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Meditationes de Prima Philosophia

PRIMEIRA MEDITAÇÃO

Descartes encontra razã o para duvidar de tudo no facto de nã o haverem indícios


claros que nos permitam distinguir a vigília do sonho.

Descartes opõ e o existente ao imaginá rio.

A imaginaçã o é submetida à existência, à realidade. Só posso imaginar coisas


que não existem a partir de coisas que existem. O exemplo da pintura, as
sereias e os sá tiros.

A ideia de “natura corporea”.

“La figure des choses étendues”.

O problema da representação, como problema moderno da mente. “Ces images


des choses qui résident en notre pensée”, que “in cogitatione nostra sunt”. P15.

No fundo, por um lado há as representaçõ es, que relevam sempre da “natura


corporea”, mesmo quando sonho ou faço um desenho, e que podem ser
verdadeiras ou falsas; por outro as duas intelecções fundamentais, que sã o
condições de possibilidade da representação, certas, e como tal, no fundo
aquém de verificação ou falsificação, as da evidência da minha existência e da
de Deus.

Há também uma certeza da “natura corporea” em geral. Cada ideia da “res


extensa”, de cada corpo, na extensã o em geral, na natureza corpó rea em geral, é
que pode ser verdadeira ou falsa.

É a partir de Descartes, com Newton, que a física se torna matemá tica.


A ideia de que a física é uma ciência incerta porque uma do corpó reo, das
“rerum compositarum”, mas nã o a aritmética e a geometria, porque nã o partem
dos corpos, mas do realm, da dimensão, onde os corpos sã o.
Descartes afirma, P16, que não se importam até com a sua existência ou não
existência na natureza (“atque utrum eae sint in rerum natura necne”), sendo
precisamente por isso certas, indubitá veis.

Há uma separaçã o entre “res corporea” e “res extensa”?


Por exemplo, um triâ ngulo, uma “res extensa”, é simultâ nea e necessariamente
uma “corpó rea”?
Nã o parece. A “extensio” parece estar a montante da “corporalitas”.
Sim, parece haver uma certeza da “corporalitas” em geral, mas fundada,
possibilitada pela “extensio” como realm matemático.
No fundo, nã o posso ter a certeza se estou a dormir ou acordado. Descartes só
lança esse problema para definir algo de comum aos dois estados, a
sensibilidade, e opor-lhe algo de que posso ter a certeza, as verdades
matemáticas, que a são em qualquer circunstância.

A certeza está aquém da, possibilita a própria verdade.

Nã o posso duvidar das certezas metafísicas, posso duvidar das verdade físicas, e
posso entã o testá -las matematicamente.

Para chegar à certeza, primeiro tenho de colocar tudo em dú vida.

A dú vida como uma suspensã o do juízo, “assesionem esse cohibendam, si quid


certi velim invenire”. AT, VII, 22.

A dú vida metó dica contra o senso comum, como destruiçã o do preconceito.

Uma concepçã o funcionalista da pró pria razã o. P17.


As proposiçõ es do senso comum funcionam, há razã o de acreditar nelas, mas o
como funcionam é obscuro.

A dú vida metó dica procura a prova das proposiçõ es nã o examinadas do senso


comum via contradiçã o, “in contrarium versa”.
Descartes afirma que se trata de empregar “tous mes soins à me tromper moi
même”.
Um paradoxo, é no exercício da imaginação, “feignant que toutes ces pensées
sont fausses et imaginaires”, que vai emergir a certeza.
O paradoxo apoia-se na admissã o de que a razã o está do lado do senso comum.
Descartes adopta entã o um ponto de vista irracional, para poder
fundamentar a própria razão, encontrar a razã o da razã o, determinando-a
como certeza.

Em Descartes trata-se de encontrar a pró pria razã o.

O método cartesiano como uma fundamentaçã o restritiva, uma delimitaçã o do


racional.

A consideraçã o imaginativa de que tudo é falso, de que a verdade nã o existe, é a


de que Deus nã o existe, mas um génio maligno, um deus enganador.
Porquê?

Esta contemplaçã o do falso, de que o mundo é uma ilusã o, é uma das coisas
exteriores, “cunctaque externa”.
O problema é o provar a existência do mundo sensível.
Descartes parte, no quadro da dú vida metó dica, do princípio de que talvez nã o
seja prová vel, e de que como tal, sendo os sentidos totalmente enganadores, a
verdade nã o existe e estou condenado ao erro.
Mas o projeto cartesiano é justamente o de provar que mesmo que o mundo
sensível, as coisas exteriores, fossem de facto uma mera ilusã o, há algo de certo,
de onde podemos partir para chegar ao verdadeiro. É o sujeito cogitante.
No fundo, esta falsa partida através do mundo sensível é apenas para provar que,
em direçã o à verdade, nã o é possível partir do sensível, mas necessariamente do
cogito.

O mundo é assim enraizado no sujeito conhecedor.

Se não há mundo sensível, se é uma ilusã o, tudo é falso, todas as proposiçõ es


que possa formular sã o falsas.

No apagamento hipotético do objeto, o sujeito passa então a encontrar-se


numa relação consigo próprio.
Nisto consiste a evidencialidade do sujeito cartesiano.
A figura da tautologia, sempre a da dobra, “ego sum, ego existo”, “je pense, donc
je suis”.
Eis o problema da consciência.

As figuras do reducionismo e da ascese.

Com a hipó teses do demiurgo, Descartes imagina-se sem sentidos. As mã os, os


olhos, a carne e o sangue.
Não tendo sentidos, Descartes afirma que não é possível conhecer.
“Non aliquem sensum”; “omnia me habere falso opinantem”; “non in potestate
mea sit aliquid vera cognoscere”. AT, VII, 23.
Mas... ainda assim há algo que posso saber, que sou, porque penso. Mesmo sem
conteúdo nenhum, há uma forma que remete para si própria, o sujeito.

Trata-se de provar que há razã o, conhecimento, independentemente dos


sentidos.

A ideia de uma “obfirmata mente”.

Descartes coloca a aderência ao mundo sensível como uma questã o de crença.


O sentido da razã o é o apagamento da crença em direcçã o à certeza.
A posiçã o ateia do cartesianismo.

O título da primeira meditatio, de tudo o que se pode apagar, subtrair,


revogar. Os sentidos, e em ú ltima aná lise o próprio mundo.

A primeira é sobre a dú vida e a destruiçã o matemá tica do sensível.


Na segunda vai-se entã o provar a “mens” como certa, e como tal que há uma
razã o, um conhecimento, independente dos sentidos, do “corpus”.
SEGUNDA MEDITAÇÃO

A filosofia moderna é toda sobre a consciência, sobre um sujeito que se desdobra


para se tomar a si pró prio como objeto.

Descartes toma como objeto a própria experiência do pensamento.


A ideia da introduçã o, de que o pensamento se torna evento.
Há um facto do pensamento, puramente formal, vazio de todo o conteú do. Ou
seja, trata-se de um partir do “actus” do pró prio pensamento.
A tal diferença entre intelecçã o, “intelligere”, e compreender, “comprehendere”.

É falso que Descartes funde o ser no sujeito representante. Na procura de


certeza, Descartes exclui a representaçã o, de forma necessá ria, ao excluir o
sensível. A discussã o do sonho tem precisamente esse sentido, bem como a
indicaçã o expressa relativamente ao que a “mendax memoria repraesentat”. P19.

A ascese e a via negativa, a apophasis. “Nihil esse certi, cognoscam”. AT, VII, 24.

A determinaçã o ontoló gica do ente pelo ponto. “Punctum” e “minimum quid”.

“Imo certe ego eram, si quid mihi persuasi”. AT, VII, 24. “De certeza que eu
era, se era a mim que me persuadia”.
Nada que ver com a representaçã o, porque nada de conteúdo.

O “me” ou “ego”, como um aquém da própria “mens”, sua condiçã o de


possibilidade.

Prova da certeza do eu contra o demiurgo. Se estou enganado, sou, existo.


Mesmo o engano pressupõ e o eu, que assim, está acima da verdade e falsidade.

Esta certeza é uma para além da mente como do corpo.


É só porque há um eu que a mente e o corpo se podem unir.

O final da P19. Sei que sou, mas nã o sei o que sou. Estamos na forma e nã o no
conteú do.

“Concipere” refere-se etimologicamente a um receber.

Um objeto é um conteú do.

A intelecção do eu como uma daquilo “quid sponte et natura duce cogitationes


mea”, do que guia os meu pró prios pensamentos. AT, VII, 26.
Na traduçã o, a ideia de que há um pensamento que nasce de si mesmo de
forma natural e espontânea, sem comércio com o mundo exterior. O
pensamento do meu ser.
O corpo como má quina, considerado a partir do cadá ver.

Há de facto um uso de “anima”. Distinçã o importante em relaçã o a “mens”. Aqui,


a “anima” é a intelecçã o formal de si pró pria, o eu que se descobre a si pró prio. A
“mens” é a actividade pensante, representativa, da anima, deste eu.
Nã o, isto é falso.
A “anima” é concebida no sentido da “animalitas”, nã o tem nada que ver com a
intuiçã o do ego.
Na P21, Descartes expõ e que, entre outros como o mover-se e o alimentar-se, há
um ú nico predicado da “anima” que é um atributo do ego, o pensamento.
Ou seja, é exactamente o oposto, a “anima” passa a ser funçã o do ego, o
pensamento.
“Mens”, é entã o o “ego cogitans”, ou mais precisamente, o “cogitare” do “ego”?
Sim, afirmado no AT, VII, 27, “res cogitans, id est, mens”.

Definiçã o do ser do corpo, da nature corporelle, “per corpus intelligo illud


omne quod aptum est figura aliqua terminari”. AT, VII, 26. A que se junta o
ocupar um lugar no espaço, o poder ser sentido, o poder ser movido pela acçã o
de um outro corpo.

O atributo como um ter, uma pertença.

À “anima”, como “cogitans”, enraizada no “ego”, Descartes chama “mens”.


“Ego sum, ego existo”.
“An sit?” Sim. Mas, entã o, “quid sit?” Cogito.
É este o sentido de “cogito ergo sum”.

Mas há uma circularidade, porque Descartes intuiu o “ego” do “cogitare”.


Nã o intuiu.
A circularidade funda-se na figura da coincidência. Quando digo ego sum, já
estou a cogitar. Estou talvez a cogitar pela primeira vez, sendo esta a primeira
certeza, e como tal o ponto de partida de todo o pensamento, o seu princípio
metafísico, a sua raiz.

Se já há um pensamento com a certeza de si, segue-se que o pensamento pode


ser certo.

Destruiçã o da ideia clá ssica de “anima”, com a reduçã o à “mens”.


“Mens, sive animus, sive intellectus, sive ratio”. AT, VII, 27.

“Sum autum es vera et vere existens; sed qualis res? Dixi cogitans”.
Qualis, de qualitas. Como sou?

A dú vida corresponde à imaginaçã o, que tem sempre uma acçã o negativa. No


exercício da negaçã o, emerge a certeza.

Sou, mas nã o sou nada de imaginá vel, nã o de duvidá vel, logo, algo de certo.
Logo, sendo algo, sou algo de uma natureza diferente da das coisas imaginá veis.
A distinçã o dualista entre as duas naturezas.

A discussã o de “effingo”. A intuiçã o do “ego cogitans” nã o é uma concepçã o, uma


fabricaçã o, algo que possa ter imaginado.

“Figura” vai ser definida contra “imago”. As “imagines”, que se referem à “natura
corporea”, e nã o a pró pria em geral, “nihil sint praeter insomnia”.

Descartes traduz pensar, definindo-o, por uma série de atividades subjetivas.


Duvidar, conceber (“intelligens”), afirmar, negar, querer, nã o querer, imaginar e
sentir, fundamentando-as todas na “certitude” do pensamento, no fundo
reduzindo-as a este.
“Quid est quod a mea cogitatione distinguatur? Quid est quod a me ipso
separatum dic possit?”
Nenhuma destas actividades, que Descartar determina como modus do
“cogitare”, pode entã o ser pensada como separada deste mesmo, com o
argumento de que estas nã o o podem ser do “ego”.
“Cogitationis mea parte facit”.
Até o “sentire”, “nihil aliud est quam cogitare”. AT, VII, 29.

A ideia cartesiana da ordem das razõ es.

Se a coisa imaginada nã o é verdadeira, o imaginar é.


Se eu sou, não há “cogitare”, nem “sentire”, falso, mas apenas cogitationes.

A determinaçã o do que todos os corpos têm em comum, da essência, do


pró prio realm do “corporeo”, do que Descartes chama os corpos em geral, como
“extensio”.

“Res corporeas, quarum imagines cogitationes formantur, et quas ipsi sensus


explorant”. AT, VII, 29. Sobre a representaçã o.

O corpó reo como o que muda, ao contrá rio do mental.


Ao contrá rio da “res corporea”, há uma permanência da “res mentalis”, que é
baseada na identidade do ego consigo mesmo, numa mesmidade, unidade
primordial.
O “realissimum” de toda a metafísica encontra-se sempre na resposta à pergunta,
onde, em que ente, está colocado o pró prio princípio de (da) identidade? Que é a
mesma que, qual o primeiro ente, a partir do qual os outros sã o, recebem a sua
determinaçã o de ser?

“Res corporea” como extensa, “nihil aliud quam extensium quid, flexibile,
mutabile”. AT, VII, 31.
A demonstraçã o é o facto de tal coisa corpó rea mudar de forma, continuando a
ser a mesma coisa. O exemplo da cera.
Nã o há a possibilidade de conhecer a “res corporea” pelos sentidos, que nã o a
definem, porque não há uma sua permanência definitiva na coisa. A forma de
um corpo muda, tal como o cheiro, a temperatura, etc. Por exemplo, derretendo a
cera muda a cor.
A pergunta é entã o, o que é que não muda no “corpo qua corpo”, que me
permita conhecê-lo? A “extensio”, a “flexibilitas”, a “mutabilitas”.
Com estas ideias, é logo introduzida a de “figura” na frase seguinte.

A “res corporea” é ou nã o “figura”? Na sua definiçã o, Descartes parece opô -la a


“extensium”.
Porque a figura ainda é uma imagem. O argumento é o seguinte. Não posso
conceber todas as figuras possíveis da cera, logo nã o a posso determinar
assim de forma certa. “Me nequidem imaginari quid sit haec cera, sed sola mente
percipere”. AT, VII, 31.
Ou seja, “figura” é modus de “extensio”.

A “extensio” é a forma correta de determinar a cera, de “recte judicarem quid sit”,


porque desta contém muito mais possibilidades de determinaçã o, muito mais
que a quantidade de figuras que posso imaginar.

A “intellectio”, a da forma, opõ e-se “comprehensio”, a do conteú do.

Para concepçã o, Descartes usa “perceptio”, que no fundo é sinó nimo de


“comprehensio”. Ambos traduzidos como “conception”.
Parece usar “perceptio”, palavra associada ao sensível, para frisar que só há
conhecimento pelos sentidos mediado pela, à luz da razão, “seule lumière
naturellle”. Uma ironia.
Verdade, porque Descartes nunca quer apagar o ver, os sentidos, mas ligá -los à s
certezas racionais. A P25, a ideia de que o que há entã o, quando parto de uma
determinaçã o certa do objeto, é um “videre ipsammet”.
“Ceram ergo visione oculi, non solius mentis inspectione, cognosci”. AT, VII, 32.

A necessidade de provar que o corpo que apreendo apenas através da


razão é o mesmo que o corpo que compreendo através dos sentidos.

Recorrência do trabalho deste problema dualista da unidade dos contrá rios com
o par pensamento interior e pensamento vocalizado. “Decepior ab ipso uso
loquendi”.

No fundo, uma separação real pressupõe uma unidade formal.

Aqui, o problema que leva Descartes a afirmar que há um conhecimento pela


visã o é o da presença. “Videre ipsammet, si adsit”. AT, VII, 32.
Nã o esquecer que é na presença da coisa que começa a pró pria meditaçã o. O “me
hic esse” do início. AT, VII, 18.
Como se só na evidência da, no facto da presença, se mostrasse a unidade, entre
mente e corpo, entre “extensio” e “figura”.
Descartes e a fenomenologia, Husserl e Marion.

A partida da meditaçã o, do método de trabalho, é a pró pria presença.

“Ipsammet”, depois “ipsos”. A tal questã o da identidade, a da unidade, do pró prio


objeto.
Há um facto, uma certeza do ver, de que vejo. O que vejo é que pode ser
verdade ou mentira.
O exemplo dos homens que vejo à janela. Na verdade, nã o vejo homens, vejo
chapéus e vestes, podiam ser autó matos.
Video me cogitare.
O ver como determinaçã o fundamental do pensar.

A distinção entre “video” e “judico”, entre o sensível e apreensõ es do sensível.


No fundo, a mesma entre “perceptio” e “comprehensio”.

No fundo, segundo esta distinçã o, nã o há um ver verdadeiro, mas apenas um


“ver”, que é sempre verdadeiro. Há ou nã o um “juízo” correto do ver.
Julgo, erradamente, serem homens. Julgo, verdadeiramente, serem chapéus.
“Quod putabam videre oculis, sola judicandi facultate, quae in mente mea
est, comprehendo.” AT, VII, 32.

Descartes parece usar “perceptio” quando há verdade, ou seja, quando se


cumprem com certeza todos os passos do método, do caminho do sujeito ao
objeto, e se dá entã o uma boa chegada ao sensível.

O “sensus communi” como um “sensu externi”, das aparências.

O ser do “cogito” determina o acesso à coisa, à sua verdade, ou seja o ser da


coisa.
Sob a presença da coisa, há um apagamento da coisa como fenómeno, do
aparecer da coisa.
A ideia de que “ab externis formis distinguo”, de que a “nuda considero”. AT,
VII, 32.
Há entã o um interior, um conteúdo da coisa, que correlativamente determinado
pela pró pria “mens”, não existe sem mim, que a penso de certa maneira.
O próprio real funda-se assim no “ego cogitante”.

O ponto de Arquimedes.

Nunca posso perceber a coisa sem a existência da minha mente, apenas através
da qual se pode pensar, e em ú ltima aná lise provar ou nã o, a existência da coisa.
Logo, a “certitude” do “cogito” determina a essência da própria coisa, que
assim só é na relação comigo.
“Quamvis adhuc error on judicio meo esse passit, non possum tamen sine
humana mente percipere.” AT, VII, 32.
Descartes vai completar este ponto na quinta meditaçã o, argumentando em
direçã o a uma objetividade da coisa independentemente de mim, do meu
pensamento, ou dos meus erros. Se assim fosse, a verdade nã o seria objetiva,
absoluta e universal. A ideia de que não se trata nunca de inferir o ser a partir
do pensamento, mas de, depois de um primeiro encontro com a coisa, deduzir
apenas a sua existência a partir de uma certa determinação da sua
essência.
O modo de ser determina o modo de conhecer?
É de novo o círculo, mas parece ser justamente o contrá rio, o método cartesiano,
a partida da “certitude” matemá tica a determinar a natureza do real.
Esta parece ser a consequência inevitá vel da partida no sujeito, não na coisa.
A crítica do cartesianismo. Há um modo de conhecer impositivo e redutivo que
vem apagar a coisa tal como se mostra a partir de si.

A existência do sujeito prova a do objeto e vice versa.


Se julgo ver o objeto, que o objeto existe, podendo existir ou nã o, segue-se
sempre que existo.
Diferença entre ver e julgar, como um “cogitem me videre”, um pensar ver. Entã o
nunca há um facto, uma certeza do ver, apenas uma do julgar ver. É a este nível
que o sujeito se prova contra o objeto, que o pensamento se prova contra o
conteú do do pensamento.
É o julgar ver que é um pensar, uma actividade, certa, do “ego” certo.
A existência do objeto, como uma representaçã o, depende apenas do que penso
ou nã o penso ver.

O julgar ver, ou por exemplo tocar, nã o o ver, refere-se à existência, à realidade,


da coisa, ao “quid”.
O ser depende do juízo deste sujeito. É assim determinado como “certitude”,
como “fundamentum inconcussum”.

P26, o final da meditatio secunda, é a prova da existência do “ego” através da


existência de objetos.
É claro que, antes dos objetos externos, podemos dizer que este “ego” já foi
objeto de si pró prio.
A necessidade de fazer o caminho inverso, o fundacionalismo, a figura do círculo.
Nã o há uma prova da existência do objeto em si, a partir de si mesmo. A
existência do objeto esgota-se no juízo sobre a existência do objeto, que pode
ser verdadeiro ou falso, por parte do sujeito que, como “ego cogitans”, o pensa,
representa, como um “excogitare”.
No fundo, a essência do ser da coisa, como objeto, é a “certa cogitatione” do
“ego” como sujeito.

No fundo, aqui trata-se de determinar o “cogitare" como um representar, mais


precisamente como um ajuizar sobre a existência ou nã o de objetos, sempre a
partir da razã o, mas em direçã o à , na intencionalidade, experiência sensível.
Há a pressuposiçã o de um realm puro da experiência sem determinaçã o racional,
a que corresponde por exemplo o “imaginare”, que nã o é seguro, onde nã o há
acesso aos objetos, aos conteú dos.
Como conhecimento, o que há é entã o um encontro do experienciado na
mediaçã o deste “judicare”, que como um “comprehendere”, os vai produzir
racionalmente, como ideia, “cogitatione”.

A questã o filosó fica do acesso é uma cartesiana, a do método.


O método define o encontro da coisa, e com isso a própria coisa.

“Perceptio, postquam mihi”, percebo a partir de mim. AT, VII, 32.


“Corporis perceptionem (...) mentis mea naturam melius probent”.

“Distinctius me ipsum a me nunc cognosci”, conheço-me a mim mais


distintamente a partir de mim.
O conhecimento de mim é então o modelo do conhecimento de todo o objeto,
dos exteriores.

O conhecimento das coisas “in ipsa mente” é mais seguro que o das “quae
corpore ad illam emanant”.
“In ipsa mente, ex quibus ejus notitia distinctior redde potest”, dentro da mente,
a partir da qual a determinaçã o destes se pode tornar mais distinta.

É a evidência da minha mente que fundamenta a certeza racional e possibilita o


pró prio conhecimento, a “perceptio clara et distincta”, verdadeira, do objeto
sensível.
“Corpora (...) sed a solo intellectu percipi”, só podemos perceber, conceber os
corpos através do intelecto. AT, VII, 34.
É esta a conclusã o da segunda meditaçã o.
TERCEIRA MEDITAÇÃO

A terceira começa com uma recapitulaçã o, “quamvus illa quae sentio vel
imaginor extra me fortasse nihil sint, (...) in me esse sum certus”. Se bem que
as coisas que sinto ou imagino podem não ser nada fora de mim, dentro de
mim estou certo de que são. AT, VII, 35.

A mente e o corpo, o interior e o exterior.

Descartes nã o nega nunca a existência do mundo exterior, apenas assume que


esta é duvidosa, mais duvidosa que a existência do ego cogitante. Pelo contrá rio,
o desafio da pró pria obra é o da prova do mundo exterior.
Como tal, há um método, um caminho que é proposto. Um partir da certeza deste
sujeito para chegar à do objeto, ou seja, ao conhecimento.

No fundo há dois caminhos, um da dúvida em direção à certeza, outro da


certeza em direção ao conhecimento. Um caminho para fora do, e um de
regresso ao mundo.

A “clara et distincta perceptio” está aquém da falsificação. A “certitude” define-


se por esta.

A verdade metafísica como certeza, inquestioná vel, constitui a possibilidade de


verdade e falsidade ló gica.

“Illud omne esse verum, quod valde clare et distincte percipio”. AT, VII, 35.
No fundo, se o ego é objecto certo do ego, pode haver, “pro regula generali”,
objeto certo, logo verdadeiro, logo falso.

Separaçã o entre a ideia da coisa, “in me”, e a pró pria coisa, “ex me”. P28.
A coisa “ex me” como “a quibus ideae istae procedebant”. Descartes vai
demonstrar que isto, se bem que verdadeiro, nã o se pode seguir de mim. É aqui
que entra a necessidade de provar a existência de Deus, como um exterior a
mim que está em mim, e unir as duas realidades num ponto.

Do verdadeiro podemos duvidar, do certo nã o.

“La souveraine puissance d’un Dieu”, seja bom ou mau, também é certa, nã o
falsificá vel.

A existência de um Deus bom vai fundar a das ideias e a do mundo exterior? Sim.

A divisã o do pró prio pensamento em exterior e interior. P29.


Há um conhecimento objetivo, do exterior, a representaçã o de coisas, as ideias.
Há um conhecimento subjetivo, do interior, onde ao conceber a acçã o do meu
sujeito apreendo coisas como vontades, afecçõ es ou juízos.

Só os juízos podem ser verdadeiros ou falsos.


A ideia é sempre verdadeira, independentemente de o seu conteú do existir ou
nã o na realidade. As afecçõ es e as vontades também, é verdade que desejo algo,
exista ou nã o.
Só o juízo pode ser falso porque trata precisamente do acordo, da
“adequatio”, entre o meu pensamento e o mundo exterior.
Descartes aponta para um erro de juízo originá rio, o julgar que as ideias, em
mim, são semelhantes ou conformes, e não de uma outra natureza, mental,
às coisas exteriores.

Descartes distingue três tipos de ideias, as “innatae”, as “adventitiae”, as


“factae” por mim pró prio.

De onde vêm as ideias? De mim pró prio ou sã o emanaçõ es da coisa?


Como é que me parece que as minhas ideias sã o idênticas à s coisas exteriores?

A ideia de “lumen naturali mihi”, oposta à própria “natura”.


A de que as verdades apresentadas por esta luz natural, a do intelecto, sã o
indubitá veis porque não há outra faculdade em nós que nos permita separar
o verdadeiro do falso, ou seja que nos permita verificar estas verdades.

É possível ter ideias adventícias, que nos chegam das coisas exteriores.
O exemplo das duas ideias de sol.

As duas ideias de sol nã o podem assemelhar-se de forma igual ao “sol extra me


existenti”. Há sempre uma, e só uma, que se assemelha mais, a verdadeira.

Nã o consistirá a pró pria “ratio” no ajuste, na adequaçã o, entre a minha ideia da


coisa e a coisa?
A relaçã o entre representaçã o subjetiva e existência objetiva?
A ideia de que a “ratio” latina significa relaçã o, no sentido de cá lculo, de
proporçã o.

Colocaçã o da “ratio” como “razã o da semelhança”, entre o mais ou menos


semelhante, na questã o do ser como questã o do idêntico, da identidade.

O problema aristotélico do “modus” é o da analogia, que é o da determinaçã o


participativa do objecto em “degrês d’être ou de perfection”.
Ou seja, há cogitationes que sã o mais cogitationes, mais puras e perfeitas,
aquelas que “substantias mihi exhibent”.
As que “plus realitatis objectivae in se continente”, que nã o sã o “accidens”
mas “essentia”, sã o justamente aquelas que sã o atributos de Deus, “aeternum,
infinitum, omniscium, omnipotentem”, o ente que é mais ente, que por exemplo
em Sã o Tomá s, é o pró prio ser.
É por isso que o modelo da percepçã o clara e distinta é o do pró prio pensamento
determinado como certeza, porque tem como atributos a unidade, a
permanência e a universalidade.
O final da P31 e P32.
Na escolá stica, o pró prio ser é definido, segundo estes seus atributos, como Deus.
A nova determinaçã o cartesiana, como “certitude”, apoia-se ainda nesta.

Ideias que representam substâncias sã o superiores. Destas, superiores as


que representam substâncias infinitas, contra as finitas.

Deus como “causa efficiente et totali”.


“Realitatem” como “effectus”, um mecanicismo metafísico.
Descartes só consegue provar a existência da realidade exterior via Deus.

Se sou real, sou um efeito. Entã o, a pergunta, qual a causa?


Respondida com a ideia de que a causa se comunicou necessariamente ao
efeito.
Como? Tenho em mim a ideia de Deus, de onde, nos seus atributos, que nesta
ideia de Deus necessariamente participam, provém o meu intelecto, a “lumen
naturali”.

O ser “effectu” como “creatum”.

Impossibilidade de se ser “creatum” “ex nihilo”.


O menos perfeito segue-se necessariamente do mais perfeito, ergo mais
real, “hoc est quod realitatis in se continet”. AT, VII, 41.

Esta ordem de determinação do ser, da “realitas”, é a mesma quanto à


determinação das ideias.
A “cogitatione” clara e distinta pressupõ e entã o, como nesta participante, a de
Deus.
É aqui que Descartes se distingue em relaçã o à escolá stica.

A ideia nã o pode “in me esse (...) nisi in me posita sit ab aliqua causa”.
As minhas ideias, ou seja, o meu cogitare e em ú ltima aná lise a minha
existência, são efeitos de uma causa, de algo “in qua tantumdem ad minimum
sid realitatis quantum esse (...) concipio”, de algo que tem pelo menos tanta
realidade quanto tudo aquilo que concebo. AT, VII, 41.

Se bem que nã o tenho como compreender a natureza formal ou atual desta


causa, nã o é por isso que deixa de ser real.
Descartes argumenta entã o assim. Se bem que, como efeito do pró prio
pensamento, a ideia qua ideia nã o tem outra determinaçã o formal senã o a de ser
pensamento, este nã o deixa por isso de ter uma realidade, de ser efeito de uma
causa.
A ideia nã o tem uma determinaçã o formal para além da que recebe do
pensamento, como este nã o tem outra senã o a que recebe de Deus.
Ou seja, neste pensamento da dependência, da participaçã o formal, a ideia é
apenas “modus” do meu pensamento, que é “modus” de Deus.

A natureza do pensamento como semelhante à de Deus, é “causa efficiens” de


ideias.
Modus como “mutuatur” de, modificaçã o, transformaçã o, produçã o de.

Realidade como objetividade, como o conteú do de uma ideia.


Para uma realidade objetiva, a ideia deve ter uma realidade formal.
Ou seja, a ideia é ideia de. Mas o que é a ideia qua ideia?
A causa da ideia confere-lhe formalidade. O “cogito” como causa dá a forma da
ideia. Deus como causa dá a forma do “cogito”.

Mas a realidade tem de ser causa da formalidade. É este o argumento para a


existência de Deus.

O conteú do das ideias corresponde aos objetos, à s pró prias coisas, à realidade, à
natureza. Isto é o “modus essendi objetivus”. A forma das ideias corresponde à
sua causa, ou seja, à pró pria actividade cogitante. Isto é o “modus essendi
formalis”.

Descartes argumenta entã o, se uma ideia pode ser causa de uma ideia, segundo
as determinaçõ es aristotélicas da causa formal e final, há uma ideia primeira,
nã o pode haver uma regressã o da causa ao infinito.
Esta primeira ideia é de um ente “in quo omnis realitas formaliter
contineatur, quae est in idea tantum objetive”, de algo no qual está contido
formalmente o todo da realidade, que é apenas contida objetivamente e de forma
parcial nas minhas ideias. AT, VII, 42.
Descartes conclui que é por isso que a ideia é apenas uma imagem imperfeita das
coisas de onde foram tiradas.
A realidade objetiva da ideia nã o está em mim, vem da coisa, exterior. A realidade
formal da ideia está em mim.

Não pude causar sozinho a ideia, logo, Descartes conclui que não estou só,
“non solum esse in mundo”, que nã o há outra coisa que tem de existir. AT, VII, 42.
Tem de existir alguma coisa que causou o facto de ter em mim a ideia de
alguma coisa que está fora de mim.
Ou seja, admitir a existência de Deus, como causador das minhas ideias, é admitir
simultaneamente a existência do mundo exterior.
Sim, o meu “cogitare” pode ser realidade para uma forma, efeito para uma causa,
para Deus. Mas o ponto nã o é esse. É o de que acima da formalidade do meu
pensamento está a realidade de Deus como sua causa, que corresponde,
como o ente que contém formalmente em si o todo da realidade, todas as
ideias que possa ter, pois como criador, contém em si todos os entes do mundo,
criados, que uma vez que Deus existe, existem de facto fora de mim, sã o de facto
a origem das minhas ideias, pois Deus é a origem das minha ideias.

O raciocínio parece ser, sem Deus, que aqui é a ideia de Deus, estaria só , o mundo
nã o existia, eu seria apenas uma forma vazia, com pensamentos sem
conteúdo, puramente formais; que no fundo nã o seriam pensamentos, nã o
existindo.
Mas eu nasço com uma ideia dentro de mim que tem uma realidade
objetiva, com algo que nã o sou eu, a ideia de Deus. Esta é a tal primeira ideia,
que causa as outras.
É Deus que me une ao mundo. O tal ponto de Arquimedes onde o interior e o
exterior se intersectam.

Recapitulaçã o das propriedades das “rerum corporalium” na P34. “Magnitudem


sive extensionem in longum, latum et profundum”, “figuram”, “situm”, “motum”,
a que podemos adicionar “substantia”, “duratio” e “numerus”.

Oposição entre “ideae” e “rerum”. As cores, os sabores e outras ideias a que


nã o correspondem “choses corporelles”, que nã o podemos saber se sã o
verdadeiras, que “sint rerum quarundam ideae, an non rerum”. AT, VII, 43.
De seguida, Descartes separa falsidade formal, a verdadeira falsidade, que só se
aplica ao juízo, de falsidade material, que caracteriza este tipo de ideias que sã o
ideias de nã o coisas.

De seguida, Descartes afirma que estas sã o ideias que “non est necesse ut
aliquem authorem a me diversum assignem”, ideias cujo autor posso ser
apenas eu, porque são desprovidas de conteúdo real, ou seja, de realidade
objetiva.
Estas ideias “procedent du néant”, c’est à dire qu’elles ne sont en moi que parce
qu’il manque quelque chose à ma nature”.
Se bem que também podem ser tomadas como verdadeiras, porque “elles me
font paraître si peu de réalité”. Mas não consigo claramente discernir a coisa
do nã o ser, entã o posso ser eu o seu ú nico autor.

Definiçã o de “substantia”, “rem quae per se apta est existere”. AT, VII, 44.

A ideia de que também poderia tirar de mim mesmo, da ideia que tenho de mim,
parte das claras e distintas que posso fazer das “rerum corporalium”.
Por exemplo, a de “substantia”. Concebo-me certamente como uma. Logo, a
“substantia extensa” podia ser um modus de mim mesmo. O mesmo quanto à s de
“durationis” e “numero”.
Porque é que as “rerum corporalium ex me” nã o o sã o entã o?
Porque nã o posso conceber “extensio”, entre outras ideias, “situs”, “figura” e
“motus”, a partir de mim mesmo?
Nã o, pois a “extensio”, se bem que nã o se encontra formalmente em mim, é
apenas modo da “substantia”. Ou seja, podia conceber toda a “res” como
“substantia” a partir de mim mesmo, eminentemente.

A ideia modal, analó gica, de emanaçã o.

Só a ideia de Deus me é então estranha, não pode ter vindo de mim.


Porquê?
Parece iló gico, pois Deus também é uma “substantia”, que tem esta e aquelas
qualidades, atributos.
O argumento é que nã o posso conceber por mim a ideia de “substantia infinita”,
sendo eu uma finita.
Parece ser os problema escolá sticos, da ordem dos predicados, da participaçã o
analó gica na cadeia dos graus de ser e perfeiçã o, onde a extensã o é algo de
inferior à substancialidade tal como a de eternidade é algo de superior.
Sim, parece ser isto. “Manifeste intelligo plus realitatis esse in substantia
infinita quam infinita”. Que é causa desta. AT, VII, 45.

Como é que da ideia, do pensamento, Descartes deduz a existência, o ser?


Se tenho a ideia em mim, tem de existir. Mas como, se tenho tantas de coisas que
nã o existem?
É uma evidência formal, “qui est per se”, da mesma que a de mim pró prio, ou
seja, nã o é uma ideia de algo corporalmente existente ou que assim poderia
existir, uma imagem, mas que também, e por isso nã o é possível que seja uma
ideia materialmente falsa, tirada do nada, é uma “maxime clara et distincta”, que
“plus realitaris objectivae quam ulla alia contineat”.
Ou seja, é uma ideia positiva, nã o é algo possa imaginar como o contrá rio do
finito, que como tal poderia nã o existir.
Descartes argumenta ainda que tenho esta ideia do infinito em mim antes da
do finito, colocando-a como condiçã o de possibilidade do pró prio pensamento,
ou seja da dú vida e da certeza de mim pró prio, pois só duvido, penso, desejo e
erro porque sou imperfeito, mas só me posso conhecer como tal porque tenho
em mim a ideia de um ser perfeito.

Esta ideia de infinito tem de proceder de algo realmente infinito, uma vez
que não tendo os meios de a conceber, a tenho em mim.

As relaçõ es de subordinaçã o entre ideias.

A ideia de Deus como a mais clara e distinta, pois se tudo o que concebo desse
modo tem em si uma perfeição, esta por ser a da perfeição suprema contém
em si tudo o que assim posso conceber.
Todas as ideias que posso conceber clara e distintamente estã o assim contidas
formalmente e eminentemente na de Deus.

Diferença entre “comprehendere” e “intelligere”, nã o posso compreender o


infinito de Deus. A P37.

Actualidade e potencialidade, associadas a forma e conteú do. Talvez tenha em


mim, em potência, a capacidade de ser perfeito, pois tenho em mim a ideia de
Deus. Se bem que, actualmente, não sou perfeito.
Se bem que o meu conhecimento pode aumentar porque tenho em mim a
perfeiçã o como “potentialitas”, nunca o poderei ser actualmente.

Nã o poderia ter uma ideia objetiva de Deus se este existisse apenas


potencialmente, como um conteú do só representado por mim, que podia ou nã o
existir na realidade. Ou seja, Deus tem de existir actualmente, formalmente.

Tal como as “rerum corporalium” de que, apesar de exteriores a mim, tenho em


mim a sua ideia, só por meio desse ente divino que existe actualmente posso
ter em mim a ideia de algo que não sou e nunca poderei vir a ser, a da
perfeiçã o.

Deus como causa de minha pró pria existência. Se fosse a causa de mim mesmo,
ergo, dos meus pensamentos, seria independente, ou seja, perfeito, e nã o
poderia duvidar, desejar, errar, ou seja, nã o poderia pensar de todo.
Ou seja, é o facto de ser dependente, causado, “creatum”, que determina a
minha existência, e com isso, o meu pensamento.

Do ponto de vista de Deus, da minha criaçã o ex nihilo, as cogitationes nã o sã o


mais que “accidentia” da “subtantia” que sou.

E com isso, o meu conhecimento como argumento para a minha


imperfeição. Conheço acidentalmente, não tenho em mim o conhecimento
de tudo. Se tivesse sido eu a criar-me, com isso teria posto em mim o
conhecimento das coisas que facilmente posso conhecer. Quanto mais as difíceis,
junto das quais o meu pensamento, o meu ser, experimenta um limite.

O tempo também como argumento. Mesmo que imagine que tenha sido sempre
como sou, o da minha vida pode ser dividido em partes. Nã o sendo uno, segue-se
que se fui, posso deixar de ser agora, e que tem de ser Deus, necessariamente,
tanto a ter-me produzido como a conservar-me neste momento.
Sobre a natureza do tempo, a ideia de que “substantia” tal precisa da mesma
força e da mesma acção que a que precisou para ser criada para se
conservar em todos os momentos em que dura. Ou seja, de que conservação
e criação são unas.
Nã o sou capaz de garantir por mim pró prio que continuo a ser.

“Ad minimum esse debere in causa quantum est in effectu”. AT, VII, 49.
Se sou uma coisa que pensa e que tem em si a ideia de Deus, segue-se
necessariamente que a minha causa tem de ser também uma coisa que
pensa, e que tenha em si todas as perfeiçõ es que atribuo à natureza divina.
É por isso que a minha causa nã o pode ser os pais ou outra entidade qualquer.

De onde tira esta causa a sua existência? De si pró pria ou de uma outra?
Deus, “per se existendi”, “possidendi actu omnes perfectiones quaram
edeam in se habet”. AT, VII, 50.
De novo a escolá stica, se Deus é causa de si pró prio, se como nenhum outro ente
este se deu a si pró prio o ser, segue-se que possui em si como “actus”, forma,
todos os conteú dos, todas as potencialidades, qualidades concebíveis, incluindo
aquelas supremas que na sua ideia, concebo.

Ou seja, a partir da sua forma, actualidade suprema, Deus concebeu


primeiro em si todas as ideias.

Se a causa de mim nã o é logo Deus, nã o importa, porque há necessariamente uma


causa ú ltima. O problema aristotélico da nã o regressã o da causa “ad infinito”.
E nã o pode haver um retrocesso infinito da causa porque aqui se trata tanto da
causa da minha criaçã o, dantes, como da minha conservaçã o, agora.
Impossibilidade de ter sido criado por vá rias causas, pois Deus é uno, antes dos
seus outros predicados. Nã o podia ter em mim a ideia de unidade, se tivesse
recebido como efeito da minha criaçã o as ideias das vá rias perfeiçõ es a partir de
vá rias causas parciais.

Deus é causa ú ltima e causa ú nica.

A própria ideia do uno vem de Deus. Impossível então pensar com certeza,
clara e distintamente, sem a sua existência, impossível ser o que sou.
No AT, VII, 50, “ullo modo me”, enquanto “res cogitans, sive mentem”.

No fundo, a “lumen naturali” é sobrenatural, divina.

“(...) ex hoc solo quod existam, quaedamque idea entis perfectissimi, hoc est Dei,
in me sit, evidentissime demonstrari Deum etiam existere”. AT, VII, 51.

Nunca recebo as ideias das coisas sensíveis só pelos sentidos, mas sempre pela
acção do intelecto. Como objetos, estas coisas “expectanti mihi advenit”,
formando entã o ideias de “rerum externa sensibilium”, que podem entã o existir
mesmo ou apenas parecer existir.

A ideia de que é impossível que a de Deus seja produto da minha fantasia, pois
nã o lhe posso acrescentar nem retirar nada.

A ideia de Deus é, como a de mim mesmo, inata.

Não há maneira de me conhecer sem conhecer também Deus, assim que me


penso, por exemplo como coisa pensante ou finita ou imperfeita, já o estou a
pensar a ele, como pensante, infinita e perfeita.
Ou seja, a marca que deixou em mim, a sua ideia, nã o é de maneira alguma
diferente da ideia de mim pró prio, mas coincidem no atual exercício do
pensamento.

Uma unidade formal entre o pensamento de mim e o de Deus.

Se Deus é perfeito nã o pode ser enganador.

Como salvar a religiã o, a fé, da pró pria certeza? Descartes opõ e contemplaçã o a
meditaçã o no final da terceira.

QUARTA MEDITAÇÃO
Oposiçã o entre “rebus imaginabilus” e “intelligibiles”.
A consideraçã o das coisas puramente inteligíveis, como daquelas que sã o
independentes de toda a matéria.

As “meditationes” como um drama do pró prio pensamento, onde este se torna


acçã o.

“In me esse judicandi facultatem”, que vem de Deus. Se sim, e se este é perfeito
e nã o enganador, é porque posso julgar com certeza e nã o erradamente.
Quando só penso em Deus, só posso estar certo.

O julgar e o juízo como objetos da quarta meditaçã o, “de vero et falso”.

“Facultatem” como “puissance”, e nã o um aparelho cognitivo do sujeito à


kantiana, pois o sujeito aqui é res, substantia, uma coisa.

“Dei, sive entis summe perfecti, realem et positivam”.

Deus como verdade, o nada como falsidade, e “me tanquam medium quid inter
Deum et nihil”. AT, VII, 54.

Esta ideia do nada que se encontra em mim é a causa dos meus erros. Assim que
me afasto de Deus em direçã o a mim mesmo, “experior me tamen innumeris
erroribus esse obnoxium”.

O problema é, se sou modus de Deus, “ens perfectissimum”, que nada de falso


tem em si, como posso então errar?

Porquê o nada? Porque sou finito. Entre “Dei et nihil”, “ita esse constitutum”.
“De nihilo (...) participo, hoc est quatenus non sum ipse summum ens”,
participo do nada pois nã o sou eu pró prio “ens perfectissimum”. AT, VII, 54.

“Certe intelligo errorem, quatenus error est, non esse quid realem”, problema
do estatuto ontológico do erro, negativo.

O erro é determinado como falha no sentido de defeito, imperfeiçã o.

O erro não é nada de real, mas apenas “defectum”.

A minha finitude como origem do erro. Este nã o se segue de um poder positivo


que Deus me tenha dado, mas do facto de Deus nã o me ter dado um poder de
discernimento infinito, “facultas veram judicandi (...) non sit in me infinita”.
AT, VII, 54.

Mas o erro nã o é uma pura negaçã o, um nada negativo. É uma privação, uma
carência, de um conhecimento que podia possuir.

Deus nã o pô de criar-me de modo a que nã o pudesse errar nunca.


Mas Deus quer sempre o ó ptimo, nã o quer o meu mal. É porque errar é melhor
para mim do que nunca errar.
Mas “quaedam a Deo fiant quorum rationes non intelligam”.
Impossível compreender a causa final da pró pria criaçã o, os fins de Deus sã o
insondá veis.
Descartes nota aqui que a ideia de causa final nã o deve ser aplicada ao mundo
físico.

Deus criou-me imperfeito, mas a criaçã o divina, tomada no seu todo, é perfeita.
Como “ens creatum” sou apenas parte do universo, do todo dos entes.

Os meus erros devem-se a duas causas, à minha “facultate cognoscendi”, ao meu


“intellectu”, e à minha “facultate eligendi”, ao facto de ser livre, à minha
vontade.

Considerado em si, o “intellectu” nunca pode errar, porque não afirma nem
nega coisa alguma, mas apenas concebe as ideias de coisas que posso entã o
julgar verdadeiras ou falsas, afirmar ou negar.
“Per solum intellectum percipio tantum ideas de quibus judicium ferre
possum”. AT, VII, 56.

A ideia de que a “facultate eligendem”, a minha vontade livre, é ilimitada,


contrariamente ao meu intelecto, muito limitado.
Com isso posso ter a sua ideia, reconhecendo que a minha “voluntas, sive
arbitrii libertas”, “ad Dei natura pertinere”.
“(...) illa percipue sit, ratione cujus imaginem quandam et similitudinem Dei me
referre intelligo”, é ela que me faz reconhecer que sou imagem e semelhança de
Deus. AT, VII, 57.

Considerando os objetos possíveis da vontade, é algo de ilimitado, mas


considerada formalmente em si, a vontade é apenas a possibilidade de
afirmar ou negar, aquilo que o intelecto propõe. P46.

Descartes procura submeter a vontade ao intelecto.

Sou livre, mas terei sempre de escolher, uma coisa ou outra, um dos dois
contrá rios. A tese de uma liberdade condicionada.

Deus criou-me livre para que pudesse escolher livremente o bem. A definiçã o
desta pela “divina gratia”.
Mas também pela “naturalis cognitio”, porque para escolher o bem tenho de ter
um conhecimento do bem.
O exemplo da indiferença, o nã o conseguir escolher, como o mais baixo degrau
da liberdade, nã o uma evidência da sua perfeiçã o, porque verdadeiramente uma
“cognitione defectum”.

Contra a indiferença, a liberdade nã o é a recusa da escolha, mas justamente a


possibilidade de escolher sempre o bem. Se o meu conhecimento fosse
perfeito, escolheria sempre bem e seria “plane liber”.
Nem a vontade nem o intelecto sã o as causas dos meus erros.
A causa dos meus erros é justamente o facto de não conseguir sempre
submeter a vontade ao intelecto.
De esta, sendo mais lata que aquele, não se conter dentro dos seus limites,
mas estender-se “ad illa quae non intelligo”, à s coisas que nã o compreendo
racionalmente, clara e distintamente.
É por isso que me engano, porque não conhecendo, ajuízo sobre o que não sei,
tomando o mal e a falsidade pelo bem e a verdade, errando e pecando.

Diferença entre “judicare” e “intelligere”.


Fundamental compreender, que o “judicare” tem como objecto o “verum”, e o
“intelligere” o “clarum et distinctum”.

Daí, “intellectu” como “luce”.

Antes de ter que ver com a verdade, a razão tem que ver com a clareza.

Que nexo entre as duas “facultatem”? Uma segue-se à outra. Concebo, logo
ajuízo. E entã o, Descartes afirma, acredito.

“(...) perceptionem intellectus praecedere sempre debere voluntatis


determinationem”. AT, VII, 60.
O intelecto tem percepçõ es (concepçõ es), a vontade determinaçõ es.

A “voluntate” como “propensio”.

Quanto mais clara é a concepção, mais se lhe segue a “propensio” da nossa


“facultate judicandi” para a declarar como verdadeira, mais sou levado a
acreditar.

Com esta ambígua separaçã o e coincidência do intelecto e da vontade, Descartes


introduz logo o problema da unidade entre “natura cogitans” e “corporea” no
pará grafo seguinte, se “ambae idem sint”.

Determinaçã o cartesiana da “ratio” como passagem de a, adequaçã o entre,


intelecção e juízo.

Quando nã o tenho “rationem”, nã o devo julgar, devo ser indiferente.

O que me leva a julgar? De um lado “rationes”, de um outro “conjecturae”.

Necessá rio fazer um uso recto da “voluntate, sive facultate judicandi”, nã o


ajuizando sobre o que nã o sei. Um problema moral. Wittgenstein.

O erro é determinado formalmente como privaçã o, quando ajuízo sem ter razã o,
ou seja, sem ter tido antes uma concepçã o clara e distinta que me permita
afirmar ou negar qualquer coisa.
O erro encontra-se na operação, é feito por mim, ou seja, nã o é imanente à s
“puissances” que me foram dadas por Deus, nã o procede dele.

Há erro porque tenho de deliberar sobre coisas que nã o sei.

A ideia de actos da vontade, os juízos.

O erro, como privaçã o, não procede de Deus porque não é ente, mas
“negatio”.

A ideia de que se estivesse só no mundo talvez fosse sem erro, só teria certezas.
A de que se tudo fosse uno na criaçã o, no universo, nã o havendo partes e tudo
sendo igual, nã o havia erro, porque a criaçã o no seu todo é perfeita.

Mas Deus deu-me um modo de nã o errar, o manter a firme resolução de não


julgar sobre nada que não sei com certeza, imprimindo esta ideia na minha
memó ria, e através do método meditativo, adquirir o hábito de não errar.

Conter a vontade nos limites da intelecçã o.

O pensamento que é um pensamento, como certo, “proculdubio”, é


necessariamente real e positivo, está aquém da própria verdade.
É por isso que o pensamento é um “videre”, como um “nosse”, e nã o um julgar.
É um ver daquilo que é, ou seja, cartesianamente falando, daquilo que nã o pode
nã o ser.
Daí o primado metó dico da dú vida, negaçã o, da reduçã o, como uma ontoló gica,
antes de ser gnoseoló gica.

Sim, claro que o que é certo é verdadeiro. Mas é preciso compreender, que aqui
trata-se de enraizar, fundamentar, a pró pria possibilidade do verdadeiro.
“(...) quid agendum ut assequar veritatem”, trata-se do que fazer para chegar à
verdade, como se antes, nã o se soubesse de todo o que a verdade é. AT, VII, 62.

Descartes pensador do ser. As mesmas perguntas fundamentais da metafísica.


Que entes sã o mais que os outros entes? Como é que estes primeiros entes sã o? E
com isso, como é que aos outros entes dã o o ser?
A metafísica estabelece cadeias de ser.

Sempre a via negativa. A pergunta sobre como chegar à verdade é substituída


pela pergunta sobre como nunca errar.

“Confusius et obscurius”.

É com este primado do problema ontoló gico, com a ideia de que antes do juízo,
do problema da verdade e da mentira, é necessário assegurarmo-nos,
termos uma concepção perfeita, da existência do objeto, que Descartes
termina a quarta meditaçã o.
A quinta, e depois a sexta, vã o justamente tratar das “rerum materialium”, como
objetos do intelecto “excogitante”, primeiro da sua “essentia”, depois da sua
“existentia”.

Centralidade da ideia da aula, de que o fundamento cartesiano já não é


ontologicamente verdadeiro, mas gnosiologicamente certo.
Mas a verdade é que no fundo do fundamento está sempre o ser, que no sentido
da “adequatio” da representaçã o subjetiva ao objeto, aqui passa a ser
determinado como “certitude”.
Ou seja, é a certeza que funda o pró prio ser, é a minha concepção segura,
perfeita do objeto que o funda, que é a condição da possibilidade da sua
própria existência.
No fundo, há um pensamento onto-gnosioló gico.

A determinaçã o é sempre fundaçã o.

As “meditationes” e a ideia de exercício espiritual.

QUINTA MEDITAÇÃO
Na escolá stica, eminentemente é apenas o contrá rio de formalmente, é o que se
passa ao nível do atributo da essência, da “potentialitas”, e nã o da existência da
essência, da “actualitas”.

Diferença entre “attributum”, a propriedade essencial, e “modus”, a propriedade


acidental.

O arco das meditaçõ es é todo em direçã o à s “rerum materialium”, aos objetos do


mundo, físicos, porque o verdadeiro assunto da obra é a constituiçã o de um
novo caminho, um novo modo de acesso a este, a partir da certeza
subjetiva.

“Rerum materialium” sempre determinadas como “rerum extra me”.

Para considerar a existência das coisas fora de mim, devo considerar as


ideias dessas coisas dentro de mim, “in mea cogitatione”.
E “videre” quais sã o claras e confusas.
O segundo pará grafo da quinta, que assim resume o todo da obra. AT, VII, 63.

A “extensio” como “quantitatem continuam”.

A “extensio” nã o como atributo da “quantitatem”, mas da pró pria “res”.

É só na determinaçã o da coisa como extensã o em largura, comprimento e altura


que posso entã o dividi-la em partes e numerar, e entã o encontrar grandezas,
figuras, posiçõ es, movimentos e duraçõ es.

A coisa é assim conhecida porque é “in genere spectata”, tomada na sua má xima
generalidade. E é precisamente isto que na coisa me permite entã o conceber
“particularia innumera” quanto aos já enumerados “modus” desta “extensio”.

“Quorum veritas adeo aperta est et naturae meae consentanea”. O problema


de a “certitude” ser uma “adequatio”. AT, VII, 64.

A referência ao “Fédon” do início da P51.


O platonismo, na demonstraçã o de que tenho em mim ideias de coisas que nã o
existem fora de mim, mas que muito longe de nã o serem nada, de serem
imaginaçã o minha, sã o por isso mesmo verdadeiras e imutá veis, perfeitas
segundo a sua essência, como nenhuma ideia do sensível, de algo de material
fora de mim, o pode ser.
O exemplo do triângulo. A realidade das ideias abstratas em mim, que
encontro no ente fora de mim, como uma rememoração. Há uma ideia de
triâ ngulo em mim que nã o existe no mundo, mas que reconheço de alguma
forma no ente intramundano.
A demonstrabilidade de certas propriedades universais do triâ ngulo como
prova de que a sua ideia em mim é uma verdadeira, imutá vel e eterna.

Diferença, o triâ ngulo é “imaginatus”, nã o “effictus”.


Platã o, há o “trianguli ideam” e as “corpora triangularem figuram”. AT, VII, 64.

A ideia de triâ ngulo nã o veio à minha mente, “a rebus externis per organa
sensum”, por ter visto corpos de figura triangular, pois em mim posso imaginar
uma data de figuras que nunca vi no mundo.

A ideia de “excogitare”, usada aqui pela primeira vez. AT, VII, 64.

A “mathesis universalis” e o “grand livre du monde”.

“Quae sane omnes sunt verae, quandoquidem a me clare cognoscuntur,


ideoque aliquid sunt, non merum nihil”.
“Omne quod verum est esse aliquid; et jam fuse demonstravi illa omnia quae
clare cognosco esse vera”.
Aqui explícito, o círculo onto-gnosiológico cartesiano.
Final da P51, no latim o AT, VII, 65.

É porque conheço que é. (mas sou antes de conhecer, como Deus é antes de o
conhecer).

Tudo bem, no fundo do fundamento só há o ser. Mas na “ordre des raisons”


cartesiana, ontoló gica, a certitude determina a verdade e a verdade determina o
ser.
Esta é a ordem correta da sua exposiçã o.

As verdades mais certas, constantes, universais, como as que “in genere ad


puram atque abstractam Mathesim pertinentibus”. AT, VII, 65.

“Wirklich ist nur was messbar ist”, a frase de Planck.

Como a ideia de Deus, as ideias dos objetos matemáticos, que nã o dependem


nem da realidade exterior nem da minha imaginaçã o, sã o inatas.
O argumento é que tal como com a de Deus, se posso provar
demonstrativamente a existência dos seus atributos, segue-se necessariamente
que a ideia tem um conteú do, refere-se a, algo de existente.
A inferência da existência a partir da certeza do pensamento. P52.

Há uma inversã o da tradiçã o aristotélica, aqui a existentia segue-se da essência.


A prova da realidade do atributo, do conteú do, antecede a prova da
existência formal.
Na formulaçã o de Descartes, o que na minha concepção clara e distinta
pertence à ideia, pertence-lhe realmente, “revera pertinere”.

“Que je connais que tout ce que je puis démontrer de (...) appartient


véritablement à la nature de”. P52.

Algo de divino no objeto matemá tico, “ad ejus natura pertinere ut sempre
existat”, na traduçã o, “une actuelle et éternelle existence”.
Só de Deus dependem as “mathematicae veritates”. Estas nã o sã o menos certas
que a sua existência.

Em Sã o Tomá s, Deus existe essencialmente, é o ente onde a existência e a


essência coincidem.
Tal como em Deus, nã o é possível conceber a essência do triâ ngulo, por exemplo,
o facto dos três â ngulos somados darem sempre dois rectos, como uma real,
demonstrá vel, sem assim conceber também a sua existência.
“In omnibus alius rebus existentia ab essentia distinguere”.

A prova da essência prova a existência.

“Non magis posse existentia ab essentia Dei separari, quam ab essentia


trianguli magnitudem trium ejus anglorum aequalium duobus rectus”. AT, VII,
66.

Impossível pensar um Deus que nã o existe, pois se penso a sua essentia como a
da perfeiçã o, nã o lhe pode faltar nada, incluindo a existentia.
Tal como o exemplo da ideia da montanha, que essencialmente é o
contrário de um vale, nã o é concebível da ideia deste.
Mas, este é o tipo de argumento aristotélico que aqui Descartes procura refutar.
Nã o é do ter uma ideia do que é um montanha que a montanha existe.
Nã o é por conceber Deus como existente que se segue que Deus exista mesmo. O
meu pensamento nã o impõ e nenhuma necessidade à s coisas.
“(...) Neque ex eo quod cogitem Deum ut existentem (...) ullam enim
necessitatem cogitatio mea rebus imponit”. AT, VII, 66.
Como é que posso deduzir a existência do pensamento?
A questã o central da obra.

Descartes afirma que este tipo de argumentos sã o sofísticos, de que aqui se trata
de um “effingere”.
Nã o se pode nunca provar assim que a coisa “in mundo esse”, que a coisa existe.
Daqui pode seguir-se apenas, que a essentia e a existentia nã o podem ser
pensadas uma sem a outra.

Descartes argumenta entã o que nã o é uma necessidade do pensamento que


determina a existência da coisa, mas que é uma necessidade da coisa ela
mesma, “sed quia ipsius rei”, que vem determinar o meu pensamento,
“necessitas me determinat ad hoc cogitandum”.
Em que se baseia isto? Nã o posso pensar que Deus nã o pode existir, tal como no
exemplo do cavalo alado, que é um “effingere” meu.
Em causa está a aderência do pensamento à realidade, a segurança do nexo entre
a concepçã o e a existência do objeto.
O argumento do círculo onto-gnosioló gico, de que a “certitude” é enraizada num
“videre” ou num “nosse” primordial cuja natureza é ontoló gica, um do ente que
nã o pode nã o ser, ou seja, que antes de a “certitude” se tornar critério
gnosioló gico na determinaçã o do ser do ente, há um encontro ontoló gico dos
entes supremos, que na evidência da sua existência, determinam a pró pria
certeza como critério, e com isso toda a possibilidade de conhecer.

Só depois do “nosse” do “me” se pode falar de “certitude”, e com isso, de


conhecimento.
É porque eu existo que penso. É porque eu existo que o mundo nã o é uma ilusã o.
A inversã o relativamente ao “Discours de la Méthode”.

“L’existence de Dieu détermine ma pensée”, e nã o o contrá rio. P53.


É entã o porque a existência determina o pensamento que só posso pensar de
determinada maneira, por exemplo, que só posso pensar que Deus existe, ter a
certeza da sua existência, e nã o que Ele pode ou nã o existir. Nã o sou livre de
conceber deus, desta ou daquela maneira, pois assim nã o estaria a pensar, mas
imaginar, tal como ao conceber o tal cavalo alado.
A tal ideia de que a certeza enquanto tal está aquém, é anterior à pró pria
verdade, fundando-a.

É esta quinta meditaçã o que parece ser o verdadeiro centro da obra.

“Quia ipsius rei”, AT, VII, 67. Husserl.

Pará grafo seguinte. Primeiro é necessá rio um “ponere” do “quid”, o quê, a


existência, o ser, para entã o pensar o “quam”, o como, o atributo, a essência, e
entã o, “quandoquidem”, de regresso ao “quid”, provar, afirmar, julgar a partir daí
da sua existência.
A ordem das razõ es.

Nã o se segue que é por ter pensado a primeira proposiçã o que sou “contraint” de
chegar à terceira.
O exemplo de que ao pensar primeiro uma lei geral, todas as figuras de quatro
lados podem inscrever-se no círculo, nã o me constrange a ter de concluir que um
rhombe também o pode, o que é falso.
Ou seja, é sempre a prova da realidade do conteúdo a provar a forma, e isso
não tem nada que ver com impor o meu pensamento à realidade, ao ser.
Exemplo seguinte, nã o é por me acontecer pensar em Deus que ele existe, posso
nã o pensar em Deus que ele existe à mesma, ou até pensar que nã o existe e estar
errado. O que nã o posso é pensar na existência de um ente perfeito e estar
errado, ou seja, só posso negar Deus nã o sabendo o que é.

O “mentis meae thesaurum”.

Primeiro o advento da realidade formal da ideia, o ter uma ideia. Depois a


prova do conteúdo, dos atributos da ideia, da sua realidade objetiva. Entã o,
pela do conteú do, a prova da realidade formal da ideia, e com isso a da
existência da coisa a que se refere.
Por exemplo, um unicó rnio, mas nada daquilo que define o ser unicó rnio, que é
apenas uma imagem, me permite afirmar com certeza que um unicó rnio existe
permanente e independentemente de mim, logo, nã o existe um unicó rnio. Ou
outro exemplo, um triâ ngulo, onde a soma dos três â ngulos equivale sempre à de
dois rectos, logo, há uma realidade do conteú do do triâ ngulo, logo, triâ ngulo
existe.

É o exame da particularidade a provar a generalidade. O método científico.

Toda esta quinta é um argumento contra o idealismo. Não é por pensar na coisa
que ela existe, mas se pensar na coisa e concluir que há uma realidade do
seu conteúdo, sou forçado não apenas a concluir que a coisa existe
atualmente, como a passar a ter este critério gnosiológico da certeza como
medida do próprio ser.

Do erro. É necessá rio que se penso num ente perfeito lhe atribua as qualidades
de ser perfeito. É necessá rio que se penso num triâ ngulo lhe atribua as
qualidades de ser triâ ngulo. Nã o é necessá rio que se penso no tipo de figuras que
se inscrevem num círculo lhe atribua figuras que nã o se inscrevem.
A ideia de “falsas positiones”, oposta à de “ideas veras”, porque uma ideia falsa
não é uma ideia.
Na prova da realidade do seu conteúdo, a ideia tem de se provar como tal.

As “ideas veras” sã o “mihi ingenitas”, inatas, e como tal, “imaginem verae et


immutabilis naturae”. AT, VII, 68.

A ideia verdadeira nã o depende de mim, a verdade, a existência nã o depende do


meu pensamento. Se dependesse, era algo de “fictitium”.

Nada de subjetivo na natureza da verdade, que é objetiva. O pensamento


nunca é verdadeiro ou nã o, só os objetos do pensamento.
A ideia de que das vá rias verdades, umas há que sã o concebidas por muitos,
outras por poucos, mas que nã o deixam de ser tã o verdade como as primeiras,
nem uma vez descobertas, de o ser para toda a gente. Que a verdade é totalmente
independente do sujeito, que tem uma validade universal.

Ao contrá rio do “me”, Deus é o ú nico ente cuja existência pode ser de facto
deduzida pelo pensamento, porque é o ú nico onde a existência está
perfeitamente contida na essência.
“Summum ens esse, sive Deum, ad cujus solius essentiam existentia pertinet,
existere”. AT, VII, 69.
No fundo, nunca chega entã o a haver um confronto com a escolá stica a este nível.
Mas argumento de Descartes aqui é o de que a existência de Deus antecede o
meu pensamento, condiciona-o. Logo, é do ser que vem o pensar, nã o o
contrá rio.

No pará grafo seguinte, a ideia de que toda a certeza depende da certeza de Deus,
“absque eo nihil unquam perfecte sciri possit”.
A de que se Deus nã o existisse, estaria obrigado a ter apenas opiniõ es, a que o
meu juízo estivesse sempre a mudar. Tem entã o de existir algo de firme e
eterno, que seja causa da minha certeza.
Sou de uma tal natureza, que a posteriori só me lembro do juízo antes da prova,
antes das razõ es que me levaram ao juízo. Consequência do facto de nã o ter uma
“obfirmata mente”, fixada numa só ideia, a de Deus, ou seja a da pró pria natureza
da certeza que me permite conhecer, de maneira a que nã o errasse nunca.
É por isso que outras razõ es se apresentam a mim, com a passagem do tempo, e
que tendo a estar sempre a mudar de opiniã o, quando me esqueço da existência
de Deus.
O ponto de Arquimedes da “vera et certa scientia”, como perfeita, una, imutá vel e
eterna.

“Nec possum non credere id verum esse, quamdiu ad ejus


demonstrationem atendo”. AT, VII, 70.
Mas se “ab illa deflexi, facile potesta accidere ut dubite an sit vera”.
Assim que me afasto da prova de algo de evidente tendo a voltar a duvidar da
evidência da coisa.
Só da prova do conteú do da coisa depende a verdade, ou existência, da coisa.
O papel subordinado, corolário, do juízo de verdade relativamente à
correção, à certeza, da concepção.

“Postquam vero percipi Deum esse”, se concebo claramente que Deus existe, e se
“omnia ab eo pendere”, tudo depende dele, segue-se que “illa omnia, quae clare
et distincte percipio, necessario esse vera”, e assim, enquanto me recordar desta
concepçã o clara e distinta de Deus, mesmo que me esqueça das razõ es que me
levaram aí, nenhuma razã o contrá ria o poderá negar, “quae me ad dubitandum
impellat”, seguindo-se necessariamente que “habeo scientiam”.
Isto significa que, “at jam scio me in iis, quae perspicue intelligo, falli non
posse”, que a “scientiam” é a de que sei que se concebo o objeto distinta e
claramente, não posso falhar.
Na traduçã o, que “je ne puis me tromper dans les jugements dont je connais les
raisons”.
Ou seja, nã o adianta pensar que a minha natureza é tal que estou condenado ao
erro.

É este o argumento do quinto capítulo, que é a certeza da existência de Deus,


que se segue da necessá ria realidade da sua essência, que funda, possibilita a
certeza da existência de todos os outros objetos, que se segue
necessariamente da realidade demonstrável da “essentia rerum
materialium”.
O conhecimento é entã o o da essência, se a essência é demonstrá vel de forma
certa, segue-se necessariamente que o objeto existe.
Só é possível este conhecimento porque Deus é certamente conhecível
deste modo, porque a sua existência segue-se necessariamente da sua essência.

Trata-se da definiçã o da pró pria “regulae veritatis”.

Descartes termina afirmando que a certeza de que conheço é de tal forma


absoluta, que mesmo estando a dormir, “quamvis somniarem, si quid
intellectu meo sit evidens, illud omnino est verum”, mesmo em sonho, tudo
aquilo que no meu intelecto é concebido de forma perfeita, evidente, é
verdadeiro. AT, VII, 71.
Outro argumento para a natureza nã o subjetiva, objetiva, o que significa nã o
relativa, absoluta, da verdade.
Ou seja, que a existência, e com isso a verdade, do objeto nã o depende nunca do
meu pensamento.
O argumento cartesiano é antes o de que se o meu pensamento é certo, se a
minha concepção do objeto, que é uma da sua essência, é perfeita, tenho de
concluir necessariamente que o objeto existe. E com isso de que esta é a
pró pria “regulae veritatis”, o método mais seguro de garantir o acesso ao objeto,
e como tal, o fundamento da pró pria possibilidade de conhecer.

O tal problema de um “nosse”, puramente ontoló gico que corresponde ao


exercício negativo da dú vida, antes da pró pria certeza gnosioló gica. Descartes
afirma no ú ltimo pará grafo que só há “scire” depois de um “nossem” de Deus.
“Nota et certa” no fim.
“Avant que je le connusse, je ne pouvais savoir”.

Sobre o seu estatuto ontoló gico, as ideias inatas como “rebus intellectualibus”.
Em oposiçã o à s de “natura corporea”, na linha seguinte, apresentadas como
plena e certamente conhecíveis, tais enquanto “purae Matheseos objectum”.

Usar sempre “pura Mathesis”, quer para geometria, aritmética e outras.

A essência das “rerum materialium” só pode ser determinada pela ideia


perfeita que delas posso fazer, de si determinada pela ideia perfeita de um
ente perfeito em mim.
Ou seja, ao nível do seu conteú do, pode haver uma concepção certa das “rerum
materialium”, podemos certificar-nos da realidade da sua essência, o que é dizer,
que estas podem ser objetos do conhecimento, da minha consciência.
Esta é a tese da quinta meditaçã o.

Provado foi que posso inferir a existência de Deus da sua essência, porque é um
“ens perfectum”, onde a primeira está necessariamente contida na segunda.
Mas como é que, da realidade da sua essência, posso inferir a existência das
coisas materiais?
Este parece ser o assunto da sexta meditaçã o.
SEXTA MEDITAÇÃO

“Reliquum est ut examinem an res materiales existant.” Primeira frase.


Entã o, começa com uma conclusã o, a de que já sei que posso conhecê-las, ou
seja, de que podem ser objetos da “pura Mathesis”.

É a “pura Mathesis”, cuja existência formal é provada pela de conteúdos, objetos


matemáticos puros em mim, que vem determinar a “materialitas”, nessa a
“corporitas”, como “extensio”, erigindo-a a assim em seu objeto, de um
conhecimento certo.
Como se, como “extensio”, a “materialitas” entrasse, coubesse, pudesse ser
conteúdo, da matemática.

É justamente isto. No primeiro pará grafo Descartes afirma que a “imaginandi


facultate”, por meio da qual considero, “versor”, as coisas materiais, nã o é mais
que a “applicatio facultatis cognoscitivae ad corpus”, ou seja, está contida
nesta, é “modus” desta.

É assim que a existência dos objetos materiais é provada logo no primeiro


pará grafo.
O salto em direcçã o à existência é dado por meio de Deus. Se concebo a coisa com
certeza, com perfeiçã o, é porque participa na suma perfeiçã o que existe, logo, se
é perfeita, tem de existir também.

A existência formal segue-se da realidade da essência.

A diferença entre o meu “percipendi”, que se segue do “efficendi” de Deus, como


causa, quer do meu perceber, quer da existência da coisa.
“Quin Deus sit capax ea omnia efficiendi quae ego sic percipiendi sum
capax.” AT, VII, 71.
Mas será que Descartes vai concluir que a existência nã o se segue da realidade da
essência das coisas materiais, mas apenas a possibilidade da sua existência?
Aqui, “capax”, na segunda frase, “posse existere”.

“Praesens, ac proinde existens”, o que a imaginaçã o detecta como presente, a


cogniçã o, onde está enraizada, conhece como existente.
É porque existe, que está presente, não ao contrário; é por isso que o
exemplo é o do meu corpo.

Distinçã o entre “imaginationem et pura intellectionem”.


A imaginaçã o como representação mental.
Posso imaginar o triâ ngulo, mas nã o posso imaginar um quiliógono. Mas ambos
existem da mesma maneira, na razã o. Só da razã o se pode inferir o ser. O
problema plató nico, das aparências. A aparência, aqui “imago”, segue-se ou nã o
do ser, aqui “figura”.
A imaginaçã o nã o serve de forma alguma para descobrir as propriedades que
definem o quiliá gono como tal.
A ideia de que a imaginação é “mihi peculiari”, que depende de certas
contençõ es da minha mente, ao contrá rio da concepçã o racional, objetiva, que
nã o depende de mim. Por exemplo, sim posso imaginar um pentá gono, mas
posso imaginar um lado de cada vez, ou o espaço vazio no centro, cada parte. Ao
contrá rio da percepção racional, que é sempre uma unitária do objeto.

Ao contrá rio da razã o, a imaginação está em mim, não sou eu. “Ad mentis mea
essentiam non requiri”, logo, “illam ab aliqua re a me diversa pendere”. Nã o se
segue de mim, segue-se do meu corpo, uma substâ ncia diferente. AT, VII, 73.

É porque tenho um corpo, que unido à minha mente, estou sempre a


contemplar, a imaginar, que imagino também os outros corpos.
Uma funçã o medial do corpo, que “pro arbitro se applicet”, “fieri posse ut per
hoc ipsum res corporeas imaginer”.
“Par ce moyen il imagine les choses corporelles”.

A palavra para uniã o é “conjuncta”.

Descartes vai assim enraizar a “corporitas” na certeza do “me”.


Tal como encontro a certeza da inteleçã o ao virar-me para mim pró prio e
considerar os meus pensamentos, encontro uma certeza da imaginaçã o ao virar-
me para mim pró prio e considerar a imagem do meu corpo.
Entã o, porque a “imaginatio” é “modus” da “intellectio”, a “imago” do meu corpo
é uma ideia distinta da “natura corporea”.
Na “ideia” do meu corpo, é o pró prio “me” que a si “se intellecta vel sensu
perceptae”.

Certeza do corpo, ou seja, estabilidade, permanência, unidade. Enquanto


sou, tenho este corpo. Não me posso separar dele.

É entã o porque tenho um corpo, ou seja, porque tenho uma ideia clara e distinta,
certa, do meu corpo, que os outros corpos existem? Nã o.

O sentir, pelo qual percebo uma série de entes de forma menos distinta, por
exemplo, os cheiros ou as cores, como um “cogitandi modo”.

O problema aristotélico das “qualitates”. Validade cognitiva das “ideas istarum


omnium qualitatum quae cogitationi mea se offerebant”.

Nesta questã o das qualidades sensíveis, cujas ideias podem distinguir os corpos
entre eles, é levantada a da presença.
É porque há uma necessidade da “praesens”, porque esta não depende de mim,
da minha vontade subjetiva, que posso sentir um objeto sensível, e que isso pode
constituir conhecimento.
Se o objeto sensível está presente aos meus sentidos, não o posso não
sentir, ou fingir que sinto outra coisa.
Segue-se entã o que há uma realidade do sentir, que nã o é um “effingere” meu,
ou seja, que estas ideias das qualidades sensíveis sã o adventícias, que sã o
conteú dos reais que se seguem de objectos formalmente existentes, no mundo
“ex me”.
“(...) me sentire res quasdam a mea cogitationes plane diversas, nempe corpora a
quibus ideae istae procederent”; “ (...) illas absque ullo meo consensu mihi
advenire”; “(...) nec possem non sentire cum erat praesens”. AT, VII, 75.

No fundo, é só esta sexta meditaçã o que trata das ideias adventícias, como “ideae
sensu perceptae”, à sua maneira muito mais distintas que as factícias.
Factícias as que sã o “avec dessein et de propos délibéré”.

É por estas ideias do sensível que, apenas na presença do objeto sensível, se


apresentam ao meu pensamento, devo necessariamente “notitiam haberem” da
existência de coisas sensíveis.

O objeto é sempre o conteúdo do pensamento. Nunca confundir com a coisa


existente. Há um caminho do objeto à coisa.

Do sensível, à razã o, de volta ao sensível. A pró pria forma das “meditationes” é a


do círculo onto-gnosioló gico.

A questã o plató nica, se tudo o que posso saber da coisa corpó rea é a imagem que
tenho da coisa como objeto sensível, será que as coisas sã o semelhantes à s ideias
que em mim causam?

O círculo também pode ser visto ao contrá rio. Da razã o, para o mundo onde a
razã o se prova, de volta para a razã o esclarecida. A tal funçã o medial do corpo. A
ciência moderna e o método experimental.

O meu corpo pertence-me nã o só porque nã o me posso separar dele, mas porque


é por meio dele, “in illo et pro illo”, que sinto os outros corpos.

As “experimenta” desfazem a crença nos sentidos. Não há dúvida de que sinto e


que o objeto sensível, o que se apresenta aos sentidos, é verdadeiro. Mas não é
correto partir dos sentidos para produzir juízos sobre o objeto sem a
mediação da razão.
“In rebus sensuum externorum judicia falli”. AT, VII, 76.

A existência do objeto sensível depende inteiramente da sua correta


concepção racional.
Ou seja, nã o é por eu sentir a coisa sensível que esta existe, mas é porque é
possível uma concepçã o certa, clara e distinta, da coisa sensível. O mesmo
argumento relativamente à s ideias inatas no capítulo anterior, com o problema
de nã o ser por eu pensar no triâ ngulo ou em Deus que eles existem, mas porque
a sua existência segue-se de uma correta e certa concepçã o da sua existência.
O exemplo do “phantom limb”, sinto dor numa perna que já nã o existe. Aqui
mostra-se que é um erro partir do que sinto para concluir sobre a existência
de um corpo, de algo exterior a mim, como causa do que sinto. Ao contrá rio,
devo sempre partir da concepção do objeto, da sua ideia, nunca do sensível.
Aqui a perna nã o está presente, logo nã o pode ser concebida com um objeto
sensível, logo se pensar assim nã o erro, logo este é o modo correto de acesso à s
coisas corporais. P61.
Toda esta parte da sexta meditaçã o que lida com a realidade objetiva do sensível
é Husserl puro. A “praesens” e o “phainesthai”.

Outro argumento sobre a impossibilidade de ajuizar a partir dos sentidos. Não


há nada que possa julgar sentir dormindo que não possa julgar sentir
acordado. Logo, uma vez que a dormir nã o tenho qualquer razã o para inferir a
existência de corpos que me fazem sentir o que sinto, também nã o há razã o para
o inferir a partir do que sinto acordado.

“(...) impelli a natura, quae ratio dissuadebat”. AT, VII, 77.

Depois de admitir a existência de conteú dos sensíveis, há ainda uma reticência


retó rica em aceitá -la, perguntando-se Descartes se será possível que as
“sensuum perceptiones”, que nã o dependem inteiramente da minha vontade, nã o
precedam de facto de “rebus a me diversas”, mas de uma “facultas” em mim
desconhecida, que destas seja “effectrix”.
No pará grafo seguinte vai afirmar que não há nem razão para aceitar
temerariamente todos estes conteúdos como certos, nem para os revogar a
todos em dúvida.

No fundo, a ideia parece ser, a coisa sensível pode ser verdade e pode nã o ser.
Ou seja, é possível ter uma ideia clara e distinta do objeto sensível, concebê-lo
racionalmente através do critério da presença, mas para poder provar a
existência do objeto, este carece a um segundo nível da aplicaçã o da grelha
matemá tica, de ser determinado como “extensio”, ao nível da essência, do
conteú do da ideia.
Satisfeitas estas duas “regulae”, posso deduzir a existentia?

Tudo o que posso conceber com certeza pode ser feito, produzido, criado por
Deus tal como o concebo.
“Quoniam scio omnia clare et distinte intelligo, talia a Deo fieri posse qualia
illa intelligo”. AT, VII, 78.
Argumento para a deduçã o da existência das “rerum materialium”.

Descartes define entã o a pró pria “intellectio” segundo o “pouvoir des contraires”,
que a concepçã o certa é sempre a do ente que posso conceber separadamente,
como uma unidade, ou seja, do ente que é distinto, diferente, de um outro.
Isto serve retrospectivamente como fundamentaçã o da concepçã o das tais
“qualitatem” sensíveis, que podem efectivamente distinguir o ente.
Mas aqui, funciona como explicaçã o de que só me conheço a mim como coisa
mental na distinção em relação à coisa corporal. Entã o se estou
absolutamente certo do meu ser mental, esse é também o argumento para poder
ter a certeza da existência de um ser corporal, como o seu contrá rio.
Segue-se que há uma real distinção entre “mens” e “corpus”.

“Essentiam in hoc uno consistere”, AT, VII, 78.


A minha é só uma, o cogitare. Mas aqui, fala-se da essência da própria essência
como unidade. Justamente, o argumento para determinar todo o “corpus”
segundo uma essência una, a “extensio”.
A essência una do corpo como “extensio” contra as múltiplas “qualitatem”
aristotélicas.

É a certeza do meu corpo, e com isso, a da sua diferença real em relaçã o à minha
mente, “res cogitans”, que me permite determiná -lo como o seu contrá rio, “res
extensa”.
As ideias de “cujunctum” e “parte”.
“Ex una parte” tenho a certeza do que sou, cogito.
“Ex alia parte” só posso ser entã o outra coisa, extensa.
AT, VII, 78.

A “praesens” é ideia distinta do “sensibilium”, do qual nã o se chega a deduzir


existência. Nunca confundir com a ideia distinta do corpo, que é a “extensio”.
Uma série de fenómenos sensíveis cuja existência não pode ser certificada.
Claro entã o o tal pequeno pará grafo, o do pode ser pode nã o ser, no fim de AT,
VII, 77. Nã o devo aceitar como certos os objetos sensíveis cuja essência nã o pode
ser definida de forma segura, permanente e unitá ria, como por exemplo as cores,
os cheiros, as dores, etc. Pelo contrá rio, devo aceitar como certos os que como
“corpus” sã o essencialmente determinados pela extensã o.

“Habeam corpus”, nunca corpus sum.

“Certum est me a corpore meo revera esse distinctum, et absque illo posse
existere”. AT, VII, 78.
É certo que eu sou realmente distinto do meu corpo, e de que posso existir sem
ele.

Posso ser sem o corpo, mas este não pode ser sem mim. Como “modis
cogitandi”, as “facultates imaginandi” e “sentiendi” não podem ser sem uma
“substantia inteligente”.
O meu corpo como “modus” de mim?

“Distinctes de moi, comme les modes le sont de la chose”.


“Modus” como “accidens”.

“Intellectionem enim nonnullam in suo formali conceptu includunt, unde


percipio illas a me, ut modus a re, distingui.” AT, VII, 78.
Precisamente, o facto de Descartes ter de fundamentar a validade da ideia do
objeto sensível como “praesens”, como uma ideia do ponto de vista formal,
que mesmo que sem um conteúdo essencial certo, têm um conteúdo
qualquer, “intellectionem enim nonnullam”. Ou seja, de ter de admitir a
realidade formal das ideias do sensível como adventícias.
Estas sã o “formali conceptu” que a minha intelecçã o pode conceber, mas que nã o
vêm de mim, que nã o estã o em mim mas “a me”, na minha percepçã o, no meu
corpo, pois sou realmente distinto do corpo, ou seja, que sã o “a res modus” dos
corpos.
A imaginaçã o e a sensibilidade como pertencentes ao meu corpo e nã o a mim.

As ideias do sensível e da imaginaçã o têm uma realidade formal mas não um


conteúdo certo.
Este conteú do nã o é certo porque é diferente de mim! Só o posso determinar
seguramente, essencialmente, contra mim como “extensio”! Os conteú dos do
sensível que nã o podem receber esta determinaçã o nã o sã o conhecíveis com
certeza!

Ou seja, será correto afirmar que as ideias do sensível têm conteú do cognitivo?
Têm apenas uma realidade formal, e claro, um conteú do qualquer, que ao nã o ser
certo, nã o posso afirmar como cognitivo?
Aqui Descartes, um mestre da retó rica, deixa-nos em suspenso. Só no final vai
afirmar que sim, mesmo que nã o certas, há um conteú do cognitivo, da ideia da
percepçã o sensível.

“Substantia corporea sive extensae”, ao qual estã o “attachées”, como um “insint”,


estas “facultates”, tal com as outras de me mover ou ter fome, tudo o que diz
respeito à “anima” excepto o “cogitare”.

Descartes distingue uma “facultate” passiva do sentir de uma activa.


A passiva é por meio da qual “ideas rerum sensibilium recipiendi et
cognoscendi”, que é totalmente inú til sem uma activa que “istas ideas producendi
vel efficiendi”.
Ou seja, nã o é directamente a razã o, a intelecçã o a produzir as ideias adventícias
dos sentidos, mesmo na sua realidade formal! Mas estas sensibilidade ativa que
as produz!
Há uma separação real entre o “cogitare” e todo o “sensibilium”, como “modus”,
“accidens” deste.
O substancialismo, a grande diferença em relaçã o a Kant.

Logo, esta “facultatem” do sentir, quer passiva quer activa, nã o está em mim, nã o
pertence à minha sustâ ncia, mas a uma outra.
E aqui, Descartes vai apresentar a soluçã o do problema essencial da obra, o de
como provar a existência da realidade, ou seja, o de como se dá o acesso da razã o
ao mundo.
A que substâ ncia pertencem as ideias objetivas do sensível, que têm uma
realidade formal adventícia, e um conteú do determinado pela presença de um
ente, que se apresentando ao meu “sensorium”, nã o posso nã o perceber?
Pertencem formalmente ao corpo e eminentemente a Deus.

Sim, há um conteú do, um conhecimento objetivo da ideia sensível.


“In qua omnis realitas (...) quae est objetive in ideis ab ista facultate productis”.
AT, VII, 79.

“Corpus”, “in qua nempe omnia formaliter continentur quae in ideis objective”.
“Deus”, “in qua continentur eminenter”.
Ou seja, a cor da minha caneta pertence formalmente à substâ ncia corpó rea, ao
corpo caneta, e eminentemente, ao nível do conteú do objetivo cor como
percepçã o da realidade existente, à substâ ncia perfeita, Deus.

Tem de ser Deus a garantir o nexo do pensamento com a realidade, e com isso, a
pró pria existência da realidade!
Se nã o houvesse este link, o da participação eminente dos conteúdos
sensíveis, cuja ideia não me pertence, na substância divina, cuja ideia me
pertence, simplesmente nã o estava no mundo.
Este link é entã o precisamente o da minha mente com o meu corpo, que só se
juntam em Deus.
Este é o ponto mais importante da obra.

Realmente distintas, como “substantias”, essências, as mente e o corpo sã o


substancialmente unas, na minha existência como “ens creatum”, que procede
eminentemente, como conteú do, de Deus.

Consequência da pertença formal da realidade objectiva da ideia sensível ao


corpo “ex me”. Neste, está assim contido como presença, fora de mim, o que
como representaçã o está contido na ideia sensível, dentro de mim.

Assim, é Deus que me envia estas ideias de forma mediata, através dos
corpos onde estã o contidas formalmente.
Ou seja, nã o sã o as coisas a enviar-me as suas ideias, é Deus por meio delas.
Sendo assim, se procedem de Deus, “rebus corporeis existunt”. AT, VII, 80.

É aqui que se torna evidente que há um conteú do cognitivo do sensível, uma


“sensuum compehensio”, mas que nã o certa, é “obscura et confusa in multis
valde”, em muitas coisas.

E é aqui que Descartes afirma, como bom plató nico, que talvez as coisas
existentes nã o sejam exactamente como as compreendo pelos sentidos.

Ou seja, das coisas dos sentidos só posso ter a certeza das “quae in pura
Matheseos objecto comprehenduntur”. AT, VII, 80. A coisa assim concebida como
“generaliter spectata”.
Quanto à s “particularia”, sã o duvidosas e incertas, “minus clare intellecta”. Mas
apenas porque as suas ideias procedem de Deus, que nã o é enganador, e que
apesar de eu me poder enganar tenho em mim a capacidade de me corrigir,
que posso ter “un espoir certain” de chegar a conhecê-las verdadeiramente.
Na traduçã o, de que tenho os meios de as poder conhecer verdadeiramente. P64.

A natureza, “generaliter spectata”, como “Deum ipso”, como “rerum creatarum


coordinationem a Deus institutam”. AT, VII, 80. O Espinoza.
Há entã o uma verdade na natureza.
A minha natureza particular como o conjunto ou a complexã o das coisas que
Deus me deu. Deus deu-me um corpo, que pertence à natureza criada por ele.
Como tal, nã o devo duvidar das verdades do corpo, pois o Deus que o criou é
perfeito, por exemplo, de que tenho dores ou fome.
A ideia de que há uma docência da natureza, uma vez que é divina, em que nã o
só posso como devo acreditar.
Na introduçã o, uma expansã o da razã o para lá de si mesma.
Aqui entramos na longa conclusã o da obra.

“Unum quid cum illo componam”, eu e o meu corpo. AT, VII, 81.
“Unione et quasi permixtione”.
Isto demonstra-se no facto de ter pensamentos que sã o do corpo, as sensaçõ es,
“hoc ipsum expresse intelligerem, non confusus sensis haberem”.
O exemplo de que ao magoar o corpo tenho uma sensaçã o, um pensamento claro
e distinto a partir deste. Outro exemplo, o de que nã o há sensaçã o de fome
confusa.
O que em nada refuta o facto de as sensaçõ es, como “modus”, “accidens” do
cogito como “puro intellectu”, serem maneiras mais confusas de pensar,
inferiores, na cadeia de ser.

As “qualitatem” como “varietates” de “sensuum perceptionibus”, que se


encontrando nos corpos, vindas destes me aparecem.
A ideia de que o corpo existente nã o é tal como assim o percepciono, de que nã o
o posso determinar na sua essência segundo estas “varietates”.

A ideia de que é só porque tenho um que posso pensar outros corpos, que sã o
“circa meum”.
Corpos de que devo fugir ou aproximar-me, por causa do meu corpo. E ideias
sensíveis, que através de Deus, deles emanam, agradá veis ou desagradá veis

No fundo, o que procede da natureza é sempre verdadeiro. Sou eu, que no


mau uso das minhas capacidades, que produzo erros e pecados.
O falso é sempre contingente, nunca necessá rio.

Os sentidos só sã o enganadores quando tendo a partir deles para ajuizar sobre o


ser da coisa.

O falso “ad mentem solam pertinent”. É por isso que Descartes pode afirmar que
“a natura doctus esse”. AT, VII, 82.

Coisas que conheço pela “natura”, em sentido estrito, pelo meu corpo. Outras
pela “lumen naturali”, pela minha mente.
Coisas que me foram dadas por Deus, aqui “natura”, como o ser composto de
mente e corpo, e coisas que me foram dadas por mim pró prio, aqui “lumen
natural”, como as noçõ es da filosofia ou da ciência.
A distinçã o profunda entre concepçã o e juízo.

As pró prias concepçõ es, os conteú dos objetivos do meu pensamento, sã o sempre
certas, vêm de Deus. Eu é que ao servir-me delas, para produzir juízos, muitas
vezes erro.
Os “modus” sã o “accidens “do “attributum”, que é a “essentia” do “ens”. Descartes
expõ e-no nos “Principiae”, artigos 52 e 53 da primeira secçã o.

Se bem que “la nature m’enseigne quelque chose”, nunca me pode ensinar
nada sobre a existência das “rebus extra nos”. Nã o é possível concluir nada de
verdadeiro, ou seja de ajuizar, sobre estas a partir dos sentidos, mas só através
da “lumen naturali”, o intelecto.
“Verum scire ad mentem solam”. AT, VII, 83.
Só eu, a mente, e nã o o conjunto de mente e corpo que sou, pode conhecer com
certeza.
A partir dos sentidos, “sine ratione judicavi”.

A atitude natural, que vem do corpo, da qual tenho sempre a aprender,


enquanto mente, como uma “realis sive positiva propensio”.
Mas se bem que justificada, esta propensã o como uma crença, a que se opõ em
as certezas do meu intelecto.

A crença passa a inserir-se na “facultate judicandi”. Tenho ou nã o razã o de


acreditar?

O exemplo do calor. Nã o tenho razã o para acreditar, através dos sentidos, que o
calor está no fogo. Tenho apenas razã o para acreditar que há qualquer coisa no
fogo que me faz sentir, que provoca em mim, o sentir calor.
Ou seja, através dos sentidos só me posso referir ao corpo fogo através do meu
corpo, nunca diretamente ao fogo!
Posso conhecer, e com isso ajuizar, através dos sentidos que tenho calor, mas
nada posso conhecer sobre o que o fogo é ou nã o, excepto o ser algo que me
afecta desta ou daquela maneira. P66.
A não identidade perfeita entre o que me parece ser a coisa, como a
percebo sensualmente, e o que a coisa realmente, certamente, é, tal como
concebida pelo “intellectu”.
E por outro lado, já uma antecipação da Ding-an-sich kantiana.

O erro como um “ordinem naturae pervertere”. AT, VII, 83.

Distinçã o entre a coisa “illa ipsa quae (...) mihi a natura exhibentur” e os
“internos sensus” que dela procedendo, Deus me envia.
Problema de estes “internus sensus” poderem ser enganadores, e com isso Deus.
O exemplo da carne com veneno, onde a natureza nã o é culpada da minha morte,
pois Deus leva-me apenas a desejar a carne, nunca o veneno. O problema sou eu,
que ignoro que tem veneno, ou seja, que a minha natureza como “res limitata”
nã o é omnisciente, mas de uma “limitata perfectionis”.

O erro, ou o pecado, provém sempre de um juízo, ou uma decisã o, baseada num


“ignorat”.
A natureza nunca me engana.

O caso seguinte, “erramus ad quaeva natura impellimur”, com o exemplo do


doente, que quer uma coisa que lhe faz mal. AT, VII, 84.
O argumento é o de que o corpo deseja o seu mal porque, doente, a sua
natureza está corrompida. Segue-se a consideraçã o do corpo humano como um
mecanismo, que mesmo estragado, obedece à s “leges omne naturae”.
A ideia é a de que aqui é apenas o corpo, que como de uma natureza realmente
distinta da da mente, pode estar mal constituído, tal como um mecanismo que
tem erros de fabricaçã o, e que no quadro de uma realidade puramente
fisioló gica, pode ter desejos nocivos à sua pró pria constituiçã o.
Assim, a concepçã o da possibilidade de uma existência do corpo sem vontade,
ou seja, sem “mens”, movendo-se apenas “par la disposition de ses organes”.
Ou seja, neste tipo de casos excepcionais, mostra-se uma possibilidade de erros
do pró prio corpo.

Este corpo estragado como um que “a natura sua deflecter”, e “aberrare”, se


afasta e nega a sua pró pria natureza.
Casos limite, os doentes, uma pessoa com hidropsia que tem sede.

A ideia de que as sensações do corpo “significam” à mente.

Descartes acaba por separar estas concepção da “natura”, meramente


denominacional, concebida como uma “cogitatione mea”, da concepçã o que é a
do tratado, a da “natura” como a realidade das pró prias coisas. Ou seja, uma
concepçã o mecanicista e uma substancialista.
Idealismo e realismo.

Do substancialismo, o realismo, “per illam vero aliquid intelligo quod revera in


rebus reperitur”. AT, VII, 85.

No passo seguinte, Descartes demonstra que se considerar o composto, e nã o


apenas o corpo segundo este modelo da denominaçã o exterior, tenho de facto
um “verus error naturae”, pois é a minha “mens” que tem sede, quando beber me
é nocivo, nã o apenas a minha garganta que está seca.
Como é que a perfeiçã o divina permite entã o que a natura seja “fallax”?

O corpo, “sempre divisibile”, a mente, “plane indivisibile”.


A divisibilidade de toda a “res extensa” é “in cogitatione”.

Funçã o mediadora do cérebro na recepçã o dos “affici”, impressõ es do corpo, pelo


cogito.
A possibilidade de uma ligação física do corpo à mente, os nervos e a
glândula pineal. Que é no fundo outra prova, científica e não filosófica, de que
os sentidos pertencem ao corpo.
Os muitos nervos, que das muitas partes do corpo, se dirigem para uma só zona
do cérebro, que comunica com uma mente una e indivisível. A esta
actividade do cérebro, mediadora, entre os sentidos e a razã o, o meu corpo e
mim mesmo, Descartes chama o “sensus communis”. AT, VII, 86.

Os nervos como cordas, que ligam as partes do corpo.


Aqui, “docuit me Physica”, e nã o “natura”, no quadro do tal modelo ideal, da
denominaçã o externa da coisa, como mera representaçã o minha.

Um modelo mecâ nico de toda a afecçã o, do sentir, “idem de quolibet alio sensu”.

O problema de ser a mente que sente, e nã o por exemplo o pé, quando faço uma
ferida.

Uma afecção imediata desta tal parte do cérebro à mente.


A ideia de que sã o determinados movimentos no cérebro que provocam
determinadas sensaçõ es na mente.
E a de que estes movimentos provocam sempre sensações com vista à minha
conservação, ou seja, de que a natureza, Deus, é boa e nã o perversa, enganadora.

O “excogitare”, e nã o a “repraesentatio”, como o verdadeiro sentido de


representaçã o mental.

No final, depois das provas metafísicas, as físicas. A ordem das razõ es.

O core da metafísica cartesiana. Só a partir do cogito posso deduzir a existência.


Entã o o corpo “signum dat” à mente para sentir, ou seja, pensar, que no pé
qualquer coisa, por exemplo uma dor, existe.

O que conserva como “utilius”, como principio do senso comum.

A ideia de que posso sentir qualquer coisa no pé sem vir do pé, mas de um erro
no meu sistema nervoso. De que, tal como no exemplo do doente, “sensusque
naturaliter fallaetur”. AT, VII, 88.
Conclusã o, se o meu corpo é uma má quina, é possível que se possam processar
erros, e por isso, como conjunto de corpo e mente, apesar da soberana bondade
de Deus, sou “fallacem”.
Mas da possibilidade de erros no corpo, que como no exemplo dos “hydropiques”
sã o anomalias, nã o devemos concluir que nos engana sempre, mas que “corpus
est bene constitutum”.
Os sensus “multo frequentius verum indicare quam falsum”. AT, VII, 89.

“Memoria, quae praesentia cum praecedentibus connectit”. AT, VII, 89.

A conclusão, aquilo que “quotidie a sensibus exhibentur” nã o é falso. Posso


confiar nos sentidos na maior parte das vezes, posso confiar no meu senso
comum, pois o meu intelecto “jam omnes erreandi causas perspexit”, devendo
assim rejeitar as minhas “dubitationes” iniciais. AT, VII, 89.

Nã o uma rejeiçã o final de toda a dú vida, mas de uma incerteza geral. A certeza
de que posso estar certo.

A memó ria prova que a vigília é distinta do sonho, pois nã o posso ligar os sonhos
uns aos outros.
Distinçã o final entre “spectrum” e “res vera”, a determinada segundo um “unde,
ubi et quando”, pelo meu intelecto, cuja percepçã o da ocorrência posso conectar
com as outras da minha vida pela minha memó ria. O sonho e a vigília. AT, VII, 90.

Uma ordem das “facultatem”, “sensus, memoriam et intellectum”.


Descartes estabelece um ú ltimo critério da “res vera”, é aquela que percebo como
tal por estas três, sem entre elas se apresentar qualquer conflito.
INTRODUÇÃO, PREFÁCIOS & RESUMO INICIAL

A originalidade de Descartes é a partida no sujeito. Trata-se de uma refundaçã o


de todo o saber a partir do seu conhecer. A analogia nas “Regulae” entre a luz
natural do espírito humano e a do sol, na iluminaçã o de todo o objeto.

Descartes determina a ideia como clara e distinta.

“La vertu du doute fait de son incertitude même le seul véritable point fixe”.

Descartes é a fundaçã o metafísica da física moderna.

Descartes funda a física sobre a ideia de espaço geométrico, definindo o objeto


físico como “res extensa”, em largura, comprimento e profundidade.
O reducionismo traduz-se no colapso da definição escolástica da coisa
através das qualidades reais e formas substanciais.

A coisa sensível, física, define-se em termos da extensã o, figura e movimento.

A ideia aristotélica e escolá stica de forma substancial, imaterial, que enforma a


coisa e a torna inteligível como tal coisa.
Por exemplo, a forma substancial de lá pis, que me permite ver este lá pis como
um lá pis.

Descartes concede que a mente é uma forma substancial, e que há uma união
substancial com o corpo.
Mas antes, conclui que há uma distinção real entre mente e corpo, conceito que
integra o título da pró pria obra.
A ideia de que a uniã o é subordinada à distinçã o.

As qualidades sã o no fundo as categorias.

A ideia de dú vida hiperbó lica, a primeira meditaçã o.

Episteme significa saber, Platã o contrasta-a com doxa.

Descartes contrasta o saber humano, limitado, com o saber divino, ilimitado, que
como tal ultrapassa os limites do conhecimento.
É um contraste entre compreensível e inteligível.
A ideia de que a intelecçã o nã o tem de ser adequada, de que nã o tem de igualar o
seu objeto. Deus é entã o inteligível e indefinível.

Contraste entre infinito, como uma ideia positiva, e indefinido, como ilimitado,
algo cujos limites nã o nos sã o acessíveis. “Le monde”, de 33.

A ideia de espaço indefinível na sua extensã o e indefinivelmente divisível, como


fundadora da de espaço geométrico, ou seja, da pró pria física.
A física cartesiana é mecanicista.

No fundo, Descartes separa pensamento de extensã o.


As formas e as qualidades da escolástica abandonam então o objeto,
concebido como corpo, como “res extensa”, sendo devolvidas ao sujeito,
como “res cogitans”.
Ou seja, as formas e as qualidades passam a ser subjetivas.

A ideia de noçã o primitiva. Três, ao pensamento e à extensã o, junta-se mais tarde


a uniã o.

A consciência como essência do pensamento.

Descartes é sempre o dualismo, o problema corpo e mente.

É a dú vida que prova o pensamento, que prova a minha existência, a da mente.


Contra a minha existência, o que mais propriamente subjaz ao exercício da razã o,
a existência do objeto, a do corpo.

A liberdade cartesiana como indiferenciaçã o, por sua vez, como ignorâ ncia,
indiferença.
O conhecimento é entã o a diferenciação, o poder dos contrários.
Um lado determinista.
Ulteriormente, no debate com os jesuítas, Descartes vai associar a liberdade aos
contrá rios, ao poder do sim e nã o, implícito em cada acto livre. Só a diferença
entre um e outro permite a escolha.

No fundo, o exercício da dú vida hiperbó lica é para duvidar dos sentidos.


É nesse quadro que, como um detour, mas para afirmar a radicalidade do corte
com o sensível, Descartes pergunta se está louco.
E entã o, para reafirmar a razã o, como algo independente da experiência sensível,
vai delimitá -la contra o sonho.

Para afirmar a certeza, Descartes tem de excluir o domínio do prová vel.

A ideia de que as meditationes cruzam o exercício com o sistema.


A de que há uma experiência da pró pria razã o, que os pensamentos tornam-se
acontecimentos que afectam, transformam, moldam o pró prio sujeito.

A crítica de Arnauld, de que há um círculo na demonstração, de que esta


resulta da prova. Simultaneamente, as ideias claras e distintas dependem e
provam a existência de Deus, que nã o é um enganador, um demiurgo maligno.

A descoberta dos indubitáveis limites da dúvida.

A ideia de que só há certeza no exercício da dúvida.


A existência da dú vida prova a da certeza.

A hipó tese do Deus enganador é a de que o meu ser é incapaz de verdade.


Como se esta fosse a razã o da pró pria dú vida, a dú vida das dú vidas, uma
suspensa sobre todas as evidências.
A prova de que Deus existe, porque a evidência existe, é entã o uma prova das
provas.

A dú vida nã o é um pensamento, tem um estatuto negativo.

Há a dú vida e a razã o da dú vida. Descartes prova a certeza através da dúvida.


E com a prova da certeza, refuta a razão da dúvida.

Na sexta meditaçã o há dois factos que apoiam a prova da existência dos corpos.
A passividade, constrangedora, do nosso sentir. A inclinaçã o natural a relacioná -
lo com o nosso corpo; que passa entã o a ser uma a acreditar que o meu sentir se
deve à acçã o de um outro.

A ideia de que em Descartes, com o problema da veracidade de Deus, a razã o


acaba por se estender para fora de si pró pria.
A sexta, onde pela primeira vez há um partir dos sentidos para provar a
existência dos corpos.

Beyssaud opõ e exercício meditativo a prova sistemá tica.


As meditationes como uma ascese.

A ideia de que nas meditationes trata-se de torcer a dú vida contra a dú vida.

A de que a dú vida, ao tornar-se hiperbó lica, se esvazia a si pró pria.


A de que como hiperbó lica, absoluta, a dú vida acaba por ser uma afirmaçã o do
infinito, da existência de Deus.

Descartes e a glâ ndula pineal.

Contra a teologia, na idade média a filosofia é definida como razã o natural,


humana.

Descartes quer identificar o matemá tico com uma razã o divina.

Certeza como determinaçã o correlativa de evidência, de verdade.

É a certeza, certitude, no sentido da universalidade matemá tica, que vem


determinar a pró pria razã o, raison.
A carta aos teó logos da Sorbonne. A oposiçã o entre raisons, philosophiques, e
certitudes, geometriques.
“parce qu’elles ne continennent rien qui, considéré séparément, ne soit très facile
à connaître”.
“elles demandent un esprit entièrement libre de tous préjugés et qui se puisse
aisément détacher du commerce des sens”.

Deus é inteligível, mas é incompreensível porque é infinito.


É como se até Descartes a actividade científica nã o tivesse um fundamento
transcendental, mas partisse do empírico, das choses materielles.

A dú vida hiperbó lica como método de apagar o preconceito.


Como preconceito, os falsos fundamentos empíricos da actividade científica.

Colocar tudo em dú vida, para nesse estado demonstrar que há coisas de que nã o
é possível duvidar.

A dúvida coloca-se ontologicamente. Posso duvidar de tudo, ou seja, da


existência de todas as coisas. Mas ao duvidar, há uma de que nã o posso duvidar,
da minha pró pria existência, do facto de que penso.
É aqui que se institui a distinçã o entre mente e corpo, da mente nã o se pode
duvidar, do corpo pode-se. A mente tem uma natureza intelectual, o corpo nã o
tem.

A concepção clara e distinta é a essencial, determinada como substancial.


É aqui que entra o poder dos contrários. A concepçã o clara e distinta é a da
substâ ncia claramente diferenciada, ou seja, realmente distinta.
Isto segue-se, é deduzido da distinçã o real entre alma e corpo apresentada logo
na segunda meditaçã o (mas verdadeiramente instaurada na diferença entre
dú vida e certeza, logo na primeira).
Nã o apenas uma existência de substâ ncias diversas, mas contrá rias, frisa
Descartes.

O problema da divisibilidade. A alma, que tem uma natureza intelectual, nã o se


pode dividir. Do corpo, mesmo do mais pequeno, podemos conceber a sua
divisã o.

Descartes só intui negativamente a imortalidade da alma. Porque nã o tem outra


definiçã o positiva de mente senã o o cogitare.

A ideia de que há substâ ncias puras, imperecíveis, e compostas, perecíveis.


É assim que Descartes diferencia mente de corpo, mas também a substâ ncia do
corpo em geral, como extensio, imperecível, da do corpo em particular,
composta e acidental.
Isto dado que nã o pode negar o postulado escolá stico de que a pró pria
substantia, seja a do corpo ou da alma, é incorruptível, que só se corrompe
segundo a vontade de Deus.

E esta distinçã o é fundamental porque o geométrico, o realm matemá tico, é o


desta substâ ncia do corpo em geral.

Outra oposiçã o, entre mutabilidade, a do corpo, que se move, quer coisas


diferentes, cresce, etc., e mesmidade, a da mente ou de Deus. Mas é a sua
evidência, negativa, que constitui o Grund, o background que possibilita o
pró prio pensar, a razã o concebida com certitude.

É assim que o metafísico instaura o físico.


Há uma fundamentação negativa da positividade.

O conhecimento certo, como compreensão, do corpó reo, do geométrico,


matemá tico, enraíza-se na certeza, como intelecção, da mente e de Deus.

Há uma distinçã o real entre mente e corpo, mas que de alguma forma perfazem
uma unidade.
É assim, a partir da evidência da mente e através desta ideia de unidade, que
Descartes vai tentar provar a existência das coisas corporais.
Descartes concede que a de Deus e da mente é mais certa e mais fá cil de
demonstrar, refugiando-se quanto ao corpo na inutilidade da prova
relativamente ao provado, segundo Beyssaud.

OUTRAS LEITURAS

“... me resolvant de ne chercher plus d’autre science que celle que se pourrait
trouver en moi-même, ou bien dans le grand livre du monde”, Descartes,
Discours de la Méthode, Première partie, 9 (ePub, Les É chos du Marquis, 2011)

“...que ces choses peuve servir d’objets à des pensées véritables”. Descartes
a Mersenne, 16.10.1639. AT II, 597, 15-16.

“Ein ‘Zirkel im Beweis’ kann in der Fregestellung nach der Sinn des Seins
uberhaupt nicht liegen, weil es in der Beantwortung der Frage nicht eine
abteilende Begrundung, sondern um aufweisende Grund-Freilegung geht”.
“Na colocaçã o da questã o acerca do sentido do ser em geral nã o pode residir ‘um
círculo na demonstraçã o’, pois tal questã o nã o se atinge no responder por uma
fundamentaçã o derivante, mas apenas pela assinalante libertaçã o do
fundamento”, Heidegger, Sein und Zeit, GA 02:08.

“La démonstration cartésienne de l’existence de Dieu est le mouvement du je


approfondissant sa propre existence.” Henri Gouhier, Essais sur Descartes (Paris,
J. Vrin, 1949, p. 128)

“Le cogito est l’idée de Dieu (...) L’idée de Dieu n’est pas dans la conscience, c’est
la conscience.” Ferdinand Alquié, La découverte metaphysique de l’homme
(Paris, PUF, 1950, p. 236)

“Ein transcendentales Prinzip ist dasjenig, durch welches die allgemeine


Bedingung a priori vorgestellt wird, unter der allein Dinge Objekte unserer
Erkenntis uberhaupt werden konnen...” Kant, Kritik der Urteilskraft.
Einleitung, V. Kants Werke, Ak Ausgabe, Bd. V, S. 181.

“Die Beziehung zwichen dem Ich und dem Gegenstand, die oft gennante Subjekt-
Objekt-Beziehung, die ich fur die allgemeinste hielt, ist offenbar nur eine
geschichtliche Abhandlung des Verhaltnisses des Menschen zum Ding, insofern
die Dinge zu Gegenstanden werden konnen...” Heidegger, Gelassenheit (3ª ed,
Pfullingen, 1959, S. 55)

“onto-theo-ego-logische”, Heidegger, “Hegel”, GA 32:193.

“...interdit d’admettre comme existant ce qui n’est pas tout à fait à l’abri de toute
possibilite d’être mis en doute.” Husserl, Méditations Cartésiennes (Paris, J. Vrin,
1966, Trad. Gabrielle Peiffer e Emmanuel Levinas, p. 2)

“...à liberer la philosophie de tout préjugé possible (...) en vertu d’évidences


dernières tirées du sujet lui même”. Husserl, Méditations Cartésiennes (Paris, J.
Vrin, 1966, Trad. Gabrielle Peiffer e Emmanuel Levinas, p. 5)

“...retrouver, dans son intériorité pure, une extériorité objective”. Husserl,


Méditations Cartésiennes (Paris, J. Vrin, 1966, Trad. Gabrielle Peiffer e Emmanuel
Levinas, p. 3)

“...de l’objectivisme naif au subjetivisme transcendental”. Husserl, Méditations


Cartésiennes (Paris, J. Vrin, 1966, Trad. Gabrielle Peiffer e Emmanuel Levinas, p.
3)

“Was er aber bei diesem ‘radikalen’ Anfang unbestimmt lasst, ist die
Seinsart der ‘res cogitans’, genauer der Seinssinn des ‘sum’.” Heidegger, Sein
und Zeit (GA 02:24)

“Die ‘res cogitans’ wird ontologisch bestimmt als ‘ens’...” Heidegger, Sein und Zeit
(GA 02:24)

“...dieses Hereinwirken der mittelalterlichen Ontologie in die ontologische


Bestimmung, bzw., Nichtbestimmung der res cogitans”. Heidegger, Sein und Zeit
(GA 02:25)

“Was seiner seinsart nach so ist, dass es dem Sein genugt, das in der
mathematischen Erkenntnis zuganglich wird, ist im eigentlichen Sinne.”
Heidegger, Sein und Zeit (GA 02:95)

“Per se autem notum mihi videtur, omne id quod est, vel esse a causa, vel a se
tanquam a causa.” Descartes, Responsiones, AT, VII, 117

O “principium reddendae rationis”, o princípio da razã o suficiente em Leibniz


(Der Satz vom Grund).

“Aquilo que é Deus como causa sui, para o ente que defende a sua causa, é-o o
ego, como cogito, para o ente como cogitatum. O ego torna-se ente supremo para
uma ontologia do ente representado.” Jean-Luc Marion, Sobre a ontologia
cinzenta de Descartes (Lisboa, Piaget, 2011)

Jean-Luc Marion, Sur la pensée passive de Descartes, Paris, PUF, 2013

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