugnação a alguma dívida apresentada, não será
dirimida tal dúvida no inventário, mas se remeterá às vias ordinárias
(procedimento comum), reservando-se, se for o caso, valores da herança
para possível vitória do pretenso credor.
Legatários (os que recebem bens certos e determinados, via testamento) se
manifestam sobre as dívidas apresentadas se o valor destas puder lhes atacar
o legado ou se toda a herança consistir inteiramente de legados.
Partilha
Já se trata de herança líquida. Em 15 dias de prazo comum, as partes
formulam o pedido de seus quinhões. O juiz decidirá de forma a atender aos
pedidos, a não causar danos e a manter a maior exatidão possível do
quinhão com o valor deste.
Irá para o partidor elaborar esboço de partilha. Há mais 15 dias para as
partes se manifestarem; dessa feita, sobre esse esboço de partida.
Pagos os impostos e em não havendo interesse da fazendo pública, o juiz
julga tudo por sentença, de forma que, após transitada em julgado, cada
herdeiro recebe um formal de partilha, que será seu título para transferência
no registro.
Para quinhão que represente até cinco salários-mínimos, pode haver entrega
de “certidão de pagamento do quinhão hereditário”; em vez de “formal de
partilha”, em tal documento consta a transcrição da sentença da partilha.
Arrolamento
Em havendo vários herdeiros e resolvendo estes fazerem partilha amigável
(consensual) em juízo, o procedimento terá o nome de arrolamento sumário.
Os herdeiros ingressarão petição inicial onde se qualificarão, qualificarão
sua posição de herdeiro, os bens da herança e seus quinhões hereditários já
pré-divididos, ou pedido para que o juiz o faça. Indicarão um inventariante
que, em sendo fruto da escolha, poderá ser qualquer pessoa capaz. Pode-se
pedir perícia caso não se saiba o valor de algo da herança.
Tudo isso nos autos; serão intimadas as fazendas públicas para que façam o
lançamento administrativo dos tributos incidentes. Se o fisco encontrar
divergência, deve cobrar via procedimento próprio, a saber, notificação,
inscrição em dívida ativa e execução fiscal, não sendo o arrolamento
sumário procedimento para cobrança de divergência tributária.
Oposição
A oposição é usada para excluir duas ou mais pessoas que se dizem donas
de algo que o opoente diz ser seu. Imagine que duas ou mais pessoas estão
brigando judicialmente por algo seu: nesse caso, você ingressará essa ação e
será chamado de “opoente”, e eles serão chamados de “opostos”. Cabe
ingresso de oposição até a sentença.
Lembro que os réus são autores e réus da ação originária, logo são
litisconsortes passivos necessários (obrigatórios). Já que eles possuem prazo
ditado em lei para contestarem, não há prazo em dobro, não caindo naquela
regra de diferentes advogados de escritórios diferentes (convenhamos: se
estão brigando entre eles, já não seria do mesmo escritório! Mas friso isso
para que o leitor não se deixe enrolar com a história do “prazo em dobro
para litisconsortes...”).
A oposição será distribuída por dependência, e os opostos serão citados na
pessoa dos seus advogados (lembremos que eles já estão em juízo!) e se
manifestarão no prazo comum de 15 dias.
Tudo é julgado de uma vez só pelo juiz, mas, se foi ingressada após o início
da audiência de instrução (lembre-se de que esta audiência pode ser cindida
em várias “audiências de continuação”, por isso é plenamente possível ser
ingressada “no meio” da audiência!), o juiz pode suspender o processo
principal e julgará primeiramente a oposição (será prejudicial, portanto); se
for vitoriosa, entrega-se o bem ao opoente – se for infrutífera, continua-se o
julgamento entre os dois (agora “ex-opostos”) originários, como se não
tivesse havido a oposição.
Pergunta básica: por que não se faz logo uma instrução apenas, seja qual for
o momento da oposição? Penso que há mais vantagens em fazer uma
instrução única.
Oposição difere dos embargos de terceiro, porque nestes alguém quer retirar
o bem (ou direito) de outrem; e não existe disputa sobre quem é o
verdadeiro dono; na oposição, dois ou mais litigam sobre quem é ou deixa
de ser dono de um direito; embargos de terceiro podem ocorrer até em
recurso, e oposição é até a sentença. Simples assim!
Habilitação
A vida acaba; o processo continua. E agora?
Há de existir o ingresso dos sucessores das partes. Para isso se usa a
habilitação, que pode ser requerida pelos próprios sucessores ou pode ser
provocada pela parte contrária em relação aos sucessores de seu antigo
adversário (já que este passou desta para uma melhor!).
Suspende-se o processo e escutam-se os demais requeridos no prazo de
cinco dias, mediante citação dos advogados, senso pessoal para os que não
tiverem causídicos constituídos nos autos.
O juiz julga de plano. Pode ocorrer impugnação, principalmente quanto à
qualidade de herdeiro do que pretensamente queira substituir o de cujus;
tais casos são autuados separadamente para instrução própria.
A sentença de habilitação, transitada em julgado, passa a integrar os autos
principais, em que o de cujus era parte, “destravando” esse processo para
que siga de onde parou.
Ação Monitória
Alguém que alegue ser credor de outrem, mas lhe falte título executivo
pode cobrar tal dívida via ação monitória; o devedor precisa ser capaz (ou
pessoa jurídica, incluindo a fazenda pública); e precisa haver prova
documental da dívida, ainda que oral, mas consubstanciada em documento.
O autor deve descrever a dívida, já com os cálculos e o valor da causa; deve
ser o valor da dívida já atualizado ou, se a obrigação for de dar algo
diferente de dinheiro, fazer ou não fazer, especifica-se o valor do proveito
econômico pretendido.
Se a prova não for cabal e pré-constituída o bastante, o juiz pode determinar
que tudo vá para o procedimento comum, transformando-se em ação
ordinária de cobrança.
Convencido o juiz do direito do autor, emite mandado monitório para que o
réu cumpra a obrigação em 15 dias, arbitrando os honorários advocatícios
em cinco por cento.
Se cumprir o mandado e efetuar o pagamento, fica isento de custas – o que
gera um problema, já que o autor terá um motivo para “embutir” tais custas
já no cálculo apresentado na petição inicial. Se não houve pagamento ou
encargo, constitui-se título executivo e passa-se à fase de cumprimento de
sentença.
Se a ré for a fazenda pública, procede-se ao duplo grau obrigatório antes do
cumprimento de sentença.
É cabível, caso o réu reconheça a dívida, que peça a “moratória”, que é o
parcelamento em seis vezes com um por cento de juros ao mês, desde que
pague a vista 30 por cento do valor da dívida.
Cabem embargos à monitória (é assim que se chama o contraditório desta
ação), total ou parcial (se for parcial, deve declarar logo o que entenda
correto, o que já formará título executivo); é igualmente cabível
reconvenção (em que o réu será chamado de embargante-reconvinte). O
autor é intimado para responder aos embargos, e o julgamento da monitória
é suspenso até a decisão final de primeiro grau.
Improcedentes ou indeferidos os embargos (por falta de cálculo, por
exemplo), constitui-se título executivo.
Monitória de má-fé gera multa em favor do réu, de dez por centro sobre o
valor da causa; igual multa cabe contra o réu se este interpuser embargos de
má-fé.
Diz o Enunciado 446 do FPPC que “Cabe ação monitória mesmo quando o
autor for portador de título executivo extrajudicial.”
Ações de família
Em procedimentos de “divórcio, separação, reconhecimento e extinção de
união estável, guarda, visitação e filiação” o procedimento é precedido do
detalhe constante nesses procedimentos.
A conciliação, já de tentativa usual no procedimento comum, aqui pode ter
auxílio de profissionais multidisciplinares.
O réu será citado pessoalmente, e o mandado de citação não será
acompanhado da contrafé, que é a cópia da petição. Isso significa que
alguém andou lendo Franz Kafka demais: o réu saberá que há o processo,
mas não conhecerá o teor dele. Que lei talentosa!
Isso gera duas leituras e uma injustiça.
Leitura 1: O legislador foi sagaz e inteligente, pois as petições de família
são cheias de ódio, peso, negatividade, capazes de acirrar o ânimo já
beligerante do réu. Sua vida, intimidade, fraquezas e vida estarão expostas
na petição, tornando a conciliação, já difícil, impossível.
Leitura 2: O legislador não leu a Constituição e gazetou aulas de Teoria
Geral do Processo; só pode! O CPC criou a “citação virtual” ou “meia
citação”, em que o réu é citado, mas não sabe do quê.
A injustiça: A parte precisará de um advogado para ler o que foi dito na
inicial sobre ele e sobre os fatos. Significa que terá que ter dinheiro para
pagar advogado, ou ter disponibilidade de tempo e paciência para obter a
assistência da defensoria.
Em no mínimo 15 dias depois, haverá a audiência de conciliação e
mediação, com as partes assistidas por advogados, podendo haver
adiamento para se tentar conciliar em outra data. Diferentemente do
procedimento comum, aqui não há limite de adiamento, seja de quantidade,
seja de tempo, para as audiências de tentativa de conciliação. Em sendo
impossível conciliar... ao procedimento comum!
Para causas sensíveis em que crianças deponham (a lei exemplifica como
abuso ou alienação parental), enuncia-se que o juiz deve estar acompanhado
de especialistas.
Restauração de autos
A restauração de autos, como o nome indica, é o procedimento motivado
por desaparecimento ou extravio de autos. A finalidade é simples: tentar
“rejuntar” os documentos e peças que existiam nos autos originais; e, se
precisar, até reinquirir e reoitivar quem precisar.
Todos os participantes do processo são citados e intimados a apresentar o
que tenham – cópias que sejam – dos autos originais. Se houver autos
suplementares, o processo continua normalmente nele; e – a meu ver –
sequer haveria por que ocorrer a restauração, a menos que os autos
principais contivessem peças ou documentos não constantes nos
suplementares.
Já a petição inicial deve ter anexa o que o autor tiver dos autos originais. A
parte contrária será citada para, em cinco dias, amealhar aos autos o que
tiver dos antigos autos.
Se ocorreu em âmbito judicial o sumiço, em tal ambiente haverá sua
restauração; até o juiz entra no rol dos que devem trazer cópia do que tiver
dos autos, e nenhum serventuário pode se furtar a participar da restauração.
Em qualquer caso, o responsável pelo sumiço ou extravio arcará com
custas, honorários de advogados e perdas e danos.
Consignação em pagamento
É direito de quem deve se libertar da dívida. Ocorre que, por vezes, o credor
não pode quitar, não quer fazê-lo, não se sabe onde está o credor ou sequer
quem ele seja. É nessa situação de incerteza que surge a ação de
consignação em pagamento.
Se a obrigação for de dar dinheiro e se saber quem é o credor, deposita-se a
quantia na conta deste (sim, sabe-se lá como, mas o devedor precisa ter
esses dados), notifica-se o credor por qualquer meio que possa ser provado
tal comunicação. Se ele ficar silente dez dias, pressupõe-se pagamento
perfeito.
Se for de entrega de coisa diferente de dinheiro, esta deverá ocorrer em até
cinco dias após o deferimento da inicial. É óbvio que poderá haver depósito
de dinheiro aqui também, no caso de o credor ser desconhecido, se não se
souber a quem pagar ou se, simplesmente, for desbancarizado ou não se
souber os dados de sua conta (aliás, acho meio besteira aquele depósito em
banco; ainda bem que, ao menos o Código usa o vocábulo “poderá” quanto
ao depósito bancário).
Em havendo mais de um possível credor, todos serão citados e brigarão
entre eles para se decidir a quem cabe o depósito; de plano, o juiz já libera o
depositante da obrigação – Bem, ok! E se algum dos possíveis credores
provar que é legítimo e que o valor é insuficiente? O que me leva a crer que
a liberação do devedor não deve ser tão “de plano” assim; devendo tal
liberação comportar a interpretação de que ocorrerá uma vez estando na
forma, local, quantidade e qualidade corretos.
Se o credor recusar solenemente o depósito junto ao banco (o CPC
determina que a recusa seja direcionada ao banco, mas entendemos que
qualquer recusa formal, com ciência do devedor-depositante, poderia
ensejar o procedimento que se segue), começará a fluir o prazo de um mês
para que o depositante ajuíze a consignação judicial do pagamento.
Ingressa-se a petição inicial, com prova do depósito e da comunicação, já
podendo depositar prestações sucessivas, caso haja, em até cinco dias após
cada vencimento.
O depósito válido e acatado pelo credor ou juízo libera o devedor de
qualquer ônus.
O credor será citado, podendo acatar ou receber o depósito, podendo
contestar insuficiência deste ou qualquer matéria de defesa (o prazo é de
dez dias para o depositante emendar o depósito, se precisar).
Concluso pelo juiz e este tendo julgado o depósito bom, além de injustas as
razões do réu, tal sentença será a quitação, e condenará esse réu ex-credor
aos ônus sucumbenciais; caso contrário, o depositante haverá sido visto
como moroso.
Existe um direito real cujo nome é Enfiteuse, Aforamento ou
Emprazamento. É uma espécie de “aluguel perpétuo”, mas desde o século
passado se percebeu que tal instituto era antieconômico, e o Código Civil de
1916 criou o “Direito de Resgate”, que era o direito de o enfiteuta ou o
foreiro, após dez anos de enfiteuse, se tornarem dono do imóvel aforado,
pagando um laudêmio e dez foros. Caso o aforador não queira receber o
dinheiro, cabe a consignação em pagamento para obrigá-lo a tal, obtendo-
se, assim, a propriedade do imóvel até então aforado.
Embargos de terceiro
Imagine que em algum momento algo que é seu, mas estava com outrem,
ou algo alheio que você legitimamente use seja tomado por alguém. E qual
não é sua surpresa ao descobrir que isso decorreu de mandado judicial! Pois
é! Para remediar esses casos, existe a ação de “Embargos de Terceiro”. Será
de senhor ou possuidor, a depender se você tem a propriedade (cuja posse
estava com outra pessoa), ou se tinha a justa posse (de algo que pertencia a
outrem). Em qualquer processo onde haja constrição de bem, o juiz, se
perceber que pode haver terceiros alvejáveis pelo ato, deve intimar para a
possibilidade de haver interesse deste em ingressar com os embargos.
O réu na presente ação é quem obteve a ordem de tomada do bem.
O que se diz dono ou possuidor, já na inicial, fará prova de propriedade ou
posse; o juiz decidirá, após ouvir a parte contrária, em 15 dias. A ação
correrá por dependência aos autos em que conste o mandado de constrição.
Usucapião extrajudicial
Usucapião é a tomada da propriedade pela posse mansa e pacífica no
decurso do tempo. Tem tempo hábil, a depender do caso, variando de dois a
15 anos no caso de imóvel, além do exercício da posse sem oposição física
ou jurídica.
Tendo ou não litígio, devia ser feito somente por via judicial, passando
agora também a contar com seu procedimento extrajudicial. É a terceira
grande “desjurisdicização” que presenciamos, depois do inventário e do
divórcio (a primeira ocorreu ainda no século passado, quando a
emancipação voluntária também passou a ser por via direta cartorária).
Será requerido por advogado, com prova da posse via ata notarial (não
entendo por que a necessidade dessa ata notarial; a não ser garantir renda
para o cartório de tabelionato, já que não tem escritura pública, aqui),
comprovante de impostos e taxas sobre o imóvel e qualquer título que
justifique a posse; planta e material descritivo lavrado por profissional
habilitado (o memorial substituiria com louvor a ata notarial, penso); prova
dos titulares do bem.
A lei fala em titular de direitos reais sobre o imóvel – para os que não
lembram, são os seguintes institutos: propriedade, enfiteuse, superfície,
usufruto, uso, habitação, hipoteca, penhor, anticrese, alienação fiduciária,
servidão, e promessa de compra e venda. Deixei de fora as concessões
especiais (para fins de uso e de moradia), porque envolvem imóvel de
titularidade pública, e sabemos que bem público é inusucapível.
Deve-se juntar certidão negativa de distribuidor para demonstrar que o bem
está desembaraçado em relação a alguma constrição judicial.
A menos que já contenha o pedido a aquiescência do titular do direito real
(vamos simplificar aqui, chamando-o de dono), este será notificado para se
manifestar em 15 anos; seu silêncio significa discordância.
Se houver concordância, o registrador transfere a titularidade do imóvel.
Se houver discordância expressa, melhor que se suscite dúvida com o juiz,
ou o procedimento contencioso judicial. O interessado emendará a petição
inicial para adequá-lo ao trâmite judicial.
Juizados especiais
Nos juizados especiais cíveis (Lei 9.099/95) se busca simplicidade,
celeridade, informalidade e oralidade. Só se reduz a escrito o absolutamente
essencial.
Elencam-se causas de menor complexidade até 40 salários-mínimos; e, até
tal valor, ações possessórias e execução de títulos executivos extrajudiciais,
cujos credores possam ser autores no juízo. Pode haver causa com valor
maior, mas automaticamente se renuncia ao valor que ultrapassar o teto.
Qualquer um destes pode ser o valor: arrendamento rural, parceria agrícola,
cobrança de condomínio, reparação de danos em imóveis, acidente de
veículos terrestres e seguro quanto a este, honorários profissionais,
revogação de doação, despejo para uso.
Não se julgam em juizado especial ações de alimentos, falência, fiscais, que
envolvam o Estado, acidentes de trabalho e capacidade das pessoas.
A competência é no foro onde a obrigação deva ser satisfeita. Se for
reparação de dano, domicílio do autor ou lugar do fato; nos outros casos,
residência ou lugar de trabalho do autor.
Pode o juiz até julgar sem observar lei, desde que a decisão lhe pareça a
mais justa. Na estrutura haverá conciliadores (de preferência bacharéis em
direito) e juízes leigos; estes são advogados com mais de cinco anos de
experiência.
É uma virtude e um defeito o juiz poder conduzir o feito como entenda
melhor, pois a qualidade do procedimento ficará diretamente ligada ao bom
ou péssimo nível de trabalho do magistrado. Enquanto eu advoguei, percebi
que em cada vara do juizado especial havia uma “lei processual própria” ali
vigente.
Além dos juízes togados, os juizados especiais podem ter juízes leigos
(escolhidos dentre advogados com pelo menos cinco anos de experiência) e
conciliadores (de preferência bacharéis em direito).
Pessoas físicas maiores e capazes, bem como microempresa, empresas de
pequeno porte, microempreendedor individual e OSCIP (Organização
Notificação e interpelação
Interpelar é obter de alguém uma declaração formal sobre determinada
matéria. Afinal, houve elogio ou insulto quando aquela pessoa disse na TV
que “você não era um ser humano normal”? Pode igualmente haver
aclaramento judicial de uma situação de fato que possa ser “desenrolada”
com simples declaração da outra pessoa. Afinal, aquela pessoa que está no
seu imóvel há tempos reside lá como sublocatário, é um invasor ou é
comodatário (“morando de favor”) do seu locatário?
Notificar é avisar formalmente, com geração de presunção absoluta de que
o aviso chegou ao destinatário, sobre algum fato ou relação jurídica.
Imagine que você faz propaganda do seu blog em outdoor, e surge um
partido político afirmando em redes sociais que você está praticando
propaganda eleitoral antecipada; como você não é candidato, nem pensa em
ser; e, para garantir peremptoriamente o fim dos boatos, resolve notificar ao
presidente de tal partido que você não é ou será candidato. Pode também
constituir em mora o comodatário de seu sítio: você deixou Charlésio morar
no seu sítio, mas não deu prazo para que ele saísse, então você o notifica
judicialmente para que saia em 30 dias.
Se o juiz entender que há algum subterfúgio ou finalidade ilícita na mente
do interpelante ou notificante, pode ouvir previamente a parte contrária;
igualmente o fará caso seja requerida alguma averbação no registro de
algum bem, após o ato.
Ao fim os autos são entregues ao interpelante para que guarde de enfeite em
casa ou ingresse alguma ação que entenda cabível, ou use como prova para
algo.
Alienação judicial (venda de coisa comum)
Precisamos dividir coisa indivisível. A lei determina que aquele que queria
ficar com a coisa pague em dinheiro a cota-parte dos demais. Se mais de um
quiser, será dado a quem tenha mais benfeitorias; se mais de um tiver, a
benfeitoria mais valiosa. Não querem fazer leilão interno para não gerar
rastro de inimizade.
Solução: vendamos o bem e dividamos o dinheiro. Simples!
É isso que chamamos “Divisão Judicial”.
Testamentos
Existe um tipo de testamento chamado “cerrado”, “hológrafo” ou “místico”;
é lavrado pela própria pessoa, entregue a um tabelião, que, juntando a
declaração cartorária de regularidade, enrola e costura. Deve guardá-lo,
informando a alguém de confiança onde se encontra escondido, para que
seja aberto após sua morte.
Esse testamento, costurado, deve ser levado a juízo, que verificará se não
foi violado. Em estando conforme, será aberto e lido. Ouvido o MP, tudo é
registrado nos autos, sendo nomeado um testamenteiro, que cumprirá as
disposições de última vontade; se não houver algum previsto no testamento,
nomeia-se um dativo.
Se o testamento for público, basta levá-lo a juízo para cumprimento; e, se
for particular, deve ser publicado judicialmente. Ouvido o MP, procede-se à
nomeação de testamenteiro para cumprimento do testamento. Aplica-se isso
também para codicilos, que são testamentos de coisa de pequeno valor e
disposições referentes ao próprio funeral.
Herança jacente
Em não surgindo herdeiro, arrecadam-se os bens do de cujus, que ficarão
sob guarda de curador até a vacância (lembre-se de “vácuo”; vacatio quer
dizer “vazio”); esse curador será o administrador e representante dos bens.
Arrolando-se tudo em auto circunstanciado, caso inexista curador, os bens
são entregues a um administrador judicial-depositário. Buscam-se dados do
falecido, informações em documentos e papéis do morto. Se ele surgir, tudo
lhe será entregue; se não, será tudo incinerado.
Publica-se edital conclamando herdeiros; três publicações com intervalo de
um mês, dando prazo de seis meses para, a contar da primeira publicação,
surgirem herdeiros para se habilitarem. Se surgir herdeiro ou o MP requerer,
procede-se ao inventário; se não surgir, mas, se tiver conhecimento, será
esse herdeiro citado.
Quanto aos credores, pode-se buscar seu pagamento junto à massa de bens,
mesmo que não surjam herdeiros. O bem que possa se deteriorar, perecer ou
desvalorizar será logo vendido.
Um ano passando da primeira publicação do edital, a herança se transforma
em “vacante”. Contando-se cinco anos da abertura da sucessão, esta,
quando se torna vacante, terá os bens móveis entregues ao município e os
imóveis rurais à União.
Interdição
A interdição ocorre quando alguém, originalmente capaz, se torna incapaz
ou relativamente capaz.
O MP ingressará a interdição em caso de doença mental grave do
interditando; e, caso nenhum legitimado original o faça, por inexistência ou
incapacidade desses também.
São legitimados originais o cônjuge, o companheiro, parentes, tutores,
representante da entidade onde esteja hospedado (manicômio, hospital etc.).
A petição conterá os motivos que levem à eventual interdição, com laudo
médico ou as causas da impossibilidade de apresentação dele, e a data
provável em que esta ocorreu.
O juiz entrevistará (note que não se trata de oitiva, inquirição; é apenas
entrevista, afinal... se pode estar falando de um demente) o interditando –
no juízo ou onde esteja – colhendo qualquer informação que lhe leve à
conclusão sobre haver ou não, afinal, incapacidade. Ouvirá também os
interessados na interdição.
O interditando terá quinze dias para impugnar o pedido. Far-se-á prova
pericial, e o juiz decidirá, nomeando – caso ocorra interdição – o curador,
especificando os limites e a incidência da interdição, ou seja, quais atos o
agora interditado não poderá praticar.
A sentença de interdição contém os dados do curador e, agora, interdito
(curatelado); e deve ser tão individualizada quanto possível, segundo a
característica do interdito.
A curatela abrange a pessoa e os bens do curatelado; somente
eventualmente, se houver conflito de interesses, terá tal autoridade
restringida. E, em havendo pessoa incapaz sendo assistida pelo curatelado,
ela passará agora a ser assistida pelo curador.
A sentença de interdição é publicada no site do tribunal a que juízo
pertença, na página de publicações do CNJ (deve ficar seis meses
publicada), averbada no registro da pessoa. Publica-se no Diário Oficial três
vezes com intervalo de dez dias; e no jornal de circulação do local por uma
vez. Tal publicação contém o nome do interdito, do curador e os limites da
interdição (atos que podem ou não ser praticados diretamente pelo interdito,
se for interdição parcial).
A interdição não é permanente; aliás, obriga ao curador que faça o possível
para reabilitar o curatelado. Se for uma curatela de boa-fé (é como a
presumimos, sempre), é o curador inclusive o primeiro a querer ver o
curatelado reabilitado quando possível, até para se livrar do encargo.
Cessada ou modificada a incapacidade, terminam ou se mudam os limites
da curatela. Faz-se pedido de “levantamento de curatela”, que pode ser
provocado pelo MP, pelo próprio interdito ou pelo curador. Procede-se à
perícia e à audiência de instrução. Em estando o juiz convencido de que não
mais há incapacidade, sentencia, averba-se essa sentença no registro do,
agora, ex-interdito, e publica-se a decisão na Internet, em página própria
(do Tribunal e do CNJ), na sede do juízo, no Diário Oficial (três
publicações com intervalo de dez dias).
Tutela e Curatela
Instituído suprimento artificial de capacidade, a saber, tutela ou curatela, em
cinco dias o nomeado prestará compromisso, passando a administrar o
patrimônio do tutelado ou curatelado.
Nos casos em que a lei autoriza a escusa da tutela ou curatela, ocorre em
cinco anos dias da intimação para prestar compromisso, ou da ocorrência do
motivo, se já estiver exercendo o suprimento da capacidade. Em qualquer
caso, o juiz pode afastar imediatamente o tutor ou curador, se houver
motivo grave e urgente para tal – afastamento definitivo ou provisório
(suspensão).
Se o juiz não aceitar a escusa, o tutor ou o curador continuarão
obrigatoriamente no exercício, até o procedimento ser completado, com
oitiva do MP, que se manifestará na escusa apresentada ou requererá a
remoção.
O fim da tutela ou curatela deve ocorrer por via judicial, com apresentação
das contas. Fim do encargo é uma coisa; fim da responsabilidade é outra. Se
as contas não forem aprovadas, pode-se extinguir a tutela ou curatela, mas
subsistir a responsabilidade.
Em dez dias após o prazo estabelecido para o fim da tutela ou curatela, deve
ser pedida a exoneração por quem a exerce. Se não o fizer, estará
automaticamente reconduzido (a lei não diz até quando – entendemos que
será até ulterior decisão). No caso da tutela, esta cessa com a maioridade.
Reclamação
A reclamação restaura e preserva a autoridade do tribunal quando um
julgamento ou a jurisprudência qualificada sua forem desrespeitados. O
relator requisita informações, que devem ser prestadas em dez dias, do
órgão que nega a aplicação da decisão; pode suspender o ato; deve ouvir em
15 dias a parte a quem a reclamação favorecer.
Se procedente, o tribunal cassa a decisão que lhe desafiou e restaura a
ordem subvertida.
Últimas primeiras palavras
Reflexões sobre o Novo CPC
Será mais fácil aos juízes recém-empossados incorporar o espírito do Novo
CPC do que aos veteranos. A zona de conforto e o fluxo de trabalho a que
já estão acostumados será o primeiro entrave; depois, haverá a fase em que
se implantará o novo procedimento, mas ainda com espírito e atuações do
antigo. Só após uns anos, quando aos poucos dirimirem as dúvidas sobre o
Novo Código, é que teremos a naturalidade do procedimento. Sim, tudo
pode ser mais rápido se o CNJ ajudar e baixar logo umas dez resoluções
sobre fluxo de procedimentos.
Dogmas do processo
Os valores buscados não são unânimes, até pela heterogeneidade de
participantes na tramitação do projeto.
Os dogmas foram:
- Maior poder ao magistrado.
- Maior participação técnica dos advogados.
- Celeridade.
- Informalidade.
- Informatização.
- Efetividade.
- Primazia da jurisprudência.
Excesso de processualismo
“Excesso de processualismo” é uma desgraça! Lembro-me de uma história
que um professor de pós-graduação nos contou: ele estava em um hospital
em Miami e viu que os médicos estavam parabenizando um cirurgião por
ele ter aplicado perfeitamente uma técnica inovadora e dificílima. Tudo bem
se não fosse um detalhe: o paciente morreu. Mas mesmo assim os médicos
acharam a técnica incrível. É mais ou menos isso que ocorre quando o
processo se torna mais importante que o direito material discutido.
Uma fábula para entender o que pode surgir
Três amigos conversavam preocupados: 1, 2 e 3.
Queriam emagrecer uns cinco quilos em três semanas para estarem fininhos
nas fotos do casamento deles.
Exatas três semanas depois, todos atingiram suas metas.
O amigo 1 contratou uma nutricionista, que sugeriu uma visita ao
endocrinologista. Matriculou-se em uma academia, contratou uma personal
trainer, que o fez realizar testes ergométricos, prescritos por uma
cardiologista. Com alimentação balanceada, suplementos, três horas por dia
em academias de ponta e... voilá: 65 quilos! Funcionou!
O amigo 2 parou de comer, tomava dois copos de shakes emagrecedores,
começou a fazer exercícios e a levantar pesos na academia do primo –
conseguiu frequentá-la de graça, e ficava correndo na esteira de madrugada
até ser derrubado pelo sono, quando ia, quase dormindo, dirigindo para
casa. Ao fim: 65 quilos! Também funcionou!
O amigo 3 só fez duas coisas: parou de comer besteira e passou a correr
uma hora por dia em volta do quarteirão... e também funcionou! 65 quilos!
Moral da história:
O amigo 1 gastou aos tubos e desperdiçou tempo, prendendo-se a opiniões
de várias pessoas para atingir o resultado – É o que acontece quando se
prende à formalidade, detalhes inúteis para que “o processo fique bonito e
tecnicamente perfeito”.
O amigo 2 cortou tudo e, de forma maluca, perseguiu a finalidade, mas não
adiantou muita coisa, pois sua dieta radical o fez gastar dinheiro para
retomar a saúde. Uma semana depois do casamento, desmaiou desnutrido.
Um processo em que se faz de qualquer coisa de qualquer forma gera isto:
nulidade e perigo de tudo ter que ser refeito.
O amigo 3 foi inteligente: fez só o necessário, gastou menos tempo e menos
dinheiro; e, depois do casamento, sua mudança de estilo de vida até se
tornou habitual – foi ó único dos três amigos a permanecer magro depois.
Assim é o processo ideal: só se faz o necessário, não se cortando o que não
pode ser cortado (contraditório, ampla defesa e recurso) e não se prendendo
a formalidades idiotas dispendiosas.
Ah! O amigo que se casou? Foi traído pela esposa, que o trocou por uns
instrutores, médicos e alunos da academia onde malhava – É exatamente o
que acontece com as medidas sem oitiva da parte contrária: a parte atingida
pela medida se sente traída pelo Judiciário, pelo juiz e por todos os
envolvidos no processo, tendo ainda menos motivo para querer conciliar ou
mediar em alguma ação, ficando já com a ideia de que “do Judiciário, nada
de bom pode surgir”.
A “PLC 168”
No apagar das luzes de 2015 veio à luz a primeira grande proposta de
mudança, vinda diretamente do Judiciário, encontrou um legislativo e
executivo envolto em escândalos e em situação de não estarem com
qualquer interesse ou disposição de dizer qualquer “não” ao pode judicante.
Tal flanco foi bem aproveitado: a quatro meses da entrada em vigor, as
mudanças – primeiras – vieram.
Trata-se da PLC (Projeto de Lei da Câmara) 168, ainda não tendo sido
transformada em lei enquanto escrevo esse livro.
Basicamente são mudanças para:
Aumentar a liberdade do magistrado, ao menos lhe retirando pretensos
regramentos impostos pelo Novo CPC; e
Mecanismos “não perturbe” impostos pelos tribunais superiores.