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Eos tivo oferece aos terapentas cognitivo-comportamentais diferentes técnicas e procedimentos a fim de tor- nar mais acessivel e mais efetiva a tera- pia, seja para as criancas, seja para os terapeutas. Seu objetivo & servir como complementacao do livro que o antece- de, Clinical Practice of Cognitive Therapy With Children and Adolescents: The Nuts and Bolts (Friedberz ¢ McClure. 2002), 0 primeiro livro oferecia informacoes basi cas sobre 0 tratamento. Agora, o tema é aprofundado visando a apresentar mais técnicas e abordagens, abrangendo pa- cientes dificeis e problemas e casos mais complexos. Ha exemplos ilustrativos de casos para ajudar os terapeutas a escolher a técnica que melhor se aplique ao pacien- te. Também se pensou em uma obra que reunisse os manuais de tratamento empi- ricamente embasados e aquilo que encon- tramos na pritica clinica. No Capitulo 1, apresentamos alguns dos achados da literatura a fim de orien- tar os terapeutas sobre meios de pér em pratica aspectos considerados efetivos em tratamentos empiricamente emba- sados. Além disso, & considerada uma abordagem paradigmatica ao tratamento, avaliando-se como ela pode oferecer be- neficios & vivéncia clinica ‘A pesquisa como fundamento da terapia cognitivo-comportamental (TCC) O comeco com criangas € metodologicamente rigo- rosa e tem apresentado eficécia significati- va. Esses achados promissores demandam préticas também empiricamente embasa- das ou, pelo menos, empiricamente con- ceituadas. Ainda assim, muitos terapeutas permanecem céticos quanto ao uso de protocolos de pesquisa em priticas clini- ‘cas (Southam-Gerow, 2004; Wisz, 2004) De fato. os esforcos no sentido de divulzar amplamente tratamentos efetivos tém si- do malsucedidos (Addis, 2002; Carroll e Nuro, 2002; Chambless e Ollendick, 2001; Edwards, Dattilio e Bromley, 2004 Gotham, 2006; Schulte, Bochum e Eifert, 2002; Seligman, 1995). Hé varias razoes para isso. s terapeutas enfrentam muitos de- safios que os protocolos de pesquisa pro- curam evitar. Por exemplo, os terapeutas geralmente tratam pacientes bastante perturbados, com comorbidades, os quais tém grandes chances de abandonar o tra- tamento (Weisz, 2004). Por outto lado, os participantes recrutados para uma pesqui- sa geralmente ou s4o voluntarios, ou so pagos por sua participacdo. Em clinicas tipicas, os pacientes que buscam trata- mento para seus filhos raras vezes reco- nhecem seus problemas, discordando dos objetivos do tratamento, e buscam ajuda por conta prépria (Creed e Kendall, 2005; Shirk e Karver, 2003). As populacdes clini 10 Friedberg, McClure & Garcia cas geralmente sofrem de psicopatologias familiares mais abrangentes, e, tristemen- te, muitas dessas criancas podem sofrer alguma forma de abuso (Weisz, 2004). Somado a isso, os terapeutas geralmen te esto sobrecarregados por demandas de produtividade, exigéncias burocrati- cas, formuldrios, entre outros (Southam- Gerow, 2004; Weisz, 2004). Southam- Gerow (2004) astutamente apontou que quem publicava manuais via incorreta- mente os clinicos como consumidores passivos ou “usudrios finais”. Ele afirma que os terapeutas deveriam ser vistos ‘como coparticipantes criativos capazes de tomar decisées inteligentes. Como Jones e Lyddon (2000, p. 340) escreveram: “de- senvolver manuais de terapia no é um processo escrito na pedra, mas um pro- ccesso em continua evolucéo”. Em outras palavras, a pesquisa pode apontar a dire- gio certa aos clinicos, mas os clinicos em sua pratica cotidiana precisam encontrar formas especificas de atingir um objetivo. A abordagem modular & TCC ofere- ida neste livro é uma alternativa atrativa ‘aos manuais, equilibrando a precisdo do paradigma com a flexibilidade e criativi- dade da prética clinica. Nés nao podemos afirmar que uma abordagem modular é melhor do que uma terapia baseada em um manual. Os dados ainda nao esto nessa questo; entretanto, a forga de uma abordagem modular reside em seu poten- cial de aplicacao pratica. UMA ABORDAGEM MODULAR A TCC. ‘Uma abordagem modular a interven- cdo é baseada em habilidades e é aplicavel. a criangas e adolescentes com diferentes diagnésticos (Van Brunt, 2000). Chorpita, Daleiden e Weisz. (2005b, p. 142) definem modularidade como “fragmentar ativida- des complexas em partes mais simples que funcionam independentemente.” A abor- dagem modular referida neste livro con- siste em selecionar técnicas individuais e procedimentos de manuais de tratamento empiricamente embasados e agrupé-las segundo tarefas de terapias em médulos (Chorpita, Daleiden e Weisz, 2005a; Curry e Wells, 2005; Rogers, Reinecke e Curry, 2005). Técnicas € procedimentos neste volume so organizados em seis médulos, nas seguintes reas: psicoeducacio, avalia- ao e intervenes comportamentais, auto- ‘monitoramento, reestruturacéo cognitiva, andlise racional e métodos de exposicio/ experimentagao. Todas as técnicas de um médulo compartitham um propésito tera- péutico comum (por exemplo, psicoeduca- do), mas elas podem diferir na adequagao desenvolvimental (infantil ou adolescen- te), populagao-alvo e modalidade (indivi- dual, coletiva ou terapia de familia). Construir um conceito individuali- zado de caso é um passo fundamental na implementacdo da abordagem modular apresentada neste livro. Kendall, Chu, Gifford, Hayes e Nauta (1998) afirmaram que a TCC com crianeas ¢ direcionada por uma légica tedrica, endo por técnicas. Os leitores de diferentes orientagdes tedricas provavelmente reconhecer’ioalgumas téenicas em geral associadas a outros pa radigmas terapéuticos. Os elos entre as di- vversas téenicas neste livro so conceituais. Vale lembrar que 0 que determina uma técnica cognitiva € seu contexto teérico © mecanismo conceitual de mudanca pro- posto (J. S. Beck, 1995). A Figura 1.1 apresenta os médulos € suas inter-relacées ao longo do trata- mento. A avaliacao e a psicoeducagao so os primeiros. Mesmo que se inicie com a avaliagdo e com a psicoeducacio, as se- tas bidirecionais permitem o retorno a esas técnicas ao longo do processo de tratamento conforme segue-se para pro- cedimentos comportamentais, de reestru- turaco cognitiva, andlises racionais e de obtencao de performances. “Técnicas de terapia copntiva para criangas@ adolescentes 11 As técnicas do médulo de testagem, automonitoramento e avaliacéo direcio- nam pacientes ¢ terapeutas a um desen- volvimento apropriado da terapia, bem como fornecem dados sobre o andamento do tratamento. Por exemplo, se o paciente est com alta anedonia, atividades praze- rosas devem ser iniciadas. Se ha caréncia dehabilidades sociais, ento o encaminha- ‘mento para essa direcdo é uma estratégia égica. Em alguns casos, 0 automonitora- ‘mento € outros métodos de testagem in- dicam a necessidade de uma intervenciio de reestruturacao cognitiva. Uma téenica nesse sentido pode ser aplicada e avalia- da, Se os dados indicarem que a interven- Go foi bem-sucedida, 0 terapeuta pode decidir ou por um procedimento avanca- do de reestruturacao cognitiva ou por um procedimento nos méditlos subsequentes de analise racional ou de exposicio. Se a avaliacao revelar insucesso, entéo ou outra técnica de reestruturagao cognitiva ou uma intervencéo do médulo compor- tamental precedente pode ser o caminho. © Capitulo 2 apresenta varios métodos de testagem e automonitoramento. A psicoeducacao possibilita as crian- gas, aos adolescentes, as familias e aos te- rapeutas um entendimento compartilhado do processo da terapia. Frank (1961) afir- mou que todas as psicoterapias incluem uma légica que explica a doenca e a recu- peragio. Mais especificamente: A légica terapéutica permite ao paciente dar sentido a seus sintomas. Como ele ‘comumente os vé como inexpliciveis, 0 so de eco ttle de Ne de co de Méal de intervencdes ‘Feestruturaao analise eee) an a Perron! en —_ _— eae cee eavaliagio: FIGURA 1.1 ‘Abordagem modular a TCC. 12 Friedberg, MeCiure & Garcia que aumenta sua percepcio de ameaca, ser capaz de nomeé-los ¢ explicé-los em. termos de um esquema conceitual maior 6 importante e confortador. O primeiro paso para adquirir controle de qualquer fendmeno é dar a ele um nome. (1961, p.328) Capitulo 3 oferece muitas téenicas especificas de psicoeducacio. Ha quarto médulos de intervengio: intervengdes_comportamentais, reestru- turagio cognitiva, andlise racional e ob- tencdo de performance/exposi¢ao. Eles so sequenciados conforme a aquisicéo de habilidades acontece: de uma tare- fa simples a uma complexa. Em geral, & mais facil para as criangas adquirir € aplicar as intervencées comportamentais (Capitulo 4), enquanto a reestruturagao cognitiva (Capitulo 5) ou a andlise racio- nal (Capitulo 6) so mais sofisticadas. A exposigao e outros métodos de obtengio de performance (Capitulo 7) so posterio- res na sequéncia, o que permite a constru- ao de habilidades de coping que podem facilitar 0 progresso em direcdo a tarefas de experiéncia/exposicao. ACONCEITUACAO Do CASO E CRUCIAL Confiar na conceituagao do caso divide terapeutas e tedricos (Freeman, Pretzer, Fleming e Simon, 1990). Ela flexi- biliza as estratégias de tratamento, permi- te ao terapeuta reconhecer quais téenicas funcionam e quais procedimentos sao iné- ccuos, facilitando a solugao produtiva de problemas quando o tratamento encontra obstéculos. Ainda que uma discussao am- pla da conceituagéo do caso ultrapasse 0 escopo deste capitulo, haverd um breve comentario sobre conceituar pacientes. Para os leitores que buscam mais base so- bre os fundamentos da conceituacio de caso, so recomendados os trabalhos de J. $. Beck (1995), Friedberg e McClure (2002), Kuyken, Padesky e Dudley (2009) € Persons (2008). Friedberg e McClure (2002) delinea- ram os elementos criticos da conceituacéo de caso, o que inclui o histérico de desen- volvimento, 0 contexto cultural, os ante- cedentes comportamentais, as estruturas cognitivas e 0s problemas levantados, ou seja, as questées que levam os jovens a0 tratamento. Mesmo sendo cruciais e, na maior parte dos casos, urgentes, eles representam apenas uma parte do todo. No modelo referido, os problemas apre- sentados sio melhor compreendidos no contexto do histérico aprendido, dos fato- res culturais, das influéncias sistémicas e varidveis de desenvolvimento, o que tem um reflexo bidirecional_nos_ problemas apresentados: tais aspectos so, a0 mes- ‘mo tempo, causa e consequéncia. Visando a conceituar um caso e implementar com sucesso um tratamento, seré necessério obter informagGes relevantes do paciente conforme segue. ‘Marcos desenvolvimentais a respeito da autorregulagao (por exemplo, comer, dormir, ir ao banheiro), responsividade a mudangas na rotina e adequagao a esco- la devem ser considerados. Além disso, 0 {funcionamento escolar de um jovem deve ser pesquisado (por exemplo, desempe- ho escolar; frequéncia; histérico discipli- nar — detencdes, suspens6es e expulsdes; vivéncias na cantina, no gindsio e no pa tio). O funcionamento social também é muito importante (Quem sio os amigos do paciente? Como os amigos so con- quistados? Quanto tempo duram as ami- zades? Qual é 0 histérico de namoros/ relacdes sexuais do paciente? O paciente vai a festas de aniversrio? Dorme fora de casa? Vai a festas?). Vocé deve colher dados especificos sobre funcionamento fa- miliar (histérico psiquidtrico de pais e ir- mos; técnicas disciplinares empregadas; presenca de violéncia doméstica; quem Tecnicas de terapia cognitva para criancas e adolescentes 13. chefia a familia e quem é coadjuvante). & importante também averiguar 0 uso de substdncias (drogas ilicitas, lcool, laxati- vos, medicamentos comuns), as condigdes médicas e 0 hist6rico legal. Dados etnoculturais também de- vem ser coletados. Niveis de aculturacdo, identidade e crengas etnoculturais es- pecificas devem ser consideradas. Deve- -se questionar sobre crencas culturais a respeito do problema apresentado e do tratamento. Quaisquer experiéncias de preconceito, discriminagéo, opressio e marginalizagao devem ser incluidas na conceituacio. Apés coletar e sintetizar todos esses dados, inicia-se o processo de inferéncia. Concordamos com Persons (1995) que formulagées simples sao preferiveis a for- mulagées complexas. Um procedimento simples sugerido por Persons é usar os da- dos para formular uma visio do self (ou seja, “Eu sou...”), do mundo (“O mun- do é...", “O ambiente é...”) € das outras pessoas (“As pessoas sio...”). Essas pecas combinam-se em uma figura que diz “Eu sou—____em um mundo onde as outras pessoas io Os componentes “mundo” e “outras pessoas” afetam diretamente o modo como © paciente entende a terapia e 0 terapeuta. or exemplo, um paciente que vé os outros como criticos, distantes, excludentes e/ou controladores vai temer avaliagSes nega- tivas e coercées do terapeuta. Por outro lado, um paciente que vé os outros como inferiores, subordinados e/ou indignos ir desvalorizar o terapeuta, ver o tratamento ‘como uma perda de tempo e agir de modo a ludibriar o terapeuta. A CONCEITUACAO DO CASO PARA ORIENTAR A TCC MODULAR A fim de avaliar como a concei- tuacao do caso impacta a TCC modu- lar, recorreremos a alguns exemplos. Considere-se uma menina de 10 anos que vé a si mesma como incapaz.em um. mundo excludente em que os outros so coercivos. Essas crengas sobre 0 mundo € sobre as outras pessoas moldarao sua percepcao a respeito do terapeuta e da terapia. Essa menina é propensa a inter- pretar as intervengdes como coercitivas € os questionamentos socrdticos como crf- ticas implicitas. Seu desafio inicial ¢ es- tabelecer as intervencdes modulares em um contexto que estimule a autonomia, © controle e a colaboragio, € que comu- nique compreensio. Portanto, a psicoe- ducagao é fundamental. As intervencdes modulares devem reduzir a sensacdo de desesperanca do paciente. Ao longo do tratamento, é possivel avangar na abor- dagem de suas concepc6es em relacio 0s outros € a0 mundo. Obtendo sucesso no tratamento, suas concepcdes dos ou- tros como sendo coercitivos e do mundo como sendo excludente serio descons- truidas Em outro exemplo, um menino de 17 anos tinha a seguinte crenga: “A me- nos que eu tenha sempre perieito controle de mim mesmo, dos outros e do mundo, eu serei um incompetente, pois 0 mundo & perigoso, e os outros sao imprevisiveis e dominadores’. Para esse paciente, 0 controle absolut equivale & seguranca © & competéncia. Uma sessio consisten- te e a colaboracao atenuarao suas amar- gas definigoes dos outros e do mundo. Entretanto, para provar sua competéncia, ele precisa preservar controle absoluto de tudo. Intervencées modulares volta- das a verificar vantagens e desvantagens do perfeito controle, a avaliar conceitos alternativos de “competéncia”, a testar a evidéncia de que a competéncia est re- lacionada ao controle e aos experimentos comportamentais em que se “perde” al gum controle e, ainda assim, mantém-se a competéncia sao recomendadas. 14 __ Friedberg, McClure & Garcia Acredita-se que a coeréncia tedrica & essencial para uma pritica clinica de exceléncia. A escolha de procedimentos e técnicas precisa ser orientada pela teoria cognitivo-comportamental. A conceitua- ao cognitivo-comportamental de caso previne a deriva tedrica. Além disso, a confianca na conceituacio permite que se avaliem os mecanismos de mudanga. Assim, € possivel avaliar por que o trata- mento transcorre bem ou mal. Dessa for- ma, obstdculos podem ser superados. INTEGRANDO PROCEDIMENTOS. COM PROCESSOS PSICOTERAPEUTICOS Assim como qualquer clinico pron: tamente reconhece, a psicoterapia é fun- damentalmente um —empreendimento interpessoal (Southam-Gerow, 2004). 0 relacionamentoéessencial, mas nao é sufi- ciente para a mudanca terapéutica. Sendo assim, recomenda-se que cada procedi- mento seja conscientemente integrado no processo psicoterapéutico (Shirk e Karver, 2006). O relacionamento e as interven: Ges do tratamento nao sdo independen- tes. Os procedimentos € a construgéo do relacionamento sao tarefas contempord- neas € trabalham em conjunto para esta- belecer aliancas de trabalho poderosas. 0u seja, as intervengdes constroem bons relacionamentos, ¢ fortes aliancas estabe lecem intervengées efetivas. ‘A colaboragéo entre o paciente ¢ 0 terapeuta aumenta a alianga terapéutica. Creed e Kendall (2005) concluiram que apressar 0 paciente e comportar-se com excess de formalidade pronunciam {ndi- ‘ces mais baixos de alianca. A curiosidade do terapeuta muitas vezes estimula a cola- boragio: terapeutas curiosos muitas vezes induzem a curiosidade em seus jovens pa- cientes, e a experimentagao comportamen- tal é dependente da curiosidade. Kingery € colaboradores (2006) encorajaram os terapeutas a revelar aspectos de suas vidas pessoais (amigos, interesses, hobbies) na terapia. Gosch, Flannery-Schroeder, Mauro ‘e Compton (2006) recomendam que 0s te- rapeutas facam revelagées pessoais apro- priadas a seus jovens pacientes, visto que isso ndo apenas aumenta o rapport, como também define o terapeuta como um mo- delo. Friedberg ¢ McClure (2002) proje- taram um modelo clinicamente titil para integrar a estrutura, 0 processo € as va- ridveis de contetido da psicoterapia, con- forme o Quadro 1.1. A estrutura indica 0 procedimento e as técnicas caracteristicos da TCC. Esses elementos incluem, mas nao limitam, a estrutura da sesso, a psicoedu- cacao, a testagem, 0 automonitoramento, as tarefas comportamentais, 0 treinamen- to de habilidades sociais, a reestruturagéo cognitiva, a andlise racional e a exposicao, Por exemplo, a terapia cognitiva de Beck usa uma estrutura de sessao consistente (A. T. Beck, Rush, Shaw e Emery, 1979; J. S. Beck, 1995) que envolve a avaliacto de humor, a retomada da sesso anterior, a revisdo das tarefas domésticas, 0 esta: belecimento de agenda, o processamento dos contetidos da sesso, a designagao de tarefas domésticas ¢ feedback. £ importan- te lembrar que a estrutura da sessao deve ser mantida ao longo da terapia ao em- pregar 0s procedimentos referidos. contetido é 0 material terapéutico direto eliciado pela estrutura. Os pen- samentos automiticos, as emogées, as respostas de testagens, os pensamentos de coping e resultados de experimentos ‘comportamentais do paciente: tudo isso representa 0 contetido. O processo acrescenta uma terceira dimensao, referente a forma como acrian- a responde a estrutura e ao conterido da sesso. Ninguém reage da mesma manei ra ao mesmo procedimento. As reacdes idiossincraéticas das criangas aos procedi “Técnicas de torapia cognitiva para criangas @adolescentes 15, mentos cognitivo-comportamentais so aspectos relevantes da compreensio do proceso de tratamento. Pos e Greenberg (2007) perceberam que os pacientes de- monstram estados cognitivos, compor- tamentais e emocionais probleméticos durante a sesso. Observar 0 processo te- rapéutico facilita 0 reconhecimento des- ses indicadores, que sao oportunidades para intervencdo. Yontef (2007, p. 23) recomendou: “O terapeuta tem que reco- nhecer aberturas e aprender a sequéncia do antes e do depois.” Os marcadores de processo das criancas podem ineluir Tespostas como cansaco, ruborizacéo, mudanca de postura, movimento com os pés, mudanga de assunto, fuga para embaixo da mesa, cinismo, complacén- cia, irritacdo, pessimismo, ansiedade por agradar, respostas lacdnicas e superficia- lidade. ‘Tramar procedimentos e 0 proceso ‘em um tecido psicoterapéutico coerente é © segredo. Eis alguns exemplos clinicos. Uma menina agressiva de 13 anos, Tanya, acreditava que estava sendo vigiada por ‘muitas pessoas. Ela sempre interpretava equivocadamente agées _benignas como sendo ameacas deliberadas. Uma vez. que a possibilidade de ser atacada parecia imi- nente, estava predisposta a contra-ataques repentinos. Durante a sesso, Tanya res- pondeu a um comentario inécuo (“Deve ser dificil pensar que vocé esta totalmente sozinha.”) com uma resposta intensamen- te raivosa (“Vooé est realmente me irritan- do. Vooé 6 vergonhoso. Va se ”). Com esse claro mareador de processo, © terapeuta interviu perguntando: “O que se passou por sua cabeca quando vocé disse aquilo?”. Em um momento de per- cepgio, Tanya comentou que ela vit 0 co- ore Sree a een) ee eos PROCESSO HIPOTETIZADO Estabelecimento da Submissao, passividade, perfeicio, agenda ‘medo de avaliacées negatvas, ‘medo de mudanca, Feedback Provocacio, competitvidade, Vocé realmente se formou” ‘busca por independéncia. Designacio/revisio “Concluséo perfeita” sem fatas ou Medo de avallagées negativas, datarefa doméstica erros. ‘busca por aprovacio. ‘Automonitoramentol Rasgou os formulirios e disse: __O paciente vé 0 terapeuta como testagem “Voeé esta mais interessado nesses. previsvel, incompreensivo e formulirios do que emmim”. distant. Reestruturacao Banalizacdes ou pensamentos de Evitacio, intolerancia aafetos cognitiva coping irrealistas: "Nada de ruim _negativos. ira acontecer comigo”. Experimentacio/ __“Iss0 € tolice. Por que eu ira _—_Evitacio, baixa autoeficica. exposicio ‘querer fcar mais preocupado ‘comportamental 16 Friedberg, McClure & Garcia mentério como uma critica pressupondo que ela era fraca demais para lidar com as, dificuldades em sua vida. Em outro exemplo, Chloe, uma pa- ciente anoréxica de 16 anos habitual- mente inibia seus pensamentos sentimentos. Acreditava que 0 poder se- tia obtido por meio de sigilo. Portanto, compartilhar pensamentos e sentimentos com um terapeuta era uma tarefa ardua, acentuada por sua crenca de que revela- Ges eram derrotas. Chloe trouxe didrios de pensamentos muito superficiais para as sessdes, 05 quais careciam de signifi- cado emocional e eram excessivamente intelectuais e impessoais. O terapeuta ento usou os didrios de pensamentos para aprender as crencas disfuncionais acerca de revelagées ¢ expresses de sen- timentos. Chloe identificou crengas como “as pessoas vao me rejeitar e me atacar — se me esconder, serei um alvo menor”; “ter segredos me da controle, e quanto mais controle eu tiver, mais aceitdvel eu sou”; “ninguém me dard o que eu quero — tenho de enganar a todos para conseguir as coisas”. De posse das crencas registra- das, 0 terapeuta avancou em direcdo & testagem das evidéncias (“O que a con- vence de que eu vou rejeitar ou atacar vocé?”; “O que faz vocé duvidar de que eu vou rejeitar ou atacar vocé?”) e proce. dimentos de reatribuicao (“Quais sao as outras formas de ser competente e acei: tdvel além de esconder seus pensamen- tos e sentimentos?”). Ao tramar juntos os processos de Chloe (nos quais ela inibia pensamentos e sentimentos como uma protecao contra potenciais ataques, acre- ditando que a dissimulagao era a melhor forma de conseguir o que ela queria) com os procedimentos terapéuticos (como 0 teste de evidéncias e reatribuicao), 0 te rapeuta foi capaz. de testar os pressupos- tos de Chloe. APLICAR AS TECNICAS NO. CONTEXTO DA ESTIMULACAO EMOCIONAL DOS PACIENTES E vital que os terapeutas apliquem técnicas e procedimentos no contexto da excitagdo emocional negativa dos pacien- tes, sendo ela 0 “sangue” da TCC, visto que os procedimentos desmoronam quando so aplicados em um ambiente emocional- mente estéril. Tal recomendacao tem sido feita frequentemente (Burum e Goldfried, 2007; Castonguay, Pincus, Agras ¢ Hines, 1998; Frank, 1961; Friedberg e McClure, 2002; Goldfried, 2003; Greenberg, 2006; Greenberg e Paivio, 1997, 2002; Robins e Hayes, 1993; Samoilov e Goldiried, 2000). Gosch e colaboradores (2006, p. 259) afirmaram que “um ingrediente es- sencial para uma TCC bem-sucedida é fazer o contetido da terapia focada para criangas ter um processo experiencial”. Uma boa terapia 6 como teatro (Kraemer, 2006): revela e lida com o drama da vida dos pacientes. Em suas formas mais ins- piradoras, tanto © teatro como a terapia formam um laco experiencial entre a pla- teia (terapeuta) e 0 ator (paciente) mol- dado em um forno emocional alimentado por expressdes genuinas, s6lida reflexdo e verdadeira acio criativa. Os terapeutas precisam usar os pro- cedimentos quando os. pacientes esto experimentando emogées problematicas ~ de outro modo, a terapia torna-se um exercicio intelectual abstrato. Quando 0 terapeuta elicia e processa sensivelmen- te as emogGes profundas dos pacientes, 0 tratamento deslancha. O desafio e a graca da TCG com jovens ¢ fazer uso de momen- tos intensamente carregados de emogoes no presente (Friedberg € Gorman, 2007). Suportar uma mudanea é facilitado por um tratamento imerso em excitacdo emocional (Robins e Hayes, 1993). De “Técnicas de terapia cognitiva para criangas eadolescentes 17 fato, defende-se que, ao ser adequada- mente executada, a TCC é uma forma de terapia verdadeiramente experiencial. Kraemer (2006, p. 245) enfatizou que “aprender com a experiéncia significa set afetado pelo aqui e agora”, Portanto, a TCC com criangas nao é um exercicio intelectual. Hayes e Strauss (1998) empregam 0 conceito de desestabilizacdo no processa- mento da excitacao emocional dos pacien- tes em sessiio. A desestabilizacdo refere-se a criagao de questionamentos contundentes acerca de crencas, comportamentos e sen- timentos. Samoilov e Goldiried (2000) su- gerem que a desestabilizacdo é fomentada a0 estreitar a atengio dos pacientes & sua experiéncia atual e ao ampliar sua excita- Go emocional. Essa intensa experiéncia Jeva a uma maior mudanca em estruturas de significado e em sintomas depressivos (Hayes e Strauss, 1998). Cotterell (2005) associou a TCC a esculpir aco. Para conseguir curvar 0 aco, calor e fogo intensos so necessérios. As ‘emogoes representam o “calor” na TCC. As cognigbes associadas a um aumen- to na excitaciio emocional sao referidas como “cognigdes quentes” (Samoilov e Goldfried, 2000). Recentes avangos na neurociéncia afetiva também corroboram tal visio de excitacdo emocional. As mu- dangas cerebrais na TCC para o transtor- no obsessivo-compulsivo (TOC) resultam de “ativacdo dos circuitos relevantes dos niicleos da base, giro cingulado e o eér- tex orbitofrontal durante a exposicao e a habituacdo a estimulos provocadores de ansiedade, permitindo assim a formagao de novos (e mais adaptativos) padroes neurais corticais e subcorticais de proces- samentos de informacao ligados a estimu- Jos” (llardi e Feldman, 2001, p. 1077). O uso apropriado de técnicas e méto- dos descritos neste livro requera excitacéo emocional. Quanto mais os procedimen- tos forem aplicados em momentos de ex- citacdo afetiva, mais terdo repercussio e mais se manterao. APLICAR AS TECNICAS. EM GRUPO E EM FAMILIA A maior parte dos procedimentos neste livro pode ser aplicada em grupo e em familia, bem como em terapia indi- vidual. Formulacées individuais de caso deve ditar se e quando um formato de grupo e/ou familiar seré usado. Assim ‘como acontece com a terapia individual, integrar os procedimentos com o processo terapéutico é essencial, além de aplicé- -los no contexto da excitagéo emocional. Entretanto, a terapia cognitiva torna-se mais complicada no momento em que hé mais pessoas presentes. Nesses casos, é importante que todos sejam participantes ativos. Isso requer que cada um seja capaz de dividir sua atencao entre as varias pes- soas na sala. Quando ha muitas pessoas presen- tes & sesstio, pensamentos, sentimentos € comportamentos de cada um tém um im- pacto nos dos demais. A TCC de familia reconhece a interagao reciproca de cogni- Ges, emocdes, agdes e relacionamentos dos membros da familia (Dattilio, 1997, 2001). Friedberg (2006, p. 160) afirmou que o “ambiente familiar é onde as cogni- Ges das criangas e dos pais aparecem”. Os processos familiares iniciam, exacerbam- “see mantém padrdes disfuncionais de pensamentos, sentimentos © agoes. Mais especificamente, as familias podem conspirar para evitar afetos negativos (Barrett, Dadds ¢ Rapee, 1996; Ginsburg, Siqueland, Masia-Warnere Hedtke, 2004). Ginsburg e colaboradores (2004) comen- taram que os pais podem ver a ansiedade 18 Friedberg, McClure & Garcia como catastréfica e considerar seu valor e sua competéncia como pais como sendo a capacidade de proteger o filho, inadver- tidamente comprometendo o frégil senso de autoeficacia do jovem. Como toda a familia ou os mem- bros do grupo tém pensamentos € senti: mentos sobre 0 que esté acontecendo na sala, comparar registros de pensamentos uma ideia excelente. Algumas pessoas podem ter registros similares, enquanto outras podem ter registros unicamente pessoais. Lidar com pontos de convergén- cia e divergéncia faz a TCC de grupo ou de familia ganhar vida. O contexto de grupo ou familia é uma circunstdncia propicia para testar, modificar ou solucionar problemas relati- vos a crencas disfuncionais. Por exemplo, criangas com ansiedades interpessoais sobre avaliagdes negativas, humilhagées ow constrangimentos demonstrarao cog- nigdes, emocdes e comportamentos ca- racteristicos em contextos de grupo. Isso permite o processamento e a modificaco terapéutica imediatos dos estados proble maticos. De modo semelhante, as familias desafiadas por um paciente identificado demonstrardo ao terapeuta suas pertur- bagGes ¢ revelardo padrdes disfuncionais. Quando os problemas se tornam mais evidentes, é possivel prontamente inter- vir com procedimentos cognitivos ¢ com- portamentais para ajudar os pacientes a mudarem suas ages, seus pensamentos € seus sentimentos. O contexto de terapia de familia permite aos membros coleti vamente testemunhar 0 processo € parti cipar da mudanga de cada um. Por fim, aplicar a TCC com grupos e familias pode avangar 0 proceso de generalizacao ao ensinar aos pacientes como usar suas ha- bilidades em circunstncias relevantes. UMA PALAVRA SOBRE TRANSCRICOES Visando & confidencialidade de nossos pacientes, todos os exemplos sao ficcionais ou relatos clinicos alterados. Eles represen- tam uma combinagao de muitos casos. CONCLUSAO. © formato modular deste livro ofe- rece parte da orientagao de uma aborda- ‘gem manualizada, com flexibilidade para selecionar e modificar intervencées a fim de adequar as conceituagées individuais de pacientes. As técnicas e os procedimen- tos de cada médulo podem ser aplicados a diversos sintomas em varios momentos da terapia. Tal abordagem permite aos te- rapeutas escolher intervencdes baseadas na idade dos pacientes, no nivel de desen- volvimento, no problema apresentado, na gravidade dos sintomas, nos interesses, nas modalidades de intervencao e nas habili- dades. Foram delineadas ferramentas para 0s terapeutas fazerem escolhas fundamen- tadas sobre como proceder no tratamento. A criatividade nos desenhos e no estilo de apresentacao dessas intervengdes mantém 8 pacientes interessados € engajados no tratamento, bem como da aos terapeutas mais opcdes, além da individualizagéo do protocolo de tratamento. Ao usar tanto ilustragdes que prendem a atencio quando metdforas interessantes, as ideias tornam- -se vivas para terapeutas e pacientes. “Técnicas de terapia cognitiva para criangas @adolescentes 19 Betas ne! + Incluir tudo em uma conceituacao cognitivo-comportamental do caso. + Manter a estrutura tradicional da sessio. * Integrar procedimentos com os processos psicoterapéuticos, como a allanca terapéutica, a colaboracio e a descoberta orientada, + Permanecer emocionalmente alerta e presente quando implementar procedimentos. * Aplicar as técnicas no contexto da excitacéo emocional Ben nce ected *+ Fazer com que todos participem ativamente, dvidindo sua atencio entre 198 individuos. + Prestar atencio a0 fato de que pensamentos, sentimentos ‘comportamentos de cada pessoa afetam os dos demais. + Ter atencio aos individuos que conspirarem para evitarafetos negatives + Usar efetivamente os contextos interpessoais apicando diérios de ppensamentos, métodos de reestruturagao cognitiva e aprendizagem ‘experimental.

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