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XI CONGRESSO INTERNACIONAL

DE ADMINISTRAÇÃO DA ESPM E XI
SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE
ADMINISTRAÇÃO E MARKETING

82
CASO DE ENSINO
ALEX ATALA
E A PROMOÇÃO DA GASTRONOMIA BRASILEIRA

Gilberto Figueira da Silva


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC/RJ

Maria Luiza Carvalho de Aguillar Pinho


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC/RJ

Angela Maria Cavalcanti da Rocha


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC/RJ

Celso Roberto de Aguillar Pinho


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC/RJ

EDU-3
Educação, Pesquisa em Administração e Casos de Ensino

Contato do autor:
gilbertofigueira@gmail.com
ALEX ATALA E A PROMOÇÃO DA GASTRONOMIA BRASILEIRA

Resumo
Este caso de ensino analisa a trajetória do renomado chef Alex Atala e a evolução da alta
gastronomia brasileira. Único restaurante brasileiro a conquistar duas estrelas no renomado
Guia Michelin, o chef participou ativamente na promoção da gastronomia brasileira no
mundo. Reconhecido internacionalmente, a fama e notoriedade não têm assegurado posições
no ranking internacional, nem tampouco rentabilidade. A trajetória de internacionalização do
chef se mistura com suas características individuais, ratificando os desafios de ser
empreendedor, posicionar-se no mercado internacional e ser bem-sucedido.
O presente caso está voltado para o entendimento de como a alta gastronomia de um país
pode ser promovida e o papel exercido por chefs de prestígio para a consolidação da imagem-
país no campo da alta gastronomia, sendo indicado para disciplinas e cursos relacionados aos
setores de turismo e hospitalidade, cursos de negócios internacionais em nível de graduação e
pós-graduação.
Os principais objetivos educacionais são: entender o papel da alta gastronomia como forma de
desenvolver a imagem-país, contribuindo para o desenvolvimento do turismo, e mostrar o
papel exercido pelos chefs na difusão do conceito de alta gastronomia do país.
Metodologia
O caso foi elaborado a partir de fontes secundárias, em que foram utilizadas entrevistas
cedidas pelo próprio empreendedor a diversos jornais e revistas. A partir destas informações o
caso foi construído a partir da suposição, fictícia, do dilema que o empreendedor enfrenta a
partir da sua história pessoal e profissional.
Palavras-chave: Marketing. Negócios Internacionais. Estratégia Empresarial.
Empreendedorismo.

ABSTRACT
This teaching case analyzes the history of the renowned chef Alex Atala and the evolution of
Brazilian high gastronomy. Sole Brazilian restaurant to conquest two stars in the Michelin
Guide, the renowned chef participated actively in promoting the Brazilian cuisine in the
world. Although he is internationally recognized, fame and notoriety have not assured
positions in the international ranking, nor profitability. The chef's internationalization path
mingles with their individual characteristics, confirming the challenges of being an
entrepreneur, to position itself in the international market and be successful.
This case is aimed at understanding how the haute cuisine of a country can be promoted and
the role played by prestigious chefs to consolidate the country-image in high gastronomy and
is indicated for subjects and courses related to the tourism and hospitality sectors,
international business courses at undergraduate and graduate levels.
The main educational objectives are: to understand the role of haute cuisine as a way to
develop country-image, contributing to the tourism development, and to demonstrate the role
played by chefs in spreading the concept of haute cuisine of the country.
Keywords: Marketing. International Business. Business Strategy. Entrepreneurship.

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Contexto
No início de 2016, o chef e empreendedor Alex Atala foi escolhido para ser uma das estrelas
da segunda temporada de Chef’s Table, série produzida pela Netflix, empresa multinacional
norte-americana do setor de entretenimento, que oferece streaming e videos on demand
principalmente online. Nesta situaão, tornava-se mais uma vez protagonista de um esforço a
que vem se dedicando no decorrer de sua carreira: a promoção da alta gastronomia brasileira.
Assim como o turismo, Alex Atala (2012) acredita que a alta gastronomia pode se tornar um
serviço essencial para projetar a imagem do Brasil no exterior, como ocorreu em outros
países:
A minha crença na cozinha brasileira vai além do meu trabalho. Vai na certeza que eu
vejo uma nova geração dedicando atenção a uma cozinha brasileira igual àqueles eles se
dedicaram uma vida inteira a outras cozinhas: francesa, espanhola, italiana, japonesa...
(Atala, 2011).
Único brasileiro com um restaurante com duas estrelas do Guia Michelin, o chef e
empreendedor se transformou em celebridade. Como ele mesmo disse “os chefs de hoje são as
modelos dos anos 1990 e os publicitários dos anos 1980: uma profissão que de repente ocupa
a grande cena" (Amendola, 2016). Contudo, notoriedade e fama não têm garantido ao
“embaixador da gastronomia brasileira” uma boa avaliação nos rankings mundiais. Desde
2012 o restaurante D.O.M. de Alex Atala vem perdendo posições. A trajetória de
internacionalização do chef se mistura claramente com suas características individuais
ratificando o desafio de empreender, posicionar-se no mercado internacional e ser bem-
sucedido.

Histórico
Alex Atala cresceu em São Bernardo do Campo, Estado de São Paulo, mas recorda os
momentos em que ia pescar com o pai e colher frutas silvestres. Aos 14 anos, saiu de casa
para atuar em uma banda de rock, trabalhando como DJ. Aos 19 anos, viajou pela Europa
como mochileiro. Depois de conhecer a Alemanha, a França, a Itália e a Suíça, decidiu ficar
por um tempo na Bélgica, trabalhando inicialmente como pintor de paredes. Seguindo o
conselho de um amigo, como forma de conseguir o visto de permanência, Atala decidiu
estudar gastronomia na Escola de Hotelaria de Namur, na Bélgica, ao mesmo tempo em que
trabalhava no restaurante do reconhecido chef Jean Pierre Bruneau. E foi aí, aparentemente,
que descobriu sua vocação para chef. Mais tarde voltou à França, onde trabalhou no renomado
Hotel de La Côte D’Or, com o chef Bernard Loiseau. Em seguida, teve experiências de
trabalho em restaurantes de Montpellier (França) e Milão (Itália).
Em 1994, retornou a São Paulo, destacando-se à frente dos restaurantes Filomena e 72. Já em
1999, inaugurou os restaurantes Namesa e D.O.M, passando a ser simultaneamente, e pela
primeira vez, chef e proprietário. A experiência com o restaurante Namesa não foi bem
sucedida e o empreendimento foi encerrado. Já o restaurante D.O.M. teve sucesso, tornando-
se uma referência na alta gastronomia brasileira. O nome do restaurante vem do latim, sendo a
abreviação de Dominus, Optimus, Maximus, que significa “Senhor, ótimo, máximo” (Totti,
2010). Em 2009, abriu o restaurante Dalva e Dito, com uma proposta diferenciada em relação
ao D.O.M., voltada para a oferta de uma cozinha brasileira tradicional, mas elevada a padrões
internacionais (Quadro 1)
Além dos empreendimentos diretamente relacionados ao setor de restaurantes, Atala tem
quatro livros publicados, que expressam sua preocupação com a divulgação da cultura
brasileira:
 Alex Atala – Por uma Gastronomia Brasileira (BEI Editora, 2003).
 Com Unhas, Dentes e Cuca – Prática Culinária e Papo Cabeça ao Alcance de Todos
(Editora SENAC São Paulo, 2008), em co-autoria.
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 Escoffianas Brasileiras (Editora Larousse, 2008), em co-autoria.
 D.O.M. – Redescobrindo Ingredientes Brasileiros (Ed. Melhoramentos, 2013).
Com o último livro, o chef pretendia promover internacionalmente os sabores da gastronomia
brasileira, o que levou a que o mesmo fosse lançado em português e inglês, com traduções
para o holandês e o alemão. Em outro empreendimento voltado à valorização da imagem do
país, Alex Atala obteve o terceiro lugar no Prêmio Jabuti para Fotografia, com Amazônia, de
Araquém Alcântara e Alex Atala, da Editora Terra Brasil.

Ano Evento
1986 Viagem à Europa
1994 Retorno a São Paulo
1999 Inauguração dos restaurantes Namesa e D.O.M.
2003 Lançamento do primeiro livro: Alex Atala – Por uma Gastronomia Brasileira
2006 O D.O.M. entra pela primeira vez na lista dos 50 melhores restaurantes do mundo
2007 O D.O.M. sobe à 38ª posição entre os 50 melhores restaurantes do mundo
Inauguração do restaurante Dalva e Dito
2009
O D.O.M. sobe à 24ª posição entre os 50 melhores restaurantes do mundo
2008 Lançamento do segundo e do terceiro livro.
2010 O D.O.M. sobe à 18ª posição entre os 50 melhores restaurantes do mundo
2011 O D.O.M. sobe à 7ª posição entre os 50 melhores restaurantes do mundo
2012 O D.O.M. é eleito o 4º melhor restaurante do mundo
O D.O.M. é eleito o 6º melhor restaurante do mundo e 2º melhor da América Latina
2013
Lançamento do quarto livro.
O D.O.M perde uma posição e é eleito o 7º melhor restaurante do mundo e 3º melhor da América
2014
Latina. Alex Atala é eleito o melhor Chef pelo prêmio do Chefs Awards.
O D.O.M perde duas posições no ranking e é eleito o 9º melhor restaurante do mundo e o 4º
2015
melhor na América Latina.
O D.O.M perde mais duas posição no ranking e é eleito o 11º melhor restaurante do mundo sendo
2016 o único brasileiro no ranking.
Alex Atala é escolhido para a 2ª temporada da série Chef’s Table da Netflix
Quadro 1 - Linha do Tempo

A trajetória do chef brasileiro Alex Atala é marcada pelas características de criatividade,


inovação e experimentação, de um lado, e trabalho duro e persistência, de outro. Podem-se
destacar ainda, como elementos relevantes para o sucesso, a capacidade empreendedora e a
competência em promover sua imagem internacionalmente. A criatividade surge da
combinação de técnicas de preparo clássicas com novas técnicas e métodos, para chegar a
resultados inusitados. Alex Atala e sua equipe desenvolvem pratos criativos utilizando
ingredientes comuns, tidos como "comida barata" (Rubin, 2001). Outra característica é a
busca por privilegiar ingredientes genuinamente brasileiros, de determinada região,
preferencialmente cultivados pelo pequeno agricultor ou pequenas comunidades. Como
informa o site do restaurante D.O.M.: “Trata-se de uma nova forma de praticar a gastronomia,
uma gastronomia sustentável no sentido mais amplo da palavra.” Segundo Atala, é preciso
tirar proveito daqueles ingredientes em que o país é excelente, ou que só existem no Brasil.
Por exemplo, a cozinha brasileira tem a oportunidade de utilizar vegetais particularmente
saborosos e com texturas diferenciadas, que só existem no Brasil (Ramalho, 2011).
Para obter inspiração para os pratos que cria, o chef está constantemente pesquisando e
viajando pelo interior do Brasil, em busca de novos ingredientes que possam gerar novos
pratos, ao mesmo tempo em que pesquisa a associação de ingredientes com as culturas locais:
Eu me atrevo a dizer que ando muito bem por rios, matos, mares, caboclos, índios e
caiçaras. A vivência de campo é algo que faz parte da minha vida e é minha grande
fonte de pesquisa. [...] Sentar com um caboclo ou uma senhora e entender a relação

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dele com aquele ingrediente é um elemento que vai se transformar em uma fonte de
receita e eu estou falando de um elemento cultural que não é somente fonte de sabor
(Atala, 2011).
Em sua visão, é tão grande a diversidade brasileira que não há limites para a experimentação
de novos ingredientes:
É tanta possibilidade [de ingredientes] que o Brasil tem para um chef brasileiro, que eu
tenho certeza que na minha vida eu não vou conseguir experimentar todas as
possibilidades (Atala, 2012).
A inovação está intrinsecamente combinada à criatividade, ou seja, é, de certa forma, o
resultado das inúmeras combinações de técnicas, ingredientes e sabores: o produto final que é
oferecido ao cliente. Como observou Atala (2001):
Não por acaso, a criação raramente choca, mesmo quando seu resultado é inusitado e
contundente. Invenção é mais próximo de experimentação. É usar novos métodos,
novas técnicas, novos ingredientes. Pensar no que ninguém havia pensado. É quase
sempre mais próximo da genialidade, mas, não raro, convive muito de perto com
grandes fracassos. Mas superei o trauma. O tempo e o exercício diário do meu trabalho
me deram a sapiência de prever o resultado de uma combinação, antes de ela se
concretizar. Deu-me a sapiência de imaginar sabores.
Além das atividades típicas de um empreendedor e daquelas específicas exercidas no D.O.M.,
a principal atividade de Atala, que se desdobra sistematicamente ao longo do ano, é a criação
de novos cardápios, incluindo a busca e teste de novos temperos e ingredientes e o
desenvolvimento de novos pratos. Como resultado dessa atividade, o cardápio é modificado a
cada estação (ou seja, a cada três meses), com o objetivo de oferecer aos clientes novas
experiências gastronômicas, o que, em sua opinião, é um requisito para o sucesso:
É muito mais difícil para mim hoje: um brasileiro que viaja bastante, que come fora e
quer que eu entregue uma foto nova toda vez que vai ao meu restaurante. [...] O meu
desafio é me manter vivo, jovem, pulsante numa cidade que come da minha comida
minimamente há quinze anos (Atala, 2012).
Uma característica adicional de Alex Atala é o perfil empreendedor, o que é atestado pelos
diversos empreendimentos desenvolvidos ao longo de sua trajetória. Como é típico de
qualquer empreendedor, alguns desses empreendimentos foram mais bem sucedidos do que
outros.
De forma geral, Atala reconhece que os negócios que conduz não geram alta rentabilidade, já
que, pelo menos no Brasil, os preços altos são compensados por custos também elevados,
resultando em margens baixas. Além disso, o posicionamento dos restaurantes também
implica menor giro de clientes:
Nós operamos custos altos e os nossos negócios [alta gastronomia] não são tão
rentáveis quanto a imagem que nós passamos (Atala, 2011).
O caminho que eu escolhi talvez não seja o mais rentável. Entregar alto padrão
demanda custo em qualquer profissão. Todos os restaurantes que possam ser pares aos
meus vivem essa dificuldade. Dentro da operação restauração essa, definitivamente,
talvez não seja a parte mais rentável. E talvez seja dos restaurantes mais caros que tem
(Atala, 2012).
Os Empreendimentos de Alex Atala
Em 2016, Alex Atala tinha dois restaurantes (D.O.M. e Dalva e Dito), uma padaria (Em
Nome do Pão) e o Instituto Atá. Além disso, produzia uma linha de produtos – Retrato do
Gosto – em parceria com a MIE Brasil, empresa de desenvolvimento de marcas de alimentos
orientadas para o consumo consciente.
O D.O.M. é o principal empreendimento de Atala. No entanto, ele não mais atua diretamente
na cozinha, a não ser excepcionalmente. Conta, na verdade, com um cozinheiro, Giovani
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Carneiro, que é seu “braço direito na cozinha”, como ele mesmo explica: "As receitas ainda
são minhas, mas o operacional é com o Giovani” (Bianchi, 2001).
Entre as características do restaurante, salientam-se: (i) presença constante de Atala recebendo
os clientes; (ii) equipe de garçons e cozinheiros de alto nível; (iii) pratos produzidos
artesanalmente a cada dia, a partir de ingredientes frescos preparados no restaurante.
A primeira característica – presença no restaurante – é fundamental, já que o contato com o
chef é um elemento importante na atratividade do restaurante junto a seus clientes. Assim,
Atala comparece ao restaurante todos os dias para receber e se despedir de seus clientes. A
segunda característica é a qualidade da equipe, em parte bilíngue, já que o restaurante é
frequentado por clientes internacionais. No que se refere aos ingredientes, esses são
elaborados na própria cozinha do restaurante, desde as preparações de base até os
acompanhamentos (como os biscoitos que acompanham o café). Por fim, o caráter artesanal
da comida implica o descarte de sobras a cada dia, e a ausência de congelamento ou de
preparo no dia anterior. Na opinião de Alex Atala, o posicionamento do D.O.M., ancorado em
diferenciação e valor, não é muito rentável, por exigir uma estrutura cara e operações
dispendiosas. Ele observou:
É um restaurante de 54 lugares que eu consigo fazer uma vez e meia... Com uma
brigada que é bilíngue, com ingredientes que são mais caros, com talheres que são
mais caros, com louças que são mais caros, com copos de cristais que são mais
caros...” (Atala, 2012).
O restaurante Dalva e Dito, também localizado em São Paulo, tem um conceito diferente do
D.O.M. Nele, Alex Atala buscou realizar um “sonho antigo”, oferecendo uma “cozinha
brasileira afetiva”, inspirada “nos livros de receitas das mães, avós, tias e sogras”, “em um
cenário que mescla o rústico e o moderno”. O restaurante enfrentou vários contratempos,
desde sua fundação. Logo após a abertura, recebeu uma crítica negativa de uma revista
respeitada. Além disso, ocorreram problemas entre os sócios e erros administrativos. É
possível que também o posicionamento não tenha sido bem implementado, já que o próprio
chef reconheceu: “Era um restaurante que se propunha a mostrar a cozinha brasileira mais
sincera e escorregou na grandiosidade do negócio” (Ramalho, 2011). Como resultado dos
problemas mencionados, Atala teve que fazer face a uma dívida de seis milhões de reais.
A ideia da padaria Em Nome do Pão surgiu da necessidade de abastecer os dois restaurantes
de Atala, assim como dois outros restaurantes de prestígio de São Paulo (Fasano e
Renaissance). O negócio foi aberto em sociedade com Rogerio Shimura. A padaria contava
com uma equipe de 27 pessoas.
Um empreendimento diferente concebido por Alex Atala foi o Instituto Atá, cuja concepção
estava ligada à ideia de valorização do pequeno produtor e a princípios de sustentabilidade.
Essa preocupação fica bem clara na seguinte declaração do chef:
Resolvi criar um instituto para estruturar as cadeias e ir em busca de ingredientes de
uma cozinha que não fosse somente boa de comer, mas que fosse saudável para quem
faz, para quem come e pra quem produz (Trefaut, 2013).
Por meio do Instituto, Atala reúne dois interesses: de um lado, a descoberta de novos
ingredientes que possa utilizar em sua culinária; de outro, o suporte a pequenos produtores,
estruturando a cadeia de fornecimento de modo a tornar viável a produção em pequena escala,
que é percebida como menos agressiva ao ambiente. Exemplos da atuação do Instituto Atá
vão desde a divulgação da pimenta jiquitaia até a defesa da produção de algas. Responsável
ainda pela agenda de eventos do Mercado Municipal de Pinheiros, Alex Atala por meio do
Instituto Atá, realiza encontros de forma a posicionar os produtos oriundos dos mais diversos
biomas brasileiros na gastronomia.
A linha de produtos Retratos do Gosto resulta diretamente dos princípios defendidos pelo
Instituto Atá. As origens dessa linha de produtos se encontram em contato feito pelo chef com
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um pequeno produtor, situado no Vale do Paraíba, que não conseguia comercializar uma
variedade de mini arroz só ali produzida. Atala passou a utilizar o produto em seu restaurante
e ainda conseguiu que o mesmo fosse vendido em alguns supermercados (Barros, 2013). A
linha de produtos incluía, em 2013, dois produtos provenientes do Vale do Paraíba (uma
variedade de mini-arroz e o feijão guandu, um tipo de feijão de aparência similar à da
lentilha), o cacau Pará-Parazinho (produto originário da Amazônia, produzido na Bahia) e
uma farinha de milho caipira da região de Lindoia (Barros, 2013). Os canais-alvo da linha
Retratos do Gosto são supermercados, empórios e restaurantes situados em Belo Horizonte,
Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo. Embora a ênfase inicial esteja no mercado interno,
os planos futuros incluem as exportações, por meio de distribuidores para Espanha, França,
Inglaterra e Itália (Rockman, 2012). Para Atala, a linha Retratos do Gosto é "um movimento
de chefs unidos em prol de pequenos produtores e alimentos melhores, remunerados de forma
mais justa e digna", visando mostrar que "o pequeno agricultor é imprescindível à boa
gastronomia" (Uchoa, 2012).

Alta Gastronomia
O conceito de gastronomia contém elementos de abrangência maior que cozinha e culinária,
incorporando aspectos relacionados ao preparo dos alimentos e à forma de desfrutar a
refeição. Freixa e Chaves (2012) definem esses conceitos como se segue:
 Alimentação - “conjunto de ingredientes in natura e industrializados com os quais as
pessoas se nutrem”;
 Cozinha e culinária – “são sinônimos [...e] se referem ao conjunto de utensílios,
ingredientes e pratos característicos de um país ou determinada região”;
 Gastronomia – “está ligada às técnicas de cocção e ao preparo dos alimentos, ao
serviço, às maneiras à mesa e ao ritual da refeição”.
Já a diferença entre gastronomia e alta gastronomia está na técnica mais sofisticada, na
escolha de ingredientes mais adequados e melhores, transformando algo comum em uma
experiência única e diferenciada (Atala, 2012).
A internacionalização da gastronomia tem uma relação sinérgica com o turismo. A
gastronomia pode ajudar a promover o turismo e o turismo pode ajudar a difundi-la. Turistas e
viajantes em geral têm a oportunidade de experimentar a cozinha e os restaurantes de um país
e a experiência obtida se agrega ao conjunto da experiência turística. O turismo gastronômico
é considerado como “qualquer experiência turística em que se aprende, aprecia, e/ou consome
alimentos e bebidas que refletem a culinária local, regional ou nacional, o patrimônio, cultura,
tradição ou técnicas culinárias” do destino receptor (MTC, 2010, p. 8).
Assim, há países que têm promovido sua alta gastronomia em estreita ligação com o turismo.
Podem-se citar como exemplos o caso da Espanha, que buscou promover sua alta
gastronomia, apoiada pela longa reputação desenvolvida no setor de turismo; e o do Peru, que
tem utilizado sua fama na alta gastronomia para promover o país como destino turístico. Por
sua vez, a França, considerada a pátria da alta gastronomia, trata esta atividade como parte
relevante de sua cultura. Em 2010, a Unesco declarou a culinária francesa um dos patrimônios
intangíveis da humanidade (France, 2012).
Alta Gastronomia no Mundo
A alta gastronomia é determinada por fontes de avaliação externas, em particular guias
gastronômicos e rankings. Os principais guias dos melhores restaurantes do mundo continuam
sendo os tradicionais guias franceses Gault et Millau e Michelin. Eles são considerados o
ponto de partida para quem quer escolher um local para ter uma experiência gastronômica
exclusiva. No entanto, ganharam recentemente um forte concorrente que é o ranking da
revista inglesa Restaurant.

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O ranking, denominado “The World’s 50 Best Restaurants” (há também o “The World’s 100
Best Restaurants”) é eleito pelo júri da The Dinner’s Club World’s 50 Best Restaurant
Academy. É um ranking bastante dinâmico, pois é atualizado anualmente e tem como
característica promover também as classificações regionais dos 50 melhores restaurantes.
Alex Atala (2012) julga que essa lista tem ganhado proeminência, frente aos rankings, por ser
mais dinâmica: “Uma das grandes forças da lista é essa volatilidade: quem sobe, quem desce.
É muito mais ágil que o Michelin.”
A avaliação é feita por mais de 900 especialistas internacionais, que podem ser chefs,
restaurateurs, jornalistas especializados e gourmands. Esses especialistas estão divididos em
26 regiões, conduzidas por um responsável (chair). Em cada região, há 36 especialistas que
irão participar da votação naquele ano. A cada ano são trocados dez especialistas em cada
região, de modo a garantir a renovação e incorporar novos pontos de vista. Há o requisito de
que o especialista tenha comido no restaurante sobre o qual faz o julgamento nos 18 meses
anteriores. Qualquer restaurante pode entrar no ranking, mas ele não pode tomar a iniciativa
de se candidatar para ingressar no ranking. O julgamento é subjetivo, podendo se basear tanto
em uma experiência interessante em um restaurante simples, quanto uma refeição opulenta em
restaurante renomado. Cada especialista faz sua própria classificação, com sete restaurantes,
em ordem de preferência, três dos quais devem estar fora de sua região.
Analisando esses critérios, Alex Atala (2012) considera que o Brasil deveria concentrar seus
esforços em divulgar um número reduzido de bons restaurantes, pois assim a chance seria
maior de obter sólida votação na sua região e ter mais restaurantes incluídos no ranking:
A condição para estar dentro é ter uma votação sólida na sua região. Hoje essa talvez
seja uma coisa que o Brasil possa fazer melhor. Hoje o Brasil divide os votos em
muitos restaurantes e talvez se nós concentrássemos os votos em menos restaurantes
nós seguramente teríamos pelo menos mais um.
Já há alguns anos que o Brasil tem sido representado por algum restaurante no ranking
mundial. Mesmo assim, considerando-se os 15 primeiros classificados nos últimos quatro
anos, somente o restaurante D.O.M. aparece na lista. Nos últimos quatro anos, a liderança tem
se alternado entre restaurantes espanhóis, dinamarqueses, italianos e norte-americanos, mas a
América do Sul conquistou posição de destaque nos últimos dois anos (Anexo 1).
Na lista dos 100 melhores restaurantes do mundo aparecem 11 restaurantes latino-americanos
(Anexo 2), localizados na Argentina, Brasil, Chile, Mexico, Peru e Brasil. Todavia, essa
mudança ocorreu nos últimos quatro anos, uma vez que anteriormente a lista estava
concentrado em apenas três países: Brasil, Peru e México. Finalmente, já na lista dos 50
Melhores da América Latina em 2015, há oito restaurantes brasileiros (Anexo 3).
Há algumas características que merecem ser destacadas nos rankings internacionais:
Identidade gastronômica própria – Observa-se nos restaurantes classificados e em sua
descrição no site do “World’s Best Restaurants” a definição clara de uma identidade
gastronômica própria, fortemente associada a características locais. A utilização de
ingredientes locais é uma característica frequente. Em alguns casos associados à culinária
local, em outros casos mesclados com a culinária de outro local, o que se denomina de cuisine
fusion. O chef Alex Atala (2012) ressaltou que o trabalho de criação de novas receitas está
diretamente relacionado à criatividade e à autenticidade do cardápio, critérios importantes
para que um restaurante seja bem classificado na lista:
A lista efetivamente privilegia criatividade com autenticidade, com experiências que
se repetem. Todas as pessoas que conseguem exprimir a personalidade do restaurante
nos pratos e na experiência ‘jantar’ conseguem uma posição melhor dentro do ranking.
Uma vez dentro, essa é a primeira condição.
Ingredientes locais – Percebendo a força dos ingredientes locais para a criação da identidade
gastronômica original, alguns chefs têm buscado canais de conexão e formas de fortalecer o
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produtor local. Garante-se suprimento e propicia-se o desenvolvimento social de regiões
menos favorecidas.
Chefs proprietários – Predomina, de forma generalizada, a situação em que o restaurante é de
propriedade do próprio chef. Em alguns casos, trata-se de tradição familiar, com alguns
restaurantes tendo pertencido a chefs de gerações anteriores da mesma família.
Chefs autores – Também se observa que os chefs que dirigem esses restaurantes publicam
livros de receitas e com outras abordagens ao tema da gastronomia.
Alta Gastronomia no Brasil
A evolução da alta gastronomia no Brasil deve muito à contribuição dos chefs estrangeiros
que imigraram para o Brasil a partir do final dos anos 1970. Esse movimento tem três fases
bem distintas: a primeira formada por franceses pioneiros, a segunda pelos que aportaram
aqui na década de 1980 e a terceira na década de 1990. Por fim, os anos 2000 assistiram à
consolidação da gastronomia brasileira no plano nacional e internacional. A Figura 1 sintetiza
a evolução da alta gastronomia brasileira.

A primeira fase da alta gastronomia brasileira pode ser relacionada à vinda de grandes chefs
franceses ao Brasil, tipicamente patrocinada por redes de hoteis internacionais, implantando
inicialmente a gastronomia francesa. Esses chefs, de forma geral, voltaram à França, mas não
antes de formarem seus sucessores, também estrangeiros, que chegaram muito jovens ao
Brasil, estabelecendo-se no país. Foi o caso de Paul Bocuse, pertencente a uma linhagem de
chefs e restaurateurs (Sissons, 2011). Foi reconhecido como o maior de todos os chefs de sua
época, sendo escolhido em 2005 o “Chef do Século” pelo Culinary Institute of America. É
considerado um dos criadores da nouvelle cuisine francesa, que se caracteriza como cozinha
mais leve, baseada em ingredientes naturais e frescos. Não só exerceu enorme influência
sobre os chefs de sua geração, como foi pessoalmente responsável pela formação de muitos
deles. Outros pioneiros foram os chefs Roger Vergé e Gastón Lenôtre e o chef patissier
Dominique Guérin. A vinda de renomados chefs estrangeiros para o Brasil aportou
conhecimentos sobre técnicas culinárias, ingredientes e administração de cozinhas e
restaurantes.

Figura 1 – Evolução da Alta Gastronomia Brasileira.


Fonte: Compilado de Gianini (2011).

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A segunda fase, já na década de 1980, é caracterizada pela presença dos sucessores dos chefs
franceses que se estabeleceram no Brasil, formando inúmeros seguidores e elevando a
gastronomia brasileira a um padrão internacional. Figuram entre eles os franceses Laurent
Suaudeau, Claude Troisgros, Emmanuel Bassolei e Fabrice Lenud, o italiano Luciano
Bossegia e o suíço Christophe Bessa. Esses chefs montaram restaurantes próprios após algum
tempo no Brasil. O sucesso dos restaurantes despertou o interesse pela alta gastronomia no
país. Além disso, em decorrência da influência desses chefs e de sua ativa participação no
desenvolvimento da alta gastronomia brasileira, foram criadas escolas e cursos, foi formada a
Associação Brasileira de Alta Gastronomia e surgiram publicações e críticos especializados
no setor. O ambiente assim criado era propício ao despertar de talentos locais, resultando no
surgimento dos primeiros grandes chefs brasileiros, que, por sua vez, serviram de inspiração
para muitos seguidores. Ao mesmo tempo, a disponibilidade de profissionais, formados na
prática ou nas escolas e cursos de gastronomia, possibilitou o surgimento de novos
restaurantes e sua qualificação, chegando muitos a atingir os mais elevados padrões
internacionais.
A terceira fase, a partir da década de 1990, é caracterizada tanto pela chegada de outros chefs
estrangeiros como pelo destaque dos primeiros grandes chefs brasileiros. O ambiente que se
havia criado ao longo das décadas anteriores era propício ao despertar de talentos locais,
resultando no surgimento dos primeiros grandes chefs brasileiros, que, por sua vez, serviram
de inspiração para muitos seguidores. Ao mesmo tempo, a disponibilidade de profissionais,
formados na prática ou nas escolas e cursos de gastronomia, possibilitou o surgimento de
novos restaurantes e sua qualificação, chegando muitos a atingir os mais elevados padrões
internacionais. A Figura 2 apresenta a evolução dos restaurantes estrelados em algumas
capitais brasileiras.

Figura 2 – Evolução dos Restaurantes Estrelados no Brasil


Fonte: Gianini (2011)

O histórico dos chefs que surgiram nos últimos anos no Brasil permite identificar três padrões
de formação: (1) grandes chefs brasileiros formados no exterior, (2) grandes chefs brasileiros
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formados no Brasil e (3) grandes chefs brasileiros formados na prática. A nova geração de
chefs brasileiros seria, na visão de Alex Atala, um fator importante para a expansão e projeção
da alta gastronomia brasileira no mundo.
A Promoção Internacional da Alta Gastronomia Brasileira
A importância da gastronomia para o turismo já vem sido explorada por países como
Espanha, Itália e França, em que os turistas buscam não só atrações artísticas, arquitetônicas e
culturais, de forma geral, mas também gastronômicas:
A gastronomia hoje é um grande produto de exportação da Espanha: no turismo, no
receptivo, mas fundamentalmente na exportação de produto e de cultural. Cria-se um
círculo virtuoso onde a gastronomia passa a ser um viés principal (Atala, 2012).
Mais recentemente, outro país que percebeu como a alta gastronomia pode ser utilizada para
projetar o país no cenário internacional foi o Peru. Atualmente, o país dispõe de grandes chefs
reconhecidos no cenário internacional, o que tem contribuído positivamente para sua
atratividade como destino turístico. Ademais, como comentou Atala (2012), percebe-se a
emergência de uma cultura de alta gastronomia que se tornou motivo de orgulho para o povo
peruano:
Hoje, o que eu posso falar do Peru – e eu, como brasileiro, admiro muito – é a união.
A gastronomia peruana passou a existir de fato, não quando eles tentaram vender, mas
quando o povo se apropriou dela. Hoje, você pega um táxi no Peru, vai num
restaurante simples [...] e as pessoas são orgulhosas de sua gastronomia, falam das
suas cozinhas. E elas reconhecem um grande restaurante não como uma coisa distante
da vida delas, mas como referências maiores da cultura peruana. Eu acho que, talvez,
se um dia nós conseguirmos fazer isso com o Brasil, pode ser um bom caminho.
Para projetar com êxito a alta gastronomia de um país, não seria por intermédio de apenas um
ou dois chefs. Os exemplos de sucesso apontam que os países que conseguiram se projetar
mundialmente por terem altos padrões gastronômicos o fizeram por meio da projeção de
diversos chefs de cozinha. Atala (2011) denominou o conjunto de chefs de alto padrão de
“time” que representa o país no exterior: “O que levou a Europa, ou os países... a França,
Espanha, Itália... o Japão ao estrelato da gastronomia não foi por ter um craque, mas por ter
um bom time.”
Alex Atala acredita que o Brasil já dispõe de boa projeção internacional, com um
posicionamento específico, a que ele chamou de “assinatura”. Tal projeção, no entanto, teria
sido alcançada até o momento por dois ou três chefs:
Já temos a assinatura de gastronomia brasileira. Ela já está no mundo. Os olhos da
gastronomia mundial já se viraram para a América Latina. Nós, brasileiros, temos uma
posição muito boa. Já não é só mais o Alex Atala e a Roberta Sudbrack. [...] Os
espanhóis, os americanos: as grandes referências gastronômicas não são por ter um
bom chef, mas por ter muitos bons chefs. O Brasil está nesse caminho. Hoje, na lista
dos 100 melhores do mundo, somos três brasileiros (Atala, 2012).
O caminho para maior projeção internacional seria, então, apoiado em três pilares: (1) ter um
time numeroso de chefs de alto padrão; (2) promover a difusão da cultura de alta gastronomia
pelo país, em apoio ao turismo; e (3) concentrar os votos em poucos restaurantes no ranking
dos 50 melhores.
Basicamente, a promoção de um chef ocorre por meio de: (i) presença do chef em eventos
internacionais de destaque da alta gastronomia; (ii) recebimento de aprendizes e de chefs de
outros países; e (iii) internet.
Uma importante forma de divulgação internacional para um chef é a participação em eventos
internacionais. Alex Atala participa com frequência de eventos da alta gastronomia em
diversos países, sendo convidado para ministrar aulas nos principais eventos internacionais,
tais como:
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 Alimentaria, San Sebastian Gastronomika e Madrid Fusión , na Espanha,
 Salone Del Gusto – Slow Food e Identità Golose, na Itália,
 Omnivore, na França, e
 The Flemish Primitives, na Bélgica.
Segundo o site do D.O.M., Atala também tem participado de todas as edições do Cook It
Raw!, evento anual em que prestigiados chefs de todo o mundo se reúnem para elaborar
pratos a partir de ingredientes específicos de regiões selecionadas. Na Lapônia, por exemplo,
os 15 chefs convidados tiveram que se internar em regiões selvagens para colher seus próprios
ingredientes e montar um novo prato. Todos os chefs participantes (em torno de 15 a cada
evento) são convidados e há ampla cobertura da imprensa especializada ao evento. A proposta
do Cook it Raw! é trabalhar com a pureza dos ingredientes, sem excesso de temperos,
buscando o máximo de refinamento na cozinha simples. As últimas edições foram realizadas
na Lapônia, Finlândia (2010), no Japão (2011) e na Polônia (2012). Segundo informações
colhidas em entrevistas no YouTube e artigos de jornal, Alex Atala teria tentado trazer o
evento para o Brasil, especificamente para a Amazônia (Bianchi, 2010), mas não teria sido
bem sucedido, aparentemente por falta de patrocínios.
Outro evento frequentado por Alex Atala é o Mistura, maior festival gastronômico da
América Latina. Foi lá onde se lançou a "Carta Aberta aos Cozinheiros do Futuro", um
manifesto a favor da ética na cozinha, na transmissão do saber e o compromisso com a
sustentabilidade (Uchoa, 2011).
O intercâmbio internacional é outra forma de promocão de restaurantes. O restaurante D.O.M.
tem um fluxo regular de chefs e aprendizes estrangeiros, que vêm aprender suas técnicas e
vivenciar o dia a dia do restaurante. Esses estagiários são normalmente provenientes de países
geograficamente próximos, mas alguns vêm de países distantes, conforme explica Alex Atala
(2012):
Nossa maior vaidade talvez seja estar recebendo alunos de outros países. Eu recebo
uma média de 20 estagiários por mês. A gente recebe com frequência bons chefs do
mundo inteiro. Obviamente dos países que estão mais perto, da América Latina, e dos
Estados Unidos, a gente recebe com mais frequência, mas até da Austrália a gente
recebe.
Além disso, as novas mídias sociais têm sido aproveitadas pelos chefs para divulgar seu
trabalho. Isso representa uma inversão das práticas dominantes, já que no passado os chefs
“escondiam” seus segredos culinários dos concorrentes:
Hoje, um chef tem uma sacada nova, ele não esconde mais. Ele vai para a internet,
publica o trabalho, que é a melhor maneira de reivindicar autoria. O chef tem mais
voz. A voz ainda é mais ágil. A troca de informação hoje, o princípio do compartir é
muito presente na cozinha (Atala, 2012).
Outra forma de divulgação promovida pelas mídias sociais é a divulgação espontânea de fotos
dos pratos e do espaço do restaurante. Essas fotos são veiculadas em conjunto com os
comentários dos clientes sobre a experiência vivenciada. Essa pode ser uma fonte de
divulgação interessante para o restaurante, sendo mais uma evidência de que a experiência
gastronômica está associada à experiência turística e à consequente projeção do país como
local atrativo à visitação.
Perspectivas Futuras
Tanto a queda no ranking internacional de seu restaurante D.O.M., como sua baixa
rentabilidade eram preocupações constantes com que Alex Atala se defrontava e que exigiriam
novas ações futuras. Além disso, ele buscava contribuir cada vez mais para o desenvolvimento
da reputação da alta gastronomia brasileira no exterior.

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Anexo 1 – Evolução dos 15 Melhores Restaurantes do Mundo (2013 a 2016)
2016 2015 2014 2013 Restaurante País (Cidade) Chefs
El Celler de Can Joan Roca ; Jordi
2 1 2 1 Espanha (Girona)
Roca Rica*
Dinamarca
5 3 1 2 Noma René Redzepi*
(Copenhagen)
1 2 3 3 OsteriaFrancescana Itália (Modena) Massimo Bottura*
Espanha (San Andoni Luis
7 6 6 4 Mugaritz
Sebastián) Aduriz*
Eleven Madison Daniel Hume e
3 5 4 5 EUA (Nova Iorque)
Park outros
11 9 7 6 D.O.M. Brasil (São Paulo) Alex Atala*
Dinner by Heston Ashley Palmer-
45 7 5 7 Inglaterra (Londres)
Blumenthal Watts
Espanha (San Juan Arzak, Elena
21 17 8 8 Arzák
Sebastián) Arzak*
9 15 16 9 Steirereck Áustria, Viena Heinz Reitbauer*
Alemanha (Bergisch
35 30 12 10 Vendôme Joachim Wissler
Gladbach)
- 40 30 11 Perse EUA (Nova Iorque) Thomas Keller *
- 31 12 Frantzen Suécia (Stockholm) Björn Frantzén*
14 20 10 13 The Ledbury Inglaterra (Londres) Brett Graham
Gastón Acurio y
30 14 18 14 Astrid y Gastón Lima (Peru)
Astrid Gutsche*
15 - 9 15 Alinea EUA (Chicago)
6 11 11 28 Mirasur França (Menton) Mauro Colagreco*
37 13 32 Nahm Tailândia (Bangkok)
8 8 14 20 Narisawa Japão (Tokio)
4 4 15 50 Central Peru (Lima)
10 13 34 44 Asador Etxbarri Espanha (Axtand)
Mexico (Cidade do
12 35 - - Quintonil Jorge Vallejo*
Mexico)
Mitsuharu
13 44 - - Maido Peru (Lima)
Tsumura*
23 10 17 Gaggan Tailândia (Bangkok)
12 25 16 L’arpège França (Paris)
Fonte: The Dinner’s Club World’s 50 Best Restaurant Academy
*O asterisco indica que os chefs também são donos dos estabelecimentos.

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Anexo 2 – Restaurantes Latino-Americanos Classificados entre os 100 Melhores do Mundo
em 2016
No Restaurante País (Cidade) Chefs
4 Central Peru (Lima) Virgilio Martinez e Pia León*
11 D.O.M. Brasil (São Paulo) Alex Atala*
12 Quintonil México (C.México) Jorge Vallejo*
13 Maido Peru (Lima) Mitsuharu Tsumura*
25 Pujol México (C.México) Enrique Olvera*
30 Astrid y Gaston Peru (Lima) Gastón Acurio, Astrid Gutsche, Diego Muñoz*
36 Boragó Chile (Santiago do Chile) Rodolfo Guzmán*
43 Biko México (C.México) Mikel Alonso, Gerard Bellver, Bruno Oteiza*
51 Mani Brasil (São Paulo) Helena Rizzo, Daniel Redondo*
64 Lasai Brasil (Rio de Janeiro)
68 Tegui Argentina (Buenos Aires)
Fonte: The Dinner’s Club World’s 50 Best Restaurant Academy
*O asterisco indica que os chefs também são donos dos estabelecimentos.
Anexo 3 – Restaurantes Brasileiros Classificados entre os 50 Melhores da América Latina em
2015
No Restaurante Cidade Chefs
4 D.O.M. São Paulo Alex Atala*
8 Mani São Paulo Helena Rizzo, Daniel Redondo*
14 Roberta Sudbrack Rio de Janeiro Roberta Sudbrack*
16 Lasai Rio de Janeiro Rafael Costa e Silva*
23 Olympe Rio de Janeiro Claude Troisgros*
26 Epice São Paulo Alberto Landgraf*
35 Mocotó São Paulo Rodrigo Oliveira*
38 Remanso do Bosque Belém Thiago e Felipe Castanho*
Fonte: The Dinner’s Club World’s 50 Best Restaurant Academy
*O asterisco indica que os chefs também são donos dos estabelecimentos.

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Referências:

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Atala, A.; Campana, F.. & Campana, H. (2013). Capítulo 1 In: Naccache, A.. (Org).
Criatividade brasileira: gastronomia, design, moda. Barueri, SP, 270p.
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prestigio-gourmet.
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Trefaut, M. (2013). Ahh, tá..., Valor, 18/04/2013. Recuperado de
http://www.valor.com.br/cultura/blue-chip/3091862/ahh-ta.

NOTAS DE ENSINO
Este caso está voltado para o entendimento de como a alta gastronomia de um país pode ser
promovida e o papel exercido por chefs de prestígio para a consolidação da imagem-país no
campo da alta gastronomia. Pode ser utilizado em disciplinas e cursos relacionados aos
setores de turismo e hospitalidade. Também pode ser utilizado em cursos de negócios
internacionais em nível de graduação e pós-graduação.
Objetivos Educacionais
 Entender o papel da alta gastronomia como forma de desenvolver a imagem-país e
contribuir para o desenvolvimento do turismo.
 Mostrar o papel exercido pelos chefs na difusão do conceito de alta gastronomia do
país.
 Mostrar os elementos relevantes na trajetória de um chef para sua projeção
internacional.
 Recomendar possíveis ações para promoção da alta gastronomia brasileira no exterior.
Questões para Discussão
Sugerem-se as seguintes questões para discussão em sala de aula:
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1. Quais os problemas relevantes sugeridos pelo caso?
2. Quais os elementos na formação de Alex Atala que contribuiram para sua projeção
internacional?
3. Quais as dificuldades enfrentadas por Alex Atala?
4. Qual o papel que a alta gastronomia pode ter no desenvolvimento da imagem do Brasil
como destino turístico?
5. Que recomendações podem ser feitas para aumentar a presença brasileira nos rankings
internacionais?
Análise do Caso
1. Quais os problemas relevantes sugeridos pelo caso?
O caso utiliza a história de um chef-empreendedor brasileiro, Alex Atala, para mostrar como
veículo para a discussão de como promover a gastronomia brasileira no exterior. Assim
sendo, a discussão pode se concentrar tanto na situação específica de Alex Atala e seu
restaurante D.O.M., quanto na questão mais geral de promoção da imagem-país do Brasil
associada à alta gastronomia. A escolha dependerá dos objetivos visados pelo instrutor.
Portanto, os seguintes problemas podem ser levantados:
- Problema imediato: O que Alex Atala deve fazer para reverter a queda de seu restaurante
nos rankings internacionais?
- Problema de fundo: Como promover internacionalmente a alta gastronomia brasileira?
2. Quais os elementos na formação de Alex Atala que contribuiram para sua projeção
internacional?
 Vivência internacional: antes de se tornar um renomado chef, Alex Atala viveu na Europa
por quase 10 anos. Nesse período ele teve contato com outras culturas e aprendeu outros
idiomas.
 Existência de um mentor: logo no início de sua carreira de cozinheiro, Alex Atala teve a
oportunidade de trabalhar nos restaurantes de dois renomados chefs, estrelados no guia
Michelin: Jean Pierre Bruneau e Bernard Loiseau.
 Perfil empreendedor: entre o seu retorno ao Brasil em 1994 e a abertura de seus dois
primeiros restaurantes, houve um intervalo de apenas cinco anos. À frente de seu
restaurante D.O.M., Alex Atala teve a possibilidade de se projetar mais como um grande
chef e figurar no ranking dos 50 melhores restaurantes do mundo.
 Posicionamento claro: associação de técnicas modernas à cultura local. Alex Atala não
procurou imitar a cultura gastronômica de nenhum outro país. Ele utilizou técnicas
modernas de preparo aprendidas e criadas por ele para criar uma identidade culinária
própria baseada em ingredientes típicos do Brasil.
3. Quais as dificuldades enfrentadas por Alex Atala?
Duas grandes dificuldades devem ser enfrentadas por Alex Atala. De um lado, a queda de
classificação nos rankings internacionais e, de outro, a baixa rentabilidade obtida de seus
negócios. A primeira questão está associada à questão geral, relacionada à promoção da
gastronomia brasileira e será analisada nas questões seguintes. Já a questão da rentabilidade
pode estar associada a problemas na gestão de restaurantes, comuns à maioria dos restaurantes
de alta gastronomia brasileiros.
Neste caso, há dois aspectos a salientar. De um lado, a formação do chef não inclui,
necessariamente, aspectos relativos à gestão de restaurantes, particularmente no caso de
autodidatas e dos que não tiveram experiências em restaurantes profissionalizados, como
aqueles pertencentes a grandes cadeias de hoteis. De outro, o custo envolvido em manter um
restaurante de alta gastronomia é muito elevado, porque, apesar dos preços elevados, há baixa
rotação de clientes e custo elevado de ingredientes, além de qualidade do serviço, instalações
etc. Assim, muitos restaurantes de alta gastronomia, que são criados por chefs, acabam
fechando, muitas vezes deixando seus donos com grandes dívidas. Muitos grandes chefs
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acabam optando por trabalhar apenas como consultores gastronômicos, dando palestras ou
cursos em escolas de gastronomia, ou oferecendo serviços de buffet. Ou seja, são talentos que,
muitas vezes, deixam de contribuir de forma direta para a divulgação internacional da alta
gastronomia brasileira.
4. Qual o papel que a alta gastronomia pode ter no desenvolvimento da imagem do Brasil
como destino turístico?
 A promoção da alta gastronomia deve estar intimamente associada à promoção do
turismo, pois são atividades complementares na experiência turística.
 Promover a alta gastronomia envolve promover a difusão da cultura de alta gastronomia
pelo país e promover o uso de ingredientes nativos, receitas tradicionais e técnicas de
preparo locais.
 A internacionalização da alta gastronomia é um processo tanto outward, por meio da
promoção dos chefs no exterior, ministrando cursos, participando de eventos e de rankings
dos melhores restaurantes, quanto um processo inward, por meio da experiência turística,
ou da vinda de outros chefs para um período de aprendizado nos restaurantes brasileiros.
5. Que recomendações podem ser feitas para aumentar a presença brasileira nos rankings
internacionais?
O caso permite sugerir um conjunto de ações com vistas a obter maior presença de
restaurantes brasileiros no ranking dos 50 melhores do mundo. Este tipo de ação pode ser
realizado por agências governamentais, em estreita colaboração com o setor privado e,
particularmente, com chefs brasileiros de prestígio internacional:
 Trazer ao Brasil críticos e especialistas para conhecerem a comida de restaurantes
selecionados em todo o Brasil, de modo a tornar mais conhecida a gastronomia brasileira.
 Dar suporte a restaurantes com potencial de se transformarem em candidatos a participar
do ranking para se adequarem às exigências dos rankings internacionais.
 Promover a participação de chefs brasileiros em eventos internacionais (competições,
congressos etc.), de modo a fazer com que sejam conhecidos no meio da alta gastronomia
internacional.
 Promover a ida de jovens chefs brasileiros talentosos para realizar estágios em
restaurantes no exterior.
 Promover a vinda de chefs e aprendizes de cozinheiros estrangeiros para aprender técnicas
de preparo e vivenciar o dia a dia de restaurantes de alta gastronomia brasileiros já
presentes nos rankings internacionais e/ou restaurantes com potencial para tal.
 Desenvolver ações de Relações Públicas junto ao universo de especialistas convidados a
participar dos rankings internacionais.
 Escolher poucos representantes para concentrar os votos dos críticos que fazem as
avaliações nos rankings internacionais.
 Realizar eventos de gastronomia brasileira no exterior.tais como festivais de comida
brasileira, combinados ou não a outros eventos.
 Identificar e apoiar restaurantes selecionados de comida brasileira no exterior (com foco
nos países de onde provém maior número de turistas), que possam servir como flagships
da comida brasileira.
 Incluir idiomas como parte importante dos currículos de escolas de gastronomia e
hotelaria.
 Melhorar a qualificação de restaurantes regionais selecionados para se tornarem referência
de cozinha regional
 Atrair jovens chefs de outros países da América Latina para estudarem ou estagiarem no
Brasil, permitindo a aquisição de elementos de outras cozinhas latino-americanas e
promovendo a difusão de elementos da cozinha brasileira na América Latina.
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 Criação de um site oficial da comida brasileira, em inglês, francês, italiano e espanhol,
que divulgasse notícias, receitas, perfis de chefs e restaurantes etc.
 Atuação orientada nas redes sociais, fornecendo informações a blogueiros, sites
especializados em turismo, restaurantes etc., por meio de ações de consultoria
especializada.
Bibliografia Sugerida
Giraldi, J.M.E.; carvalho, D.T. (2009). A imagem do Brasil no exterior e sua influência nas
intenções de compra. RAC-Eletrônica, v. 3, n. 1, art.2, p. 22-40.
Kleppe, I. A.; Iversen, N. M.; Stensaker, I. G. (2002). Country images in marketing strategies:
conceptual issues and an empirical Asian illustration. Journal of Brand Management, v.
10, n. 1, p. 61–74.
Pappu, R.; Quester, P. G. (2010). Country equity: conceptualization and empirical evidence.
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Pappu, R.; Quester, P. G.; Cooksey, R. W. (2007). Country image and consumer-based brand
equity: relationships and implications for international marketing. Journal of
International Business Studies, v. 38, n. 5, p. 726–745.
Usunier, J. C. (2006). Relevance in business research: the case of country-of-origin research
in marketing. European Management Review, v. 3, p. 60-73.

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Você também pode gostar