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ISSN 1645-4146

Direcção-Geral da Saúde
C a d e r n o s d a

N.º 4 • DEZEMBRO 2004 • PUBLICAÇÃO SERIADA

Índice
Nota de Abertura 02

Padrões de Em Foco
Foco
• Padrões de Reprodução em Idades 03
Jovens

Reprodução em • Doença Meningocócica em Portugal


• Resistência aos Antituberculosos em 14
11

Portugal

Idades Jovens Perspectivas


• Programa de Vigilância 19
Epidemiológica das Doenças
Humanas por Priões
• Radiação Ultra-sónica 21
Foi dito por...
por...
• Dr. Rui Calado 24
• Dr. Alexandre Diniz 26
Notas Breves
Breves 27
Para Ler
Ler 33

Ficha Técnica
Direcção Direcção-Geral da Saúde
e Alto-Comissário da Saúde
Edição Direcção-Geral da Saúde
Alameda D. Afonso Henriques, 45
1049-005 Lisboa
http://www.dgsaude.pt
dgsaude@dgsaude.min-saude.pt
Coordenação Prof. Doutor Valentino Viegas
Revisão Gabinete de Documentação
e Divulgação
Ilustração Vitor Alves
Grafismo Ideias Virtuais
ideiasvirtuais@mail.telepac.pt
Composição e impressão Europress, Lda.
europress@mail.telepac.pt

Tiragem 1500 exemplares


Depósito Legal 180389/02
É permitida a reprodução parcial ou integral dos
artigos publicados, desde que seja feita a indicação
da fonte. Os artigos assinados são da responsabilidade
dos próprios autores, não reflectindo necessariamen-
te os pontos de vista da Direcção-Geral da Saúde.

Ministério da Saúde
Direcção-Geral da Saúde
1
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Nota de Abertura

Mais e Melhor Saúde para T


Todos

O objectivo último de qualquer sociedade civilizada é


proporcionar mais e melhor saúde a todos os seus concidadãos.
Neste mundo, que caminha para a globalização, qualquer
sociedade que queira garantir a sua perenidade terá que se
reproduzir a si própria em termos qualitativos cada vez mais
exigentes.
Sendo os jovens um dos pilares mais importantes da sociedade,
o estudo dos Padrões de reprodução em idades jovens deve ser
encarado como fundamental para cumprir aquele desiderato.
É sabido que a vida humana não tem preço. A sua perda é
tanto mais dolorosa quanto mais tenra for a idade. Por isso,
todas as informações e estudos sobre a Doença Meningocócica
em Portugal são indispensáveis para impedir que as crianças
sejam as principais vítimas daquela doença.
A poderosa arma de prevenção poderá ser utilizada pelas
autoridades de saúde, investindo na investigação sobre a
Resistência aos Antituberculosos em Portugal, acompanhando
de perto o Programa de Vigilância Epidemiológica das
Doenças Humanas por Priões e providenciando no sentido da
utilização criteriosa da Radiação ultra-sónica.
O conhecimento do saber mais actualizado pode ser adquirido
com a participação activa nos eventos que se desenrolam no
país, como o I Encontro Luso-Brasileiro de Epidemiologia e o
Dia Mundial da Osteoporose.
Todas estas acções conjugadas e ainda a criação de um
Observatório para um melhor enquadramento das doenças
profissionais, a definição de uma Estratégia Global de
Alimentação, Actividade Física e Saúde o acompanhamento da
bibliografia sobre Sexo, género e saúde e a actuação contínua
da Comissão de Acompanhamento do Plano Nacional de
Saúde 2004-2010 irão, seguramente, contribuir para
proporcionar mais e melhor saúde para todos.

O Coordenador
Prof. Doutor Valentino Viegas
valentinov@dgsaude.min-saude.pt

2
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

Padrões de
Reprodução em
Repr
Idades Jovens

Ana Rita Laranjeira


Psicóloga Social
Vasco Prazeres
Consultor de Medicina Geral e Familiar
da Divisão de Saúde Materna, Infantil e dos Adolescentes
dgsaude@dgsaude.min-saude.pt

Desde há muito tempo que o fenómeno da gravidez e da materni- mente localizados1; outro, na segunda
dade na adolescência tem sido objecto de estudo e de intervenção metade dos anos 90, coincidindo, em larga
no domínio da saúde. Se, tradicionalmente, era abordado colo- medida, com a entrada na fase “plena” de
cando-se a tónica nos riscos biológicos que comportava para as fertilidade da geração nascida no “pico”
jovens mães e para os nascituros, tal perspectiva tem vindo a de natalidade anterior.
modificar-se ao longo dos anos. Por um lado, estudos mais
Considerando as duas décadas mais re-
recentes apontam para uma maior incidência de casos de restri-
centes2, o fenómeno da natalidade, enca-
ção de crescimento intra-uterino, parto pré-termo e baixo peso ao
rado agora na perspectiva das taxas de
nascer verificada abaixo dos 17 anos; por outro, tem sido consta-
fecundidade específicas3 por idade das
tado que, mediante seguimento e cuidados obstétricos e neonatais
mães, adquire contornos diversos. Se, por
adequados, a morbilidade ligada à reprodução em adolescentes
um lado, na maioria dos grupos etários, a
não se afigura superior à encontrada na população em geral.
diminuição do valor da taxa de fecun-
Acresce também o facto de se valorizar, de forma cada vez mais
didade traduz uma tendência constante,
persistente, as determinantes e as consequências de ordem
noutros (30-34 e 35-39 anos), esta não se
psicoafectiva, socioeconómica, cultural, educativa e laboral da
verifica; pelo contrário, inverte-se no de-
sexualidade e da reprodução nas idades juvenis. Neste contexto –
curso da última década. No que respeita
no qual outros sectores, além da saúde, começam a ter interven-
às idades mais jovens, constata-se, nos 20-
ção crescente – as questões ligadas ao género apresentam-se como
-24 anos, um abrandamento da expressão
uma das áreas merecedoras de maior atenção nos domínios da
dessa tendência, tendo havido, inclusive,
investigação, educação, prevenção e protecção da saúde sexual e
um ligeiro aumento nos anos de 1999 e
reprodutiva, em particular nos jovens. Nesse sentido, torna-se
20004, ao qual se seguiu nova diminuição
cada vez mais pertinente e indispensável, mesmo, encarar o
fenómeno da reprodução em idades jovens, não apenas no plano
dos dados epidemiológicos da maternidade, mas também no dos 1
Trata-se de alterações nos padrões
indicadores da paternidade, enquadrado numa perspectiva comportamentais, nomeadamente na esfe-
relacional mediada pelas dinâmicas sociais e pelas relações de ra sexual e reprodutiva, e de dinâmicas
migratórias decorrentes da descolonização.
género.
2
Os últimos dados disponíveis referem-se
ao ano de 2002.
Maternidade 3
Taxas de fecundidade específicas calcula-
das a partir das estimativas da população
Em Portugal, no decurso das últimas quatro décadas, o número residente em 31.XII de cada ano.
de nascimentos tem vindo a diminuir de forma tendencial, pese 4
Nos mesmos anos, o número absoluto de
embora tenha havido dois períodos esporádicos de aumento: um, nascimentos neste grupo etário aumentou
em meados dos anos 70, atribuível a acontecimentos historica- também.

3
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

/1000
200 nos anos subsequentes, alcançando um
180 valor de 55,1 NV/1000 em 2002. Por outro
160 lado, quanto à taxa de fecundidade dos
140 15-19
20-24
15-19 anos, a progressão decrescente do
120
25-29 respectivo valor parece esbater-se a par-
100 30-34
35-39
tir de 1996, havendo ligeira oscilação num
80
40-44 sentido e no outro; em 2002, a taxa de
60
45-49
40
fecundidade das mulheres neste grupo
20 etário apresentava um valor de 21,4 NV/
0 1000 – gráfico 1.
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DGS/DEST De qualquer forma, entre 1985 e 2002, é
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verificável uma baixa relativa de valores,
Gráfico 1: Taxas de fecundidade específicas por idade das mães quer nos 15-19 anos (35,1%), quer nos 20-
-24 anos (48,3%) – tabela1.
1985 33.9%
0.1% 10.4%
Em termos percentuais, o contributo dado
1986
pelos nascimentos ocorridos em mães de
1987
menos de 25 anos para o total dos nasci-
1988
mentos mantém-se em diminuição cons-
1989
tante desde o início dos anos 80, quer no
1990
grupo dos 15-19, quer no dos 20-24 anos.
1991
A leitura do gráfico 2 permite constatar o
1992
<15 fenómeno a partir do ano de 1985.
1993 15-19
1994 20-24
É de salientar, também, o facto do valor
1995 percentual de nascimentos em mães com
1996 idade inferior a 15 anos não apontar ten-
1997 dência definida. Trata-se de um número
1998 pequeno de casos, em relação ao universo
1999 considerado; porém, face às questões
2000 biomédicas e psicossociais que estas situa-
2001 ções podem colocar, não deixa de ser rele-
2002 18.0% vante atender à casuística verificada –
0.1% 5.8%
gráfico 3.
0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35%

Fonte dos dados brutos: INE Considerando o grupo 15-19 anos, a des-
cida relativa dos nascimentos não tem a
Gráfico 2: Padrões de evolução dos nascimentos (NV) em mães
mesma expressão em todas as idades com-
<25 anos (% total de nados-vivos)
preendidas nesse intervalo – tabela 2. As-
sim, tendo em conta os subgrupos 15-16 e
140
17-19 anos, a diferença relativa entre 1985
120
e 2002 situava-se, no primeiro caso, num
100 valor de 18,2% e, no segundo, de 49,0%.
80
<15
60
Tabela 1
40
Diferença relativa das taxas de fecundidade femini-
20 na nos 15-19 e 20-24 anos, entre 1985 e 2002

0 GRUPO TAXAS DE FECUNDIDADE


ETÁRIO 1985 2002 DIF.ª %
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Fonte dos dados brutos: INE 15-19 32,95 21,40 35,1

Gráfico 3: Número de nascimentos (NV) em mães <15 anos 20-24 106,52 55,10 48,3

(1985-2002) Fonte dos dados brutos: INE

4
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

60%
Tabela 2
Diferença relativa do valor percentual de nascimen-
50% tos (NV) em mães 15-16 e 17-19 anos, entre 1985
15-19

40%
20-24 e 2002
25-29
30-34
30% SUBGRUPO % DE NASCIMENTOS
35-39

20%
40-44 ETÁRIO 1985 2002 DIF.ª %
>45

10%
Ign. 15-16 1,1 0,9 18,2

0%
17-19 9,8 5,0 49,0
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Fonte dos dados brutos: INE
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Fonte dos dados brutos: INE

Gráfico 4: Padrão de evolução dos nascimentos (NV) em mães


biológico associados à reprodução, ao con-
15-19 anos, por idade dos pais (%)
trário do que se verifica nas mulheres;
contudo, não deixa de ser pertinente, por-
que necessário, aprofundar a investigação
50% e tomar medidas que permitam atender ao
impacto psicoafectivo e social que o
40%
15-19
20-24
fenómeno também gera nos progenitores
30% 25-29 do sexo masculino6.
30-34
35-39
20%
40-44 Conforme decorre da leitura do gráfico 6,
>45
10% Ign.
a tendência da evolução das taxas de
fecundidade masculina nos 15-19 e 20-24
0%
anos acompanha, em termos gerais, a en-
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contrada nas mulheres, nos mesmos gru-


Fonte dos dados brutos: INE pos etários. Apurados, em 1985, valores
de 68,0 e de 6,4 NV/1000 nos homens de
Gráfico 5: Padrão de evolução dos nascimentos (NV) em mães 20-24 e 15-19 anos, respectivamente, o
20-24 anos, por idade dos pais (%) decréscimo gradual conduziu a taxas de
32,9 e 5,5 NV/1000, em 2002, para as
mesmas idades7.
Atente-se, de seguida, na variável “idade do pai” na evolução dos
padrões da reprodução feminina em idades jovens5. Assim, da
análise da progressão do valor percentual de nascimentos em
mães nestes grupos etários, em função da idade dos pais, salienta-
-se o facto de não serem observáveis alterações de monta no 5
As estatísticas da paternidade disponíveis
decurso da última década – gráficos 4 e 5. Contudo, parece apresentam como limite etário inferior o
desenhar-se um afastamento na idade de mães e pais, nos nasci- grupo “<20 anos”; contudo, neste docu-
mento, a fim de harmonizar as idades
mentos em mulheres de 20-24 anos, à custa do aumento da idade
consideradas em ambos os sexos, adopta-
dos homens – gráfico 5. -se a designação “15-19 anos” também
nos dados da paternidade.
Merece destaque, ainda, o facto da percentagem de nascimentos
6
em que a idade do pai é ignorada evidenciar estabilidade na Está-se em presença de um número signi-
ficativo de jovens que, anualmente, se tor-
última década, em ambos os grupos em estudo, embora com maior nam pais, embora com tendência a dimi-
expressão percentual nos nascimentos ocorridos em mães de 15- nuir; em 1985, era de 28464, no grupo 20-
-19 anos, apresentando, neste caso, uma variação entre 6,9 e 8,9% -24 anos, e de 2711 no dos 15-19 anos, ao
passo que, em 2002, cifrava-se em 12602
e, no grupo etário acima, entre 2,9 e 3,9% – gráficos 4 e 5.
e 1772, respectivamente.
7
Trata-se de um indicador cuja constru-
Paternidade
ção apresenta menor fidedignidade do que
Tomem-se em consideração, de seguida, os dados referentes à o equivalente feminino (dificuldades rela-
cionadas com o rigor na atribuição de
paternidade em idades jovens, realidade que tem merecido estudo
paternidade, etc.) não deixando, contudo,
pouco aprofundado até ao momento presente. No caso dos ho- de se considerar ser de interesse a sua
mens, não se está, obviamente, em presença de riscos de carácter utilização.

5
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

120 Tabela 3
Diferença relativa das taxas de fecundidade mascu-
100
lina nos 15-19 e 20-24 anos, entre 1985 e 2002
80
15-19 M GRUPO TAXAS DE FECUNDIDADE
60
20-24 M ETÁRIO 1985 2002 DIF.ª %
15-19 H
20-24 H 15-19 6,4 5,5 14,1
40
20-24 68,0 32,9 51,6
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DGS/DEST
Esta evolução nos padrões de fecundidade
Gráfico 6: Padrões de fecundidade feminina e masculina (1985-2002) masculina corresponde a um decréscimo
relativo, entre 1985 e 2002, de 14,1% nos
15-19 e de 51,6% nos 20-24 anos – tabela 3.
1985 2.1% 21.8%
Em termos percentuais, constata-se um
1986
decréscimo gradual dos nascimentos em
1987
pais <25 anos, com valores extremos no
1988 grupo 20-24 anos de 21,8 em 1985 e 11,0
1989 em 2002. No grupo 15-19 anos, embora se
1990 verifique uma evolução no sentido descen-
dente dos valores relativos de 1985 (2,1%)
1991
para 2002 (1,5%), tal não se afigura siste-
1992
mático, considerando ano após ano – grá-
1993 fico 7.
15-19
1994
20-24 Tome-se em atenção, ainda, a variável “ida-
1995 de da mãe”, à semelhança do que se fez a
1996 propósito da evolução da maternidade
1997 juvenil em função da idade do progenitor.
Assim, desde a década de 90, em relação
1998
aos pais no grupo 15-19 anos, não parece
1999
constatar-se alteração de relevo no que
2000 respeita à distribuição etária das mães das
2001 crianças; cerca de 70% destas tem, tam-
2002
11.0% bém, entre 15 e 19 anos, enquanto que a
1.5%
percentagem das que se situam no grupo
0% 5% 10% 15% 20% 25%
etário imediatamente superior tem oscila-
Fonte dos dados brutos: INE
do entre 24 e 28%, sem tendência de evo-
Gráfico 7: Padrões de evolução dos nascimentos (NV) em pais lução evidente – gráfico 8.
<25 anos (% total de nados-vivos)
No que respeita a pais de 20-24 anos, a
80%
percentagem de nascimentos em que a
70%
<15
mãe se encontrava no mesmo grupo etário
60%
15-19 tem sido superior a 50% desde há vários
50% 20-24
25-29
anos; contudo, nos últimos cinco, verifica-
40%
30-34 -se um decréscimo nesta associação, à cus-
30% 35-39
40-44
ta, sobretudo, da subida verificada nas
20%
>45 mães de 25-29 anos. Assim, do total de
10%
nascimentos em pais daquele grupo etário,
0%
o valor percentual de mães de 20-24 anos,
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de 1997 a 2002, baixou de 57,1 para 50,5%,


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Fonte dos dados brutos: INE


ao passo que o de mães de 25-29 anos
Gráfico 8: Padrão de evolução de nascimentos (NV) em pais aumentou de 14,6 para 18,6%, no mesmo
de 15-19 anos, por idades das mães (%) período – gráfico 9.

6
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

70%
Assim, quanto aos nascimentos ocorridos
60% em pais de 15-19 anos, em cerca de 70%
<15
50% 15-19 dos casos a mãe pertencia ao mesmo grupo
20-24
40% etário; em 24% das situações situava-se no
25-29

30% 30-34 intervalo 20-24 anos e 1,2% tinha mais de


20%
35-39
30 anos. Quanto a nascimentos respeitantes
40-44

>45
a pais de 20-24 anos, em 26% das ocorrên-
10%
cias a mãe encontrava-se no grupo 15-19
0%
anos, em 50% no de 20-24 anos e, em 1%
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dos casos, no das maiores de 35 anos –
Fonte dos dados brutos: INE
gráfico 10.
Gráfico 9: Padrão de evolução dos nascimentos (NV) em pais
Quanto a nascimentos ocorridos em mães
de 20-24 anos, por idade das mães (%)
de 15-19 anos, em cerca de 19% dos casos
o pai pertencia ao mesmo grupo etário; em
50% das situações, a idade do progenitor
80%
70.1% situava-se entre os 20 e os 24 anos e em
70%
2,5% era superior a 35 anos. No caso das
60%
50.5% mães de 20-24 anos, em 31% dos nas-
50%
cimentos ocorridos o pai pertencia ao
40% 15-19
mesmo grupo e em 46% ao imediatamen-
30% 26.0% 20-24
23.8%
18.6% te superior, situando-se 2% no extremo
20%
do leque etário (acima de 40 anos) – grá-
10% 3.5% 3.6%
1.1% 0.1%1.1% fico 11.
0%
15-19 20-24 25-29 30-34 >35
Idade da mãe
Fonte dos dados brutos: INE
Geografia dos nascimentos, situa-
ção escolar e condição perante o
Gráfico 10: Nascimentos (NV) em pais <25 anos, por idade das
trabalho de mães e pais jovens
mães (%) 2002
Geografia dos nascimentos

O estudo do fenómeno da reprodução em


50% 49.3% idades jovens não se esgota na caracteri-
45.8%
45% zação dos intervenientes sob o ponto de
40% vista da distribuição etária. Justifica-se,
35%
30.9%
cada vez mais, proceder a uma abordagem
30% integrada e compreensiva dos contextos e
25% das determinantes que confluem para a
15-19
20% 18.7% 18.2%
20-24 ocorrência do mesmo.
15% 13.3%
Tal necessidade pode ser sugerida a partir,
10%
7.0%
4.3% 3.2%
por exemplo, da análise comparativa dos
5% 2.1% 2.9%
1.6% 1.8%
0.9% dados distritais de 2002 quanto a taxas de
0%
15-19 20-24 25-29 30-34 35-39 >40 Ign fecundidade e a distribuição percentual
Idade do pai
dos nascimentos ocorridos em mães em
Fonte dos dados brutos: INE
idade jovem. A observação dos gráficos 12
Gráfico 11: Nascimentos (NV) em mães <25 anos, por idade dos e 13 permite verificar a posição relativa
pais (%) 2002 dos distritos, no que respeita à distribui-
ção dos valores referentes a estes indica-
dores. A comparação e interpretação des-
A discrepância entre a distribuição etária dos progenitores, tes dados não pode ser efectuada de forma
consoante se considere os nascimentos em mães ou pais <25 anos, linear, sem que tenham sido ponderadas
pode tornar-se mais evidente quando comparados os valores outras variáveis respeitantes, por exem-
observados num ano, por exemplo o de 2002. plo, a estrutura da pirâmide etária e dinâ-

7
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

micas populacionais, fenómenos conjunturais, características e Pondere-se, de seguida, o grau de instrução


diversidades étnicas, religião, especificidades locais, urbaniza- de mães e pais de menos de 25 anos que
ção, etc. A compreensão do padrão reprodutivo nas idades jovens tiveram filhos no ano de 2002, a nível
não pode ser dissociada destes parâmetros. nacional. Tal como pode constatar-se na
tabela 4, os pais apresentavam, regra ge-
Se se atender às taxas de fecundidade no grupo 15-19 anos, no ano
ral, um grau de escolaridade inferior ao
considerado, os distritos/regiões autónomas (RA) de Açores, Beja,
das mães, em ambos os grupos etários
Faro, Madeira e Portalegre posicionam-se, de forma evidente,
estudados. Das mães com menos de 20
acima do valor encontrado a nível nacional; ao contrário, os
anos, cerca de um quinto terminara, no
distritos de Braga, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e
máximo, o 1.º ciclo do ensino básico (1,7%
Viana do Castelo situam-se no extremo oposto – gráfico 12. não sabia ler nem escrever)9. No mesmo
80 grupo etário, os pais que estavam em iguais
70 circunstâncias representavam um quarto
60
15-19
do total (2,1% não sabia ler nem escrever).
50

40
20-24 No grupo etário seguinte, estes valores
Tx fec nac 15-19
30 Tx fec nac 20-24 relativos eram ligeiramente inferiores em
20
ambos os sexos. No que respeita ao com-
10

0
pletar da escolaridade obrigatória, no caso
das mães com menos de 20 anos, menos de
ga

ça

Ca o
Vi lo

al
iro

Co co

G a
a

u
Sa boa

ém

l
ja

re

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Le

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ua

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P


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ag

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la

Br

nt

Se

rt
Br

metade conseguira-o e, no grupo das de


o
el
a

Ca
an

DGS/DEST/DSMIA
Vi

20-24 anos, cerca de 56% estava nestas


Gráfico 12: Taxas de fecundidade feminina por grupo etário e distrito circunstâncias; no caso dos pais, os valo-
2002 res observados eram inferiores aos verifi-
cados nas mães, na ordem dos 7%, em
ambos os grupos etários.
Considerando os valores percentuais da natalidade efectiva por
distrito, no mesmo ano e grupo etário, os distritos/RA de Açores, Tabela 4
Grau de instrução de mães e de pais, por grupo
Beja, Bragança, Madeira e Portalegre assumem posição de relevo etário (%)
particular acima da percentagem a nível nacional, estando em
2002
situação oposta Braga, Coimbra, Leiria, Lisboa e Viana do Cas-
MÃE PAI
telo – gráfico 13. GRAU DE INSTRUÇÃO <20 20-24 <20 20-24
Não sabe ler nem
25%
escrever 1,7 0,8 2,1 0,8
Sabe ler sem
20%
frequentar ensino 1,2 0,6 1,5 1,0
15% 15-19 Ens. básico – 1.º ciclo 15,7 12,9 21,3 15,1
20-24
% nacional NV 15-19
Ens. básico – 2.º ciclo 35,1 29,4 35,4 34,2
10%
% nacional NV 20-24 Ens. básico – 3.º ciclo 33,9 28,0 29,8 29,8

5%
Ensino secundário 12,4 24,8 9,9 17,4
Ensino superior 0 3,5 0 1,7
0%
Fonte dos dados brutos: INE
ag a
ça

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Vi elo

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Co co

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im

ua

Vi
Br

ad
s


al
la

Br
Br

el
a

Ca
an
Vi

DGS/DEST/DSMIA 8
Tendo em conta a especificidade destes
indicadores, nomeadamente a estreita as-
Gráfico 13: Nascimentos (NV) em mães <25 anos, por distrito (%) sociação destes com a idade, consideram-
2002 -se na análise os grupos “<20 anos” e “20-
-24 anos”, em ambos os sexos.
9
O facto de cerca de 19% das mães com
Grau de instrução e condição perante o trabalho 8 menos de 20 anos não ter completado o 2.º
ciclo merece ponderação ao constatar-se
Aquando do estudo da maternidade e da paternidade juvenis, que cerca de quatro quintos dos nascimen-
tos neste grupo ocorrem em mães de 17-19
outros exemplos de indicadores a ponderar são o grau de instrução
anos, idade em que, teoricamente, já o
e a condição perante o trabalho de ambos os progenitores. teriam concretizado.

8
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

No que se refere à condição de mães e pais perante o trabalho, em As taxas de fecundidade específicas nas
termos genéricos, são notórias diferenças entre homens e mulhe- mulheres mais jovens têm apresentado
res, nos dois grupos etários. Assim, tomando em consideração o declínio nos valores atingidos, embora com
ano de 2002, verifica-se que, no grupo de menos de 20 anos, 60% abrandamento desta tendência no decur-
das mães encontrava-se no grupo “não activa”10 (apenas 30% so dos últimos anos. Abaixo dos 15 anos,
correspondia ao item “empregada”), ao passo que, no grupo idades em que os valores absolutos são
etário acima, a situação alterava-se, estando 60% das mães na pequenos quando comparados com os de
condição de “empregada” e 32% na de “não activa”. No caso dos escalões etários superiores, tal evolução
homens, no grupo dos menores de 20 anos, 77% estava em não se verifica.
situação de “empregado”, valor que aumentava para 92% no
Em relação ao total de nascimentos ocor-
grupo de 20-24 anos (na condição de “não activo” 18%
ridos, quando ponderados os valores
correspondia a <20 anos e 5% ao grupo 20-24 anos)11. Deste
percentuais, a natalidade em mulheres de
modo, constata-se, também, a discrepância evidente na situação
15-19 e de 20-24 anos tem vindo a baixar
perante o trabalho entre pais e mães, em cada um dos grupos
de forma sistemática.
etários considerados – gráficos 13 e 14.
No que respeita aos padrões reprodutivos
<20 anos 20-24 anos nos homens, afigura-se pertinente salien-
29,5% 32,2%
tar que a tendência evolutiva das taxas de
fecundidade específicas para os grupos
etários 15-19 e 20-24 anos acompanha, em
4,0% 60,3%
60,1%
6,5%
6,3%
1,3%
traços gerais, a verificada para as mulhe-
Empregada Empregada
res nas mesmas faixas etárias.
Procura 1.º emprego Procura 1.º emprego
Procura novo emprego Procura novo emprego
Não activa Não activa Se se atender aos valores percentuais da
Fonte dos dados brutos: INE paternidade abaixo de 25 anos em relação
ao total de nascimentos, a evolução des-
Gráfico 14: Condição da mãe perante o trabalho, por grupo etário (%) cendente daqueles torna-se também evi-
2002 dente no caso dos pais de 15-19 anos, se
bem que não sistemática quando tomada
<20 anos 20-24 anos em conta ano após ano.
18% 1% 2% 5%
3% Considerando, em simultâneo, a idade do
2%
pai e da mãe, a distribuição etária e o
padrão evolutivo da mesma não se afigura
77%
simétrica entre sexos, nos dois grupos
92%

Empregado Empregado
etários. Dos nascimentos de mães de 15-19
Procura 1.º emprego
Procura 1.º emprego
Procura novo emprego Procura novo emprego anos, cerca de metade diz respeito a pais
Não activo Não activo
de 20-24 anos, relação da mesma ordem de
Fonte dos dados brutos: INE
grandeza da encontrada nos casos ocorri-
Gráfico 15: Condição do pai perante o trabalho, por grupo etário (%) dos em mães de 20-24 anos e pais de 25-29
2002 anos. No que se refere aos homens, salien-
te-se que, em quase três quartos dos nas-
cimentos em pais de 15-19 anos, as mães
Algumas conclusões
Face aos valores apurados, parece ser possível retirar algumas
indicações que merecem ser ponderadas, enquanto contributo 10
No grupo “não activo (a)” estão incluídos
para o desenvolvimento de políticas e programas de saúde os que se encontram na situação “estudan-
reprodutiva juvenil cada vez mais adequados. te”.
11
Cruzando os dados deste indicador com
Assim:
os referentes ao grau de instrução, apre-
Em Portugal, o número de nascimentos tem vindo a baixar no sentados atrás, merece reflexão a possibili-
dade de se revestir de precariedade e baixa
decurso das últimas décadas. Simultaneamente, verifica-se uma diferenciação a actividade laboral exercida
deslocação progressiva dos mesmos para idades mais avançadas. por estes jovens.

9
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

encontravam-se no mesmo grupo etário; no caso dos de 20-24 Contudo, se bem que as questões de género
anos, cerca de metade das mães encontra-se na mesma faixa de que sustentam tais iniquidades se reper-
idades. No mesmo período, constatou-se uma evolução crescente cutam transversalmente na sociedade,
da percentagem, quer de pais, quer de mães de 20-24 anos que se nunca será demais salientar a pertinência
reproduzem tendo por parceiros indivíduos do escalão etário de serem equacionadas, de forma sistemá-
superior. tica, em conjunto com outras deter-
minantes, tais como a pobreza, a ilitera-
Quando analisada a variável distribuição geográfica por distritos,
cia e outros factores do contexto sociocul-
torna-se evidente a heterogeneidade dos valores observados, o
tural.
que aponta para a necessidade de se investigar características
específicas que concorram para tal diversidade.
O estudo de outros indicadores, a nível nacional, tais como
Agradecimentos
situação escolar e condição perante o trabalho das jovens mães e Os autores agradecem as críticas, suges-
dos jovens pais, permite apontar outras assimetrias entre os dois tões e comentários produzidos por:
grupos etários estudados e, de uma forma mais impressiva, entre
Amélia Esparteiro Leitão
sexo feminino e sexo masculino. Assim, verifica-se que as mães
Beatriz Pieroni Calado
detêm, em média, um grau de escolaridade superior aos pais da
Luísa Maria Branco
mesma faixa etária, ao passo que a condição de “trabalhador(a)”
Maria Otília Duarte
é significativamente mais frequente no caso masculino em ambos
Maria Teresa Martins
os grupos de idades.

Notas finais
Os discursos médicos sobre a maternidade na adolescência, que
de início colocavam a tónica, quase exclusiva, nos riscos biológi- Bibliografia
cos associados à gestação e ao parto, têm vindo a sofrer evolução Campos J, Costa E, Faria C. Filhos de mães
no sentido de ponderar factores de ordem psicoafectiva e adolescentes. Nascer e Crescer 2003; XII
(3): 146-150
socioeconómica na abordagem ao fenómeno. Neste contexto, ape-
Faria JM. Gravidez na Adolescência – estu-
sar de em Portugal ser detectável a valorização pontual da
do retrospectivo em mães com menos de
participação dos homens nas questões de saúde sexual e 18 anos, 1995 (Tese de Mestrado pela Fa-
reprodutiva, tais iniciativas contemplam de forma incipiente a culdade de Medicina, Universidade de
Coimbra, manuscrito não publicado)
intervenção daqueles enquanto protagonistas.
INE. Estatísticas Demográficas (vários anos)
Tal como as mulheres, os homens apresentam necessidades espe-
Leitão AE. Nascimentos em Portugal de
cíficas nestas matérias e torna-se necessário entendê-los não mães de menos de 20 anos. Saúde em
apenas como interlocutores daquelas – ou como complemento das Números 1989; 4: 25-27
análises sobre maternidade –, mas também enquanto verdadeiros Prazeres V. Saúde Juvenil no Masculino –
parceiros nestes domínios. género e saúde sexual e reprodutiva, 2003,
Direcção-Geral da Saúde, Lisboa
É nesta contradição que a Saúde se encontra, entre desejo de
Santana C, Severo R, Gomes Z, Fernandes I,
incrementar a participação dos homens nesta área da promoção Dias H, Figueiredo A, Ribeiro E. Gravidez na
da saúde e a carência de saberes acerca das especificidades Adolescência – uma análise retrospectiva.
Revista de Saúde 1999; 4 (1): 24-34
masculinas que possam contribuir para tal.
Santos RS. Gravidez em Mães Adolescentes
Melhorar a capacidade de resposta às necessidades masculinas – estudo no distrito de Beja 1986-1991.
nestes domínios afigura-se ser, também, uma forma de minorar as Acta Médica Portuguesa 1997; 10: 681-688
iniquidades ligadas ao género – em particular no domínio da Social Exclusion Unit. Teenage Pregnancy.
saúde sexual e reprodutiva – que continuam a condicionar ambos London, 1999
os sexos, ainda que com contornos diferentes. Valente Rosa MJ, Vieira C. A população
portuguesa no século XX, 2003, ICS, Lisboa
Os estudos epidemiológicos, ao permitirem caracterizar melhor
WHO. Gender Analysis in Health. A review
alguns aspectos da reprodução nos homens, nomeadamente os of selected tools, 2002, WHO, Geneva
jovens, podem ser um contributo de relevo para minorar, nestes
WHO. Integrating Gender Perspectives in
domínios, diversas formas de assimetria entre sexos. the Work of WHO, 2002, WHO, Geneva

10
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

Doença Meningocócica em P
Portugal
Algumas considerações sobre a situação observada em 2003

Dr. Rui Calado


Director de Serviços de Informação e Análise da Direcção-Geral da Saúde
rcalado@dgsaude.min-saude.pt
Dr.ª Graça Freitas
Chefe de Divisão das Doenças Transmissíveis
Dr.ª Cristina Furtado (INSA)
Dr.ª Maria João Simões (INSA)
Dr.ª Ana Meireles da Divisão de Doenças Transmissíveis

À data em que, no âmbito do Programa de Vigilância todo o ano, qualquer situação epidémica
Epidemiológica Integrada da Doença Meningocócica, se deu por justificativa da adopção de cuidados espe-
terminada a recolha de dados relativos ao ano de 2003 (30 de ciais, para além dos que estão estabeleci-
Março de 2004), tinham sido registados 209 casos em todo o país, dos como procedimentos habituais na pre-
o que significa que a Taxa de Incidência foi de 2,1 casos por sença de casos isolados de doença.
100 000 habitantes/ano.
O registo da incidência acumulada, relati-
Os valores mais elevados da incidência semanal da doença vo a 2003 e ao triénio anterior (2000-
meningocócica (10 casos), ocorreram na 13.a e na 51.a semanas de -2002), é sugestivo da ocorrência de uma
2003 (Fig. 1). Nos meses mais quentes do ano, entre a vigésima e diminuição da frequência de casos ao lon-
a quadragésima semanas, foi muito baixo o número de casos go de todo o ano, a mais baixa nos 4 anos
notificados (44 casos em 20 semanas). considerados (Fig. n.o 3).
A frequência de casos observada, esteve
12 de acordo com a variação sazonal habitual
nesta doença, tendo-se registado 121 ca-
10
sos no primeiro semestre do ano de 2003
N de c as os / s emana

8
(58%) e apenas 88 no segundo semestre
(42%).
6

4
.
o

0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
11

Número da semana

Figura 1: Doença meningocócica


Incidência semanal, no ano de 2003

Ao longo do ano, um dos métodos utilizados na vigilância da


doença constou da análise sistemática da informação obtida
através do registo da frequência semanal de casos no corredor
endémico da doença meningocócica em Portugal, construído a
partir dos dados disponíveis relativos ao triénio 2000/2002. Con-
forme se pode observar na figura n.o 2, não houve, ao longo de

11
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

30
zona de alerta
Em 2003, o número de meningites
25 Zona epidémica
zona de segurança
zona de êxito
correspondeu a 44% do total dos casos de
2003 doença meningocócica diagnosticados, o
Número de c as os

20
de sépsis meningocócica a 33% e o diag-
15
nóstico de meningite e sépsis (conco-
10 mitante) ocorreu apenas em 14% do total
de casos registados (Fig. 4).
5

A percentagem de meningites e de sépsis


0
ocorridas no primeiro e no segundo se-
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10

12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
11

Número da semana
mestre é semelhante nas duas entidades
Figura 2: Corredor endémico da DM em Portugal (2000/02) nosológicas (cerca de 60% e de 40%, res-
Evolução da incidência semanal em 2003 pectivamente).
450
No 1.o semestre de 2003, do conjunto de
400 2003
2002 casos de doença meningocócica com con-
350
2001
firmação laboratorial do serogrupo, a
Número de c as os

300 2000

250
maioria teve por agente causal a Neisseria
200 meningitidis do serogrupo C (50%). A
150 Neisseria meningitidis do serogrupo B foi
100 responsável por 44% dos casos e “outros
50
serogrupos” (A e W135) foram identifica-
0
dos em 7% dos casos (Fig. 5).
12-Out

27-Out
12-S et

27-S et
14-J un

29-J un

13-A go

28-A go
1-J an

16-J an

31-J an

15-A br

30-A br

14-J ul

29-J ul
15-F ev

15-Mai

30-Mai

26-Nov
1-Mar

16-Mar

31-Mar

26-Dez
11-Nov

11-Dez

No 2.o semestre de 2003, estas proporções


Figura 3: Doença Meningocócica modificaram-se de forma acentuada.
Incidência acumulada em 2003 e no triénio anterior Assim, no conjunto de casos de doença
100
meningocócica com confirmação labora-
91 torial do serogrupo, houve uma clara pre-
90
Semestre 2
80
Semestre 1 dominância da Neisseria meningitidis do
70 37
70 serogrupo B, identificada em 67% dos
Núme ro de c as os

60
30 casos, enquanto que apenas 30% dos do-
50
entes tiveram como agente causal bacté-
40

30
29 rias do serogrupo C e em 3% dos casos
54 19
20 40
10 foram identificados “outros serogrupos”.
11
10 19 Os dados globais para 2003 revelam pre-
8
0
Sépsis Meningite Sép+Mening S/ diagn
dominância do serogrupo B, com 54% dos
casos, sendo as percentagens do serogrupo
Figura 4: Doença Meningocócica C e dos “outros serogrupos” de, respecti-
Número de casos por semestre, segundo o diagnóstico diferencial vamente, 41% e 5%.
80
71 72
70 Semestre 2 Caracterização antigénica N.º de casos
Semestre 1
60 C:2b:P1.5 19
54 30
Núme ro de c a sos

50 38 B:NT:NST
B:NT:NST 9
17 B:NT:P1.15
B:NT:P1.15 7
40
B:1:NST 6
30
B:NT:P1.14
B:NT:P1.14 5
20 42 Outros 27
33 37
10 7 ----- -----
5
0
5 4 TOTAL
TOTAL 73
Serogr.. B
Serogr Serogr.. C
Serogr Outro serogr.
serogr. Não grupável Não determ. Fonte: INSA (Instituto Nacional de Saúde)

Figura 5: Doença Meningocócica Figura 6: Caracterização antigénica da


Número de casos por semestre, segundo o serogrupo estirpe (Ano de 2003)

12
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

A caracterização antigénica sistemática das estirpes estudadas no


INSA proporcionou a identificação de 38 serotipos diferentes,
pertencentes aos serogrupos A (1), B (21), C (31) e W135 (4).
Manteve-se clara a predominância do padrão serológico C:2b:P1.5,
com mais de ¼ do total de casos caracterizados e com mais de 60%
do total de casos pertencentes ao serogrupo C (Fig. 6).
A percentagem de casos de doença meningocócica registados em
2003 na base de dados do Programa de Vigilância Epidemiológica,
com base apenas no seu diagnóstico clínico e, portanto, sem
confirmação laboratorial, foi de 37%. Em 35% desses casos, não
parece ter havido intervenção do laboratório na determinação do
agente causal (Quadro I).

Quadro I
Número de casos de DM em 2003, por serogrupo e diagnóstico

DIAGNÓSTICO SEROGRUPO SEROGRUPO OUTROS NÃO NÃO TOTAL


B C (A, Y…) GRUPÁVEL DETERM.
Meningite 27 21 2 1 40 91
Sépsis 16 19 3 2 30 70
Meningite+Sépsis 16 11 0 0 2 29
Desconhecido 12 3 2 2 0 19
Total 71 54 7 5 72 209
Fonte: Direcção-Geral da Saúde – Lisboa

Da análise da distribuição dos casos de doença por grupo etário,


há a referir como relevante que 61% dos casos e 68% dos óbitos
ocorreram em crianças com idade inferior a 5 anos. 23% dos casos
e 41% dos óbitos ocorreram em crianças que não haviam ainda
completado o seu primeiro ano de vida (Quadro n.o II).

Quadro II
Número de casos e de óbitos de DM em 2003, por serogrupo e grupo etário

GRUPO SEROGRUPO B SEROGRUPO C OUTROS SEROG. N/IDENT.-N/DETERM TOTAL


ETÁRIO CASOS ÓBITOS CASOS ÓBITOS CASOS ÓBITOS CASOS ÓBITOS CASOS ÓBITOS
<1 26 5 9 1 0 0 13 3 48 9
1–4 28 0 17 0 2 0 33 6 80 6
5-9 10 0 10 0 0 0 9 0 29 0
10 - 14 1 0 4 0 0 0 5 0 10 0
15 - 19 0 0 5 0 1 1 7 1 13 2
20 - 24 1 0 1 1 0 0 1 0 3 1
25 E+ 4 1 8 1 3 0 7 2 22 4
Desconh. 1 0 0 0 1 0 2 0 4 0
Total 71 6 54 3 7 1 77 12 209 22
Fonte: Direcção-Geral da Saúde - Lisboa

Em 2003, a Taxa de Letalidade foi de 10,5% e apenas em 45% dos


casos foi obtida confirmação laboratorial do agente causal. Nestes,
1 caso foi identificado como resultante da acção de Neisseria
meningitidis do serogrupo W135, 3 casos do serogrupo C e 6 do
serogrupo B. Destes, 5 ocorreram em crianças com menos de 1 ano.

13
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

Resistência aos Antituberculosos


Antituber em
Portugal
Dr. António Fonseca Antunes
Coordenador do Programa Nacional de Luta Contra a Tuberculose
Direcção de Serviços de Promoção e Protecção da Saúde
afantunes@dgsaude.min-saude.pt

A expansão da vigilância a outras regiões


e a monitorização nas regiões com análise
já iniciada foram consideradas iniciativas
de alta prioridade, com o objectivo de se
acompanhar a evolução da prevalência e
estudar a correlação entre a magnitude da
resistência e os métodos de controlo da
tuberculose (TB).
A situação de Portugal é a mais grave
entre os países da Europa Ocidental, jus-
tificando-se plenamente seguir a iniciati-
va DOTS-PLUS da OMS para a gestão da
TBMR com intervenções programáticas
adequadas2. Neste sentido, e no âmbito do
desenvolvimento do Programa Nacional
da Tuberculose (PNT), foi decidido aderir
ao sistema de vigilância da resistência aos
Antituberculosos na Europa, mediante a
realização, a nível nacional, de Testes de
Sensibilidade aos Antibióticos (TSA) em
todos os isolados de Mt3.

Mecanismo de desenvolvimento e
disseminação da resistência
A resistência aos AT, na sua dimensão
clínica e epidemiológica, não é mais do que
Enquadramento a amplificação de um fenómeno natural
Em 1997, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a International por intervenção do homem – através do
Union Against Tuberculosis and Lung Disease (IUATLD) coorde- uso dos antibióticos.
naram o primeiro relatório sobre os dados de um estudo sobre a Estima-se que a prevalência de bacilos
resistência aos antituberculosos (AT), realizado entre 1994 e com resistência natural à Rifampicina (R)
1996, em 35 regiões, cobrindo 16% dos casos notificados em todo seja de 1 em 108 bactérias e à Isoniazida
o mundo1: Global Project on Anti-Tuberculosis Drug Resistance (H) de 1 em 106. Como as lesões pulmona-
Surveillance. res cavitadas têm frequentemente mais de
Em todas as regiões estudadas se encontrou resistência, e a 107 bacilos, a presença de mutantes resis-
tuberculose multirresistente (TBMR) – resistência, pelo menos, à tentes é inevitável. Se não houver acção
Isoniazida (H) e à Rifampicina (R) simultaneamente – aparece dos antibióticos, estes bacilos resistentes
como um problema importante em várias regiões. ficam diluídos no contingente de bactérias

14
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

sensíveis. Porém, a presença de antibióticos exercerá uma pressão objectivo essencial, na perspectiva do tra-
selectiva, levando à preponderância dos resistentes, particular- tamento individual. O controlo da
mente nas lesões com grande carga bacilar. multirresistência numa comunidade as-
senta primordialmente na sua prevenção.
O tratamento irregular, resultante da deficiente qualidade dos
fármacos, da má prescrição ou da má aderência por parte do A avaliação das resistências aos antitu-
doente, acaba por se tornar frequentemente em autêntica berculosos, através do Sistema de Vigilân-
“monoterapia”, provocando a supressão do crescimento dos bacilos cia da Tuberculose SVIG-TB, em sintonia
sensíveis e, permitindo desta forma, a multiplicação dos resisten- total com a vigilância estandardizada e
tes – Resistência Adquirida. coordenada pela EuroTB/OMS, visa co-
A transmissão destes bacilos resistentes a outra pessoa irá provo- nhecer a dinâmica daquele que se pers-
car doença com resistência à partida – Resistência Primária. pectiva vir a ser o maior desafio no con-
trolo da tuberculose. O desejável aumento
A resistência espontânea a mais do que um antibiótico é virtual- da cobertura dos testes de sensibilidade
mente impossível, uma vez que não há um gene único envolvido (presentemente recomendados a todos os
no processo, e as mutações que levam à polirresistência são isolados de Mt) e o aperfeiçoamento dos
geneticamente distintas. Torna-se por isso bastante improvável sistemas de cruzamento da informa-
que, por exemplo, aconteça o desenvolvimento de 1 bacilo em 1014 ção clínica-laboratorial irão, a curto pra-
resistente simultaneamente à H e R (multirresistente). Por outras zo, fornecer meios para o estudo das
palavras, a probalidade de mutações espontâneas levarem à determinantes decisivas no modelo de de-
multirresistência é o produto das probalidades individuais para senvolvimento e transmissão da TB resis-
H e para R, ou seja, 106 x 1014. Portanto, o desenvolvimento da tente.
multirresistência não é um fenómeno espontâneo. Resulta sempre
da acção de regimes terapêuticos inadequados. Enquanto por todo o mundo, e em diver-
sos contextos epidemiológicos, se efectu-
Para além dos factores estritamente biomédicos, numa determi- am estudos para definir as determinantes
nada população, a emergência de estirpes de Micobacterium da resistência, entendemos que há dois
tuberculosis resistentes está associada a uma série de factores de
aspectos que devem prevalecer na mente
gestão, de recursos de saúde e de factores psicossociais4.
dos profissionais que, de uma ou outra
Após o aparecimento dos casos com resistência adquirida, torna- forma, podem ser agentes no modelo
-se possível a infecção de outras pessoas, originando casos novos, determinístico da resistência aos AT:
com resistência, que por sua vez podem infectar outros, dando
• Primeiro, não se pode falar num só
origem a mais e mais casos novos com resistência primária. A TB
factor, mas sim num conjunto interactivo
resistente primária torna-se, assim, tanto mais predominante
(como o fazem notar os autores de um
quanto menor for a eficiência do PNT a detectar novos casos e a
tratá-los precoce e adequadamente até à cura. estudo de análise das determinantes em
11 países da Europa: má gestão do regi-
me terapêutico; carência de supervisão
Implicações da Tuberculose Resistente no Programa
da toma, carência de stocks e falhas no
de Controlo da Tuberculose
fornecimento das drogas; deficiente
Quando se desenvolve resistência simultânea, pelo menos à qualidade dos fármacos no mercado;
Isoniazida e Rifampicina (Multirresistência), o prognóstico agra- acesso descontrolado a medicamentos
va-se seriamente, os efeitos colaterais dos tratamentos acentuam- sem prescrição específica; programas
-se e o tempo de infecciosidade (e consequentemente o risco de de controlo da tuberculose mal geridos
transmissão) prolonga-se significativamente. a nível de países ou grandes regiões).
Ainda que a resistência aos AT numa região esteja associada a • Segundo, quando a situação da tuber-
factores de risco, nomeadamente a co-infecção pelo VIH, ela deve culose numa região permanece ainda
ser considerada um indicador de adequação do funcionamento do livre deste problema emergente, ou seja,
programa de controlo da tuberculose nessa mesma região (ou quando a epidemia da tuberculose se
país). deve exclusivamente a estirpes de Mt
A cura de um doente com multirresistência deve envolver todos sensíveis (como acontece ainda, feliz-
os recursos farmacológicos e de vigilância do tratamento, e é o mente, em grandes áreas do nosso país),

15
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

sabemos que um bom programa de controlo, baseado na estra- Situação actual em Portugal
tégia DOTS, pode prevenir a rápida disseminação da
O conhecimento da evolução da incidên-
multirresistência5.
cia de casos com resistência aos anti-
tuberculosos em Portugal está prejudica-
do pela baixa cobertura de testes de sensi-
Quadro I bilidade verificada em algumas regiões do
Padrões de resistência inicial em Portugal, em 1994-97 (1105 casos testados) e
2000-03 (4723 casos testados) país.
PADRÕES ESTUDO DGS/OMS 1994-97 SVIG-TB 2000-03 A análise de um universo de 4723 casos
Resistência Total 17,7% 12,8% com isolamento do Mycobacterium
Resistência H Primária 7,7% 6,5% tuberculosis, testado para sensibilidade
Resistência R Primária 1,9% 2,2% aos fármacos antituberculosos, entre 2000
Multirresistência Primária 1,8% 1,9% e 2003, revela uma proporção de 1,9% de
Resistência H nos retratamentos 31,1% 12,3% casos com multirresistência (TB MR) pri-
Resistência R nos retratamentos 20,9% 7,9 % mária (detectada em casos novos antes do
Multirresistência nos retratamentos 20,9% 7,3% início do tratamento) e uma proporção de
Resistência H: resistência à Isoniazida; 7,3% de multirresistência detectada em
Resistência R: resistência à Rifampicina
Multirresistência: resistência a, pelo menos, H e R em simultâneo. casos com tratamentos anteriores. Consi-
Fonte: SVIG-TB, dados definitivos de 2003, em Set. 2004 derando a situação global do país, relati-
vamente aos dados da década de 90 (Qua-
dro I), o problema parece estar a diminuir
Quadro II francamente, à custa da redução da resis-
Proporção de Resistência por Classes de Doentes, 2000-03 (4723 casos testados)
tência nos casos com tratamentos anterio-
CLASSES DE DOENTES COBERTURA TSA RESISTÊNCIA H MULTIRRESISTÊNCIA res. Contudo, a multirresistência primá-
(%) (%) (%)
ria parece evoluir com tendência ligeira-
I (Novos TP M+) 60 5,8 1,6
mente crescente, tendo particular expres-
II (Retrat. TP M+) 62 10,8 6,6
são nos distritos de Lisboa e Setúbal.
III (TP M- / Extra TP) 47 8,0 2,7
Embora consideradas ainda moderadas,
Quaisquer 55 7,1 2,4
as taxas são superiores à média da União
Novos TP M+: Casos novos pulmonares com microscopia positiva
Retrat. TP M+: Casos pulmonares em retratamento com microscopia positiva Europeia (a maioria dos países que notifi-
TP M- / Extra TP: Casos de TB pulmonar com microscopia negativa ou casos de TB extrapulmonar.
ca dados de sensibilidade aos antituber-
Fonte: SVIG-TB, dados definitivos de 2003, em Set. 2004 culosos tem menos de 1% de TBMR pri-
mária). Há a assinalar a existência de
registos de resistência primária isolada à
Quadro III
Proporção de resistência por estado de infecção VIH, 2000-03 (4723 casos testados) Rifampicina, facto que, até 2000, não se
tinha detectado.
CLASSES DE DOENTES COBERTURA TSA RESISTÊNCIA H MULTIRRESISTÊNCIA
(%) (%) (%)
Assumindo que o risco de desenvolvimen-
VIH+ 53 9,0 4,2 to de resistências varia conforme a catego-
VIH- ou Desc 54 6,7 2,1 ria dos casos de TB, é importante avaliar
Quaisquer 55 7,1 2,4 separadamente os casos da classe I (casos
Fonte: SVIG-TB, dados definitivos de 2003, em Set. 2004 novos pulmonares com microscopia posi-
tiva), os casos da classe II (casos pulmona-
res em retratamento com microscopia po-
Quadro IV
Proporção de resistência em doentes reclusos versus em liberdade, 2000-03 sitiva) e os casos da classe III (casos de TB
(4723 casos testados) pulmonar com microscopia negativa e ca-
CLASSES DE DOENTES COBERTURA TSA RESISTÊNCIA H MULTIRRESISTÊNCIA sos com TB extrapulmonar). Pela obser-
(%) (%) (%) vação do Quadro II, podemos constatar
Reclusos 70 5,6 2,9 que a classe II é de longe a que apresenta
Em liberdade 54 7,2 2,4 maior incidência de resistência e que, nos
Quaisquer 55 7,1 2,4 doentes da classe III, surpreendentemen-
Fonte: SVIG-TB, dados definitivos de 2003, em Set. 2004 te, a proporção de casos com resistência à

16
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

Isoniazida é bastante elevada, o que suscita algumas reservas os melhores. É importante realçar o facto
quanto à utilização dos regimes de tratamento inicial com apenas de as regiões do Norte e do Centro apre-
três drogas. De salientar é o facto de, apesar do pressuposto de sentarem uma cobertura da vigilância ain-
que os doentes da classe II têm maior risco de resistência, a da inferior à média nacional e, por isso,
vigilância da sensibilidade, a avaliar pela taxa de cobertura do não se poder atribuir representatividade.
teste de sensibilidade aos antibióticos (TSA), não ter sido nestes
A análise dos resultados do tratamento
doentes significativamente maior que nos restantes.
nos doentes novos com TBMR vem reve-
A infecção pelo VIH é, dos factores emergentes, o mais associado lar que o prognóstico é bastante pior do
ao desenvolvimento de resistências. A situação actual no país está que nos restantes: a avaliação da coorte de
resumida no Quadro III, que nos revela níveis de multirresistência 2 anos (2001-2002) mostra que, sendo a
duas vezes superiores nos doentes VIH positivos, em relação aos taxa de abandono semelhante à da genera-
que têm VIH negativo ou desconhecido. Também aqui se constata lidade dos casos, o sucesso terapêutico
uma deficiência do processo de vigilância, considerando que a neste grupo só se atingiu em 52% (Quadro
representatividade dos dados da sensibilidade aos AT é inferior VI). Esta baixa taxa de sucesso, muito
nos VIH+, relativamente ao total. inferior à geral e também muito inferior à
meta proposta pelo PNT (85%), deve-se
Geralmente a situação de reclusão está também associada a
essencialmente à elevada taxa de mortali-
elevada incidência de resistência. Nas duas últimas décadas, esta
dade.
população sofreu profundas transformações demográficas, com a
TB a emergir associada a estabelecimentos sobrelotados, a
toxicodependência e a VIH/SIDA. Pela observação do Quadro IV, Conclusões e orientações gerais
verifica-se que tem uma elevada cobertura de testes de sensibili- para o controlo da resistência
dade, correspondendo a um bom nível de vigilância (70% de aos AT
cobertura) e que, surpreendentemente, a sua taxa de TBMR é
No contexto da Europa Ocidental, Portu-
apenas 20% superior à da população em liberdade.
gal tem a maior proporção de multirresis-
As maiores disparidades encontram-se quando se segmenta a tência aos AT. Contudo, na última década
análise por áreas geográficas (Quadro V). No Continente, a região assistiu-se a uma franca redução, particu-
de Lisboa e Vale do Tejo apresenta os piores índices e o Alentejo larmente no grupo dos doentes com trata-
mentos anteriores.
Quadro V A expansão da estratégia DOTS continua
Proporção de Resistência por região de residência, 2000-03 (4723 casos testados)
a ser a condição primordial para o contro-
REGIÃO DE SAÚDE COBERTURA TSA RESISTÊNCIA H MULTIRRESISTÊNCIA lo da TBMR, pois a multirresistência do
(%) (%) (%)
Mt aos AT não é um fenómeno espontâneo.
Norte 49 6,2 1,2
É essencialmente um problema resultante
Centro 35 8,5 2,6
da má gestão dos tratamentos, devendo
Lisboa e V. Tejo 66 7,7 3,5
ser, por isso, assumido como um problema
Alentejo 76 2,1 0
de responsabilidade individual dos pro-
Algarve 55 9 2,2
fissionais e dos gestores do PNT.
Total 55 7,1 2,4
Fonte: SVIG-TB, dados definitivos de 2003, em Set. 2004 A magnitude do risco de TBMR e os maus
resultados em termos de sucesso deviam já
Quadro VI ter tido maior impacto nas taxas de cober-
Resultados do tratamento dos casos novos de TBMR, comparados com os tura do teste de sensibilidade aos antibió-
dos casos sensíveis ou de outras formas de resistência. Análise da coorte de
2001-02 (2652 casos testados) ticos. Todavia, apesar de se registarem
alguns progressos, a cobertura é ainda
CLASSES DE DOENTES FALECIDOS ABANDONO AINDA EM INSUCESSO + SUCESSO
(%) (%) TRATAMENTO TRANSFERIDOS TERAPÊUTICO muito baixa em algumas regiões e, relati-
(%) (%) (%) vamente a algumas populações, de elevado
Novos TB MR 23,1 7,7 10,3 6,6 52,3 risco.
Novos não TB MR 5,5 6,0 4,3 3,3 80,1
A situação da TB resistente em Portugal
Total 5,6 6,0 4,4 3,3 80,6
obriga a uma tomada de consciência das
Fonte: SVIG-TB, dados definitivos de 2003, em Set. 2004
causas e dos contextos de maior risco, de

17
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Em Foco

forma a ser feito um efectivo reforço das medidas de prevenção


da TBMR e de melhoria do sucesso terapêutico, de que se
salientam as seguintes:
1. Implementação dos regimes estandardizados da OMS para
tratamentos curtos, em toma observada directamente (TOD);
2. Acompanhamento sistemático de cada caso, de modo a detec-
tar precocemente os casos de insucesso terapêutico, para
imediata reclassificação e prescrição dos regimes terapêuticos
estandardizados para os retratamentos (regimes
estandardizados de 1.ª linha ou regimes estandardizados de
2.ª linha);
3. Criação de estruturas de referência para os casos de TB com
MR ou outras formas de polirresistência, com competência
reforçada para gerir os tratamentos, os seus efeitos secundá-
rios e o aprovisionamento das drogas de 2.ª linha;
4. Avaliação e monitorização da capacidade de internamento em
adequadas condições de isolamento dos hospitais com base em
rácios, consoante a carga de casos nas comunidades das res-
pectivas áreas de influência;
5. Implementação de um sistema de preparação das altas hospi-
talares, com participação multidisciplinar para aferir a opor-
tunidade da alta e assegurar a continuidade dos cuidados no
ambulatório até à cura, prioritariamente nos casos infecciosos;
6. Definição da Rede Laboratorial de Tuberculose, com um
sistema de controlo de qualidade externa, enquadrado na
Rede dos Laboratórios Supranacionais da OMS;
7. Reforço da vigilância da TB resistente com uma maior cober-
tura de execução dos TSA e implementação de um sistema
eficiente de cruzamento de informação de base laboratorial
com o Sistema de Vigilância Intrínseco ao PNT (SVIG-TB), ao 1. World Health Organization. Anti-
nível das coordenações distritais. -tuberlosis Drug Resistance in the World.
Report No.2: Prevalence and Trends. The
A informação que permite esta análise epidemiológica e de proce- WHO/IUATLD Global Project on Anti-
dimentos resulta do trabalho de recolha e agregação dos dados Tuberculosis Drug Resistance
Surveillance. World Health Organization.
dos CDP pelos assessores para o PNT, nos distritos:
Geneva 2000. WHO/CDS/2000.278.
Maria Cristina Martins (Madeira); Domingos Rocha e Alcina 2. World Health Organization. DOTS-PLUS
Saraiva (Aveiro); A Fonseca Antunes (Beja); Manuel Ribeiro PILOT PROJECTS FOR THE MANAGEMENT
OF MULTIDRUG RESISTANT
(Braga); Fátima Valente (Bragança); Miguel Resende (C. Bran-
TUBERCULOSIS (MDR-TB). World Health
co); M.ª Luísa Paiva de Carvalho (Coimbra); Teresa Serra (Évora); Organization. Geneva 2000. WHO/CDS/
Ulisses de Brito (Faro); Francisco Gonçalves e Dulce Quadrado TB/2000.279.
(Guarda); José Alves Pereira (Leiria); Elena Raymundo (Lis- 3. Direcção-Geral da Saúde. Resistência aos
boa); Olga Guterres (Portalegre); Eduardo Coutinho (Porto); Antibióticos em Tuberculose. Circular
Normativa 9/TD 29/05/00.
José Miguel Carvalho (Santarém); Ana Cristina Garcia (Setúbal);
M.ª Luísa Pimenta de Castro (V. Castelo); Artur José Pilão e 4. Barnes PF. The influence of epidemiologic
factors on drug resistence rates in
Manuel Carlos Fidalgo (Vila Real); Laura Andrade (Viseu). tuberculosis. Am Rev Respir Dis 1987;
136: 325-328.
5. WHO/IUATLD. Revised international
definitions in tuberculosis control. Int J
Tuberc Lung Dis 2001; 5 (3) 213-215.

18
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Perspectivas

Programa de V
Programa Vigilância
Epidemiológica das Doenças
Humanas por Priões
Doença de Creutzfeldt Jakob em 2003
Dr. Rui Calado
Director de Serviços de Informação e Análise da Direcção-Geral da Saúde
rcalado@dgsaude.min-saude.pt

Introdução neurologia, solicitando a notificação dos


casos identificados ao longo do ano de
O Programa de Vigilância Epidemiológica das Doenças Humanas
2003, o que permitiu a integração, na base
por Priões (PVEDHP), criado pelo Despacho n.º 8378/99, de 5 de
Abril, publicado no DR, II Série n.º 98, de 27.04.1999, é alimen- de dados central, de todos os elementos
tado por dados provenientes de várias fontes e permanentemente recebidos até ao dia 31 de Março de 2004.
integrados numa base de dados da Direcção-Geral da Saúde,
construída para esse efeito. As principais fontes de dados são os Resultados
Boletins das Doenças de Declaração Obrigatória, os Certificados
No ano de 2003, foram notificados 12 no-
de Óbito e os Inquéritos Epidemiológicos. De acordo com o
vos casos de DCJ, o que significa que a sua
Despacho n.º 11408/2003, publicado no DR, II Série n.º 134, de
incidência em Portugal se situou dentro
11.06.2003, a responsabilidade pela coordenação do programa
dos valores esperados, isto é, foi de 1,2
passou para a Direcção-Geral da Saúde, mantendo os seus prin-
casos por milhão de habitantes/ano (Qua-
cipais objectivos. Do programa se destaca não só a organização,
dro I). O maior número de notificações
funcionamento e avaliação periódica do processo, mas também o
ocorreu durante os meses de Setembro e
estabelecimento de parcerias e envolvimento de centros de refe-
rência, possuidores dos requisitos técnico-científicos adequados Dezembro (3). A idade dos doentes à data
ao desenvolvimento do programa. Com o presente relatório, a do diagnóstico variou entre os 56 e os 80
Direcção-Geral da Saúde pretende transmitir aos seus principais anos. O número de casos identificados em
parceiros informação relativa a factos relativos à Doença de homens (7 casos) foi superior ao das mu-
Creutzfeldt Jakob (DCJ), ocorridos em 2003, e proporcionar um lheres (5 casos). Foram identificados 3
conjunto de elementos facilitadores de tomadas de decisão, resul- casos na Região de Saúde do Norte, 5 na
tantes da sua análise. Para esse efeito, no dia 09.01.2004 foi Região Centro, 3 na Região de Saúde de
enviado ofício, no âmbito do PVEDHP, a todos os serviços de Lisboa e Vale do Tejo e o caso restante
neurologia e àqueles que prestam assistência a doentes do foro da ocorreu no Algarve. Nos 10 casos em que o
tempo de evolução da doença entre a data
Quadro I do diagnóstico e o óbito é conhecido, o
DCJ: casos notificados no ano de 2003
tempo mínimo registado foi de 3 meses. De
CÓDIGO INFORMÁTICO NOTIFICAÇÃO IDADE SEXO REGIÃO DE SAÚDE acordo com o registo do Inquérito
GNC-NT 01-01-2003 77 1 Lx Vale do Tejo Epidemiológico, o último caso notificado
SLV-TM 09-04-2003 62 1 Centro
em 2003 teve início em 1998, pelo que o seu
GDS-JS 08-05-2003 75 1 Norte
RS-LB 02-07-2003 69 1 Centro
tempo de evolução é superior a 5 anos
NGR-BL 13-08-2003 73 1 Centro (Quadro II). Dos 10 casos em que é assina-
BNT-MR 18-09-2003 61 2 Centro lado o falecimento do doente, 3 têm diagnós-
LRN-SB 18-09-2003 80 2 Algarve tico clínico de Doença de Creutzfeldt Jakob
MRR-FL 22-09-2003 79 2 Lx Vale do Tejo Esporádica (caso suspeito, uma vez que o
MT-JQ 29-10-2003 67 1 Centro
notificador lhe atribuiu o código 11 no
SNT-CL 05-12-2003 56 2 Lx Vale do Tejo
Inquérito Epidemiológico), 2 têm o diag-
VZ-FR 17-12-2003 68 1 Norte
RBR-TR 30-12-2003 75 2 Norte nóstico de Doença de Creutzfeldt Jakob

19
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Perspectivas

Quadro II de dados do Programa de Vigilância (Qua-


DCJ: tempo de evolução dos casos notificados
dro IV). Em 4 destes casos, foi efectuada
CÓDIGO INFORMÁTICO INÍCIO FALECIMENTO T. DE EVOLUÇÃO autópsia tendo-se, em todos eles, obtido o
GNC-NT 31-12-2001 23-06-2003 18 meses diagnóstico de CJD esporádica (Quadro
SLV-TM 01-02-2003 15-05-2003 3 meses
GDS-JS 01-11-2002
IV). Foi ainda efectuada mais uma autóp-
RS-LB 01-04-2003 07-08-2003 4 meses sia, em doente sem registo de proteína
NGR-BL 01-01-2002 26-09-2003 21 meses 14-3-3, a qual também confirmou mais um
BNT-MR 01-03-2003 04-12-2003 9 meses
diagnóstico de CJD esporádica.
LRN-SB 01-06-2003 18-09-2003 3 meses
MRR-FL 01-05-2003 12-11-2003 6 meses Para além das 5 autópsias referidas, a
MT-JQ 17-06-2003 29-10-2003 4 meses
SNT-CL 05-12-2003
Neuropatologia do Hospital de S. João exa-
VZ-FR 01-07-2003 15-12-2003 5 meses minou, em 2003, mais 5 cérebros resultan-
RBR-TR 01-01-1998 5 anos tes de autópsias efectuadas em anos ante-
Quadro III
riores (4 em 2001 e 1 em 1997). O diagnós-
DCJ: diagnósticos clínicos e confirmados tico de 4 desses casos foi CJD esporádica e
HOSPITAL D CLÍNICO AUTÓPSIA RES. DA AUTÓPSIA
o restante foi de Doença de Alzheimer.
H. Capuchos - Lx 11 3
H. Capuchos - Lx 11 3
Conclusões e recomendações
H. São João - Porto 11
C. H. Coimbra 23 1 046.1 Da análise de resultados do presente rela-
H. Santa Maria - Lx 23 1 046.1
tório, é possível concluir que:
H. Santo André - Leiria 23 1 046.1
H. Barlavento Algarvio 23 1 046.1 • O valor da incidência da Doença de
H. Santa Maria - Lx 22 3
Creutzfeldt Jakob observado em 2003
H. Inf. D. Pedro - Aveiro 23 1 046.1
H. S. Bernardo - Setúbal 11 3 está de acordo com o esperado para esta
H. Sra. Oliveira - Guimarães 22 3 doença em Portugal.
H. São Marcos - Braga 11
• Todos os processos relativos aos casos
Quadro IV notificados ao PVEDHP incluem o res-
Doentes com proteína 14-3-3 positiva notificados ao PVEDHP
pectivo Inquérito Epidemiológico, por
CÓDIGO INFORMATICO NOTIFICAÇÃO TIPO DE NOTIFICAÇÃO AUTÓPSIA DIAGNÓSTICO cujo preenchimento é responsável o mé-
RS-AL Sim Notação do PVEDHP+DDO Sim CJD esporádico dico neurologista assistente do doente.
MRQ-NT Não – – –
SRS-NT Não – – – • As autópsias efectuadas não detectaram
GS-CR Não – – – qualquer caso de Variante da DCJ.
MRC-FL Sim Notação do PVEDHP+DDO Não Diag. Clínico CJD
VZ-FR Não – – – • As escassas instalações e equipamentos
LRN-SB Sim Notação do PVEDHP Sim CJD esporádico disponíveis para as autópsias não
MT-JQ Sim Resumo Processo Clínico Sim CJD esporádico constituiram razão fundamental para a
CTR-JS Não – – –
NDR-MN Não – – –
sua não realização.
SNT-HL Não – – – O conhecimento proporcionado pela ges-
BNT-MR Sim Certidão Óbito+DDO Sim CJD esporádico
SLV-TM Sim Notação do PVEDHP+DDO Não Diag. Clínico CJD
tão do PVEDHP permite fazer as seguintes
SLV-VL Sim Notação do PVEDHP Não Diag. Clínico CJD recomendações:
• A recente aprovação do conteúdo do
Esporádica (caso provável, uma vez que o notificador lhe atribuiu
documento Rede de Referenciação Hos-
o código 22) e os restantes 5 têm diagnóstico de Doença de
pitalar de Anatomia Patológica permite
Creutzfeldt Jakob Esporádica, confirmado pelo Laboratório de
que se concretize a escolha dos 3 Hospi-
Bio-Segurança do Hospital S. João, na sequência de autópsia
tais nele previstos e dos respectivos Ser-
efectuada pelo Serviço de Anatomia Patológica (Quadro III).
viços de referência para os doentes com
Os 2 casos em que não ocorreu ou se desconhece o falecimento do diagnóstico clínico de DCJ.
doente têm diagnóstico de Doença de Creutzfeldt Jakob Esporá-
• A revisão, actualização e adequação dos
dica (caso suspeito, com o código 11, no Inquérito Epidemiológico).
normativos referentes ao PVEDHP de-
O Laboratório de Neuroquímica do Hospital Universitário de verá poder contar com contributos de
Coimbra, Laboratório de Referência do PVEDHP para a realiza- peritos nas áreas da anatomia patológica
ção de análises à proteína 14-3-3 do líquor, efectuou 14 análises com e da neurologia, preferencialmente
resultados positivos, das quais 7 são de doentes registados na base oriundos dos hospitais de referência.

20
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Perspectivas

Radiação Ultra-
Ultra-Sónica
Délia Escaja Gazzo
Responsável do Núcleo de Protecção Contra Radiações – Direcção-Geral da Saúde
Investigadora Auxiliar
deliag@dgsaude.min-saude.pt

O vasto domínio de aplicações dos ultra-sons, originando a expo- A insonação de um meio elástico origina
sição de pessoas, quer de forma acidental, quer intencional, como nas partículas deste uma vibração causan-
acontece nas aplicações médicas, desde cedo colocou a questão do do sucessão de rarefacções e compressões
dano eventual causado por estas exposições. que rapidamente se alternam.1
Neste sentido, numerosos trabalhos têm sido efectuados sem que, Se o meio material for um líquido ou um
contudo, tenha havido respostas satisfatórias quanto à comprova- gás, a radiação pode propagar-se sob a
ção de efeitos adversos para a saúde, susceptíveis de resultar da forma de ondas longitudinais (ondas de
exposição a campos ultra-sónicos, ou da sua inocuidade. compressão); no caso de o meio ser um
sólido, pode ainda propagar-se sob a
Face ao desenvolvimento em curso e à multiplicidade das técnicas
forma de ondas transversais (ondas de
ultra-sónicas, é necessário assegurar que, sem prejuízo do seu
corte).
emprego, estas sejam utilizadas em boas condições de protecção,
tomando-se medidas que evitem exposições não apropriadas ou
excessivas. Celeridade do som
Porque é de exposição a radiações não ionizantes que se trata, o Contrariamente às radiações electromag-
estudo da sua absorção quantitativa pela massa irradiada apre- néticas, os ultra-sons necessitam de um
senta particular dificuldade por não se dispor de grandezas meio material para se propagarem.
físicas que permitam a predição de efeitos biológicos resultantes Uma perturbação ultra-sónica induzida
de uma dada exposição, tal como o gray ou o sievert o permitem num meio afasta-se da fonte que a produ-
em dosimetria das radiações ionizantes. ziu a uma celeridade c que é característica
Assim, reveste-se de interesse abordar algumas propriedades desse meio, pois depende do módulo de
físicas e parâmetros técnicos que nos permitam caracterizar as elasticidade do meio e da sua densidade
exposições aos ultra-sons, preservando a eficácia da sua utiliza- média ρ. É esta celeridade que, relaciona-
ção e evitando eventuais efeitos não desejáveis. da com a frequência da vibração, determi-
na o comprimento de onda das ondas trans-
mitidas nesse meio2, segundo os princípios
Propriedades físicas e parâmetros técnicos
da difracção a que as técnicas ecográficas
Sendo a natureza física de todos os sons a mesma, a divisão das recorrem.
ondas sonoras em audíveis e inaudíveis está ligada às particula-
ridades do ouvido humano. Entende-se por ultra-sons um
fenómeno ondulatório elástico numa gama de frequências supe-
riores ao limite dos sons audíveis, isto é, acima de 20 kHz.
A frequência de uma onda ultra-sónica propagando-se num meio 1
Recorda-se que as partículas do meio não
elástico tem como limite superior o valor da frequência das se deslocam aquando da propagação de
um som, apenas entram em vibração. Mo-
vibrações térmicas das moléculas desse meio. vimento análogo pode observar-se quando
uma vaga corre à superfície da água. As
As actuais tecnologias permitem atingir os 100 GHz, valor, aliás,
moléculas da água não seguem a vaga no
muito inferior ao das frequências das vibrações moleculares. seu deslocamento, antes oscilam em torno
das suas posições médias.
Em aplicações práticas, por questões de segurança, e no que
2
Este comprimento de onda refere-se à
respeita às exposições humanas, estabelece-se o valor máximo de
distância entre duas zonas vizinhas de
20 MHz. sobrepressão e de depressão.

21
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Perspectivas

Transmissão nas interfaces “rasgue”, dando origem a uma quantida-


de de minúsculas gotas. É o que se chama
Uma das propriedades dos meios, que se reveste de grande
o fenómeno de cavitação.
importância quando se pretende determinar em que medida a
energia ultra-sónica se transmite entre dois meios contínuos No interior das bolhas de cavitação en-
isótropos, é a impedância acústica característica Z, relacionada contram-se, além do vapor de água e de ar,
com ρ e com c. Os valores aproximados destas grandezas e minúsculas gotículas de água, subtraídas à
respectivas unidades, para a temperatura ambiente, estão indica- superfície do “rasgão”.
dos no Quadro I. As paredes da bolha de cavitação e as
gotículas no interior desta encontram-se
Quadro I
Propriedades de diferentes meios em presença de ultra-sons carregadas de electricidade de sinais con-
trários.
MEIO CELERIDADE DO SOM, C IMPEDÂNCIA ACÚSTICA, Z COEFICIENTE DE
(m × s -1 ) (Kg × m-2 × s -1 ) ATENUAÇÃO α a 1 MHz Quando as bolhas são comprimidas, as
2
Ar 330 4,50 × 10 15 suas dimensões são muito reduzidas, a
6
Água 1500 1,50 × 10 0,02 tensão eléctrica aumenta fortemente, po-
6
Gordura 1440 1,40 × 10 5-25 dendo produzir-se descargas eléctricas.
6
Osso 3360 6,99 × 10 115 São estas a causa principal da acção quí-
6
Perspex 2680 3,16 × 10 23 mica dos ultra-sons.
Pode ainda acontecer que a movimenta-
ção do líquido envolvente provoque
Fenómenos de atenuação
implosões catastróficas, para valores ele-
Com a propagação de um movimento vibratório existe sempre uma vados de intensidade, em que a oscilação
transmissão de energia ao longo do meio material em que a osci- das bolhas se intensifica, originando o
lação se propaga, pelo que há que ter em consideração uma outra colapso destas e produzindo ondas de cho-
propriedade importante dos meios em tecnologias ultra-sónicas que e temperaturas muito elevadas.
que é a sua capacidade de atenuação. Este processo representa a
Assim, a cavitação pode ser uma causa
redução de intensidade do feixe ao afastar-se da fonte, devido à
importante de lesões de estruturas imersas
ocorrência dos fenómenos de absorção, reflexão e dispersão.
num líquido, ou na vizinhança deste.
No caso dos tecidos moles é a absorção o factor mais significativo
Uma outra consequência importante da
na redução da intensidade dos ultra-sons. Para um dado tecido,
cavitação é a libertação localizada, no lí-
o seu coeficiente de atenuação aumenta de forma proporcional à
quido, de concentrações elevadas de radi-
frequência do feixe incidente. Assim, quanto maior for a frequên-
cais livres e a sua capacidade de destruir
cia de emissão, menor será o poder de penetração deste.
microrganismos patogénicos.
O fenómeno de absorção conduz a uma transformação da energia
As condições físicas da aparição do
mecânica em energia calorífica, o que, em certos casos de aplica-
fenómeno de cavitação são muito variá-
ções fisioterapêuticas, pode constituir o efeito desejado. Noutros,
veis e ainda não conhecidas em detalhe,
será um efeito a evitar, pois um aquecimento não desejável pode
apesar da investigação investida nesta
provocar alterações que conduzam a uma lesão celular irreversível.
matéria.
O osso fetal é um exemplo de meio com elevado coeficiente de
absorção. Os campos intermitentes (pulsados) pro-
duzem geralmente menos cavitação que a
A reflexão é o fenómeno fundamental para a obtenção de imagem
emissão contínua.
no diagnóstico médico.
É ainda devido à reflexão que advém a capacidade de analisar Parâmetros técnicos
estruturas, de assinalar e localizar objectos distantes, móveis ou O parâmetro dosimétrico mais corrente-
estacionários, imersos em meio líquido. mente utilizado é a intensidade do feixe,
isto é, a medida do fluxo de energia por
Cavitação unidade de superfície na direcção de pro-
As depressões produzidas por uma onda ultra-sónica podem ser pagação (watt × m-2), considerando as
de tal modo elevadas que o líquido irradiado não lhes resista e se frentes de onda planas.

22
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Perspectivas

Mas os campos produzidos pelos equipamentos médicos têm uma


estrutura complexa. São frentes de onda fortemente convergentes
e a sua propagação é feita de forma não linear. Daí que, em termos
práticos, se tenha de recorrer a vários parâmetros para caracte-
rizar um mesmo feixe.
De entre os mais usados, destacam-se: SATA (spatial average
temporal average) – intensidade média no tempo e média no
espaço; SPTA (spatial peak temporal average) – intensidade
média no tempo e máxima no espaço; SAPA (spatial average
pulse average) – intensidade média por pulso e média no espaço;
SPPA (spatial average pulse average) – intensidade média por
pulso e máxima no espaço.

Recomendações
Na utilização industrial de radiação ultra-sónica é preciso ter em
conta medidas especiais de protecção adequadas aos trabalhado-
res expostos. As vibrações ultra-sónicas de forte potência que se
produzem nos meios líquidos apresentam possibilidades de se
propagarem ao corpo humano.
No que respeita às exposições em contexto clínico, os critérios de como se configurassem técnicas segura-
boa utilização focalizam-se preferencialmente no paciente e po- mente inócuas.
dem resumir-se no seguinte:
Como medida de precaução, na exposição
• Garantir que o equipamento cumpra todos os critérios de a radiações ultra-sónicas deve ser sempre
aceitabilidade que lhe correspondem, nomeadamente os ponderada a existência de um eventual
parâmetros que referem os valores de intensidade disponi- risco, ainda que ligeiro ou tardio, em rela-
bilizados3; ção ao benefício esperado para o paciente
• Assegurar que o paciente seja exposto ao nível mínimo compa- com essa exposição.
tível com a obtenção do objectivo clínico desejado; A sua utilização deve ser sempre criteriosa,
• Providenciar que todas as exposições sejam controladas por com exposição mínima do paciente e, so-
pessoal devidamente habilitado para o efeito; bretudo, do feto, conseguida através da
diminuição da intensidade fornecida pe-
• Garantir que haja a devida supervisão, no caso de serem os
los aparelhos utilizados, bem como do tem-
estudantes ou aprendizes a aplicar as referidas técnicas.
po de duração dos exames.

Conclusões Com o objectivo de evitar exposições não


apropriadas ou excessivas, é imperativo
A radiação ultra-sónica, largamente aplicada em áreas tecnológicas
que estas sejam sempre efectuadas medi-
ou científicas, permitindo induzir rotura mecânica em moléculas,
ante prescrição médica, levando em consi-
produzir radicais químicos, acelerar reacções químicas, formar
deração que a acuidade dos exames de-
emulsões e destruir microrganismos, entre outras possibilidades,
pende largamente da experiência do ope-
coloca a necessidade de se considerar a protecção dos trabalha-
rador que os realiza, bem como da quali-
dores que estejam submetidos a um risco de exposição susceptível
dade dos equipamentos utilizados.
de induzir efeitos adversos para a saúde.
Naquelas áreas de aplicação da radiação ultra-sónica, o risco
envolvido decorre da possibilidade de propagação ao corpo do 3
Refere-se a necessidade de considerar que
trabalhador das vibrações ultra-sónicas de forte potência que se o parâmetro SPTA é sempre superior ao
SATA porque se refere à zona do feixe que
produzem nos meios líquidos utilizados.
apresenta a intensidade máxima, geralmen-
Apesar do reconhecido interesse clínico pelo recurso às técnicas te no centro, enquanto que o SATA se
refere à média da intensidade em toda a
ultra-sónicas, estas não devem ser utilizadas indiscriminadamente secção do feixe.

23
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Foi Dito Por...

I Encontro
Encontr Luso-Brasileiro de
Epidemiologia
Dr. Rui Calado

Em nome do Director-Geral e Alto-Comissário da Saúde, quero As vantagens deste tipo de cooperação são
começar por cumprimentar os organizadores do I Encontro Luso- evidentes. Portugal é parceiro activo num
-Brasileiro de Epidemiologia e os participantes nesta Sessão de vasto conjunto de redes de vigilância
Abertura, manifestando a satisfação que sentimos pela realização epidemiológica que proporcionam um co-
de tão relevante evento em Portugal. nhecimento imediato e transfronteiriço de
muitos problemas de saúde, assim como
Uma importante reunião da Organização Mundial da Saúde
sólidas bases para uma acção concertada,
impediu o Director-Geral de estar presente neste Encontro, onde
por isso, claramente mais eficaz e
teria tido a oportunidade de manifestar, publicamente, a sua
desejavelmente mais eficiente.
convicção e o seu reconhecimento sobre a crescente influência da
Saúde Pública e da Epidemiologia na procura de soluções para os De facto, a partilha de saberes e de mode-
problemas da saúde, em todo o Mundo. los de intervenção é hoje uma realidade
incontornável. Facilitada pela chamada
Efectivamente, a Saúde Pública e a Epidemiologia foram conquis-
sociedade da informação, que forneceu
tando, ao longo dos tempos, a posição relevante que ocupam, em
meios adequados e acessíveis, que estamos
consequência do seu desempenho na produção e análise da
a utilizar cada vez com maior frequência.
informação técnica e científica, indispensável a um vasto e com-
plexo conjunto de tomadas de decisão, desejavelmente baseadas Assim, estão hoje criadas as condições
na evidência. Em Portugal, a sua importância manifesta-se prin- para que possamos cooperar, de forma
cipalmente em relação à Gestão e Administração da Saúde nos mais intensa e mutuamente vantajosa, com
seus diferentes níveis, tendo hoje uma particular relevância nos outros países, mesmo os mais longínquos,
processos de regulação farmacêutica e tecnológica. de todos os continentes.

Os diagnósticos de situação em saúde, os grandes programas A Direcção-Geral da Saúde, ao reconhe-


nacionais e regionais, a sua avaliação, a determinação dos ganhos cer o nível técnico e científico de inúmeras
em saúde que proporcionam em Portugal, não dispensam a instituições brasileiras, faz um apelo aos
comparação com a realidade dos países que nos rodeiam, em presentes para que promovam o desenvol-
especial dos que partilham connosco espaços e valores. vimento de relações de cooperação com
esse grande país que é o Brasil. Coopera-
O Ministério da Saúde, frequentemente através da Direcção- ção que, na Direcção-Geral da Saúde, ini-
-Geral da Saúde, troca um vastíssimo leque de informações e ciámos há mais de uma década. O trabalho
interage activamente com a Organização Mundial da Saúde, com efectuado com o Centro Colaborador da
a OCDE, com diferentes organismos da União Europeia e com as Organização Mundial da Saúde para a
estruturas de saúde dos respectivos países. Família de Classificações, a funcionar em
Lembro, aqui, o Programa de Saúde Pública 2003-08, que parti- S. Paulo, permitiu a Portugal desenvolver
lhamos com os países da União Europeia e cujo pilar principal é o processo que conduziu à introdução da
o da Informação e Conhecimento. Na presente data, trabalha-se CID9 e posteriormente da CID10, na
activamente na procura e definição dos melhores indicadores, codificação das causas de morte.
capazes de proporcionarem a todos os países participantes os No início de 2004, foi divulgada, através do
benefícios resultantes da comparação de dados fiáveis e credíveis site da DGS, a Classificação Internacional
sobre as suas realidades. de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde

24
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Foi Dito Por...

(a denominada CIF), em língua portuguesa, cuja concretização só


foi possível graças ao trabalho conjunto realizado por técnicos
dos nossos dois países.
No passado mês de Julho, o responsável pela equipa de codificação
das causas de morte da DGS efectuou um estágio no Centro
Colaborador da OMS de S. Paulo, para se familiarizar com as
técnicas e procedimentos a adoptar, a partir de Janeiro de 2005,
tendo em vista a implementação da codificação automática das
causas de morte em Portugal (área na qual o Brasil tem vasta
experiência, utilizando software em língua portuguesa...).
Por tudo isto, quero aproveitar esta oportunidade para, em nome
do Director-Geral da Saúde de Portugal, cumprimentar o Profes-
sor Ruy Laurenti, da Universidade de S. Paulo, e agradecer a tão
ilustre académico os saberes e conhecimento que nos tem faculta-
do. Estamos e estaremos ao seu inteiro dispor.
Finalmente, manifesto a convicção de que este I Encontro Luso-
-Brasileiro de Epidemiologia está condenado ao sucesso. A quali-
dade técnica e científica dos colegas presentes nesta sala propor-
cionará, inevitavelmente, uma jornada com comunicações de
elevada qualidade e grande utilidade.
Em nome do Director-Geral e Alto-Comissário da Saúde, desejo
a todos um excelente dia de trabalho.
Muito obrigado.

Dr. Rui Calado


Director de Serviços de Informação e Análise da Direcção-Geral
da Saúde
rcalado@dgsaude.min-saude.pt

Comunicação proferida na Sessão de Abertura do I


Encontro Luso-Brasileiro de Epidemiologia, no dia 7
de Setembro de 2004, na cidade do Porto, no Salão
Nobre da Secção Regional do Norte da Ordem dos
Médicos.

25
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Foi Dito Por...

Dia Mundial da Osteopor


Osteoporose
20 de Outubro de 2004

Dr. J. Alexandre Diniz

Quero, em primeiro lugar e em nome de Sua Excelência o Senhor portuguesa, a redução dos riscos de contra-
Ministro da Saúde, cumprimentar a Associação Nacional Contra a ir estas doenças e a concretização do seu
Osteoporose – APOROS, na pessoa da sua Presidente, Senhora adequado tratamento e reabilitação.
Dr.ª Viviana Tavares, e todos os participantes hoje presentes na O Programa Nacional Contra as Doenças
comemoração do Dia Mundial da Osteoporose. Reumáticas, que se integra no recém-apro-
A Osteoporose, doença silenciosa que se caracteriza pela diminui- vado Plano Nacional de Saúde 2004-2010,
ção da massa óssea, que leva a uma diminuição da resistência óssea constitui, assim, norma no âmbito de Servi-
e consequente aumento do risco de fracturas por traumatismos de ço Nacional de Saúde, sendo coordenado
baixa energia, é uma importante causa de incapacidade temporá- por uma Comissão Nacional directamente
ria e permanente e até de mortalidade. dependente do Senhor Director-Geral da
Saúde e presidida pelo Senhor Professor
Na verdade, ocorrem em Portugal cerca de 40 000 fracturas por Doutor Viana de Queiroz, constituída pe-
ano, das quais 8 500 do fémur, as quais, para além do enorme los serviços dependentes do Ministério da
impacto negativo em termos de qualidade de vida que provocam, Saúde, pela Sociedade Portuguesa de Reu-
se estima consumirem mais de 50 milhões de euros só em cuidados matologia, pelas Ordens Profissionais e por
hospitalares. representantes dos Doentes Reumáticos.
Apesar da Osteoporose atingir essencialmente as mulheres pós- Não podia, portanto, o Ministério da Saú-
-menopáusicas e as pessoas idosas de ambos os sexos, a restante de deixar de se associar à comemoração do
população não fica excluída do risco de contrair esta doença. Dia Mundial da Osteoporose, da mesma
Embora, hoje, se saiba que existem factores de risco individuais forma que se associou, juntamente com a
para contrair esta doença, que não são modificáveis, existem, de Senhora Presidente da APOROS, ao Pai-
facto, outros factores de risco que são modificáveis se forem tidos nel de Consultores que, no âmbito da União
atempadamente em atenção pela população e pelos serviços de Europeia, elaborou o Plano de Acção
saúde, através de uma ampla informação e da prestação de cuida- Europeu para a Osteoporose, desejando
dos antecipatórios. São exemplo destes factores, a escassez de que a chamada de atenção que, hoje, se faz
actividade física, a dieta pobre em cálcio, o tabagismo ou o consu- para este problema de saúde pública se
traduza num contributo conjunto para a
mo excessivo de álcool ou de cafeína ou, ainda, a toma contínua de
redução da Osteoporose e das suas nefas-
medicamentos que provocam diminuição da massa óssea.
tas consequências.
Foi tendo em conta a magnitude, em termos de saúde pública, desta
e doutras doenças do foro reumatológico, que o Senhor Ministro da
Dr. J. Alexandre Diniz
Saúde aprovou, em Março passado, o Programa Nacional Contra
Médico. Mestre em Ética da Saúde. Chefe
as Doenças Reumáticas.
de Divisão de Doenças Genéticas, Crónicas
Este Programa deve ser entendido não apenas como o contributo e Geriátricas da Direcção-Geral da Saúde
do Ministério da Saúde para o movimento internacional “Década adiniz@dgsaude.min-saude.pt
do Osso e da Articulação 2000-2010”, criado por iniciativa da
Organização das Nações Unidas com o apoio da Organização Mun-
dial da Saúde, mas, principalmente, como a tentativa nacional de Discurso proferido no dia 20 de
inverter a tendência de crescimento das doenças reumáticas, onde Outubro de 2004, Dia Mundial da
se inclui a Osteoporose, obrigando a uma abordagem abrangente e Osteoporose, no Museu da Cerâ-
articulada dos serviços de saúde, que potencie, na população mica, em Sacavém.

26
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Notas Breves

Doenças Profissionais
Pr
Monitorização e vigilância através de um
observatório

Com alguma regularidade ouvem-se e até se escrevem comentári-


os variados relativos ao conhecimento disponível em Portugal
acerca das doenças profissionais. Esses comentários estão relaci-
onados não só com a falta de informação mas também com as
falhas notórias do sistema de notificação em vigor, que podiam e
deviam ser evitadas.
Trata-se de um assunto em que existe, de acordo com a OMS1, uma
certa indisponibilidade para reconhecer as causas ocupacionais
de alguns problemas de saúde. Mesmo quando reconhecidas, há
alguma ineficiência no seu relato, quer pelos médicos em geral,
quer pelas várias tutelas com responsabilidade na matéria.
No contexto laboral, as doenças profissionais não têm merecido a
atenção devida, pois são secundarizadas por outro fenómeno mais
dramático e mediático que é o dos acidentes de trabalho.
Numa fase em que algumas das instituições envolvidas nesta área Por outro lado, a questão também não
se encontram comprometidas com projectos individuais de reor- beneficia com o facto de, para além dos
ganização dos sistemas informáticos próprios, parece-nos que a organismos com responsabilidade legal na
divulgação de um projecto com uma perspectiva integradora, matéria, existir uma constelação de agen-
fornecendo matéria para reflexão e, talvez, uma reorientação tes a intervir nesta área, nem sempre ime-
atempada dos mesmos, seria de grande utilidade. diatamente identificáveis, que vão desde
Foi nesse sentido que, a partir de elementos colhidos na literatura os parceiros sociais até às empresas, pas-
do sector, se criou o presente documento base. Estando ainda na sando pelos profissionais de saúde nas
fase preliminar, foi solicitado a várias entidades que, a título suas múltiplas formas de intervenção.
individual, o comentassem e completassem2. Desde há bastantes anos que existe um
regime jurídico de reparação de danos
Situação actual do sistema de informação das causados por acidentes de trabalho e do-
doenças profissionais enças profissionais. Porém, o sistema de
Por definição, doença profissional é aquela que consta da Lista de notificação/confirmação que lhe está asso-
Doenças Profissionais3. No entanto, cabem também neste âmbito ciado tem evidenciado pouca capacidade
a lesão corporal e a perturbação funcional de origem profissional para gerar conhecimento explícito sobre a
e que são indemnizáveis. As doenças não incluídas na lista só são matéria.
indemnizáveis, desde que se prove serem consequência, necessá-
ria e directa, da actividade exercida e não surjam pelo normal
1
desgaste do organismo4. Press Release WHO/31 - 8 June 1999.
2
Este artigo contou com a colaboração,
Na verdade, as doenças profissionais representam um conjunto que se agradece, do Dr. Pedro Rodrigues
de fenómenos muito diferentes entre si, passíveis de ocorrer em (IIES), da Dr.ª Fátima Vacas (CNPRD) e do Dr.
contextos diversos e de grande complexidade. O efeito das Mário Castro (CRSPLVT).
3
determinantes ambientais da saúde/doença é, neste caso, particu- Decreto Regulamentar n.º 6/2001, de 5 de
Maio.
larmente evidente e revela-se muito pouco vulnerável às interven-
4
ções convencionais em saúde pública. Código do Trabalho, n.º 2 do art.º 310.

27
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Notas Breves

De facto, até à data apenas tem produzido informação adminis- Todavia, se este último aspecto da questão
trativa pouco esclarecedora e fidedigna, devido em grande parte é facilmente ultrapassável com recurso à
aos problemas característicos dos sistemas de notificação obriga- tecnologia, com uma solução pouco com-
tória, nomeadamente, a subnotificação. plexa ou onerosa, o mesmo não se pode
dizer do funcionamento integrado das
O sistema de notificação actualmente em vigor, que está represen-
entidades envolvidas.
tado na figura 1, resulta das competências e atribuições legais
conferidas aos vários organismos intervenientes. Este parece ser, sem sombra de dúvida, o
ponto crítico da monitorização e vigilân-
cia das doenças profissionais.
Qualquer médico
Art.º 84º do Decreto-
Decreto-Lei
Lei n.º248/99 de 2 de Junho CNPCRP Porém, antes de se passar à descrição de
Presunção de uma possível forma de articulação e inter-
Doença
Profissional venção integrada convém passar em revis-
Participação
Base 1 ta as medidas legislativas actualmente em
vigor.
Al.b) d
do
oaarrt.º 3
3ºº d
do
oDDe
ecreto-Lei n
n..º 2
2//82 d
de
e005
5-01-1982
C er tificação

Delegado Distrital de Médico CNPCRP


Saúde
Adjunto Eurostat
Medidas legislativas que visam o
INE controlo de doenças profissionais
Delegado Regional
de Saúde Base 2 IIES Verifica-se que as preocupações que actual-
(Serviços regionais
de saúde)
Outra legislação mente nos movem se encontravam já
claramente expostas no art.º 20.º da Lei-
Direcção-Geral Quadro (1991) e que constituem por si
da Saúde
só importantes orientações para a
Direcção-Geral das Inspecção Centros Regionais Empresa acção:
Condições de Trabalho
Trabalho do Trabalho
Trabalho de Segurança Social
“A informação estatística deve per-
N.º 1 do art.º 85.º do Decreto do Decreto-Lei n.º 248/98 de 2 de Junho
mitir a caracterização dos acidentes
e das doenças profissionais, de molde
Figura 1: Sistema de notificação/confirmação de doenças
a contribuir para os estudos epidemio-
profissionais actualmente em uso
lógicos, possibilitar a adopção de
metodologias e critérios apropriados
Analisando o sistema, ele parece ser relativamente simples no que à concepção de programas e medidas
se refere aos fluxos de informação e ao mesmo tempo abrangente, de prevenção de âmbito nacional e
na medida em que envolve todas as entidades investidas de sectorial e ao controlo periódico dos
capacidade interventiva. resultados obtidos”.
Fica, pois, claro que a falta de resultados significativos, isto é, Esta disposição legal é reforçada na “Nova
capazes de orientar a acção, não resulta tanto de falhas na estratégia comunitária de saúde e segu-
estrutura do sistema como da forma como este é operado e de rança no trabalho (2002-2006)”:
como os agentes envolvidos interagem com ele e entre si.
“… para poder instaurar uma cultu-
Onde seria de esperar um funcionamento sem grandes problemas ra de prevenção e uma alteração dos
e com resultados fáceis encontramos, a partir de uma origem comportamentos de risco, é necessá-
comum de dados, um número elevado de intervenientes que rio melhorar o conhecimento dos ris-
utilizam esta informação de acordo com as suas necessidades cos por parte dos agentes interessa-
internas e em que o retorno público desejável não é praticado ou, dos …Identificar e analisar os riscos,
pelo menos em alguns casos, divulgado de forma eficaz. com base numa recolha sistemática
Sucede também que, por se tratar de um sistema em que a de informações e pareceres científi-
transferência e tratamento de informação se processa de forma cos. Além disso, os organismos de iden-
manual na maior parte dos pontos, os agentes têm muita dificul- tificação deverão coordenar os res-
dade em dispor de conhecimento utilizável quando dele necessi- pectivos programas, centrando-os na
tam. resolução de problemas e preparando

28
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Notas Breves

a transferência dos resultados da investigação para as Definiríamos, então, o nosso conceito de


empresas.” observatório de doenças profissionais em
Alínea c) do n.º 2 da Resolução do Conselho 2002/C 161/01 saúde pública da seguinte forma:
de 3 de Junho.
Uma plataforma resultante de um acordo
O Plano Nacional de Acção para a Prevenção (PNAP)5, já previs- formal entre as entidades envolvidas, su-
to em 20016, e que tantas expectativas criou, menciona as doenças portada por um sistema de informação, ou
profissionais na Medida D, a propósito do sistema estatístico, mas conjunto de sistemas coordenados e inte-
no que se refere ao enquadramento e desenvolvimento desta grados, que permita a avaliação de um
medida é completamente omisso. qualquer caso de doença profissional, des-
de a sua notificação até à certificação, e
Na Medida E, propõe a realização de acções de formação, divul-
que disponibilize informação e conheci-
gação e sensibilização junto dos profissionais de saúde, tendo por
mento aos investigadores, actores e
tema as doenças profissionais, com o objectivo fundamental de
decisores, em resultado de uma aborda-
minimizar a situação da subnotificação.
gem holística e multidimensional do
Parece-nos pois que as medidas previstas no PNAP são manifes- fenómeno.
tamente insuficientes para concretizar princípios estabelecidos
Assim, o observatório deverá contem-
há quase catorze anos e resolver os constrangimentos que abor-
plar a concretização dos seguintes objecti-
dámos atrás.
vos:
• Permitir que cada organismo envolvido
As bases de informação e o observatório de doenças
tenha a possibilidade de analisar e uti-
profissionais
lizar a informação disponível, de acor-
Somos de opinião que o sistema de informação existente está longe do com as competências específicas que
de ter esgotado as suas potencialidades e pode ser facilmente lhe estão atribuídas.
melhorado através de informatização.
• Desenvolver uma visão e estratégia par-
Todavia, o que nos parece ser realmente necessário é o desenvol- tilhadas pelos parceiros.
vimento de um protocolo de actuação resultante de um acordo
• Proporcionar a informação necessária
entre as partes, que permita, em simultâneo, o reforço conjunto
aos decisores e autoridades responsá-
das diversas competências institucionais e a criação de uma base
veis a nível nacional, regional e local,
de conhecimento orientadora de políticas baseadas na evidência,
minimizando distorções e duplicações,
assim como de uma bolsa de capital intelectual disponível para
e permitindo uma intervenção adequa-
intervir ou orientar a actividade no terreno.
da no tempo.
Esta perspectiva integradora e abrangente está claramente
• Desenvolver instrumentos de observa-
explicitada nas Prioridades do Plano Nacional de Saúde:
ção e parâmetros de vigilância de as-
“Talvez o aspecto mais importante no domínio da necessida- pectos relevantes relacionados com as
de de intervenção no local de trabalho se situe na melhoria várias vertentes e componentes das do-
da informação e dos conhecimentos em matéria de saúde enças profissionais.
ocupacional. Essa informação seria destinada ao grande
público, aos profissionais de saúde e às autoridades respon-
sáveis pela saúde.
É pois fundamental a organização conjunta com os parceiros
5
Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 105/2004
intervenientes de um Observatório de Doenças Profissio-
de 22 de Julho.
nais.” 6
Conselho Económico e Social, Comissão
Permanente de Concertação Social: Acordo
A definição de observatório em saúde pública não colhe unanimi-
sobre as condições de trabalho, higiene e
dade entre as entidades que abordam o conceito na literatura. No segurança no trabalho e combate à
entanto, a definição de observatório em geral do Cognitive Science sinistralidade. Lisboa, 9 de Fevereiro de
2001.
Laboratory da Universidade de Princeton, isto é, “uma estrutura
7
que possibilite uma visão alargada da sua envolvente”, parece Por colaboração, que se agradece, do Dr.
Paulo Bárcia, Director do escritório de Lis-
ajustar-se muito bem aos nossos propósitos. boa da OIT.

29
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Notas Breves

• Criar condições que permitam tanto o estudo global das doen-


ças profissionais como a investigação de aspectos particulares.
Bibliografia
• Criar uma agenda de investigação passível de ser cumprida por
CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION.
colaboradores da área académica ou empresarial. Public Health Conceptual Data Model,
• Promover a divulgação de toda a informação relacionada com Premiere Edition, July 2000

doenças profissionais e actuar como catalizador de acções que Código do Trabalho


visem o seu controlo. CONSELHO ECONÓMICO E SOCIAL, COMISSÃO PERMA-
NENTE DECONCERTAÇÃO SOCIAL: Acordo sobre as
• Proporcionar um ponto único de contacto nacional e interna- condições de trabalho, higiene e segurança
cional. no trabalho e combate à sinistralidade.
Lisboa, 9 de Fevereiro de 2001
• Desenvolver uma atitude prospectiva e interactiva. Decreto-Lei n.º 2/82 de 5 de Janeiro
• Garantir formas de intervenção partilhadas e consensuais que Decreto-Lei n.º 441/91 de 14 de Novembro
favoreçam a aprendizagem. Decreto-Lei n.º 100/97 de 13 de Setembro
Uma vez definida a questão, importa que as organizações com Decreto-Lei n.º 122/97 de 20 de Maio
responsabilidade atribuída em matéria de doenças profissionais Decreto-Lei n.º 248/99 de 2 de Julho
e também as entidades directa ou indirectamente envolvidas Decreto Regulamentar n.º 6/2001, de 5 de
tenham a oportunidade de reflectir sobre o assunto e desenvolver Maio
os seus próprios pontos de vista e sugestões de colaboração. LIVERPOOL PUBLIC HEALTH OBSERVATORY. URL: http:/
7 /www.liv.ac.uk/PublicHealth/obs/OBS.HTM
Por exemplo, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) ,
uma vez contactada por nós, manifestou grande interesse num RESOLUÇÃO DO CONSELHO 2002/C 161/01 DE 3 DE
JUNHO. Nova estratégia comunitária de saú-
projecto deste tipo e disponibilizou-se para, caso este venha a de e segurança no trabalho (2002-2006)
consolidar-se, estabelecer um protocolo que permita o acesso à
SALTMAN R. B., FIGUERAS J., SAKELLARIDES C. Critical
informação, a publicações, bases de dados da OIT e a experiên- Challenges for Health Care Reform in
cias internacionais neste domínio. Um aspecto importante reside Europe. Buckingham, Open University Press,
1998
na possibilidade de o futuro observatório ser integrado em redes
internacionais deste tipo e obter uma colaboração mais directa SAKELLARIDES, C. Direcção estratégica e gestão
de expectativas no sistema de saúde portu-
por parte da unidade de Safework da OIT. guês: o papel de um observatório para os
sistemas de saúde. REVISTA PORTUGUESA DE SAÚ-
Aguardamos todas as sugestões e críticas para, em conjunto,
DE PÚBLICA, VOL.18 N.º 1
continuarmos a aperfeiçoar o projecto.
WHO GENEVA. Design and implementation
of health information systems. Geneva,
WHO, 2000
Dr.ª Mariana Neto
marianan@dgsaude.min-saude.pt

30
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Notas Breves

Eventos
Eleição para Conselho Executivo da Organização O Prof. Doutor José Pereira Miguel, como
Mundial da Saúde Presidente da Comissão de Acompa-
nhamento do Plano e principal garante da
No âmbito da reunião europeia da Organização Mundial da
sua execução, apresentou as estratégias
Saúde, que decorreu em Copenhaga, no dia 9 de Setembro do
globais para a implementação, frisando
corrente ano, Portugal foi eleito para integrar o seu Conselho
que se iria dar prioridade aos mais
Executivo.
carenciados.
Trata-se de um órgão de gestão estratégica, que reúne habitual-
A intervenção do Prof. Doutor José
mente em Genebra e que supervisa o trabalho técnico e científico
Manuel Lage Campelo Calheiros foi
conduzido a nível mundial por esta Organização, integrada no
centrada nos Estilos de Vida Saudáveis,
sistema das Nações Unidas.
comunicando que a sua estratégia iria
Portugal apresentou a sua candidatura, encabeçada pelo actual ser baseada no “Percurso da Vida” e,
Director-Geral e Alto-Comissário da Saúde, Prof. Doutor José tal como recomenda a Organização Mun-
Pereira Miguel, que mereceu o apoio unânime de todos os Estados dial da Saúde, também ele reconhece a
Membros. Este apoio foi de tal ordem que os cinco Países, importância da prevenção das doenças
inicialmente concorrentes, acabaram por retirar as respectivas crónicas.
candidaturas.
Relativamente às doenças neoplásicas,
A eleição de Portugal, que há dez anos não integrava este o Dr. Fernando Leal da Costa referiu
órgão, em representação do subgrupo da Europa Ocidental, é um que a política oncológica terá por objecti-
acontecimento que indubitavelmente prestigia o País. Ela possibi- vo fazer com que as pessoas tenham me-
litará o reforço da cooperação técnica ao mais alto nível interna- lhor qualidade de vida. Disse que iriam
cional. ser envidados esforços para que se detec-
O Prof. Doutor Pereira Miguel tomará posse em Maio de 2005, tasse cedo o problema, se diagnosticasse
para um mandato de três anos. mais e tratasse melhor, a fim de se poder
assegurar qualidade, acessibilidade, con-
tinuidade, responsabilidade e racionali-
dade.
Plano Nacional de Saúde 2004-2010 Foi acentuado pelo Prof. Doutor Ricardo
Tomada de posse da Comissão de Acompanhamento do Plano Seabra Gomes que as doenças cardio-
Com a presença do Ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira, do
Director-Geral da Saúde e Alto-Comissário da Saúde, José Perei-
ra Miguel, e de outras individualidades, teve lugar a cerimónia de
tomada de posse da Comissão de Acompanhamento do Plano
Nacional da Saúde, no dia 13 de Outubro de 2004, no Palácio Foz,
em Lisboa.
Nesta cerimónia solene, não só foram apresentados os membros
daquela Comissão, como também cada um deles se comprometeu
entusiasticamente a envidar todos os esforços para executar a
missão específica que lhes foi atribuída.
Esta ocasião foi igualmente aproveitada pelos membros da Comis-
são para apresentarem sinteticamente as áreas da sua intervenção
prioritária. Assim:

31
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Notas Breves

vasculares representam a primeira causa de morte em Portu- Reunião promovida pelo


gal e que, apesar das medidas de prevenção, da melhoria Gabinete de Documentação e
dos cuidados de saúde primários e hospitalares, do aumento Divulgação
da prescrição medicamentosa e do aumento dos recursos finan-
ceiros e humanos, o máximo que se conseguiu nos últimos No dias 9 e 10 de Novembro, o GDD
dez anos foi uma estabilidade destas doenças ou uma ligeira promoveu uma reunião com os responsá-
diminuição. veis da distribuição e difusão ou seus re-
presentantes, das Administrações Regio-
A Dr.ª Elsa do Vale Rocha falou sobre traumatismos e lesões, nais e respectivas sub-regiões, com os se-
apresentando um quadro que revela ser a taxa de mortali- guintes objectivos:
dade infantil por acidentes em Portugal extremamente elevada
quando comparada com outros países europeus. Lembrou que a • Fazer um levantamento, junto de todas
morte representa apenas a ponta do iceberg, porque os acidentes as Administrações Regionais de Saúde,
provocam também incapacidades definitivas, incapacidades Sub-Regiões de Saúde e dos respecti-
temporárias, internamentos, idas às urgências, além de represen- vos Serviços de Documentação, das
tarem potenciais anos de vida perdidos e custos sociais e eventuais dificuldades que possam exis-
económicos. tir no que respeita à execução da refe-
rida tarefa.
A evolução e a imprevisibilidade das doenças infecciosas foram
focadas pelo Prof. Doutor António Mota Miranda, que salientou • Saber qual deverá ser a participação
não só a capacidade de evolução e adaptação dos microrganismos, da Direcção-Geral da Saúde não só
como também a sua aptidão para o desenvolvimento de resistên- com vista a sensibilizar o pessoal da
cias aos antibióticos, e alertou para o facto de nenhum País estar saúde como também a encontrar a
livre daquelas doenças, principalmente numa época em que pode melhor forma de aperfeiçoar os circui-
existir a ameaça de bioterrorismo. tos de distribuição e difusão.

Iniciando a sua intervenção, o Prof. Doutor José Sampaio


Faria não pôde ser mais claro ao afirmar que não há saúde sem
saúde mental. De seguida, apresentou números assustadores: em Visita a Portugal de duas
Portugal, um milhão e trezentas mil pessoas sofrem de perturba- delegações da República Popular
ções mentais graves e prolongadas; um milhão de pessoas têm da China
depressão; milhão e meio têm perturbações por abuso e depen-
De 9 a 12 de Novembro de 2004, esteve
dência de álcool. O mais preocupante ainda é o facto de a falta de
em Portugal uma delegação da República
saúde mental ser a 1.ª causa de incapacidade e de estar a
Popular da China, chefiada pelo Vice-
aumentar.
-Ministro da Saúde, tendo sido assinado
A aposta no envelhecimento activo ao longo da vida foi a estraté- um Memorando de Entendimento sobre
gia apresentada pela Prof.ª Doutora Maria Helena Saldanha, já Cooperação em Saúde entre os Ministé-
que as previsões apontam para uma duplicação de pessoas com rios da Saúde dos dois Países.
mais de 80 anos, em 2030, o que irá provocar o aumento das
No âmbito daquela cooperação, no dia 22
doenças crónicas, bem como a diminuição da qualidade de vida e
de Novembro de 2004, o Senhor Director-
o consequente aumento dos custos económicos.
-Geral e Alto-Comissário da Saúde rece-
O Prof. Doutor Paulo Ferrinho faz o diagnóstico da situação, beu outra delegação da República Popu-
sabendo de antemão que os ganhos de saúde em Portugal serão lar da China, chefiada pelo Vice-Ministro
tanto mais consistentes quanto mais se melhorar a equidade do da Segurança Social.
Sistema de Saúde em Portugal.
Nas reuniões levadas a efeito, foram
Com orçamento assegurado, a Comissão de Acompanhamento em abordadas questões relacionadas com o
funções e o empenho dos agentes de saúde, pode-se dizer que os Sistema de Saúde Português, designa-
dados estão lançados para que a implementação do Plano Nacio- damente de política, gestão e financia-
nal da Saúde venha a ser um êxito. mento.

32
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Para ler

Estratégia Global de
Alimentação, Actividade
A
Física e Saúde
Uma Ferramenta para a Acção em Saúde
Pública

Em 2001, as doenças crónicas não transmissíveis contribuí-


ram para quase 60% dos 56 milhões de mortes anuais1. Tendo
em consideração estes valores e antevendo um agravamento
desta situação, a prevenção das doenças crónicas não transmissí-
veis constitui um dos maiores desafios para a saúde pública
actual.
O Relatório Mundial de Saúde de 2002 descreve como contri-
buem os principais factores de risco para os valores de mortali-
dade e morbilidade da maior parte dos países. No caso das
doenças crónicas não transmissíveis, os factores de risco mais
importantes incluem hipertensão, consumo de tabaco, consumo
de bebidas alcoólicas, deficiência em ferro, colesterol sanguíneo
elevado, consumo inadequado de frutos e hortícolas, inactividade
física e o excesso ponderal.
Hábitos alimentares pouco saudáveis e inactividade física estão
entre as principais causas para o aumento dos factores de risco
acima referidos e para o aparecimento de doenças como obesida-
de, doenças cardiovasculares, diabetes mellitus tipo II e certos
tipos de cancro, que contribuem substancialmente para os indi-
cadores de mortalidade e para as despesas globais com a saúde.
Face à crescente e alarmante prevalência deste tipo de doenças,
tanto nos países desenvolvidos como nos subdesenvolvidos, os
Estados Membros da Organização Mundial de Saúde (OMS)
solicitaram, em Maio de 2002, a elaboração de uma estratégia
global que pudesse ser usada como instrumento na prevenção das
doenças crónicas não transmissíveis e degenerativas2.
Assim se iniciou o processo para a elaboração da “Estratégia
Global de Alimentação, Actividade Física e Saúde” (“Global
Strategy on Diet, Physical Activity and Health”)3, que aborda
dois dos principais factores de risco para o aparecimento das
doenças crónicas não transmissíveis: alimentação e actividade
física.
Para a elaboração da estratégia foi levado a cabo um longo
processo de consulta com todos os intervenientes interessados4.
Este processo, que durou cerca de 18 meses, incluiu reuniões
formais entre os Estados Membros e a OMS, organizadas em
conjunto com os Escritórios Regionais da OMS; reuniões com

33
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Para ler

outras instituições das Nações Unidas, Organizações Não Gover- • Monitorizar dados científicos e princi-
namentais (ONG), sociedade civil e ainda com o sector privado. pais influências na alimentação e activi-
dade física; apoiar a investigação reali-
De cada uma destas reuniões resultou um relatório formal que
zada em áreas relevantes para este tema,
contém as preocupações, prioridades e recomendações específi-
incluindo a avaliação da eficácia das
cas dos intervenientes a serem incluídas no documento da estra-
intervenções e o reforço dos recursos
tégia que estava a ser produzido.
humanos necessários neste domínio.
Adicionalmente ao processo de consulta, foi estabelecido formal-
A estratégia fornece a todos os elementos
mente um grupo de referência internacional constituído por
interessados um vasto conjunto de opções
especialistas independentes, provenientes tanto de países desen-
para que seja possível, com a adaptação à
volvidos como subdesenvolvidos, especializados em diversas
realidade de cada país, melhorar o estado
áreas de trabalho (ex.: prevenção e controlo das doenças crónicas
de saúde da população e diminuir os avul-
não transmissíveis, actividade física e promoção da alimentação
tados gastos com o tratamento das doen-
saudável).
ças.
A equipa de trabalho da OMS, constituída especificamente para
Em termos alimentares, esta estratégia faz
trabalhar neste documento (Secretariado), baseando-se nas reco-
5 recomendações gerais:
mendações obtidas durante o processo de consulta e na orienta-
ção dada pelo grupo de referência, produziu uma primeira versão • Adquirir um peso adequado à estatura
da estratégia que foi apresentada para discussão na reunião do e fazer a manutenção do mesmo através
Concelho Executivo da OMS em Janeiro de 2004. Nesta reunião, do equilíbrio energético entre o que é
os Estados Membros expressaram a sua preocupação relativa- gasto e o que é consumido;
mente a determinados pontos da estratégia e ficou estabelecido • Limitar o consumo de gordura total,
que haveria um período até 29 de Fevereiro para que estes preferindo sempre gorduras insaturadas
pudessem fazer comentários adicionais ao texto apresentado. e eliminando o consumo de ácidos gor-
Ficou também acordado, em Janeiro, que o Secretariado teria em dos trans;
consideração os comentários feitos pelos Estados Membros, in- • Aumentar o consumo de frutos, hor-
corporando-os, sempre que justificável, na nova versão da estra- tícolas, cereais e leguminosas;
tégia que seria apresentada para discussão na Assembleia Mundi-
• Limitar o consumo de açúcares sim-
al de Saúde. Assim, durante a Assembleia Mundial de Saúde que
ples;
decorreu em Maio de 2004 em Genebra, a estratégia foi novamen-
te discutida e finalmente aprovada. • Limitar o consumo total de sal (sódio),
assegurando que o sal consumido é
Tendo sempre como objectivo final a promoção e melhoria da iodado.
saúde da população, a estratégia tem quatro objectivos princi-
pais: Relativamente à actividade física, reco-
menda-se um mínimo de 30 minutos diá-
• Reduzir os factores de risco para as doenças crónicas não rios para a redução do risco de doença
transmissíveis provenientes de hábitos alimentares inadequa- cardiovascular, diabetes, cancro do cólon
dos e inactividade física, através de acções em saúde pública e e da mama. Pode ser necessário aumentar
de medidas que abranjam a promoção da saúde e a prevenção os níveis de actividade física, se o objecti-
da doença; vo for, por exemplo, o controlo de peso.
• Aumentar a consciencialização da população para a influência Para que estas recomendações possam ser
da alimentação e actividade física na saúde e para o impacto seguidas pela população, as iniciativas de-
positivo que têm as acções de prevenção; senvolvidas devem ser multidisciplinares e
• Incentivar o desenvolvimento e implementação de políticas e sinérgicas, daí que o papel regulador e
planos de acção globais, regionais, nacionais e comunitários coordenador do governo seja salientado
que melhorem os hábitos alimentares e aumentem a actividade em todo o documento. Além de estabelecer
física da população. Os planos de acção devem ser abrangentes, as responsabilidades dos Estados Mem-
de longa duração e multissectoriais, sendo importante que bros, este documento inclui também as
incluam a colaboração com a sociedade civil, sector privado e responsabilidades da própria OMS, de
com os meios de comunicação; outras instituições das Nações Unidas, das

34
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Para ler

ONG e do sector privado. Atribuindo responsabilidades a diversos implementação a longo prazo e de medi-
intervenientes, é destacada a importância da colaboração entre das preventivas efectivas. No entanto, as
sectores e instituições para a eficácia das acções de prevenção. alterações nos factores de risco e na inci-
dência das doenças crónicas não trans-
De uma maneira não vinculativa, esta estratégia reúne um con-
missíveis podem ocorrer rapidamente
junto de recomendações para a acção em diversas áreas. De
quando se fazem intervenções eficazes.
seguida, mencionam-se algumas das áreas de intervenção reco-
Por isso, todos os planos de acção devem
mendadas aos Estados Membros:
incluir, para além dos objectivos a longo
• Educação, comunicação e consciencialização da população; prazo, objectivos a curto e médio prazo
• Criação de recomendações nacionais para alimentação e acti- que permitam uma avaliação rigorosa dos
vidade física; progressos feitos durante todo o processo.
• Marketing, publicidade e promoção de itens alimentares para A aprovação deste documento constitui
crianças e adolescentes. Sugere-se que nenhuma destas activi- apenas um primeiro passo para a preven-
dades explore a credulidade e inexperiência destas faixas ção global da epidemia das doenças cróni-
etárias, e que mensagens que promovam hábitos alimentares cas não transmissíveis. Esta estratégia
pouco saudáveis ou um estilo de vida sedentário sejam desen- constitui uma valiosa ferramenta de tra-
corajadas, devendo os governos ter nesta área um papel coor- balho em saúde pública, uma vez que
denador e, principalmente, regulador; coloca à disposição de cada país uma ex-
tensa lista de sugestões para uma aborda-
• Rotulagem nutricional;
gem holística deste problema. A eficaz
• Utilização de “menções de saúde”; implementação desta estratégia contribui-
• Promoção de alimentos que, numa alimentação saudável, de- rá de forma decisiva para a melhoria da
vem ser consumidos diária e regularmente; saúde da população mundial.

• Políticas fiscais. Uma vez que o preço dos alimentos é um dos


factores que influenciam a escolha dos consumidores, as polí- Vanessa Candeias
ticas fiscais implementadas devem influenciar o preço dos vanessac@dgsaude.min-saude.pt
alimentos através da aplicação de taxas que favoreçam a
adopção de hábitos alimentares saudáveis;
• Programas alimentares de ajuda aos mais carenciados;
• Políticas agrícolas. A política agrícola de um determinado país
pode ter uma grande influência nos hábitos alimentares da 1
The World Health Report 2002. Reducing
população. Assim, a política deve ser escrita e implementada risks, promoting healthy life. Geneva, World
Health Organization, 2002.
tendo também em consideração a promoção da saúde e a
prevenção das doenças crónicas não transmissíveis; 2
Diet, Physical activity and Health. Fifty-
fifth World Health Assembly, Agenda item
• Desenvolvimento de políticas multissectoriais para a promoção 13.11 (WHA 55.23). Geneva, World Health
da actividade física; Organization, 2002 (disponível em: http://
www.who.int/gb/ebwha/pdf_files/WHA55/
• Programas escolares que apoiem a adopção de hábitos alimen- ewha5523.pdf , consultado a 1 de Outubro
tares saudáveis e de práticas de actividade física adequadas. de 2004).

Para além das sugestões acima mencionadas, a estratégia inclui 3


Global Strategy on Diet, Physical Activity
muitas outras, dirigidas a diferentes intervenientes, sempre re- and Health. Fifty-Seventh World Health
Assembly, Agenda Item 12.6 (WHA 57.17).
forçando que a elaboração de planos de acção e políticas nacio-
Geneva, World Health Organization, 2004
nais para a promoção da alimentação saudável e actividade física (disponível em: http://www.who.int/gb/
devem estar adaptadas à realidade de cada país/região e ser ebwha/pdf_files/WHA57/A57_R17-en.pdf,
suportados por infra-estruturas adequadas, legislação eficaz, consultado a 1 de Outubro de 2004).

fundos apropriados, monitorização e avaliação dos planos 4


World Health Organization Process for a
implementados. Global Strategy on Diet, Physical Activity
and Health. Geneva, World Health
As alterações nos padrões alimentares e de actividade física serão Organization, WHO/NHM/EXR.02.2 Rev.1,
graduais, e as estratégias nacionais precisarão de planos de 2003.

35
CADERNOS DA DIRECÇÃO-GERAL DA SAÚDE Para ler

Sexo,
Sexo, Géner
Género e Saúde
O volume da produção científica actual, a facilidade e a velocidade perspectivadas de um modo integrado, evi-
de circulação da informação têm vindo a aliar-se para que o “prazo tando o desenvolvimento de formas com-
de validade” da maioria dos artigos seja cada vez mais curto. petitivas de encarar a saúde em ambos os
Contudo, há documentos que, pela temática que abordam, pelo grupos, quer no plano da relevância no
rigor e inovação que vieram trazer ao estado da arte em numerosas contexto técnico e científico da morbimor-
áreas do conhecimento, resistem à voragem do tempo, tornando-se talidade, quer no plano organizativo e da
verdadeiros “clássicos”, que vão servindo de referência gestão de recursos. Através de uma abor-
incontornável a gerações de investigadores que os citam permanen- dagem compreensiva do género – enquan-
temente. Uma outra categoria diz respeito aos textos que passam to construção social do ser homem e do ser
despercebidos na altura da publicação – porque se afiguram mulher a partir das diferenças biológicas
demasiado especulativos e parecem ser irrelevantes como contributo ligadas ao sexo de pertença –, é possível
para melhorar o conhecimento do tema que abarcam, ou, não raro, equacionar o binómio saúde/doença nos
porque são demasiado incómodos num dado contexto científico – homens e nas mulheres mediante referên-
mas que ganham pertinência quando consultados mais tarde. cias que não se esgotam no biodeterminismo
e que ajudam a entender padrões de con-
Está nesta situação um conjunto de artigos publicados no British
duta com impacto nos indicadores de saú-
Medical Journal (BMJ) de 3 de Novembro de 2001, a propósito de
de e no bem-estar em ambos os sexos.
temática diversa no âmbito da saúde do homem. Dentre os vários
textos, merecem destaque particular “The future of men and their Os estudos de género e a respectiva aplica-
health – are man in danger of extinction?”, de Siegfried Meryn e ção no domínio da promoção e da protec-
Alejandro R Rajad, e “Sex, gender and health: the need for a new ção da saúde e das ciências médicas cons-
approach”, de Lesley Doyal. tituem um elemento de ponderação cada
vez mais efectivo na definição de estratégi-
No primeiro trabalho, que integra o conjunto dos editoriais, é dado
as de desenho e de aplicação dos progra-
relevo ao facto de que, embora a maioria das determinantes sociais
mas em saúde. Torna-se necessário, contu-
pareçam “jogar” a favor dos homens, estes, no que respeita às
do, que tal abordagem permita encarar os
principais causas de morte, apresentam índices de mortalidade
mundos da masculinidade e da feminilida-
mais elevados e menor esperança de vida do que as mulheres
de numa perspectiva sistemática de inter-
(menos sete anos, em média). Reflectindo acerca da pertinência em
dependências, sob risco, a acontecer de
promover a saúde dos homens enquanto grupo com necessidades
outra forma, de se transformarem em áre-
específicas, nomeadamente, através da sensibilização e do treino
as meramente competitivas no que respeita
dos profissionais nas questões de género, os autores não deixam de
a polarização de vontades e de recursos –
se questionar acerca das futuras implicações que a redefinição, em
com a consequente ineficácia em termos de
curso, das típicas atribuições masculinas e femininas na família, no
ganhos em saúde para ambos os sexos.
mundo laboral e na sociedade, em geral, possa ter na saúde dos
homens – e das mulheres.
Vasco Prazeres
Quanto ao segundo artigo, trata-se de uma reflexão acerca da
dgsaude@dgsaude.min-saude.pt
necessidade de serem exploradas novas formas de abordar as
questões de saúde quer dos homens, quer das mulheres, mediante
políticas sensíveis às questões ligadas ao género. Se, por um lado,
ao longo das últimas décadas, se tem verificado um enfoque
Bibliografia
significativo nas necessidades e nos problemas de saúde das mu-
lheres, assiste-se recentemente a um movimento semelhante Meryn S, Rajad A.R. The future of men and
their health – are man in danger of extintion?
centrado na saúde dos homens, em particular acerca das implica- Bmj 2001; 7320 (3 Nov ): 1013-4
ções negativas que a chamada “masculinidade” pode nela determi-
Doyal L. Sex, gender and health: the need
nar. No entender da autora, torna-se cada vez mais necessário que for a new approach. Bmj 2001; 7320 (3
as questões relativas aos indivíduos de ambos os sexos possam ser Nov): 1061-3

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