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ec ma ulc | wen G FUNDAMENTOS, METODO E PESQUISAS | 4 t A CAMINHADA : PELAS CONCEITUACOES I - Introducao Estilo adotado na redagéio do trabalho er (1972), em uma de suas obras, relata como — em suas “tentativas desaiei interessou-se pela Fenomenologia e a ela passov Hi 8 Légicas, dizendo sobre ‘ads para penctrar na Filosofia" (p. 99) — ¢ dedicar, a partir do contato que teve com o livro Investig ndo apenas por saber de sua enialidade, como, também, por ter sido ele 0 fl6sofo que conseguiu chegar i mais original Significativa interpretago desse “processo de pensamento”, cuja repercusséo tem sido t grande, talvez até maior que a do préprio Hussetl, seu iniciador surpresa, fiquei consideravelmente aliviada disposta a ra compreender a Fenomenologia. Fiquei surpresa com estas afirmagées de Heide Além ar a enorm: dificuldade que tenho encontrad 0 conseguinde deslindé-la completamente até le hoje. YOLANDA CINTRAO FORGH O referido texto do ilustre filésofo inspiou-me, também, a rever o que teria me leva fessar'¢ me “apaixonar” pela Fenomenologia, e a chegar, fin sonhecé- a como o fundamento para a compreensio do existir humano, bem como do meu modo de atuar, decorrente de tal entendimento, em minha vida profissional e pessoal Minhas lembrangas conduziram-me a refletir sobre as razées que levariam uma psicéloga a ter preferéncia por esta ou aquela abordagem, num campo de estudos onde hi diversidade de enfoques, de idéias principios bastante diferentes, sendo alguns deles até mesmo opostos. O ser humano tem-se preocupado, através dos tempos, com o conhecimento ¢ a compreensio de sua existéncia no mundo, Profundas reflexdes ¢ estudos foram feitos, inicialmente, pelos filGsofos; os primeiros psicélogos surgiram apenas no final do sécul passado, procurando tomar a Psicologia uma ciéncia objetiva, Wundt foi o iniciador des movimento, fundando, em 1879, o Primeiro Laboratério de Psicologia Experimental. Desde enliio, foram surgindo vétias abordagens na Psicologia e dentro destas muitas teorias da personalidade Uma das razdes para a multiplicidade de abordagens no campo da Psicolo Personalidade 0 fato de o psiquismo humano revelar-se através do proprio cxistir e de set este muito amplo complexo. Os fendmenos psiquicos sio vividos, imediatamente, pelo Psicélogo que os pretende estudar, mas, para manter determinada atitude cientiica, ele Procura estudé-los nas outras pessoas, que passam, entZo, a ser os sujeitos de suas investiga gies. Ponti, o cxistirdestes sujeitos niio apresenta apenas aspectos passiveis de observagio, em suas manifestagées exteriores, mas contém outros que ficam ocultos aos mais competentés € atentos observadores, por ocorrerem no intimo das pessoas. Acontece que estas niio so ransparentes ¢ geralmente no querem revelar a sua intimidade; além disso, passam por fenémenos que, as vezes, nem chegam a perceber, pois ocorrem num nivel muite que € o seu inconsciente Acresce, ainda, que 0 existir cotidiano esté repleto de aspectos contrastantes. Assim, por exemplo, somos racionais¢ livres, mas ndo podemos negar que também somos determinados condicionamenios; dedicamo- n-estar de nossos semelhantes, mas, ao mesmc npo, Nos empenhamos na nossa propria realizagdo pessoal; convivemos com as pessoas ¢ ym os animais ¢ as coisas deste mundo, mas, por outro lado, nos ‘ confrontamos com a nossa solidio; experimentamos momentos felizes de grande trangii dade, mas niio conseguimos evitar as nossas angiistias e afligdes. Enfim, vivemos mas também morremos, numa paradoxal simultaneidade, pois, a cada dia que passa, estamos caminhando sentido d nais plenamente, como no-de morrer mais proximamente xistir cotidiano imediato é vivenciado como uma totalidade que integra todos os set aspectos complexos ¢ tantes, porém, 0 processo racional de teorizado parcial delimitador. Todos mos tantas coisas, de modo vivencialmente global, que nio ACAMINHADA PELAS CONCEITUAGOES 3 conseguimos explicar de modo preciso € completo. Assim acontece, por-exemplo, com a mura que sentimos por alg lizes, a tristeza que nos invade € nos oprime nos momentos de afligdo. Quando me tam se a alegria que nos envolve e nos engrandece nos momentos pe me pedirem para defini-las eu posso tentar, porém, todas as minhas explicagdes deixam-me sempre a sensago de ndo ter conseguido fazé-lo de modo completo. Eo que acontece nessas situagdes ¢ em tantas outras da vida cotidiana, ¢ também na vivéncia do psicélogo nos momentos de atuagao profissional. Todas essas complexidades e contrasts tém dificultado a investigago no campo da Psicologia da Personalidade pois, como ciéncia, ela precisa ser elaborada por meio de ada uma dessas experiéncas eu di 1 Sci no que consis 70 que sim, mas se prinefpios claros, logicamente organizados. Esta situago tem levado os seus estudiosos a investi arem o existir humano, focalizando ora uns, ora outros de seus miltiplos e, 3s vezes, paradoxais aspecto Assim, foram surgindo as varias teorias psicol6gicas, tais como a comportamental, a psicanalitica e a humanista, sendo, cada uma delas, um conjunto de iadas, que procuram explicar o ser humano a partir de uma nas alguns de seus aspectos Como estudiosa da Psicologia, tenho refletido muito a respeito dessas dificuldades e rerentemente artic formulagées © perspectiva que abrange ap amo professora, tenho partlhado da inguietaco de meus alunos, quando sentem que ecisam adotar uma posicio diante da diversidade que percebem nas diferentes teorias. A inquietago aumenta no momento de ultrapassarmos a situagio de meros estudiosos ntrarmos na prética; ou, em outras palavras, quando, por exemplo, nos defrontamos com alguém que precisa de nos suas dificuldades pessoais Freud, Jung, Skinner, Re atuagdo competéncia profissional, para ajudé-lo a superar as ger € tantos outros... Qual deles seguir ou adotar ara a nossa prética de psicSlogos? Que autores nos fomecem subsidio par compreendermos 0 modo como vive as pessoas que solicitam a nossa ajuda, quais os meios mo Suporte para ajudé-las a viverem melhor? Acontece q} Des; ¢ entio somo para ele préprio. O modo como tenta 0 psicdlogo também € objeto de suas investigagdes ¢ refl i perguntas tanto se voltam para os seus cliente compreender ¢ ajudar outras pess fet do melhor modo possfvel 6 basicamente, 0: modo como tenta compreender-se ¢ As teorias psicol6gicas surgem a partir da vivér io s6 como estudiosos ofissionais, mas também como seres humanos vivendo cotidianamente nas mais variadas Encia psicoldgica esté entrelagada:a vivencia do_psicélogo; ¢ € na altemnéne erligada das teorias com st véncia que ele vai chegan s preferéncias te6ricas e jcgHes, como profissional e como ser humano, que experimenta alegrias e triste We fdas de c ebricas racionais e de crengas que ele no consegue explicar satisfatoriame ies As dos sujeitos que ele pretende conhever: sio conviogées imb YOLANDA CINTRAO FORGI ERI do apenas da coeréncia de seu raciocinio como, também, de seus sentimentos ¢ de su cia imediata global. E estes nio est io estagnados, mas continuamente abertos & revisio, mudanga e ampliagfo, conseqientes aos estudos continuos e A constante abertura 3S suas Préprias experié ncias, Refletindo sobre todos esses fatos, senti necessida ide de identificar ndo apenas as teorias bém as vivencias que teriam contribuido para que eu soffesse essa influéncia e me encaminhasse para a Fenomenologia Enfim, para ser aut critica — do sivel nele © 05 autores que me influenciaram, mas tam intica em minhas enune igdes e para facilitar a compreensiio —e a rabalho, considerei ser indispen te da trajetéria que percomri at nfoque de personalidade que aprese uir Os varios elementos que fizeram A sua elaboragto. E entre eles e chegar tantos 0s componentes racionais e objetivos. 0S, que esto present ontram-se t tes em todas as elaborages cientificas, ente sejam mencionados. ss razBes, a0 redigir este trabalho precise adotar um estilo, de certo modo, ira dar conta do que pretendia ne Sentir apoiada por escritores fenomendle autobiogrifico pois s6 assim conse E me encorajei a fazé- ke 0s, entre os quais destaco Merleau-Ponty "om nossa prépria vivencia (1973) quando afirma: “E no contato «: ue claboramos as nogées fundamentais das quais a Psicologia p. 33). se serve a cada moment Assim sendo, o estilo que aq Fenomeno mo diria Spieg Ponty (1973) adoto pode ser considerado como v elberg (1975), ou uma forma de vivé-ta modo de fazer mo afirmaria 2. Vivéncias Iniciais A lembranca ereflexio a respeito das primeira vivéncias que poderiam ter propiciado ‘neu encaminhamento para a Fenomenologia reportaram-me, espontaneamente; a uma €peca em que ainda nfo tinha o menor interesse pelo estudo de textos cientificos: a minha infincia. Recordo-me de que, desde crianca, tive a preocupacio de estar r importantes para. mim, enta e procurar preender as minhas prOprias experiéneias © as das pe formando, gradativa ete, através das mesmas, de modo intuitiv obal, um conjunto de que hoje poderia denominar de personalidade humana, A pattir da juventude, quando c Jembro-me di incipios si omecei a entrar em contat amas delas me intrigaraim im as obras de Psicologi impressionaram, por me rev ce me levava a ref vant al larem alge completamente novo e fascinante, que r inguiet odifi let sobre aquilo em ar ou ampliar as idéias que havia formado sobre té ent acreditara, levando-me an © existir humano. Assim foi © meu contato e envolviménto com a Psican Por outro lado; ¢ com maior freqUéncia, no meu percurso ¢ lespertaram-me grande intere para confirmar e escla mo intelectual, varias obras or pereeber, ou apenas pressentir, q continham a 4s minhas conviogdes. Foi o que aconteceu com a maioria dos A CAMINHADA PELAS CONCEITUAGOES 5 textos de Fenomenologia que, embora me parecessem muito dificeis ¢ desafiassem meu naciocinio, paradoxalmente, também me proporcionavam um sentimento de certa familia dade; era como se os autores me revelassem, em suas formulagées, certo saber elementar, que cu jd havia vislumbrado vivencialmente. Iso acontecen intimeras vezes, mais sob a forma de sentimento do que de um reconhecimento racional. Por esse motivo, encontro dificuldades em identificar e enunciar pormenores a esse respeito, Consigo, apenas, vislumbrar duas circuns tincias significativamente importantes, ambas decorrentes do convivio com minha mae. ‘Uma delas surgiu quando comecei a perceber a enorme oscilaedo-de sentimentos que experimentava em relagio a ela, Como mie extremosa, carinhosa e dedicada proporciona me momentos imensamente agra e amor € compreensio; porém, no de forma comum, mas bastante estranha e, com alguma freqiiéncia, ela se transformava, de modo nexplicdvel e repentino, numa pessoa profundamente ansiosa ¢ confusa, que no conse; sequer cuidar de si mesma, Por esse motivo, as minhas experiéncias de amor, trangiilidade mavam-se, periédica e intensamente, com as de solidio, afligao ¢ inseguran diante dessas intensas oscilagdes suscitaram-me a necessidade imperiosa de agir no sentido de alivié-las. E no meu egoeentrismo infantil, 0 recurso do qual omecei a me utilizar foi estar atenta’d minha vivéncia e & dela, para tentar gir de forma a no he despertar aquele modo de ser que me afligia intensamente. Tudo isto leva je a supor que, desde crianca estive, de certo modo, voltada para refletir sobre a experiéncia vivid, ou em outras palavras, para “ir as préprias coisas”, que € um principio fundamental da Fenomenologia de Husser A segunda circunstincia, bastante relacionada & primeira, foi a necessidade que, desde muito cedo, tive de amar a outras pessoas, além de minha mie, ¢ delas me sentir préxima, Minhas reflexes de crianga levaram-me a perceber, com muita ansiedadk com ela satisfazer, permanentemente, a minha necessidade de amor e catinh meus esforgos para manté-la trangiila e préxima, minha mie, periodicamente, em decorrén: cia de suas perturbagées psicolégicas, distanciava-se de mim ¢ se tornava uma pessoa completamente estranha. Isto levou-me, desde a inffncia, a tentar querer bem a outras pessoas 4 me sentir perto delas. Por ser ainda crianga, consegui fazé-lo sem defesas ou restrigdcs, iniciando-me €, de certo modo, “exereitando-me”, satisfatoriamente, na relagio Eu-Tu, presentada pelo fenomendlogo Buber como « mais humana forma de existir e adquitir onhecimentos. Tais circunstincias, que influenciaram profundamente a minha existéncia, tomaram-se tudes que até 0s dias de hoje marcam o meu modo de viver, parecendo-me terem sido as principais propulsoras de meu encaminhamento para a Fenomenologia e meu profundo rimento oc Foram esas circunstincias, também, que, quando jovem, levaram-me a sentir um interesse pela Psicologia e a transformé-la no foro de meus estudos ¢ reflexdes. 6 YOLANDA CINTRAO FORGHIER! Il - Influéncia de Psicdlogos, Psiquiatras e Fildsofos no Pensamento da Autora Voltando-me para 0s autores ¢ 0s textos cientificos que tiveram influéneia no desenvol vimento de minhas idéias, reportei-me, espontinea ¢ agradavelmente, ao inicio de minh 0, em 1942, Sapientiae” (Sec rajetGria como leitora de Psicologia, 0 que aconteceu hd cerea de meio séc quando ingressei na Faculdade de Filosofia Ciéncias e Letras “Sed Estava eu trangiilamente entregue as lembrangas de minha vida como estudante, quando, d -me & meméria uma inumerdvel quantidade de livros que “desabaram"” sobre na angustiante sensago de precisar identificar todos cles a fim de pode! on buido para a meu pensamento Desanimada, interrompi a redago ficando distraidamente a olhar para a minha enorme estante de livros, quase todos lidos, alguns com muito interesse ¢ bastante proveito, a maioria del porém, lidos com pouco envolvimento quase- completame: am-se, casualmente, em uma antiga revista da PUC-SP, lenta © saudosamente, deparando-me, entio, com um artigo de Montoro (1976), sobre 0s objetivos do ensino do Direito; baseado em Pascal, o autor inicia sew artigo afirmando esquecidos. Eis que meus olhos fix que passei a folh Ieitura, casual e oportuna, revitalizou o meu Animo, mostrando-me um alternativa para rever e selecionar os textos que me influenciaram. Decidi considerar, apenas, 0s autores, 10s que “Tn por le forma significat m envolvic profunda, ¢ o que ficou da interpretagdo que tenho dado as suas idéias, relacionando-as &s minhas de vida, tanto profssional como pessoa cperiéncias Foi com esta intenglo que, sem recorrer 3s intimeras anotagdes de bibliografia de cursos jf ministrados ou de te ns preparados para con! nbrar- réncias ou publicagdes, procure I medosautoresque foram importantes na minha trajetriaem diregao ao enfoque fenomenol6gico dda personalidade. Lembrei-me, com muita clareza, do primeiro autor que me havia impressionado profundamente: foi Freud, em 1943, no 2° ano da Faculdade; a tradugdo de seus textos, escritos em alemio, biblioteca do “Sedes”, Por isso havia nda nao faziam parte do acervo: tomado contato com a psicandlise somet través das aulas expositivas de alguns professo- mas, estas haviam sido suficientes para me deixarem encantada com suas revelagGes sobre 0 inconsciente, 0 dinamismo deste ¢ suas inf luéncias no modo de pensar e de agir das Pessoas, sem que elas disso se aper Embora fosse grande 0 meu interes: A CAMINHADA PELAS CONCEITUAGOES 7 a depois, quando, retomando ao “Sedes” para cursar Graduagio, entrei em contato com as Obras Completas de Freud. Foi quando, além da portunidadede aprofundarvérios conceitos, conheciaPsicandlise comométodo psicoterapeéutico © iniciei-me na sua pratica, com a supervisto de professores, Nao cheguei a me’ tomar um psicanalista, mas, os conhecimentos que aduiri nesse campo foram to marcantes que, desde nto, os tenho mantido e considerado, procurando estar atenta as possiveis interfer€ncias do inconsciente na maneira de pensar ¢ agit de meus clientes e esforgando-me por desvend em minha propria vivéncia segundo autor que me impressionou profundamente foi Rogers. Iniciei meu contato com suas idéias, casualmente, em 1965, quando coordenei um curso de reciclagem para professores secundirios da rede oficial de ensino, onganizado pelo “Sedes", em convénio com a CAPES ¢ a USP. Maria José Werebe, entio professora da USP, utlizou, nesse curso, uma apostila com o resumo do livro Client Centered Terapy desse autor (1951), que despertou meu interessse pela sua perspectiva a respeito da personalidade humana. Passei, entdo, a localizar ler esta ¢ outras obras desse psicdlogo americano (1942, 1951, 1954, 1961), que encontrei biblioteca da USP. Meu envolvimento com Rogers tomou-se tio grande, que elaborei a minha ‘Tese de Doutorado (Forghieri, 1972), adotando como referencial teérico, as suas formulagées sobre a personalidade e a psicoteraia. Nas attudes faciltadoras propostas pc Rogers (1961, 1967, 1971) havia encontrado os fundamentos para a atuacdo que jé vinha nnvolvendo, desde o inicio de minha carreira, como docente ¢ como psicoterapeuta, Devido a referéncias feitas por esse autor, fiquei conhecendo algumas idéias do fildsofo Buber, pelo qual interessei-me profundamente, passando a ler, de suas obras, todas aquelas que con: ncontrar na ocasigo (1947, 1971). Acabei concluindo, cm minha Tese, que as trés atitudes facilitadoras apresentadas por Rogers (consideracio incondicional Compreensio empatica e congniéncia) fundamentavam-se na relago Eu-Tu, formulada por endo esta a propiciadora do crescimento ¢ amadu 10 psicolégico das pessoas ue se encontram psicologicamente é meu filésofo prefer de hoje; estou sempre em busca de suas obras, Procurando encontrar ler aquelas que esto relacionadas ao psiquismo humano (1974, 1977 1982), Entretanto, fui, gradativamente, afastando-me de Rogers, por varias circunstincias, algumas das quais lembro nitidamente, Uma delas ocorreu na defesa publica de minha Tese de Doutoramento, em 1973, a partir de observagées feitas por um dos examinadon. Competente, querido e saudoso Dante Moreira lite. Ele alertou-me para 0 fato de que eu estava interpretando Rogers, além do proprio Rogers; em outras palavras, indo mais a fundo do que o autor pretendia. Concluiu que eu era muito mais fenomensloga do que rogeriana aconselhou-me a estudar Fenomenologia: Na semana seguinte, presenteou-me com dois livros dos psiquiatras ¢ psicdlogos fenomendlogos Boss (1963) ¢ Binswanger (1 dcasicio ainda no exist as bibliotecas e livrarias de Séo Paulo. YOLANDA CINTRAO FORGHIER! Foi assim que mie iniciei-me, conscienten ogi, ao qual légico em Psic te, no enfoque dedico-me até hoje. O professor Dante Moreira Leite teve influéncia decisiva sta escolha, néio s6 devido &s suas palavras e aos importantes livros que me também, porque a sua oi veio esclarecer vrias insatis jes que eu ja sentir a respeito da teoria de deconréncia de al Estas foram-se acentuando nos anos seguintes, em que vivenciei em minha vida profissional e pessoal Na atuagio profissional comecei a notar que alguns de meus c tudes failitadoras de consi ensdio empética, aliando-as & congruéncia, Conforme pude verific nas sit ficuldade em vivenciar comigo as rao positiva compre. com eles, posteriorme era sua habitual no icionamento com as pessoas. Dialogando com os alunos ¢ obser or se sentirem tolhidos em sua agressividade, q onde também adotava as trés atitudes facilitad. as, verifiquei que analisar @histéria de vida de minh empenho da familia e dos amigos no sentido d ns deles. Por outro lad mie, observei que todo citi-la e compre em nada havia contribuido para aliviar as suas crises de angdstia ¢ impedi enlermidade psicolégica. a questionar a teoria geral das relagées human: que nem sempre a manifestacao des facilitadoras de nles nos sujeitos e os direciona para a importincia da aceitaca 2, mas apena ire parénteses”, comecei a refleir a respeit ressividade, imaginando que também poderiam contribuir, dé erta atitudes semelhi xpressiio de Huss ( aprendera que set amado e amar eram ssarios P de crescimento, mas ser ofendido reagir também deviam fazer parte desse e880. O proprio Rogers deixara transparecer, em uma entrevista filmada, como se sentira om a educagio excessivame! iva que recebera de seus pais ¢ 0 quanto stimulara para elaborar sua teoria do relacionamento interpessoal tomando-se, assim, ma si njustica, ocorrida comigo numa Instituico onde eu lecionava, ambém contrib lecer a minha idéia dos aspectos positivos da agressividade: a oordenadora do curso, com bastante mé fé, de forma velada ¢ utilizando-se de mentiras, pretend. afastar-me da docéncia do mesmo, Tomei conhecimento disto, casualmente de uina funcionéria ¢ alguns alunos, a tempo de me defender tratando do p tame 0 dora e ido. 08 fatos junto as auloridades superiores; d onse wecer no curso, mais fortalecida e segu Lembro-me, nitidame: a € 0 sentimento de revolta pela injustica sof despertaramn toda pete de me defender de forma leal de minha personalidade, a Pouco explorada e o quanto estes pod ever 0 desabr Percebi, com muita entio mui har de meus recursos pessoais {AMINHADA PELAS CONCEITUAGC 9 A recordagdio desse fato trouxe-me a Jembranga um curso sobre Rogers, durante o qua ta um filme sobre “Trés abordagens em psicoterapia: Rogers, Perls e Elis”. A principio fiquei muito chocada com a atuago de Perls, quando desafiou frontalmente a cliente que fora ratada pelos trés, chamando-a de crianga, como se duvidasse ser ela capaz de agir como dulta, Esta, inicialn 20u muito magoada, chorando, como sempre fazia quando se , Mas, & medida que ele continuou a desafié-la, ela foi comegando a se sentir giu e chegou a brigar abertamente com cle, passando, entio, a defender-se como ma pessoa adulta, Apds este desfecho conclu que as atitudes facilitadoras de Rogers — 4 atendera anteriormente — néo haviam sido “suficientes” para livri-la de suas constantes mentagdes ¢ prolongadas crises de choro, Contudo, nao era essa a intencio dos organizadores filme, que haviam pretendido, através io contrastante dos dois psicoterapeutas, dar taque ¢ valorizar 0 “calor humano” das atitudes de Rogers. Nesse panorama, um acontecimento trigico contribuiu para abalar ainda mais a minha so otimista da personalidade: meu pai, um homem caridoso, que sempre ajudara materi espiritualmente as necessitavam, foi violentamente assassinado, & queima wpa, por um ladrio, dentro do seu proprio lar. Minha mie, meus inmios e eu vivemos mentos de enorme sofrimento; a perda irrepardvel de uma pessoa tio querida, a revolta com acontecimento, a acdo precétia da policia...Entretanto, a propria tragédia trouxe uma grande proximaco entre nds, um partlhar conjunto do enorme sofrimento, que acabou converten: do-se em muito amor. amor entre n6s ¢ amor de outros familiares ¢ de uma porgao de amig que nos confortaram nesse momento tio dificil de nossa vida! Quantos semtimentos opostos xistentes vivemos nessa ocasifo: raiva e amor, revolta e solidatiedade. Os acontecimentos anteriores ¢ principalmente este Gitimo, tio profundamente dramé ixaram-me confusa durante algum tempo, até 0 momento em que comecei a aceitar os paradoxos da existéncia, seus aspectos contrastantes, os quais, de certo incompreen urticulam-se e complementam-se, passando a constituir uma unidade. Recorde ncia com minha mfe, na infincia, que me proporcionara experimentar, com muita s primeiros contrastes da minha existéncia Todos esses fatos despertaram o meu interesse pela versio existencialista da Fenon a, que mostra as idades do existir humano, enfatizando a angiista e o sofrimen- Foi assim que, depois de um periodo inicial de estidos de textos de Freud, seguido de dos aprofundados de Rogers e, posteriormente, de Buber, Binswanger c Boss, passei de fildsofos existencialistas como Kierkegaard (1964, 1972), Nietzsche (1973), Sartre idegger (19712), Eu sentia uma necessidade enorme de estudar erefletira re imento, da angiistia, do nada, da solid humana, pois até entio jé estivera volta tadamente, apenas para a satisfaco, 0 amor, a bondade ¢ a solidariedade mente, fui compreendendo 0 enfoque fenomenol6gico como aquele que rea existir humano em sua totalidade, abran; a tristeza ¢ a ale 10 YOLANDACINTRAO FORGHIER! ranqiilidade, a raiva eo amor, a vida € a morte, como pélos que se articulam.numa dnica ia um dos extremos, aparentemente opostos, 0 seu real de nhos quando j4 parihamos nosso existir com estrunura € cuja vivencia dé a ado, Sabemos, verdadeirament signi fe, 0 que é a tranquilidade, ao vivenciar uma si mente st angistia; sentimo-nos profund alguém,; sabemos, de fato, no que consiste o infortino, se jétivemos ocasio de nos sentirmos felizes Completando a lembran que me influenciaram, recordei-me de um encontro ocasional ¢ oportun Dr. Van Acker, um antigo mestre do “ que me proporcionou, por sua sui conhecimento e envolver-me com a obra do psiquiatra e psicdlogo fenomendlogo 173). Depois deste, por indicagio bibliogrifica de Binswanger, fui ao psiquiaira Minkowski (1970), pelo qual me interessei, entindo um grande envolvimento com suas idéias ras fenomenélogos,tais como Binswanger, Boss, Berg, van den ¢ Mink fundamentavam suas formu necessidade de entrar em contato com os fil6sofos nos quais s de Husserl (1965, 196 et € aprofundar as referida: fo, a examinar te tivo de es passei, 970) e de Heidegger (1971, 1972), com 0 ot ormullagdes. A leitura de obras destes fil6sofos foi, para mim, inicialmen nis, além de Serem muito complexas, levaram-me a ter que me debrugar ¢ hastantes abstratos, quando até ento estava habituada a estudar assuntos relacio vivencia ou ao psiquismo humano, procurando d nsinamentos que propiciass melhorar a minha atuacio profissional De Husserl © Heidegger, fui a0 fil6sofo Merleau-Ponty (1971 cujos textos facilitaram-me o estabelecimento de relagdes entre a reflexio filoséfica ¢ a reflexao sobre ncia, propiciaram-me reduzir as di inicialmente encontradas ¢ me encorajaram chegar ao meu proprio modo de compreender a Fenomenologia Ill - Razdes paraa Elaboragao de um Enfoque Fenomenolégico da Personalidade Oenfoque fenomenol ico em Psicologia surgiu no campo da Filosofia, no inicio dest § tomou impulso € se ¢ década de 50; até os dias atuais, ituir um conjunto de prinefpios articulados, unanimemente século, mas nvolveu a partir entretanto, no chegou a con accito pelos psicélogos ades que surgem quando estes cientistas oque ter como suporte fin ritamente abstratos, ¢a Psicologia ser uma cincia de fatos, que esti cia, Tal dificuldade ¢ significativamente ampliada, em virtude da Fenomenologia apresentar-se apenas como um método de i Isto acontece devido a uma série de dific procuram explicité-lo. Uma delas decor tos filos6ficos que sai voltada para a concretude da ACAMINHADA PELAS CONCEITUACOES. 1 fendmeno; embora, este seja inseparivel da atitude originada do modo como ela considera ¢ fenmeno, nao chega a constituir um conjunto de principios igualmente interpretados pelos fildsofos a ela pertencentes. Nesse panorama, tém surgido algumas propostas de enfoque fenomenolégico na Psicologia elaboradas principalmentc. por psiquiatras ¢ psicélogos europeus, que contén importantes contribuigdes para a compreensio do existir humano, priorizando uma ou algumas de suas caracteristicas bisicas, no chegando, entretanto, a constituir um enfoque sicol6gico pormenorizado da personalidade. Al $s americanes, tais como Giorgi (1978), Keen (1979) e Kruger (198: ‘também se tém dedicado a elaboragao de uma Psicologia Fenomenol6gica. Entre estes, Giorgi que € 0 mais renomado, considera que “uma genuina Psicologia Fenomenolégic ainda nio existe, € a razo é o fato da Fenome: cer compreendida basicamente com ima filosofia, com impli c és neretamente para > desenvolvimento de A falta de uma abordagem fenomenolégica pormen ivéncia humana, tem dificultado sobremaneira a compreensig tos Teniomenol6gicos que norteiam a pritica profissional no ca 5 quisa. Neste dltimo, especial se um itefpretacio e comparacdo d fa fato que prejudica o pro € aprimoramento do préprio enfoque fenomenolégico da personalidade, pois faltam, a este ns pattimetros a serem verificados de forma sistematizada, a fim de serem confirmados mpliados ou refutados ¢ enriquecidos com novas formulay Coinsidero que o prinefpio bisico do método fenomenolégico (introduzido por Husser! as proprias coisas”, ou, em outras palavras, de ir ao proprio fenémeno para desvend a.em si mesmo”, independentemente de teorias a seu respeito, refere sido elaboradas por meio da utilizacio do método experimental, que onta a intencionalidade, Entretanto, ndo diz respeito as vitias formulag ravés do emprego do priprio método fenomenolégico. Julgo importante que tais formulagSes sejam levadas de pesquisas fenomenol6gicas, niio como métodos rigidos de interpretacio, mas, como parimetros flexiveis que permitam confirmé-las, descrevendo-as melhor, ov refuté-las, modificando-as; nesse processo, a a humana deve sempre servir de contraponto, pois, na Psicol laboragSes conceituais. nso que a critica feita pela Fenomenologia & elaborago e utilizagdo de teorias, neste l6gicas, diz respeito ao modo pretensamente objetivo como ém sid elaboradas © utlizadas. Por xlas as razdes acima descritas, considerei que a elabor fenomenolgico da personalidade seria uma significativa contribuigi explorada sob tal perspectiva.

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