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Universidade do Estado do Pará - CCSE

Curso: Licenciatura em Física Turma: 2019M


Disciplina: A Construção da Física Moderna e Contemporânea II
Prof.: Penn Rodrigues (penn@uepa.br) Data: / /
Aluno(a):

1ª PROVINHA DE FMC II: O Oscilador Harmônico Quântico (3,5 pts)

No estudo de oscilações em Tópicos de Física II foram abordados movimentos que se


repetem em intervalos regulares, chamados de movimentos periódicos ou movimentos
harmônicos (Halliday, Resnick e Walker, 2012.). Podemos citar vários exemplos para esse
tipo de movimento como o caso de um pêndulo simples, no entanto, o maior representante
é o sistema massa-mola, mostrado na Fig.1.

Figura 1: Sistema massa-mola no eixo x. Em vermelho temos a representação da força elástica.


Fonte: https://brainly.com.br/.

A força elástica dada pela lei de Hooke atua como força restauradora, no sentido de
levar a massa para o ponto de equilíbrio em x = 0. Além disso, na ausência da força de
arrasto devido as partículas do ar e da força de atrito com o solo, a força elástica será a força
resultante sobre o sistema, ou seja,

d2 x
m = −kx, (1)
dt2

1
ou ainda,
d2 x
= −ω02 x, (2)
dt2
onde ω02 = k/m é a frequência angular de oscilação do movimento.
A solução geral do movimento pode ser dada por:

x(t) = A cos(ω0 t + ϕ), (3)

onde ϕ é a fase da oscilação associada ao valor de x onde a massa foi abandonada no início
do movimento.
Note que a energia total do sistema é obtida a partir da soma da energia cinética e da
potencial,
1 1
E = K + V = kA2 = mω02 A2 . (4)
2 2
Uma extensão natural do problema clássico consiste em supor que os átomos que com-
põem a estrutura cristalina da matéria podem se comportar como pequenos osciladores
harmônicos, evidentemente para pequenas oscilações em torno da posição de equilíbrio,
veja a Fig.2.

Figura 2: Representação da estrutura tridimensional de um sólido metálico. Na figura as molas


representam as forças interatômicas. Fonte: Adaptado de https://willelindberg.se/.

Essa consideração implica em uma solução da equação de Schrödinger para uma partí-
cula sujeita à energia potencial do tipo,
1 1
V = kx2 = mω 2 x2 , (5)
2 2
ou seja,
ℏ2 ∂ 2 1 ∂
− 2
ψ(x, t) + mω 2 x2 ψ(x, t) = iℏ ψ(x, t). (6)
2m ∂x 2 ∂t
EXERCÍCIO 1: (0,25pt) A partir do método de separação de variáveis, ψ(x, t) = ψ(x)T (t), e
tomando como constante de separação a energia total E, mostre que soluções estacionárias
implicam em:
iE
T (t) = e− ℏ t , (7)
2
bem como,
ℏ2 ∂ 2 1
− 2
ψ(x) + mω 2 x2 ψ(x) = Eψ(x). (8)
2m ∂x 2
EXERCÍCIO 2: (0,25pt) Mediante a mudança de variáveis
r

ξ = x,

2E
λ = ,
ℏω

tal que ψ = ψ(ξ) e ξ = ξ(x) mostre que a Eq.(8) pode ser reescrita como

∂2
2
ψ(ξ) + (λ − ξ 2 )ψ(ξ) = 0. (9)
∂ξ
∂ψ ∂ψ ∂ξ
(Note que a mudança de variáveis requer a aplicação da regra da cadeia: ∂x
= ∂ξ ∂x
.)

Na busca pela solução do Oscilador Quântico vamos supor a seguinte solução geral
para a Eq.(8),
ξ2
ψ(ξ) = Ae− 2 y(ξ), (10)

uma vez que soluções fisicamente compatíveis implicam em funções y(ξ) → 0 quando
|ξ| → ∞. Assim,
 
dψ dy ξ2
= A − ξy e− 2 , (11)
dξ dξ
2
 2 
dψ dy 2
2
− ξ2
= A + (ξ − 2ξ − 1)y e , (12)
dξ 2 dξ 2

de modo que, substituindo na Eq.(9), obtemos:

d2 y dy
2
− 2ξ = −(λ − 1)y. (13)
dξ dξ

A Eq.(12) só admite soluções quando o lado direito é nulo ou múltiplo par de y(ξ), ou seja,

λ − 1 = 2n, (14)

onde n = 0, 1, 2, . . . fazendo com que os valores para a energia não sejam contínuos:
 
1
En = n + ℏω, (15)
2

de forma que existem diferentes níveis de energia para cada valor de n. Na figura (3)
vemos a representação energética de V (x) e En versus x, a linha cheia representa a energia
potencial V (x), enquanto as linhas tracejadas representam a energia por nível n. Além

disso, no eixo horizontal temos αx onde α = (mω/ℏ).
3
Figura 3: Representação energética de V (x) e En versus x. Fonte:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5828574/mod_resource/.

Por outro lado, a função y(x) pode ser obtida substituindo a Eq.(14) em (13), isto é,

d2 y dy
2
− 2ξ = −2ny, (16)
dξ dξ

cuja solução são os polinômios de Hermite, y(x) ≡ Hn (ξ), dados por:

ξ2 dn − ξ 2
Hn (ξ) = (−1)n e 2 e 2, (17)
dξ n

satisfazendo as seguintes relações de recorrência

H1 (ξ) = 2ξH0 (ξ), (18)

Hn+1 (ξ) = 2ξHn (ξ) − 2nHn−1 (ξ), (19)

onde n = 1, 2, 3, . . .. Assim, os polinômios de Hermite até a terceira ordem são dados por:

H0 (ξ) = 1,

H1 (ξ) = 2ξ,

H2 (ξ) = 4ξ 2 − 2, (20)

H3 (ξ) = 8ξ 3 − 12ξ,

Os polinômios de Hermite também apresentam a propriedade de ortogonalidade em


2
relação à função e−x , a saber,

Z ∞  0 , n ̸= m
2
e−x Hn (x)Hm (x)dx = (21)
−∞  2n n!√π, n = m.

Finalmente, colecionando todos os resultados obtidos, Eq.(7), Eq.(10) e Eq.(17), a solução


por nível energético pode ser rescrita como:

mω 2 iEn
ψn (x, t) = An e− 2ℏ x Hn (x)e− ℏ
t
, (22)

4
de modo que a solução geral é dada por:

X mω 2 iEn
Ψ(x, t) = An e− 2ℏ x Hn (x)e− ℏ
t
. (23)
n=0

Na figura (4) estão representadas as funções de onda ψn (x) e as densidades de probabi-


lidade |ψn (x)|2 para o nível fundamental e para os dois primeiros níveis energéticos,

Figura 4: Representação gráfica de ψn (x) e |ψn (x)|2 versus x para os valores de n = 0, 1, 2. Fonte:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5828574/mod_resource/.

A linha tracejada preta representa o limite de oscilação da partícula, de modo que, a proba-
bilidade de se localizar a partícula varia de acordo com o nível energético. Cabe ressaltar
que é possível observar uma probabilidade de encontrar a partícula em nas regiões proi-
bidas, uma vez que a densidade de probabilidade se estende para além dos pontos de
máximo e mínimo na oscilação. Veremos nas próximas aulas que esse fenômeno possibilita
o tunelamento de partículas, isto é, faz com partículas restritas uma determinada região
migrem para outras outrora não permitidas pelas barreiras de potenciais.

EXERCÍCIO 3: (0,5pt) A substituição “retirada do bolso” na Eq.(14) pode gerar um certo


desconforto, para contornar essa dificuldade considere a expansão de y(ξ) em série de po-
tências em torno de ξ = 0,

X
y(ξ) = cn ξ n , (24)
n=0
em seguida, após substituir na Eq.(13) (a) (0,25pt) mostre que a relação de recorrência entre
os coeficientes deve ser dada por:
(1 − λ + 2n)
cn+2 = cn . (25)
(n + 2)(n + 1)
5
(b) (0,25pt) Além disso, a normalização da função de onda está relacionada à energia total
e ao potencial, no entanto, grandes valores de n na Eq.(21) tornam a série divergente e invi-
abilizam a normalização da função de onda (veja a solução do exercício 4). Logo, devemos
ter cn+2 = 0 para grandes valores de n. Mostre que essa condição sobre a Eq.(21) implica
que λ − 1 = 2n.

EXERCÍCIO 4: (0,5pt) Sistemas físicos onde a partícula está sujeita à uma energia potencial
implicam que a energia total E deve exceder o valor mínimo de V (x) (suposto Vmin = V0 ),
caso contrário a função de onda não será normalizável. A partir da equação de Schrödinger
independente do tempo,
∂2 2m
2
ψ(x) = 2 [V0 − E] ψ(x), (26)
∂x ℏ
2m
(a)(0,25pt) mostre que a solução para a função de onda quando α2 = ℏ2
[V0 − E] > 0 é dada
por:
ψ(x) = Ae−αx + Beαx , (27)

onde A, B e α ∈ R. (b)(0,25pt) Mostre que essa solução não é normalizável, isto é, mostre
que Z +∞
ψ ∗ (x)ψ(x)dx → ∞. (28)
−∞

Esse resultado nos mostra que as soluções fisicamente aceitáveis implicam que a energia
total E deve ser superior ao valor mínimo da energia potencial V0 , dessa forma o coeficiente
do lado direito da equação de Schrödinger independente do tempo deve ser negativo (α2 <
0) e o argumento das exponenciais devem ser números complexos.
Portanto, as soluções estacionárias por modo n possuem a forma:
Z +∞
ψ ∗ (x)ψ(x)dx → ∞. (29)
−∞

EXERCÍCIO 5:(0,5pt) Dada a solução para as órbitas estacionárias para um nível arbitrário
n,
mω 2 iEn
ψn (x, t) = An e− 2ℏ x Hn (x)e− ℏ
t
, (30)

determine a constante de normalização An para os seguinte casos: (a) (0,25pt) fundamental


n = 0 e (b) (0,25pt) primeiro estado excitado n = 1. [Obs: Considere que cada nível pode
ser normalizado de forma independente dos demais.]

6
EXERCÍCIO 6: (0,25pt) A partir do valor da energia para as órbitas estacionárias, Eq.(15),
mostre que a diferença entre dois níveis consecutivos é dado por ∆E = ℏω. (Dica: Utilize
os níveis n e n + 1, de modo que ∆E = En+1 − En ). Na próxima seção veremos que esse
resultado possibilitará reproduzir teoricamente o resultado experimental para a emissão
de radiação por um corpo negro.

APLICAÇÃO E GENERALIZAÇÃO

Desde meados do século XIX ao início do século XX havia uma grande movimentação
em torno do estudo da absorção e emissão de radiações por corpos aquecidos. Uma vez
que a quantidade de energia de radiação emitida em um determinado comprimento de
onda dependia do material do corpo e das condições de sua superfície, bem como da sua
temperatura. Havia sido observado que vários materiais emitem quantidades diferentes de
energia radiante, mesmo quando estão na mesma temperatura. Nesse sentido, idealizou-
se um corpo que emite a quantidade máxima de energia radiante para a sua temperatura
absoluta, isto é, o corpo negro.
A partir da Mecânica Estatística Clássica é possível mostrar que um corpo negro ideal,
em equilíbrio térmico, dever ter uma energia média de kT por modo de oscilação, conhe-
cido como teorema da equipartição da energia (Exercício 1). Nesse sentido, um emissor de
energia térmica atuará como um oscilador natural. E, desde que cada modo tenha a mesma
energia, a maioria dela estará nos menores comprimentos de onda (e maiores frequências),
conforme mostra a Fig.(5).
O tratamento matemático utilizado na modelagem teórica considera que as paredes do
corpo negro são compostas por pequenos osciladores harmônicos, oscilando em torno da
posição de equilíbrio. Nesse caso, a densidade de energia por unidade de volume pode ser
dada pela seguinte equação: Z ∞
U= u(λ)dλ, (31)
0

onde
u(λ) = Ē n(λ), (32)

é a densidade de energia por comprimento de onda entre λ e λ + dλ e

n(λ) = 8π Ēλ−4 , (33)

7
Figura 5: Função distribuição espectral R(λ) para várias temperaturas. A curva escura repre-
senta a previsão clássica de Rayleigh-Jeans. Fonte: https://thermal-engineering.org/ultraviolet-
catastrophe-chart.png.

é o número de modos de oscilação por unidade de volume, conhecida como lei de Rayleigh-
Jeans quando Ē = kT . Finalmente,
Z ∞
Ē = A Ee−E/kT dE, (34)
0

é a energia média dos osciladores obtida a partir da média ponderada.


No entanto, no cálculo da densidade de energia total emitida via teoria de Rayleigh-
Jeans observa-se que para grandes comprimentos de onda a teoria concorda com a obser-
vação experimental, mas para pequenos comprimentos de ondas a intensidade da radiação
emitida tende para o infinito (ver exercício 1), o que não concorda com os experimentos.
Esse comportamento da teoria para pequenos comprimentos de onda lhe rendeu o nome
de catástrofe do ultravioleta ou catástrofe de Rayleigh-Jeans.
Na busca por uma solução teórica correta, o físico alemão Max Planck tratou a curva
experimental obtendo a seguinte equação experimental

aλ−5
u(λ) = , (35)
eb/λ − 1

onde as constantes a e b são constantes reais positivas obtidas a partir da curva experi-
mental. Além disso, Planck observou que só era possível obter a Eq.(35) se a energia dos
osciladores fosse múltiplos inteiros de hν (ou ℏω), isto é,

En = nhν = nℏω, (36)


8
onde n = 0, 1, 2, ... (ver exercício 2).
A partir dessas considerações responda as questões a seguir:
EXERCÍCIO 1 (0,5pt) Considerando que na física clássica a energia média é dada pela soma
da função de distribuição de Boltzmann das energias Eq.(34), onde a constante de norma-
lização é dada por:
Z ∞ −1
−E/kT
A= e . (37)
0

(a) (0,25pt) Mostre que a energia média Ē deve ser igual a kT .


(b) (0,25pt) Na teoria de Rayleigh-Jeans o número de modos de oscilação é função da ener-
gia média e do comprimento de onda, Eq.(33), mostre que na teoria de Rayleigh-Jeans a
densidade de energia por unidade de volume dada pela equação (31) tende ao infinito.

EXERCÍCIO 2 (0,75pt) A partir da hipótese da discretização da energia de Planck, Eq.(36),


vemos que as equações devem tomar o limite do discreto, isto é,

X
Ē = A En e−En /kT , (38)
n=0

onde " #−1



X
A= e−En /kT . (39)
n=0

(a) (0,25pt) Mostre que a média da energia passa a ser dada por:


Ē = , (40)
ehν/kT − 1

(b)(0,25pt) A partir dos devidos cálculos utilizando as Eq.(32), (33) e (40), mostre que

8πhcλ−5
u(λ) = . (41)
ehc/λkT − 1

(c) (0,25pt) A partir da soma da densidade de energia (41) sobre todo o espectro (31), mostre
que a lei de Stefan-Boltzmann é uma consequência natural da lei de Planck, isto é, mostre
que
U = σT 4 , (42)
R∞ x3 π4
onde a cosntante de Stefan é dada por σ = 8π 5 k 4 /15h3 c3 . [Dica: Utilize 0 ex −1
= 15
.]

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