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FACULDADES INTEGRADAS IESGO

CURSO DE LETRAS-INGLÊS

VICTÓRIA PASSOS ESCOBAR

Variação linguística na obra “A língua de Eulália” de Marcos Bagno

Artigo apresentado como requisito parcial


para obtenção do título de Licenciado em
Letras das Faculdades Integradas IESGO.

Orientador: Prof. Ieda de Macedo

Formosa-GO
2023
Variação Linguística na obra A Língua de Eulália de Marcos Bagno

Victória Passos Escobar1


Ieda de Macedo 2

Resumo

Este trabalho propõe uma análise sociolinguística na obra “A língua de Eulália”,


especificamente o preconceito linguístico. Assim, este estudo tem o objetivo de
abordar a questão das variações linguísticas e fazer uma análise do livro “A
língua de Eulália”, de Marcos Bagno. Dessa maneira, como instrumentos de
coleta de dados, utilizou-se, no estudo, a pesquisa bibliográfica em livros,
artigos e sites da Internet que tratam do assunto. Ao relacionar as variedades
linguísticas com a obra, fazendo reflexões sociolinguísticas, os resultados
mostram as consequências negativas que o preconceito linguístico tem na vida
das pessoas, principalmente daqueles marginalizados que se sentem
humilhados por não saber a norma culta da língua.

Palavras-Chave: Linguagem padrão e não-padrão, Preconceito linguístico,


Sociolinguística, Variação linguística, “A Língua de Eulália”.

1. Introdução

O presente trabalho discorre sobre a temática variação linguística na


obra “A língua de Eulália” de Marcos Bagno. Nesse sentido, há algumas
concepções sobre a obra “A língua de Eulália”, dentre elas, observamos que a
língua não-padrão pode causar problemas como o analfabetismo em pessoas
adultas, que têm como linguagem o dialeto da família. O português não-padrão
tem as suas variações, já que nem todos possuem acesso à norma culta da
língua. Muitos deparam com algo desconhecido, e têm a língua culta como algo
único. Para essas pessoas a língua não-padrão é “errada”, e, dessa forma,
gerando preconceito. Por conta dessa concepção equivocada o português não
padrão (PNP) é martirizado, o qual acaba acarretando preconceitos sobre
essas pessoas de baixa escolaridade.

1
Graduanda em Letras pelas Faculdades Integradas Iesgo
2
Professora nas Faculdades Integradas Iesgo.
Dessa forma, a obra “A língua de Eulália” do professor linguista Marcos
Bagno trata de uma novela voltada para professores que devem compreender
a necessidade de debater o preconceito linguístico na escola e na sociedade.
O autor, além dessa obra, teve como tese de doutorado, e posteriormente,
como livro “O Preconceito linguístico: o que é, como se faz.” Nesse sentido,
este trabalho justifica-se pela importância e relevância deste tema ainda nos
dias atuais, considerando que esse fenômeno ainda é recorrente nas salas de
aula das escolas brasileiras. A educação tem a grande responsabilidade de
combater qualquer tipo de preconceito, e nós, professores de Língua
Portuguesa, temos a missão de combater, além dos demais, o preconceito
linguístico.
Para amenizar o preconceito linguístico, a língua não-padrão deve ser
encarada como é, uma língua compreensível, útil e que faz parte das
variedades. Devemos aceitar essas diferenças e englobar uma língua diversa
da nossa tendo a compreensão e sendo mais acessível. Dessa forma,
podemos entender essas pessoas e aprender com elas. Na obra “A língua de
Eulália” percebe-se que há mais semelhanças do que diferenças entre as
variedades, mas as pessoas que defendem a norma culta como única, não
aceitam oposições, daí o preconceito linguístico.
Portanto, cada região tem seu jeito de falar – já que a fala é a utilização
individual da língua - modos que vêm de famílias, culturas diferentes, ou até
mesmo problemas na língua. É necessário, portanto, abordar mais sobre esse
assunto nas escolas, em casa e na sociedade, pois o preconceito linguístico
acontece com bastante frequência. Sendo assim, este estudo tem o objetivo de
abordar a questão das variações linguísticas e fazer uma análise do livro “A
língua de Eulália”, de Marcos Bagno.

2. As Variações Linguísticas e o Ato Comunicativo.

De acordo com Silva e Gementi (s.d) os fatores sociais, econômicos,


políticos, além de escolarização, entre outros, variam dos padrões, portanto, é
necessário que as pessoas conheçam essa diferença e que a respeitem. A
comunicação é necessária para todos nós. Para Medeiros (2010, p.01) apud
Silva & Gementi (s.d. p. 03):

comunicar é ocasionar uma resposta do receptor, do cliente.


Quando uma correspondência é bem escrita, mas o receptor
não compreende a mensagem, não ocorre a comunicação. Um
departamento não emite correspondência para mostrar seus
conhecimentos, mas para fazer negócios. A vida social e
profissional está em comunicação o tempo todo, é possível
gerar cumplicidade, materializar ideia, fechar negócios, trocar
informações, experiências e muito mais. Para isto, não é
necessário apenas falar dentro da norma padrão, muitas vezes
é preciso praticar diálogos com questionamentos, troca de
informações democráticas, levando em consideração fatores
sociais, econômicos, culturais e regionais dos envolvidos neste
diálogo, assim, podendo gerar confiança na comunicação.

Além do mais, para Camillo (2015, p.1) apud Silva & Gementi (s.d. p.
03):
a língua padrão é baseada no “modo de falar e escrever” dos
grupos de maior prestígio cultural, político e econômico;
caracteriza-se pelo uso de estruturas frasais mais complexas,
pelo vocabulário mais elaborado e pela observância às regras
da gramática normativa. Já a língua não padrão é mais
espontânea, empregada em situações informais do dia a dia e
caracterizada pelo emprego de frases de estrutura simples,
pela pouca (ou nenhuma) observância às regras da gramática
normativa, pelo vocabulário mais comum e pela presença de
frases feitas, expressões populares e gírias. Empregamos a
variedade não padrão quando nos comunicamos de maneira
mais informal e espontânea com nossos familiares, vizinhos,
colegas e amigos.

Nesse sentido, a comunicação exerce diferentes papéis em relação à


variedade não-padrão usada quando nos comunicamos de forma informal no
nosso cotidiano, e que para os autores são um modo, em outras palavras, o
jeito próprio de cada um de se comunicar e por isso não deve ser considerado
errado. Além disso, para Silva & Gementi (s.d) os alunos devem aprender na
escola a forma tradicional da gramática, porém é necessário que tenham
conhecimento das diferentes formas linguísticas existentes para que assim
possam respeitá-las, uma vez que as variedades linguísticas fazem parte da
cultura de um povo. Sendo assim, o aluno deve saber a importância da
variedade linguística, pois, como foi dito anteriormente, cada pessoa possui
seu modo de se comunicar.
Continuando nesse mesmo sentido, as variedades linguísticas são
entendidas como a língua que possui diferentes formas que variam a partir de
diversos fatores, entre eles, os fatores históricos e culturais. No Brasil, por
exemplo, temos diversos dialetos existentes como o mineiro, carioca, baiano,
gaúcho, entre outros. Podemos citar o exemplo da região Sul onde se fala
“guri” e na região Centro-Oeste onde se fala “menino” para se referir à pessoa
do sexo masculino com menos idade. Em outras palavras, esse conjunto de
línguas possui suas variedades, ou seja, a nossa língua possui suas variantes,
portanto a língua padrão de um país não é homogênea. Sendo assim, esses
conjuntos de variantes podem ser sociocultural, estilístico, regional,
ocupacional ou etário. Desse modo, podemos perceber que a variação
linguística está em constante transformação, seja no modo de falar, na grafia, e
também em seu sentido (CHÉROLET, 2019)
E assim podemos perceber que essas variações linguísticas estão
presentes no modo de se comunicar das pessoas em diferentes partes do
mundo, além disso, elas ocorrem sob influências sociais, regionais e históricas.
A partir disso, a variação linguística geográfica engloba a variação do local em
que se vive, como também existe a social que tem relação com as classes
sociais a qual cada grupo usa vocabulário restrito à sua comunidade. Há
também o dialeto situacional que engloba a situação do diálogo, o qual se trata
de um contexto formal ou informal. Nesse sentido, compreendemos que as
pessoas se comunicam de diversas formas, seja a língua culta ou não
(CHÉROLET, 2019).
Além disso, o nível de escolaridade pode ser entendido como fator relevante na
variação linguística.
De acordo com Abreu (2021, p.31):

a escolaridade também pode ser um fator bastante relevante


na questão da variação linguística, e está diretamente
relacionada à variações linguísticas e classe socioeconômica
do falante, visto que o acesso à educação ainda é desigual, e
os que têm acesso a ela, pertencem, de modo geral, a o grupo
socioeconômico mais elevado e privilegiado. Mesmo com
essas divergências, todos os estudantes são avaliados,
diariamente, da mesma forma e com o mesmo nível de
exigência, sem que seja levado em consideração a
peculiaridade daqueles cuja linguagem está mais distante da
norma padrão da LP, visto que cada uma possui o seu próprio
estilo e ritmo de aprendizagem e apresenta saberes prévios
originários de situações ambientais diversas.

Diante disso, o autor defende que o ensino deve estar disponível às


diferentes variações linguísticas, levando em consideração as peculiaridades
de cada aluno que são fundamentais para a condução de uma educação
respeitosa.
Tendo em vista as variedades existentes da língua e seus vários
contextos em que é inserida, surge a sociolinguística na década de 1960 -
ramo da linguística que estuda a relação entre a língua e a sociedade. Além do
mais, esse ramo é definido por Mollica (2005,) apud Abreu (2021 p.28) como:

[...] uma das subáreas da Linguística e estuda a língua em uso


no seio das comunidades de fala, voltando a atenção para um
tipo de investigação que correlaciona aspectos linguísticos e
sociais. Esta ciência se faz presente num espaço
interdisciplinar, na fronteira entre língua e sociedade,
focalizando precipuamente os empregos.

Sendo assim, percebe-se, através da sociolinguística, que a língua não


é homogênea, caso contrário as pessoas podem ter a falsa ideia de que só há
uma língua correta e um único jeito de se dialogar. A falta de conhecimento
sobre esses assuntos pode favorecer o preconceito linguístico, esse
preconceito ainda é marcante na década atual. Além disso, essa manifestação
de intolerância ou desprezo pela forma de dialogar do outro geralmente ocorre
em tom de deboche quando o indivíduo possui a crença de que seu modo de
falar é superior e o mais correto.

3 - A Variação e o Ensino da Língua

A variação linguística consiste no ato de utilizar um elemento no lugar


de outro sem alterar o sentido da frase, isto é, as pessoas utilizam variadas
formas e maneiras de falar para expressar as mesmas ideias e isso pode
ocorrer em vários níveis como na sintaxe, na semântica, morfologia ou lexical.
(LABOV [1972] 2008, p. 184).

Confirmando esta concepção de ensino de línguas, ao tratar do ensino


de Língua Materna, Travaglia (1996, p.41) afirma que:

Não cabe o argumento de trabalhar apenas com a norma culta


porque o aluno já domina as demais; isso não é verdade, uma
vez que o aluno, quando chega à escola, pode dominar bem
uma ou duas variedades e alguns elementos de várias, mas
sempre tem muito que aprender de diversas variedades,
inclusive das que domina.

Para Bagno (2007, p. 39), “a língua ocorrer variação quer dizer os


inúmeros grupos de atuações capazes das linguagens importantes que estão à
disposição do falante”. Por exemplo, no nosso cotidiano, convivendo com
outras pessoas conseguimos observar diferenças entre a maneira como
falamos a língua padrão. Sendo assim, uma pessoa que mora na Bahia não
fala da mesma forma que uma pessoa que mora Sul. A norma padrão difere-se
visivelmente da norma não padrão. A língua falada não obedece
criteriosamente à língua escrita. Em cada região do país a pronúncia dos
fonemas vai diferenciando e distanciando uma da outra dentro do próprio
português. Um exemplo disso está na variante caipira, quando o “r”
intervocálico é pronunciado diferentemente em várias regiões. Nas regiões de
São Paulo, Minas Gerais e de Mato Grosso, pode-se dizer que são oriundas de
um dialeto caipira, o “r” intervocálico é pronunciado com o chamado “r”
retroflexo, ou “r” caipira. Já em outras regiões esse mesmo “r” intervocálico tem
o som forte ou vibrante.
Dessa forma, a variação linguística concebe um fato concreto em
relação a comunicação. No Brasil, o português padrão para os estudantes é o
único e correto, mas não se dão conta que o PNP é falado pela maioria,
principalmente pela classe social menos beneficiada. O português não padrão
tem as suas variações, a língua varia em todo território brasileiro, cada lugar
tem um modo de falar regionalizado. Na Educação de Jovens e Adultos,
perceber-se que os alunos continuam com a sua língua materna, assim vão
realizando objetivos comuns com uma sociedade de pessoas, pois como não
possuíram a chance de estudar na idade apropriada, ao chegar à sala de aula
têm um enorme confronto de absorver a língua padrão. Logo, a finalidade da
educação de jovens e adultos é de fato alfabetizá-los e progressivamente
encaminhando para a concepção de um vocabulário mais culto. Mas, se esse
trabalho seria fracassado, pois o adulto está introduzido em uma sociedade,
em uma classe social em que a linguagem é um Português não padrão,
portanto língua coloquial sempre predominará como meio de comunicação.
Nesse sentido, cabe à escola trabalhar com a variação para que o aluno
consiga ter afluência às diversas variedades da língua e, além disso, conhecer
em qual circunstâncias sociais pode valer-se de cada variante, e não limitar o
ensino da língua à norma padrão, pois de acordo com Labov (1978), uma
análise da variação linguística não concebe uma simples definição da
gramática, e sim uma definição da língua que vai além dos métodos de
gramática. Além disso, segundo Baralo (1999, p.17), “a variação linguística é
indispensável para a atribuição sociolinguística nas quatro capacidades: falar,
ouvir, ler e escrever.” Vale enfatizar que a competência sociolinguística é
fundamental para que o aluno expanda seu domínio comunicativo.
Segundo os PCNs, o conhecimento da língua materna na escola retrata
para uma importância sobre a eficiência da língua na vida e na sociedade. Os
alunos precisam assimilar que a língua portuguesa é a nossa língua materna e
na escola não tem que exigir a língua padrão como certa, porém instruir que
tenham muitas circunstâncias no qual se aproveitam inúmeras variações dessa
própria língua.
Afirmam os PCNs (ensino Médio. 2000):

O desenvolvimento da competência linguística do aluno no


Ensino Médio, dentro dessa perspectiva, não está pautado na
exclusividade do domínio técnico de uso da língua legitimada
pela norma padrão, mas, principalmente, no saber utilizar a
língua, em situações subjetivas e/ou objetivas que exijam graus
de distanciamento e reflexão sobre contextos e estatutos de
interlocutores – a competência comunicativa vista pelo prisma
da referência do valor social e simbólico da atividade linguística
e dos inúmeros discursos concorrentes.

Diante disso, as linguagens são vistas como grupos representativos, das


quais atribuímos e incluímos o que está em nossos objetivos, em nossos
fundamentos e no levantamento entre esses contextos, e com esses inclusive
que nos informamos com os nossos semelhantes e observamos nossa
conexão que vive e os diferentes aspectos de exposição entre homem e
natureza, aprofundando sobre as diversas maneiras e oposições da sociedade
em ligação a si mesmo e ao âmbito. No contexto de língua materna a
linguagem é a habilidade de produzir sentidos, quanto mais linguagens
abranger mais o homem será apto de se identificar e relacionar-se o mundo ao
seu entorno (Proposta Curricular do Estado de São Paulo, 2008).

3. O Preconceito Linguístico

De acordo com o dicionário brasileiro da língua Portuguesa, Aulete,


preconceito é definido como:

Sig.1. Opinião ou ideia preconcebida sobre algo ou alguém,


sem conhecimento ou reflexão. Sig. 2. Atitude genérica de
discriminação ou rejeição de pessoas, grupos, ideias etc., com
base no sexo, raça, nacionalidade, religião etc. (AULETE,
2011, p.698-699)

Dessa forma, o preconceito linguístico nada mais é do que a rejeição


do falar diferente do convencional, ou seja, de quem domina o poder sobre as
classes sociais menos favorecidas. E sem ter conhecimento dos vários fatores
que influenciam a língua, por apenas se comunicarem de um modo diferente, o
português dessas pessoas é tachado como errado.
Sendo assim, Possenti (2011)3 afirma:

No fundo, o preconceito linguístico é um preconceito social. É


uma discriminação sem fundamento que atinge falantes
inferiorizados por alguma razão e por algum fato histórico. Nós
o compreenderíamos melhor se nos déssemos conta de que
‘falar bem’ é uma regra da mesma natureza das regras de
etiqueta, das regras de comportamento social. Os que dizemos
que falam errado são apenas cidadãos que seguem outras
regras e que não têm poder para ditar quais são as elegantes

3
POSSENTI, Sírio. Preconceito Linguístico. Instituto Ciência Hoje. 23 de dezembro de
2011. Disponível em: < http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/palavreado/preconceito-linguistico/
É fato que o Brasil possui uma língua oficial: a Língua Portuguesa.
Porém, ela sofreu influências por muitos aspectos. O primeiro deles é que a
nação brasileira foi formada por vários povos, entre eles os indígenas,
portugueses, africanos e muitos outros. Toda essa miscigenação deixou
marcas no modo de vida das pessoas, pois cada um desses grupos tinha seus
costumes e maneiras de comunicação. Com isso, a fala também sofreu
influência dessa mistura. Desse modo a Língua Portuguesa falada aqui foi
incorporando palavras originárias dessa grande variedade de línguas ao seu
vocabulário.
A partir disso, Couto (1998, p. 20) diz que:

Esse português foi trazido para o Brasil. Aqui ele sofreu não só
a influência do meio físico, mas também a dos povos
indígenas, africanos e de outros que, como imigrantes, vieram
fazer parte de nossa sociedade posteriormente. A língua
portuguesa do Brasil atual é consequentemente, o resultado de
tudo isso.

Pelo fato de o Brasil ser um país continental, muitos lugares foram


adquirindo uma forma própria de falar, os chamados regionalismos. Por
exemplo, um nordestino tem a pronúncia diferente de um gaúcho ou um
carioca, e como esses, vários outros casos existem e modificam a Língua
Portuguesa Brasileira. Ainda existem os fatores sociais, como o acesso ou não
aos estudos, entre tantos outros.
Como menciona Bagno (2007):

A língua também fica diferente quando é falada por um homem


ou por uma mulher, por uma criança ou por um adulto, por uma
pessoa alfabetizada ou por uma não alfabetizada, por uma
pessoa de classe alta ou por uma pessoa de classe média ou
baixa, por um morador da cidade e por um morador do campo
e assim por diante. Temos então, ao lado das variedades
geográficas, outros tipos de variedades: de gênero,
socioeconômicas, etárias, de nível de instrução, urbanas, rurais
etc. (BAGNO, 2007, p.20).

Então, como muitos pensam, o português brasileiro não é uma língua


estática, ela está em constante evolução. E essas modificações podem ocorrer
de diversas maneiras, como: região, classe social, entre outros. A língua
portuguesa brasileira “[...] não é um bloco compacto, sólido e firme, mas sim
um conjunto de ‘coisas’ aparentadas entre si, mas com algumas diferenças.
Essas ‘coisas’ são chamadas variedades” (BAGNO, 2007, p.19). Por tudo isso,
não tem como certificar que algumas dessas variedades linguísticas sejam
melhores ou piores, já que cada uma cumpre seu objetivo: o da comunicação.
Mesmo com essas peculiaridades na formação do português brasileiro, a
maioria dos modos como se falam no Brasil são considerados inferiores.
De acordo com isso, os PCNs (1997) afirmam:

A Língua Portuguesa, no Brasil, possui muitas variedades


dialéticas. Identificam se geográfica e socialmente as pessoas
pela forma como falam. Mas há muitos preconceitos
decorrentes do valor social relativo que é atribuído aos
diferentes modos de falar: é muito comum se considerarem as
variedades linguísticas de menor prestígio como inferiores ou
erradas.

A partir do pensamento de algumas pessoas de que existe uma


variedade linguística que se sobressai sobre as outras, norma de prestígio,
usada pelos grandes autores, jornalistas e a que os órgãos do governo utilizam
para passar suas mensagens, criou-se a ideia da existência de apenas um falar
correto. Dessa forma, a sociedade passou a crer que quem não estiver dentro
da norma ou não domina esse modo de falar é inferior aos que conseguem.
Assim, criando o preconceito linguístico.
Logo, essa forma de discriminação se encontra em todos os campos
da sociedade, inclusive e principalmente na escola. Por exemplo, um aluno da
zona rural habituado a falar do modo que aprendeu com a sua família, dentro
da sala de aula, para se referir ao animal “porco” usa a expressão “poico’’, isso
pode transformá-lo em motivo de “chacota” pelos outros. O que pode levar
esse indivíduo a se retrair, a ficar com medo de se comunicar diante da
sociedade. Ou seja, um desconhecimento de que na língua existem diferentes
variedades e que todas são importantes, pode comprometer o futuro
profissional, social de vários indivíduos.
Supõe-se, portanto, que o preconceito linguístico está enraizado na
sociedade, não unicamente pelas pessoas que acham que detêm o
conhecimento, mas igualmente pelas que sofrem isso, por se acharem
inferiores. É fundamental que se apoiam e compreendam as variações
linguísticas e os gêneros do discurso existentes na sociedade e na escola, pois
o preconceito que reprime variantes é o mesmo que exclui sujeitos.

Cabe à escola, ambiente destinado à aquisição de conhecimento,


transformar essa realidade, tendo a obrigação de trabalhar com as variedades
e enfrentar a desigualdade linguística como algo próprio na língua, visto que
nenhuma (língua) é homogênea e que todas as variantes se conectam
diretamente com a sociedade. E, por isso, é importante conscientizar os
alunos, futuros cidadãos, de que no Brasil existem inúmeras variedades da
língua e os fatores que influenciam e diferenciam uma de outra, podendo assim
mudar a atual realidade.

4. A Língua de Eulália, uma Novela Sociolinguística

O livro “A língua de Eulália” refere-se a uma questão muito habitual, mas


constantemente passa despercebido para a maior parte da população.
Para o professor, linguista e filólogo Marcos Bagno quando às
variedades linguísticas são atribuídos juízos de valores de forma negativa, isso
configura preconceito linguístico. Isso significa que agir com preconceito
linguístico é acreditar que quem não segue a norma culta escrita e falada está
“usando o português errado”. Dessa maneira, o preconceito linguístico causa
consequências negativas no contexto social de vida.
Afirma Bagno (2014, p. 214):

A variação linguística tem que ser objeto e objetivo do ensino


de língua: uma educação linguística voltada para a construção
da cidadania numa sociedade verdadeiramente democrática
não pode desconsiderar que os modos de falar dos diferentes
grupos sociais constituem elementos fundamentais na
identidade cultural da comunidade e dos indivíduos
particulares, e que denegrir ou condenar uma variedade
linguística equivale a denegrir e a condenar os seres humanos
que a falam, como se fossem incapazes, deficientes ou menos
inteligentes […].

Nessa perspectiva, o autor Bagno que nasceu na cidade de


Cataguases – Minas Gerais, no dia 21 de agosto de 1961, formou-se em Letras
pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), teve como objetivo
discorrer sobre o preconceito linguístico em sua obra intitulada “A língua de
Eulália”, publicada em 1997. A obra é composta de 22 capítulos, distribuídos
em 251 páginas. Bagno é um grande defensor da valorização de todos os
modos de falar e atua contra qualquer forma de exclusão social por meio da
linguagem (ABREU, s.d). Em seu livro ele conta a história de Eulália, uma
empregada doméstica alfabetizada, que possui seu próprio modo de se
comunicar, sendo “diferente” considerado não padrão, mas possível de ser
entendido por todos, além de Eulália, existem dona Irene, professora
aposentada, e três meninas universitárias envolvidas que viajam para o interior
de São Paulo e que praticam preconceito linguístico contra Eulália. Sendo
assim, o autor Bagno, por meio da história procura mostrar que nem sempre
uma linguagem diferente pode ser considerada errada e que isso pode ser
explicado pela ciência, a história, a sociologia, entre outros, como linguística
(ABREU, s.d).
Continuando, a obra de Bagno, trata-se de uma novela sociolinguística a
qual expõe assuntos pertinentes do cotidiano, como o preconceito linguístico,
como foi dito anteriormente, daquele que não possui conhecimento das
variedades linguísticas existentes, ou seja, das diversas formas de se
comunicar e que não há o “certo” e o “errado”.
Nesse sentido, para Costa (2015, online):

A língua não é, como muitos acreditam, uma entidade imutável,


homogênea, que paira por sobre os falantes. Pelo contrário,
todas as línguas vivas mudam no decorrer do tempo e o
processo em si nunca para. Ou seja, a mudança linguística é
universal, contínua, gradual e dinâmica, embora apresente
considerável regularidade.
Porém, atualmente na nossa sociedade o português não padrão ainda é
considerado errado, devido aos conceitos que foram impregnados através do
sistema tradicionalista de educação o qual valoriza a gramática visando
somente a uma única forma correta do português. Dessa forma, “Não dá mais
para ficar parado no tempo, agarrado à gramática normativa e aos dogmas
tradicionais, lamentando a “ruína”, a “corrupção”, a “decadência” da língua
portuguesa […]” (Bagno, 1997, p.225). Por consequência, pode gerar a
exclusão social, por muitas pessoas sofrerem preconceito por seu modo de se
comunicar. Portanto, para o autor, cada um possui seu modo de falar, e a
variedade linguística deveria ser normalizada por toda a sociedade.
No Brasil, o preconceito linguístico ainda é algo muito evidente e
comum, principalmente nas regiões de baixa renda. Esse preconceito advém,
geralmente, por meio de deboche e pode gerar diversos tipos de violência,
tanto física, mental, quanto verbal. Em relação a esse assunto, o autor Bagno
(1999, p. s.d) apud Diana (2022, online)4 cita em obra Preconceito linguístico: o
que é, como faz que:
É um verdadeiro acinte aos direitos humanos, por exemplo, o modo
como a fala nordestina é retratada nas novelas de televisão,
principalmente da Rede Globo. Todo personagem de origem
nordestina é, sem exceção, um tipo grotesco, rústico, atrasado, criado
para provocar o riso, o escárnio e o deboche dos demais personagens
e do espectador. No plano linguístico, atores não nordestinos
expressam-se num arremedo de língua que não é falada em lugar
nenhum do Brasil, muito menos no Nordeste. Costumo dizer que
aquela deve ser a língua do Nordeste de Marte! Mas nós sabemos
muito bem que essa atitude representa uma forma de marginalização
e exclusão. (...) Se o Nordeste é “atrasado”, “pobre”,
“subdesenvolvido” ou (na melhor das hipóteses) “pitoresco”, então,
“naturalmente”, as pessoas que lá nasceram e a língua que elas falam
também devem ser consideradas assim... Ora, faça-me o favor, Rede
Globo!

Dessa forma, o preconceito linguístico se torna algo comum no século


XXI. Os sotaques desses indivíduos são alvo de discriminação, pois sabemos
esses sotaques se distinguem não somente nas cinco regiões do Brasil, mas
também dentro do próprio Estado e são os principais meios de discriminação.
Geralmente as pessoas que vivem na capital acham que sua maneira de falar é
a mais correta, e sabemos que isso não é verdade, além disso, acham-se

4
DIANA, Daniela. Variações Linguísticas. Toda Matéria, [s.d.]. Disponível em:
https://www.todamateria.com.br/variacoes-linguisticas/. Acesso em: 15 abr.
superiores em seu modo de falar em relação às pessoas que habitam no
interior ou mesmo nas zonas rurais (DIANA, 2022).
Diante disso, há bastante semelhanças do que diferenças entre as
variedades. Entretanto, as pessoas instruídas não aceitam as diferenças
linguísticas, porém há desigualdades sociais, por isso o preconceito linguístico,
preconceito esses mencionados nesse livro, como por exemplo: religioso,
sexual, racial entre outros. Além disso, são associadas ao uso da fala. No
entanto, conseguimos ver a sociolinguística de maneira crítica e ao mesmo
tempo agradável. Ao encarar-se com pessoas que não possuem convívio com
essas variações, elas são capazes de provocar ou criar uma circunstância, seja
tanto de admiração como de discriminação, através de contato social e
pessoal, em consequência do preconceito linguístico.
O que intitulamos de Português não é um conjunto íntegro, sólido e sim,
um total de elementos designadas de variedades no livro. A maneira de falar o
Português e a forma de falar do brasileiro têm suas diferenças sintáticas,
semânticas, lexicais, fonéticas e no uso da língua. Temos também, além das
variedades geográficas, outros tipos de variedades: de gênero,
socioeconômicas, etárias, de nível de instrução, urbana, rurais, religiosas etc.
Toda língua “além de variar geograficamente, no espaço, também muda com o
tempo. A língua que falamos hoje no Brasil é diferente da que era falada aqui
mesmo no início da colonização [...]” (Bagno, 1997, p.23).
Partindo da ideia de que a sociedade não é homogênea, podemos
perceber que todos são iguais, porém todos são diferentes, ou seja, somos
todos iguais quando respeitamos as diferenças. Pode-se divergir com as ideias,
porém sempre observando o princípio do respeito. Desse modo, conseguimos
assistir ao que os falantes do PNP têm a nos ensinar quanto aos nossos
respectivos antepassados, pois da mesma forma que o Latim se modificou
lentamente nas inúmeras línguas românicas atuais, assim com cada uma delas
segue mudando. O fato é que essa variedade não é vista como riqueza de
diversidade da língua portuguesa, tornando-se alvo de preconceito contra a fala
de estipulados grupos ou classes sociais, fazendo com que sejam focos
frequentes de chacota e indiferença de pessoas que desconhecem a
variabilidade da língua.
Portanto, fica evidente que não existe o modo correto de falar a língua
portuguesa, pois as variações linguísticas existem e devem ser levadas a sério,
respeitando os falantes e levando em consideração sua cultura e a região em
que habitam, além de considerarem-se as particularidades de cada um. Pois, a
variação linguística não existe somente no idioma português como foi dito
anteriormente, mas sim em todas as línguas. E assim, não existe o certo e
errado no modo de falar, e através desse conhecimento o preconceito
linguístico poderá ser diminuído.

5. Conclusão

O preconceito sempre vem acompanhado da ideia de superioridade ou


ignorância de quem os tem, isto é, aqueles que são preconceituosos tendem a
ver defeito nas diferenças e utilizam o conceito antecipado que possuem
acerca do outro justamente para dominá-lo. Numa sociedade extremamente
competitiva e individualista, onde cada um busca o seu próprio benefício sem
dar muita importância ao seu semelhante que está ao redor, parece não haver
solução contra tal problema que é tão antigo e tão atual ao mesmo tempo. O
livro a língua de Eulália tem como objetivo possibilitar uma análise ao uso da
língua padrão e não padrão, conseguimos compreender a imensa diversidade
linguística presente, com base nos âmbitos culturais, sociais, hábitos e
costumes.
É fato que o Brasil possui uma língua oficial: a Língua Portuguesa.
Porém, ela sofreu influências por muitos aspectos. O primeiro deles é que a
nação brasileira foi formada por vários povos, entre eles os indígenas,
portugueses, africanos e muitos outros. Toda essa miscigenação deixou
marcas no modo de vida das pessoas, pois cada um desses grupos tinha seus
jeitos próprios de viver e se comunicar. Com isso a fala também teve grande
influência dessa mistura. Desse modo, a Língua Portuguesa falada aqui foi
incorporando ao seu vocabulário palavras originárias dessa grande variedade
de línguas.
Desse modo, evidencia-se a clara ligação entre o português falado e a
informalidade e o português escrito e a formalidade. Com isso, aquilo que é
forma ou solene tende a ter relevância maior do que aquilo que não é. Embora
exista tal relação, podemos perceber momentos em que o português formal é
utilizado na linguagem escrita, como em revistas em quadrinhos ou mesmo nas
redes sociais com a velocidade e dinamismo em que as mensagens de textos
são escritas e enviadas. Assim como também se utiliza o português padrão em
discursos, aulas ou em telejornais
Dessa forma, a cada artigo publicado, trabalho de conclusão de curso,
dentre outras coisas do gênero tendo como assunto o preconceito linguístico,
mais pessoas conhecerão o assunto e flexionarão a maneira de pensar. A cada
abordagem sobre diversidade da comunicação oral feita em sala de aula, mais
opiniões sobre o assunto serão formadas. Nos confrontos de saberes a língua
se torna ainda mais rica, todos se entendem e passam a se respeitar mais até
que com o tempo a exclusão (ao menos pela maneira de falar) seja extinta.

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