Você está na página 1de 74

Rascunho inicial (8 de Abril de 2020)

Ensaio
Sobre a poesia dos Abismos
e
Cordilheiras da Alma

Uma viagem pelos Recantos


e
Encantos do ser
Gabriel Felipe M. Salomon Camargo
Hoje vim contar uma história, um conto sobre o encontro entre
um guerreiro do coração e a Jibóia encantada.

No coração da natureza, ventre da floresta, na alma da terra,


muitos e muitos anos atrás nasceu um rio… Que serpenteando entre o
arvoredo, dançando em meio as pedras, cantava para o azul do céu e
seguia rumo ao mar.

Em algum ponto, no sutil espaço que baila entre a poesia e a


inspiração, o rio começou a se transformar… Do espelho de suas águas
claras, refletindo o desenho das nuvens, formou-se a pele. Das pedras
cristalinas – fortaleza que sustenta a terra – nasceram seus ossos. E assim,
da terra fecunda onde dormem as sementes, se fez sua carne.

O rio, que serpenteava rumo ao mar, se fez, como num passe de


mágica, serpente. Desabrochou, do ventre da alma da terra, a Jibóia
Encantada.

Reinava soberana, Rainha da Floresta, encarnação da Beleza e


do Encanto, da magia das folhas, plantas, ervas… Conhecimento das
profundezas e alturas da Alma do Mundo.

Guardiã da Medicina e da Sabedoria, era a portadora dos


Mistérios da Floresta. Do sagrado conhecimento pulsante da natureza, cura
para todos os males causados pela inconsciência.

Passou-se o tempo, correram os anos… Eras, vidas, ciclos. Até


que um dia, o homem chegou até seu reinado. No começo, era puro,
inocente, como uma criança eternamente maravilhada pelo sonho de
Nhanderu.

Que dançava, girando em êxtase ao som da criação...

Que caminhava junto às árvores…

Voava com os pássaros, cantava com as águas…

Mas, um dia, em algum lugar do mundo, o homem caiu no


esquecimento da unidade, da essência do mais profundo de seu ser, e nesse
esquecimento, deixou de ouvir a música da natureza.

Tornou-se cego para as belezas e encantos da criação.

Passaram-se, novamente, os anos, vidas, eras e ciclos, até que


completamente tomado pelo esquecimento o homem já não se reconhecia
mais na natureza.

E assim, começou sem perceber a destruir o próprio berço de


seu nascimento, cortando as florestas, poluindo os rios, mares… Até
mesmo o próprio ar que respira.

Acreditando cegamente que a terra sagrada em que vivia era


algo externo, alheio à sua existência.

Construiu estradas cortando a floresta, irresponsavelmente feriu


a terra, explodindo montanhas para extrair os minerais da terra…
Construiu muros de concreto, armado, cofres e fortalezas, bancos…
Escondendo a sete chaves as “riquezas” que ele próprio usurpou da terra.

...
A vida se faz no movimento e requer, portanto, um tanto de
coragem pra que a magia possa acontecer.

Há momentos de sol, tempo aberto, dias livres pra se dançar na


relva por entre as flores da primavera.

Em outros momentos, a chuva vem, os temporais, vendavais e


trovoadas que estremecem o chão e o céu, desestruturando as energias
densas e lavando a alma do mundo.

Assim como a natureza, somos seres de ciclos, estações.

Temos que deixar de temer as estações de nossos corações e


sentir verdadeiramente, inteiramente, entregues às nossas emoçoes e
sentimentos.

Permita-se sentir a dor, a tristeza, até mesmo o desespero. Os


sentimentos são como a água, quando represados, contidos, tendem a
apodrecer e gerar todo tipo de desequilibrio. Assim como uma represa não
pode conter para sempre a força de uma enchente, também não somos
capazes de conter para sempre nossos sentimentos represados. Em algum
momento a barragem se rompe, e assim como a água de uma represa que
se solta de uma vez, …..

Permita-se transitar entre as estações de seu coração, pois,


assim como as que pairam sobre os campos, também passarão.

Depois da tempestade, sempre vem a calmaria, e com ela, os


ensinamentos que a trovoada despertou.
……

Quando todas as luzes se apagam e o futuro já não parece ter


solução, silenciemos.

A esperança é a força mais poderosa que há, é preciso acreditar


que é possível, mesmo que as chances sejam mínimas e que tudo pareça
estar desabando.

Sempre é possível sonhar, com um novo caminho, um mundo


melhor, uma nova poesia.

Mesmo que as chances sejam poucas, a esperança é a sabedoria


de que se cada um continua fazendo o seu melhor, apesar das estatísticas,
pode ser que as coisas funcionem. E mesmo se não funcionarem, pelo
menos se terá tentado.

Quando perdemos a esperança e paramos de agir acreditando


que realmente não tem mais jeito, efetivamente perdemos a possibilidade
de vencer as adversidades.

É imprescindível portanto acreditar, acreditar que é possível e


seguir em frente, mesmo que aparentemente nada conspire a nosso favor.

Quando nos colocamos em movimento, vencendo os medos


que outrora nos imobilizavam, começamos a construir possibilidades
melhores, abrir novos caminhos para que a sorte possa nos encontrar
preparados, prontos para agarrar a oportunidade quando ela se apresentar.

Um dia de cada vez, hora após hora, constrói-se o dia de


amanhã, os anos porvir, o futuro que antes parecia distante.

Mesmo que não façamos o “melhor”, ou o que julgamos que


seria o melhor a nosso alcance, se caminhamos um passo de cada vez, na
medida que conseguimos, cada dia estaremos mais fortes e mais aptos a
cada vez melhor reagir aos desafios que nos são apresentados.

O trabalho é a matéria-prima a partir da qual se realiza a arte do


viver. Trabalho não no sentido pejorativo que costumeiramente atribuímos
à palavra, mas no sentido de movimento, ação. Meditação é trabalho,
interior, o cuidado com as nossas palavras, pensamentos, relações, tudo
isso é trabalho.

É preciso, portanto, trabalhar no presente todos aqueles


aspectos com os quais não nos encontramos em sintonia. Trabalhar dentro
de si, com empenho, dedicação, capricho… A cada desafio aprendemos
muito, mesmo quando nos damos por vencidos. Se temos a tranquilidade
de observar, com mais carinho e paciência com nós mesmos,
compreendendo que não se pode julgar o dia de ontem com os olhos de
hoje, pois sem as experiências passadas não poderíamos ter a compreensão
que hoje vivenciamos.
Se de tudo aprendo, não há passo errado, já dizia a sabedoria
dos antigos.

O importante é, assim, aprender com tudo que nos acontece,


com todas as situações que temos que encarar. Reconhecendo nossos erros
e, livres da culpa, mais conscientes trabalhar para não repetir as mesmas
ações que nos impedem de fazer as pazes com o passado.

O passado pode ser nosso grande aliado – ou um grilhão que


atrasa nossa caminhada –, tudo depende do empenho que dedicamos à
aprender as lições de cada situação, seja ela boa ou ruim aos nossos olhos.

A existência é neutra, são nossos olhos que rotulam de bom ou


mau aquilo que nos acontece.
…...

A vida se faz na dança, no giro da roda do céu, no bailado das


melodias, na poesia das grandezas do ínfimo.

Girando e girando

Entre versos, cantos, rimas…

Cordéis de histórias e estrelas

Nossos dias estão escritos

Na memória íntima do mundo

Em cada volta da roda do infinito

Que incessantemente

Se reinventa

Desabrocha

Arboresce

Se enraiza

E alça voo


A Busca da Visão ensina, antes de tudo, que sem água não há


vida. Absolutamente nenhuma.

Aprendemos também a controlar nossas reações, que são a


partir de onde o nosso inconsciente exerce influência sobre nossa vida
Poemas Místicos da Alma
Anoiteceu no Juremal
Com os últimos raios do sol

A noite teceu seu manto de estrelas

Cobrindo a mata

Acordando o fogo

Que arde no coração da Aldeia

Bailando no arvoredo

Chega o Vento

Trazendo o canto das aves da noite

Silêncio, Silêncio

Dançam as chamas com a brisa

Entoando seus ícaros

No coração de quem sabe ouvir


Perfumada, a fumaça dos cachimbos paira por entre as folhas

Girando entre as plumas

Vai levando aos céus as rezas

Espalhando em seu caminho os encantos do fogo

Na alquimia das ervas

Na medicina do Luar

Reluzindo seus raios de Prata

Vem escorrendo do firmamento

Como o nascer de uma Cachoeira

No Ventre da Mata Virgem

Desabrochando as Sementes
No Florescer da Primavera dos Povos

No despertar da consciência

No amanhecer de um novo tempo

Somos a Alma de um novo dia

E, tão certo como o Sol que vem raiando

Cobrindo com seu manto os mistérios da noite

Renasceremos.

‫ﬡ‬
Poemas pra deitar numa rede e sonhar
O mistério da vida é regressar,
voltar ao começo

com o olhar

de tudo que já se aprendeu.

‫ﬡ‬
Escrevo a poesia de mim

Na folha do tempo

Na criança que sou

Para o adulto que fui

Deitar na beira do rio

E embalado nas corredeiras

Sonhar

Transcrevo em sentimento

A melodia do silêncio

As cordas ao vento

Que sopra do coração

Escuto a voz do que não sei

Sou eterno aprendiz

Do pó que clareia a estrada

Dos passos que abrem a alvorada


Para a criança que sempre serei

Dançar com os passarinhos

E transbordando em brisas

Brincar

Ciranda que gira

Roda que pulsa no ventre

Da terra, do fogo

De mim

Descubro que tudo é muito pouco

Diante da eterna maravilha de ser

Do raiar do dia que floresce

Da poesia que deságua doce

No mar

Oceano das vidas que vivi

Girando do nada
De tudo que ainda irei navegar

Espalhando estrelas feito pó

Sou andarilho, cigano do luar

Sou a brisa que canta pra noite

Na floresta pra lua sonhar

Sou pó, me liberto no ar

Sou pedra e quero sonhar

Sou rio, deságuo no mar

Sou de mim o retalho

Retrato de todas estrelas

Que brilhei, que brilho,

que ainda hei de clarear

Alvorada

Que ensina

A renascer
Despetalar o tempo

Para enfim

Flores ser

‫ﬡ‬

Através da mansarda inexistente no concreto

Via os nomes do céu e da terra

Despercebia as histórias

Que a noite tinha pra contar

Teceu das nuvens uma cortina

Que descobrisse sua nudez

Das estrelas fez a cama,

Anoitecida de silêncios,

Desfeita de cor

Não sabia muitas coisas

Certezas, desconhecia...
Sabia, contudo, sonhar.

Tirar das coisas a seriedade

Pintar de azul as vozes e as palavras

Reinventar das pedras um silêncio

Ou dos mares a inspiração

Até que pudesse anoitecer-se

E na solitude das estrelas

Finalmente

Adormecer.

‫ﬡ‬

Sentado na lua com seu chapéu de palha


O malandro ri pro vento

Enquanto brinca

Com seus versos

Tecidos meio que no cambaleio

De uma conversa de botequim

Palavras servem de que se não for

Pra desfiar uma troca de idéias

Pra preencher o silêncio das entrequadras

E perturbar a ordem do cidadão de bem

Silêncio é pro meio do mato

A cidade se constrói no grito

Na música que toca nas calçadas

No murmurar das conversas sem sentido

Jogadas fora no canto da mesa


No canto daquela mesa,

Onde o bandolim ainda ecoa

Onde o sereno cai tranquilo

E toca, assim como as cordas

O chapéu de palha

Do Malandro

Que já se foi

14.12.2016

‫ﬡ‬

No mato não há gente que barulhe


O orvalho tranquilo no amanhecer

Não há ruído que ofusque

O solfejo do vento por entre as árvores

No mato a gente conhece as coisas sentindo

Não se chama nada pelo nome, mas pela sensação

O trêm verde de subir e de ter sombra

A cobra de vidro que rasteja tarde afora

Aquele alaranjado que embeleza o amanhecer

02.01.2017

‫ﬡ‬

Desfez a noite em pequenos versos:

três pedaços de arrebol


3/4 de vento desaverbado

metade de uma pia vesga

alguma peça de Vega

las flores del camino

e as do vinho (Baudelaire)

aquela caneta informal

um chão de estrelas

e claro, outro de giz

um desaprendimento manco de metades

Esse teclado metido a jurista

Doutor, pelamor me acuda!

Vi um sonho no teto

ele me fez azul.

‫ﬡ‬
Despercebido pelas ruas

Vagueia um vulto em meio à chuva

As gotas já não o tocam,

O vento sussurra seu nome

A brisa com cheiro de terra

Permeia seus andrajos de poeta

As aves buscam abrigo

Em meio aos ramos

De seus sonhos

Uns dizem que é louco por ouvir

As cores no canto dos pássaros...

A pedras do caminho tem para ele

Uma beleza digna das noites de inverno


O orvalho que repousa em seus olhos

Mais parece o amanhecer de seus sentimentos,

Que se reinventam nos descobrimentos

Até desenhar o cheiro das nuvens

Para desenhar o cheiro das nuvens

É preciso sofrer de poesia,

Passar em claro, noites frias

Caetanear, sem melodias

Em sua loucura aprendeu

Que as folhas só caem

Quando a inspiração

Pesa em demasia
Pois como lhe disse um amigo:

Poesia é voar fora da asa.

23.04.2014

‫ﬡ‬

Ouvir nem sempre é escutar

É abrir-se a outros mundos

Padecer de outras dores

Silenciar

Sonhar com outros olhos

Chorar molhando outra face

‫ﬡ‬
Na folha do tempo não cabem palavras

Escreve-se em cores, ventos, brisas

Sarãs arborescidos de estrelas,

Arrebóis de uma aurora do porvir

Desprecisa filosofias,

Grandes feitos lançados ao vento

Certeza?

Só a de passar

De morrer em partes a cada noite, padecer

Rasgar o ócio que perfuma as idéias

Errar em cor na tela da vida

Deixar no caminho apenas as cinzas

Do poente - e talvez de um cigarro


Largado pela metade, inacabado

Incompleto como o resto das coisas minhas

É que há coisas que só o tempo termina

Desbota as cores, dá seu toque

Põe duas camadas de poeira,

Amarela as páginas perdidas

Afina as cordas da lira, ou da lida,

Para que idas as notas, ou os anos,

Continuem a soar nos campos de outrora

Para que findas as horas, ou a voz,

Desnudem-se os versos, estes, infindos

Tecidos do silêncio das noites


Saberes da alma de um andarilho

Pequenas verdades sobre o caminho

Veste os andrajos de um destino incerto

Para que o tempo pare,

Paire sobre os passos

Incauto em sua necessidade de passar

Atirado à tormenta como as ondas à praia

Assim como o errante investe contra a estrada

Fugindo do crepúsculo, bailando às marés,

Impregnado de arrebol e poesia...

Segue seu curso feito rio

Até tornar-se gota no oceano


Até despetalar-se ao vento,

Tornar-se brisa embriagada

Cambaleante ao sabor do azul

Esquecida de si, perdida sem palavras

Arborescida

Enfim

E se?

‫ﬡ‬

Diferente do Cartola

Eu só volto
Quando me perder

De mim

‫ﬡ‬

Através da mansarda inexistente no concreto

Via os nomes do céu e da terra

Despercebia as histórias

Que a noite tinha pra contar

Teceu das nuvens uma cortina

Que descobrisse sua nudez

Das estrelas fez a cama,

Anoitecida de silêncios,

Desfeita em cor

Não sabia muitas coisas

Certezas, desconhecia...
Sabia contudo sonhar.

Tirar das coisas a seriedade

Pintar de azul as vozes e as palavras

Reinventar das pedras um silêncio

Ou dos mares a inspiração

Até que pudesse anoitecer-se

E na solitude das estrelas

Finalmente

Adormecer.

- 21.05.2015 -

‫ﬡ‬

Arborescido de estrelas

Vi um sonho correr pela noite.


‫ﬡ‬

Olhos pesados como as nuvens

Carregadas de sonhos nas noites de inverno

Saberiam eles, que a loucura é a porta do mundo?

Mundo esse que se recria

Que a cada novo dia destrói sonhos e alegrias

Para das cinzas refazer em versos cegos

Os mares de areia, ou agua fria

Louco, ouvinte das pedras

Amigo da poeira

Artista do incerto

Arborescido

‫ﬡ‬
Poesia é a incerteza da melodia

A se redescobrir, em ventanias

Em casa de sol, chapéu se deixa na porta

Em rios de lua, a tristeza fica à margem

Ao poeta cabe a arte de desvanecer as frondes

Das árvores que sombreiam o rio da vida

Que envereda pelos roucos caminhos onde a noite

Vem colher os sonhos e os versos insones

Ao poeta cabem também os desfazeres,

Amanhecer colibris, recitar sóis, cantar as cores de um sorriso...


Em manhãs de abril a lua desponta mais cedo

Nas de outono, faz arrebol

O perfume do azul permeia os fios

Que tecem o céu nos sarãs da noite

Sob os quais o poeta adormece em sonhos

E em sonhos, reinventa o mundo.

‫ﬡ‬
‫ﬡ‬

‫ﬡ‬

Do amor
O teu riso

“Tira-me o pão, se quiseres,tira-me o ar, mas nãome tires o teu riso.

Não me tires a rosa,a lança que desfolhas,a água que de súbitobrota da


tua alegria,a repentina ondade prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regressocom os olhos cansadosàs vezes por ver
que a terra não muda,mas ao entrar teu risosobe ao céu a procurar-me
e abre-me todasas portas da vida.

Meu amor, nos momentosmais escuros soltao teu riso e se de súbito


vires que o meu sangue manchaas pedras da rua,ri, porque o teu riso
será para as minhas mãoscomo uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,teu riso deve erguersua cascata de espuma,


e na primavera, amor,quero teu riso comoa flor que esperava,a flor
azul, a rosada minha pátria sonora.

Ri-te da noite,do dia, da lua,ri-te das ruastortas da ilha,ri-te deste


grosseirorapaz que te ama,mas quando abroos olhos e os fecho,quando
meus passos vão,quando voltam meus passos,nega-me o pão, o ar,a luz,
a primavera,mas nunca o teu riso,porque então morreria.”

- Pablo Neruda

‫ﬡ‬

Quero teu sorriso

Como a última brisa

Que desperta a primavera


Despetalando as flores

O teu olhar é a semente

Que arboresce na noite e me sonha

Que canta uns versos e inventa

Uma viajem pra longe

Onde me perco

De verão e de ti

‫ﬡ‬

O que seria o amor

Se não a leveza do sorriso

Nos lábios de quem ama.

A alegria do simples pensar,


Da poesia que clama pelo encontro

Às vezes basta um olhar

Para florescerem no sorriso

As sementes que

Há muito, haviam secado

Pois o amor é isso,

Lágrima que ao desabrochar

Dos olhos do poeta,

Traz vida ao sonhador

‫ﬡ‬

Quis um dia ter um amor

Para quem pudesse ser poesia

E abraçar nas noites frias

Onde só me beija o luar


Para ver a chuva infinda

Como quem vê a primavera

Com suas flores sempre lindas

Mesmo antes de desabrochar

Ouvir o canto risonho das andorinhas

Que pairam no azul, firmamento

Dançando nas asas do vento

‫ﬡ‬

‫ﬡ‬
‫ﬡ‬

‫ﬡ‬
Das leis e da Revolução
“A metafísica jurídica não tem tempo para a dor
das pessoas reais”

- Costas Douzinas

A letra da lei não serve ao homem,

Disse-me um poeta de nadas em seus andrajos de céu


A sanidade que pregam os juristas adoece a mente

A razão quando em demasia ensurdece o canto dos pássaros

Ensurdecei-vos!

Clamam os homens da lei

Recitai os versos e incisos daquele Código

Calem os sonhos

Até que sejais velhos e pendais suficientemente ao chão

Para alcançar os versos que os andantes lá deixaram

E então, quando lembrardes dos teus sonhos,

– Que tivera quando criança –

Encontrar-te-ás sob a terra, com o peso das leis e dos tomos

Que cobrem a rasa cova


De tua inspiração

‫ﬡ‬
PRÁTICA POÉTICA
“Creativity is allowing yourself to make mistakes.

Art is knowing which ones to keep.”

- Scott Adams

Caem as folhas

Não os versos

Arrastadas pretensões

De saber-se si
Devastadas versações

Malversas de raiz

Inverdades, afazeres

Verdadeiramente desfeitas

Não mais, nunca mais

Nem cá nem lá

Hei de deixar

De derramar

Meu pranto, encanto

De outros tempos

Antro de víboras

Aquieta-te

Saiba

Nunca mais
- 20.03.2017 -

‫ﬡ‬

O calor das tardes de janeiro

Inspira na gente uma moleza distinta

Nascida do ócio praiano de ser sem pressa

Vai progredindo de poucos até florescer em tardes

Deitado na rede, estirado no sol que se põe à tarde

Já quase noite

Dà na gente uma vontade de ser nada,

De sentir o tempo passar

De afundar na rede e só acordar amanhã

É que no calor a gente se torna meio que árvore

Ou como diriam, calango do cerrado

Esticado no sol em alguma pedra, até que finde a tarde

E se tenha que ir a algum lugar fazer alguma coisa


Se é que há o que fazer, numa tarde dessas

De qualquer maneira, a escrita é ferramenta de passar tempo

Nessas tardes, nesse sol

Navegar longe nas palavras,

Voltar só depois que o pé tiver virado pra amanhã

Pra já levantar com o pé direito

E ir ver o por do sol

Numa manhã bem cedinho,

Em alguma praia

No céu de aqui

- 07.01.2017 -

‫ﬡ‬

Calmaria que desterra o azul do céu

Em brisas que rodopiam pelas ruas

Tece em trapos enferrujados


Algum poema de se perder nu

Algum sopro de se sentir

Como folha incauta a dançar no vento

Como a rouca semente que brota no asfalto

Verde poema no concreto

Reencontro ao acaso entre a vida e a estrada

Caminho por onde se perdem os sonhos

E por onde se chega onde quiser

Feito de momentos

Tecido no instante

Andrajo adormecido de ver estrelas

Sonha assim, sem pressa

Ou sentido que se ponha

Porque verso desprecisa de motivo

Só não pode carecer de inspiração


Sob pena de padecer de razão

- 02.01.2017 -

‫ﬡ‬

Cai leve brisa escura

Permeada de estrelas num sarã de abril

Perdida no tempo, a brisa-vera tinge de brim

Algum pensamento jogado

Meio papel cansado

De ser tinta no meio do chão

Tecer linhas sem reta

Em palmas

Em mãos
Sair sem rumo pela rua é coisa de quem tem chuva nos olhos

Perder pro chão algumas idéias e muitas conquistas

Até virar no vento da esquina tipo cipó sem pauta

Redemunhar desvairado por aquis e tirar do chapéu o pó assentado

Tergiversado por ontens, onde o agora espera o futuro

Adormecido de palavras

Retidas

Ali

- 31.11.2016 -

‫ﬡ‬

Hoje acordei obtuso,

Pendente de todos os verbos

Perdido no parapeito de mim olhando os carros

Quem me dera fossem os rios, o azul do vento


Mas a cidade tem dessas

Acordar no concreto desprecisa de azul

Ter-se como folha no caminho aqui é virtude de tirar na sorte

E se tiver sorte tira metade da folha em um verso

Põe na cabeça um chapéu de vento e anda por ai

Pensando na vida, refletindo no olhar o asfalto, infindo

Pra todos os lados, tem rua que dê lá

Menos pra dentro do mato

O mato tem seus caminhos traçados no céu

E quando anoitece as estrelas arborescem e descem pro chão

Brotam, versos e passos do passado

Passados a limpo na poeira

Poeira de andarilho, pisada até o osso de poesia

Perdida até o oco


De abril

Mês sem fim

- 28.11.2016 -

‫ﬡ‬

Pra adormecer num barranco alado

Basta tirar do bolso um chapéu de versos

Plantar debaixo de 2 palmos de terra

E esperar nascer um travesseiro

Depois disso é sono fácil, aconchegado na terra

Perdido pro azul do céu de ontem

Não sei muito o que cria essa necessidade

De dormir nuns cantos estranhos

Ou não
A mentira é o instrumento de trabalho do poeta

É a faca de dois gumes que tece versos e despetala os ventos

Que tira do teto um pouco de peso e das pernas o cansaço

Abre os ramos da cachola pro arrebol

Cantar aos quatro ventos

Toys in the attic

- 27.11.2016 -

‫ﬡ‬

Recorria no silêncio das noites

à única voz que lhe cabia

Reafirmava de ventos em ventos


Alguns versos roucos,

Alguns berros, poucos

A noite, de fato

Que por vezes lhe trazia angústia

Acariciava sua face com silêncios tardios

Sabia-se que tardava a ser brisa

Nos dias em que a chuva caía de lado

Tinha propensão à permutas de pedra

Sabia que para ser andarilho precisava arborescer

Tecer do caminho um bocado de disparates

Que pudesse recitar aos passantes

Até que ao fim da estrada, onde a chuva cai de baixo


Tivesse as folhas e os ramos de seus sonhos

Cheios de versos, carinhos

E azul.

- 25.11.2016 -

‫ﬡ‬

Descia das nuvens, sereno

Como o sereno que cai

Nas manhãs nubladas e sobe

Pelos ventos, farrapo de verso


Arredondado pro lado da esquina

De quem dobra o papel pelo lado de lá

Queria saber do tempo,

O que faz, como passa…

Qual o segredo das pedras

Qual a linguagem dos ascos

Rígidos trapos vestidos a caráter

Pro baile da chuva que sobe do céu

Pra fala do rio que revira a terra

E levanta do fundo o barro seco

Que o guri pega pela mão

E transforma em barco, em verso

Transforma em pipa e solta


No céu da noite, sem arrebol.

Vai saber que quanto tem de verde folhado na lida

Como que folha revirada no vento

Como disperso alvorecer de lata

Pertinentes são as pedras arborescidas

Arborescer é ter nos olhos um sarã e metade de um cordel

Que conte de preferência umas rendas metidas à lampião

- 22.11.2016 -

‫ﬡ‬

Sou assim

Sem palavra nem letra

Pra descrever o que sinto


Completamente perdido

No azul de um fim de tarde

Qualquer

Coado como café

Numa manhã triste

De inverno

- 05.04.2016 -

‫ﬡ‬

Verdes sonhos que alcançam o céu

Estendendo-se da terra às nuvens

Solidez que reflete em suas frondes o anoitecer ainda distante.


Imóveis e inefáveis, despertam a alma dos vagabundos que abrigam

Do sol, da chuva ou das pedras que lhes atiram

Pedras que caem, assim como as lágrimas do céu

Em dor, em cores, em tiros

Tiros de homens que destroem matas e sonhos

Para de seu cerne tecer a grana e os grilhões

Que acorrentam a vida

De homens

E de árvores.
‫‪- 10.06.2015 -‬‬

‫ﬡ‬

‫ﬡ‬

‫ﬡ‬
‫ﬡ‬

‫ﬡ‬
‫ﬡ‬

Oferecimentos
Pescador de sonhos (à Matheus Werner)

Tem um poeta que é mar...

Mar também é pescador

Que joga sua linha de sonhos


Pra pegar versos no arrebol

Esse meu poeta,

Fazedor de amanheceres

Tem precedências pra sabiá

Que quando canta

Desabrocha o dia

Na noite de quem encanta

(Inclusive na minha)

Ouvi do vento

Que às vezes

Toma forma de brisa

Pra levar um canto pro canto

Do mar onde dorme Inaê

Pra embalar o balanço

Da rede das ondas do mar

Pro lado pescador do poeta

Dançar na espuma e sonhar...

Uma vez ele me disse


(Parte em palavras, parte sem)

Que às vezes é preciso

Jogar a vida pra ferver no vento

Pra colher do café a poesia.

Hoje ele tem casa no meu peito

Onde eu fiz um jardim

Pro poeta plantar suas sementes

E colher de mim versos arborescidos

De poesia

E gratidão

‫ﬡ‬

Você também pode gostar