TEORIAS SOBRE A ORIGEM
pA SOCIEDADE HUMANA
SumAaio: 2.1 Conceito de sociedade ~ 2.2 Teorias sobre os fundamentos da
sociedade: 2.2.1 A interpretagao organicista da sociedade; 2.2.2 A interpre
taco mecanicista da sociedade; 2.2.3 A interpretacao eclética da sociedade
-2.3 Sociedade e Estado.
2.1 CONCEITO DE SOCIEDADE
Ao buscar um conceito para o termo sociedade, € posstvel, intuitivamente,
imaginar seu significado. Quando se pensa em sécios, imediatamente se imagi-
nna duas ou mais pessoas que se unem a fim de obter um determinado fim. Em
uma empresa, por exemplo, o fim pode ser 0 lucro. Ampliando esse conceito,
€ possivel imaginar uma grande sociedade na qual varios homens agrupados
convencionem uma organizacdo a fim de obter algo.
Talcott Parsons define sociedade comoa palavramais genérica para explicar
“todo o complexo de relagdes do homem com seus semelhantes”.' Para ele, a
sociedade nao se configura como um aglomerado de individuos, ou de grupos
de individuos, mas sim como relagdes humanas.
Sanchez Agesta afirma que nao ha sociedade, “termoabstrato eimpreciso,
mas sociedades, uma pluralidade de grupos da mais diversa espécie e coesdo”.
Charles Maurras acredita que vivemos em uma sociedade de sociedades e nao
sociedades de individuos.?
L. Pansons, Talcott. Encyclopaedia of social sciences apud Bonavines, Paulo. Ciencia politica
10. ed. Sao Paulo: Malheiros, 1997.
2. Bowavioes, Paulo. Ciencia politica.10. ed. Sao Paulo: Malheitos, 1997. p. 54.38 | ‘TEORIA GERAL DO ESTADO E CIENCIA POLITICA
Desde a Antiguidade, o conceito de sociedade ja ¢ tratado. O grande tra-
‘tadista Aristoteles assinalava em sua Politica que o homem € 0 politikon zoon
(animal social), ou seja, nao € possivel conceber a existéncia do homem sem
iver em contato com outros homens. Afirma Aristoteles que se o ente humano
viyesse isolado seria um Deus ou um bruto, algo mais ou algo menos do que um
jhomem. Deste modo, a doutrinaaristotélica assinala o carater social do homem.
Embora divirjam em muitos aspectos, conforme veremos maisa frente nesta
|, os chamados contratualistas, Thomas Hobbes, Jean-Jacques Rousseau €
in Locke convergem no que diz respeito a sociedade; consideram que esta €
uultado de um contrato hipotético realizado entre os homens. Deste modo,
)ponto comum de todasas teorias contratualistas €a negacao do impulso asso-
tivo natural no Estado de Natureza, e a afirmacao de que somente a vontade
mana justifica a existéncia da sociedade.
Outra definicao a ser destacada € a de Giorgio Del Vecchio, que afirma
sociedade um “complexo de relacoes pelo qual varios individuos vivem e
’m conjuntamente, de modo a formarem uma nova e superior unidade”*
Para Del Vecchio, a sociedade é um “complexo de relacdes” porque os
bros de uma determinada comunidade ou associacao sao sujeitos de
éticos que refletem um encadeamento constante, em ultima andlise, de
juridicas. “Vivem e operam conjuntamente” porque as colaboracées
individuos nao sao apenas mecanicas, s4o colaboracdes conscientes que
m a harmonia ea paz social, respeitando 0 coletivo e o individual.
TEORIAS SOBRE OS FUNDAMENTOS DA SOCIEDADE
Temos trés teorias sobre os fundamentos da sociedade, sao elas: a teoria
sta na qual os papéis sociais so bem divididos e, se somados, consti-
odo culminado na sociedade; a teoria mecanicista possui um viés mais
lista na qual cada individuo age com autonomia eliberdadee aeclética
la as duas supracitadas.
_ A interpretagao organicista, em apertada sintese, consiste em consid
de como um corpo dotado de orgaos a desempenhar cada qual
TEORIAS SOBRE A ORIGEM DA SOCIEDADE HUMANA 39
funcao especifica em prol de todos ou, nas palavras de Del Vecchio, representa
a “reuniao de varias partes, que preenchem fungées distintas e que, por sua
acdo combinada, concorrem para manter a vida do todo”.’ Os organicistas tém_
na filosofia grega de Platao seu nascedouro.
Plato, no Livro V da sua obra A Republica, estrutura a organizacao social
de forma que todos teriam seus papéis definidos, nao havendo individualidade
ou ambicao individualista. Afirma que o Homem aceitaria sua condi¢ao social
endo raciocinaria individualmente, pensaria apenas em fortalecer a sociedade
a fim de que esta fosse justa.
Paulo Bonavides firma que Del Vecchio € organicista, pois “seasociedade
éo valor primario ou fundamental, se a sua existéncia importa numa realidade
nova e superior, subsistente por si mesma, temos 0 organicismo” 1
‘A critica feita a teoria organicista € que esta pode levar a posices anti-
democraticas e autoritarias. A partir do momento em que se busca apenas 0
bem coletivo, esmaga-se a individualidade eo interesse de cada um passa a ser
irrelevante. Por consequéncia do raciocinio apontado, no plano do Estado,
terfamos um governo ditatorial, ou em bases rousseanianas, como veremos
mais a frente, um governo “despotico das multidées”.Confunde o preclaro,
autor “organicismo” e “coletivismo”. Porém, dizemos nos, se € organicismo,
guarda certa analogia com os organismos, ¢ assim sendo, constitui-se como a
totalidade de partes menores que sao os tecidos ¢ estes, por sua vez, é formado
por células. Portanto, na esfera politica, correspondera ao reconhecimento
do fato de que a sociedade maior, como a Nacao, € composta de sociedades
menores, regionais, municipais, locais, como sao as universidades, as familias,
Ws organizacoes profissionais, como a Ordem dos Advogados do Brasil — OAB,
ir exemplo.
E, portanto, se bem refletirmos, o oposto do coletivismo e isto sem cair
individualismo.
ma-
eo idealista.
icismo materialista, de Schaeffle e Spencer, constréi uma teoria
organicismo na biologia. Compara a sociedade ao organismo. Ou
ietaforicamente, podemos explicar o funcionamento da sociedade a partir
do corpo humano. A titulo de exemplo seria o mesmo que dizer
nays alah adetahe Ast 640 .
ye, Wet) nb oubotoeTEORIA GERAL DO ESTADO F CIENCIA POLITICA, TEORIAS SOBRE A ORIGEM DA SOCIEDADE HUMANA | 41
entre homem e Estado, que tem prejudicado bastante a compreensao da ideia
de bem comum, sempre que haja qualquer risco de colisao com interesses
individuais.
~ Cultivando a escola historica, 0 organicismo ético ¢ idealista bem defen-
do por Savigny, cré na existencia de um “espirito popular” (0 Volksgeist) que
funda em fontes historicas, costumeiras, tradicionais, geradoras de regras e 2.23 Ainterpretagdo eclética da sociedade
Ateoria eclética consiste em um misto das teorias organicista e mecanicis-
Implica o individual eo coletivo em uma so realidade. Entende o Professor
José Geraldo Britto Filomeno que a sociedade, tal como um corpo humano, é
Em linhas gerais, a interpretacao mecanicista da sociedade ¢ a concep¢ao posta de varios drgaos, constituidos por individuos personalizados, cada
doa qual ela se forma por juncao de individuos, agindo porsi mesmos com qual desenvolvendo um esforco no intuito de preencheras finalidades da vida
momiae liberdade. Em outras palavras, asociedade resultaria de umaatitude ocial, esforco tal que obedece aos designios sociais, e, portanto, a normas de
mnduta, sob pena de colapso do corpo (sociedade)”®
2 Ainterpretagdo mecanicista da sociedade
Entendemos que seja essa a melhor maneira de interpretar a questao em
omento. Devemos observar a individualidade sem deixar de observar a cole-
idade para que se compreenda nao s6 a origem, mas a melhor forma de se
duzir uma sociedade.
-contratualistas em geral, em oposicao a filosofia aristotélica que concluia ser
ociedade uma decorréncia natural, portanto, nao artificial, das necessidades
“Eo homem, por natureza, animal social e politico, vivendo em compa-
a de outros de sua espécie, sendo para ele, mais necessaria do que para os
itros animais, a vida em sociedade, pois a estes dotou a natureza de meios de Sociepave & Estavo
timenta e defesa do qual o homem carece; tém os outros animais instintos ¥
sre 0 que lhes titi ow nocivo, como a ovelha que instintivamente vé no lobo Cabe neste capitulo considerar também a basica distincao € correlacao
0. O homem, porém, possui somente o conhecimento geral do que lhe Sociedade ¢ Estado. Embora exista quem considere os dois termos como
essdrio a vida, nao podendo, porém, abarcar tudo com asua razao. Dai ser nimos absolutos, ha diferencas importantes.
‘ario ao homem viver em sociedade para que sejaajudado por outros seres
anos e busquem nas diversas questoes, este na medicina, aquele outro em
matéria, usando paraissoa linguagem articulada pela qual pode exprimir
\lmente o seu conceito a outrem, o que é muito mais limitado entre os outros
mais gregarios como a formiga, a abelha ou os castores. E, pois, o homem, . 8
mais comunicativo de todos os animais.”* considera o Estado como uma das formas de sociedade, caracterizada
~ Noentanto, apesar de ter o apoio de classicos da Ciencia Politica como errs’ PO oot pay gale sejam: a promocao da ordem politica ea
6teles e Sao TomAs, a ideia do Estado como algo natural foi substitufda es Soetededectelic_exire-catce,
tir do séc. XVII pelas doutrinas contratualistas de varias orientagdes, , Norberto Bobbio considera que tanto o Estado pode aparecer em
io A Sociedade como sob sua égide. Conceitua sociedade como 0 “con-
‘todas coincidem ao afirmar que o Estado resulta de uma unido mecanica
‘os homens. Isto deu origem a uma visao individualista nas relagoes ages intersubjetivas, anteriores, exteriores e contrarias ao Estado
Proudhon vé no Estado a opressao organizada e na sociedade a liberdade
. Karl Marx e Friedrich Engels nao compreendem 0 Estado como algo
, autonomo da sociedade. Entendem que 0 Estado nao esta fora da so-
mas dentro desta, portanto, distinto da mesma. Porseu turno, Auguste
O organicismo materialista ¢ objeto de criticas, pois pode levara exageros absurdos, cOM,
‘comparag6es excéntricas e desatinos légicos comparando a sociedade a organismos que
ilminam em um descrédito da teoria organicista
‘Tomas de, O governo dos principes. Trad, Arlindo Veiga dos Santos,42 | TEORIA GERALDO ESTADO E CIENCIA POLITICA
Integrando as doutrinas anteriores, podemos reconhecer que o Estado e
a sociedade sao distintos, que a sociedade é algo muito maior que o Estado, €
que no € ele a tinica associagao de grande porte que existe em uma dada so-
ciedade. Mas também é verdade que a sociedade politica chamada Estado tem.
por finalidade especifica nao o seu bem proprio, mas estabelecer as condicdes
basicas de paz e seguranca social que possibilitam as outras sociedades, grandes
€ pequenas, atingirem cada uma delas o seu fim especifico.
Teorias sobre os fundamentos da sociedade
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