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Sem Acaso Ou Coincidencia
Sem Acaso Ou Coincidencia
Rosângela Bittar
07/07/2010
O Greenpeace chegou a pedir para seu público escrever a Rebelo com avalanches de
apelos para não modificar o Código. Uma tortura.
O deputado reagiu, apontando a reduzida autoridade de uma Ong "que tem sede na
Holanda, se envolveu em vários problemas na Europa e nos Estados Unidos, é
suspeita de atividades irregulares e, portanto, não tem muita autoridade para se
meter em problemas do Brasil".
Nos últimos dias, antes mesmo da votação do relatório que negociou até o fim, ao
longo de um ano - de julho de 2009 a julho de 2010 - Aldo Rebelo ainda fez
concessões, modificou regras em busca de equilibrio entre as posições conflitantes
na questão, os ambientalistas, de um lado, e os agricultores, de outro. Finalizou a
missão enquanto dava curso aos preparativos para o périplo eleitoral que deve
começar agora. "Converso com as pessoas, frequento sindicatos, ambientes de classe
média, todos acham correto o que estou fazendo, a defesa do interesse do país, da
agricultura nacional, da economia nacional. Há uma noção muito clara do embate,
possivelmente comercial, entre o interesse do Brasil e da Europa e Estados Unidos".
Os argumentos do deputado vão sendo reforçados por fatos internacionais. Na
semana passada, por exemplo, a União Nacional dos Agricultores dos Estados Unidos
produziu o documento "Farms here, Forests there", que reforça a posição de Aldo:
"Foi uma desfaçatez".
"Meu eleitorado nunca foi de Ong, como também nunca foi o agronegócio. É um
eleitorado de opinião que está acostumado a esses embates, um eleitorado de
caráter democrático e nacionalista".
Não é uma coincidência nem a primeira vez que Aldo Rebelo se vê no olho desse tipo
de furacão. Seu eleitorado foi posto à prova quando fez o embate da Lei de
Patentes, defendendo abertamente que o Brasil não deveria assinar o acordo Trips
da Rodada Uruguai.
Liderou uma longa e densa batalha pelos transgênicos e, como relator do projeto do
governo, introduziu no texto a pesquisa de célula tronco.
"O difícil, o que me preocupa, não é errar nas alianças, é errar nos objetivos". Se os
objetivos estão claros, argumenta, as alianças se tornam previsíveis. Numa atitude
quase zen, sentencia, em voz pausada: "É como se você escrevesse mentalmente o
roteiro do que vai acontecer. As reações dos aliados e adversários passam a ser
previsíveis. É uma certa batalha mental, também".
O controverso texto, que deve ser apreciado no plenário da Câmara depois das eleições de outubro,
abriu um profundo racha na bancada de PT e PSDB, que votaram divididos. Questões como anistia e
moratória de cinco anos a multas aplicadas até julho de 2008 acirraram os ânimos de parlamentares
ruralistas e ambientalistas.
Em reunião tensa, marcada por troca de insultos e ameaças de agressão física, houve disputa de
gritos de guerra entre sindicalistas, agricultores familiares e produtores rurais. Antes, um protesto
da ONG Greenpeace tumultuou a sessão e tentou paralisar a votação do relatório. Os exageros no
comportamento só foram serenados pela aprovação maciça na comissão. Às vésperas das eleições, os
deputados votaram para agradar seus eleitores e aliados políticos.
Com o pano de fundo eleitoral, o novo Código Florestal abre espaço para a regularização de áreas
em situação ilegal, prevê "desmatamento zero" por cinco anos, perdoa crimes ambientais e libera da
exigência de reserva legal áreas de até quatro módulos fiscais - de 20 a 400 hectares, segundo a
região. Também onera os cofres públicos com o pagamento de parte dos custos de recuperação das
florestas e a remuneração pela manutenção de áreas nativas, além de reduzir a área mínima de
preservação permanente (APPs) em beiras de rio (de 30 para 15 metros) e consolidar cultivos de
áreas em uso sem contrapartida de recomposição obrigatória. Quem desmatou terá até 20 anos para
recuperar. "Essa lei faz Justiça a 4 milhões de produtores e avança na questão ambiental", disse Luís
Carlos Heinze (PP-RS).
Nem mesmo algumas concessões de Rebelo foram suficientes para aplacar a fúria dos
ambientalistas, que patrocinaram uma guerrilha regimental para evitar a votação do parecer antes
das eleições. A manutenção dos termos de compromisso impostos pelo Ministério Público e a
obrigação de recompor áreas devastadas acima de quatro módulos fiscais não ajudaram muito. "Isso
aqui termina tão confuso quanto começou", disse o líder do PV, Edson Duarte (BA). "Este relatório
não soma nada. Apenas divide. Como fica quem respeitou a lei?", perguntou o líder do P-Sol, Ivan
Valente (SP), que quase brigou com Heinze após a aprovação do relatório.
Em defesa de seu texto, costurado a duras penas durante um ano de audiências da comissão
especial, Aldo Rebelo afirmou ter assegurado "margem de sobrevivência" aos produtores. "Retiramos
a autonomia dos Estados para evitar guerra fiscal, mesmo que eu refute esse argumento. Também
recuperamos as florestas como bens de interesse comum, além de proteger áreas sensíveis." E
deixou a porta aberta para novas alterações no texto, agora no plenário. "A proposta está aberta a
votos e destaques, mas tenho certeza que ajudei a proteger o ambiente, a agricultura e a sociedade
brasileiras."
Nos bastidores, os partidos aliados do governo costuraram um acordo para votar o texto de Aldo
Rebelo e evitar desgastes ao relator. Mas o acordo não impediu divergências internas na base aliada.
O PT apresentou um voto em separado, retirou o texto e o reapresentou em menos de 24 horas. O
deputado Anselmo de Jesus (PT-RO), eleito por agricultores familiares, rejeitou a reprovação do
texto, como queria a maioria do partido. No fim, mesmo com orientação contrária da liderança da
bancada, votou a favor do relatório. "Contemplou a maioria, que é bastante ampla aqui", disse
Anselmo. O PSDB também viveu um dilema. Para não desagradar eleitores rurais nem urbanos, o
líder João Almeida (BA) "liberou" a bancada. Assim, o ruralista Duarte Nogueira (SP) votou a favor e
o ambientalista Ricardo Tripoli (SP), contra.
Aos gritos de "vendidos", militantes da CUT e da Contag encheram dois plenários e corredores das
comissões. De outro lado, dirigentes e produtores rurais tomaram o plenário onde ocorriam as
discussões.