Escola Estadual Luciana de Abreu é uma escola de ensino fundamental de
turno integral, as aulas começam às 8:30 e a escola finaliza o dia às 17:30. É situada no Santana, um bairro de classe média. É uma escola flexível, observei que os alunos podem se locomover sem supervisão pela escola e existiam algumas concessões, como a possibilidade (após pedir permissão da diretoria) de os alunos se deslocarem sozinhos até o supermercado ao lado da escola para comprar lanches. Possui nas instalações biblioteca, laboratório de informática, refeitório, duas salas de artes e quadras ao ar livre. É possível para os alunos irem (sem acompanhamento) na sala da direção solicitar e retirar materiais para usar durante as aulas (como chromebooks, folhas, materiais para escrita e pintura).
Os alunos possuem um currículo diferenciado, como no ensino médio,
com aulas de “Empreendendorismo”, “Ciência, Tecnologia e Cultura Digital” e “Educação Financeira e Fiscal”. A instituição na teoria possui um grande potencial para preparar os alunos para a vida prática após a saída da escola, mas a quantidade de tempo não é equivalente a “preparação para o futuro”, conhecimento “absorvido” ou“aprendido”. Pelo relato de um aluno do sétimo ano sobre as aulas de Educação Financeira e Fiscal, ele não via muito sentido em aprender sobre o assunto naquele momento, durante as aulas não estava interessado por não ter contato nenhum com as situações abordadas. Dizia que o professor mostrava como fazer as coisas mas não dizia o motivo de ser organizado daquela forma. Pelo relato de outros professores, existem muitas disciplinas que mesmo depois de uma formação, existe dificuldade para pensar em uma abordagem.
As observações foram realizadas em turmas de 6º, 7º e 9º ano. As
primeiras aulas estive na aulas de “Artes”, presenciei uma visita à Pinacoteca Aldo Locatelli e algumas aulas de “Expressão Artística”. No caso, por ser perto do dia da consciência negra, o docente estava trabalhando “o continente africano” e a produção de um desenho com coloração em papel a4,em cada ano a proposta era correspondente com o conteúdo trabalhado anteriormente. No sexto ano e no oitavo ano propôs desenho de máscaras, no sétimo o desenho de um orixá e no nono ano o desenho de um busto de uma pessoa africana. No quadro havia um texto sobre o tema que ia ser abordado na aula, falando da importância e do significado das artes e também como eram feitas, junto de um enunciado com os critérios para a realização da prática. Ele pedia para os alunos lerem o texto e logo depois resumia e explicava de forma breve o texto/atividades que deveriam realizar. Todas as atividades necessitavam de consulta de imagens, mas o professor não trouxe nenhuma imagem, então os alunos realizaram a consulta pelos Chromebooks disponibilizados na escola, usaram celulares para pesquisar ou desenvolveram alguma imagem por imaginação.
As turmas observadas eram muito tranquilas, faziam as atividades de
forma silenciosa ou enquanto conversavam com os colegas. Existiam alguns educandos que não realizavam as atividades e ficavam jogando no celular, mas poderiam entregar a atividade em outro momento. Nenhum aluno me pareceu extremamente empolgado com as aulas de artes ou pelas atividades, apenas uma menina ficou muito feliz de poder desenhar um orixá que ela apreciava. Mesmo no dia de visita guiada na Pinacoteca, eles aparentavam cansaço e desorientação. Não sei atribuir algum motivo em especial, pode ser o clima de final de ano, mas acredito que o cotidiano seja extremamente cansativo para todos os envolvidos em uma escola de turno integral. Todos vão passar 40 horas por semana,conviver e fazer as atividades diárias naquele ambiente. Vão realizar a maior parte das refeições da semana e estar vendo as mesmas pessoas durante esse tempo todo sem ter um espaço para descanso.
O docente comentou sobre alguns trabalhos que produziram durante o
ano e os conteúdos abordados, que chegamos para observar as aulas em um ponto do ano letivo no qual eles já “venceram” todo o conteúdo. No restante do ano ele fazia aulas intercaladas de teoria da arte e prática. Os alunos do 9º ano conheciam a teoria da cor, já tinham conhecimento de movimentos artísticos e alguns períodos históricos na arte, trabalhavam bem com tintas guache e pincéis.
Percebi nos alunos um uso constante de redes sociais e jogos online,
gostavam de anime, músicas funk e trap, além de se vestir de maneira livre,pois a escola não possui uniforme. No nono ano observei que alguns discentes usavam piercings e já tinham tatuagens. No geral não era visível nenhuma restrição na vestimenta, algumas meninas se vestiam muito no estilo anos 2000 (roupas curtas e calças de cintura baixa), calças jeans e camiseta, ou roupas esportivas/ abrigo. Entre os meninos também era popular moletom,camiseta e calça jeans com correntes, roupas para academia e esportes (como basquete e futebol).
A sala de artes que os alunos do fundamental dois utilizam é grande e
espaçosa, mas acredito que a organização e a disposição dos materiais poderia ser repensada. A sala poderia ser utilizada de uma forma mais funcional e ser mais organizada. O professor não tem interesse em orientar os alunos a organizar e limpar os materiais ou arranjar a sala de uma forma diferente. A escola possui diversos recursos que não são possíveis em outras escolas e que aqui me parecem mal utilizados.
O docente é formado em Licenciatura em Artes Visuais, com uma
especialização em história da arte. Trabalhou anteriormente em outro colégio com ensino médio e prefere trabalhar com esta faixa etária. É professor também de ensino religioso, realizou uma formação em ensino religioso para complementar as horas necessárias de ensino no estado e ficar somente em uma escola. Admirei muito a honestidade brutal, a liberdade que dá para os alunos em sala de aula, a abertura para conversa e orientação que ele demonstrou. Também é uma pessoa muito afetiva com os alunos e parece encorajar a produzir e se comportar de forma mais concisa. Fala de forma irônica, mas também leva os alunos a sério e ouve o que eles têm a dizer, ao mesmo tempo que ele tem um senso de humor e sabe quando ignorar algum comentário, algo que não acontece tanto em ambientes escolares. Mas está insatisfeito onde trabalha agora e não parece se esforçar para ter uma aula com uma abordagem interessante, com projetos diferentes. Ele passa a atividade e deixa os alunos trabalhando, não interage muito, exceto para chamar atenção ou conversar com alguém que vai até a sua mesa. Não é o tipo de professor que busca conversar individualmente com cada aluno e circular na sala. Cada turma ele trata diferente, no 6º ano existia uma tensão, ele pediu para os alunos fazerem tarefas adicionais que não foram solicitadas nas outras turmas.
No planejamento do ano letivo já estava considerado as saídas de campo
para visitar diversos museus de Porto Alegre, segundo o professor existe a possibilidade de solicitar autorização aos pais e ir com os alunos em um ônibus de linha em lugares mais longínquos da escola. Para locais mais próximos é possível se deslocar com o grupo sem pedir autorização da direção e dos pais.Durante a visita no museu ele passou uma atividade para os alunos observarem as obras e responderem. Apenas 6 alunos participaram da visita guiada, após o trajeto eles foram visitar a pracinha da alfândega e retornaram ao colégio no horário estipulado. No outro dia, quem participou da visita guiada na Pinacoteca criou uma obra inspirada nas obras que conheceram no museu. Os que não estavam presentes na atividade fizeram uma obra inspirada na coleção de livros e mídias que interagiram durante o ano.
Na aula de expressão artística, cada turma tem um período e eles são
reservados para leituras de livros e apresentações sobre livros. Durante o ano eles leram livros clássicos da literatura brasileira e agora estão lendo outros materiais. Os do sexto ano são livros mais infantis e a partir do 7º ano eles devem ler livros da coleção “Vagalume ", livros de aventura dos anos 80. Eles ficam a disposição para os alunos escolherem numa estante que fica dentro da sala e depois eles farão um teste dando mais detalhes do que eles acharam da leitura, onde se passa a história, quais os personagens e um resumo. A maioria parava e tentava ler, respondia o melhor possível a proposição, outros sentavam nos sofás e conversavam, lanchavam e usavam o celular.