Você está na página 1de 1

CARTA AOS JOVENS*

 
Ivan Pavlov**
 
O que desejaria eu aos jovens de minha pátria, consagrados à ciência?
Antes de tudo - constância. Nunca posso falar sem emoção sobre essa importante condição
para o trabalho científico. Constância, constância, constância! Desde o início de seus trabalhos
habituem-se a uma rigorosa constância na acumulação do conhecimento.
Aprendam o ABC da ciência antes de tentar galgar seu cume. Nunca acreditem no que se
segue sem assimilar o que vem antes. Nunca tentem dissimular sua falta de conhecimento, ainda
que com suposições e hipóteses audaciosas. Como se alegra nossa vista com o jogo de cores dessa
bolha de sabão - no entanto ela, inevitavelmente, arrebenta e nada fica além de confusão.
Acostumem-se à discrição e à paciência. Aprendam o trabalho árduo da ciência. Estudem,
comparem, acumulem fatos.
Ao contrário das asas perfeitas dos pássaros, a Ciência nunca conseguirá alçar vôo, sem
sustentar-se no espaço. Fatos - essa é a atmosfera do cientista. Sem eles nunca poderemos voar.
Sem eles nossa teoria não passa de um esforço vazio.
Porém, estudem, experimentem, observem, esforcem-se para não abandonar os fatos à
superfície. Não se transformem em arquivistas de fatos.
Tentem penetrar no mistério de sua origem e, com perseverança, procurem as leis que os
governam.
Em segundo - sejam modestos. Nunca pensem que sabem tudo. E não se tenham em alta
conta; possam ter sempre a coragem de dizer: sou ignorante.
Não deixem que o orgulho os domine. Por causa dele poderão obstinar-se, quando for
necessário concordar; por causa dele renunciarão ao conselho saudável e ao auxílio amigo; por
causa dele perderão a medida da objetividade.
No grupo que me foi dado dirigir, todos formavam uma mesma atmosfera. Estávamos
todos atrelados a uma única tarefa e cada um agia segundo sua capacidade e possibilidades.
Dificilmente era possível distinguir você próprio do resto do grupo. Mas dessa nossa comunidade
tirávamos proveito.
Em terceiro lugar - a paixão. Lembre-se de que a ciência exige que as pessoas se
dediquem a ela durante a vida inteira. E se tivessem duas vidas, ainda assim não seria suficiente.
A ciência demanda dos indivíduos grande tensão e forte paixão.
Sejam apaixonados por sua ciência e por suas pesquisas.
Nossa pátria abre um vasto horizonte para os cientistas e é preciso reconhecer – a ciência
generosamente nos introduz na vida de nosso país. Prossigam com o máximo de generosidade.
O que dizem sobre a situação de nossos jovens cientistas? Eis que aqui tudo é claro. A
vocês muito foi dado, mais de vocês muito se exige. E para os jovens, assim como para nós, a
questão de honra é ser digno de uma esperança maior, aquela que é depositada na ciência de
nossa pátria.
 
 
*Texto extraído do livro: CASTRO, C.N. A pátria da pesquisa. São Paulo: Mac Graw Hill, 1977.
**Ivan Pavlov (1849-1936) fisiólogo russo. Estudou medicina e química na Universidade de San Petersburgo.
Em 1890 assumiu a cadeira de professor de fisiologia na Academia Médica Imperial. Recebeu o prêmio Nobel
em 1904. É conhecido, sobretudo pelos estudos sobre reflexo condicionado.

Você também pode gostar