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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2022.0000887677

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1002776-


94.2022.8.26.0127, da Comarca de Carapicuíba, em que é apelante ANTONIO
GAMA DE SOUZA FILHO, é apelado BANCO DIGIMAIS S/A.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 24ª Câmara de Direito


Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram
provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra
este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JONIZE SACCHI


DE OLIVEIRA (Presidente sem voto), SALLES VIEIRA E PLINIO NOVAES DE
ANDRADE JÚNIOR.

São Paulo, 27 de outubro de 2022.

CLÁUDIO MARQUES
Relator(a)
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO Nº: 29.509


Apelação nº 1002776-94.2022.8.26.0127
Apelante: Antonio Gama de Souza Filho
Apelado: Banco Digimais S.a
Comarca: Carapicuíba

APELAÇÃO – “Ação de
modificação de cláusula contratual
c/c exibição de documento e
consignatória com pedido de tutela
de urgência cautelar antecedente”
Sentença de extinção com fulcro no
art. 485, inc. I do CPC
Insurgência Elementos dos autos
que evidenciam a hipossuficiência
financeira do autor Deferimento
do benefício da justiça gratuita em
grau recursal, dispensando-se o
preparo recursal – Autor que não
tem em seu poder a via do contrato
firmado Possibilidade de pedido
incidental de apresentação de
contrato em ação revisional
Possiblidade de formulação de
pedido genérico Inteligência do
inc. III, §1º do art. 324 do CPC
Decisão que deve ser anulada -
Necessário o regular prosseguimento
do feito na instância de origem
Precedente desta C. Câmara
Recurso provido.

Trata-se de apelação contra sentença de fls. 51/53 que


julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, o que fez com
fundamento no artigo 485, inciso I, do Código de Processo Civil.
Inconformada, recorre a parte autora (fls. 56/63),
sustentando em breve síntese que não tem condições de arcar com as
despesas processuais; que o direito de acesso ao Poder Judiciário é
previsto no inciso XXXV do artigo 5° da Carta Magna e estabelece
que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
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ameaça a direito”; que “a necessidade/utilidade está presente na


medida em que a Apelante precisa da prestação jurisdicional para ter
em sua posse o contrato para a propositura de uma nova ação. Sendo
que a adequação evidencia-se, na busca para compelir o Apelado a
apresentar o documento em questão”; que “faz jus ao interesse de
agir do Apelado, pois a recusa do mesmo em apresentar o contrato de
financiamento e o extrato das parcelas vencidas e vincendas, desperta
o interesse substancial a jurisdição”; que “verifica-se que a
impossibilidade da Apelante efetuar a revisão do contrato, tendo em
vista não possui-lo, mostrando-se perfeitamente cabível a TUTELA
CAUTELAR REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE, com a
finalidade de compelir o Apelado a apresentar os documentos
almejados, haja vista que deveria ter sido apresentado de forma
espontânea no ato da contratação e no decorrer da vigência com
contrato.”
Recurso tempestivo, regularmente processado, sem
preparo com pedido de deferimento da assistência judiciária gratuita,
sem resposta diante da ausência de completa angularização processual.

É o relatório.

Cuida-se de “Ação de modificação de cláusula


contratual c/c exibição de documento e consignatória com pedido de
tutela de urgência cautelar antecedente” em que o autor questiona
cláusulas contratuais, juros aplicados e postulando pela consignação da
parcelas vencidas e vincendas do contrato em valor que entende correto
o autor.
À fl. 46, o autor foi instado a esclarecer se pretendia a
conversão para o rito da produção antecipada de provas, por ser o
contrato documento indispensável a propositura da ação, contudo
manifestou-se pelo prosseguimento o do feito com a exibição do
documento.

Apelação Cível nº 1002776-94.2022.8.26.0127 -Voto nº 29.509 3


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Sobreveio sentença de extinção sem resolução do


mérito com fulcro no artigo 485, inciso I, do Código de Processo
Civil.
Pois bem.
Considerando que o benefício da gratuidade da justiça
pode ser requerido a qualquer tempo e grau de jurisdição, que o autor é
pessoa física auferiu nos últimos anos rendimentos inferiores a 3 (três)
salários mínimos, é isento da declaração de imposto de renda e diante
da sua baixa movimentação bancária nos últimos anos (fls. 65/112), e
que os demais elementos dos autos corroboram com situação de
hipossuficiência econômica alegada (arts. 99 §º 3º do CPC), de rigor o
deferimento da benesse, dispensando-se o preparo recursal.
Prossegue-se.
O magistrado “a quo” entendeu que o contrato em que as
cláusulas são impugnadas nesta demanda, “trata-se de prova que deve
ser assegurada antes do ajuizamento da demanda em que deva ser
empregada, posto que a obtenção do documento justificaria eventual
interesse processual do autor, já que não há como aceitar petição
inicial de revisão de cláusulas contratuais que sequer sabe se estão
presentes no contrato, ou ainda adequação da taxa de juros à taxa
média do Banco Central sem informação de que a taxa contratual é
superior.” E que é “forçoso reconhecer que inaplicável ao caso em
questão, a presunção de veracidade dos fatos que se quer provar,
consoante disposto no artigo 400 do Código de Processo Civil, bem
assim que a teor do disposto no artigo 329 inciso II do Código de
Processo Civil a alteração do pedido e causa de pedir, após a citação,
demanda consentimento do réu.” (fls. 51/53).
Com efeito, dispõe o art. 330, §2º, do CPC:
“Art. 330, §2º: Nas ações que tenham por
objeto a revisão de obrigação decorrente de
empréstimo, de financiamento ou de alienação
de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia,
discriminar na petição inicial, dentre as
obrigações contratuais, aquelas que pretende
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controverter, além de quantificar o valor


incontroverso do débito”.
Data vênia do entendimento do nobre magistrado, não é
caso de extinção do feito sem resolução do mérito, pois, in casu, o
autor não tem, em seu poder, a via do contrato firmado, mas apenas
tem ciência de algumas informações contratuais, o que o impede de
cumprir o disposto no §2º, do art. 330 do CPC supracitado.
Por esta razão, o autor solicitou, na inicial a exibição
incidental, inclusive com pedido de tutela provisória de urgência, para
apresentação do contrato firmado e espelho de pagamento (item c fl.
20), inclusive já pleiteado administrativamente e reiterado
judicialmente. E, havendo pedido incidental de exibição de
documentos, que se revelam fundamentais ao cumprimento da
obrigação prescrita naquela norma, incide o disposto no art. 324, §1º,
III, do CPC, que autoriza a formulação de pedido genérico:
“Art. 324. O pedido deve ser determinado. §
1º É lícito, porém, formular pedido genérico:
(...) III - quando a determinação do objeto ou
do valor da condenação depender de ato que
deva ser praticado pelo réu.

Em caso análogo, já julgou esta C. Câmara:


"APELAÇÃO - ação REVISIONAL
CONTRATOS BANCÁRIOS CUMPRIMENTO
DO ART. 330, §2º, DO NCPC NULIDADE
DO DECISUM Impossibilidade de
cumprimento, pelo autor, do disposto no art.
330, §2º, do NCPC, eis que não tem, em seu
poder, a totalidade dos contratos firmados
junto ao réu Pedido de exibição incidental
dos documentos, que se revelam
fundamentais ao cumprimento da obrigação
prescrita naquela norma, que autoriza a
formulação de pedido genérico, nos termos
do art. 324, §1º, III, do NCPC - Extinção,
sem julgamento de mérito, afastada
Inaplicável o disposto no art. 1.013, §3º, do
NCPC, vez que, neste momento, não há
condições para julgamento imediato da
demanda Juntada, pela instituição

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financeira, da totalidade dos contratos


firmados, é medida que se impõe - Decisão
anulada - Necessário o regular
prosseguimento do feito na instância de
origem Prejudicada a análise das demais
matérias arguidas no apelo - Apelo provido".
(Apelação Cível 1004781-65.2021.8.26.0405;
Relator (a): Salles Vieira; Órgão Julgador: 24ª
Câmara de Direito Privado; Foro de Osasco -
2ª Vara Cível; Data do Julgamento:
27/01/2022) (g.n.)

Ante o exposto, dá-se provimento ao recurso, para


anular a r. sentença, com remessa dos autos à origem para o seu
regular processamento e determinação de exibição do contrato
impugnado, concedendo-se o benefício da gratuidade da justiça ao
autor.

Cláudio Marques - relator

Apelação Cível nº 1002776-94.2022.8.26.0127 -Voto nº 29.509 6

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