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Este inferno de amar

(Almeida Garret)

Este inferno de amar - como eu amo! –


Quem mo pôs aqui n’alma ... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói –
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,


A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... – foi um sonho
Em que paz tão serena a dormi!
Oh!, que doce era aquele sonhar ...
Quem me veio, ai de mim!, despertar?

Só me lembra que um dia formoso


Eu passei... dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela?, eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei ...
Ser Poeta
(Florbela Espanca)

Ser Poeta é ser mais alto, é ser maior


Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor


E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!


Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

É seres alma e sangue e vida em mim


E dizê-lo cantando a toda gente!
Amor é um fogo que arde sem se ver
(Luís de Camões)

Amor é um fogo que arde sem se ver,


é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;


é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;


é servir a quem vence o vencedor;
é ter, com quem nos mate, lealdade.

Mas como causar pode seu favor


nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

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