Você está na página 1de 8
Elementos de Estétiea Joao de Jesus Paes Loureiro 3* Edigdo Revista e Ampliada &. eR Capa: Lais Zumero Foto: Patrick Pardini Paldcio Anténio Lemos (detalke da fachada) Projeto Grafico/Produgao Editorial: Lais Zumero Reviso: José dos Anjos Oliveira Editoragio Eletrénica Maria Auxiliadora Prado, Joao Carlos Moraes, Cristinam Pantoja Lisboa Impressao Grafica Supercores Fotolito Pontopress Dados Intemacionais de Catalogago na Publicagao (CIP) (Biblioteca Central da UFPA, Belém-PA-Brasil) Loureiro, Jodo de Jesus Paes Blementos de estética / Joio de Jesus Paes Loureiro. — 3. ed. rev. ampl. Belém: EDUFPA, 2002. Bibliografia ISBN 85-247-0219-2 1. Estética, 2, Arte, I. Titulo. cDD -d. 701.17 © Direitos de cépia/Copyright, 3? edico, 2002, por/by Universidade Federal do Para Proibida a reprodugio total ou parcial, Os infratores serio processados na forma da lei Disrripuicio Editora Universitdria -EDUFPA/Livraria do Campus Rua Augusto Cortéa, n. 1 Campus Universitario Guamé 66.075-110 ~ Belém-Paté-Brasil Telefax: (Oxx91)211-1965 - Caixa Postal 8609 Site: wwwufpa.br/edufpa E-mail: edufpa@ufpa.br Origem da arte 1 A arte expressa sentimentos por meio de uma forma, explora a realidade por via da aparéncia, promovendo verdadeira recriagéo do mundo. Com isso, torna-se fonte de prazer e sua presenca estimula a imaginagao do contemplador. Nao apenas de um, mas do grupo, de comunidades inteiras, sendo, portanto, motivo de solidariedade social, numa experiéncia compartilhada por muitos em diferentes momentos da existéncia, saciando e realimentando nossa necessidade de beleza. A origem da arte esta na Pré-Histéria, no Paleolitico Superior. Antes, no Paleolitico Inferior (de 50.000 a.C. até 30.000 a.C. aproximadamente), fase obscura da evolugao a condi¢ao humana primitiva, a utilizagao de ferramentas foi uma das etapas basicas dessa transformagao. Nessa fase, 0 6rgao privilegiado foi a mao, tida por alguns como “érgao essencial da cultura, iniciador da humanizagao”, sendo o homem “razao e mao”, como também j4 se observou. Assim, pelo trabalho, atividade essencialmente humana, num processo de ensaio e erro, isto 6, pela pratica de experiéncias sucessivas, o homem determinou sua forma de poder sobre a natureza, no que teve papel importante a criacao de algum meio intermediario entre ambos: a ferramenta. Nasce o “instrumento” e, com ele, o aumento do exercicio do poder do homem sobre as coisas. A vara - primeiro instrumento? - inicia 0 processo em que o homem primitivo, ao utilizd-la, normalmente, para apanhar a fruta, percebeu que podia alguma coisa além dos bracos: um poder além de suas forcas naturais, desde que criasse um instrumento para isso. Outra descoberta importante foi a “semelhanca”, a duplicagao que, também, “duplicava” a qualidade do poder. veo E P 10 Elementos de Estética * Joao de Jesus Paes Loureiro O valor da semelhanga se acentuou pela experiéncia pritica, por meio do estratagema de imitar os animais como forma de engana-los, atrai-los e mata-los. Dai, poder-se compreender o que sera exposto, em seguida, na atitude do pintor-cacador do Paleolitico Superior, o qual acreditava em adquirir poderes sobre os animais que pintava com realismo figurativo duplicando-o na parede das cavernas. A arte originou-se, propriamente, no meio de um povo primitivo, formado de cacadores, numa atividade econdémica instavel (parasitaria), sem tarefas de previsio para produzir alimentos. Procuravam tirar sustento na captura de suas provisées. Viviam socialmente sem organizagao, numa forma elementar de individualismo e sem aparentes demonstragdes de crenga em Deus ou deuses, como também na vida eterna, apds a morte. Os grupos humanos deviam sustentar-se encontrando alimento sem produzi-lo pelo plantio ou criagao, norteando sua vida pelo sentido pratico mais simples, que é a busca permanente de alimentos. E compreensivel que a arte deixada por esses povos seja, inicialmente, uma arte de reprodugao da natureza. O sentido de observagao direta do mundo que adotavam no sistema de vida aparecia nas obras pintadas no interior das cavernas, nas paredes recOnditas (pinturas parietais) e que eram naturalistas, lineares, de cores firmes, revelando a impressao do olhar, a aparéncia das coisas, 0 passageiro momento da vida. A observacao visual é mostrada de modo direto e puro, com representagéo do movimento, em alguns casos. Acredita-se em que a arte do Paleolitico Superior estivesse dominada pelo sentido de um poder de magia, com funcao de permitir a obtengdo de sobrevivéncia. O pintor-cagador acreditava em que, ao pintar o animal, passava a ter sobre ele um poder, a garantia de posse antecipada, uma antecipagdo da morte que iria provocar no animal. A arte determinava o acontecimento “real”, pois o animal pintado nao diferia do verdadeiro. O mundo era percebido como um todo indistinto. O artista era criador de realidades vivas. Mas nao estava interessado no efeito estético puramente contemplativo da obra, pintada no mais escuro interior das cavernas, sem possivel carater decorativo, dando, no entanto, a impressao de estar em lugar reservado as praticas magicas. Além disso, os animais vi- nham atravessados por flechas e langas idénticas 4s que sangrariam o animal verdadeiro. Torna-se claro compreender, assim, o realismo da arte paleolitica, pois a eficiéncia do efeito magico decorreria, também, da exatidao do modelo representado na pintura. Eevidente que, na fase artistica do Paleolitico Superior, ha mtitua implicacao entre arte e conhecimento. O homem duplica a realidade. Essa duplicagdo resulta de uma demonstracao de possibilidades pessoais que confere a ele uma sensagao de poder sobre a realidade. Mas a significacao somente pratica das pinturas parietais de Altamira, na Espanha, por exemplo, ja esta claramente suplantada. Ainda que o objetivo seja a conquista de realidade pratica, isso vem impregnado a um comportamento em que a figuragéo pela pintura se associa 4 magia. Com isso, o homem acreditava em alcangar a meta objetiva: a caca de animais selvagens. Algumas teorias tentam explicar a origem das artes, sendo conveniente uma idéia geral sobre isso. Cada uma delas traz sua contribuigdo ao esclarecimento do problema, sem, no entanto, representar conclusées definitivas. 1 - Teoria da Necessidade Inata - O homem tem o instinto da beleza, provocando sua exteriorizagdo na estetizagao das coisas ou, de modo mais elevado, na forma da arte. Estaria, assim, pela criacgao artistica, ou estetizagao das coisas, satisfazendo a uma necessidade que o impele para tal. Por isso, nao poderia o homem deixar de criar aquilo que considerasse belo. 11 Origem da Arte + 1 12 Elementos de Estética + Jodo de Jesus Paes Loureiro 2 ~ Teoria da Arte Utilitéria ~ A arte, para aqueles que seguem essa idéia, é 0 resultado do aperfeigoamento, em busca de funcionalidade e ordem. Uma espécie de fazer cada vez melhor ajustando ou adequando 0 objeto a sua perfeita finalidade. 3 ~ Teoria Magica ou Religiosa ~ Segundo este ponto de vista, as artes teriam origem na invocacao de forcas sobrenaturais. Esta teoria jé esta referida em outra parte deste capitulo. 4 ~ Teoria da Fungéo Expressiva — A arte surge da necessidade de expresso e comunicagao do homem, ¢ o que afirmam os seus seguidores. Busca exprimir 0 seu interior. Para isso, o meio adequado sera o da simbolizagao, pois os simbolos sao a melhor forma de revelar as intuigoes da sensibilidade humana. A arte, por essa via, ¢ a expresso simbélica de uma cultura. 5 ~ Teoria Mimética - O ponto de partida desta teoria esté no seguinte: o homem tem a tendéncia natural para imitar. A arte passa a ser o produto disso, espécie de segunda natureza diante da qual o homem se reconhece responsavel, pois ela depende dele para existir. Objetos artisticos, uma vez que ele “cria” esta segunda natureza. O instinto do homem para a reproducao de objetos, gestos, etc., tera sido acondicdo que o levou a criar, por imitagao. 6 - Teoria Liidica - Aqui, se diz ser a atividade artistica a forma de 0 homem dispersar as energias acumuladas, depois que deixou de lutar, de forma némade, pela sobrevivencia, para instalar-se num sistema de previsio ¢ lazer. Assim, 0 homem, pelo sistema de acumulacao de bens, passando a dispor de écio durivel, inventou o jogo da imitacao da vida comum. Dessa disposicao, teria nascido a arte. A arte como jogo, sendo o “impulso Itdico” um atributo do homem, que, por meio desse impulso, se torna pleno. O impulso lidico é um estado de liberdade em que razio e sensibilidade jogam juntas. A arte é uma expressao em que transparece 0 aspecto documental, além do intenso contetido emotivo. Sao qualidades que se revelam inseparavelmente ligadas, nas formas de documento e emocao. Revelando condicées relacionadas a sua época, a obra de arte de qualquer fase historica é acolhida por sua dimensio social, isto é, pelo que nela se dirige ao “homem social”. Todavia, a obra também € percebida pelo que chamamos de “homem interior”, pela sensibilidade de quem a contempla. No primeiro caso, temos a obra relacionada com as condic¢des de cada época, vinculando o carater social presente tanto no artista que cria, como no espectador que a contempla. Ja no segundo, percebemos o aspecto essencial da arte, que nao parece ter ligacdo com nada de exterior, relacionando- se, apenas, com a subjetividade do artista. Nasce no intimo do criador, dirigindo-se ao intimo do contemplador. Porém, para alcangar esse interior, a obra se reveste de qualidades formais que expressam, simbolicamente, a moldura de valores culturais que a fazem comunicar-se com nosso ser social. Por esse motivo, rompendo a barreira do presente, podemos emocionar-nos com a arte do passado, compreendendo-a melhor, na medida em que nossa sensibilidade se reforga com informacées das condigdes antigas em que a obra surgiu, acentuando a relagao entre o ser social do artista de outra época com o ser social do contemplador. A obra de arte nao pode aspirar a uma linear objetividade na representacao do real, sem acrescentar-lhe nada. E o fruto da subjetividade que aduz a arte sua essencial humanidade. E-lhe fundamental a presenga do humano pois, por meio dela, o homem faz da criagao da arte um signo auténomo, criando, fora da natureza, uma outra que é fundamentalmente humana, transformando, com isso, o mundo e a si mesmo. Desde a pintura parietal 13 Origem da Arte + 1 pré-histérica até os dias atuais, com os experimentos “ abstratos, 0 que da grandeza a obra de arte é 0 “grau de 14 _ realidade interior, humana, que 0 artista soube incorporar a realidade” (Roger Garaudy - “Sobre o Realismo Artistico”) Seja qual for a razao e maneira do seu surgimento, a arte atravessa a historia, exprimindo 0 desejo de felicidade dos seres, revelando a realidade da cultura por meio de simbolos que sao a sua expresso, humanizando as coisas na obra, a qual, por sua vez, ao nascer da transformacao da natureza, promove a transformacao do artista, em permanente processo de implicagao ou circularidade. Elementos de Estética * Jodo de Jesus Paes Loureiro a L P a E P

Você também pode gostar