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• ANTROPOLOGIA

AULA 3 – A experiência da Verdade como a vida de uma pessoa

Bem-vindo à terceira aula. Nessa aula, a gente vai aproveitar os primeiros conceitos que
aprendemos sobre as faculdades, as capacidades humanas, e principalmente as que são
especificamente humanas, diferentes de outros reinos, diferentes de outros seres. Então,
vamos fazer uma primeira experiência agora, que vou chamar para vocês de "experiência da
verdade". Como podemos nos aproximar do que podemos chamar de uma experiência
completa com o mundo real e verdadeiro? Com as capacidades humanas que já adquirimos,
vamos montar isso juntos agora para poder nos orientar e dar nome às experiências do nosso
dia, de como a gente vai vivendo no mundo, e depois estruturar isso numa personalidade.
Então, vamos lá. Vou contar para vocês uma história de uma época em que, há uns três anos,
passei um período, cerca de um ano e dois ou três meses, em um país da África chamado São
Tomé e Príncipe. Lá na África, era muito famoso um café, muito próprio de lá, café de roça,
quase praticamente feito de maneira artesanal. Antes de ir para África, quando soube na
notícia que iria para uma missão lá, eu comecei a entrar em contato com pessoas que tinham
tido experiência lá, que conheciam alguma coisa e, na verdade, pouquíssimas pessoas
conhecem esse país, São Tomé e Príncipe. Conversei com um amigo e, dentre várias coisas que
ele me falou, ele me contou sobre o café de São Tomé e Príncipe. Obviamente, eu sabia alguma
coisa do que ele estava falando, afinal, eu já tinha tomado café, mas era qualquer café. A gente
se falava pelo telefone e ele me explicava: "Caramba, você vai conhecer, Diego, um café aqui de
São Tomé que tem diferença quando ele é produzido acima de 800 metros." Eu ainda não
conhecia, obviamente, nada disso e nem tenho tanta sensibilidade assim para perceber os
detalhes saborosos de cafés. Mas ele foi me explicando, com palavras, algumas características
do café de lá, porque ele é produzido acima de 800 metros. Então, a altitude, a temperatura,
tudo isso interfere. E tudo que ele estava falando para mim, em que mundo ele estava falando?
No mundo dos conceitos, do intelecto. Então, vou começar a desenhar essa experiência aqui
para a gente se orientar no que está acontecendo. Esse meu amigo começou aqui em cima,
porque eu vou descer. Ele começou a me falar aqui em cima, no mundo imaterial. Em breve, a
gente vai chegar aqui, no mundo onde eu vou poder tomar esse café, mundo material. A gente
estava conversando aqui em cima, e ele estava me falando sobre conceitos, sobre logos, sobre
palavras, sobre orações: o mundo do alto, o mundo das orações, o mundo onde a gente vai
progredindo de oração em oração, nas operações que a gente aprendeu a chamar de deduções,
o mundo tipicamente intelectual do intelecto ativo.
Então, a gente tem um intelecto passivo que consegue prender esses conceitos. Ou seja, o
intelecto passivo é o intelecto potência, como é chamado em latim, ou "nus potencial", como
os gregos chamavam, esse mundo do espírito, o mundo imaterial. Nesse intelecto passivo, eu
consigo prender aqui, numa experiência conceitual, aquilo que tinha lá no mundo físico. Então
não tem mais sentido aqui, tem palavras nesse mundo. E o intelecto ativo consegue operar,
assim como a imaginação opera na memória. Então, faço um paralelo para vocês conseguirem
ter uma percepção do que é. Lembrem-se, o método passa do mundo físico para o mundo
metafísico. Esse mundo intermediário de memória e imaginação, que tem um pouquinho de
sentido de lá de baixo e um pouquinho já do imaterial, esse mundo intermediário, quando é
reproduzido por material para o mundo do logo, da lógica, da palavra, ele encontra essa
espécie de memória, que aceita com passividade as produções que lhe são dadas. O intelecto
passivo, que consegue se transformar em todas as coisas sem perder sua capacidade. Ou seja,
eu consigo, conceitualmente, entender o que é um café por palavras. Ele consegue falar isso
com palavras, deduzindo as coisas. "Esse café é de 800 metros, então a altitude pode interferir
na porosidade do café, deixando-o mais aerado, porque tem uma pressão menor lá em cima na
altitude". Ele está falando tudo, e eu estou deduzindo no mundo dos conceitos. Vocês
percebem? Estou juntando orações, estou lá em cima no mundo do espírito, e consigo receber
essas informações dele e aprender em mim, nessa espécie de plano imaterial. E com essas
deduções, com esse raciocínio lógico, do logos, vou passando de degrau em degrau, operando
com o meu intelecto ativo. Ou seja, "nus poietikos", quase que fazendo uma poesia. Uma
poesia no seguinte sentido: eu estou falando sobre o café de maneira durável, de maneira
quase que eterna, porque eu estou falando só nos conceitos. Ainda que nunca mais exista esse
café em São Tomé e Príncipe, eu posso fazer uma poesia eternizando esse café, "nus poietikos",
intelecto que faz aquele café durar. Então, estou aqui em cima nesse mundo do logos, não
estou aqui no mundo da lógica. Ele está me falando que existe isso, existe esse café. Bom, eu,
como ser humano, vou tentar me orientar, para eu não ficar lá no mundo do logos, metido lá
em cima nesse mundo imaterial. Vou começar a vir para o mundo onde consigo me orientar
muito melhor, que é o mundo da materialidade. E aí, paro para pensar: "Caramba! Ok, eu sei
que ele está me falando: café, porosidade, pressão. Eu sei dessas coisas. No mundo real,
falando que existe, começo a pensar: 'Faz sentido, eu vejo o café no mundo. É provável que um
país na África tenha café assim, lá tem elevação, é provável que ele seja mais gostoso sim.'
Então, começo aí, para mim, a imaginação, a memória e começo a tentar encarnar, ou seja,
materializar essa experiência dele. Ou seja, olha aqui, estou trazendo para a materialidade,
para começar a descer no mundo da lógica, essa experiência de olhar para o mundo e tentar
ver o que parece lá em cima no mundo imaterial, como o mundo material aqui embaixo. Essa
experiência é meio analógica. Analogias, a gente aprendeu a chamar em latim de "ratio", ou
seja, inclusive no latim medieval, o conceito de "veritas", de verdade, era muito parecido. O
que está lá no mundo intelectual, que é muito parecido com aquilo que está no mundo real.
Então, se no mundo intelectual e quero saber se é verdade, eu olho para o mundo real e vejo se
funciona exatamente assim, uma espécie de teste da verdade. Aí, a gente aprendeu a chamar
esse movimento de descida ou semelhança, "verosimilitude".
Então, vamos lá. É verdade, logicamente, que o que ele está falando faz sentido. Estou olhando
para o mundo real e, no mundo real, parece que sim. Estou começando a ver similaridade no
mundo real com o que ele está me falando. Só que chega um momento, é uma espécie de
momento que a gente fala assim: "Cara, falou sobre o café. Eu comecei a pesquisar no
YouTube, lá na roça tem esse trabalho artesanal, tem a altitude que ele está falando.
Caramba!" Chega um momento dentro de mim que parece que tem uma inflexão humana. É
essa que estou falando, é o momento que sou convencido, como uma espécie de
probabilidade, ou seja, é uma espécie de 50 mais um. Ele falou alguma coisa, falei: "É possível",
depois é: "Sim, olhando para o mundo, imaginação". Só que chega um momento que encarna
mais ainda, ou seja, começo a ter mais força dos sentidos. Quase que já estou juntando todos
os sentidos que ele está falando, juntando o cheiro do café, o corpo do café, a pressão do café,
a textura do café, cada vez mais encarnando, tentando encarnar aquilo, só que ainda não é
concreto. Ou seja, estou colocando nos meus sentidos como se quisesse provar, no sentido de
degustar. Então, estou tornando aquilo cada vez mais provável, semelhante. Estou entrando no
mundo da probabilidade, ou seja, vai aparecer um desejo, um movimento de provar aquilo, no
sentido de degustar, esse novo movimento aqui. E é por isso que tem um ponto aqui, mudando
esse movimento, é uma espécie de grau de certeza. Então, a gente aprendeu a chamar esse
movimento de "provável", que é o mundo das probabilidades. E aí, qual é a próxima
experiência? Bom, já estou com os sentidos à flor da pele, esse movimento de querer encarnar
o café já é tão grande que, às vezes, quando ele falava, já começava a me dar água na boca e eu
queria efetivamente provar o café. Ou seja, já está no mundo dos sentidos, quase que
completamente. Só falta eu encarnar aquela lógica que depois virou semelhança, que depois se
tornou provável, degustável. Então, esse último movimento só pode acontecer, e é por isso que
eu mudo aqui, faço esse movimento de inflexão no meu desenho nesse movimento que estou
fazendo, e vou completamente para o mundo dos sentidos, agora para o material. Estou aqui
embaixo, agora eu preciso encarnar o café, eu preciso usar os meus sentidos para que o café
exista efetivamente em mim. E isso é uma espécie de encarnação de uma verdade, de um
logos, que vai descendo no mundo e vai se tornando provável, ela acontece aqui embaixo, e eu
chamo isso de encarnação. Eu tomei o café, eu queria provar e eu provei. Você fala assim para
mim: "Prove que o café de São Tomé e Príncipe é gostoso". Olha, cara, eu posso conversar
contigo na lógica, e aí vai ser só uma parte disso. Vou tentar, no mundo intelectual, fazer várias
deduções para você. Mas, em sentido contrário, uma outra pessoa que não gostou pode fazer
essa lógica ao contrário. Você percebe que esse mundo aqui de cima, como ele é o mundo das
definições, é o mundo potencial, o "nous potens", o intelecto passivo, ele permite várias
impressões que dependem muito do que acontece aqui embaixo. Então, o que estou querendo
falar para vocês agora é que o mundo intelectual, ele tem, de maneira impressionante, uma
espécie de submissão a esse mundo aqui de baixo. Então, se eu tivesse achado o café aqui
embaixo muito ruim, na verdade, o que estaria fazendo lá em cima, no mundo da lógica, é uma
dedução tentando convencer você a não tomar aquele café porque é muito ruim. Então, esse
mundo aqui em cima, você percebe que ele sofre uma consequência do mundo aqui de baixo.
O que é isso pra gente? No mundo da filosofia, por exemplo, um cara da história dele chamava
da submissão do mundo intelectual ao mundo dos sentidos. Primeiro, quando ele fala que nada
chega no mundo do intelecto antes de passar pelo mundo dos sentidos e, segundo, quando ele
fala que, para você ser um filósofo, você precisava ter a moralidade de um filósofo.
Ou seja, você precisava ter uma espécie de encarnação do homem funcionando bem aqui
embaixo para conseguir ter a lógica do homem funcionando bem aqui em cima. Porque, se
você funcionasse mal aqui embaixo, a lógica que explicaria esse teu movimento aqui embaixo
seria uma lógica de um homem funcionando mal. Então, por exemplo, quando a gente fala - e
eu vou mencionar isso para vocês algumas vezes - que a lógica freudiana, por exemplo, é uma
lógica que carrega uma espécie de imoralidade, o que estou dizendo é que Freud carregou aqui
para cima, o mundo das palavras, que imaterializavam a materialidade da imoralidade dele na
vida. Percebe? E não era o contrário. Não foi a ideia de moral que ele teve que veio aqui para
baixo. Primeiro, isso acontece posteriormente. Agora, nessa espécie de caminho da verdade,
um caminho de uma verdade que sai do mundo sensível para o mundo intelectual e, depois, de
uma verdade que se encarna, que vem lá do mundo do logos e vem provar aqui embaixo, no
mundo dos sentidos. A diferença é extremamente simples, como acontece. Fui convencido a
fazer um roteiro para tomar um café. Então, essa é a nossa experiência do dia a dia. Isso quase
que nos mostra os caminhos de amizade, das pessoas que a gente sai, fazendo convencimento
intelectual através de tudo que já foi provado aqui no mundo dos sentidos. Que é isso dentro
da nossa experiência cotidiana? Estou falando isso dentro de um café, mas isso acontece na
nossa vida. Acontece nos momentos que a gente vai tentar decidir sobre um emprego, sobre
casamento. No caso, a gente está decidindo sobre tomar um café ou não. E depois que a gente
chegou aqui, nesse mundo da encarnação, eu pego esse movimento: o café realmente é uma
maravilha. Assim como o cara que me falou sobre o café, ele está me explicando que ele é
muito bom, tentando me convencer. Eu agora provei o café e pensei: "Caramba, tomei o café".
E isso pode nunca mais ser mencionado por mim. Se o café fosse um café normal, nunca mais
eu ia falar nesse café. Só que o café carrega alguma coisa ali, uma beleza, um bem, que eu
decido fazer durar. Então veja, não é assim que acontece na nossa vida? Se eu tomei um café e
gostei, eu quero repetir aquilo. Se eu tomei um café e não gostei, eu não quero mais saber
daquilo. Veja o que essa experiência que estou tentando passar para você: fazer o café durar.
Bom, como é que eu passo para os outros que o café é gostoso? Eu posso passar aqui embaixo,
no mundo sensível. "Cara, toma aqui esse café, só toma." A pessoa vai tomar o café, e eu fiz um
convencimento quase que pela força aqui no mundo dos sentidos. Mas, se eu decidir fazer uma
espécie de promessa por esse café, é uma promessa por esse café. Bom, o café me dá algum
tipo de prazer. Então, eu vou assumir um compromisso com esse café. Eu vou fazer alguns
esforços para que eu possa repetir. Ele me promete um prazer, e eu prometo comprá-lo mais
no mercado, eu prometo falar para outras pessoas sobre esse café. Vocês percebem que
movimento é esse? Estou assumindo um compromisso com um café, estou respondendo ao
café. Ele me deu um prazer, ele me deu uma promessa desse prazer futuramente, e eu
respondo a uma promessa. Responder a uma promessa, os latinos chamavam, exatamente
dessa expressão que estou falando para vocês, de "re" responder. Em latim, a gente traduz para
o português como responsabilidade, ou ainda do latim "res publica", responsabilidade, coisa
pública, responsável. Então, estou assumindo o que os gregos chamavam de "store" e os latinos
chamavam de responsabilidade. Estou respondendo a uma promessa do café. Estou fazendo o
café durar um pouco mais. Então, olha só, agora estou tirando o café do mundo dos sentidos de
novo. Bom, agora vou começar a tentar fazer ele durar por essa responsabilidade que eu
assumi por ele. Então, existe um caminho que é um caminho de convencimento interior. Assim
como eu desci na probabilidade querendo trazê-la do mundo material para o mundo dos
sentidos, eu agora quero tirá-la do mundo dos sentidos, dessa presença só de quando ele está
presente, e assumir uma responsabilidade de quando ele não está presente. Quando estiver no
mercado, o café não está lá, eu quero dar um jeito de trazê-lo à mente.
Então, eu compro esse café. Essa responsabilidade ainda carrega materialidade do café. Vocês
percebem? Estou tentando, no mundo físico, fazê-lo durar por algum sacrifício no mundo físico.
E então, tenho esse movimento aqui subindo. Agora, eu chamei de responsabilidade para
vocês, responsabilidade. Só que esse sacrifício que eu fiz aqui para subir, eu não consigo,
quando estiver com uma pessoa, passar isso para ela sem usar a intermediação do que é
própria desse mundo aqui de cima, que a gente está indo para o mundo intelectual, lembram?
Então, eu tenho que utilizar as capacidades humanas daqui de cima, tenho que utilizar coisas
intelectuais. E vou tirar aqui do mundo das promessas, das responsabilidades, e vou fazer esse
caminho aqui de torná-lo imaterial. Como é que eu consigo fazer o café durar de maneira
imaterial? Eu tenho que utilizar uma linguagem que a gente pode chamar aqui de poética. Ou
seja, utilizando o meu intelecto aqui no meio, eu começo a passar daí imaginação, nos sentidos,
para aquilo que não está mais no mundo dos sentidos. Como é que eu faço isso? Através da
poesia. Por isso que intelectivo é chamado de "espírito poético". Ele dá uma espécie e me
permite agora dar uma espécie de testemunho, uma linguagem poética, que fala através de
entes imateriais sobre o café que eu quero falar. Eu não posso fazer isso por imagens para
chegar até um certo limite daqui de cima. Estou conversando com os homens, estou
conversando com o próximo, com um amigo, novamente. Para tentar convencê-lo novamente,
só por palavras, só aqui em cima, no mundo da lógica, sobre o café. E aí, o ciclo, o nosso ciclo,
fecha. O nosso ciclo fecha aqui. Então perceba o que nós temos aqui, que vai começar a
orientar a gente no nosso caminho, da nossa personalidade humana, e do que está
acontecendo com a gente através das faculdades humanas, girando aqui dentro. Percebem que
fui falando, novamente, de todas as faculdades da última aula. Aqui, de como elas foram
funcionando para explicar como que a gente é convencido a tomar café, ou seja, a gente faz um
roteiro para tomar um café futuramente. E aí o tempo vai passando. Eu vou tentando
materializar isso e, de repente, eu chego aqui no mundo da presença. O café está na minha
frente, o mundo da presença. Cheguei aqui embaixo e, depois que tomo esse café aqui no
mundo presente, e eu desejei tomar esse café, fiz um roteiro dele para o futuro. No futuro
chegou no presente, encarnei nesse café e, depois, eu olho para o passado, para o café que eu
tomei. E aí, no passado, eu tento achar um jeito conceitual de fazê-lo durar. Então percebam
que eu dei um passo importante aqui no movimento da vida humana, um movimento que vai
estruturar a nossa personalidade a partir das próximas aulas. Então, que movimento é esse? O
movimento de um roteiro de futuro, ou seja, de uma esperança. Fui convencido de que o café
de São Tomé e Príncipe é bom, fui convencido aqui no mundo da lógica, no mundo da verdade
que, depois de encarnada, passou do mundo da sensibilidade através da responsabilidade e de
um sacrifício, tanto de comprar mais café, de fazê-lo durar no sensível, quanto um sacrifício de
tentar arrumar uma linguagem para que ele dure. Então, no mundo passado, fiz essas
operações através das capacidades humanas que vamos falar. Cheguei aqui em cima, como
uma verdade no mundo do intelecto, fiz um roteiro para o futuro para que, lá na frente, eu
pegasse esse roteiro, descesse para o meu personagem aqui embaixo, no mundo material,
numa espécie de palco da vida. Agora, estou em São Tomé e Príncipe, e o café está na minha
frente. Estou no palco com um roteiro onde está escrito: "Você tomará o café porque esse café
é bom", tem uma esperança do futuro nesse café. Chego aqui no presente, no palco da vida, e
então eu olho para trás, depois de ter tomado o café, e faço minhas críticas, tentando buscar a
verdade do café.
Então perceba aqui, nesse giro, nesse movimento de futuro, presente, passado, também
acontecem os famosos encontros com a beleza. A beleza que está muito ligada a tudo que é
sensitivo. Descendo dessa beleza, vou subindo para fazer essa beleza durar com os meus
instrumentos da verdade, ou seja, vários conceitos sobre o café que espelho no mundo real,
muito como era feito pelos medievais. E depois que eu percebo que essa verdade carrega sua
bondade, eu espero. Essa verdade é uma operação do intelecto que aprendemos a chamar de
indução. Quando os passados, os passos da verdade, vão dando esperança no futuro, nessa
roda aqui em direção ao futuro, o que diferencia é esse nascer todos os dias. O café tem sido
gostoso todos os dias, então amanhã o sol vai nascer, amanhã o café será gostoso. Entendeu a
dinâmica? Isso aqui, por exemplo, em linguagem teológica, é a opção. São Paulo, por exemplo,
dizia que a fé é o fundamento da esperança. Eu acredito que o café é gostoso, eu espero que
ele me dê esse sabor amanhã. E aí faço esse giro humano, que é uma experiência de
encarnação da verdade, esse passado tentando virar futuro, durar eternamente, através desse
mundo material onde ele não se desgasta, mas ainda que não exista, jogo esse café para o
futuro como um roteiro porque ele é bom. Eu tenho aqui o que aprendemos a chamar de
terceiro termo. Essa é a estrutura da personalidade, e na próxima aula vamos verificar como
essa estrutura da personalidade humana pode ser falada por nós, para que a gente se oriente
não só tomando café, mas nos nossos relacionamentos, se orientando, criando filhos e fazendo
o que expliquei para vocês na aula 1: dominando o mundo, transformando caos em ordem, que
é a nossa vocação. Quando completarmos o mistério desses giros aqui, como o café, com o
casamento, com criação de filhos, com a filosofia, fortalecendo a nossa personalidade de
roteiro em roteiro, interpretando, encarnando esses roteiros no mundo e tentando
desencarná-los, transformando-os em verdades conceituais. Quando eu for fazendo esses giros
aqui, a cada vez que termina um giro desses, eu me sinto em paz. Planejei tomar café, tomei
café e consegui dizer para um amigo a verdade sobre esse café. Quando eu dou um
testemunho do café e o meu amigo ouve aquele testemunho, agora ele vai fazer o processo de
encarnar o café. Quando deito a minha cabeça no travesseiro e percebo que cumpri esse ciclo,
essa experiência que eu sinto é o que aprendemos a chamar de experiência da nossa paz.
Finalmente estou em paz. Dei testemunho daquilo que amei e desejei que durasse. Essa paz é a
ausência desse movimento da noite, como na liturgia da igreja, aquele movimento da alma de
Simeão: "Agora meus olhos podem dormir em paz, porque viram a vossa salvação." Agora que
falei para o meu amigo sobre o café, que fiz durar, que coloquei no mundo dos conceitos, no
mundo que não se desgasta mais, no mundo do espírito, do nus, posso descansar, pois vai
durar no meu amigo e no conceito que está lá escrito no mundo das palavras. Esse mundo,
onde toda a verdade é mediada, essa palavra que vai fazer o processo agora eternamente de
encarnar no mundo dos sentidos e voltar para o mundo. Encarnar no mundo dos sentidos
sendo testemunhada pelo homem. E você vê a beleza dessa paz que sentimos quando
completamos esse ciclo. Esse repouso tem a beleza dessa espécie de formato de caixão.
Quando completamos a obra desses seis dias, os seis lados, finalmente ficamos em paz.
Finalmente fizemos um roteiro que o personagem interpretou nesse palco da presença e que o
nosso crítico conseguiu dizer que o personagem cumpriu o roteiro, e agora eles são uma pessoa
só. Na próxima aula, veremos como esse movimento do presente, passado e futuro tem uma
estrutura em nossa psique que representa nossa vida cotidiana e qual é a melhor maneira que
encontramos até hoje de expressar uma vida humana, de estruturar nossa verdade, de
estruturar a maneira como vivemos. Tá bom, pessoal? Ficamos por aqui nessa aula e nos vemos
na próxima aula de Antropologia.

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