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GUIA de Estudo Cultura e Educacao VFF
GUIA de Estudo Cultura e Educacao VFF
A POLITÉCNICA
Escola Superior Aberta
GUIA DE ESTUDOS
Moçambique
Ciências de Educação –Cultura e Educação – Semestre 2
FICHA TÉCNICA
Organização e Edição
Escola Superior Aberta (ESA)
Autor
Sara Jona Laisse (Conteúdo)
ÍNDICE
Epígrafe ........................................................................................................................................... 4
NOTA DE ABERTURA ................................................................................................................. 5
NOTA IMPORTANTE ................................................................................................................... 6
PROGRAMA TEMÁTICO ............................................................ Error! Bookmark not defined.
Objectivo geral: ........................................................................................................................... 7
Objectivos específicos: ............................................................................................................... 7
CONTEÚDOS ........................................................................... Error! Bookmark not defined.
ADVERTÊNCIA ........................................................................................................................ 8
LIÇÃO Nº. 1 .................................................................................................................................... 9
O CONCEITO CIENTÍFICO DE CULTURA E A SUA DEFINIÇÃO..................................... 9
Lição Nº. 2 ..................................................................................................................................... 15
CARACTERÍSTICAS DA CULTURA .................................................................................... 15
Lição Nº. 3 ..................................................................................................................................... 18
RELAÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO E CULTURA.................................................................... 18
Lição Nº. 4 ..................................................................................................................................... 21
O papel da cultura no processo educacional – continuação da aula anterior ............................ 21
Lição Nº. 5 ..................................................................................................................................... 24
CULTURA E PROCESSOS IDENTITÁRIOS EM MOÇAMBIQUE..................................... 24
Lição Nº.6 ...................................................................................................................................... 27
CULTURA E PROCESSOS IDENTITÁRIOS EM MOÇAMBIQUE - .................................. 27
Continuação da lição anterior.................................................................................................... 27
Lição Nº. 7 ..................................................................................................................................... 30
Identidade e Moçambicanidade – Processo de formação da identidade Moçambicana –
Continuação da lição anterior.................................................................................................... 30
Lição Nº. 8 ..................................................................................................................................... 32
IDENTIDADE E MOCAMBICANIDADE – Porque falhou o projecto de Moçambicanidade?
................................................................................................................................................... 32
Lição Nº.. 9 .................................................................................................................................... 36
A PRETENÇÃO DA SUPERIORIDADE RACIAL – Formulação de juízo de valor ............. 36
Lição Nº. 10 ................................................................................................................................... 39
A pretensão da superioridade cultural: o relativismo cultural – continuação da aula anterior.. 39
Lição Nº. 11 ................................................................................................................................... 42
A PRETENÇÃO DA SUPERIORIDADE CULTURAL – continuação da aula anterior......... 42
Lição Nº. 12 ................................................................................................................................... 45
Escolas de pensamento antropológico – conclusão da lição anterior. ....................................... 45
Lição Nº. 13 ................................................................................................................................... 48
A FUNÇÃO SOCIAL DOS MITOS E RITOS EM MOÇAMBIQUE .................................... 48
Alguns exemplos de rituais pós-guerra civil ................................................................................ 51
Lição Nº. 14 ................................................................................................................................... 54
Territorialidade de Moçambique – Fronteiras Geográficas e “Imaginárias” – A construção da
nação em África ........................................................................................................................ 54
Lição Nº. 15 ................................................................................................................................... 59
MODELO DE ANÁLISE DE CULTURA GEERTZ ............................................................... 59
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................... 67
Epígrafe
NOTA DE ABERTURA
Caro estudante,
Tem nas suas mãos o manual da disciplina de Cultura e Educação, áreas que se
complementam, por serem duas faces da mesma moeda. Não se pode falar em cultura,
sem se falar em educação e vice-versa: ambas são adquiridas socialmente, dependendo da
época e da região do planeta em que ocorram.
Mas não nos esqueçamos que existem, no mundo, valores culturais universais, pelo que
não devemos relativizar a cultura e a educação de forma extremista. É com intuito de
fazê-lo conhecer diferentes vertentes de socialização secundária1 que este manual foi
feito para si. Além disso, queremos que aprenda pela prática. Por isso, para verificar se
conseguiu alcançar os objectivos traçados, em cada lição você terá que realizar um
exercício aplicado sobre a matéria leccionada.
Ao terminar a leitura de uma lição, verifique se conseguiu seguir e compreender os
objectivos traçados. Aconselhamo-lo a evitar passar para a lição seguinte, sem ter o
domínio do que estiver a estudar. Lembre-se ainda que, sem ler os materiais
recomendados, não chegará a lugar nenhum e irá limitar-se a responder às perguntas
colocadas, tanto nas actividades de cada lição, como nos testes por via “da adivinha” e
sem perceber aonde quer chegar com a sua resposta. Você é um futuro educador, um
semeador e por isso deve preparar-se sempre para ter “boa colheita”, com ou sem
intempéries. O semeador deve habituar-se, desde cedo, a lidar e a gerir o imprevisto, por
isso:
“Sai Semeador! Parte! Prepara!
Leva contigo tudo o que tens, tudo o que sabes
E acolhes o que o outro te dá!
Aceita o desafio do Semeador
Que semeia o bem, a verdade, a sabedoria!
Tu também és um grande Semeador!”.
1
A socialização primária é a que o indivíduo fica exposto na sua infância, ao tornar-se membro de uma
sociedade, sendo que a secundária é a introdução do indivíduo já socializado em outros sectores objectivos
da sociedade (Luckman e Berger (2004).
NOTA IMPORTANTE
Consulte o plano temático da cadeira, para ver quantas horas precisa para fazer o
aprofundamento de cada lição. Deverá dedicar algum tempo para a leitura e compreensão
e outro para a resolução dos exercícios de aplicação a que chamamos actividade e ainda
outro momento para fazer as leituras recomendadas que complementam o que foi dito em
cada lição deste manual.
Você terá três momentos de avaliação nesta cadeira. Os dois primeiros irão consistir de
testes de frequência com pergunta e resposta e o terceiro será uma frequência realizada
através de um trabalho de pesquisa de campo.
Peça ao seu tutor para lhe dar a indicação das temáticas a serem abordadas em seminários
de integração, para que você vá preparado para expor questões relacionadas com o tema
em discussão.
Bom trabalho!
Objectivo geral:
Objectivos específicos:
Plano Tematico
Nº Conteúdos Horas
Avaliações 3h
ADVERTÊNCIA
Nas páginas que se seguem, você irá encontrar 15 lições e a indicação sobre como
desenvolvê-las. Encontrará, também, todos os textos (bibliografia) a serem usados em
cada lição e durante o semestre todo, na cadeira de Cultura e Educação.
Você deverá ir lendo esse material, não só na perspectiva de ter que responder aos
objectivos de cada lição ou para responder às perguntas dos testes, mas também deve
preparar-se para realizar um trabalho de pesquisa que deverá ser depositado no seu centro
de apoio, no final do semestre ou da disciplina: - convinha que fosse fazendo o trabalho
de pesquisa aos poucos e não deixasse essa tarefa para o fim.
Bom trabalho!
UNIDADE TEMÁTICA I
Objectivos
LIÇÃO Nº.1
O CONCEITO CIENTÍFICO DE CULTURA E A SUA DEFINIÇÃO
Antes de iniciarmos esta lição e as restantes, você deverá saber de antemão que os
termos cultura e educação têm merecido inúmeros debates, por serem polissémicos,
por abrirem várias possibilidades de interpretação e, sobre tudo, porque entre diferentes
autores muito dificilmente se encontra consenso.
Segundo Silia (1996) a cultura pode ser vista sob dois eixos principais:
Nesta lição iremos falar sobre o conceito científico de cultura e a sua definição. Assim,
no final deverá ser capaz de:
9 distinguir as diferentes concepções científicas do termo cultura;
9 conhecer as definições de cultura postuladas por diferentes autores.
Saiba que:
Esta lição é meramente teórica, mas você deverá fazer a fixação de conceitos, para
poder usá-los posteriormente em outras lições, especialmente no que diz respeito ao
conceito de relativismo cultural.
Leia o texto “A invenção do conceito científico de cultura” in CUCHE, Denys . A Noção
de cultura nas ciências sociais: 2004, para aprofundar mais esta matéria, cuja síntese
segue nas próximas linhas.
Anote:
2
Posição filosófica que introduz a necessidade da exaltação de valores essencialmente humanos na
sociedade, a partir do Séc. XIX.
Este autor defende que a diferença entre os grupos humanos tem uma sustentação
cultural e não racial, o que significa que, no seu entender, a diferença entre os
chamados povos primitivos e civilizados centra-se na cultura adquirida e não em
questões biológicas. Assim, o etnólogo, se quiser conhecer e compreender uma cultura,
deve apreender pessoalmente a língua do local pesquisado, realizar entrevistas (mais
ou menos formais), estando atento a tudo o que é dito durante as conversas
espontâneas. Por tudo isto se supõe que sejam feitas estadias prolongadas junto das
populações cuja cultura se escolheu estudar.
Boas defende a necessidade de se ter em conta o relativismo cultural na comparação
entre culturas, daí que advoga uma abordagem científica baseada na pesquisa de
campo, porque “cada cultura é única, especifica e representa uma totalidade singular e
todo o seu esforço consistiu em buscar aquilo que forma a sua unidade” Cuche, 2004:
48).
A sua preocupação estava centrada, não só na descrição dos factos culturais, mas na
sua compreensão em termos de articulação.
Esta concepção era marcada pela etnologia francesa, antes tida como reducionista,
porque considerava o estudo das sociedades humanas, sem considerar a sua cultura,
nem o conceito científico da cultura, preferindo usar o termo civilização. Nos primórdios
da sua investigação (no Século XIX e inícios do Séc. XX), para os precursores desta
corrente, o termo cultura só era usado quando fosse referente ao indivíduo de forma
particular (pessoa culta). Só nos anos 30 do Séc. XX é que se começou a verificar uma
autonomia da etnologia em relação à sociologia.
Nessa altura, Émile Durkein, pai da Sociologia, (1858-1917), percursor principal desta
corrente, não concebia uma diferença entre civilizados e primitivos, não punha em
causa a unidade do homem, por entender que a humanidade é una e que todas as
civilizações particulares contribuem para a civilização humana.
tendo que seguir um sentido linear, no que concerne ao seu progresso, mas como
sociedades com diferentes árvores com ramos múltiplos e divergentes, ou seja, não
existem sociedades mais elevadas que outras. Dava o exemplo da China, considerada
sociedade inferior, mas que, no futuro, poderá tomar uma direcção diferente – o que na
verdade é o que está a acontecer, porquanto a China encontra-se actualmente no
mapa das economias com progresso surpreendente.
Importa reter que Durkein não usou o termo cultura de forma sistematizada como
Taylor, hesitando entre uma concepção unitária e outra diferencial.
Mais adiante, neste manual, irá conhecer as relações existentes entre cultura e
educação. Daremos especial ênfase a questões culturais, uma vez que um dos
principais objectivos é fornecer materiais para que, na qualidade de educador, tenha em
consideração que, no acto de ensinar e no contexto educativo, é importante estimular a
diferença e evitar a supremacia de umas culturas sobre as outras.
Para John Locke (1690) a mente humana não é mais do que uma caixa vazia, ao
nascer, dotada de capacidade para obter conhecimento, através da endocrinação.
Eliot (1948) defende que a cultura se refere à totalidade de costumes, leis, crenças,
técnicas, formas de arte, de linguagem e de pensamento.
Lima Vaz (1993) afirma que a cultura é um todo ordenado, que garante a sobrevivência
do homem e é edificada à luz do ethos: conjunto de valores, costumes fundamentais
para a convivência pacífica dos homens em sociedade.
Blackburn (1997) refere que a cultura é o modo de vida de um povo, em que se
incluem as suas atitudes, valores, crenças, artes, ciências, modos de percepção e
hábitos do pensamento e de acção.
Como se pode depreender, todas as definições acima mostram que o termo cultura está
associado a uma tarefa social e não apenas individual. Essas definições revelam ainda
as experiências vivenciadas pelo homem, o que difere de outros animais3. Neste
sentido, pode-se afirmar que essa tarefa social carece de um processo de transmissão
a ser realizado, de uma geração já existente a outra acabada de “chegar” a esse
contexto ou mais nova. É a chamada “socialização adaptadora” ou enculturação.Vale
lembrar que existe uma socialização adaptadora em que o indivíduo por si adquire os
ensinamentos da sociedade. Verifica-se ainda que a cultura é um conjunto de
significados e valores partilhados e aceites por uma comunidade.
Actividade 1
1. Faça uma tabela em que mencione e descreva (sem se esquecer dos autores –
percursores) as diferentes concepções de cultura (abordagens: universalista,
particularista, unitária e diferencial). Para saber diferenciar essas
abordagens/métodos científicos usados desenhe uma tabela com os seguintes
tópicos/colunas: autor, tipo de concepção, descrição das características essenciais
dessa abordagem e método de pesquisa – em quatro parágrafos no máximo.
Síntese:
Nesta lição, você aprendeu que a cultura é objectiva e pressupõe o domínio da natureza
pelo homem (uso da força física) para viver e é subjectiva (uso da força
mental/intelectual) para agir através da educação, ciência, arte, crenças, mitos, leis e
religiões.
Aprendeu também as diferentes concepções sobre cultura, nomeadamente:
3
Nesta lição não entraremos nas discussões filosóficas de Kant e de Rousseau que não consideram os
animais seres a parte, ou seja que colocam alguma paridade entre as vivências dos animais e dos seres
humanos, a partir da racionalidade, sensibilidade e moralidade. Na verdade, para estes autores a grande
diferença entre animais e seres humanos, está na capacidade ou não de mudarem os seus destinos.
particularista, cujo precursor é Franz Boas, que defende que, para comparar culturas,
é preciso fazer-se pesquisa de campo (um estudo etnográfico, observando directamente
os factos), porque a diferença entre os grupos humanos tem uma sustentação cultural e
não racial, dado que a diferença entre os chamados povos primitivos e civilizados
centra-se na cultura adquirida e não em questões biológicas. Este autor advoga ainda a
necessidade de se ter em conta o relativismo cultural, porque cada cultura tem as suas
particularidades.
unitária, Émile Durkein, percursor principal desta corrente, não concebia uma diferença
entre civilizados e primitivos, não punha em causa a unidade do homem, por entender
que a humanidade é una e que todas as civilizações particulares contribuem para a
civilização humana.
Para ele, o pensamento humano não funcionava de uma única maneira, porque as
formas de raciocínio dentro de uma mesma cultura não são homogéneas. Os seus
estudos eram comparativistas.
Por fim, é de lembrar que o termo cultura está associado a uma tarefa social e não
apenas individual. E que a cultura revela experiências vividas pelo homem, o que
diferencia de outros animais.
Lição Nº. 2
CARACTERÍSTICAS DA CULTURA
Saiba que:
Para aprofundar mais sobre esta lição, use como material básico a obra de: MARTINEZ,
Francisco Lerma. Antropologia cultural. Guia para estudo. 2003.
Anote:
Além das características que veremos mais adiante, convém saber que a cultura é
dotada de alguns mecanismos, nomeadamente:
Mecanismo cumulativo:
Nota: estes são algumas características outras deverão ser lidas no texto de
Martinez (2003) – indicado para a presente lição.
Actividade 2
Síntese:
Não faremos uma síntese com a mesma índole que a da aula anterior, mas
aconselhamo-lo a reler os exemplos e características da cultura acima apresentados.
Para além dos exemplos apresentados, habitue-se a ir procurando outros exemplos,
mesmo após ter estudado esta lição.
UNIDADE TEMÁTICA II
Educação e Cultura
Objectivos
No final desta unidade, você deverá ser capaz de:
Lição Nº. 3
Este é o tema central da disciplina de Cultura e Educação. Irá permitir-lhe perceber por
que razão não se pode falar em educação sem se levar em linha de conta a cultura.
Afirmámos anteriormente que este manual irá privilegiar aspectos ligados à cultura e
que devem ser considerados no contexto educativo, mas antes, convinha conhecer a
relação entre os dois conceitos.
Objectivos:
No final desta lição você deverá ser capaz de:
- Compreender a relação existente entre Educação e Cultura.
Anote:
De acordo com Veiga-Neto (2003) pode-se afirmar que, ao longo dos últimos dois ou
três séculos, não se procurou problematizar os significados modernos de cultura e
educação. Aceitou-se, de um modo geral e sem questionamentos, que cultura
designava o conjunto de tudo aquilo que a humanidade tinha produzido de melhor –
fosse em termos materiais, artísticos, filosóficos, científicos, literários etc. Assim, cultura
sempre foi pensada como única e universal. Única porque se referia ao que de melhor
se havia produzido e universal por fazer referência à humanidade – um conceito
totalizador.
Veiga-Neto postula, ainda, que somente nos anos 20 do século passado começaram a
aparecer os primeiros questionamentos da antropologia, da linguística, da filosofia e da
sociologia – a epistemologia monocultural. Mais recentemente, a Politicologia e
especialmente os Estudos Culturais foram eficientes no sentido de desconstruir o
conceito moderno e nos mostrar a produtividade de entendermos que é melhor falarmos
de culturas em vez de falarmos em Cultura.
“Não há ninguém que, tendo sido abandonado durante a juventude, seja capaz de
reconhecer na sua idade madura em que estado foi descuidado, se na disciplina ou na
cultura. Quem não tem cultura de nenhuma espécie é um bruto, quem não tem
disciplina ou educação é um selvagem. A falta de disciplina é um mal pior que a falta de
cultura, pois essa pode ser remediada mais tarde, ao passo que não se pode abolir o
estado selvagem e corrigir um defeito de disciplina.
Muitas vezes, este autor usa o termo cultura de forma similar ao que se usa quando fala
em educação, porque, para ele, em ambos os processos há a aquisição de habilidades,
instrução, ensino e orientação. Mas alerta que não basta ser-se habilidoso, para
considerar-se que a pessoa é instruída (civilizada e disciplinada).
Daí que vale a pena lembrar a diferença entre o que Kant chama de cultura geral e
civilização (que é na verdade outro tipo de cultura); pois a civilização tem por finalidade
habilitar para a prudência, que é um estádio mais alto do que a cultura geral. Neste
ponto há alguma semelhança entre o que Kant (1996) e Vygotski (1985) defendem.
4
Ver, neste manual, as diferentes concepções de cultura. Veja-se ainda, na lição º. 1, a diferença entre
cultura objectiva e subjectiva.
5
O texto deste autor será usado na segunda parte da aula, quando abordarmos o papel da cultura no
processo educacional.
Nota: todos esses passos são assimilados de formas diferentes por cada indivíduo,
dependendo da idade que tem, da sociedade em que vive e dos elementos que são os
elos de transmissão desse conhecimento. Mas é preciso realçar que todos os indivíduos
nasceram com capacidade de poder aprender, independentemente da sua origem ou
condição social.
É ainda importante sublinhar que existem autores que usam os termos cultura e
educação como se de sinónimos se tratasse, quando, na verdade, são fenómenos
similares, tal como ficou acima esclarecido.
6
Os conceitos cultura e educação são plurissignificativos e não querem dizer a mesma coisa. Vamos, para
efeitos de compreensão da relação entre os dois termos, convir que, tanto na cultura como a educação
correspondem a atitudes padronizadas decorrentes de um processo de socialização. São um fenómeno
social que constitui uma forma de ver, estar e de perceber o cosmos.
Actividade 3
1. Que diferença pode ser estabelecida entre a perspectiva de Silia (1996), quando
refere que a cultura é objectiva e subjectiva e a perspectiva de Kant(1999), quando
refere a educação primária e a educação prática? Comente esses posicionamentos
Síntese:
No final desta lição, é importante que nos detenhamos no pensamento de Kant, que
afirma que quem não tem educação é selvagem e não tem disciplina. Quem não tem
cultura é bruto e mal comportado. Há necessidade de se cultivar as duas vertentes, pois
não basta ser-se hábil (culto); é necessário também ser-se disciplinado
(treinado/educado/civilizado).
Lição Nº. 4
O papel da cultura no processo educacional – (continuação da aula
anterior)
Saiba:
Para chegar ao objectivo desta lição, você irá precisar de ler o texto: GONÇALVES,
António. “A Educação e a Cultura: caminhos cruzados”. (sd). Esse texto deverá estar
anexo ao presente manual, caso não esteja, peça ao seu polo para lhe facultar uma
fotocópia. Você deverá incidir a sua leitura em dois subcapítulos, nomeadamente:
9 A Educação como projecto cultural e
9 A educação como utopia e ideologia: função reprodutora.
Anote:
Para aprofundar sobre esta matéria, poderá ler AKKARI, Jalil; MESQUIDA, Peri. Cultura
e educação: situação e perspectivas possíveis. 2000 e VEIGA-NETO, Alfredo. Cultura,
Culturas e educação. 2003.
Apesar de termos indicado os subcapítulos em que deve centrar-se, leia o texto todo,
porque irá precisar dos conteúdos para comentar, explicar e argumentar sobre o tema
“Cultura e Educação” nos testes ou seminários a que está sujeito.
Pretende-se que esta aula seja de índole prática (leitura e compreensão da matéria);
você deve ler o texto indicado para encontrar argumentos que o ajudem a discutir sobre
diferença/semelhança entre a educação e a cultura e sobre o impacto da cultura no
processo de educação.
Actividade 4
Síntese da lição:
Você aprendeu que tanto a educação como a cultura são fenómenos marcados pela
passagem de informação de uma geração para a outra e que a aquisição de ambos os
fenómenos depende de um processo de aculturação.
Em qualquer dos casos, mesmo que as gerações seguintes não mantenham a
originalidade das crenças, conhecimentos e valores, as pessoas têm a capacidade de
reestruturar e reorganizar a aprendizagem que fazem, algo tornado possível pela
adaptabilidade e selectividade da cultura e da educação.
7
O texto encontra-se depositado na biblioteca da Escola Superior Aberta - ESA, na Universidade A
Politécnica. Foi elabora e apresentado numa palestra nessa Universidade, para os alunos da ESA.
Gonçalves (sd), ao socorrer-se de Arendt (2001) que refere que, cabe aos mais velhos
introduzir os mais novos no mundo da cultura, pela transmissão do ethos e que a
educação, normalmente, é feita através de instituições. Ambos os processos são de
socialização, sendo que a educação é um acto eminentemente cultural.
Gonçalves (sd) acrescenta que a escola, para além de produzir indivíduos ajustáveis à
sociedade é também um lugar de reprodução das desigualdades sociais e económicas,
pois, para ele, e segundo Apple (1979), os estudantes culturalmente favorecidos lidarão
facilmente com a linguagem e cultura escolares, porque a acção pedagógica reproduz a
cultura dominante. Assim, a escola deverá preparar-se para lidar com as diferenças,
sem homogeneizar e sem criar exclusão social, dado que a cultura ministrada pela
escola contribui para a desigualdade extra muros.
CULTURA E IDENTIDADE
Objectivos
No final desta unidade, você deverá ser capaz de:
Lição Nº. 5
Objectivos:
- Conhecer os diferentes contornos que o termo identidade pode tomar;
- Reflectir sobre a valorização da identidade enquanto fenómeno em constantes
mutações, susceptível de ser reformulada;
Memorize:
Conceitos básicos
Segundo Berger e Luckman (2004) qualquer indivíduo que nasça numa sociedade
aprende a interiorizar, à nascença (socialização primária) todos os elementos que
determinam o funcionamento da família com a qual vive ou convive. Ao crescer, ele vai
ganhando contacto com outros indivíduos diferentes dos da sua família, relaciona-se
com instituições e adquire os hábitos exigidos nesses contactos; chama/se a esse
fenómeno, socialização secundária.
Saiba:
Esses teóricos defendem que o conceito de identidade está relacionado com a ideia de
“permanência, unicidade e singularidade”, conceito apresentado por Heráclito, séc. VI
aC. e V aC., no que tange à existência das coisas. Este modo de pensar o conceito
identidade influenciou todas as outras definições de identidade em gerações posteriores
à de Heráclito (CALDAS; WOOD JR., 1999)
Assim, identidade é um processo que vai sendo construído e reformulado ao longo das
nossas vidas, em função do momento histórico que atravessamos, seja ele colectivo ou
individual.
Actividade 5
Esta actividade marca o início de um trabalho que deverá ser completado no final da
próxima lição.
Síntese:
Aprendemos ainda que a identificação é definida como “processo psicológico pelo qual
um indivíduo assimila um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se
transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo dessa pessoa. Pelo que a
identificação assume o valor de operação através da qual o indivíduo humano se
constitui. Operação essa que implica um laço emocional que relaciona duas ou mais
entidades. Assim, o grau de identificação do indivíduo com algo (objecto) dependerá do
tipo de socialização em causa.
Lição . Nº.6
Para um melhor aproveitamento desta lição, e para poder acompanhar melhor os seus
objectivos, leia a obra de MAALOUF, Amin. Identidades Assassinas. 2005, um livro de
ensaios que o ajudará a perceber por que razão, no contexto de inclusão social, é
importante a tolerância cultural e a coabitação com a diferença.
Saiba que:
nossa identidade é complexa e tem vários níveis, mas não se compartimenta. Ela é feita
de todos os diferentes níveis que a formam. Para ele, há necessidade permanente de
se fazer uma reflexão em torno da identidade Por ser um fenómeno subjectivo, é
susceptível de criar conflitos sociais, onde umas identidades são “assassinadas” pelas
outras.
Maalouf faz-nos questionar por que razão é que as pessoas cometem crimes em nome
de uma identidade única, nacional ou religiosa.
Há, na obra, a discussão sobre como os conflitos religiosos, linguísticos, raciais, o
sufrágio universal e a pertença podem oprimir minorias ou, como é que, em nome da
unicidade, pode-se dizimar seres humanos. O autor chama-nos a atenção para o facto
do nosso olhar ser portador de preconceitos.
A visão que temos do mundo e as palavras que usamos podem, muitas vezes,
contribuir para o assassínio das identidades das pessoas. Contrariando essa ideia,
deve-se incentivar as pessoas a assumirem as suas múltiplas identidades ou múltiplas
pertenças. Uma atitude preconceituosa ou discriminatória é perigosa.
Cada vez mais, o mundo encontra-se a caminhar para uma unicidade económica da
qual já não podemos prescindir; no entanto, esse fenómeno deverá ser acompanhado
pela salvaguarda dos valores e crenças essenciais dos seres humanos.
Segundo Maalouf (2005), os seres humanos não são indiferentes às pertenças das
pessoas (religiosas ou étnicas e até de cor de pelo, mas o importante é que se encontre
uma fórmula para a valorização das diferentes qualidades humanas. Temos que chegar
a um momento em que eleger-se um presidente negro nos Estados Unidos da América
ou um presidente branco na República da África do Sul seja encarado como um
fenómeno comum. Devem ser valorizadas as qualidades humanas e não a pertença,
independentemente das crenças e da cor.
Para o autor uma atitude menos conturbada a nível social seria aquela em que a atitude
de tolerância é a aceitação do que é diferente, desde que não seja nocivo, porque as
pessoas devem ser encorajadas a assumirem as suas múltiplas identidades/pertenças
de forma descomplexada, porque impedir isso é “formar legiões de loucos, sanguinários
e alucinados ou de pessoas que se renegam a si próprios”.
Actividade 6
1. Procure num Dicionário, Enciclopédia ou, em última instância pela internet, o que é
que significa afro pessimismo e unanismo. Não se esqueça de mencionar o autor e a
fonte da definição que encontrar.
2. Usando ainda a Internet, procure comentários feitos em torno da realização (ou não)
do mundial do futebol na África do Sul em 2010. Esses comentários deverão deixar
clara a ideia de afro pessimismo e de unanismo (conceito de que falámos na questão
anterior).
2.1. Faça uma análise desses comentários (os referidos em 2) tendo em conta:
- Os ensinamentos e os desafios colocados por Maalouf em “As identidades
Assassinas”;
Síntese
As pessoas são feitas de várias identidades e não há necessidade de compartimentá-
las, porque elas vão se ajustando/reformulando em cada momento, dependendo do
contexto. Por outro lado, há necessidade permanente de se fazer uma reflexão em
torno da identidade, por ser um fenómeno subjectivo é susceptível de criar conflitos
sociais, onde umas identidades são assassinadas pelas outras.
Lição Nº.7
Leia a obra de GRAÇA, Pedro.”A construção da nação em África”. 2005, cap. III e IV,
para aprender sobre a formação de processos identitários em África e o texto de
NGOENHA, Severino “Identidade Moçambicana: já e ainda não”, inserido em SERRA,
Carlos, “Identidade, Moçambicanidade e Moçambicanização” (1998).
Saiba que:
Graça, Pedro (2005) refere que é impossível falar-se na existência de uma identidade
comum no país, dada a multiplicidade de línguas e etnias; no entanto, deve-se referir
que a convivência com a cultura portuguesa é um marco comum nessas diferentes
etnias, uma vez que houve uma convivência social entre moçambicanos e portugueses.
8
O conceito de Nação é plurissignificativo, mais adiante, neste manual, abordaremos essa questão.
Retenha isto, caro aluno. Será importante no âmbito de várias discussões sobre
processos identitários referentes a Moçambique.
O autor refere ainda que, entre 1962 e 1968, havia no grupo várias tensões inter-étnicas
e até de origem racial, sendo que a questão central tinha a ver com o poder. A partir do
II congresso da FRELIMO (1968), verificou-se a necessidade de diminuir os conflitos e
de se fazer a reconstrução nacional, integrando a organização política, económica,
social, incluindo o desenvolvimento de uma cultura nacional.
Nesse âmbito, o chamamento era para que houvesse uma atitude de tolerância
relativamente aos valores culturais tradicionais. O combate contra o tribalismo, o
regionalismo e o racismo, constituíam o ideal nessa reconstrução e tornou-se tabu o
reconhecimento de antagonismos étnicos.
No entanto, o autor explica que a prioridade na reconstrução do país dava mais ênfase
a questões políticas e da implantação do Marxismo-Leninismo pela FRELIMO, o que fez
com que houvesse algum vazio no tratamento de aspectos ligados ao desenvolvimento
da cultura moçambicana. A primeira e a segunda reuniões nacionais da cultura,
organizadas pelo Ministério de Educação, foram reveladoras disso, isto porque, o
debate sobre a cultura redundou num fracasso.
O autor afirma ainda que, na sequência do III congresso, entre 1978 e 1982 foram
iniciadas campanhas para consolidar a cultura frelimista, nomeadamente a Campanha
Nacional de Preservação e Valorização do Património Cultural que culminou com a
criação do ARPAC, do Museu da Revolução, do Museu da Moeda, do Instituto Nacional
do Livro e do Disco e do Instituto Nacional do Cinema. Em 1978 teve lugar ainda o
primeiro festival de dança popular – que mostrou a diversidade cultural a partir das
massas. Só a partir dos anos 90, com a implantação da democracia é que se começou
a questionar o conceito de Nação e nessa altura começou a haver abertura para o
reconhecimento da existência da diversidade etnocultural, iniciando-se o
questionamento sobre a proporcionalidade relativamente à detenção de cargos
políticos.
Actividade 7
1. Acha que a identidade moçambicana já está formada?
1.1Considerando apenas questões culturais, acha que pode afirma-se que existe uma
identidade Moçambicana (unicidade)? Leia o capítulo V da obra “A construção da
Nação em África”, para entender o pensamento de Graça (2005) sobre essa questão.
Leia e releia o que referimos que deveria ser retido no início da presente lição.
Síntese:
Ainda não é possível falar-se na existência de uma identidade comum no país, dada a
multiplicidade de línguas e etnias, no entanto, deve-se referir que a convivência com a
cultura portuguesa é um marco comum nessas diferentes etnias, uma vez que houve
uma convivência social entre moçambicanos e portugueses.
Como uma grande marca na arena cultural em Moçambique, no que concerne aos
processos identitários, pretendia-se uma comunidade ideal de cidadãos, que reconhecia
simplesmente indivíduos iguais e ignorava as particularidades étnicas, regionais,
culturais, linguísticas e religiosas de cada um. A política vigente nessa altura, antes da
independência, era essencialmente oposta aos micro-nacionalismos, ao tribalismo, ao
regionalismo, que só podem viver no isolamento de cada um nas suas particularidades.
O que quer dizer que esse processo gerou rupturas, uma vez que era e é importante
não impedir que haja coabitação com as diferenças.
Esse é um trabalho que tem tido um franco andamento, nos dias que correm, porque
cada vez mais se dá importância a diversidade cultural, o que é salutar para a
reconstrução do país.
Lição Nº. 8
Tal como na lição anterior, no final desta lição, você deverá ser capaz de:
- Discutir sobre alguns processos culturais que marcam a identidade dos
moçambicanos;
E ainda:
- Compreender alguns pressupostos para resgatar o projecto de Moçambicanidade.
Nesta lição, não iremos marcar exercícios para que reflicta sobre a matéria, mas
colocaremos questões que deverão servir de alicerce, no referente a discussões sobre
a moçambicanidade. Leia as respostas com muita atenção.
Aprenda com o filósofo moçambicano Severino Ngoenha. Leia a sua obra “Identidade
Moçambicana: já e ainda não”, inserido em Serra, “Identidade, Moçambicanidade e
Moçambicanização” (1998) para perceber de que recursos nos poderemos socorrer na
tentativa de resgatar o projecto de Moçambicanidade.
Lembra-se do que referiu Maalouf (2005)? Ele afirmou que é importante deixar conviver
as diferentes identidades do si mesmo ou as identidades relacionais. Não foi?
Saiba que:
Para Ngoenha (op. cit), a moçambicanidade é sobretudo, um dever e uma tarefa: dever
de conservar a liberdade e a soberania duramente conquistadas; tarefa de as consolidar
e de as incrementar para gerações futuras.
A sociologia pode descrever a crise e o perigo que ameaçam esta frágil unidade política
e moral que é Moçambique: do interior, pelos micro-nacionalismos e pelo economicismo
individualista; do exterior, pela globalização económica e pela usurpação do espaço
político nacional em acto, o que pode significar um colonialismo de retorno.
Por que razão é urgente discutir-se a sobre os processos identitários nos dias
que correm?
Vivemos uma época de paradoxos. Nunca, como hoje, se falou tanto da identidade
moçambicana, ou de uma moçambicanidade, mas ao mesmo tempo, nunca, desde a
proclamação da independência, tal identidade esteve tão ameaçada como hoje. Do
exterior, pela limitação da soberania que comporta a internacionalização das trocas e a
interdependência das economias; do interior, pela ideologia produtivista, que exalta o
indivíduo e os seus interesses, mas ignora os cidadãos e os seus ideais.
Nada nos assegura que a moçambicanidade terá, no futuro, a capacidade de assegurar
as relações sociais entre Moçambicanos.
Que alternativas?
Urge renovar o projecto político nacional e adaptá-lo aos imperativos hodiernos, através
de instituições comuns. Urge criar instituições comuns susceptíveis de renovar o
processo de integração das populações através de uma prática de cidadania e
participação na vida colectiva. Urge forjar um projecto capaz de assimilar as diferentes
populações a um projecto comum, sem desnaturar as suas especificidades.
É preciso um projecto que permita a colaboração de todos num único “élan” nacional,
um projecto fundado sobre a ideia do valor do inter-culturalismo. Um projecto que
favoreça a unidade na diferença.
Síntese:
UNIDADE TEMÁTICA IV
Objectivos
Lição Nº. 9
Anote
Para esta aula será importante trazer conhecimentos de História Universal e daquilo a
que se tem chamado de “humildade científica”. Leia especialmente Colleyn, JP . “A
pretensão da superioridade cultural. in Elementos de antropologia. 2005, capítulo II
ideologia social e cultural” de (2005), para perceber a presente lição e as próximas.
Actividade 9
1.Escreva no seu caderno que passos tomaria para formular um juízo de valor acerca
de um acontecimento social, cultural ou político?
2. Leia o texto que segue e comente-o tendo em conta a importância de se considerar
o rigor científico, quando emitimos juízo de valor.
TEXTO
…uma grande mulher não finge, não mente, não trai e nem denigre a vida alheia; não
abandona o marido nos momentos difíceis da vida, nem na pobreza e nem na tristeza,
pelo contrário consola-o, aconselha-o, fica do seu lado, enfim, transmite-lhe toda a
alegria!
Uma grande mulher não escolhe o marido pela cor da pele e nem pela condição
económica, muito menos pela riqueza, mas sim pelo amor, carinho e sinceridade.
Uma grande mulher chora por uma justa causa, chora pela sua dignidade ofendida, ri
quando for necessário, transmite o amor ao marido, perdoa, ajuda e constrói uma
família feliz, luta em prol do desenvolvimento da sociedade, pelos valores morais do seu
género, da sua sociedade e da sua nação.
Uma grande mulher não exibe o seu corpo, não ofende, não comete injúrias, pelo
contrário guia-se pela ética e decência.
Uma grande mulher transmite amor aos seus filhos, aos desesperados, aos sofredores,
aos amigos e à sociedade; ela luta pela causa da nação, usando a coragem, fé, força,
da alma e do espírito, aceita receber o marido, mesmo que ele volte de madrugada à
casa e não se envolve em discussões, tenta ficar forte e consegue! Mesmo magoada,
ela fica firme e simples, como se nada tivesse acontecido, porque o amor é mais forte.
Uma grande mulher vai à luta, arrisca a sua vida por uma causa, como a liberdade do
povo da sua nação.
Uma grande mulher não envereda pelo “materialismo” e nem pela luxúria na escolha do
parceiro, mas sim pelo amor e felicidade; ela sorri, alegra-se quando for necessário,
Então? O que achou do texto? Acha que é assim que deve ser uma grande mulher?
Porquê? Lembre-se que, tal como afirma Amin Maalouf, o nosso olhar não deve ser
prisioneiro dos nossos preconceitos! Voltaremos a esta questão, quando falarmos sobre
o relativismo cultural.
Saiba:
Por falta desse rigor, no mundo houve/há, na História da Humanidade, erros difíceis de
reparar (e que não encontram sustentação científica) e que marcaram a humanidade
advindos de “etnografia de varanda”, como é ocaso da ilusão da superioridade de raças
e de culturas: que, de acordo com Colleyn (2005), permitiram considerar que África é
um continente “bárbaro” e “selvagem”; pelo que deveria ser colonizado. Quais terão sido
os fundamentos científicos desse pressuposto?
9
A Revolução Industrial surgiu na Inglaterra no final do séc. XVIII.
Daí que Colleyn (2005) afirme que ao comparar sociedades e fenómenos, não se pode
assumir que a ausência de determinada característica numa, é sinónimo de
inferioridade. As sociedades têm estádios de desenvolvimento diferentes. Os seres
humanos têm diferentes maneiras de ser e de estar. Não se pode tomar a parte pelo
todo ou ficar -se pelas aparências.
Resumindo: a ciência não tem verdades absolutas, mas cada conclusão científica
deverá juntar o maior número possível de provas.
Actividade 10
3. Depois de ter lido o que acabamos de afirmar, reforce a sua resposta à questão
anterior. O que é que faltou, na formulação de juízo de valor no texto de Licusse?
Síntese
Aprendemos que para formular juízos de valor, temos que usar métodos científicos que
possam ser testados, verificados e mensurados por outras pessoas, para além da
pessoa que faz a pesquisa.
Além disso é importante usar dados fiáveis que podem ser obtidos de pesquisas de
campo, comparação de dados encontrados e entrevistas aos nativos.
Em termos de ética recomenda-se uma atitude não preconceituosa e não etnocêntrica,
para além de ter que se verificar todos os pormenores em volta do fenómeno estudado.
Lição Nº. 10
Afirmámos na aula passada que o tema sobre a pretensa superioridade racial é muito
complexo, pelo que requer uma abordagem faseada.
Nesta lição, irá aprender sobre o relativismo cultural. Assim, terá que voltar às notas dos
textos indicados na aula passada, especialmente à introdução da obra “Elementos de
antropologia social e cultural” de Colleyn, JP (2005).
Leia ainda:
Actividade 11
1. Procure pela Internet ou num dicionário de vocábulos de língua portuguesa o que
significa etnocentrismo.
Nota:
Lembra-se do que leu sobre o conceito etnocentrismo? Se sim, relacione-o com a
expressão “atitude etnocêntrica”. Se não, volte a pesquisar o termo pela Internet ou
então use um dicionário de vocábulos de língua portuguesa.
Ao falar em relativismo cultural, Cardoso (1995) defende que é importante reter que
cada cultura tem especificidades que lhe são inerentes e que resultam de factores
socio-históricos que definem a identidade de seus detentores. É por isso que não é
defensável a ideia da superioridade racial ou cultural de um povo sobre o outro.
Segundo o autor, há uma crítica que é feita ao uso excessivo do relativismo cultural que
tem a ver com o facto de, em nome desse relativismo, as culturas se fecharem em si e
não permitirem um intercâmbio em contextos multiculturais.
Actividade 12
1. Retomando o exemplo de texto analisado na aula anterior, reforce o seu comentário
tendo em conta o relativismo cultural e o etnocentrismo.
Síntese
Lição Nº. 11
Saiba:
“O bárbaro é, antes de tudo, aquele que crê na barbárie” Claude Lévi-Strauss (1961),
“Race et Historie”, in Colleyn (2005)
Lembra-se do que dissemos na lição anterior? Dizíamos que não se pode avaliar os
fenómenos culturais independentemente dos contextos em que ocorrem, não foi? Vá
reler sobre o de relativismo cultural defendida por Cuche (2003).
Saiba ainda:
Tem se dito que o homem apareceu num período calculado entre 4 a 7 milhões de
anos na África centro-oriental, no Quénia. Após um longo período a viver numa
economia caracterizada pela caca e recolecção, passou-se à revolução ligada à
indústria da pedra polida, à descoberta da agricultura e da criação de animais.
De acordo com Colleyn (2005) muitos livros escolares continuam a apresentar a África
como um continente que se manteve selvagem devido ao seu isolamento. Continuam a
tratar da civilização egípcia e a de Méroe (onde foi inventada a escrita meroítica”) e
Kouch como se não fizessem parte do continente africano.
Além disso, a África ao longo da sua história adoptou culturas de origem asiática e do
médio oriente como o inhame, o taro, a bananeira, a cevada, o trigo, o arroz, a cebola e
a mangueira. A sua população nómada cria, desde há séculos, bois de origem egípcia e
zebus asiáticos e fundia o ferro há 2000 anos. Vejam-se os casos da arte de bronze do
Benin que, pelo mundo inteiro, têm causado espanto e admiração. Lembra-se que
afirmámos isso na lição nº9, não é? Não se lembra? Volte a essa lição, antes de
avançar.
Colleyn (op. cit.) defende que o domínio colonial é o principal responsável pelo atraso
económico de África. A concepção mais difundida, na opinião euro-americana, no que
concerne a diferentes culturas é a de que elas são as etapas sucessivas de um mesmo
desenvolvimento, de um progresso linear da humanidade. Nesta perspectiva, é cómodo
comparar sociedades contemporâneas que não possuem o domínio desta ou daquela
técnica (metalurgia, electricidade, escrita, etc) com o estágio da nossa sociedade, antes
da descoberta dessa técnica.
O autor defende, ainda, que, pela lógica, esse ponto de vista é indispensável: a partir da
ausência comum de determinada característica em duas sociedades, com que direito se
pode postular uma analogia entre essas duas sociedades sob todos os seus aspectos?
O erro desta ideia é confiar nas aparências, tomando a parte pelo todo, enquanto que
qualquer empreendimento científico consiste em ir para além das aparências.
Assim, considerar umas sociedades mais atrasadas que outras resulta de um devir
histórico cujo postulado se encontra incorrecto, dado que “...o progresso não é
necessariamente contínuo...a humanidade em progresso não se assemelha a uma
personagem que sobe uma escada” (Lévi-Strauss, 1961). Falar de progresso é emitir
um juízo de valor. Os valores não são universais, nem absolutos. Resultam das
exigências de cada sociedade.
Outras reflexões a que o autor nos remete, para responder à pergunta colocada
no início desta lição:
Que superioridade moral podem apresentar as grandes potências que, graças aos seus
fornecimentos de armas, alimentam todos os conflitos e apoiam todas as ditaduras?
Outra qualidade de que o ocidente se orgulha é a racionalidade, mas porque será que o
ocidente se debate contra as suas próprias criações: dinheiro e técnica? Porque será
que com o progresso técnico, o aumento da produtividade se traduz em despedimentos
de pessoas e de emprego cada vez maior? Além disso, o desenvolvimento sem
precedentes da técnica tornou o homem num factor que ameaça os equilíbrios naturais
– a poluição cada vez maior, o aquecimento do planeta e o esgotamento dos recursos.
Actividade 13
4. Depois do que leu até agora, encontra alguma razão científica que defenda a
supremacia de umas culturas sobre as outras? Ou de posturas sociais como por
exemplo as reportadas por Licusse no texto mencionado nas aulas anteriores? Não lhe
parece que as qualidades defendidas por esse autor deveriam caracterizar tanto
homens como mulheres? Ou por outra, será que em todas as culturas é ponto assente
que entre homem e mulher, as diferenças devem ser encaradas do jeito que o autor
propõe? Porque razão será que ele defende uma postura reducionista da mulher?
Síntese
Nesta lição deixamos espaço para que você faça a síntese do que aprendeu, mas
recordamo-lo que, ao comparar sociedades diferentes, é importante que tenha em
consideração que usa critérios similares para as duas sociedades. Além disso, é
importante ter em consideração que não há necessidade de que as sociedades tenham
um progresso linear ao longo do seu desenvolvimento.
Lição Nº.12
Anote:
Para um bom aproveitamento desta lição, leia Colleyn, Jean Paul. “Elementos de
Antropologia social e cultural”. 2005. Capítulo V e ainda Cuche, Denys. “A Noção de
culturas nas ciências sociais”. 2003. Cap. II, pg. 59 – 65.
Antes de iniciarmos com a abordagem das diferentes correntes, importa salientar que
elas não são compartimentos estanques e que pormenores sobre cada corrente podem
ser encontrados em outras correntes.
O evolucionismo
Nesse sentido, esta corrente postulava que os povos europeus eram superiores aos
demais, pelo facto de terem progresso tecnológico-cientifico derivado do seu estado
civilizacional. Nessa perspectiva, os outros povos eram considerados primitivos.
Lewis Morgan e Durkein são alguns dos percursores desta escola, embora nem todos
tivessem exactamente as mesmas ideias.
O Difusionismo
O funcionalismo
O estruturalismo
O autor mais representativo desta corrente é Lévi-Strauss. É criticado por não levar em
linha de conta questões históricas, no estudo das culturas e por estudar as culturas
numa perspectiva determinística, em que o indivíduo não é visto como uma entidade
individual, mas colectiva
Para ele, o mais importante é estudar-se os símbolos, uma vez que as funções
estruturais da sociedade são iguais (os homens nascem de um mesmo átomo). Este
pensador questiona se existem povos mais evoluídos do que outros, uma vez que os
seres humanos nascem todos a partir de uma mesma estrutura.
Actividade 14
Síntese
Há várias críticas a esta escola, por ela defender que os estágios de desenvolvimento
dos povos advêm da constituição humana e pelo facto de os seus percursores não
terem sido rigorosos no emprego do método comparativista.
O Difusionismo
O Funcionalismo
O Estruturalismo
Para Levivi-Strauss, autor mais representativo desta corrente, os seres humanos são
iguais, porque nascem a partir do mesmo átomo. Este autor não compara as culturas, a
parir de uma perspectiva histórica, mas, sim, a partir dos significados partilhados pelas
culturas.
UNIDADE TEMÁTICA V
A função social dos mitos e ritos de Moçambique
Objectivos
No final desta unidade, você deverá ser capaz de:
Lição Nº. 13
Anote:
Actividade 15
Saiba ainda:
O contacto com o colonialismo em África abafou, de certa forma, as manifestações
culturais moçambicanas, como por exemplo o uso das línguas nacionais, dos rituais
tradicionais para convívio com antepassados ou para pedir sucesso na sementeira ou
em algum ritual familiar.
No Tempo colonial
Essa autorização era feita como forma de estabelecer uma ligação entre si e os chefes
da população e também para manter a sua autoridade, a partir da protecção dos
espíritos. No entanto, os régulos a quem as autoridades coloniais reconhecessem
pactos desse tipo também eram punidos.
Apesar da repressão, as práticas foram sempre mantidas pela população, dada a sua
importância para a manutenção do equilíbrio social. Até porque os antepassados
orientavam os régulos na governação do território e na sua relação com os
portugueses.
Os principais rituais por eles praticados eram o mhamba que se destinava a kuphahla
(venerar) os antepassados; os rituais da chuva (mbelele), destinados a promover a
fertilidade da terra e a boa produção agrícola; os rituais do Wukanyi, que se realizavam
para evitar maus comportamentos e conflitos no período do wukanyi.
O que se dizia era que a linha férrea não passaria daquele local, porque havia, por
baixo, um cemitério dos donos da terra e seria necessário realizar-se uma cerimónia
para pedir autorização. Não havendo outra solução, os portugueses viram-se obrigados
a autorizar que se fizesse o ritual, até forneceram comida e bebida para a cerimónia.
Crê-se que indivíduos que tenham estado fora dos seus locais de origem possam ter
estado expostos à contaminação social – pelo facto de terem sido vítimas de magia ou
feitiçaria ou de terem apanhado espíritos desconhecidos, ou vítimas de doenças num
ambiente desconhecido.
Este grupo de pessoas é representado por aqueles que regressam das indústrias
mineiras sul-africanas ou de soldados ou refugiados do pós guerra que, por terem
convivido em algum ambiente de morte, poderão ser o veículo de assombração das
suas famílias, no lugar de regresso. Há, então, nas comunidades, um ritual de
reajustamento destes indivíduos ao seu meio social habitual. O processo de limpeza é
fundamental para o reajustamento dessas pessoas.
A realização de rituais de veneração e purificação possibilita ao indivíduo recriar uma
identidade perdida ou estabelecer uma nova.
Deste modo, cabe aos tinyanga o papel de realizar os seguintes rituais de purificação
Leva-se a criança para um lugar, longe de casa. Constrói-se uma palhota coberta de
capim seco. A criança é vestida com as roupas trazidas do campo de guerra. Já dentro
Conta-se que, em guerras anteriores, os soldados, antes de irem para a guerra, tinham
de ser submetidos a rituais, para se protegerem dos males da guerra e para se
tornarem combatentes fortes e destemidos. Os soldados eram tratados com vacinas de
ervas, para que se tornassem corajosos e para se protegerem contra os perigos da
guerra. Fora essas vacinas, há nyangas que davam aos seus protegidos um talismã,
para se andar com ele preso à cintura.
O mesmo acontecia quando regressassem da guerra, fazendo-se um ritual de
purificação, para os preparar ao retorno do contacto social. A limpeza depois do
regresso da guerra servia para evitar que o soldado tenha mpfukwa (fosse assombrado
pelo sofrimento ou males que viu na guerra).
O ritual após o regresso é semelhante ao que era feito aos regressados da guerra. Fora
isso, o soldado era levado para a palhota dos espíritos e apresentado aos seus
antepassados para que o recebessem de volta a casa.
Estes rituais têm a função de libertar o indivíduo da poluição e restaurar a sua
identidade como membro do grupo. São feitos para estabelecer uma ruptura com o
passado e integrar o indivíduo no grupo social. Sem a realização destes rituais, o
indivíduo é considerado impuro e propenso a contaminar o resto da sociedade. Ele, sem
a realização deste ritual, é considerado uma ameaça ao colectivo.
Actividade 16
Síntese
Esse “banimento” marcou bastante a identidade dos moçambicanos, porque ainda hoje,
altura em que já são permitidas essas práticas (na verdade, desde o início dos anos 90
e finais de 80), elas são realizadas de forma discreta, salvo um e outro caso.
UNIDADE TEMÁTICA VI
A Construção da nação em África
Objectivos
Lição Nº.14
Anote:
Actividade 17
Saiba que:
Há, portanto, até aos nossos dias, uma certa ambiguidade no que o conceito nação
pretende designar. Contudo, a nação é um valor supremo de coesão dos Estados
contemporâneos, quer sejam homogéneos, quer sejam heterogéneos, do ponto de vista
étnico, linguístico e cultural. É possível, ainda, encontrarmos o conceito a significar
povo, pátria e etnia, sendo que, umas vezes, representam a realidade de nação e
outras não.
A etnia Machope, de acordo com Magode (1996), é das que, no território nacional,
existe num espaço delimitado, sem alargamento para regiões de fronteira entre
Moçambique e outros países. O resto do país é constituído por várias bolsas étnicas de
confluências culturais moçambicanas ou não.
Cahen (sociólogo Francês), citado por Magode (1996), refere que o nacionalismo,
enquanto ideologia de estruturação de Estado e de integração social, não simboliza as
realidades sócio-culturais africanas. Para ele, os processos políticos africanos sempre
se afirmaram numa espécie de tensão entre o ideal de construção de nação nos
moldes europeus e os grupos étnicos, enquanto unidades societais distintas.
Para este autor, o futuro de países sem nação, como é o caso de Moçambique, poderia
ser pensado fora do quadro de construção/imposição do Estado-Nação, adoptando o
sistema de relações políticas fundado no reconhecimento de várias jurisdições a serem
reconhecidas por questões sociais. Assim, o seu desenvolvimento basear-se-ia no
quadro de um Estado unitário, não nacional e democrático.
Magode (1996), afirma que, provavelmente por esse facto, o nacionalismo, além de
ideologia de Estado ou das elites no poder, degenera em etnicidade10, tornando-se,
assim, em força de criação de marginalidade social, em termos étnicos: facto que seria
suprido com a legitimação de uma lei geral do Estado, para os grupos socioculturais.
Aquando da estruturação do estado colonial (1890-1920), a territorialização e a divisão
político administrativa observadas visavam institucionalizar os particularismos
socioculturais e políticos. Deste modo, o Estado pôde desorganizar a reconstituição das
unidades políticas africanas e fragilizar a resistência contra o poder colonial. Por outro
10
A etnicidade é um conceito que envolve muitas dimensões, podendo ser um fenómeno de identidade
étnica, no sentido em que define os limites espaciais e socioculturais de uma comunidade. Neste caso, a
etnicidade é considerada um critério de classificação e de ordenamento de formações socioculturais em
termos de identidades sociais.
Magode e Khan (1996) retomam este debate revelando que o modelo de Estado-Nação
assumido pelos países africanos é um processo transcendental à sua história, às suas
necessidades. Trata-se de uma teoria de Estado que invalida a sua própria experiência
de governo (cultura política) anterior à colonização.
Ainda de acordo com esse autor, a emergência das Nações-Estado tem sido associada
a transformações políticas, económicas e culturais que levaram ao surgimento de
formas de capitalismo na Europa. O Nacionalismo constrói-se através de uma
consciência popular de nação, i.e, consciência de um povo que se sente como uma
comunidade ligada por laços históricos, culturais e de uma ancestralidade comum.
Não é possível falar-se de uma única identidade Moçambicana. Tantas são as línguas,
como as culturas e, por consequência várias identidades. Várias são as identidades
dentro do território Moçambicano, como em regiões fronteiriças do país. Há em
Moçambique, tal como vimos acima “um sistema heterogéneo constituído por
subsistemas homogéneos” e, cada um desses subgrupos projecta uma noção
etnocêntrica que os diferencia dos outros e também do propalado conceito de Nação.
(Graça, 2005)
Síntese
Podemos resumir o que foi acima referido, usando o pensamento de Graça (2005:23),
que defende que o conceito nação é polissémico; no entanto, do ponto de vista
operacional, pode-se afirmar que a Nação é um sistema de relações sociais,
caracterizado por factores subjectivos e objectivos, que estruturam e dinamizam uma
situação de homogeneidade, ainda que parcial, assente na identidade cultural e na
consciência nacional, i.e, na síntese de elementos culturais que conferem identidade e
unidade a um conjunto de indivíduos, grupos e instituições, diferenciando-o de outros
que estão para além das fronteiras do Estado, e na noção de que os indivíduos têm de
pertencer a esse mesmo Estado, compreendendo o estatuto e o papel deste no sistema
das relações internacionais.
Assim, existem duas correntes a partir das quais se pode definir o conceito nação: a
subjectiva (que valorizam a vontade colectiva de fazer face a um objectivo comum) e a
objectiva, que leva em linha de conta a raça, a geografia, a língua e a cultura.
Não será uma atitude realista a negação da moçambicanidade; no entanto, ela não
traduz, ainda, a existência de uma nação moçambicana e, muito menos, de um Estado-
Nação. Tal realidade não pode, nem seria conveniente, subordinar a sua existência à
fundação de um Estado-Nação. Partindo-se da afirmação de elementos da pluralidade
étnica, a moçambicanidade terá de ser o resultado de uma aquisição sociocultural.
Objectivos
Lição Nº. 15
Nota:
Esta aula está dividida em duas partes. A primeira é teórica, onde introduzimos a teoria
sobre o modelo e a segunda é prática, onde você deverá verificar e demarcar no texto,
alguns momentos entendidos como aplicação do modelo teórico de Geertz.
Saiba:
Na obra A interpretação das culturas, Geertz (1989) enuncia que a cultura deve ser
vista como um texto passível de leitura e interpretação, em busca do significado
expresso na lógica informal da vida real.
Sob esta perspectiva, o papel do antropólogo/investigador é o de um intérprete do
discurso social, traduzindo os significados que são cultural e socialmente construídos
pelos sujeitos investigados. Assim, para o autor, esta interpretação é operada a partir da
interpretação que os próprios sujeitos fazem da sua cultura, isto é, existe uma
intersubjectividade, que se dá a partir da intersecção de dois universos, o do
pesquisador e o do pesquisado.
Geertz (op. cit) visualiza a cultura como um conjunto de mecanismos de controlo, como
planos, receitas, regras, instruções, que ordenam o comportamento do homem,
facto de, no 13º parágrafo (veja a parte sublinhada no texto abaixo), emitir um juízo de
valor ao referir: “este método, por ser potencialmente compulsivo e retrógrado” (veja o
texto).
O termo retrógrado é valorativo e deve ser evitado quando se compararem ou se
estudam culturas, pois elas têm importância e significado para as comunidades que as
praticam. No caso de se tratar de um ritual cultural, em que põe-se em causa a
dignidade e os valores fundamentais dos seres humanos, o pesquisador, nas suas
recomendações, pode recomendar que o ritual seja realizado de forma diferente, por
exemplo:
Tratando-se do ritual da circuncisão, o pesquisador pode recomendar o uso de lâminas
individuais para cada circuncisado, uma vez que a prática tem sido fazer-se o ritual de
forma colectiva, usando a mesma lâmina. Este facto atenta contra a saúde pública. Ou
então, tratando-se de uma prática como a excisão do clítoris, o pesquisador poderá
sugerir o seu banimento, alegando o facto de essa prática atentar contra a vida e os
valores fundamentais da pessoa.
Actividade 19
Nota:
No final de alguns parágrafos, irá encontrar entre parêntesis a indicação de alguns
critérios advogados por Geertz. São para servir de exemplo ao trabalho que
pretendemos que faça, para apreensão do modelo estudado.
Texto
fizer, será conotado como um bêbado e acusado de falta de respeito pelos mais
velhos, e isto pode chegar a inviabilizar o projecto matrimonial.
Lá por volta das 21 horas, o rapaz, acompanhado de seu “sebueni”, regressa a casa e
vai dar a conhecer aos pais como decorreu a cerimónia. Uma vez consumado o acto, o
rapaz obriga-se, em razão da nova realidade, a melhorar a sua apresentação e reforçar
a sua seriedade.
Se andava desarranjado e indecente, luta muito pela melhoria da sua imagem e
visibilidade. Multiplica os banhos, compra roupa bonita, perfumes e, normalmente, à
noite e quase todos os dias, desloca-se à casa da namorada, pernoitando lá, naquelas
palhotas que os pais constroem para acomodar meninas crescidas, chamadas “tando”.
Vai depois do jantar, das 19 às 21, dependendo da distância, para a jornada nocturna
de namoro. Chegado à zona, onde normalmente o rapaz deve ter um amigo que, a
qualquer momento o pode acomodar e socorrer de alguma coisa, dirige-se ao referido
“tando”, bate à porta, que lhe é aberta, sem nenhuma resistência.
Se, antes da apresentação, o rapaz aparecia às escondidas aos encontros com a sua
namorada, depois daquela todos os obstáculos terão sido removidos, pelo que o
caminho está aberto. E isto, nalguns casos, que não são raros, tem contribuído para a
depreciação do amor e, consequentemente, para o falhanço do projecto matrimonial.
As meninas cujos pais não tenham ainda construído “tandos” e que por isso estejam a
dormir na casa principal onde igualmente pernoitam os pais, namoram ao relento, regra
geral, debaixo de árvores, sendo a cama o tronco do coqueiro inclinado.
As jornadas de namoro são bastante longas e quase cobrem todo o período nocturno
(das 21 as 4,30 horas). Quando o céu começa a clarear, naquela aurora matinal que
anuncia o nascer do sol, o “casal” larga a casota ou o arvoredo de regresso a casa. A
noite seguinte, idem e assim sucessivamente.
Nos casos em que o local de residência do namorado fica perto da casa da futura
esposa, este, nas noites, coabita com a sua namorada, na sua casa. Porém, se por
qualquer motivo, a namorada atrasar a acordar e regressar a procedência, antes de
amanhecer, poderá perder direito a fazê-lo, acabando por permanecer com o namorado
e por esta via, declarar-se casada.
Se isto acontecer, e porque tal irrita os pais da donzela, o namorado já “marido”, envia
os pais para a casa da “esposa” para pedirem perdão pelo erro do filho ao ter retido a
filha antes de terminarem todas as formalidades para a consumação do casamento.
Nesse tempo, os dois parceiros trocam muitos presentes. Enquanto o rapaz compra
capulanas, blusas, atavios, cosméticos, perfumes, peixe, bebidas e outras coisas para
oferecer à noiva, aos futuros sogros e cunhados, ela oferece arroz torrado (“matango”)
ou castanha também torrada, que ela leva pessoalmente à casa do namorado,
transportando a encomenda em cestos de “micomba”, embrulhados em lenços.
Essa encomenda, geralmente, é entregue ao destinatário à tarde. Para o fazer, ela
chega à casa do namorado devidamente aprumada e esta presença reveste-se de
duplo significado. Por um lado, demonstra amor e paixão pelo namorado e, por outro,
confirma e reforça a intenção da menina de contrair matrimónio com o jovem.
Passado algum tempo, e por recomendação dos futuros sogros, o “rapaz“ marca a data
da cerimónia de apresentação dos pais, que se chama “pethe”, o equivalente a troca de
anel, na modernidade. Para esta cerimónia, os pais levam consigo 20 litros de “sura” e
dinheiro no valor variável entre 250 a 500 meticais.
A ida dos pais do namorado à casa da noiva é igualmente informada através dela, com
a necessária antecedência, para evitar surpresas. São recebidos e, como forma de
manifestação de respeito, prepara-se-lhes galinha com arroz, o prato que, na região,
Síntese
BIBLIOGRAFIA
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