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Maridos e Esposas - Um Sermão Sobre o Casamento
Maridos e Esposas - Um Sermão Sobre o Casamento
MARIDOS E ESPOSAS
Um sermão sobre o casamento
João Calvino
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João Calvino Brasil
As citações bíblicas usadas nesta tradução são da versão Almeida Corrigida Fiel | ACF
Copyright © 1994, 1995, 2007, 2011 Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil.
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Nós vimos até agora como cada um de nós está sujeito a seus vizinhos, e
que de outra forma não podemos viver uns com os outros, a não ser
participando de algum dever em sinal de sujeição diante de nosso próximo.
E, como isso não nos agrada, porque cada um de nós deseja estar acima de
seus companheiros, e, como damos tamanha importância a essa busca por
elevação pessoal que é difícil nos rebaixarmos, também constatamos que,
se tememos a Deus, não devemos achar estranho o fato de sermos
ordenados a nos submeter a nosso próximo, pois Deus nos criou tendo essa
condição em vista. Vocês podem constatar, então, que o amor nos liga de
tal maneira às demais pessoas que não devemos menosprezar nenhum
homem, nem odiá-lo ou considerá-lo de tal maneira indigno que não possa
ter algum serviço prestado a ele. Pois em consideração a Deus, ou nós
baixamos a cabeça, ou nossa rebeldia será nossa ruína.
E agora São Paulo vai além, revelando que há ordens e categorias
específicas entre os homens. Pois, embora a regra citada acima permaneça,
ou seja, ordenando que todos nós nos esforcemos para cumprir nosso dever,
ainda assim há uma sujeição mais elevada do que aquela existente
universalmente entre todos os homens, a qual se trata, particularmente, da
subordinação do filho em relação ao pai, da esposa em relação ao marido e
de todos os demais subordinados aos seus superiores. Eu já vos disse antes
que existe uma irmandade, mesmo entre estranhos, ligando as pessoas mais
distantes da terra, porque elas são todas de uma mesma natureza, e todos os
homens são obrigados a reconhecer-se em dívida uns com os outros. No
entanto, quando Deus decide unir por um laço mais íntimo e santo algumas
pessoas, cada homem deve olhar mais atentamente para si mesmo. Pois
quando uma esposa se une ao marido, ela é dada a ele como um auxílio e
faz parte do corpo dele. Além disso, trata-se de uma sujeição especial, de
modo que, embora o marido possa ter posição superior em autoridade, isso
não o impede de ter obrigações para com sua esposa. Pois ela é sua
companheira para viver e morrer com ele.
O mesmo ocorre com os filhos em relação a seus pais, e com os pais em
relação a seus filhos, cada um em seu lugar e posição, como os súditos em
relação a seus príncipes e superiores e servos em relação a seus senhores.
Vocês podem perceber, então, que agora nós temos de lidar com o fato de
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que precisamos viver cheios de amor uns pelos outros, procurando cumprir
o dever que Deus nos impõe, de acordo com a nossa capacidade. Ao
mesmo tempo, não devemos desprezar a ordem estabelecida por Deus entre
nós, mas, antes, ser impelidos ainda mais a cumprir nosso dever neste
mundo, sabendo que se recusarmos essa condição, estaremos entrando em
guerra contra Deus.
E agora vamos ao casamento, o qual não se trata de algo ordenado pelos
homens. Sabemos que Deus é o seu autor e que é em Seu nome que ele é
celebrado. A Escritura diz que é uma aliança santa e, portanto, a chama de
divina. Então, se uma esposa é extremamente teimosa e não encontra em
seu coração o desejo de suportar o jugo matrimonial como uma fiel
companheira, ainda que o mal que ela cause seja direcionado ao marido, é
Deus quem está mais indignado. E por quê? Porque é Sua vontade que o
vínculo entre os dois seja inviolável, e eis que encontra uma criatura mortal
determinada a quebrá-lo e deixá-lo em pedaços! Vemos então que, ao fazê-
lo, ela se coloca contra a majestade de Deus. Por outro lado, quando um
homem insiste em dominar sua mulher de acordo com seu gosto e
extravagância, desprezando sua esposa ou usando-a de modo cruel e
tiranicamente, ele mostra que também despreza a Deus e O desafia
abertamente. Pois o marido deve saber para que propósito foi criado, em
que consiste o estado civil do casamento e que lei Deus estabeleceu para
ele. Portanto, o que São Paulo nos convida a fazer é levar em consideração
o propósito de Deus em cada estado em que nos encontrarmos. Porque
enquanto nossos olhos se fixarem apenas naqueles com quem temos
obrigações, é certo que sempre encontraremos inúmeras desculpas para nos
eximir de toda lei.
O marido pode alegar: “eu tenho uma esposa terrível e teimosa”; ou então
argumenta que ela é orgulhosa, tem um coração perverso ou até mesmo que
é tagarela demais. Outra talvez seja uma bêbada, preguiçosa ou com
alguma outra disposição. Em suma, não há homem que não seja capaz de
apresentar algum motivo, quando não deseja manter a fidelidade e a honra
do casamento, quando lhe cai bem. A esposa também, por sua vez, não
ficará sem seu estoque de desculpas. Pois muitas vezes o marido pode ser
iracundo e briguento, com pouca consideração por aquilo para o qual Deus
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que é Ele quem une marido e mulher, um ao outro, selando essa ligação; e,
portanto, cada um deles deve prestar atenção aos seus respectivos deveres.
Quando São Paulo diz a respeito das esposas que elas devem se sujeitar a
seus maridos, devemos observar que essa sujeição é dupla. Pois o homem
já era a cabeça da mulher antes mesmo do pecado e da queda de Eva e
Adão. (1 Tm. 2:13) E São Paulo, usando a mesma razão para mostrar que
não é apropriado que a esposa governe em igualdade de condição com o
marido, diz que o homem não veio da mulher, mas a mulher do homem, e
que ela faz parte do corpo dele. Pois Deus poderia ter criado Eva da terra,
como fez com Adão. Mas essa não era a vontade Dele. Antes, Ele uniu o
homem e a mulher de tal maneira que o homem, sabendo que sua esposa
era como sua própria substância e carne, fosse induzido a amá-la (como
veremos mais adiante); e que a esposa, conhecendo de si mesma, que não é
como que inteiramente independente, mas unida ao homem, suporte sua
submissão pacientemente e com uma afeição voluntária. Pois, se a mão,
sendo membro do corpo, recusar-se a ficar em seu próprio lugar e insistir
em se acomodar no topo da cabeça, que coisa estranha seria! Então, se
olharmos para trás e vislumbrarmos a criação deles e da mulher, o marido,
por sua vez, deve ser induzido a amar e honrar sua esposa como a si
próprio; e a esposa, vendo que ela foi tirada da constituição do homem,
deve se submeter pacificamente a ele, como seu cabeça.
Mas há também outro vínculo que reforça essa submissão da esposa, pois
sabemos que ela foi enganada. (Gn. 3; 6; 1 Tm. 2:14) As mulheres,
portanto, devem lembrar que, estando sujeitas a seus maridos, recebem o
salário do pecado de Eva. E ambos devem considerar que, se o casamento
tivesse permanecido sadio e sem corrupção, não haveria nada além de
felicidade para os homens e suas esposas. Pois sabemos que todos foram
abençoados por Deus, e não havia nada que não pudesse ser transformado
em gozo e alegria. Mas agora, embora as bênçãos de Deus brilhem em
todos os lugares, tanto acima como debaixo do sol, há sempre sinais de
maldição impressos neles, de modo que não podemos contemplar o céu ou
a terra ou toda a gama de criaturas, sem perceber parcialmente que Deus se
tornou um estranho para nós, porque nosso pai Adão caiu e foi arrancado
daquele estado nobre e excelente no qual ele foi originalmente criado.
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entre ela e sua família, mostrando, com suas ações, que não possui uma
centelha do temor a Deus, já que rejeita o marido, que é seu cabeça e, por
assim dizer, sacerdote de Deus a esse respeito.
Portanto, note que São Paulo não usou essa semelhança para ligar em pé de
igualdade os maridos (que são criaturas mortais, e não mais que pobres
vermes sobre a terra) a Jesus Cristo, mas para mostrar brevemente que, já
que nosso Senhor Jesus preside o casamento, os homens devem ter seus
olhos Nele, e assim cada pessoa se submete pacientemente, visto que
ninguém pode recusar sua parte sem desprezar Aquele que deseja que o
casamento seja mantido como um vínculo de dever mútuo, para que o
homem possa amar a sua esposa e a esposa estar sujeita ao seu marido.
Isso é, em suma, o que temos que lembrar nessa passagem.
Agora, então, permitam que as esposas olhem bem para sua função e
compreendam que quando rivalizam com seus Maridos, é como se
rejeitassem a Deus, porque (como eu já disse) Ele não as criou senão para
essa finalidade e condição, para que estejam sujeitas a seus maridos. É
verdade que muitas agirão de forma tão orgulhosa e arrogante a ponto de
dizer: “Meu marido deve ter autoridade sobre mim?” Mas nisso tal mulher
demonstra que não está disposta a permitir que Deus tenha qualquer
superioridade sobre ela e que gostaria de jogar para debaixo do tapete a lei
de Deus acima mencionada. No entanto, como não há outro remédio, senão
este, as mulheres precisam se humilhar e entender que a ruína e a confusão
de toda a raça humana surgiram da parte que lhes cabia no Éden, de modo
que todos nós estamos perdidos, amaldiçoados e banidos do reino dos céus.
Quando as mulheres (afirmo) entendem que isso veio das ações de Eva e do
sexo feminino (como São Paulo nos diz em 1 Tim. 2:14), não há outra
atitude para elas senão agir de forma humilde e suportar pacientemente a
submissão que Deus lhes impôs, que nada mais é do que um aviso para se
manterem discretas e modestas. Mas se elas se levantam contra seus
maridos e não conseguem encontrar prazer em serem conduzidas por eles, é
como se fossem, por assim dizer, colocados outros selos no pecado de Adão
e Eva e na desobediência cometida por eles, sendo esta uma declaração de
que essas mulheres não estão dispostas a permitir que Deus cure a ferida,
apesar do fato de ela ser mortal. Agora, quando fazem guerra contra a graça
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de Deus, o que pode resultar disso, senão o caos absoluto? Mas as esposas
obstinadas não pensam nisso, porém, ainda assim, está tudo registrado
diante de Deus, e terão de prestar contas disso para sua total confusão.
Devemos, portanto, prestar maior atenção a esse aviso, para que todos
possam glorificar a Deus em suas próprias casas.
Também devemos fazer com que os maridos pensem em seu dever. Pois
(falando de maneira adequada) embora eles não estejam sujeitos a suas
esposas, porque suas esposas não têm autoridade sobre eles, no entanto, são
promovidos a essa honra de superioridade sob uma determinada condição, a
saber, que não sejam cruéis com suas esposas, ou achem que tudo que lhes
agradar é permitido e lícito, pois sua autoridade deve ser, antes, uma
manifestação de companheirismo do que uma realeza. Pois não há dúvida
de que o marido não é a cabeça de sua esposa para oprimi-la ou fazer pouco
caso dela. Mas ele deve entender que a autoridade que ele tem o coloca
mais ainda sob obrigação para com ela. Por ser ele o cabeça, precisa ter
discrição em si mesmo para guiar sua esposa e sua família. E como fará
isso acontecer, senão usando de bondade e brandura, auxiliando
discretamente sua esposa no que diz respeito às fragilidades que ele sabe
que ela possui, assim como São Pedro nos adverte? (1 Pe 3: 7)Você vê,
então, que os maridos devem exigir obediência de suas esposas, quando ao
mesmo tempo eles mesmos também devem cumprir seus deveres; que
possam considerar o fato de que não serão mantidos diante de Deus, se
derem ocasião a suas esposas para se levantarem contra eles. Pois é certo
que, se um marido se comporta discretamente e com integridade, a sua
esposa se submeterá a ele e nosso Senhor inclinará tanto o coração dela,
tornando-o disposto, que a casa inteira será pacífica.
Agora, o mais importante é que, em primeiro lugar, Deus seja invocado.
Pois, embora um homem possa usar todos os meios possíveis, ainda que
confie em seu próprio entendimento, apesar disso, tudo que conseguirá é
desperdiçar o seu tempo. E por quê? Porque Deus acabará rindo dessa sua
presunção em desprezar Sua direção. No entanto, se os maridos consideram
que Deus tem o coração das pessoas em Suas mãos e os inclina como bem
entender, e, consequentemente, orarem ao Senhor para receber Dele graça e
poder para conquistar suas esposas, de modo que elas possam concordar
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suas necessidades do que elas mesmas poderiam fazer por si. Quando
tiverem ponderado cuidadosamente sobre o assunto, discutido e reunido
todas as razões possíveis, ainda assim, é certo que não saberão tão bem o
que é o melhor para suas vidas, como Deus sabe, O qual as submeteu a seus
maridos. É de fato para seu bem-estar que assim seja, a fim de que elas
possam se manter, o que de outra forma não seria possível.
No entanto, São Paulo também apresenta nosso Senhor Jesus Cristo aos
maridos, para que eles não abusem da autoridade que lhes é concedida por
Deus, destruindo a amizade que deve ser mantida dentro do casamento por
agirem de forma tão cruel, como é seu costume. E o que ele estabelece
sobre nosso Senhor Jesus Cristo é o seguinte: De que maneira Ele amou
sua Igreja? Antes de mais nada, e principalmente, Ele se entregou por ela;
Ele não se poupou quando se revestiu de carne como homem. É verdade
que todo poder e domínio lhe foram concedidos, de modo que todos os
joelhos se dobram diante Dele (como diz São Paulo aos Filipenses, capítulo
2, verso 10), e todos nós, grandes e pequenos, devemos prestar-lhe
homenagem. No entanto, o que Ele fez por sua igreja? Ele se agradou em
reinar de maneira a exercer uma tirania sobre nós? Não! Pelo contrário, Ele
se humilhou e, embora tenha poder soberano sobre os anjos do paraíso, se
submeteu à lei; Ele foi chamado de servo e foi totalmente esvaziado por
nossa causa. (Fl. 2: 7; Gl. 4: 4)
Agora, quando vemos que Deus nutre por nós um amor tão inestimável em
nosso Senhor Jesus Cristo, O qual se colocou na pessoa de um marido e
garantiu que seríamos como uma esposa para Ele — quando olhamos para
isso, pergunto, deveríamos nós, os maridos, não sendo nada além de
vermes rastejantes da terra e algo que nada é, nos recusar a seguir o
exemplo do Filho de Deus, que não levou em conta Sua própria glória e
majestade celestial, a fim de se rebaixar por nós? Portanto, isso basta para
amolecer os corações, tanto de um lado como do outro, se não houver uma
tão má selvageria, ou pior, se não houver uma perversidade cruel em
ambos, tanto nos homens como nas mulheres. Por considerar que nosso
Senhor Jesus Cristo se humilhou tanto pelo amor que tem por nós, que não
somos nada além de podridão e uma coisa sem valor, e considerando que
Ele nos disse que nada é melhor do que as esposas estarem sujeitas a seus
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Comovente foi o termo escolhido para manter a fidelidade da tradução sem apresentar qualquer visão distorcida da glória e
majestade de Deus, a qual a equipe está comprometida em exaltar. Uma vez que tal adjetivo define alguém capaz de despertar fortes
sentimentos em outra pessoa, não houve qualquer prejuízo ao sentido original do termo. O vocábulo utilizado pelo reformador Calvino
no seu sermão em francês foi “pitoyable”, que descreve uma pessoa que provoca piedade em outra. É provável que tal palavra tenha
sido empregada de modo a trazer à mente dos ouvintes a imagem chocante de Cristo em seu martírio, se entregando ao sofrimento e à
morte por amor à Igreja.
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seus deveres. Por exemplo, pode ser que um marido afirme possuir uma
esposa doce e agradável (como falei antes); ele, por sua vez, poderia apoiá-
la sem dificuldades, e ela passaria por momentos maravilhosos ao lado
dele. Mas talvez outro homem alegue que sua esposa é uma bêbada ou
comilona, e outro que sua mulher é dada ao luxo e à extravagância, de
modo que todo dinheiro no qual ela põe as mãos só é usado para uma coisa:
vestir-se e adornar-se; e ainda outro argumenta que sua esposa é preguiçosa
e não faz nada. Bem, essas coisas podem ter algum peso para os homens.
De fato (como eu disse antes), se o assunto dissesse respeito apenas às duas
partes, cada uma delas teria sua defesa em mãos, para lançar fora o jugo
que as une. Mas nesse caso o marido deve pensar: eu tenho uma esposa
indisposta, alguém de cabeça dura ou alguém que não possui qualidades
agradáveis nem qualquer cuidado com a casa; em relação à minha parte,
como devo me comportar, não apenas nesses assuntos mundanos, mas
também em relação a Deus?
Quando o marido tiver considerado e examinado minuciosamente suas
próprias falhas, ele não terá mais argumentos, e, assim, deverá suportar
pacientemente as falhas de sua esposa, até que Deus lhe dê a graça de
corrigi-las. Enquanto isso, aconteça o que acontecer, não deixe de agir
como marido, aplicando-se aos interesses de sua esposa, para conquistá-la
para Deus. Pois o marido não foi colocado em uma posição de
superioridade por outro motivo senão para o benefício e bem-estar de sua
companheira de jugo. E como é uma lei inviolável, o mesmo argumento
também deve convencer as mulheres. Se uma esposa tem um marido
bêbado e um frequentador de tabernas, outra tem um jogador compulsivo,
um desperdiçador, outra tem de lidar com um sujeito debochado e
dissoluto, e outra com um homem terrível que nunca está em paz com ela,
de modo que faça ela o que for para obedecê-lo e agradá-lo, ainda assim
nunca consegue obter paz ou boa vontade; que essa mulher considere o
seguinte: Este é o flagelo de Deus sobre mim, pois não fui o que deveria ser
ao obedecer o meu Deus e a me submeter a toda a sua vontade. Como
tenho me aplicado a servi-lo e honrá-Lo? Como me desobriguei das
responsabilidades que Ele colocou sobre mim?
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Que a esposa pense dessa maneira sobre essas coisas e conclua que, não
importa o que aconteça, não é certo que criaturas mortais rompam o
vínculo pelo qual Deus nos uniu, pois isso seria como lutar contra Ele.
Portanto, devo me submeter àquele que é meu cabeça. E embora ele possa
ser terrível, é necessário que eu esteja sujeita ao meu Deus, que tem o
coração de meu marido em suas mãos, e pode amolecê-lo quando bem
entender. E não devo dar ocasião a ele de me fustigar com a vara com o
intuito de vencer minha teimosia, pois assim Deus ficaria aborrecido com
ele e comigo. Portanto, as falhas da esposa não podem eximir o marido de
manter a lei inviolável que Deus ordenou, isto é, que os dois devam viver
juntos em comum acordo. Do mesmo modo, as faltas do marido não
dispensam a esposa de se submeter a ele e obedecê-lo em todas as coisas
com respeito a Deus, como é dito por São Paulo sobre o assunto.
Agora, Paulo, para confirmar melhor essa exortação, declara como nosso
Senhor Jesus Cristo é o Salvador de todo o corpo, a saber, porque Ele se
entregou pela Igreja para “santificá-la”. Certamente essa doutrina não pode
ser tratada agora de maneira completa. Não obstante, temos de observar em
poucas palavras que aqui São Paulo mostra com mais detalhes o que ele
havia mencionado antes, a saber, que o marido e a esposa sempre podem
refrear seus sentimentos perversos e que, quando são tentados a Se
divorciar um do outro, ou a ficar indignados um com o outro, o caminho
certo para subjugar todas as paixões iníquas é prestar atenção à promessa de
união espiritual entre nosso Senhor Jesus Cristo e nós, de que falaremos
mais plenamente depois.
Antes de tudo, devemos considerar que nosso Senhor Jesus Cristo Se
entregou por nós, e isso tem início com Sua obra redentora. Devemos,
portanto, manter essa palavra até o fim, aguardando para entender com
mais clareza o restante desse ensino em seguida. Pois sob essa palavra nos é
revelado primeiramente que nosso Senhor Jesus Cristo era (por assim
dizer), indiferente a Si mesmo, e não considerou Sua própria pessoa,
quando teve por objetivo nossa salvação. É verdade que Ele nos foi enviado
por Deus, e que (como é dito no terceiro capítulo de São João, verso 16),
“amou o mundo de tal maneira que não poupou Seu único Filho, mas O
entregou à morte por nós”. Não obstante, nosso Senhor Jesus Cristo
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também se entregou por nós. “Ninguém tira a minha vida de mim (Ele diz),
mas Eu de mim mesmo a dou. (João 10:18). Porque era necessário que o
sacrifício que Ele ofereceu para a remissão de nossos pecados fosse
voluntário. Você percebe então que Jesus Cristo de fato se entregou à
morte. E se perguntarmos o motivo, certamente foi primeiro para cumprir a
vontade e o conselho eterno de Deus, Seu Pai. Não obstante, como Deus
Pai tinha por objetivo a salvação dos homens, Jesus Cristo nos revelou
como somos amados por Deus e quão preciosas nossas almas são à sua
vista, pois o Senhor se dignou a se entregar por nós dessa maneira.
Agora, então, é conveniente que os maridos considerem bem o dever que
lhes é imposto em relação a suas esposas, o qual se constitui no seguinte:
que os homens amem suas esposas na mesma proporção em que, no
mínimo, são capazes de amar suas próprias vidas. Ainda assim, no entanto,
eles não alcançarão a perfeição de nosso Senhor Jesus Cristo, mas seguirão
Seus passos nessa grande caminhada. E as esposas também devem
considerar isso: uma vez que é da vontade de Deus que no matrimônio deva
haver, por assim dizer, uma imagem da graça conferida à humanidade por
nosso Senhor Jesus Cristo, elas serão muito ingratas se não se submeterem
àquela vocação para a qual Deus as chamou. Ao mesmo tempo, devemos
considerar que São Paulo buscava exaltar a bondade de Deus para conosco
e o amor que Jesus Cristo nos conferiu ao afirmar que o Senhor se entregou
por nós. Portanto, reconheçamos que isso veio da graciosa misericórdia de
Deus, Seu Pai, e que possamos perceber que nosso Senhor Jesus Cristo não
atentou senão para a nossa condição de miséria quando se mostrou tão
piedoso em nos socorrer.
Se mantivermos essas coisas em mente, seremos levados a cumprir nosso
dever sem contestar. Pois seremos também inflamados de tal maneira a
glorificar nosso Deus e a reconhecer o quanto devemos a Ele, tanto através
de nossas palavras, quanto por meio de toda a nossa vida, visto que
derramou sobre nós os tesouros de Sua misericórdia, de modo que não
apenas nos libertou da condenação em que estávamos, nos tirando da
morte, mas também se comprometeu a nos dar Seu amado Filho como
penhor de Seu amor. E assim, Jesus Cristo tomou sobre Si essa
incumbência de ser o penhor e o resgate por nossas almas, a fim de nos
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absolver diante de Deus, para que o diabo também não tenha do que nos
acusar, uma vez que é nosso adversário e estamos sujeitos a ele, até que
sejamos libertos de toda essa escravidão por meio desse Redentor.
Agora vamos cair de joelhos diante da majestade de nosso bom Deus,
reconhecendo nossas falhas, orando para que Ele nos torne capazes de
identificá-las mais e mais, para pedirmos perdão, e sermos transformados
a cada dia, corrigindo nossos pecados. Assim, recebendo os benefícios da
doutrina da salvação, que nossa vida possa sempre ser modelada de
acordo com a lei Dele, segundo a medida de graça que Dele recebemos. E
assim digamos todos: Deus Todo-Poderoso, Pai Celestial.
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