Você está na página 1de 13

ELETRÔNICA DE

POTÊNCIA I

Vinícius Novicki Obadowski


Tiristor
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer a simbologia e curva característica de um tiristor.


 Analisar as características reais dos tiristores.
 Descrever circuitos de comando e acionamento com tiristores.

Introdução
Tiristor é o primeiro termo que o estudante da área de eletrônica de
potência deve conhecer e cujo significado deve apreender, pois todos
os estudos da área fundamentam-se nos princípios acerca dessa família
de componentes, cada um com sua particularidade e emprego ideais.
Diversos equipamentos modernos são projetados utilizando tiristores:
conversores de frequência, retificadores e chaves eletrônicas remotamente
acionadas são alguns dos exemplos. Embora esses nomes ainda não lhe
sejam familiares, vão ser conforme você se aprofundar nos estudos na
área de eletrônica de potência.
Neste capítulo, você conhecerá esses componentes e suas di-
ferenças. Assim, você verá como reconhecer a simbologia e curva
característica de um tiristor, como analisar as características reais
dos tiristores e como descrever circuitos de comando e acionamento
com tiristores.

Tiristor: definição
Tiristor é um termo que se refere a uma família de chaves eletrônicas de três
terminais cujos principais representantes são: o retificador controlado de
silício (SCR, Silicon Controlled Rectifier), o tríodo para corrente alternada
(TRIAC), o tiristor desligado pelo gatilho (GTO, Gate Turn-off Thyristor) e
2 Tiristor

o tiristor controlado por MOS (MCT, MOS Controlled Thyristor). Cada um


desses componentes é um tipo de tiristor e possui um emprego específico
dentro da área de eletrônica de potência.

Na indústria, costuma-se empregar o termo tiristor como sinônimo de SCR. Os outros


tiristores (GTO, TRIAC, MCT) são chamados por sua sigla particular a fim de se dife-
renciarem do SCR. Neste capítulo, o SCR é o dispositivo adotado para representar o
comportamento de toda a família de tiristores.

Você, como engenheiro, encontrará diversos problemas cujas soluções


dependerão do emprego de um ou mais tiristores. Um sistema de con-
versão de corrente alternada para contínua para transmissão de energia,
uma solução de servoacionamento para motores de indução trifásicos ou
a elevação de um nível de tensão contínua para outra de forma a melhorar
a eficiência de placas solares são algumas das possíveis aplicações que os
tiristores possuem na área elétrica. Nas próximas seções, serão explicados
em maiores detalhes o comportamento do SCR em termos ideais e reais, pois
esse dispositivo serve como base para que você entenda o funcionamento
das outras chaves eletrônicas.

SCR
O retificador controlado de silício é um tiristor composto por três terminais:
anodo, catodo e gatilho. Os dois primeiros terminais são idênticos àqueles
presentes no diodo comum, enquanto o gatilho é o terminal responsável por
permitir a condução de corrente quando a tensão anodo-catodo for positiva
(HART, 2012). Em outras palavras, o comportamento do SCR é idêntico ao do
diodo comum, exceto que se caracteriza por possuir um terceiro terminal que
pode ser empregado para permitir que o SCR entre em estado de condução. A
Figura 1 apresenta o símbolo adotado tradicionalmente para a representação
do SCR em circuitos elétricos.
Tiristor 3

Figura 1. Símbolo tradicional do SCR,


com indicação dos terminais de anodo
(A), catodo (K) e gatilho (G).
Fonte: Hart (2012, p. 8).

Como você pode inferir, um circuito que possua um SCR não funciona de
forma autônoma, como ocorre com circuitos projetados com diodo. Nesses, no
instante em que a tensão anodo-catodo for positiva, o diodo inicia a condução
de corrente a despeito de qualquer outro elemento externo, interrompendo
somente quando a condição de disparo não for mais satisfeita. No SCR, por
outro lado, somente ocorre a condução quando a tensão anodo-positiva e uma
corrente for fornecida ao gatilho e, similar ao diodo, o SCR para de conduzir
no instante em que a tensão anodo-catodo se tornar igual ou menor que zero.
Para facilitar a compreensão dessa questão, observe as Figuras 2a e 2b, que
mostram a diferença nas curvas ideias do diodo e do SCR.

Figura 2. (a) Curva ideal de um diodo comum. (b) Curva ideal de um SCR.
Fonte: Segundo e Rodrigues (2015, documento on-line).
4 Tiristor

Entretanto, embora as Figuras 2a e 2b retratem a operação do diodo e do


SCR, elas refletem parcialmente a operação real desses dispositivos — de
fato, ambos conduzem na situação apresentada nas figuras. Porém, existem
outros elementos que podem levar a condução — muitas vezes indesejada
pelo projetista do circuito — que tanto o SCR quanto o diodo entrem em
estado de condução.
Para explorar esses outros casos e compreender melhor a operação real do
SCR, observe as Figuras 3a e 3b, que dispõem de duas curvas reais: uma do
diodo e outra do SCR, respectivamente.

Figura 3. (a) Curva real de um diodo comum. (b) Curva real de um SCR.
Fonte: Segundo e Rodrigues (2015, documento on-line).

A Figura 3b carrega uma grande quantidade de informações e, por essa


razão, ela será analisada de forma pormenorizada. Primeiramente, as definições
das variáveis são as seguintes:
Tiristor 5

 IG é a corrente no gatilho;
 IA representa a corrente de anodo;
 VBR é a tensão máxima reversa que o SCR suporta antes de entrar em
condução ao ser polarizado reversamente (este é um modo de operação
normalmente não desejado);
 IR é o valor da corrente mínima na condução reversa;
 VBO é a tensão de breakover, que indica o ponto no qual não é necessária
corrente no gatilho para que o SCR inicie a condução;
 VT é a queda de tensão quando em operação do SCR (equivalente à
queda de tensão do diodo real);
 IGT é a corrente mínima de gatilho necessária para que um SCR sub-
metido à tensão VAK = VT inicie a condução de corrente;
 IH é a corrente de manutenção que deve ser mantida no gatilho para
manter o SCR em condução;
 IL é a corrente de carga mínima necessária para dispensar a corrente
de manutenção no gatilho.

Por meio da descrição das variáveis, é possível perceber que a corrente


no gatilho possui um valor mínimo necessário quando o SCR está submetido
a uma condição de baixa VAK e, ao mesmo tempo, pode não exigir corrente
nenhuma no gatilho se a tensão for VAK for igual ou maior que VBO. E,
assim como no diodo comum, se a tensão de polarização reversa for muito
elevada, isto é, se , o SCR irá permitir a condução de corrente
no sentido reverso.
Além das maneiras que você percebeu na Figura 3b, existe, ainda, a pos-
sibilidade de o SCR disparar devido a uma variação de tensão muito elevada
(também conhecido como disparo por dV/dt); se a variação da tensão no
tempo proceder de forma muito rápida — como no caso de um surto na rede
ou alguma sobretensão por rejeição de carga —, o SCR irá entrar em estado
de condução sozinho. EsSe tipo de ação é frequentemente um problema para
o projetista do circuito, mas a solução normalmente adotada é o emprego de
um circuito snubber, cuja função é servir de curto-circuito para as frequências
elevadas de tensão. A Figura 4 apresenta um exemplo de como empregar um
circuito snubber e um tiristor.
6 Tiristor

Figura 4. SCR e um circuito snubber (RC série).


Fonte: Segundo e Rodrigues (2015, documento on-line).

O SCR pode disparar em função do aumento de temperatura no com-


ponente; a elevação da temperatura faz com que o módulo da tensão re-
versa máxima tenda a diminuir, ocasionando o disparo do SCR. Outra
maneira é por meio de luz ou radiação eletromagnética de alta frequência
(ultravioleta, raio x, nêutrons), em que a ação desses fótons tem o efeito
similar a da presença de corrente no gatilho — um componente com esse
tipo de disparo também é chamado de LACSR (Light Activated Sillicon
Controlled Rectifier).

Circuitos de acionamento do tiristor


Existem diversas formas de executar o acionamento (disparo) de um tiristor.
Para que você possa compreender mais claramente, nesta seção serão expli-
cados os principais métodos empregados que lhe fornecerão subsídios para a
confecção de circuitos mais complexos conforme sua necessidade.
O primeiro método de acionamento que você aprenderá é o de comutação
natural, cuja operação trata do desligamento quando a corrente do anodo IA se
torna menor que a corrente de manutenção IH. A Figura 5 ilustra um circuito
no qual este tipo de situação ocorre.
Tiristor 7

Figura 5. Circuito com comutação natural do SCR (TIC 106).


Fonte: Segundo e Rodrigues (2015, documento on-line).

Perceba, na Figura 5, que, ao fechar a CH2, o TIC 106 não dispara pela
ausência de corrente no gatilho; porém, no fechamento da chave CH1, em
função do divisor de tensão, uma corrente passa a ser fornecida ao gatilho e,
toda vez que a tensão anodo-catodo encontrar-se em um valor superior ao VT
do TIC 106, ele disparará. No entanto, por estar submetido a uma fonte AC,
próximo ao cruzamento pelo zero de tensão da rede, a corrente de anodo será
inferior à de manutenção, fazendo com que o circuito desligue naturalmente.
Outra opção é a chamada comutação forçada, em que o objetivo é inter-
romper a corrente que passa pelo tiristor. As Figuras 6 e 7 apresentam duas
técnicas distintas para realização desta tarefa.

Figura 6. Circuito com comutação forçada do TIC 106, bloqueio por chave.
Fonte: Segundo e Rodrigues (2015, documento on-line).
8 Tiristor

Figura 7. Circuito com comutação forçada por meio de capacitor.


Fonte: Segundo e Rodrigues (2015, documento on-line).

Na Figura 6, com o fechamento das chaves CH1 e CH2 , o TIC 106


permanecerá conduzindo para sempre, pois, como a fonte é de corrente
contínua, nunca acontecerá a interrupção da corrente de anodo; mesmo
removendo a corrente de gatilho, o TIC 106 continuará a conduzir, pois
a corrente de anodo é superior à da de manutenção. A maneira trivial de
fazer com o TIC 106 interrompa seu funcionamento é desligando todo o
circuito (abertura de CH2), o que pode não ser desejado dada a aplicação,
ou o fechamento seguido da abertura da chave CH3, pois, ao fechá-la, a
corrente que antes passava pelo TIC 106 passará pela chave CH3, o que
fará com que a corrente de anodo se torne inferior à da de manutenção.
Para que o circuito volte a funcionar como antes, será necessário abrir
CH3 e fechar CH1, para que uma nova corrente de gatilho seja fornecida
enquanto a tensão anodo-catodo é positiva.
Por outro lado, na Figura 7, com o fechamento de CH1, ocorre o funcio-
namento do circuito (acendimento da lâmpada e condução de corrente pelo
anodo do TIC 106). Dado que o tiristor conduz, ocorre o carregamento do
capacitor C1, e, ao fechar a chave CH2 o capacitor fica em paralelo ao TIC
106, aplicando sobre este uma tensão reversa, bloqueando, portanto, o tiristor
e impedindo seu funcionamento.
Tiristor 9

Outros tipos de tiristores


Na seção de introdução deste capítulo, foram apresentados outros tipos de
tiristores além do SCR (GTO, TRIAC e MCT). Fundamentalmente, todos eles
funcionam da mesma forma, mas cada um possui uma particularidade devido à
sua operação. O GTO apresenta um comportamento similar ao do SCR, porém,
ao fornecer no gatilho uma corrente reversa elevada (em torno de 2/3 da corrente
do anodo), é possível comutar o componente da mesma forma como se uma
chave em paralelo tivesse sido fechada. Embora essa característica permita uma
operação mais simples, pois dispensaria o uso de uma chave externa e um segundo
tipo de circuito de acionamento, o fato de necessitar de uma corrente reversa de
gatilho elevada faz com que o GTO tenha seu uso bastante restringido, porque
um circuito de acionamento que gere uma corrente reversa elevada apresenta
uma complexidade também elevada, dificultando o emprego em aplicações de
grandes potências (linhas de transmissão ou estações de retificação/conversão
de frequência). O MCT, por sua vez, também tem seu uso restrito por problemas
em sua fabricação e posterior substituição por MOSFET, transistores de potência
que empregam o conceito MOS em conjunto com transistor FET (BALIGA,
2012). Outro componente também associado a tiristores é o tríodo de corrente
de alternada, que, essencialmente, é um componente que integra dois SCR com
sentidos contrários em paralelo e com o gatilho em comum. A simbologia do
TRIAC é apresentada na Figura 8.

Figura 8. Simbologia
padrão para TRIAC.
Fonte: Hart (2012, p. 8).
10 Tiristor

BALIGA, B. J. Advanced high voltage power device concepts. New York: Springer New
York, 2012.
HART, D. W. Eletrônica de potência: análise e projetos de circuitos. Porto Alegre: AMGH, 2012.
RASHID, M. Eletrônica de potência: dispositivos, circuitos e aplicações. São Paulo: Pe-
arson, 2014.
SEDRA, A. S.; SMITH, K. C. Microeletrônica. 5. ed. São Paulo: Pearson, 2007.
SEGUNDO, A. K. R.; RODRIGUES, C. L. C. Eletrônica de potência e acionamentos elétricos.
Ouro Preto: Instituto Federal de Minas Gerais, 2015. Disponível em: https://www.ufsm.br/
unidades-universitarias/ctism/cte/wp-content/uploads/sites/413/2018/12/02_arte_ele-
tronica_de_potencia.pdf. Acesso em: 2 ago. 2019.

Você também pode gostar