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1|Five Nights at Freddy’s: Fazbear do Terror #4

Um Passo Mais Perto


five nights at freddy’s
fazbear do terror #4:
um passo mais perto

FIVE NIGHTS AT FREDDY’S: FAZBEAR FRIGHT #4 - STEP CLOSER


(FAZBEAR DO TERROR #4 - UM PASSO MAIS PERTO)
SCOTT CAWTHON, ELLEY COOPER, KELLY PARRA, ANDREA WAGGENER

Traduzido e revisado por Sorinha Phantasie, TiuNight e Lobo.


Editado por Sorinha Phantasie e TiuNight.

Esse livro é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e incidentes são obra da
imaginação do autor ou usados de forma fictícia. Quaisquer semelhanças com eventos, locais ou
pessoas, vivas ou mortas, são coincidências.

FIVE NIGHTS AT FREDDY’S © 2020 Scott Cawthon.


Todos os direitos reservados.

Tradução em português brasileiro pela PHANTASIE TRANSLATE, 2022.


A tradução deste material foi elaborada e disponibilizada sem fins lucrativos. Se você pagou
pelo acesso a este livro, você foi enganado.
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2|Five Nights at Freddy’s: Fazbear do Terror #4


Um Passo Mais Perto
five nights at freddy’s
fazbear do terror #4:
um passo mais perto
´
indice
CAPA

CONTO 1: UM PASSO MAIS PERTO

CONTO 2: DANCE COMIGO

CONTO 3: INDO PARA CASA

EPÍLOGO: O FANTASMA REMENDADO PARTE 4

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Um Passo Mais Perto
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Um Passo Mais Perto
O
s olhos amarelos de Foxy brilhavam em meio à escuridão do quarto. Seu maxilar estava
aberto, os dentes afiados reluzindo. Foxy ergueu seu gancho e lançou a ponta afiada em
direção ao rosto de Pete, o gancho zunindo diante de seu nariz. Pete saiu rolando da
cama, seu corpo tremendo. Caído no chão, impotente, ele sentiu seu estômago revirar e
Foxy então se virou, pairando sobre ele. O farfalhar das engrenagens preencheu o quarto quando
Foxy voltou a levantar o gancho.
— Você até pode ser um pirata, mas primeiro terá que perder um olho e um braço.
— Não — disse Pete, ofegante.
Quando Foxy lançou o gancho contra o olho de Pete, houve um som de estouro alto. Com
sangue jorrando de sua órbita, Pete gritou...

A Freddy Fazbear’s Pizza estava cheia de criancinhas doidas e seus pais abusivos idiotas. Os
alto-falantes nas paredes berravam uma música alta e os jogos de fliperama vibravam com seus
apitos e assobios. O cheiro de pepperoni queimado pairava no ar, misturado com o de algodão doce.
Pete estava recostado numa parede, as pernas cruzadas e com um boné virado para trás na cabeça,
bebendo um refrigerante de cereja enquanto mascava um chiclete sabor melancia. Seu irmão mais
novo e seus amigos estavam todos aglomerados em volta de um dos jogos do fliperama.
Pete não queria estar lá, mas sua mãe tinha que trabalhar e Chuck tinha que sair com os
amigos depois da aula de novo. Então Pete foi quem teve que bancar a babá. Pela centésima vez, ele
se perguntou: por que esse era sempre o seu trabalho? E o pirralho sequer era grato por isso?
Não.
Chuck estava sempre choramingando sobre sua bombinha de asma. Sempre choramingando
de fome. Sempre perguntando um monte de coisas. Sempre alguma coisa. Desde que seu pai foi
embora, tudo com relação a Chuck foi jogado para cima de Pete.
As palavras de sua mãe ficaram gravadas em sua mente: “Você é o homem da casa agora,
Pete. Cuide do seu irmãozinho”.
Como Pete podia ser o homem da casa quando tinha só dezesseis anos? Alguém perguntara
o que ele achava de suas novas responsabilidades?
Óbvio que não.
Pete observou enquanto um garotinho se aproximava de um par de funcionários que estavam
limpando as mesas de aniversário. Ele puxou a manga de um dos sujeitos. O homem olhou para o
garoto e sorriu.
— Posso te ajudar com alguma coisa? — perguntou.
— Queria saber, cadê o Pirata Foxy? — disse o garoto.
A voz do sujeito soou doce feito melado:
— Ah, o Foxy está de férias no momento. Esperamos recebê-lo de volta em breve.
O garotinho fez uma baita cara de decepção, mas assentiu e foi embora. O outro funcionário
deu risada.
— Boa — ele disse ao sujeito.
— É, de férias na sala de manutenção. Vai saber quando vão trazer o show de volta.
Pete estava pensando sobre o assunto, quando notou que alguém estava dizendo seu nome:
— Pete?
Ele desviou a atenção da conversa e lançou o olhar para Maria Rodriguez, que estava parada
a seu lado. Seus cabelos negros roçavam nos ombros e seus lábios eram de um vermelho reluzente.
Ela tinha aqueles olhos verdes brilhantes com cílios longos e algumas sardas no nariz. Era uma líder
de torcida no colégio onde estudavam e ele a conhecia desde o sexto ano. Então por que de repente
estava se sentindo tão nervoso perto dela?
— Oi, Maria — disse.
— Preso aqui com o Chuckizinho, é?
Pete fez careta.
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— Pois é.
— Eu também. Aniversário da minha irmãzinha. — Maria indicou uma mesa de aniversário
na frente do palco, com criancinhas usando chapéus de cone e comendo bolo. — Não dá nem pra
acreditar que a gente já foi assim.
Ele deu uma risadinha.
— Não sei você, mas eu nunca fui assim.
Maria sorriu.
— Sei. E aí, por onde tem andado? Não tenho te visto nos treinos ultimamente.
Ele havia sido posto na reserva do time por agressividade desnecessária e por apresentar
uma postura ruim em múltiplas ocasiões. Oi? Aquilo ali era futebol americano! Então ele resolveu
simplesmente sair do time. A verdade era que Pete não era alguém que deixava as coisas de lado.
Ele costumava terminar tudo o que começava. Mas depois de ver seus pais se deixarem, terminar as
coisas não pareceu mais importar tanto. Além do mais, ele não precisava de mais encheção de saco
por parte do técnico — já tinha o suficiente de seus professores e sua mãe. Tinha um limite para as
queixas que uma criança conseguia suportar.
Ele deu de ombros.
— Cansei dessa coisa toda, sabe?
— É, acho que sei. E o que vai fazer com todo o tempo livre agora?
— Bom...
Alguém acenou para Maria na mesa da festa e seu rosto se iluminou. — Boa! Finalmente tá
na hora de ir embora. — Antes de partir, ela acrescentou: — Ei, tem uma galera marcando de se
encontrar na Ponte do Farol, se estiver a fim de sair depois.
ete sorriu.
— Ah, é?
Ela assentiu.
— Vai ser legal.
Ele então balançou a cabeça.
— Não dá. Tenho que cuidar do Chuck Chororô.
— Ah, tá bom. Talvez na próxima. Te vejo na escola.
A irritação tomou conta de Pete enquanto via Maria indo embora. Era tudo culpa de Chuck.
Aquele pirralho. Era tudo sempre sobre o seu irmão. Não importava o que Pete queria porque nada
importava quando era para o Pete. Seu pai foi embora. Sua mãe tinha o seu próprio mundinho.
Acharam melhor simplesmente deixar Pete responsável por Chuck porque eles mesmos não tinham
tempo para lidar com ele. Mas Pete nunca concordou em assumir suas responsabilidades. Ele era
uma criança e crianças deviam ser livres, sem preocupações. Deviam poder fazer o que quisessem,
como sair com outras crianças em vez de cuidar dos irmãos mais novos. Mas seus pais obviamente
não ligavam para nada disso. Afinal, nunca perguntaram a Pete se ele queria que eles se separassem
para início de conversa. Simplesmente se divorciaram e ponto final. Nada daquilo era justo.
Pete tinha tantas emoções dentro de si que às vezes não sabia nem o que fazer com elas. Às
vezes, sentia-se como uma bomba relógio a ponto de explodir, como se a tensão em seu corpo
estivesse palpitando embaixo de sua pele, implorando para sair. Por um tempo, o futebol ajudou.
Ele era um monstro no campo, derrubando outros jogadores, arrancando todo mundo da sua frente.
Ao final dos treinos, se sentia exausto e vazio. O vazio era melhor. Era bom. Mas agora que saíra do
time, Pete estava sem uma válvula de escape. Ele odiava essa sensação. Às vezes, odiava tudo.
Ele observou enquanto seu irmão se separava dos amigos para ir ao banheiro e seus olhos se
estreitaram frente à oportunidade. Pete derramou seu refrigerante sobre uma mesa vazia e saiu
andando rapidamente até o lado do irmão, segurando seu braço à força.
Chuck fez careta.
— Ai, Pete!
— Cala a boca e anda — murmurou ele, enchendo uma bola de chiclete até estourar.
— Por quê? Aonde estamos indo?
— Você vai ver.

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Com uma rápida olhada por cima do ombro, Pete empurrou o irmão mais novo ao longo de
um corredor escuro e comprido. O chão ali era bem velho e desbotado, e havia vários pôsteres dos
animatrônicos nas paredes, quase se soltando de onde costumavam ficar. O lugar precisava de uma
atualização urgente. Pete já tinha perambulado ali antes e descobriu a grande sala de manutenção.
Agora que sabia o que estava tirando férias ali dentro, mal podia esperar para levar Chuck para uma
pequena aventura, ainda mais levando em consideração que seu irmão sempre tivera medo de um
certo animatrônico.
Chuck começou a protestar.
— Aonde estamos indo?
— Qual o problema, tá com medinho?
— Não! Eu só quero ficar com os meus amigos!
— A gente vai dar uma olhada numa coisa.
Chuck soluçou e lambeu os lábios secos junto ao aparelho em seus dentes. Ele soava como
um sapo quando estava nervoso:
— Me solta logo ou eu vou contar pra mamãe.
— Você é o maior dedo-duro. Agora é que você vem mesmo.
Pete continuou arrastando o irmão mais novo surpreendentemente forte pela entrada da sala
de manutenção para um encontro com o Pirata Foxy.
A porta pesada bateu com força atrás deles, a escuridão os engolindo.
— Pete, me solta!
— Quieto. Alguém pode escutar e eu não quero te ouvir chorando que nem um bebê. Tem
ideia de como isso é irritante? — Pete não havia diminuído a força com a qual segurava o braço do
irmão. Não, estava na hora de ensinar uma lição a Chuck. Estava na hora de Pete fazer o que queria
e agora isso significava dar um bom susto em seu irmão.
O Chuckizinho Chororô podia até molhar as calças.
Pete deu uma risada diante da ideia.
Com uma mão ainda segurando com firmeza o braço do irmão, ele tirou o celular do bolso e
acendeu a lanterna para guia-los lentamente pela escuridão. A área estava estranhamente silenciosa,
como se não estivesse conectada a uma verdadeira multidão a um corredor de distância. O cheiro ali
era podre e rançoso e o ar parecia... mortiço. Como se ninguém tivesse sequer colocado os pés no
lugar recentemente. O que era estranho, sendo que o resto do prédio estava em plena atividade.
Um soluço.
Pete bateu com o pé numa garrafa no meio do chão. Ela acabou batendo em alguma coisa e
se estilhaçou. Pete e Chuck congelaram, perguntando-se se alguém ouviria, mas não parecia haver
ninguém por perto.
Outro soluço.
Pete vasculhou o chão com a luz da lanterna, revelando uma série de azulejos quadriculados
pretos e brancos arranhados. Havia mesas empoeiradas e algumas cadeiras espalhadas pela grande
sala. Havia também caixas de papelão parcialmente vazias sobre as mesmas, com chapéus e pratos
de festa espalhados ao redor delas. Sua lanterna iluminou uma grande aranha preta parada na beira
de uma caixa.
— Caramba, olha essa coisa. É enorme! — disse Pete.
A aranha deu um pulo e os meninos recuaram às pressas.
— Eu odeio aranhas. Vamos sair daqui — choramingou Chuck.
— Ainda não. Ainda temos muito mais a explorar. Pense nisso como um daqueles joguinhos
de aventura que você gosta tanto de jogar. Temos que achar o tesouro secreto — disse Pete, rindo
baixinho. Na verdade, ele só queria era deixar seu irmão ainda mais apavorado.
Ele desviou a lanterna de volta para o chão. Pousou a luz sobre o que pareciam velas escuras
derretidas e estranhas marcas negras.
— O que é isso? São símbolos? — Chuck quis saber.
— Quem liga? — Pete continuou a lançar a luz pela sala. Então, viu um pequeno palco com
uma cortina roxa fechada e um sorriso lhe cruzou os lábios. Presa à cortina, havia uma pequena
placa torta com as palavras FORA DE SERVIÇO.
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— Ponto! Com sorte, ainda tá funcionando.
Mais um soluço.
— Pete... a gente não devia estar aqui. Podemos nos encrencar. Tipo, pra caramba. É tipo
invasão, sabe? É contra a lei.
— É contra a lei — Pete o imitou com uma voz afetada. — Você é um puta dum nerd, sabia
disso? O que você quer ser quando crescer, Chuck? Policial? Vou ver se te compro uma rosquinha
quando a gente estiver voltando pra casa.
Pete lançou a luz da lanterna junto ao palco, revelando uma caixa de controle enferrujada em
uma mesa de canto. A tampa estava quebrada e parecia ter sido arrancada da caixa.
— Vai ser muito bom. — Ele arrastou seu irmão até o pé do palco. — Aproveite o show,
irmãozinho.
— Para com isso, Pete!
Ele agarrou Chuck pela camisa e pelas calças, dando um bom cuecão enquanto o atirava em
direção ao pequeno palco. Em meio a um “ugh”, Chuck caiu com tudo sobre a plataforma e Pete
rapidamente correu até a caixa de controle.
Ele bateu com a palma da mão em um botão que dizia INICIAR. De novo e então de novo.
Um zumbido baixo ressoou pelo lugar, seguido por um estalo e um baque abafados.
— Ah, qual é! — gritou Pete quando nada aconteceu.
Finalmente, a pequena cortina começou a se abrir. Houve uma série de três soluços. Num
rápido movimento, Chuck rolou para o lado.
— Chuck, seu banana! — Pete correu até o palco, agarrando Chuck pelo tênis para mantê-lo
no lugar. Com movimentos rápidos que apenas o medo podia tornar possível, Chuck conseguiu se
esquivar do irmão. Ele se levantou, pulou de cima da plataforma e saiu correndo.
Pete nunca havia visto seu irmão correr tão rápido assim. Se não estivesse correndo dele,
Pete podia até ter ficado impressionado. Pete estava para correr atrás dele, mas então parou diante
do palco quando sua camiseta prendeu em alguma coisa.
— Droga — murmurou. Ele puxou a camiseta, mas estava presa num prego idiota.
Uma música agitada começou a soar pelo ar e as cortinas se abriram por completo. Pete
ficou completamente paralisado diante de um Foxy animatrônico quebrado que o estava encarando.
Seus olhos amarelos brilhavam sob as sobrancelhas vermelhas, um tapa-olho se erguendo como
uma janela sobre o olho direito. Com a mandíbula com dentes pontudos e afiados frouxamente
pendurada, a grande raposa começou a cantar uma música desconexa sobre como se tornar um
pirata. Um dos braços tinha um gancho no lugar da mão e a outra mão estava completamente sem
pelugem, deixando seu esqueleto robótico à mostra. Estranhos sons de engrenagens rodopiantes
gritaram e pareceram ecoar no silêncio da sala. O peito do robô parecia estar aberto, expondo mais
de seu corpo mecânico. Foxy se mexia devagar, de forma sorrateira. Mesmo com Pete sabendo que
era um robô, seu corpo deteriorado lhe parecia parcialmente devorado por sabe-se lá o quê.
Um calafrio subiu pela espinha de Pete.
Ele engoliu seu chiclete.
Não conseguia desviar o olhar dos olhos amarelos de Foxy enquanto ele cantava. Não sabia
por quê. Era só um robô velho e idiota...
— Você até pode ser um pirata, mas primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg!
...primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg! ...primeiro terá que perder um olho e um
braço! Yarg! ...primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg!
O velho animatrônico estava travado no mesmo trecho da música...
— ...primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg!
Pete piscou quando uma estranha sensação lhe tomou como um lençol pesado, gelado e
invisível cobrindo cada centímetro de seu corpo, afundando em sua pele e adentrando seus ossos.
— ...primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg!
A sala pareceu ficar inerte em meio a um súbito silêncio, mas Pete continuou parado ali no
escuro. Imóvel.
Ele piscou e olhou em volta, tentando se lembrar de onde estava. Estava no escuro. Sozinho.
Seu pulso acelerou enquanto recuava um passo. Então viu que sua camiseta estava presa no prego e
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tudo voltou a fazer sentido. Ele esfregou os olhos, puxou a camiseta para se soltar do prego e se
afastou do palco às pressas, correndo para encontrar seu irmão.
— Que droga, Chuck!

Pete viu Chuck inalar uma vaporada de sua bombinha de asma antes de se sentar à mesa de
jantar. Podia ver que seu irmãozinho ainda estava com os nervos à flor da pele por conta de quando
Pete o levara para ver o Pirata Foxy. Chuck olhou para Pete do outro lado da mesa e estremeceu.
Pete não sabia com o que estava tão irritado. O moleque não chegara nem a ver a melhor parte do
show. Tinha fugido e ficado bem pertinho dos amigos até dar a hora de voltarem para casa.
— Como foi a Freddy Fazbear’s Pizza, meninos? — perguntou sua mãe enquanto colocava
pratos de presunto e batatas diante deles.
— Legal — disse Chuck, sem erguer o olhar de seu prato.
— É, maravilhoso — murmurou Pete, engolindo o purê de batatas.
— O que foi? Aconteceu alguma coisa?
— Não, nada — os irmãos disseram juntos.
Pete lançou um olhar de advertência para Chuck. Melhor não contar...
Sua mãe ergueu as sobrancelhas enquanto se sentava.
— Então tá. Bom, eu tenho uma coisa bem legal para compartilhar com vocês. Achei que
estava na hora de fazermos algo em família. E algo que fosse bom para o mundo.
Pete engoliu palavras que provavelmente feririam os sentimentos de sua mãe. Que família?
Fazia quase seis meses desde que seu pai fora embora e quebrara sua família. E desde quando ela se
tornara um paladino da justiça?
— Algo novo. Algo que represente um recomeço para nós três como uma unidade familiar.
Algo que também possa dar um recomeço para outras pessoas. — Ela tirou um papel de uma pasta e
mostrou para eles.
Pete leu as letras em negrito, sem conseguir acreditar:
— Doadores de órgãos?
Sua mãe assentiu, animada.
— Sim, seremos uma família de doadores. Não é demais?
Os olhos de Chuck se encontraram com os de Pete, perplexos.
— Essa é a notícia “bem legal”? Você quer mesmo que a gente abra mão das partes do nosso
corpo? — perguntou Pete.
Ela balançou a mão.
— Só se acontecer alguma coisa com a gente, bobinho! O que nós obviamente não
queremos. Mas se acontecesse, poderíamos ajudar outras pessoas que estão doentes e precisam de
um coração ou de um rim novo. Poderíamos salvar a vida de alguém. Seríamos heróis.
— Seríamos heróis mortos — disse Chuck.
Ela riu.
— Ah, Chuckizinho, você me faz rir!
— É, Chuckizinho, você é hilário — disse Pete, inexpressivo.
Chuck fechou a cara.
— Ei, mãe, sabe o que o Pete fez na pizzaria?
Pete estreitou os olhos para Chuck. Ele sabia que aquele moleque não conseguiria ficar de
boca fechada.
— O que ele fez?
— Ele bebeu um montão de refrigerante. — Chuck sorriu, sorrindo com aqueles trilhos de
trem nos dentes.
Sua mãe suspirou.
— Ora, Pete, qual é. Já te disse o que esse refrigerante todo faz com os seus dentes.

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Pete apenas encarou sua mãe. O que tinha dado nela ultimamente? No mês anterior, ela
começara a ver alguém que dizia ser um “coach da vida”. Então sua mãe começou a fazer yoga,
cortou seu cabelo comprido e passou a tomar um suco desintoxicante bizarro. Ela também recolheu
várias de suas coisas e doou para a caridade. Agora... ela queria doar partes de seus corpos?
— Aqui, leia o panfleto, Pete — disse sua mãe. — Vai te convencer, tenho certeza.
Pete agarrou o papel que sua mãe enfiou embaixo de seu nariz. A lista de doação de órgãos
era bastante longa: ossos, coração, rim, fígado, pâncreas, pele, intestino, olhos... Olhos.
Você até pode ser um pirata, mas primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg!
A imagem de Foxy voltou à cabeça de Pete. Ele imaginou Foxy subitamente descendo do
palco e o perseguindo com seu grande gancho afiado. Seus pés mecânicos arranhando o chão.
O purê de batatas de Pete revirou em seu estômago e, de repente, ele se sentiu zonzo. Ele
piscou para se livrar da imagem.
— Que ideia ridícula, mãe.
— Pete, não é ridícula. E me deixa magoada você achar isso.
Sim, sua mãe também estava expressando bastante os sentimentos ultimamente. Ele afastou
sua cadeira com tudo da mesa e se levantou com o rosto ficando frio e, logo depois, quente.
— Eu não vou fazer isso, mãe.
— Pete.
— Não quero conversar sobre isso. Eu vou pra cama. Pete saiu andando da sala de jantar.
— O que aconteceu? — ele ouviu sua mãe perguntar.
Chuck suspirou.
— Puberdade.
— Rápido, Pete!
Na manhã seguinte, Chuck bateu na porta do banheiro. Se Pete não saísse logo, Chuck se
atrasaria para pegar o ônibus para o Colégio W. H. Jameson. Se perdesse o ônibus, teria que ir para
a escola de bicicleta, pedalando por quase dez quilômetros, e sua mãe surtaria por ele ir sozinho. Ela
era paranoica, sempre achando que alguma coisa aconteceria se Pete não estivesse com ele, o que
ele não conseguia entender, afinal, já tinha quase doze anos (bom, onze anos e meio)! Vários de
seus amigos ficavam sozinhos o tempo todo, mas Chuck não. Pete sempre dizia que era porque
Chuck era um bebezinho e sua mãe não conseguia deixar de vê-lo assim.
Foi quando Chuck ouviu Pete vomitando no banheiro. Ele recuou um passo e se encolheu
um pouco. Pete devia estar doente, imaginou. Os lábios de Chuck se retorceram de leve. É o que ele
merece por ter tentado me assustar ontem. Mas quando Pete vomitou de novo lá dentro, Chuck
deixou o pensamento deixar sua mente, afastando-se e se recostando na parede para esperar. Chuck
sabia que o fato de seu pai ter ido embora havia mudado todo mundo. Pete estava zangado o tempo
todo. Sua mãe ficava procurando novas coisas que a deixassem feliz. E quanto a ele? Ele só tentava
se manter ocupado. Gostava de sair com seus amigos, gostava de jogar online e se interessava
bastante por quebra-cabeças.
Claro, o ensino médio era uma droga, mas ir para a escola era uma parte da vida que ele
precisava suportar. De vez em quando, ele se sentia desafiado por algum trabalho, mas então o
concluía e ficava entediado de novo até que outra coisa lhe chamasse a atenção. Ele entendia por
que Pete o odiava metade do tempo, porque sua mãe fazia Pete vigiá-lo o tempo todo. Ele tentava
não ser irritante. Mas tudo que saía de sua boca parecia irritar Pete. Será que as coisas eram sempre
assim com todos os irmãos? Chuck não sabia porque não tinha outro irmão para comparar.
O som da descarga ecoou pelo banheiro. Um minuto depois, Pete abriu a porta. Uma onda
de um fedor poderoso flutuou em direção a Chuck e ele sacudiu a mão na frente do nariz. Pete não
parecia bem. Seu rosto estava tão pálido que suas sardas se destacavam como pequenos insetos em
suas bochechas. Seu cabelo escuro estava bem embaraçado, com pontas apontando para todos os
lados, como se ele tivesse enfiado o dedo numa tomada e levado um baita choque, além de estar
com grandes olheiras embaixo dos olhos.
— Caramba, Pete, o que você tem?
— Nada não — disparou Pete. — Alguma coisa não deve ter me caído bem. Provavelmente
naquela Freddy Fazbear’s Pizza idiota.
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Chuck achava que não era isso.
— Quer que eu ligue pra mamãe?
Pete o empurrou para o lado.
— Não, eu não sou um bebezão que nem você, Chuck Chororô. Chuck sentiu seus ombros
enrijecerem. Ele odiava esse apelido idiota.
— Tanto fez — murmurou. Ele bateu e então trancou a porta do banheiro atrás de si.
Pete engoliu num gole só um energético com cafeína tripla enquanto corria para sua aula de
biologia, mas ainda se sentia esgotado e exausto. Tivera uns sonhos bem doidos na noite anterior.
Não conseguia se lembrar de muita coisa, só que tinha um monte de sangue. Estava por toda parte,
escorrendo por seu corpo inteiro, desde o rosto até o peito e os braços. Quando acordou num pulo,
seus lençóis estavam todos enrolados em seu corpo. Ele caiu no chão tentando se soltar dos lençóis
para que pudesse correr até o banheiro e botar para fora a ânsia de vômito presa em sua garganta.
Ele tremeu só de pensar a respeito, mas ajeitou os ombros e tentou afastar a memória nada
divertida. Talvez devesse ter ficado em casa, mas ligar para sua mãe no trabalho a teria deixado
surtada e ela começaria a perguntar um milhão de coisas. Ele decidiu simplesmente tentar enfrentar
o dia. Quando entrou na sala, cinco minutos já tinham se passado depois do sinal.
— Sr. Dinglewood, está atrasado — disparou o Sr. Watson com a voz entediada. — Bilhete?
Pete tirou o boné da cabeça e balançou a cabeça negativamente. Sentou-se em uma banqueta
vazia na estação de trabalho nos fundos da sala, ao lado de um garoto de cabelo roxo com uma
jaqueta de couro preta. Pete enfiou o boné na mochila e a deixou no chão, limpando então o suor
que lhe escorria pela testa. Ele começou a se ajeitar desconfortavelmente na banqueta. Por que não
estava conseguindo parar quieto?
— Como eu estava dizendo, turma, hoje nós vamos dissecar um sapo — disse o Sr. Watson.
— Vocês todos já aprenderam sobre as regras de segurança para as ferramentas e o procedimento
em si. Vocês trabalharão em equipe com um parceiro para preencherem a ficha do laboratório.
Espero que sejam todos jovens maduros. Sei que vai ser difícil para alguns de vocês, mas não quero
gracinhas aqui, ou não vão ganhar nota. E vocês não querem ficar sem nota. Vocês têm trinta
minutos começando agora.
Quando os dois viraram para o sapo morto estendido diante deles, o sujeito da jaqueta de
couro franziu o cenho.
— Mano... você tá bem aí? Pete balançou a cabeça.
— Não é nada.
O sujeito da jaqueta lhe deu um olhar que dizia algo como “aham, tá bom” e pegou um
bisturi. Dez minutos depois, Pete bocejou. Sua boca estava seca e sua mão estava começando a
tremer por conta dos cortes precisos.
O sujeito da jaqueta abriu um sorriso.
— Ei, saca só — disse ele, cutucando o olho do sapo com o bisturi. Um líquido esquisito
começou a vazar. — Doido, né não?
Ele então enfiou a lâmina no braço do sapo e o desmembrou. Ele pegou a mãozinha e
acenou com ela para Pete.
Pete balançou a cabeça.
— Preciso de uma pausa.
— Olha, foi mal. Juro que vou parar com a zoeira. — Ele levantou a mãozinha do sapo. —
Vem, bate aqui.
O garoto deu risada enquanto Pete afastava a banqueta e ia até o bebedouro da sala. Tomou
dois goles bem longos. Caramba, como estava com sede. E morrendo de fome! Seu estômago então
decidiu roncar, já que ele havia pulado o café da manhã para tentar chegar à escola na hora.
Ele estava voltando para a bancada da estação de trabalho quando o Sr. Watson o parou.
— Está tudo bem, Sr. Dinglewood? — perguntou.
O Sr. Watson era mais baixo que ele, com cabelos brancos e um bigode igualmente branco.
Estava com os óculos pendurados na ponta do nariz vermelho, como se para que pudesse olhar para
Pete de cima para baixo, com certo ar de superioridade — mesmo que fosse fisicamente impossível.
— Sim, tudo legal — disparou Pete.
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O Sr. Watson franziu o cenho.
— Bom ouvir isso. Agora, por favor, volte à mesa de dissecação. Você mais que ninguém
não pode ficar sem essa nota.
— É o que estou fazendo — murmurou Pete, virando as costas para ele. Desse ponto em
diante, foi quando tudo desandou.
Pete deu um passo rápido e longo e eu pé pousou sobre a alça de sua mochila em vez de
chegar ao chão em segurança. E então ele escorregou, perdendo o equilíbrio e caindo para trás. Ele
sentiu pé batendo no sujeito da jaqueta com toda a força. O garoto gritou e o Sr. Watson berrou
alguma coisa em resposta.
Pete pousou de costas, perdendo o fôlego no processo. Ele picou e, quando abriu os olhos,
viu o bisturi do garoto no ar. A pequena faca devia ter saído voando com o impacto. Mas então,
incrédulo, Pete viu o bisturi perder altitude e cair em direção a seu rosto, a ponta da pequena lâmina
apontada diretamente para seu olho.
Ele sentiu um pico de adrenalina lhe tomar o corpo. Com os reflexos rápidos que havia
adquirido com os vários anos jogando futebol, Pete jogou a ferramenta longe como se fosse um
inseto mortal bem quando a lâmina estava a ponto de cegá-lo. O bisturi bateu na bancada da estação
de trabalho e então caiu no chão.
— Caceta... — sibilou o sujeito da jaqueta de couro.
— Santo Deus, Peter, você está bem? — disse o Sr. Watson, pairando sobre ele como um
pai apavorado. — Não se mexa, vou chamar a enfermeira. Turma, fiquem sentados! Ninguém se
mexe. Procedimento de segurança, por favor! Saiam da frente.
A turma ignorou o Sr. Watson e todos se aglomeraram em volta de Pete enquanto seu peito
subia e descia em meio à sua respiração pesada. Ele não achava que havia batido a cabeça, mas se
sentia zonzo e um pouco fora de si. Isso sem mencionar o pavor que estava sentindo.
Alguém sussurrou:
— Muito bom, Dingleburro.
Algumas das outras crianças deram risada.
— É, que otário. Agora a gente sabe por que chutaram ele do time. Pete se sentou devagar, o
rosto completamente vermelho. Droga, agora ele tinha certeza que devia ter ficado em casa.
De alguma forma, Pete conseguiu sobreviver ao resto do dia na escola. A enfermeira o
examinou, lhe deu uma bolsa de gelo e o liberou. Foi um alívio quando o último sinal tocou e ele
saiu andando às pressas em meio aos outros alunos lentos, saiu pelas portas e desceu correndo pelos
degraus na frente da escola. Quando olhou o celular, viu que tinha uma mensagem nova de sua mãe.
Ele passou a mão pelo rosto.
O que era agora? Ele não podia ter um dia sequer em que ela não lhe pedisse para fazer
alguma coisa? Claro, ele amava sua mãe, mas agora que não tinha seu pai para ajudá-la, sempre
sobrava para Pete. Era melhor que ela não pedisse que Pete levasse Chuck para dar uma volta de
novo. Ele diria “Não, foi mal, tô doente”. Ele abriu a mensagem:
Oi, Pete. Pode passar no açougue depois da aula e pegar as costelas de porco que eu pedi?
Ele respondeu secamente: Tá.
Ela respondeu: Obrigada! (emoji de coração)
Pete atirou um chiclete de melancia na boca e foi andando até o açougue, que ficava a alguns
quarteirões na contramão do caminho de casa. Ele queria tirar a carteira de motorista e esse era o
plano seis meses atrás, antes do divórcio, mas agora todo mundo parecia ter se esquecido.
Ele enfim chegou ao Açougue do Barney, que parecia estar bem parado. Não tinha nenhum
carro no estacionamento em frente à loja, o que era perfeito, porque ele podia pegar o pedido e ir
embora rápido. Pete passou pela porta de vidro e não tinha ninguém nem atrás do balcão. Os preços
promocionais estavam afixados no vidro com uma música de rock antiga tocando no fundo.
Ele foi até o mostruário de cortes de carne, olhando para um lado e depois para o outro.
— Olá? — disse em a voz alta. — Oi, preciso pegar uma encomenda.
Não havia um sino para tocar, então ficou ali parado por mais um minuto, esperando que
alguém viesse para ajudá-lo. Quando ninguém veio, ele já estava farto. Ele bateu no balcão de vidro
algumas vezes.
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— Oláááááá!
Finalmente, resolveu dar um jeito naquilo ele mesmo e deu a volta no mostruário alto.
— Ei, tem alguém aí ou não?
Do outro lado do balcão, havia uma grande mesa de cortes com um líquido aguado e
vermelho em cima. O cheiro avassalador de carne e sangue fez seu estômago embrulhar de novo. O
chiclete em sua boca ficou amargo. Ele levou a mão ao estômago, como se para acalmá-lo. Eu não
vou vomitar, eu não vou vomitar, pensou. Ele olhou em volta para se distrair, mas tudo o que via
eram fotos de cortes de carne. Quando inclinou a cabeça para o outro lado, se viu cercado por facas
e cutelos de aparência letal penduradas sobre sua cabeça. Uma nova onda de tontura lhe encobriu.
Ele estendeu a mão para se equilibrar na mesa de corte, sentiu o líquido aguado na ponta dos dedos
e começou a suar frio.
Bam!
Um cutelo gigantesco bateu com tudo na madeira, por pouco não lhe acertando o pulso. Pete
recuou como uma bala, protegendo a mão junto ao peito e batendo com a mochila no mostruário.
Seu olhar pousou sobre o cutelo encravado na madeira. O cabo vibrava no ar, como se a força com
que tinha caído tivesse sido incrivelmente extrema. Seu olhar se ergueu em direção às ferramentas
penduradas. Um dos ganchos estava balançando devagar. O cutelo havia caído do gancho. Caído?
Ele não achava que algo podia cair com tanta força sozinho, mas o que mais podia ter acontecido?
— Ei, o que está fazendo aqui atrás? — disse um sujeito mais velho e atarracado que vestia
um avental ensanguentado e veio andando até o local enquanto secava as mãos numa toalha. — É
só pra funcionários. Não sabe ler as placas não?
Pete apontou para o cutelo fincado na mesa de corte.
— E-Eu...
— Ah, não. Você não pode brincar com as minhas facas. Tá tentando me arranjar problema,
garoto? A vigilância sanitária vai querer caçar a minha licença.
— E-Eu...
— Fala de uma vez. Qual o problema?
— Eu não toquei em nada. Ele... ele só caiu.
O velho estreitou os olhos.
— Não tem como essas facas caírem dos ganchos, garoto. Se fosse o caso, eu teria perdido
bem mais dedos do que os que eu já cortei fora. — O velho ergueu a mão esquerda para mostrar o
espaço vazio onde deveria ser o dedo mindinho e a ponta do dedo anelar. A pele parecia mais lisa
em ambos os tocos de forma esquisita.
Quando Pete começou a tremer, o homem riu.
— Tá com medo? Nunca viu alguém que tinha perdido um dedo antes? Bom, mantenha os
seus dedos e mãos longe de objetos afiados, garoto, e vai ficar tudo bem. Talvez. — Ele deu mais
uma gargalhada.
Pete engoliu em seco.
— Eu só vim... pegar uma encomenda... para a Sra. Dinglewood.
O açougueiro acenou em direção à sala dos fundos.
— É, tô com ela lá na geladeira. Costelinha, né? Já trago aqui pra você.

Pete abriu a porta da frente de casa e a bateu com tudo assim que pisou do lado de dentro.
Ele jogou sua mochila no chão e se arrastou até a cozinha, onde abriu a geladeira, jogou as costelas
de porco lá dentro e pegou um refrigerante. Ele fechou a porta com a cintura e bebeu a lata inteira.
O refrigerante de cola amortizou sua garganta e o açúcar o acalmou um pouco.
Que dia louco.
Ele tirou o boné e passou a mão pela cabeça. Só precisava comer, descansar e se esquecer de
todo o resto. Não queria mais saber de sonhos doidos ou de garotos estranhos com bisturis e com
certeza também não queria mais saber de açougues. Sua mãe teria que buscar carne por conta
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própria a partir de agora. Ele olhou pela janela da cozinha quando ouviu o portão do quintal sendo
aberto. Chuck empurrou sua bicicleta para dentro e então a deixou apoiada do lado da casa antes de
entrar pela porta dos fundos.
Pete sentiu sua irritação borbulhar.
— Você tá doido? — ele perguntou a Chuck. — Se a mamãe descobrir que você foi pra
escola de bicicleta...
— Alguém se apossou do banheiro de manhã e eu me atrasei pra pegar ônibus.
— ...E que eu não te busquei, eu tô ferrado.
— Eu não vou contar.
— Aham, tá bom! Você sempre me dedura.
Chuck revirou os olhos.
— Eu não contei pra ela que você me forçou a ir pra sala de manutenção, contei?
— Ainda não. Mas eu vi como você queria contar ontem à noite no jantar. Você se achou
engraçadão.
Chuck ergueu as mãos, exasperado.
— Bom, eu não contei! Isso tem que valer de alguma coisa. Pete deu de ombros.
— Ainda não dá pra confiar em você.
— Beleza, então eu vou contar pra você se ferrar de uma vez! Que tal? — Viu? Você é um
dedo-duro!
— Cala a boca, você que é!
— Cala a boca você, seu pivete!
Chuck desistiu.
— Tanto faz, babaca — murmurou.
Ele pegou uma fatia de pão do pote, a manteiga de amendoim do armário e a geleia da
geladeira. Tirou uma faca de manteiga da gaveta e começou a fazer um sanduíche para si. Quando
viu Pete olhando seu sanduíche, ele ergueu as sobrancelhas.
— Que foi? Quer um?
Pete hesitou.
— Não sei.
— Bom, você que faça o seu.
Pete levou uma mão ao estômago, debatendo consigo mesmo para saber se conseguiria.
— Você ainda tá doente ou sei lá? — perguntou Chuck.
Ele deu de ombros.
— Foi só um dia ruim.
— Por quê, o que houve?
Pete gritou:
— Não se preocupa. Não é da sua conta. — Ele não contaria de jeito nenhum para mais
ninguém sobre o incidente na aula de biologia ou sobre o cutelo voador. Ainda mais para o irmão
tapado que iria correndo contar para sua mãe e deixá-la surtada.
— Então tá. — Chuck terminou de fazer o sanduíche e o deslizou pelo balcão para Pete.
Uma oferta de paz?
Pete ergueu as sobrancelhas, surpreso, enquanto Chuck começava a fazer mais um.
— Viu que a mamãe preencheu a papelada de doação de órgãos pra gente? — disse Chuck,
como se fosse uma conversa casual.
Pete ficou boquiaberto.
— O quê? Por quê?
Chuck assentiu, sorrindo com aquele seu aparelho nos dentes, quase parecendo satisfeito
com a situação.
— Ela disse que uma hora ou outra você ia aceitar a ideia.
— Mas eu disse pra ela que não!
— Desde quando a mamãe escuta o que a gente fala? — Chuck deu uma mordida no
sanduíche e continuou falando de boca cheia: — Mas não é nada de mais. Você vai estar morto

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quando pegarem os seus órgãos. A sua vida, a sua alma ou sei lá já não vai mais estar lá. Pra que me
importar? Por que você se importa tanto?
Pete não sabia nem por onde começar. Lá estava ele, tentando salvar as partes do seu corpo
o dia inteiro, e sua mãe queria dá-las para outra pessoa!
— É que... é uma ideia idiota!
Chuck o fitou com um olhar curioso.
— Espera. Você tem medo, é isso?
— Não, cala a boca!
— Eu pesquisei a respeito. Quer saber como eles te cortam e tiram os órgãos? É mó legal!
Eles te abrem todo, com uma incisão em forma de “Y” e aí suas entranhas ficam todas penduradas.
Então eles tiram tudo, pedaço por pedaço. — Ele fez uma careta, com os olhos revirados e a língua
pendurada. — O nosso intestino é compridão, né? Então eles puxam ele que nem uma corda ou um
monte de salsichas ligadas pela pele. — Chuck fez um movimento com a mão, como se estivesse
puxando uma corda do estômago.
— Eu disse pra calar a boca! — Pete pegou o sanduíche e foi correndo para o quarto.

Na manhã seguinte, Pete tomou um gole de seu energético com cafeína tripla enquanto
caminhava para a escola. O sol estava brilhando no céu azul, o que melhorava muito a caminhada.
O dia hoje tinha que ser melhor que o anterior, imaginou. Na noite passada, teve sonhos estranhos
de novo, mas por sorte, os detalhes deixaram sua mente assim que ele acordou. E ele também não
teve que botar tudo pra fora no banheiro, o que já era ótimo.
Ele mal falara com sua mãe na noite passada ou naquela manhã. Por que ela o havia
registrado como doador mesmo com ele dizendo que não queria? Não quis nem comer as costelas
de porco que tinha buscado no jantar — elas só o faziam lembrar de como ele quase perdera a mão.
Quando passou na frente de uma obra, ele parou por um momento. Olhou para o outro lado
da rua e decidiu não atravessar no meio do trânsito movimentado — em vez disso, resolveu passar
embaixo do andaime. Pete examinou as tábuas em cima de si, certificando-se de que não havia
nenhuma ferramenta esquisita que poderia cair em sua cabeça. Podia ouvir o barulho de serras
motorizadas e brocas na obra em si, mas nada que viesse do andaime. Quando viu que estava
seguro, ele relaxou um pouco.
Só por precaução, foi andando com todo o cuidado embaixo das tábuas, sempre dando
olhadas rápidas para cima. Se tinha uma coisa que aprendera recentemente era que cautela nunca
era demais. Quando estava chegando ao final do andaime, ele suspirou aliviado.
Molezinha.
Foi quando ouviu um zumbido engraçado vindo da obra, seguido por um tinido alto. Os
pelos do braço de Pete se eriçaram.
— Puta merda! Cuidado! — Alguém gritou.
Pete avistou algo se movendo rápido em sua visão periférica. Sua cabeça se virou a tempo
de ver a lâmina de uma serra elétrica circular voando em sua direção, lembrando um frisbee com
dentes afiados.
Ele perdeu a força no maxilar e sentiu o corpo sendo tomado por um pico de adrenalina. Pete
correu para trás enquanto a lâmina redonda voava pelo ar em sua direção. Ele ergueu a mão para se
proteger, como se talvez pudesse pegá-la, mas então se deu conta de que essa era a pior coisa que
podia fazer e tentou tirar a mão do caminho da lâmina voadora. Achou que estava fora de perigo,
mas então a sentiu cortar sua carne logo acima do pulso, seguido por um ardor intenso.
Ele caiu com tudo no chão, derramando sua bebida em cima de si. Todo ar lhe fugiu dos
pulmões. Seus olhos estavam completamente arregalados quando ele ergueu o braço, olhando em
choque para o sangue que escorria por sua pele.
— Caramba, garoto! Alguém chama uma ambulância! — Um operário da obra correu para o
lado dele, levando ambas as mãos ao capacete, como se não soubesse o que fazer com elas. —
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Deixa eu pegar um pano limpo. Não se mexe! — O operário saiu correndo e outras pessoas
começaram a se juntar à sua volta.
— Garoto, você está bem? — disse um homem de terno, aproximando-se de Pete e se
agachando a seu lado. Ele estava com um celular junto ao ouvido. — Alô, sim. Houve um acidente.
Tem um adolescente, ele está sangrando. No braço. Hã, numa obra na Willington com a Salisbury.
Rápido, por favor. Não se preocupa, garoto, a ajuda está vindo. Sim, está consciente...
Desorientado, Pete olhou para o corte aberto em seu braço. Não era muito profundo.
Mas...
Ele podia ter morrido.

— Pete! — Sua mãe gritou assim que entrou em casa. — Pete!


— No meu quarto — exclamou. Ele estava deitado na cama, olhando para o teto. Depois que
o paramédico lhe pôs um curativo no braço na frente da obra, ele ligou para sua mãe e voltou para
casa. Nem sequer a esperou para uma carona — queria era sair de perto daquela obra o mais rápido
possível. Agora se sentia esgotado. Havia notado que suas costas doíam, então foi para o banheiro e
levantou a camiseta na frente do espelho. Como se o corte em seu braço não fosse ruim o suficiente,
ele agora tinha vários arranhões nas costas devido à queda na calçada.
No dia anterior, havia passado por poucas e boas duas vezes, mas esse último acidente fora
mais perigoso. Dessa vez, chegou a perder sangue.
Sua mãe entrou no banheiro numa pilha de nervos.
— Santo Cristo! Meu bebê!
Pete suspirou.
— Mãe, eu tô bem. É só um machucado. Não precisei nem de pontos. Tá tudo bem.
Ela agarrou sua mão, examinando o curativo em seu braço.
— Como isso aconteceu? — Ela colocou as costas da mão em sua bochecha, a passou por
cima de sua cabeça e então lhe deu um beijo na testa.
Pete olhou para o braço e respondeu honestamente:
— Na verdade, eu não sei.
Ela arregalou os olhos.
— Como assim, não sabe? Não estava prestando atenção? O operário daquela obra estava
sendo negligente? Temos que ligar pra um advogado? Talvez seja melhor irmos ao hospital.
— Não. Tá bom, mãe? Só relaxa. Ui. — Embora fosse bom ter toda a atenção dela para
variar, sua ansiedade o deixava tenso.
— Não, eu não vou relaxar. Você podia ter se machucado de verdade. — Ela se ajeitou e
cruzou os braços com um olhar determinado no rosto. — Tá decidido. Você não vai mais andando
pra escola. Pode pegar o ônibus ou ir de carona. Talvez eu mude o meu horário. Aí eu levo você e o
seu irmão pra escola. Acho que posso fazer funcionar. — Ela então colocou as mãos nos quadris,
como se de repente fosse a Mulher Maravilha e não houvesse nada que pudesse detê-la. — Eu vou
fazer funcionar.
— Mãe, para. Foi só... um acidente doido. — E ele vinha tendo muitos desses ultimamente.
Houve uma batida na porta da frente e então ela abriu de súbito. Pete se levantou com tudo
da cama, assustado.
— Porra, quem é?
— Pete, olha a boca.
— Oi, alguém em casa? — berrou uma voz familiar.
Pete olhou para sua mãe com um olhar acusatório.
— Você ligou pro papai?
Ela disse:

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— É claro que eu liguei para o seu pai. Aqui, Bill. No quarto do Pete. — Rapidamente, ela
começou a recolher as roupas sujas que estavam jogadas no chão. — Eu preciso ligar para ele
quando acontece uma emergência. Meu Deus, Pete, esse quarto tá uma bagunça.
Como se fosse novidade.
Seu pai preencheu o espaço inteiro do vão da porta, vestindo um par de calças cargo e uma
camiseta e usando um colete com bolsos e um chapéu de lona. Havia um sorriso forçado enterrado
sob sua barba desleixada.
— Aí está o meu garoto.
— Você estava pescando? — perguntou sua mãe, surpresa.
— Não, ainda não. Tirei o resto do dia de folga. Começando o fim de semana mais cedo.
Estou aqui para levar o meu primogênito comigo para o lago. Como vai aí, Pete? Deixa eu ver esse
braço. — Seu pai se aproximou da cama, chutando garrafas d’água no processo. Seu maxilar
enrijeceu, mas ele não disse nada sobre a bagunça.
Pete ergueu o braço para a inspeção de seu pai, incerto quanto ao que pensar da visita. Ele
não via o pai há meses. Só falara com ele ao telefone em pouquíssimas ocasiões. De repente, ele
estava em casa, tipo, de verdade. Ele já não entrava na casa há quase seis meses. Costumava ser tão
normal ver sua mãe e seu pai em casa juntos e agora... era extremamente constrangedor.
Seu pai fez um som de humph.
— Não parece ruim. Você logo vai ficar novinho em folha.
— Hã, é, bom... acho que eu não tô muito no clima pra pescar hoje, pai. — Na verdade, ele
sabia que não estava no clima. Estava machucado e só queria deitar e dormir. Pete fitou sua mãe
com um olhar de súplica. Me ajuda.
Ela hesitou.
— Ele está cansado, Bill. Talvez outra hora. Foi uma manhã doida.
Seu pai sacudiu uma mão.
— Besteira. Ele tá bem. Pescar acalma os nervos e relaxa a mente. Anda, se apronta pra ir,
Pete. Já estou com os sanduíches embrulhados. Vai ser divertido à beça, você vai ver.

O sol estava brutal, mesmo sob uma bruma de nuvens. Pete estava recostado numa cadeira
dobrável ao lado de seu pai num cais antigo. Havia um cooler entre eles e uma velha caixa de
ferramentas aos pés de seu pai. O braço de Pete estava dolorido, então ele não conseguia lançar a
linha de pesca muito longe. Em vez disso, estava observando a paisagem. Havia um punhado de
barquinhos no lago com uma série de pessoas — a maioria velhas — pescando neles. A cada
poucos minutos, a água ondulava com a brisa forte e levantava consigo o cheiro de peixes e plantas
podres. Pete não se lembrava de seu pai ter pego nenhum peixe no lago local. Se perguntava se
alguém já tinha conseguido pegar alguma coisa ali — em algum momento da vida.
Parecia estranho, pescar sozinho com seu pai. Provavelmente fazia uns dois anos desde a
última vez que eles foram ao lago, e Chuck normalmente ia junto, preenchendo o silêncio com
várias perguntas para seu pai. Chuck sempre tinha que saber das coisas. Por que algo funcionava da
forma como funcionava ou onde tal coisa era feita. Pete não sabia se Chuck realmente queria as
respostas ou atenção, mas de toda forma, ele já tinha se acostumado. Chuck gostava de fazer
perguntas e Pete não gostava de falar muito.
— E aí, Pete, quero saber como você tá — disse seu pai.
Pete tirou o chapéu, coçou a cabeça e então colocou de volta o boné.
— Eu tô bem, pai.
— A sua mãe disse que você parou de jogar futebol e que não tem se dado muito bem com o
seu irmão. — Seu pai não usou um tom acusatório, mas Pete podia sentir sua desaprovação, da
mesma forma que sentira quando ele viu seu quarto bagunçado. Seu pai sempre agia como se fosse
culpa de Pete quando as coisas davam errado. Eventos externos — como, sei lá, ações paternas —
não entravam na equação. Deve ser legal ser um adulto e estar certo o tempo todo, pensou Pete.
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Pete deu de ombro, apesar de seu pai não estar olhando para ele.
— Já tô cheio do futebol. Não é mais pra mim.
A brisa soprou e a linha de pesca de alguém passou voando na frente do rosto de Pete. Ele se
encolheu por um instante e olhou para um sujeito flutuando em seu barco alguns metros à frente,
sem prestar atenção para onde estava jogando a linha. Seu pai disse:
— Certo. A escolha é sua, sobre o futebol. Mas você é o irmão mais velho do Chuck, e
quanto a isso não há escolha.
Pete não precisava exatamente que alguém o lembrasse disso, mas seu pai prosseguiu:
— E como um irmão mais velho, você tem algumas responsabilidades. Eu fui o irmão mais
velho da sua tia Lucy. Na verdade, ainda sou quando ela precisa de mim. Ela agora é casada, então
não depende mais tanto de mim... — Quando entrou no tópico do marido, ele pareceu ficar um
pouco desconfortável.
Pete juntou os dentes com força. Uma pena que havia esquecido seu chiclete. Sermões eram
sempre chatos e um desperdício de espaço aéreo, mas pelo menos o chiclete seria uma distração.
Ele olhou para o outro lado do lago, esperando que alguma coisa pudesse quebrar aquele momento
desconfortável.
— Mas enfim... às vezes, a responsabilidade pode ser demais para uma criança — disse seu
pai, pigarreando. — Sabe, com a escola, notas e garotas te fazendo se sentir engraçado. — Seu pai o
fitou de soslaio. — Tem alguma pergunta que queira fazer sobre garotas?
Pete sentiu as bochechas queimarem e balançou a cabeça numa negativa categórica.
— Bom, enfim, a questão é que se você precisar de alguém pra conversar, vou estar aqui por
você, filho. — Seu pai então se virou para ele por inteiro, fitando-o como se esperasse que Pete
dissesse algo grande.
Pete franziu o cenho.
— Hã, tá bom.
Seu pai passou a mão pela barba.
— Ou se for mais fácil conversar com um estranho, posso te arranjar um psicólogo.
— O quê? Não, eu não preciso de psicólogo.
— Bom, com o seu pulso... — Seus olhos se voltaram para o curativo no braço de Pete.
— O que tem ele? Foi um acidente.
O olhar de seu pai se tornou mais intenso.
— Foi mesmo, Pete?
Pete se lançou para trás num solavanco.
— Você acha que eu fiz isso comigo mesmo?
— Ouvi dizer que o divórcio pode afetar as famílias de várias formas... — Eu não me cortei,
pai. Ui. — Pete passou uma mão pelo rosto, frustrado. Uma linha de pesca passou zunindo na frente
de seu rosto outra vez e ele se jogou para a esquerda para se esquivar. Bem que os velhos ali
podiam prestar atenção no que estavam fazendo!
— Não vou te julgar, filho, se tiver feito isso. Só quero que você se lembre que eu sempre
estarei aqui por você e pelo seu irmão.
De repente, Pete riu com dureza.
— Você não para de falar isso. Eu mal te vi desde o divórcio. Você não tá aqui por mim ou
pelo Chuck. Você e a mamãe esperam que eu assuma o seu lugar com ele. — Pete achou que se
sentiria melhor depois de colocar a verdade para fora, mas só se sentiu mal. Estava sentindo algo
estranho no peito, como se alguém estivesse pondo a mão lá dentro e puxando com força.
Os ombros de seu pai despencaram.
— Não é verdade, Pete. Eu moro do outro lado da cidade e você sabe que eu não tenho hora
no trabalho. Estou fazendo o melhor que posso. Você e Chuck precisam saber disse. Quer dizer... eu
vou tentar melhorar. Eu amo vocês dois.
Claro, Pete ouvia isso o tempo todo de sua mãe e seu pai, mas palavras não eram mais o
suficiente. Se Pete quisesse, poderia chorar de verdade agora. Mas chorar era ainda mais doloroso
que ficar zangado, então escolheu apenas ficar zangado.

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— Isso — Pete levantou o braço com o curativo diante do rosto do pai — foi um acidente
bizarro. Teve testemunhas, tá? Ou você acha que eu usei a mente pra jogar a lâmina daquela serra
elétrica pra cima de mim e arrancar a minha mão fora? Até parece! Não é possível! Quer saber, me
leva logo pra casa, pai. Pra mim já deu.
— Por favor, Pete, acalme-se.
— Por favor, só me leva pra casa. — Pete se levantou tão depressa que sua cadeira dobrável
derrapou para trás. Uma lufada de vento soprou em sua direção, quase levando seu boné. Ele o
agarrou com força antes que saísse voando. Então ouviu um som bem breve antes de algo afiado
fincar em sua bochecha, logo abaixo de seu olho. Alguma coisa puxou seu rosto para frente. —
Ahhhhhh!
— Pete!
Ele soltou a vara de pesca quando suas mãos voaram em direção ao rosto, onde encontrou
um anzol preso em sua pele. O anzol estava ligado a uma linha de pesca, tentando puxar sua pele
fora. Ele se inclinou para frente, gritando. O choque e a dor tomaram conta de si. Seu coração
estava batendo tão rápido que ele achou que poderia explodir em seu peito.
A linha estava tão tensionada que Pete deu mais um passo em frente, a fim de tentar aliviar a
pressão. Havia apenas a água escura sob ele e Pete não estava conseguindo parar.
Eu vou cair de cabeça no lago, pensou.
Ele sentiu o braço de seu pai envolvê-lo, para que ele não caísse.
— Segura firme! — Seu pai sacou uma pequena faca de caça e cortou a linha. A pressão
imediatamente desapareceu.
Pete se curvou em meio à dor lancinante. Seu sangue pingou na água. Seu pai levou a mão a
suas costas.
— Tá tudo bem, amigão, eu tô aqui. — Ele o ajudou a se levantar da beira do cais.
— Desculpa! — exclamou alguém mais ao longe. — Ele tá bem? A droga do vento soprou o
meu arremesso pra cima de vocês. Não dá nem pra acreditar!
— Pete, olha pra mim. Vem, vamos dar uma olhada nisso aí.
Seu pai inclinou sua cabeça para trás. Pete mal conseguia ver o anzol preso em seu rosto.
Seus olhos estavam marejados, catarro escorria de seu nariz e as lágrimas misturadas ao sangue
pingavam de sua bochecha.
Seu pai soltou o fôlego.
— Bom. Te pegou em cheio, mas você vai ficar bem. Baita sorte, imagina se pega no olho.

Parecia que Pete tivera um dia ruim.


Quando Pete e seu pai chegaram em casa, a mãe de Pete correu até ele. Seu rosto estava
praticamente todo enfaixado.
Os olhos de Chuck se alargaram. Uau, ele estava quase parecendo o Frankenstein! Mas ele
teria que guardar esse apelido para outro dia.
— Como isso aconteceu? — sua mãe praticamente berrou. — Ah, Pete, seu pobre rostinho.
— E aí, Chuck, meu garoto!
— Oi, pai — disse Chuck, acenando de leve. Lembrava de quando era pequeno e costumava
subir nas pernas do pai até que ele o levantasse. Chuck se perguntou quando parou de fazer isso.
Seu pai jogou as mãos para o alto.
— Relaxa, Audrey, vamos manter a calma. Foi um acidente bizarro. Um anzol acertou ele
na bochecha. Não foi tão ruim e eu mesmo consegui fazer os curativos.
Ela arregalou os olhos.
— Outro acidente bizarro, no mesmo dia? Como é possível?
Seu pai passou a mão pela barba.
— Não sei. Acho que ele precisa ficar na cama, descansar um pouco. Tenho certeza que
esses acidentes vão passar.
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— Sim, descansar era exatamente o que ele devia estar fazendo — disparou sua mãe. — Foi
sua a ideia brilhante de levá-lo ao lago para ele ser fisgado que nem um peixe. Por que não estava
de olho nele?
Seu pai tirou o chapéu de lona, revelando sua cabeça careca.
— Audrey, isso não é justo. Ele estava sentado bem do meu lado. Estava ventando muito.
Foi a droga de um...
Pete se jogou com tudo no sofá. Ele parecia zonzo enquanto observava sua mãe e seu pai
irem e virem com sua discussão, falando sobre ele. Chuck não estava acostumado a ver seu irmão
tão... vulnerável. Pete era maior que ele, desbocado e sempre muito irritante. Agora, sentado no
sofá, parecia pequeno e quase frágil. Chuck foi até lá e se sentou ao lado de Pete, olhando para o
rosto do irmão.
— Você tá parecendo — o Frankenstein — mal, Pete. Tá doendo?
— O que você acha? — murmurou ele.
Chuck assentiu, como se entendesse.
— Dia ruim, hein? Então... o que você acha que tá rolando contigo? Você passou por baixo
de uma escada? Quebrou um espelho? Cruzou o caminho de um gato preto?
Pete franziu o cenho.
— Do que você tá falando? — perguntou.
— O que você fez pra ganhar essa maré de azar?
Pete balançou a cabeça.
— Não é azar e eu não sou desastrado — insistiu. — Eu não sei o que tá acontecendo.
Chuck lambeu os lábios secos e se inclinou mais perto do irmão. — Mas é algo estranho,
né? Primeiro, você ficou doente. Aí a mamãe me contou sobre o acidente esquisito naquela obra, e
agora essa coisa da pesca. — Chuck estivera pensando sobre todas essas coisas estranhas que se
acumulavam na vida do irmão... era a receita certa para um bom quebra-cabeça. — Isso tudo
começou quando você tentou me assustar na Freddy Fazbear’s Pizza — comentou.
Pete tentou fechar a cara, mas estremeceu quando o gesto lhe causou uma fisgada de dor.
— O quê? Agora vai me dizer que isso é coisa de carma? Conversa fiada. De jeito nenhum.
Eu não acredito nessas coisas.
Chuck deu de ombros.
— Você não pode negar que é estranho.
Pete ficou em silêncio por um instante, mas então disse, a voz baixa:
— Não foram só essas coisas.
Chuck ergueu as sobrancelhas, intrigado.
— O que quer dizer?
Pete balançou a cabeça.
— Não posso falar sobre isso agora. Te conto depois. — Ele indicou os pais com a cabeça,
como se não quisesse que eles ouvissem.
Chuck foi para seu quarto, se sentou no chão na frente de sua TV e começou a jogar
videogame. Ele não achava de fato que Pete lhe contaria mais alguma coisa, mas, algumas horas
depois, Pete entrou em seu quarto e se sentou em sua cama. Sua bochecha estava inchada embaixo
do olho e o olho em si estava injetado de sangue.
Chuck pausou o jogo e olhou para ele, esperando.
— Na escola ontem, eu escorreguei e caí na aula de biologia. Eu chutei um garoto e o bisturi
dele saiu voando. Quando eu caí no chão, o bisturi quase pegou no meu olho.
Chuck ficou boquiaberto.
— Não creio.
— Eu o joguei longe antes que me acertasse.
Chuck ficou impressionado.
— Bem pensado.
Pete pareceu contente por um segundo.
— É, tem que ter habilidade — disse.
— O que mais?
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Um Passo Mais Perto
Pete encolheu os ombros.
— Eu fui buscar as costelinhas no açougue para a mamãe e não tinha ninguém atrás do
balcão. Então eu dei a volta pra ver se encontrava alguém. De repente, um facão se soltou de um
gancho e caiu com tudo na mesa de corte, bem do lado da minha mão.
— Puta merda! Foi por pouco!
— É, bota pouco nisso. Quer dizer, se eu acreditasse nessas doideiras, acharia que tá rolando
alguma coisa. Mas eu não acredito em coisas como...
— Maldições?
Pete franziu o cenho.
— Se manca, Chuck.
Chuck suspirou. Por que ele tinha um irmão tão teimoso?
— O que mais pode explicar isso? Quatro vezes? Tem que ser alguma coisa. Qual é, Pete.
— Seja lá o que for, eu já tô de saco cheio. — Pete pigarreou. — Só pra garantir, caso tenha
sido, você saber, porque eu te arrastei pra ver o Foxy. — Ele levantou a mão em direção a Chuck.
Os olhos de Chuck se arregalaram enquanto olhava para ela.
Pete ergueu as sobrancelhas.
— Que foi? Aperta.
Por que não, pensou Chuck. Hesitante, ele apertou a mão do irmão. Pete puxou a mão de
volta e até se desculpou:
— Me desculpa por ter tentado te assustar. Foi idiotice. Vamos fazer uma trégua, beleza?
Chuck sorriu.
— Beleza, trégua. Valeu, Pete.
Pete se levantou aos tropeços.
— Vou voltar pra cama. Té mais.
— Até — murmurou Chuck, enquanto seu irmão saía do quarto. Então começou a pensar,
revirando sua mesa atrás de um caderno no qual pudesse escrever. Seu irmão podia não querer
aceitar suas ideias, mas tinha que ter uma explicação. Tinha que ter.

— Que jogo é esse aí? — Pete perguntou a Chuck da porta de seu quarto. Ele havia passado
a maior parte de sábado na cama e agora sentia que precisava levantar e dar uma volta pela casa.
Ficar deitado na cama lhe dava tempo demais para pensar. Ele ficava reprisando cada um dos
acidentes bizarros de novo e de novo em sua cabeça e isso não era legal.
— Só um jogo indie de aventura. Quer dar uma olhada?
Pete deu de ombros e se sentou de pernas cruzadas com o irmão no chão. O quarto de Chuck
era bastante diferente do de Pete. Primeiramente, Chuck realmente usava a cesta de roupa suja em
vez de deixar tudo jogado no chão. Sua cama estava arrumada. Não tinha um monte de folhas soltas
em cima de sua mesa. Ele tinha uma prateleira de livros sobre alienígenas e teorias da conspiração.
Havia também uma série de pôsteres de jogos colados de forma bastante organizada na parede.
Chuck explicou sobre o jogo:
— Se liga: eu sou o mago e tenho que procurar todos os ingredientes escondidos pra fazer
uma poção que vai deter um feiticeiro do mal. Ele colocou um feitiço na minha vila e eu tenho que
ajudar a quebrar a maldição com essa poção pra poder libertar a vila antes que seja tarde demais.
— E o que acontece se você não conseguir a tempo?
— Aí eu os perco pra sempre. Vão todos continuar sob o controle do feiticeiro do mal. E
isso não vai acontecer.
Pete deu uma risada.
— Você gosta de ser o herói, né?
— É o único jeito de vencer. Quer jogar comigo?
— Claro.
Os olhos de Chuck brilharam enquanto ele pegava o outro controle.
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Um Passo Mais Perto
— Você pode ser o meu aprendiz.
— Por que eu sou o aprendiz? Por que eu não posso ser o mago e você o ajudante?
Chuck balançou a cabeça.
— Você tem muito a aprender.
Pete se virou para sua mãe, que estava recostada junto à porta. Ela estava sorrindo.
— Oi, mãe — disse Pete.
— Vocês precisam de alguma coisa? Que tal uma pipoquinha?
— Uma pipoca até que cairia bem, valeu.
— E uma caixa de suco pra mim — disse Chuck.
Pete jogou o jogo por algumas horas e então voltou para a cama. Tinha que admitir que era
legal se dar bem com seu irmãozinho de novo. Depois de apertarem as mãos e fazerem uma trégua,
as coisas quase voltaram a ser como quando ainda eram pequenos. Quando não tinham nenhuma
preocupação no mundo. Antes dos ressentimentos, dos apelidos, do divórcio. Tinha que admitir que
ele sentia falta daqueles dias.
Antes que Pete pudesse perceber, a noite de domingo chegou e ele estava se aprontando para
voltar à escola. Para seu alívio, o inchaço em seu rosto havia diminuído. Ele tirou o curativo do
braço, expondo uma casca de ferida fresca logo acima de seu pulso. Ela o fez pensar em seu pai o
acusando de ter se automutilado. É claro, ideias de fugir de seus pais às vezes lhe passavam pela
cabeça, mas não da forma como seu pai estava pensando.
Pete passara a maior parte do dia assistindo TV compulsivamente. Não ousara sair de casa,
com medo de que pudesse ter outro acidente bizarro. Não que sua mãe fosse lhe deixar sair de toda
forma. Ela havia passado o final de semana inteiro de olho nele, mais presente que nunca. Talvez
ele desse o braço a torcer quando ela começasse a lhe pedir para fazer um milhão de coisas de novo.
Se todos aqueles acidentes bizarros tivessem mesmo alguma coisa a ver com carma, ele
havia pedido desculpas a Chuck, não é? Então queria dizer que ele devia estar livre, limpo ou seja lá
o que fosse. Mas ele ainda tinha uma estranha sensação em seu âmago, como um enjoo. Estava
preocupado que aquilo podia ainda não ter acabado.
Podia nunca acabar.
Ele então ouviu uma batida em sua porta.
— Entra aí — disse, ao que Chuck colocou a cabeça para dentro. Ele normalmente gritaria
com o irmão para dar o fora do seu quarto, mas as coisas eram diferentes agora com a trégua entre
eles. Perturbar o irmãozinho não lhe parecia mais tão divertido. Não que ele fosse lhe contar isso.
— Sim? — disse Pete.
Seu irmão entrou com um bloco de notas numa mão e fechou a porta atrás de si. Ele tirou
seu inalador do bolso da bermuda, deu uma baforada e então voltou a guardá-lo.
— Como que você tá? — ele perguntou a Pete.
— Bem, eu acho.
— Tá pronto pra voltar pra escola amanhã?
— Aham, claro.
Chuck abriu um sorriso metálico e passou uma mão pelo cabelo.
— Só pra saber.
— Qual é a do bloquinho aí?
— Algo com que eu tenho trabalhado nesse fim de semana, desde que você me contou sobre
os acidentes. — Chuck foi andando em direção a Pete, abriu o bloco de notas e lhe mostrou uma
espécie de organograma desenhado a mão. Havia cinco caixas organizadas em um círculo, com
setas apontando entre elas. Em cima do organograma, havia uma caixa com o nome O PIRATA
FOXY. Nas caixas seguintes, estava escrito: AULA DE BIOLOGIA, AÇOUGUE, OBRA e LAGO. A última
seta apontava de volta para O PIRATA FOXY.
— O que isso quer dizer? — Pete quis saber.
— Quer dizer que eu acho que o ponto de origem, o ponto onde isso tudo começou, foi na
sala de manutenção com o Foxy.
— É, a gente já falou sobre isso.

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— Desde aquele momento, cada um desses acidentes bizarros levou ao próximo e, para que
isso tudo acabe, você tem que voltar e consertar seja lá o que tenha feito pra início de conversa.
— Já fiz isso. Eu pedi desculpa por aquela pegadinha idiota, tá? Já é pra estar tudo certo
agora. Você me perdoa, né?
— Claro, nós somos irmãos. É claro que eu te perdoo — disse Chuck. — Mas em todos os
jogos que eu jogo, você tem que enfrentar o chefão final. O vilão. Que nem no jogo que a gente
jogou ontem à noite. O mago teve que enfrentar o feiticeiro do mal no final para poder liberar a vila
com a poção.
Pete forçou uma risada quando seu estômago se revirou, aterrorizado.
— Chefão? Quem? O Foxy animatrônico?
— Talvez... mas... o que exatamente aconteceu depois que eu saí correndo naquele dia?
Pete desviou o olhar para sua TV, fitando um filme de ação passando naquele momento.
— Nada, o Foxy cantou uma música e aí eu fui embora. Nada de mais.
Você até pode ser um pirata, mas primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg!
Pete sentiu seu pulso acelerar quando ouviu as palavras em sua cabeça.
— Qual era a música, Pete?
Ele balançou a cabeça.
— Só uma música idiota sobre ser um pirata.
— Qual exatamente era a letra?
— Quem liga pra qual era a letra?
— Eu ligo. Por favor, Pete, é importante.
— Tá. Alguma coisa sobre que pra poder ser um pirata... você tem que perder um olho e um
braço. Viu? Idiota!
Chuck lambeu os lábios secos. Então pegou um lápis da mesa bagunçada de Pete e começou
a escrever.
— O que está fazendo?
— Espera um pouco.
Depois de um minuto, ele jogou o bloco de notas nas mãos de Pete. Chuck havia escrito
notas adicionais embaixo das caixas:
O PIRATA FOXY: Música pirata. Perder olho. Perder braço.
AULA DE BIOLOGIA: Quase perdeu olho.
AÇOUGUE: Quase perdeu braço.
OBRA: Quase perdeu braço.
LAGO: Quase perdeu olho.
Pete balançou a cabeça em negação.
— Não — murmurou ele, começando a tremer. — Você tá errado.
— Você não pode ignorar os fatos, Pete. O Foxy quer que você vire um pirata e os acidentes
estão ficando cada vez mais perigosos.
— Não! — ele gritou. — O Foxy é a droga de um robô! É feito de metal e engrenagens. —
Ele arrancou a folha do bloco de notas e começou a rasgá-la diante de si. — Isso é tudo invenção
dessa sua cabecinha gamer perturbada. É tudo fantasia! Não é real!
— Pete, para!
— Cala a boca! Dá o fora do meu quarto! — Ele empurrou o irmão e jogou o bloco de notas
com tudo nele.
Em choque, Chuck recuou aos tropeços, seu rosto ficando vermelho.
— Eu tô tentando te ajudar!
Pete ergueu um dedo no ar e o apontou para Chuck.
— Não, você tá tentando me assustar por todas as vezes que eu te assustei! É sempre questão
de vencer com você, né? Bom, isso não é um joguinho pra você vencer!
— Eu sei disso. Não tô tentando vencer. Tô tentando entender o que tá acontecendo aqui.
Sua mãe então apareceu na porta.
— Meninos, que gritaria toda é essa? O que está havendo?
— Fala pro Chuck Chororô sair do meu quarto!
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Um Passo Mais Perto
— Não me chama assim, fuça de Frankenstein!
Pete sentiu seu rosto se revirar.
— Ah, você tava esperando pra usar essa, né? Você me paga! A trégua oficialmente acabou!
— Por mim tudo bem! Pode pegar essa sua trégua idiota e enfiar no meio do teu nariz!
— Meninos, acalmem-se! — gritou sua mãe.
— Eu disse pra DAR O FORA DO MEU QUARTO!
— TÔ DANDO! — Chuck pegou seu bloco de notas e saiu correndo.
Pete virou as costas para a mãe. Após um momento, em meio a um suspiro exagerado, ela
fechou a porta.
Pete estava com tanta raiva que começou a chorar.

Pete ficou se revirando de um lado para o outro na cama — sua mente continuava bastante
alerta. Seu pijama lhe parecia quente, sua coberta pesada demais. Seu quarto estava escuro, exceto
pela luz da lua que entrava pelo vão da cortina em sua janela. Enquanto olhava para a cortina, ele
pensou ter visto um vulto escuro atrás do tecido.
Pete se levantou e foi andando até a janela, puxando a cortina para o lado. O quintal lá fora
estava quieto. Havia um carro estacionado junto ao meio-fio e uma fileira de árvores ao longo da
rua. Nada fora do comum. Ele girou os ombros para aliviar a tensão e então voltou para a cama.
Bateu no travesseiro algumas vezes para ficar confortável. Então olhou para o teto e continuou a
fitá-lo um pouco mais.
Não tinha jeito, ainda não conseguia pegar no sono.
Um momento se passou e ele então pegou seus olhos atraídos de volta para a janela.
Não levanta. Não vai olhar.
Mas ele não conseguiu se impedir — alguma coisa lhe parecia estranha. Ele estava sozinho
em seu quarto, mas sentia como se estivesse sendo observado. O que era completamente idiota.
Suspirando, ele se levantou e foi de volta até a janela, puxando novamente a cortina para o lado.
Estava prestes a dar meia-volta quando notou um vulto atrás das árvores. Havia alguém lá?
O pulso de Pete acelerou.
Ele esfregou os olhos, piscou e buscou mais sinais de movimento — mas não havia nada lá.
Sua mente estava mexendo com ele. Estava ficando paranoico! Ele inspirou e soltou o ar devagar.
Provavelmente era só o vento soprando os galhos. Ele passou as mãos pelo rosto e se deitou de
volta na cama. O vento uivava lá fora e, de alguma forma, isso o acalmou um pouco.
Então, o portão dos fundos rangeu.
O portão só devia ter se soltado com o vento... certo? Só para ter certeza, Pete escutou com
atenção. Uma coruja piou. Uma porta rangeu. Um segundo depois, ele se levantou com tudo, o
coração acelerado. Aquele rangido estava vindo de dentro da casa? Ele seguiu sorrateiramente até a
porta do quarto e a abriu devagar. Vasculhou o corredor vazio. Não havia ninguém por ali.
Estava começando a surtar. Chuck e sua mãe estavam dormindo. Não tinha mais ninguém na
casa. Vai dormir de uma vez! Disse a si mesmo. Ele voltou para a cama batendo os pés, se jogou
embaixo das cobertas e fechou os olhos com toda a força.
Pensou ter ouvido um passo.
Vai dormir.
O chão rangeu na frente de sua porta e um calafrio lhe subiu a espinha.
Não tem ninguém aqui.
Ele disse a si mesmo que era só sua imaginação, mas o ar pareceu se remexer à sua volta. Os
pelos em seus braços se arrepiaram e ele não conseguiu mais negar a inquietação.
Quando abriu os olhos, Foxy estava em cima dele!
O horror tirou o ar dos pulmões de Pete. Ele não conseguia se mexer. Não conseguia falar.
Os olhos amarelos de Foxy brilhavam em meio à escuridão do quarto. Seu maxilar estava
aberto, os dentes afiados reluzindo. Foxy ergueu seu gancho e lançou a ponta afiada em direção ao
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rosto de Pete, o gancho zunindo diante de seu nariz. Pete se atirou da cama, seu corpo tremendo,
mas não conseguiu se levantar do chão. Foxy então se virou, pairando sobre ele. O farfalhar das
engrenagens preencheu o quarto quando Foxy voltou a levantar o gancho.
— Você até pode ser um pirata, mas primeiro terá que perder um olho e um braço.
— Não — disse Pete, ofegante.
Quando Foxy lançou o gancho contra o olho de Pete, houve um som de estouro alto. Com
sangue jorrando de sua órbita, Pete gritou. O pé mecânico de Foxy pisou em seu braço direito,
esmagando seus músculos e triturando seus ossos. Pete convulsionou em agonia. Tentou empurrar
Foxy, tirá-lo de cima de si. Era muito pesado. Muito forte.
O coração de Pete batia com toda a força. Lágrimas e sangue escorriam por seu rosto.
Foxy se lançou para baixo e fincou seu gancho na mão de Pete, estilhaçando os ossos e
rasgando os músculos até arrancá-la por completo. Foxy levantou o gancho e observou a mão de
Pete pendurada, o sangue respingando. Pete gritou.

Ele acordou gritando em seu travesseiro. Como estava com dificuldade para respirar, ele se
levantou com tudo, ofegante. Sua blusa estava encharcada de suor, grudada em sua pele. A luz do
sol estava entrando com tudo pela janela.
Estava em casa. Em seu quarto. Sozinho.
Ele estendeu as mãos — abrindo bem os cinco dedos — e viu que estava tudo no lugar. Ele
levou as mãos aos olhos e os dois continuavam lá. Estava vivo e ainda podia ver. Todas as partes de
seu corpo estavam intactas.
Deu um grande suspiro de alívio. Só um pesadelo.
Por que tinha que parecer tão real?
Pete engoliu em seco. Seu estômago revirou e ele começou a tremer. Sentia que já tivera
uma versão do mesmo sonho antes, mas, dessa vez, se lembrava de cada detalhe.

Com um capuz lhe cobrindo a cabeça, Pete entrou no Colégio North Hillside na manhã de
segunda-feira e ficou boquiaberto diante do grande cartaz pendurado no corredor: ENCONTRE O SEU
TESOURO EM ALTO MAR: FESTIVAL DE PRIMAVERA NO ALMOÇO DE HOJE.
Havia a cabeça de um pirata desenhada embaixo do slogan, exibindo um gancho no lugar da
mão junto a um balão de texto que dizia “Aye, aye, marujo!”. Pete quase deu meia-volta e foi para
casa. Mas sabia como sua mãe estava nervosa quando o deixara na escola.
— Vai ficar tudo bem, Pete — dissera ela, como se tentando convencer a si mesma.
— Sim, mãe, vai ficar tudo bem — ele lhe garantiu. — Mãe?
— Sim, querido?
— Você é uma boa mãe.
Ela piscou rápido algumas vezes e abriu um sorriso.
— Obrigada, filho, você me deixa muito feliz.
A verdade era que ele esperava que fosse ficar tudo bem. Ele se deu conta de que tudo o que
queria era que tudo voltasse ao normal — com as aulas chatas, as provas desnecessárias e até ter
que cuidar do irmãozinho. Estava pronto para que aquilo tudo acabasse e agora podia ver que tinha
uma vida bem tranquilo, mesmo que seus pais não estivessem mais juntos. Seus pais amavam ele e
Chuck, mesmo estando frequentemente enrolados com suas próprias preocupações e obrigações.
Ele tinha uma casa boa e confortável. Alguns amigos. Não era um daqueles garotos que aproveitava
o ensino médio ao máximo, mas passaria por ele como todos os outros.

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Ele continuou seguindo ao longo do corredor, observando os cartazes nas paredes. Havia
navios piratas, papagaios, caveiras, ossos cruzados e cabeças de piratas para onde quer que olhasse.
O conselho estudantil sempre fazia uma grande festança para a semana do baile da primavera.
Podia sentir as pessoas pasmas com o desastre em seu rosto, mas tentou não prestar atenção
enquanto sussurravam e apontavam. Ele seguiu em direção a seu armário e colocou a combinação
do cadeado, certificando-se de evitar um garoto com uma fantasia de pirata e um tapa-olho. Tirou o
dever de casa atrasado da mochila e pegou seu livro de biologia para a primeira aula.
— Mano, o que aconteceu com o seu rosto? — Duncan Thompson perguntou a ele. Duncan
era o vizinho de armário de Pete, um sujeito baixo e atarracado com a cabeça raspada. Os dois
costumavam jogar futebol juntos. Para a sua versão do espírito escolar, ele estava com caveiras e
ossos cruzados pintados em ambas as bochechas.
Pete encolheu os ombros enquanto fechava o armário novamente.
— Acidente de pesca. Nada de mais.
— Pô, mas como? Você se cortou com uma faca ou sei lá?
Pete não queria entrar em detalhes.
— Algo assim.
— Mas vou te falar, te deixou irado. Como se fosse um aviso pra não mexer contigo ou sei
lá. Sabe qual é?
Pete abriu um sorriso de leve.
— Legal.
— Cê vai perder o jogo da primavera essa semana, mano. Ia ficar intimidador pra caramba
em campo, aparecendo com uma cicatriz novinha em folha assim na cara.
— É, valeu — disse Pete.
Duncan sorriu e levantou o punho. Pete bateu com o seu próprio.
Ele se afastou do armário se sentindo um pouco melhor. Ergueu a cabeça bem alto enquanto
os outros o observavam, ignorando as decorações e fantasias de pirata idiotas. É, ele estava mesmo
com uma vibe de “não mexa comigo” e gostava disso.

As aulas da manhã passaram tranquilamente para Pete. Ele não ousou se levantar de seu
lugar durante a aula e ficou longe de todo e qualquer objeto afiado. Quando o sinal para o horário
do almoço tocou, estava se sentindo supreendentemente bem, como se a maré de acidentes bizarros
de fato tivesse passado. Agora só precisava fazer as pazes com seu irmãozinho...
O pior era que ele tinha feito as pazes antes de estragar tudo de novo gritando com Chuck e
o expulsando de seu quarto. Ele simplesmente não queria acreditar no que Chuck acreditava — que
aquilo ainda não tinha acabado. Que ele precisava voltar para enfrentar Foxy.
Pete estremeceu. Ia pedir desculpas a Chuck e restaurar a trégua. E Chuck entenderia, ele
tinha certeza. Seu irmãozinho parecia perdoá-lo com certa facilidade. Pete estava mesmo pronto
para começar de novo, como sua mãe às vezes dizia. Seria como um recomeço. Até então, ele nunca
entendeu muito bem o que ela queria dizer com isso.
O sol estava brilhando no céu e ele saiu no pátio da escola, onde estava acontecendo o
festival de primavera. Barraquinhas de comida e jogos estavam armadas e espalhadas pelo espaço.
As crianças corriam de um lado para o outro, comendo algodão doce e outras guloseimas. Havia
também um tanque de mergulho sobre o qual o vice-diretor da escola, o Sr. Sanchez, esperava para
ser atirado na água. Estava tendo um concurso de comer tortas ao lado de uma mesa de queda-de-
braço, um circuito de pistolas d’água e muito mais. Um DJ estava tocando música e dando
camisetas promocionais. Pete tirou o capuz e deu uma volta pelo pátio, esperando encontrar algo
bom para comer. Não muito depois de começar a busca, se deparou com Maria.
Ela estava trabalhando em uma das barracas.
— Ah, oi, Pete! — disse. Estava usando um lenço vermelho em volta do pescoço e grandes
brincos redondos. — Nossa, o que aconteceu com você? — Ela apontou para a própria bochecha.
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— Oi, Maria. — Pete deu de ombros, desviando ligeiramente o olhar. — Foi só um acidente
de pesca idiota.
— Ai, que droga. Você deu uma sumida, né?
As sobrancelhas de Pete se ergueram. Ela tinha notado?
— Hã, pois é, muita coisa acontecendo. Mas tá tudo bem.
Ela assentiu, como se entendesse o que ele queria dizer.
— Mas e aí, quer ganhar alguma coisa? Só tem que colocar a mão na caixa e ver o que
consegue tirar. — Ela apontou com a cabeça para uma mesa grande com um buraco no centro.
Pete enfiou as mãos nos bolsos das calças.
— Não, tá tranquilo. Tô de boa.
Ela sorriu.
— Vai, é só pra brincar. Não quer ganhar um prêmio?
O estômago de Pete se revirou quando tirou a mão direita do bolso, fechando-a num punho.
Todas aquelas coisas bizarras tinham acabado, ele garantiu a si mesmo. Estava em segurança agora.
— Claro, eu acho. — Hesitante, ele enfiou a mão no buraco e, após alguns segundos, sentiu
alguma coisa envolvê-la. — Que diabos?
Maria deu uma risadinha.
— O que você pegou?
Ele puxou a mão de volta, mas estava presa. Ele puxou com mais força e a pressão em volta
de sua mão aumentou. Uma gigantesca apreensão tomou conta de si. O suor começou a escorrer em
sua testa. Pete plantou os pés no chão e puxou a mão com tanta força que começou a erguer a mesa.
— Pete, para! Você vai quebrar a mesa! — disse Maria.
— A minha mão tá presa!
— Eu sei, Pete, calma. — Maria bateu na mesa com força. — Tá bom, para! Eu disse para!
De repente, Pete conseguiu tirar a mão e ela estava presa ao que parecia uma armadilha de
dedo chinesa, mas grande o suficiente para cobrir sua mão inteira. Pete olhou para aquilo, incrédulo.
Quanto mais ele puxava, mais apertada ficava a armadilha em volta de sua mão.
Maria estava com uma expressão de culpa no rosto.
— Desculpa, Pete, é só uma pegadinha que estávamos fazendo com os alunos. Você sabe,
uma brincadeira para o festival. Tava todo mundo achando engraçado.
— Eu não sou todo mundo — disparou.
A cabeça de um garoto brotou do buraco na mesa. Seu cabelo era arrepiado e ele tinha um
piercing no nariz.
— Relaxa, mano. Não aguenta uma piada?
Pete não sabia nem o que dizer, estava surtando nesse nível.
— Que mané piada! — gaguejou, tentando tirar a armadilha de sua mão. De alguma forma,
ela só ficou mais apertada, segurando sua circulação. Ele engoliu em seco. Era como se houvessem
pequenas facas o cutucando por debaixo da pele. — Tira isso de mim!
— Espera, eu te ajudo. Eu sei como tirar. — Maria correu para o outro lado da barraca e
empurrou a armadilha para mais perto da mão de Pete, a fim de fazê-la afrouxar. — Desculpa por te
deixar bravo desse jeito.
— É, tá bom! Só tira logo isso — disse ele, mal conseguindo se conter. — Eu tô tentando,
tá? Ela tá presa, por algum motivo. Aguenta aí. — Ela voltou para trás do balcão para pegar alguma
coisa.
A armadilha não estava só presa, estava apertando com cada vez mais força. Sua mão
começou a latejar de dor. De novo não, foi tudo o que ele conseguiu pensar.
— Ei — choramingou o garoto na caixa. — Não corta não. Senão a gente não vai mais
poder usar.
Maria voltou com uma tesoura.
— Eu preciso, não tá soltando. — Ela foi cortando do lado aberto da armadilha até conseguir
soltar sua mão.
Quando ela finalmente tirou a armadilha de sua mão, a pele de Pete parecia completamente
roxa e dormente. Ele abriu e fechou o punho para que a circulação voltasse ao normal.
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Maria arregalou os olhos.
— Meu Deus, Pete! Me desculpa, de verdade. Nem acredito que isso aconteceu. Foi um
acidente biz...
— Nem fala — ele a interrompeu. — Você não devia ter feito isso. Não devia ter tentado me
enganar. Achei que a gente tava de boa.
— E estamos... — Quando as bochechas dela enrubesceram e ela abaixou a cabeça, Pete
sentiu sua garganta apertar. — Eu pedi desculpa, Pete.
— Olha, tanto faz. Não foi nada demais. Tenho que ir.
Então, antes que ela pudesse dizer qualquer outra coisa, ele foi embora às pressas, tentando
acalmar os nervos enquanto esfregava sua mão. Que piada idiota. Como aquilo era engraçado? E foi
ainda outra coisa bizarra. Ele engoliu em seco e sentiu a garganta ainda mais apertada. Ele já não
aguentava mais aqueles acidentes. Se aquilo continuasse, iria acabar perdendo a cabeça.
Uma onda de crianças subitamente o cercou como um rebanho de bois, empurrando-o
consigo pela entrada de um labirinto de espelhos.
— Ei, cuidado! — gritou Pete. Ele tentou se separar do grupo, mas eram muitas crianças.
Tentando se libertar, ele se prensou numa parede e elas finalmente passaram, rindo e gritando.
— Olha só, mano, tem uns vinte de nós nos espelhos! — gritou uma das crianças, até que
todas sumiram de vista.
Pete tentou voltar para a entrada, mas, de alguma forma, se viu perdido na droga do labirinto
de espelhos. Começou a seguir para o lado oposto, a fim de chegar diretamente na saída. Mas em
vez disso, acabou num beco sem saída e um pirata apareceu no espelho, com um chapéu inclinado
para lhe cobrir o rosto e um gancho letal preso ao braço. Quando ele finalmente tirou o chapéu de
cima do rosto, Pete viu que o pirata na verdade era uma raposa. Pete estremeceu. Olhou para trás,
pensando que a raposa pirata estaria parada ali, mas havia apenas outro espelho.
Seu coração começou a bater mais rápido e um único pensamento continuou a permear sua
mente: Preciso dar o fora daqui. Ele foi dando uma volta atrás da outra pelos corredores estreitos,
procurando pela saída. Imagens da raposa pirata e de si mesmo refletiam em cada um dos espelhos.
Quando ele corria, a raposa corria. O suor encharcava o rosto de Pete. Só o que sabia era que não
podia deixar a raposa pirata pegá-lo.
Já estava perdendo o fôlego quando finalmente viu uma luz ao final de um pequeno corredor
de espelhos. Mas antes que pudesse chegar lá, a raposa pirada saltou em sua frente, erguendo seu
gancho. Como se por instinto, Pete recuou um passo e socou a raposa pirata no nariz. O pirata então
cambaleou para trás, levando uma mão à sua máscara, e Pete saiu correndo.
Pete estava praticamente hiperventilando quando voltou ao festival no pátio. Estava trêmulo
e trôpego, como se tivesse saído de um carrossel. As outras crianças riam e o encaravam enquanto
diversas perguntas circulavam sem parar em sua cabeça. Pra onde eu vou? O que eu faço?
Ele recuou um passo e colidiu em alguém. Quando virou, se deparou com um palhaço com
chapéu de pirata. O palhaço acenou, mas Pete o empurrou e correu em direção a uma tenda, abrindo
caminho por entre os pesados retalhos de lona. Tinha que sair do festival, mas estava tão confuso
que não sabia nem para onde estava indo. Quando deu por si, estava entrando numa barraca com
vários balões presos numa parede.
Um dardo veio voando em sua direção e passou raspando em sua bochecha. Ele bateu no
próximo com a mão.
Alguém gritou:
— Ei, tem um garoto ali!
O próprio Pete virou para frente para pedir que parassem, mas era tarde demais. Foi quando
o último dardo atingiu em cheio — prendendo na pele ao lado do interior de seu olho.
Ele urrou de dor.
As crianças ficaram olhando, boquiabertas. Alguém gritou.
Pete ergueu a mão devagar e arrancou o dardo. Um filete de sangue escorreu por seu rosto.
Ele jogou o dardo no chão e saiu correndo pelo outro lado da barraca, em pânico. Entrou em outra
barraca. Havia uma série de pássaros exóticos engaiolados lá dentro, piando e cantando.
Um papagaio guinchou:
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Um Passo Mais Perto
— Perca um olho! Perca um braço!
Pete parou e girou em direção ao pássaro. Seu corpo estava tremendo.
— O que foi que você disse?
— Kaw! Kaw! — O pássaro era de um verde vivo, com um bico preto. Ele bateu as asas
para Pete. — Kaw!
Pete agarrou a gaiola e a sacudiu. Várias penas saíram voando. Todos os pássaros na barraca
enlouqueceram.
— O que foi que você disse, seu pássaro idiota? Foxy, você está aí dentro? — Não, não fazia
sentido que Foxy estivesse dentro do pássaro, mas Pete não ligava. Desde quando alguma coisa
daquilo que vinha acontecendo fazia qualquer sentido? Seja lá o que fosse o que estava acontecendo
com ele ainda estava acontecendo e ele já não aguentava mais. — Você não vai vencer! Tá me
ouvindo? Você. Não. Vai. Vencer.
— Ei, garoto, vai com calma aí! — Alguém segurou Pete pelo ombro e o virou. — Qual o
seu problema?
Pete empurrou o sujeito, um professor da escola, Sr. Berk ou qualquer coisa do tipo.
— Não tem problema nenhum. — Pete rapidamente secou o suor de sua testa e o sangue da
bochecha. — Nenhum.
Nenhum exceto a onda de acidentes bizarros que envolviam a perda de um olho ou um
braço. Nenhum exceto uma raposa robô que queria que ele virasse um pirata — ou morresse. O que
viesse primeiro. Chuck só podia estar certo. Ele precisava voltar e enfrentar Foxy para acabar com
aquilo de uma vez por todas.
O Sr. Berk estendeu a mão para ele.
— Você não me parece muito bem. Seu olho está sangrando. Vamos à enfermaria para dar
uma olhada nisso.
Pete se afastou.
— Não! Eu tô bem! — insistiu.
— Tudo bem, vai com calma. O que aconteceu na sua bochecha?
— Aconteceu muita coisa. — Pete balançou a cabeça. — Muita coisa. — Como poderia
sequer começar a explicar?
— Eu só quero ajudar — disse o Sr. Berk. — Qual o seu nome?
— Não, você não pode me ajudar. Ninguém pode. Ele está atrás de mim e nunca vai parar.
Eu acredito dele agora, achei que poderia consertar tudo só pedindo desculpa. — Pete riu de forma
amarga. — É, engraçado, né? Como se pedir desculpa já tivesse consertado alguma coisa. Mas eu
tinha que tentar, né?
— Quem está atrás de você, garoto? Qual o nome dele? Podemos nos sentar com o diretor.
Resolver essa história. Você só precisa se acalmar, respira fundo.
— Você não entende! Não tem come sentar ou conversar! Ele é a droga de um robô!
Os olhos do Sr. Berk se arregalaram.
— Um robô? Me ajude a entender. Sente-se aí por um momento. Você pode falar comigo,
tá? Às vezes, achamos que as coisas são piores do que realmente são. Mas quando paramos e
analisamos a cena por completo, não é assim tão ruim. Acredite, garoto. Acontece o tempo todo.
— Não, é ruim. Muito ruim. Mas eu sei o que tenho que fazer agora. Logo tudo isso vai
acabar. Vou voltar ao ponto de origem, aonde isso tudo começou. Eu tenho que enfrentar o vilão.
Antes que o professor pudesse detê-lo, Pete saiu em disparada.

Ele atravessou o corredor da escola às pressas, encharcado de suor. Um monitor gritou com
ele por estar correndo, mas Pete ignorou. Tenho que sair. Tenho que acabar com isso. Quando ele
abriu as portas, olhando para trás por cima do ombro, o monitor estava falando com alguém pelo
rádio. Enquanto descia pela escada na frente da escola, Pete pisou em falso em um dos degraus e

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Um Passo Mais Perto
tombou. Ralou os joelhos e as palmas das mãos, seu corpo doía por inteiro, mas ele se forçou a
levantar e continuar correndo.
Enquanto avançava pelo jardim da escola, ele pegou o celular no bolso e clicou no número
de Chuck. Caiu direto na caixa postal porque Chuck ainda estava em horário de aula.
— Chuck! — Pete praticamente vomitou no celular, sem fôlego. — Você tava certo! Foi
mesmo o Foxy, o tempo todo. Eu tenho que voltar pra enfrentá-lo. Aquelas coisas bizarras ainda
estão acontecendo, mas eu não vou deixar o Foxy vencer, Chuck. De jeito nenhum! Me desculpa
por não ter acreditado em você, irmãozinho! Me encontra lá assim que puder! Podemos acabar com
isso juntos!
Em meio ao pânico cego, Pete disparou pela calçada e saiu no meio da rua. Ele sentiu algo
acelerando em sua direção e se virou — e foi quando um caminhão bateu nele com toda a força. Seu
corpo saiu voando, seus membros retorcidos, num momento que pareceu durar uma eternidade.
Então ele caiu, seu corpo tombando com tudo no chão. Ele sentiu algo quebrar e então se estilhaçar.
Sua pele queimou com a força com a qual raspava na estrada enquanto ele girava e girava, deixando
uma trilha de sangue atrás de si. A dor envolvia por inteiro, até que tudo ficou escuro.

“Chuck! Você tava certo! Foi o Foxy esse tempo todo. Eu tenho que voltar pra enfrentá-lo.
Aquelas coisas bizarras ainda estão acontecendo, mas eu não vou deixar o Foxy vencer, Chuck. De
jeito nenhum! Me desculpa por não ter acreditado em você, irmãozinho! Me encontra lá assim que
puder! Podemos acabar com isso juntos!”
Chuck apertou um botão para apagar a tela do celular, olhou por cima do ombro e então
rapidamente saltou por cima da cerca de sua escola. Depois, saiu correndo.
Ele tinha que ir à Freddy Fazbear’s Pizza. Tinha que ajudar Pete!
Ele balançou os braços com toda a força e velocidade para sair logo do campo de visão da
escola. Quando sentiu que estava tranquilamente fora de vista, pegou seu inalador, deu duas
baforadas e caminhou até recobrar o fôlego. Ainda tinha alguns quilômetros pela frente. E queria
estar com sua bicicleta, mas não estava e também não deixaria Pete na mão. Não o deixaria
enfrentar Foxy sozinho.
Começou a correr novamente, mas não demorou muito para voltar a parar. Não era lá um
grande atleta. Chuck até conseguia correr, mas normalmente por uma distância mais curta — ele
sempre bombava quando tinha que correr por mais de cem metros na aula de educação física. Ele
olhou em volta e seu corpo enrijeceu quando viu uma viatura da polícia. Essa não! Ele se enfiou
numa loja de rosquinhas e esperou que o carro passasse. Não estava acostumado a quebrar as regras
e matar aula. Era a primeira vez que fazia algo assim. O que aconteceria se sua mãe descobrisse?
Iria colocá-lo de castigo? Pete provavelmente riria dele por estar tão assustado. Mas tudo bem, Pete
podia rir dele o quanto quisesse quando aquilo tudo acabasse.
Estava sem fôlego quando chegou à Freddy Fazbear’s Pizza e sua camiseta estava grudada
em suas costas com o suor. Ele passou pelas portas da frente e sentiu um grande alívio quando o
vento fresco do ar condicionado lhe acertou o rosto. Havia criancinhas correndo de um lado para o
outro e ele se esquivou delas enquanto avançava em direção ao corredor que levava à sala de
manutenção. Um supervisor ou qualquer coisa do tipo estava parado na frente do caminho. Droga.
Chuck ficou passando o peso do corpo de um pé para o outro, esperando que ele fosse embora. Ele
fingiu jogar um jogo no fliperama até que o sujeito finalmente se foi.
Chuck seguiu até a passagem bem devagar, atravessou a entrada e correu pelo corredor até
chegar à porta. Ela se abriu e revelou uma escuridão absoluta. Chuck engoliu em seco e entrou na
sala, a porta batendo com tudo atrás dele. O medo quase o engoliu por inteiro, mas ele pegou seu
celular no bolso para acender a lanterna.
Ele soluçou e rapidamente bateu com a mão na boca para tentar deter aqueles soluços
idiotas. Lançou a luz da lanterna do celular para um lado e para o outro. Nada de fantasmas, nada de
robôs. Pegou o inalador e deu uma baforada rápida enquanto continuava olhando em volta. Ainda as
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Um Passo Mais Perto
mesmas mesas empoeiradas e as velhas caixas de suprimentos e cadeiras quebradas, como na
primeira vez que visitaram o lugar. Por algum motivo, parecia ter sido semanas atrás.
— Pete — sussurrou. — Cadê você?
Outro soluço.
Quando não houve uma resposta, ele se perguntou se Pete não estaria tentando assustá-lo de
novo. Então afastou o pensamento. Pete havia parecido bem inquieto na mensagem de voz que tinha
deixado. Estava fisicamente ferido e finalmente acreditava na teoria de Chuck de que tudo
começara com Foxy. Eles finalmente concordavam em alguma coisa. Agora Pete o estava tratando
como um irmão de verdade em vez de um problema que precisava suportar todos os dias.
— Pete. Você tá aí?
Quando apenas o silêncio o respondeu, Chuck discou o número do irmão no celular.
Chamou e chamou, até que finalmente caiu na caixa postal.
— Pete, cadê você? — Mais um soluço. — Eu tô aqui com o Foxy, te esperando. Me liga.
Ou só vem pra cá de uma vez. Você sabe que esse lugar me dá arrepios.
Com mais uma série de soluços, Chuck desligou a chamada e seguiu em frente, mirando a
luz do celular para o pequeno palco. Um calafrio lhe subiu a espinha e ele estremeceu. O instinto
lhe dizia para ficar longe, bem longe do palco. Para sair dali. Mas ele não podia. O que estava em
jogo ali não eram os seus medos. Era o seu irmão. Engolindo em seco, ele avançou até a caixa de
controle. Ele descobriria o que aconteceu com Pete naquele dia. Sua mão estava pairando sobre o
botão INICIAR quando seu celular tocou e ele deu um baita pulo. Três soluços seguidos. Ele atendeu
a ligação às pressas.
— Pete?
— Não, filho, é o seu pai. Cadê você? Fui à escola pra te buscar, mas você não tava lá.
De repente, Chuck ficou com medo de se meter em encrenca por ter matado aula. Sentiu a
garganta apertar.
— Hã, desculpa, pai — soluçou. — O Pete precisava de mim. Tive que sair mais cedo. —
Outro soluço. — Eu não vou fazer de novo. Prometo.
— O Pete? O que quer dizer? Você falou com ele?
— Hã, não exatamente. Ele me mandou uma mensagem pedindo pra encontrar com ele. Mas
ele ainda não chegou. Não sei onde está. Ele não atende o celular. — Mais um soluço.
— Ah, filho... — sua voz se partiu.
— O quê? O que foi, pai? — Uma onda de pavor lhe tomou o corpo. — Por que o senhor foi
me buscar na escola? — Chuck soluçou.
— Chuck... houve um acidente.

O pai de Chuck o buscou na Freddy Fazbear’s Pizza e dirigiu mais rápido que o normal até a
escola de Pete. Não fez nenhuma pergunta sobre porque Pete pedira que Chuck o encontrasse ali.
Disse que sua mãe tinha ido direto para a escola quando recebeu uma ligação dizendo que Pete
havia sido atropelado por um caminhão.
— Por enquanto, não vamos contar pra sua mãe sobre você ter matado aula — disse seu pai.
— Ela não precisa de ainda mais isso pra estressar a cabeça agora.
Chuck sentiu a culpa como um soco no estômago.
— Tá bom, pai. Você tem que entender que foi pelo Pete. Eu nunca teria feito se não fosse.
— Eu sei, filho. Não se preocupe muito com isso. Irmãos cuidam um do outro.
Chuck assentiu. Quando se aproximaram da escola, Chuck viu luzes intermitentes. Viaturas
da polícia estavam bloqueando a rua e barricadas mantinham as crianças afastadas da calçada.
Chuck engoliu em seco.
— O Pete vai ficar bem, não vai, pai?
Seu pai parou o carro em uma vaga na rua a uma quadra de distância dos veículos de
emergência e desligou o motor.
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Um Passo Mais Perto
— Ele vai ficar bem. — Mas sua voz soou engraçada, como se estivesse com a garganta
apertada. Seus olhos pareciam temerosos e tensos, como se não acreditasse nas próprias palavras.
Chuck saiu do carro às pressas, correndo ao lado do pai. Eles seguiram em direção às luzes
intermitentes. Um policial ergueu os braços.
— Desculpa, não podem passar.
— É o meu filho. Preciso vê-lo. Minha esposa está aqui.
— Nome?
— Dinglewood. O nome do meu filho é Pete Dinglewood. Foi ele que foi atropelado.
O policial assentiu e os deixou passar. Eles passaram por mais profissionais de emergência
do que Chuck podia contar e por um caminhão que estava parado mais ao lado, com um enorme
amaçado no para-choque. Chuck arfou, na esperança de que o amaçado não tivesse sido por causa
do atropelamento. Havia um homem sentado no meio-fio, conversando com um policial. Estava
com o chapéu nas mãos, chorando.
Chuck olhou para o meio da rua e congelou quando viu o sapato de Pete ali caído. Era um
tênis completamente branco, fazendo o sangue que respingara nele terrivelmente notável. Só o que
conseguiu pensar foi que Pete precisava do sapato. Havia pequenos cartões de plástico dobrados
com números pretos espalhados pela rua, como se para uma investigação. Chuck engoliu em seco e
seguiu seu pai até que finalmente viu sua mãe junto a uma maca. Estava de costas voltadas para eles
e seus ombros tremiam.
— Olha a mamãe — disse Chuck, mesmo tendo certeza de que seu pai já a havia visto. Ele
correu até o lado dela e pôs um braço à sua volta.
Chuck se segurou, com medo de ver Pete naquela maca. Ele pegou seu inalador e deu uma
baforada antes de se aproximar. Atrás das barricadas, havia outros alunos do ensino médio. Alguns
rostos estavam em choque, algumas das crianças estavam chorando e outras usavam fantasias de
pirata. O Pete provavelmente adorou isso. O pensamento fez Chuck torcer os lábios, mas ele não
conseguiu se fazer sorrir.
— Chuck — disse seu pai, estendendo a mão para ele. — Vem cá, filho. — Ele estava
chorando. Chuck nunca vira seu pai chorando antes.
Chuck não queria se mexer. Não queria ir até a maca. Se pudesse, teria ido para o lado
oposto. Mas se forçou a dar um passo em frente e então mais outro. Se sentia inebriado, como se
estivesse andando em slow motion, atolado num mar de lama. Quando finalmente chegou a seus
pais, entrou entre eles para se apoiar.
Pete estava deitado na maca. Seus olhos estavam fechados e ele parecia incrivelmente
pálido. Os arranhões do acidente da pesca se destacavam como linhas vermelhas furiosas em seu
rosto e ele tinha novas feridas que lhe marcavam a testa. Chuck esperou que seus olhos se abrissem.
Esperou que ele se mexesse, piscasse, qualquer coisa.
— Ele se foi, Chuck — disse seu pai, em meio às lágrimas. Suas palavras fizeram sua mãe
chorar ainda mais.
Um homem de uniforme branco se aproximou.
— Lamento pela sua perda. Podemos encontrá-los no hospital quando estiverem prontos.
Seu pai disse:
— Sim, obrigado.
O homem usava luvas azuis. Ele pegou o grande zíper na altura do peito de Pete e o puxou,
selando-o em uma grande bolsa de lona. E assim, sem mais nem menos, Pete se foi.

Pete estava se sentindo congelado, como se não pudesse mexer nenhuma parte do corpo.
Estranhamente, não sentia frio, calor nem nenhum tipo de dor. Estava rodeado pela escuridão.
Havia vozes distantes... sons de movimento...
...Oi?
Onde eu estou? Pensou consigo mesmo. Estranhamente, não conseguia mexer os lábios.
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Um Passo Mais Perto
Que diabos?
Parecia que muito tempo havia se passado. Finalmente, ele ouviu algo como o som de um
zíper sendo aberto e então uma luz brilhante apareceu à sua volta. Havia um homem sobre ele que
usava óculos de proteção clarões, uma touca cirúrgica azul e uma máscara que lhe cobria o nariz e a
boca. Seria ele um médico?
Ei, cara, você tem que me ajudar. Tô me sentindo estranho.
Pete imaginou que devia estar no hospital. Tinha se machucado feio por causa do caminhão.
Ele se lembrava. Estava tentando chegar à pizzaria, mas se esqueceu da regra que sua mãe enraizara
em sua cabeça desde que era pequeno. Olhar sempre para os dois lados antes de atravessar a droga
da rua. Bom, agora iam dar um jeito nele com alguma cirurgia. Ele sentiu o alívio tomar conta de si.
Iam dar um jeito nele e então ele e Chuck enfrentariam Foxy juntos e aí tudo aquilo ia acabar.
Finalmente.
Outro homem apareceu em cima de Pete, fitando-o com olhos tristes. — Pobre garoto. Tão
novo — disse.
— Pois é, odeio quando são novos assim.
— Uma pena, né? Às vezes me dá calafrios.
— Por causa dos seus filhos, né?
— Sim, vou até dar um abraço mais apertado neles depois.
— Eu também.
Os dois homens ergueram o corpo de Pete e então o colocaram numa mesa dura.
Ei, pessoal, eu não tô conseguindo me mexer. Não sei por quê. Qual o problema comigo?
Vocês me deram alguma coisa pra me sedar? Isso tá me deixando meio surtado e eu já tive uma
semana bem ruim, sabe? Então, por favor, digam que tá tudo bem.
Um pensamento terrível lhe passou então pela cabeça. Ah, não! O caminhão machucou as
minhas pernas? Eu vou conseguir voltar a andar? É por isso que não consigo senti-las? Por que
vocês não falam comigo? Eu preciso de respostas! Preciso de ajuda!
Um dos homens pôs seus dedos enluvados em cima dos olhos de Pete. — Estranho.
— O quê?
— Não consigo fechar as pálpebras. É como se estivessem congeladas abertas desse jeito.
— Já aconteceu antes.
— É, mas eu não gosto. Queria fechar.
O outro homem riu.
— Ah, para com isso, florzinha. Temos trabalho a fazer. — Ele pegou uma tela portátil. —
Uma coisa boa, diz aqui que o garoto é doador de órgãos.
Espera, o quê?
— Sim, partes dele vão para alguns pacientes de sorte. Ele é jovem, seus órgãos são
saudáveis. Mas temos que trabalhar rápido.
Não! Houve um engano! Eu tô bem! Ainda não estou pronto para dar os meus órgãos! Mãe!
Pai! Cadê vocês? Não deixem fazerem isso comigo!
O homem pegou uma grande tesoura e começou a cortar suas roupas. Alguns minutos
depois, a sala foi tomada por música.
Espera... isso é outro pesadelo? Eu tô sonhando? Por favor, que isso seja um pesadelo. Que
não seja real. Acorda, Pete, agora! Acorda logo!
— Tem planos pra essa noite?
— Aham, vou levar as crianças pra Freddy Fazbear’s Pizza. Elas adoram aquele lugar.
— Ah, os meus filhos também. Vou te falar, aqueles animatrônicos ou sei lá o que me dão
calafrios, mas as crianças amam. Bom, se elas ficam felizes, por mim tudo bem.
Parem! Eu tô vivo! Vocês não podem tirar os meus órgãos antes de eu morrer! Alguém me
ajuda! Por favor!
O primeiro homem pegou um bisturi e então colocou a ponta sobre o peito de Pete.
— Ah, espera um pouco — disse o outro homem, lendo de novo alguma coisa na tela.
— O que foi?

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Ah, graças a Deus. Fala pra ele que foi tudo um engano. Fala pra ele que eu ainda tô vivo.
Fala pra ele não me abrir!
— Temos um caso bem urgente, precisando de olhos e de uma mão. Diz aqui que o garoto é
perfeitamente compatível. A mão não sofreu muito dano. Vai funcionar, mas temos que congelar
tudo bem rapidinho. O transporte já, já chega aí. Vamos fazer isso primeiro.
Nããããããããão!
O homem com o bisturi olhou para Pete.
— Bom trabalho, garoto. Você vai ajudar um monte de gente. — Ele pegou uma pequena
pinça com a outra mão. O segundo homem ligou uma pequena serra circular, a lâmina girando em
meio a um vulto arredondado.
— Vamos ao trabalho.
Pete começou a ouvir a música de Foxy tocando em sua cabeça...
Você até pode ser um pirata, mas primeiro terá que perder um olho e um braço! Yarg!
Pete observou, horrorizado e impotente, enquanto o primeiro homem se inclinava para tirar
seus olhos.

Quatro semanas depois...


Chuck foi com sua bicicleta até a Freddy Fazbear’s Pizza. As nuvens estavam carregadas e
escuras e havia um frio mórbido no ar. Quando foi para casa depois da aula, não havia ninguém lá.
Mesmo sabendo que a casa estava vazia, Chuck ainda chamou:
— Olá? Pete?
A geladeira respondeu com um zumbido alto.
A casa não era muito grande, mas parecia enorme e vazia para Chuck. Ele costumava
desejar que já tivesse idade para ficar em casa sozinho. Agora que seu desejo fora realizado,
desejava companhia.
Sua mãe finalmente conseguira voltar ao trabalho, depois de semanas chorando. Seu pai
também estava trabalhando. De alguma forma, o luto da perda de Pete havia reunido seus pais e ele
se mudara de volta para casa depois do funeral. Um dia, Chuck viu os dois limpando o quarto de
Pete. Recolheram as roupas sujas, jogaram o lixo fora, fizeram sua cama e fecharam a porta. Ela
não fora mais aberta desde então.
Chuck não se encontrava com seus amigos já há algum tempo. Agora, ele devia estar em seu
quarto, fazendo o dever de casa. Mas alguma coisa o estava levando de volta...
De volta à Freddy Fazbear’s Pizza. Para ver Foxy.
Ele nunca contou a ninguém o que ele e seu irmão realmente achavam sobre os acidentes
bizarros de Pete. Como acreditavam que o problema havia começado ou que planejaram se
encontrar na Freddy Fazbear’s Pizza para enfrentar Foxy de uma vez por todas.
Por semanas, Chuck sentiu um peso no peito, como se devesse fazer alguma coisa que nunca
chegou a fazer, como se tivesse um quebra-cabeças que estava incompleto.
Desde o funeral, ele havia escutado a última mensagem de Pete incontáveis vezes:
“Chuck! Você tava certo! Foi o Foxy esse tempo todo. Eu tenho que voltar pra enfrentá-lo.
Aquelas coisas bizarras ainda estão acontecendo, mas eu não vou deixar o Foxy vencer, Chuck. De
jeito nenhum! Me desculpa por não ter acreditado em você, irmãozinho! Me encontra lá assim que
puder! Podemos acabar com isso juntos!”
A morte de Pete incomodava Chuck dia e noite. Às vezes, quando estava sentado na sala, o
sinal tocava e ele então se dava conta de que a aula tinha acabado antes sequer de notar que havia
começado. Estava ficando para trás em todas as matérias. Os professores ficavam olhando para ele,
mas ninguém dizia muita coisa. Todos sabiam que ele havia perdido o irmão. Sabiam que havia
mudado. Chuck se sentava sozinho no recreio, escrevendo em seu bloco de notas, enchendo-o de
anotações, ideias e cenários do que podia ter acontecido com Pete e como podiam ter impedido tudo
antes que Pete... se fosse.
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Bom, ele estava cansado desses “e se”. Chuck não queria mais ficar só confabulando.
Ele prendeu a bicicleta no bicicletário na frente da Freddy Fazbear’s Pizza. Quando passou
pelas portas, o aroma familiar de pepperoni flutuou em sua direção. Os sons de sino e músicas dos
jogos vibravam à sua volta. Ele passou pelo fliperama e viu um grupo de crianças amontoadas em
volta de uma das máquinas. Aquele costumava ser ele. Ele sempre amou aquele lugar — até aquele
dia fatídico, quando Pete o arrastou pelo corredor até a sala de manutenção e tudo mudou.
Ele passou pela área de brincadeiras e seguiu até as mesas de aniversário, onde observou
algumas famílias sentadas diante do palco. Todos ali pareciam tão felizes. As criancinhas estavam
comendo pizza, fascinadas com o show dos animatrônicos. Algumas estavam cantando com a boca
cheia. As crianças aplaudiram e gritaram de alegria quando a música terminou.
Chuck avançou até o corredor que levava à sala de manutenção. Olhou por cima do ombro
para ver se alguém estava vendo e então foi em frente. Caminhou devagar pela área escura,
passando pelos pôsteres antigos, até chegar à porta. Ele levou a mão até a maçaneta e a sentiu
trêmula. Respirando fundo, ele abriu a porta pesada e adentrou a escuridão.
A porta bateu atrás dele, o som ecoando em seus ouvidos.
Com a respiração rala, ele pegou seu inalador e deu uma baforada. Então enfiou o inalador
no bolso e pegou o celular para acender a lanterna. Ele foi direto para o pequeno palco e abriu a
caixa de controle. Não ia mais perder tempo.
Sentiu um calafrio lhe subir a espinha, nas ignorou. Se hesitasse, sabia que não faria o que
precisava ser feito e repetiria esse momento de novo e de novo em sua cabeça. Ele tinha que fazer.
Tinha que descobrir o que havia acontecido com Pete.
— É por você, Pete — ele disse para a sala escura. — Eu vou enfrentar vilão e zerar o jogo.
Ele segurou o fôlego e bateu com tudo no botão INICIAR.
Ele esperou que a cortina se abrisse... que Foxy começasse a cantar...
Mas nada aconteceu.
Só o que Chuck ouviu foi o completo silêncio.

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Um Passo Mais Perto
A
s estrelas pareciam várias pequenas cabeças de alfinete brilhando em meio a uma coberta
de veludo negro. Kasey estava deitada de costas em um muro de pedra baixo, fitando o céu
noturno, sentindo-se maravilhada por mesmo que uma pequena parte de um universo tão
bonito. Ela se lembrou de uma canção de ninar de quando era pequena — havia um livro
de colorir no jardim de infância que tinha a letra da canção e a imagem de estrelas sorridentes.
Brilha, brilha, estrelinha, pensou. Quero ver... eu brilhar.
— Kasey! — A voz de Jack a assustou, tirando-a com tudo de seu transe. — Olha só ali!
Kasey se sentou e desviou o olhar para o restaurante infantil muito bem iluminado do outro
lado da rua, o Circus Baby’s Pizza World. Uma mulher e duas crianças pequenas estavam paradas
na frente da grande porta vermelha. A mulher estava mexendo desajeitadamente em sua bolsa.
— Vamos — sussurrou Jack.
Kasey se levantou e atravessou a rua casualmente ao lado de Jack, enfiando-se no beco ao
lado do Circus Baby’s, perto o suficiente para que pudesse ouvir a garotinha falando com a mãe:
— Eu acho a Circus Baby muito bonita! — disse a garotinha de cabelos castanhos. Estava
usando uma camiseta decorada com as mascotes bizarras do Circus Baby’s Pizza World.
— É bem bonita sim — disse a mãe, parecendo um pouco atordoada, provavelmente porque
tinha passado tempo demais cercada das luzes brilhantes e barulhos altos do empório de pizza cheio
de crianças.
— Posso usar marias-chiquinhas igual a Circus Baby? — perguntou a garotinha, puxando
duas mexas dos cabelos para cima e formando pequenos cachos. Não devia ter muito mais que três
anos, pensou Kasey. Quatro, no máximo.
— É claro que pode — disse a mãe. — Segure a mão do seu irmão enquanto eu acho as
chaves do carro.
— Ela tá com as mãos todas grudentas de doce — reclamou o garoto. Parecia ter idade para
estar começando o fundamental. Talvez sete.
— Mamãe, tô com sono — disse a garotinha. — Pode levar a minha sacolinha de doce? —
Ela ergueu uma pequena sacola plástica com o nome do restaurante estampado na frente.
A mãe encontrou suas chaves.
— Claro — disse. — Vou colocar aqui na minha bolsa.
— Pode me carregar? Tô com muito sono pra andar.
A mãe sorriu.
— Muito bem, vem aqui, garotona. — Deixando a bolsa pendurada no antebraço esquerdo,
ela se abaixou para pegar a filha.
— Agora! — Jack exclamou no ouvido de Kasey.
Kasey puxou a máscara de ski para cima do rosto e saiu às pressas de seu esconderijo no
beco. Passou correndo pela mãe e pegou sua bolsa com um movimento rápido e certeiro. Continuou
correndo quando a mulher gritou “Ei!” e a garotinha começou a berrar.
Enquanto Kasey corria, o garotinho disse:
— Eu pego o bandido, mamãe!
— Não — disse a mãe, com firmeza. — Você vai ficar aqui.
Se disseram mais alguma coisa, Kasey não ficou por perto para ouvir. Kasey sabia que era
rápida e sabia que não havia como a mãe alcançá-la a pé, não com duas criancinhas nas mãos.
Depois que Kasey conseguiu se afastar consideravelmente da cena do crime, tirou a máscara
de ski e a enfiou no bolso da jaqueta. Diminuiu o passo até uma caminhada regular e foi levando a
bolsa casualmente, como se fosse sua. E agora, imaginava, de fato era.
Voltando para casa, ou ao menos o que lhe servia de casa, ela se encontrou com os garotos.
Kasey, Jack e AJ ficavam em um depósito abandonado. Não tinha eletricidade — tinham que se
virar com lanternas comuns e aquelas de acampamento. Mas tinha um bom telhado e o prédio era
bem isolado, o que fazia com que fosse mais quente que do lado de fora. Eles dormiam em sacos de
dormir e esquentavam a comida em um pequeno fogão de duas bocas, do tipo que as pessoas
usavam em acampamentos. Na verdade, morar no depósito era meio que como um acampamento
coberto. Ou pelo menos era uma forma de encarar a situação, pensou Kasey.

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Um Passo Mais Perto
Ela se sentou em uma das caixas de madeira que o trio usava como cadeiras, pousando a
bolsa roubada em seu colo.
— Quanto a gente conseguiu? — perguntou Jack, inclinando-se sobre seu ombro. Ele tinha
um nariz acentuado que estava sempre mexendo, quase como um rato.
— Gosto de como você fala “a gente” mesmo tendo sido eu quem correu todos os riscos —
disse Kasey, abrindo o zíper da bolsa.
— Esse é o código do Covil dos Ladrões — disse AJ, sentando-se na caixa ao lado dela. Ele
era grande e corpulento, o músculo do grupo. — Nós dividimos tudo.
— É — disse Jack. — É que nem os técnicos falando que não se soletra “time” com “eu”.
Só que nesse caso, não se soletra “ladrão” sem “nós”.
— É, mas acontece que não tem nenhum “nós” na palavra “ladrão” — disse Kasey, rindo.
Ela tirou as longas tranças de cima do rosto e deu uma olhada dentro da bolsa. A primeira coisa que
tirou de lá foi a sacola de doces da garotinha. Não era de se admirar o berro que ela tinha dado. Não
queria perder todos os doces e cacarecos de plástico que tinha conseguido “ganhar” na pizzaria.
Kasey enfiou a sacola no bolso de sua jaqueta e então encontrou o que todos estavam esperando: a
carteira da mulher.
— Quanto? — disse Jack. Estava tremendo de ansiedade.
— Aguenta aí — disse Kasey, desdobrando a carteira e tirando todas as notas de dentro. Ela
contou. — Parece... oitenta e sete dólares. — Não era ótimo, mas não era terrível. As pessoas já não
costumavam mais carregar tanto dinheiro.
— Algum cartão? — perguntou AJ.
— Estou procurando. — Ela olhou brevemente para a carteira de motorista da mulher, mas
logo desviou o olhar. Sempre se sentia mal quando pensava que a vítima tinha um rosto e um nome,
que teria que esperar na fila do Departamento de Veículos Motores para tirar uma nova carteira. Ela
pegou os cartões plásticos. — Um cartão de crédito para abastecimento de gasolina, um cartão de
crédito normal.
O cartão de abastecimento era de uso limitado, visto que eles não tinham um carro. Ainda
assim, podiam usá-lo nas lojas de conveniência dos postos de gasolina. E certamente poderiam usar
o cartão de crédito regular antes de terem que descartá-lo. Kasey precisava muito de umas meias e
de um novo par de botas. As que estava usando estavam bem surradas, cheias de buracos tampados
com fita adesiva e, por isso, seus pés doíam o tempo todo.
— Vamos tentar usar os cartões amanhã — disse Jack. — Enquanto isso, oitenta e sete
dólares dividido por três dá... — Ele fez uma grande exibição do cálculo, “escrevendo” no ar como
se estivesse resolvendo um problema no quadro de uma escola. — Vinte e nove dólares para cada.
Vou pegar vinte daí agora, dona Kasey. Vou dar uma saída e ver o quanto uma pessoa pode farrear
com vinte pratas. Vocês dois vêm comigo?
— Eu vou — disse AJ. — Me dá vinte também, Kasey. — Ele ergueu a mão para ela.
— Acho que vou ficar aqui — disse Kasey. Ela não era muito de farra, como Jack e AJ. Sua
mãe costumava farrear bastante e Kasey cresceu sabendo que a tendência de sua mãe de torrar todo
o dinheiro numa noite despretensiosa significava que elas tinham que viver com as consequências
disso até o próximo pagamento.
— Por quê? — perguntou Jack. — Qual a graça disso?
— Eu tô cansada. — Kasey colocou a carteira de volta na bolsa roubada. — Fui eu que saí
correndo, lembram?
Depois que os garotos saíram, Kasey se deitou em cima de seu saco de dormir e revirou a
sacola plástica do Circus Baby’s Pizza World. Ela tirou de dentro um par de óculos de papelão com
lentes de plástico maleável. O papelão era decorado com a imagem de uma espécie de robô
bailarina esquisita. Kasey colocou os óculos no rosto por um momento, mas eles a fizeram se sentir
estranhamente tonta. E se a intenção era que visse alguma coisa, estava escuro demais para que
conseguisse fazê-lo. Ela os colocou no bolso da jaqueta para tentar de novo depois.
Todo o resto na sacola eram doces. Kasey e seus amigos ladrões comiam para sobreviver.
Compravam sanduíches de fast-food baratos quando tinham um pouco de dinheiro e surrupiavam
um ensopado de carne enlatado ou um ravióli de alguma loja de conveniência quando estavam
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Um Passo Mais Perto
quebrados. Fazia muito tempo desde a última vez que Kasey comera um doce. Ela encontrou um
pirulito vermelho, desembrulhou e o enfiou na boca, apreciando o sabor artificial de cereja e
sentindo-se como uma criancinha de novo.
Uma criancinha. Ela havia roubado de uma criancinha. Um ditado veio à cabeça de Kasey:
como roubar doce de criança. Era literalmente o que tinha feito hoje. Ela não se orgulhava disso,
mas ao mesmo tempo, a mãe da garota tinha sapatos bonitos, uma bolsa bonita e um carro. Se tinha
dinheiro o suficiente para levar os filhos para comer pizza e brincar no fliperama, então também
podia comprar mais doces para eles.
Por que Kasey acabara desse jeito e não como a mulher que tinha roubado? Kasey nunca
tinha planejado ser uma ladra que dormia num depósito. Duvidava que esse fosse o objetivo de
carreira de qualquer um.
A mãe de Kasey nunca quis muito ser uma mãe. Ela trabalhava à noite e dormia de dia e, no
geral, quando Kasey voltava para casa da escola, sua mãe olhava para ela com um misto de surpresa
e irritação, como se estivesse pensando “Ah, esqueci. Eu tenho uma filha, né?”. Normalmente, o
jantar era só uma tigela de cereal ou um sanduíche antes de sua mãe sair para o trabalho no clube.
Enquanto sua mãe estava fora, Kasey fazia o dever de casa, tomava um banho e assistia TV até a
hora de dormir. Ela tinha instruções de ir para o apartamento da senhorinha que morava ao lado
caso houvesse alguma emergência, mas nunca houve. Kasey sabia cuidar de si mesma.
Quando Kasey era adolescente, sua mãe arranjou um namorado novo que parecia que ia
ficar com ela por mais tempo que sua última sequência de namorados. Ele tinha um emprego
estável e podia ajudar sua mãe com dinheiro. O único problema era que ele não queria ter que
bancar uma adolescente “aproveitadora”, como costumava falar. Ele disse que teve que se mudar da
casa dos pais e arranjar um emprego na época que tinha a idade de Kasey e que por isso era tão
bem-sucedido. Quando disse que sua mãe tinha que escolher entre ele e Kasey, ela não pensou duas
vezes sobre a escolha. Kasey estava na rua antes de seu aniversário de dezessete anos.
Os professores de Kasey a imploraram para não largar os estudos. Suas notas eram boas e
ela era uma boa atleta, então havia a chance de conseguir uma bolsa para a faculdade, disseram.
Mas ela não podia ficar na escola e ainda ganhar dinheiro o suficiente para sobreviver. Ela saiu da
escola e pulou de um emprego fim de carreira para o outro, trabalhando até tarde, mas nunca
fazendo o suficiente para pagar o aluguel e as compras do mês. Às vezes, ficava nuns quartinhos
tristes que alugava por uma semana — outras vezes, acampava no sofá de amigos até que sua
hospitalidade acabasse.
A primeira vez que ela roubou foi no Famoso Frango Frito, o restaurante de fast-food no
qual estava trabalhando. Era um trabalho terrível. Ela suava em cima das fritadeiras por horas e
horas a fio e, toda noite, ia para casa sentindo como se tivesse sido mergulhada num barril de
gordura. Um dia, quando estava esfregando o chão na sala de jantar, notou que um sujeito havia ido
ao banheiro e deixado sua jaqueta pendurada nas costas do assento. A ponta de uma nota de vinte
dólares estava aparecendo na fresta do bolso. Era tentador até demais.
Esfregando o chão ao lado da mesa, Kasey puxou a nota e a escondeu em sua manga. Foi
chocantemente fácil e muito empolgante. Ela sabia que o sujeito nunca suspeitaria que foi roubado.
Só acharia que precisava tomar mais cuidado.
Ganhando o salário mínimo parada na frente daquelas fritadeiras infernais, Kasey levaria
mais de duas horas para ganhar o dinheiro que levou menos de um minuto para roubar. Aquilo lhe
enchia de adrenalina — saber que se safara de alguma coisa, que vencera o sistema.
Ela logo começou a roubar em vez de trabalhar — furtava bolsas, batia carteiras, pegava
comida e outros bens das prateleiras das lojas. Um dia, estava num festival de rua, surrupiando
carteiras e notas soltas nos bolsos das pessoas, quando dois homens a abordaram. A princípio, ficou
com medo de que fossem policiais, mas não pareciam da polícia. Um era um sujeito branco,
magricelo e irrequieto com várias tatuagens. O outro era negro, com ombros largos e a aparência de
quem costumava jogar futebol americano nos tempos do colégio.
— Estivemos te observando e você é boa — disse o magrelo agitado. — Já pensou em
trabalhar numa equipe em vez de agir sozinha?

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Um Passo Mais Perto
— A gente cuida um do outro — disse o grandão. — E dividimos o que pegamos. Mais
pessoas trabalhando, mais dinheiro.
Ela acabou ficando om Jack e AJ porque eles estavam nas ruas há mais tempo que ela e
estavam dispostos a compartilhar seu conhecimento sobre como sobreviver. Claro, eram mais
imprudentes que ela e torravam todo o dinheiro que roubavam, mas havia segurança em números.
Mesmo que eles às vezes lhe dessem nos nervos, ela preferia ter sua companhia do que tentar
sobreviver sozinha.
Kasey terminou o pirulito vermelho e se enfiou em seu saco de dormir. Ela pegou no sono
com o sabor doce ainda em sua língua.

Ela acordou com a luz do sol vazando pelas claraboias do depósito. Jack e AJ estavam os
dois apagados em seus sacos de dormir. Kasey não fazia ideia de que horas eles haviam voltado na
noite anterior. Ela rastejou para fora de seu saco de dormir e decidiu que usaria dois dólares dos
espólios do dia anterior para comprar um café da manhã barato no Estábulo do Hambúrguer. Um
pãozinho com hambúrguer e um café pequeno com refil grátis podia ser o suficiente para o dia
inteiro, se assim precisasse. Kasey pegou sua mochila e saiu em meio ao sol brilhante da manhã.
O Estábulo do Hambúrguer ficava só a meio quarteirão do Circus Baby’s Pizza World, o
lugar do assalto de ontem. Kasey riu, pensando na situação como se fosse algo dramático como um
grande assalto, sendo que só envolvera roubar uma sacola de doces de uma criança. Ela entrou no
Estábulo do Hambúrguer, fez seu pedido e então se sentou num banco de vinil laranja embaixo de
um mural com vários animais de fazenda cartunescos. Ela adicionou creme e açúcar em seu café,
desembrulhou seu pãozinho com hambúrguer e passou o tempo ali, curtindo seu café da manhã.
Enquanto mordiscava seu hambúrguer e bebericava seu café, olhou para os outros clientes.
A maioria pegava pedidos para viagem e já corria para seus trabalhos em escritórios, lojas ou obras.
Todos pareciam estressados ou com pressa. Isso era uma coisa boa na vida de Kasey. Ela tinha
sossego. O único momento em que tinha que ter pressa era quando estava fugindo com a bolsa ou a
carteira de alguém.
Comprar café da manhã no Estábulo do Hambúrguer lhe dava o direito de usar o banheiro
sem ser chutada do estabelecimento. Esse era um direito que ela estimava. Depois de terminar sua
refeição, ela foi até o banheiro para fazer sua higiene pessoal. Ela se trancou em uma cabine, pegou
uma espécie de esponja de banho com lenços umedecidos e então trocou de meias, roupa íntima e
camiseta. Depois de terminar na cabine, foi até a pia para lavar o rosto e escovar os dentes.
Uma mulher vestindo um uniforme composto por uma camisa de botão e uma calça caqui
olhou torto para Kasey, mas ela só a ignorou. Tinha tanto direito de estar ali quanto qualquer outra
pessoa. Kasey encheu sua garrafa d’água e a enfiou na mochila. Estava pronta para o dia.
Saindo sob a luz do sol, sua barriga cheia de comida e café, Kasey se sentia ótima. Pensou
em dar uma volta no parque antes de voltar ao depósito para ver o que os garotos estavam fazendo.
Enquanto caminhava, enfiou as mãos nos bolsos da jaqueta e sentiu os óculos de papelão da sacola
de doces da garotinha. Ela sorriu consigo mesma e os pegou.
Não tinha notado que havia um pequeno pedaço de papel enrolado grudado com fita na haste
esquerda do óculos. Ela tirou a fita com cuidado, desenrolou o pedaço de papel e leu: Coloque os
óculos e Ballora dançará para você.
Kasey pôs os óculos e sentiu a mesma tontura da noite anterior. Ela desviou o olhar para o
Circus Baby’s Pizza World, mais à frente na calçada. Lá, bem ao longe, ela viu a imagem de uma
bailarina, suas mãos sobre a cabeça, girando sobre a ponta do pé. Não era uma imagem muito bem
definida — era azul e meio difusa. Um holograma. Era assim que chamavam esse tipo de imagens,
ela se lembrou de súbito. Mas mesmo distante e borrada, havia algo fascinante no rodopio da
estranha boneca bailarina.

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Um Passo Mais Perto
Uma pirueta. Esse era o nome que se dava para aquele tipo de rodopio. Quando era pequena,
Kasey queria ser uma bailarina, assim como várias outras meninas. Mas não tinha dinheiro e sua
mãe dizia que, mesmo se tivesse dinheiro, ela não gastaria em algo tão inútil quanto aulas de dança.
Kasey ficou parada na calçada olhando para a imagem, quase como se estivesse hipnotizada.
Era bonita e havia tão pouca beleza na vida cotidiana de Kasey. Ela se sentiu consumida por
tristeza, anseio e também uma outra coisa... arrependimento? Ela se arrependia da vida que levava?
Devia haver beleza na vida de uma pessoa, não é? A vida devia ser mais do que apenas sobreviver.
Após um tempo, Kasey começou a se sentir tonta, como se fosse ela quem estivesse fazendo
as piruetas. Com medo de que pudesse estar doente, ela tirou os olhos e se recostou do lado de um
prédio para se recuperar.
Ela olhou para o par de óculos em sua mão. De fato, a bailarina era um efeito visual bem
impressionante para o que parecia um brinquedo tão barato. Não era de se espantar que a garotinha
tivesse ficado tão chateada quando Kasey levou sua sacola de doces. Para uma criança, aqueles
óculos deviam parecer completamente mágicos.
Kasey guardou os óculos no bolso. Decidiu pular o passeio no parque e voltar direto para o
depósito. Tinha que mostrar aquele brinquedo doido para os garotos.

Jack e AJ tinham acabado de acordar quando ela voltou.


— Que horas vocês chegaram ontem? — perguntou Kasey, sentando numa caixa.
— Sei lá. Duas? Três? — Jack bocejou. Ele apoiou um cotovelo em seu saco de dormir. —
Mas francamente, quem se importa? Não tenho que ficar batendo ponto pra ninguém não.
AJ abriu seu saco de dormir e se sentou de pernas cruzadas no chão.
— Ei, a gente tava pensando em pegar aquele cartão de abastecimento que você arranjou e
ver se consegue usar pra comprar alguma coisa na loja de conveniências do posto.
— Claro — disse Kasey. Seria muito bom ter comida em casa. — Mas antes quero mostrar
uma coisa.
Fora do depósito, do lado de uma caçamba de lixo, Kasey tirou os óculos do bolso.
— Isso aqui tava na sacola de doces da pizzaria. Coloca. — Ela deu os óculos para Jack.
Ele os colocou no rosto, fez uma pose de “bacana” e então deu risada.
— Olha pra frente — disse Kasey. — Tá vendo ela?
— Vendo quem? — disse Jack.
— A bailarina dançando.
— Não tô vendo ninguém — disse Jack. — Eles só fazem tudo ficar azul, mais nada.
— Deixa eu ver — disse AJ, pegando os óculos de Jack e os colocando no rosto. Ele olhou
em volta. — Também não vejo nada.
— Nada da bailarina? — disse Kasey. Não fazia sentido. Por que eles não estavam vendo?
— Não. Só fica tudo azul, que nem o Jack disse. — AJ devolveu os óculos para Kasey.
Kasey estava confusa. Talvez os óculos só funcionassem na frente do Circus Baby’s Pizza
World? Mas isso também não fazia sentido. Por que alguém faria um brinquedo que só funcionasse
em um lugar?
Ela colocou os olhos e olhou para frente, para o outro lado da rua. A bailarina — Ballora, de
acordo com as instruções — estava lá, dançando em um beco cheio de lixo entre dois depósitos.
Mas ela logo foi acometida pela tontura, assim como pela sensação inquietante que teve antes.
— Bom, eu vejo ela — disse Kasey, tirando os óculos antes que perdesse o equilíbrio ou
vomitasse. — Talvez tenha algo de errado com os seus olhos.
— Talvez tenha algo de errado com o seu cérebro — disse Jack, rindo e batendo com o
cotovelo em AJ, que também deu risada.
Kasey ignorou a gozação e guardou os óculos de volta no bolso da jaqueta. Mas começou a
pensar. Será que eles estavam certos? Havia algo de errado com ela?

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Um Passo Mais Perto
No posto, eles pegaram bem mais comida do que a maioria das pessoas compraria em uma
loja de conveniências: um pão de forma tamanho GG, um pote de manteiga de amendoim, seis
pacotes de salgadinho, latas de ravióli e ensopado de carne e um pack com doze garrafas pequenas
de refrigerante. Kasey sabia que seria ela quem pagaria no caixa porque Jack e AJ sempre diziam
que ela tinha um rosto honesto. Sem contar que, normalmente, as pessoas não costumavam
suspeitar de uma mulher cometendo um crime.
A caixa parecia sonolenta e entediada enquanto passava e ensacolava todos os produtos.
Kasey passou o cartão roubado na máquina e segurou o fôlego. Demorou apenas dois segundos,
mas pareceu uma eternidade até a palavra “Aprovado” aparecer na tela.
Kasey, Jack e AJ pegaram as sacolas e esperaram até saírem da loja para rirem de sua sorte.
— Bom, não vamos ter que nos preocupar com comida pelos próximos dias — disse Jack.
— Guarda esse cartão aí, hein, Kasey.
Kasey deixou o cartão em um pequeno compartimento em sua mochila.
— Vou sim, mas não sei se vamos conseguir usar de novo — disse ela. Normalmente, as
companhias de cartão de crédito eram bem rápidas para cancelar cartões que suspeitavam terem
sido roubados.
Quando voltaram ao armazém, eles se banquetearam com sanduíches de pasta de amendoim,
salgadinhos e refrigerantes que ainda estavam gelados graças às geladeiras da loja de conveniências.
Jack e AJ ainda estavam exaltados por conta da adrenalina de terem conseguido usar o cartão
roubado com sucesso. Eles riram e fizeram piadas, mas alguma coisa ainda estava incomodando
Kasey, alguma coisa que ela não sabia dizer exatamente o que era. Ela riu das piadas de Jack e AJ,
mas algo que lhe parecia preocupação a atormentava no fundo da cabeça. O estranho era que,
quando sentia isso, não sabia ao certo com o que estava preocupada.
Havia sempre a preocupação do ladrão de ser pego. A preocupação de ser preso, julgado,
condenado. Essa preocupação nunca ia embora, mas o que ela estava sentindo agora era diferente.
De alguma forma, tinha algo a ver com os óculos, com o fato de que podia ver a bailarina dançarina
enquanto Jack e AJ não, com o jeito estranho que olhar para a bailarina e seus rodopios fazia com
que se sentisse.
Quando terminaram de comer, Kasey pegou uma das sacolas da loja de conveniências.
— Coloquem o lixo aqui — disse para Jack e AJ — que eu levo lá pra caçamba.
— Sempre limpando tudo pra todo mundo. É a dona de casa perfeita — disse Jack, jogando
sua garrafa de refrigerante vazia na sacola.
— Quê que eu posso fazer se vocês são uns porcalhões? — disse Kasey. — Não quero ter
problema com insetos aqui.
Kasey tinha crescido em uma série de apartamentos que eram um mais nojento que o outro.
Sua mãe era despejada por não pagar o aluguel e aí elas acabavam se mudando para outro lugar
menor e mais sujo que o anterior. Sempre tinha baratas e, no verão, um desfile infinito de formigas.
Quando Kasey já tinha um pouco mais de idade, começou a lavar os pratos e recolher o lixo que sua
mãe deixava acumular. Limpar ajudou um pouco, mas os insetos ainda vinham dos apartamentos
vizinhos, como penetras procurando comida e bebida grátis numa festa. Kasey sempre pensou que,
quando fosse mais velha, teria um apartamento próprio que seria limpo, bem-organizado e livre de
insetos. Diferente de sua mãe, ela pagaria o aluguel na data certa todos os meses.
O depósito não era exatamente o que tinha em mente, mas ela ao menos podia fazer sua
parte para manter os insetos longe. Ela levou a sacola de lixo para fora e a jogou na caçamba.
Talvez devesse sair para andar. Sentiu uma súbita necessidade de ficar sozinha. Sabia que,
no depósito, Jack e AJ estariam fazendo planos para a noite. Como era sexta, eles provavelmente
iam querer ir para o centro, onde ficavam os barzinhos. Se esperassem até bem tarde, depois que as
pessoas já tinham farreado por horas, os roubos ficavam bem mais fáceis. Kasey podia passar por
um grupinho de rapazes e bater três de suas carteiras sem que nenhum deles notasse.
Bolsas eram sempre mais complicadas porque não dava para levar embora sem que a dona
notasse. Mas Kasey era rápida. Era da equipe de atletismo antes de largar a escola. Não tinha como
uma garota bêbada de salto alto conseguir pegá-la.

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Um Passo Mais Perto
Normalmente, Kasey gostava de planejar o trabalho da noite com os garotos. Gostava de
montar uma estratégia para que tivessem o maior lucro possível, para que maximizassem suas
chances de sucesso. Era como montar um quebra-cabeça.
Mas agora, ela não estava no clima para juntar as peças. Só queria andar, clarear a cabeça
dos pensamentos confusos que espiralavam lá dentro.
Espiralar. Espiralar rimava com rodopiar. Por que ela não conseguia tirar aquela boneca
dançarina que não parava de girar da cabeça?
Ela foi andando até o parque. Havia policiais em horário de almoço sentados nos bancos,
comendo sanduíches. Um passeador de cães estava de alguma forma passeando com quatro
cachorros de tamanhos diferentes sem deixar com que as guias se enrolassem uma na outra. Kasey
sorriu diante do pequeno Yorkshire que ia andando na frente da matilha, como se fosse o maior
cachorro de todos.
No parquinho, as crianças se penduravam, escorregavam e balançavam, gritando e rindo.
Suas mães as observavam, para se certificarem de que estavam em segurança. Kasey invejava
aquelas crianças. Como será que era, se perguntou, brincar tanto quanto quisesse e saber que
quando ficasse com fome ou sede, sua mãe tiraria uns biscoitos e uma caixinha de suco gelado da
bolsa? Saber que, quando ficasse cansada, podia ir para casa e sua mãe a enfiaria numa caminha
quente e macia para tirar um cochilo?
Mesmo quando criança, Kasey nunca teve esse tipo de cuidado.
Ela seguiu para uma área mais arborizada do parque, porque gostava da sombra e da solidão.
As folhas do outono — vermelhas, douradas e laranjas — iam caindo dos galhos das árvores.
Folhas que já haviam caído eram trituradas sob seus pés.
Era estranho. Ela não queria ver Ballora. Não gostava de como ver Ballora a fazia se sentir.
Mas, ainda assim, se sentiu levado a mão aos óculos de papelão, se sentiu colocando-os no rosto.
Sentiu a tontura familiar, se ajeitou junto a uma árvore e olhou para o bosque adiante, onde a luz do
sol brilhava em meio aos vãos entre os galhos.
Lá estava Ballora, dando uma pirueta entre as folhas coloridas. A cada giro, as folhas
brilhantes eram sugadas em direção a seu vórtice. Elas voavam à sua volta, suavemente num
primeiro momento, depois mais rápido, como se presas num redemoinho.
Por alguns instantes, Kasey admirou sua beleza, mas então parou para pensar: Calma. Se
Ballora é só uma imagem, um holograma, então como está afetando os objetos à sua volta? Não
fazia sentido.
Além disso, Ballora agora não estava mais perto de Kasey que no dia anterior? A imagem
estava mais clara, isso era certeza. Não tão difusa — ela podia ver as articulações nos braços e
pernas da figura que mais parecia uma boneca, podia ver os olhos azuis e lábios vermelhos no rosto
branco. O rosto pintado parecia o de um palhaço, mas, diferente da maioria dos palhaços, Ballora
não estava sorrindo. Os olhos azuis vazios não piscavam, mas, de alguma forma, Kasey sentia que
estavam olhando para ela. Ballora estava olhando para Kasey e não gostava do que estava vendo.
De repente, Kasey não conseguia mais respirar. Ela se curvou, com medo de que pudesse
desmaiar. Por que estava surtando por causa de um brinquedo idiota? Ela arrancou os óculos do
rosto e os enfiou de volta no bolso da jaqueta. Estava sendo ridícula e tinha que parar com isso. Se
queria sobreviver, tinha que manter a cabeça fria a todo momento.
Ela devia voltar ao depósito e falar com os garotos. Precisava saber os planos para a noite.

Depois da meia-noite, Kasey, Jack e AJ foram para os barzinhos. Eles não entravam neles,
ficavam só escondidos nas sombras do lado de fora. Os garotos estavam de olho em vários bares
diferentes enquanto Kasey esperava no beco ao lado de um clube de dança que era frequentado por
universitários, suas carteiras e bolsas cheios com o dinheiro da mamãe e do papai.
Ela encontrou seu alvo. A garota com um vestido curto rosa-claro e um salto cor-de-rosa
impossivelmente alto. Sua bolsa de grife — do mesmo tom de rosa que o vestido e os sapatos —
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estava pendurada em seu ombro por uma alcinha finíssima. A garota do vestido rosa estava rindo e
conversando aos berros com seu namorado.
Kasey tinha uma ferramenta para trabalhos assim, uma tesoura bem forte que podia cortar
uma alça de bolsa de couro como se fosse papel. Ela pegou a tesoura e se enfiou em meio à
multidão. Se aproximou por trás da garota de vestido rosa e posicionou a tesoura para cortar a alça.
Quando estava para dar o corte, alguém bateu nela por trás. Ela escorregou e a ponta afiada da
tesoura fincou em carne. Quando Kasey pegou a bolsa, viu o corte superficial, porém cheio de
sangue no braço da garota.
— Ai! O que foi isso? — gritou ela. — Ei, a minha bolsa...!
Kasey correu.
Correu até ter certeza de que havia se distanciado o suficiente de sua vítima, então
desacelerou até que estivesse andando mais casualmente e, por fim, enfiou a bolsa cor-de-rosa
dentro de sua jaqueta.
Em sua mente, Kasey continuava vendo o braço da garota lacerado pela tesoura, o sangue
vermelho vívido sobre sua pele pálida.
Kasey não queria machucá-la. Claro, ter sua bolsa puxada com força pode te assustar um
pouco, — pode ser uma inconveniência, — mas não vai causar nenhum dano físico.
Kasey já havia roubado dezenas, talvez centenas de pessoas, mas nunca tinha machucado
ninguém fisicamente até aquela noite. Derramar sangue mudava as coisas.
Foi um acidente, pensou Kasey. Mas foi mesmo? A garota não teria sido cortada se Kasey
não tivesse chegado atrás dela com a tesoura na mão. Kasey não queria cortá-la, mas não podia
exatamente se dizer inocente.
Kasey chegou ao depósito antes dos garotos. Pegou uma lanterna e se sentou em seu saco de
dormir para ver o que tinha conseguido. Ela abriu a bolsa cor-de-rosa e jogou seu conteúdo no chão:
uma carteira de motorista, um batom e uma única nota de vinte dólares que, de acordo com as
regras do Covil dos Ladrões, devia ser dividida em três.
Kasey colocou tudo de volta na bolsa e suspirou. Não valera o esforço ou o derramamento
de sangue. Ela se ajeitou em seu saco de dormir, mas demorou bastante até pegar no sono.

No dia seguinte, Kasey, Jack e AJ foram para o centro, em busca de possíveis lugares para
arranjar um emprego. Eles passaram pelo parque onde Kasey havia visto Ballora. Kasey olhou para
o bosque cheio de árvores e viu as folhas se erguendo e espiralando assim como quando estavam
em volta da boneca dançarina. Ela colocou os óculos e lá estava Ballora, mais perto que antes.
Estava chegando mais perto dela todos os dias. Se Kasey pudesse fazer com que os garotos vissem a
boneca, se sentiria muito melhor. Kasey tirou os óculos e correu para alcançar Jack e AJ.
— Espera, pessoal — disse Kasey. Ela ergueu os óculos para eles. — Coloquem os óculos e
olhem ali, no meio daquelas árvores.
— De novo? — disse AJ. — Eu não. Eu te amo como se fosse minha irmã, Kasey, mas pra
mim já deu dessa esquisitice.
Jack revirou os olhos, mas disse:
— Beleza. Dá aqui. — Ele colocou os óculos e olhou exatamente para onde Kasey estava
apontando. — Nada.
— Nada? — O coração de Kasey afundou em seu peito.
— Não. Nadica de nada — disse Jack. — Pelo que posso ver, tem duas soluções pra esse
problema. Uma é te trancar num hospício e a outra... é isso. — Ele jogou os óculos numa lixeira
próxima. — Pronto. Problema resolvido. Beleza?
Kasey sentiu uma onda de alívio lhe percorrer todo o corpo. Jack tinha razão. Sem óculos,
sem problemas.
— Beleza. — Ela se sentiu sorrindo um pouco. — Obrigada, Jack.

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Um Passo Mais Perto
— Não por isso — disse Jack. — Agora você tem que se recompor. O Covil dos Ladrões
precisa do seu raciocínio rápido e dedos leves. Para de surtar por essas paradas doidas.
Kasey assentiu. Nem acreditava que tinha se deixado desmoronar por um brinquedo barato.
— Raciocínio rápido e dedos leves. Pode deixar — disse Kasey, balançando os dedos. —
Por que não pegamos o ônibus até o mercado e vemos se conseguimos fazer o cartão de crédito
daquela mulher funcionar.
— Ótima ideia — disse Jack. — Viu? Já tá até melhor.
Os garotos foram em direção ao ponto de ônibus, mas Kasey hesitou. Os óculos eram o que
a faziam ver Ballora. Livrando-se deles, ela não veria Ballora. Mas isso não queria dizer que
Ballora não estaria lá. Ela ainda podia estar seguindo Kasey, — se aproximando mais a cada dia, —
mas Kasey não teria como saber que ela estava lá. A ideia de uma Ballora invisível dava mais medo
que o de uma visível. Kasey levou a mão à lixeira, pegou os óculos e os enfiou de volta no bolso
antes de correr até o ponto.
No grande supermercado, Kasey pegou um novo par de botas — pesadas, confortáveis e
práticas. Todos pegaram pacotes de meias, roupas de baixo e camisetas. Comprar coisas demais
levantaria suspeita, então tentaram se limitar ao que mais precisavam.
Como sempre, foi Kasey quem fez a comprar por causa do seu rosto honesto. Mas sua cara
não foi de muita importância, visto que a caixa passou os produtos sem nem olhar para ela e então
perguntou roboticamente:
— Débito, crédito ou dinheiro?
— Crédito — disse Kasey, entregando o cartão roubado.
A mulher passou o cartão na máquina, franziu o cenho e então tentou de novo.
— Lamento, senhora. Esse cartão foi recusado. Tem outro cartão que gostaria de usar hoje?
— Não, obrigada. — Kasey pegou o cartão inútil, abandonou a tentativa de compra e foi
andando às pressas até a porta da frente, onde Jack e AJ estavam esperando. — Recusado — disse.
— Putz, que droga — disse Jack enquanto passavam pela porta.
AJ balançou a cabeça.
— A mulher deve ter reportado que foi roubado. Pena. Eu meio que tava na expectativa pra
usar aquelas meias e cuecas novas.
— Só tem uma coisa a fazer — disse Kasey. Ela pegou sua grande tesoura, cortou o cartão
em vários pedacinhos pequenos e então os espalhou pela lixeira mais próxima.
No caminho de volta para o depósito, eles passaram no parque. Kasey ouviu o farfalhar das
folhas e desviou o olhar para vê-las espiralando, mas isso não significava que Ballora estava lá,
disse a si mesma. Ela cerrou as mãos em punhos para que não tirasse os óculos do bolso. O fato de
as folhas estarem espiralando só queria dizer que aquele era um dia de vento, bem comum no
outono. Nada além disso.

O trabalho daquela noite devia compensar aquela maré de azar. Eles se sentaram encolhidos
no depósito, comendo ravióli enlatado com as mãos e tentando bolar o próximo plano de ação.
— Podíamos tentar a pizzaria de novo — disse Jack. — As pessoas costumam levar dinheiro
vivo pra esses lugares.
— Não. — A resposta de Kasey foi automática e firme.
— Por que não? — disse Jack. — Tá com medo de acabar com um brinquedinho possuído
assustador?
— Não é isso — disse Kasey. Ela provavelmente merecia a piada. Tinha deixado a coisa
com os óculos sair do controle. — Só não gosto de envolver crianças nisso, tá bom?
— A gente não vai na estação de trem faz tempo — disse AJ. — É bem fácil de se misturar
na multidão lá e bater umas carteiras. Pode ser um bom jeito de recuperar a sua confiança, Kasey.
— É, vamos fazer isso — disse Kasey. Era disso que ela precisava. Um trabalho fácil.

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Um Passo Mais Perto
Eles nem precisavam entrar na estação, era só esperar a hora do rush, quando um amontoado
de pessoas saía com tudo pelas portas da estação, e aí podiam se misturar na multidão sem serem
vistos. Kasey abriu caminho pelo aglomerado, sempre de olho em empresários de aparência mais
abastada, com volumes em forma de carteiras em seus bolsos de trás. Tinha encontrado um alvo e
estava para pescar a carteira quando alguém agarrou seu braço. Ela levou um susto, mas então viu
que era Jack. Ele sibilou a palavra “vamos”.
Quando viu as luzes azuis intermitentes, ela entendeu.
Uma viatura da polícia estacionou ao lado do meio-fio. Kasey, Jack e AJ foram andando
com multidão da forma mais tranquila e casual possível, como se também tivessem acabado de sair
do trem. Kasey só conseguiu respirar direito quando a luz azul ficou para trás.
— Dava pra esse dia piorar? — disse Jack, quando finalmente voltaram ao depósito.
— O azar sempre vem em três rodadas — disse AJ, erguendo três dedos. — Já foram duas,
então falta uma.
— Eu não acredito em superstições — disse Jack. — Em gatos pretos, espelhos quebrados.
Nada disso.
O depósito estava gelado, menos que do lado de fora, mas ainda frio. Kasey decidiu ficar
com a jaqueta. Ia ficar ainda pior à noite e suas mãos já estavam congelando. Provavelmente teria
que comprar ou roubar umas luvas. Ela enfiou as mãos nos bolsos da jaqueta para aquecê-las. Lá
estavam os óculos. Onde estava Ballora? Será que Ballora estava prestes a pegá-la? Seria essa a
terceira rodada do azar? Seu coração bateu mais forte de pânico e ela passou correndo por Jack e
AJ, saindo do depósito. Agora o frio era a menor de suas preocupações.
Do lado de fora, ela levou as mãos à cabeça e começou a andar de um lado para o outro.
Finalmente, levou uma mão trêmula ao bolso e tirou os óculos de dentro.
Sem conseguir se deter, os colocou no rosto. Lá, sob o facho de luz de um posto a poucos
metros de distância, Ballora rodopiava. Estava mais perto que nunca antes. Kasey podia ver cada
articulação de seu corpo, cada detalhe do rosto, do corpo e do tutu. Era bonita e horrível ao mesmo
tempo e com certeza estava chegando mais perto.
Kasey arrancou os óculos do rosto e os enfiou de volta no bolso. Se sentou na calçada úmida
e gelada e tentou pensar. Toda vez que via Ballora, ela estava um pouco mais perto. O que ia
acontecer quando Ballora estivesse perto o suficiente para tocá-la? Ballora poderia pegá-la?
Kasey sentia como se estivesse esperando por uma punição. Não sabia se seria rápida e
certeira ou rápida e tortuosa. Ela não queria saber.
Tinha que ter um jeito de fugir, pensou Kasey. Ballora tinha aparecido pela primeira vez na
frente do Circus Baby’s Pizza World, a cena onde Kasey roubara os óculos. Desde então, Ballora a
vinha seguindo pela cidade. Talvez, Kasey pensou, Ballora só pudesse segui-la na cidade onde o
crime havia ocorrido. Talvez se Kasey fosse embora, se fosse para outro lugar, pudesse deixar
Ballora para trás.
Valia a tentativa.
Kasey esperou até que Jack e AJ estivessem dormindo e então entrou furtivamente no
depósito, enrolando seu saco de dormir e pegando a mochila com seus pertences da forma mais
silenciosa que conseguiu. Ela pegou sua parte do dinheiro do esconderijo do Covil dos Ladrões e
deixou o resto para Jack e AJ. Ela não roubaria deles. Eles foram como irmãos para ela — às vezes
chatos, mas bons do seu próprio jeito.
Foi uma longa caminhada até a estação de ônibus. Ela deu uma olhada na lista de partidas. O
próximo ônibus partia para Memphis às seis da manhã. Pelo visto, ela ia para Memphis. Comprou
uma passagem, que custou metade de todo o dinheiro que tinha, e então se sentou num banco para
tentar dormir por algumas horas. Ela acordou às 4h30, notando alguém perto dela. Abraçou a
mochila para proteger seus pertences de gente como ela.
— Desculpe. Não queria acordá-la. — A voz pertencia a uma senhora idosa com cabelos
cinzas e a pele alguns tons mais escura que a de Kasey. Usava um vestido florido amarelo-gema de
ovo e um chapéu combinando. Parecia que estava indo para a igreja.
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Um Passo Mais Perto
— Não, não, tudo bem — disse Kasey. — Eu precisava mesmo acordar. Meu ônibus sai em
uma hora e meia.
— Para onde vai? — A senhora se sentou ao lado de Kasey.
Por um segundo, Kasey se perguntou se devia lhe contar, mas a voz da senhora era tão doce
que ela não viu mal.
— Memphis — disse.
— Ah, não vai ser uma viagem muito longa — disse a senhora. — Eu vou para Chicago para
ver meu filho, minha nora e meus netos. Vai ser uma boa visita quando eu chegar lá, mas também
vai ser uma longa viagem de ônibus. Você tem família em Memphis?
— Não, senhora — disse Kasey. — Só estou procurando um recomeço. — Não era como se
ela pudesse contar para a senhora que estava fugindo de uma boneca bailarina que possivelmente
queria machucá-la. Isso faria a senhora sair correndo do banco.
— Já tem um emprego em vista? — perguntou a senhora.
— Não, mas vou achar alguma coisa — disse Kasey. — Sempre acho.
— Que bom — disse a senhora, dando uma batidinha no braço de Kasey. — Gosto de ver
uma pessoa jovem com essa iniciativa. — Ela pegou uma grande sacola de palha e começou a
revirá-la. — Está com fome, meu bem? Eu guardei comida suficiente para o café da manhã, almoço
e jantar de um exército. Nunca que eu vou pagar pela comida dessas estações de ônibus. São caras,
têm um gosto ruim e fazem mal.
Kasey estava com fome. Não havia se dado conta até a mulher tocar no assunto de comida.
— Estou um pouco, sim. Mas não precisa dividir comigo se não...
— Eu tenho bastante, meu bem. — Ela tirou da bolsa uma pequena garrada de suco de
laranja, gelado e úmido por conta da condensação. Então deu a Kasey algo embrulhado em papel
alumínio. — Pão com presunto — disse. — Você não é um daqueles jovens que não como porco, é?
— Não, senhora — disse Kasey. — Eu como qualquer coisa que coloquem na minha frente.
Obrigada. — O pão era artesanal e fofinho e o presunto estava no ponto certo entre o doce e o
salgado. Era a melhor coisa que Kasey comia há muito tempo. — Que delícia — disse.
— Que bom que gostou. — A mulher deu mais uma batidinha no braço de Kasey e então se
levantou do banco com firmeza. — Melhor eu passar no sanitário antes de pegar o ônibus. Esses
banheiros dos ônibus não são muito legais. Gosto de banheiros que fiquem parados.
Kasey riu.
— Sim, senhora. — Foi a melhor conversa que ela se lembrava de ter tido em muito tempo.
A senhora olhou para Kasey por um longo momento.
— Veja, sei que não é da minha conta, mas como nunca mais vou vê-la de novo, posso
muito bem dizer o que penso. Você parece uma jovenzinha que está fugindo de alguma coisa. Com
a minha experiência, às vezes, se você tenta fugir dos seus problemas, esses problemas só acabam te
seguindo. Isso faz sentido? — Kasey assentiu. Não conseguiu olhar nos olhos da senhora. — É
melhor construir pontes do que queimá-las, querida. Lembre-se disso.
A senhora saiu andando e Kasey sentiu um calafrio frente à ideia de que seus problemas a
seguissem. De que Ballora a seguisse. Esperava de todo o coração que a senhora estivesse errada.
Kasey dormiu pela maior parte da longa viagem de ônibus, acordando ocasionalmente para
olhar pela janela para a paisagem lá fora. Aquela era a maior viagem que já tinha feito, então por
que não aproveitar o cenário?
Quanto mais longe viajava, mais esperançosa se sentia. Um recomeço. Era o que havia dito
para a senhora do que aquilo se tratava e talvez de fato fosse. Sem mais roubos, sem mais viver com
medo, sem mais ser perseguida por uma boneca bailarina bizarra e rodopiante.

Kasey saiu da estação de ônibus sob o sol vibrante de Memphis. A placa de um hotel azul
claro decadente de canto de estrada cujo nome era Hotel Melhor Opção anunciava quartos por 29,99

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dólares a noite. Kasey duvidava muito que aquela era mesmo a melhor opção, mas era melhor que
dormir na rua e ela tinha quarenta pratas no bolso.
Ela entrou na recepção escura do hotel e deu uma nota de dez e uma de vinte para a mulher
acabada que usava um roupão e pantufas.
O quarto tinha um revestimento barato com décadas de idade e um carpete que costumava
ser marrom, manchado pelos muitos anos de hóspedes desleixados. Mas tinha uma cama de casal,
TV a cabo e um banheiro que seria todo de Kasey.
O primeiro passo em seu recomeço foi tomar um banho.
Kasey deixou a água quente bater em seu pescoço e ombros. Não conseguia se lembrar da
última vez que tinha lavado o cabelo e usou toda a garrafinha do shampoo do hotel para lavar as
tranças e o couro cabeludo. Se ensaboou da cabeça aos pés e deixou os jatos de água quente a
enxaguarem até se sentir perfeitamente limpa. Foi o paraíso. Kasey sempre tentava manter sua
higiene em dia, mesmo vivendo nas ruas, mas não tinha como lenços umedecidos e a pia do
banheiro de uma lanchonete se compararem a um banho quente de verdade.
Depois de se secar, Kasey escovou os dentes e vestiu as roupas mais limpas que tinha.
Estava na hora de encontrar seu recomeço.
Andando pelas ruas de Memphis, se deparou com uma velha cafeteria chamada Royal Café,
que tinha uma placa escrita à mão na janela dizendo PRECISA-SE DE AJUDA. Embora o nome
sugerisse isso, a cafeteria era tão luxuosa quanto o hotel em que estava ficando era a melhor opção,
mas ela precisava ser realista.
Quanto tempo fazia desde que tivera um emprego de verdade?
Não desde os tempos do Famoso Frango Frito, onde roubara aquela nota de vinte e começara
sua vida criminosa.
Dentro do Royal Café, uma garçonete de cabelos loiros oxigenados que podia ter qualquer
coisa entre trinta e cinco e sessenta e cinco anos disse:
— Pode sentar onde quiser.
— Estou aqui pelo trabalho — disse Kasey.
A garçonete virou a cabeça e gritou:
— Jimmy!
Um homem com a pele cor de azeite de oliva e olhos cansados saiu da cozinha, secando as
mãos numa toalha. Seu avental estava manchando de óleo de várias idades.
— Sim? — disse ele.
— Ela tá aqui pelo trabalho — disse a garçonete. Seu tom implicava que ela não achava que
Kasey fosse uma candidata muito boa.
— Já serviu mesas e lavou pratos antes? — perguntou o homem, presumivelmente Jimmy.
— Claro — disse Kasey. Nunca tinha feito nada disso, mas não podia ser tão difícil, não é?
— As bandejas cheias de louça suja podem ser bem pesadas. Acha que consegue aguentar?
Você parece bem mirradinha.
— Sou pequena, mas sou forte.
Ele sorriu um pouco.
— Tem um nome?
— Kasey.
— Quando pode começar, Kasey?
Não foi uma entrevista muito exigente. Ela nem chegou a dizer para ele qual era seu
sobrenome.
— Quando você precisa de mim?
— Que tal agora?
Não era como se ela tivesse alguma outra coisa para fazer. Podia muito bem começar a
ganhar dinheiro agora mesmo.
— Claro. Mas eu não preciso de treinamento ou coisa assim?
Jimmy olhou para ela como se tivesse feito uma pergunta idiota.
— Você pega uma bandeja. Você tira os pratos das mesas e coloca na bandeja. Você leva os
pratos pra cozinha, enxagua na pia com água quente e depois enfia eles na máquina de lavar louça e
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liga ela. Quando os pratos estiverem limpos, você tira da máquina e empilha eles nas prateleiras.
Consegue fazer isso?
— Sim, senhor.
— Ótimo. Então esse foi o seu treinamento. O salário é o mínimo, eu pago em dinheiro no
final da semana. Das sete às duas de segunda à sexta, com uma refeição grátis por turno. Tudo bem
por você?
— Sim, senhor. — O pagamento era pouco, mas ela sairia do trabalho às duas e ter uma
refeição quente grátis todos os dias a ajudaria bastante.
— Ótimo — disse ele. — Ao trabalho.

O trabalho não era tão ruim. Jimmy gritava bastante, mas nunca era algo pessoal. Kasey
conseguiu alugar seu quarto no Hotel Melhor Opção com pagamento semanal. Tirava vantagem da
lavanderia, do chuveiro e da TV à cabo e sua única grande refeição diária na cafeteria ajudava
bastante para mantê-la alimentada. Além disso, Jimmy cozinhava bem. Disse que ela era magricela
demais e seus pratos especiais de bolo de carne e peru ao molho estavam começando a colocar um
pouco de carne em seus ossos. O trabalho era fisicamente cansativo, mas dependia tão pouco do
cérebro que ela podia sonhar acordada com o que quer que quisesse.
Seu único problema no trabalho era que Brenda, a garçonete que havia conhecido na
primeira vez que entrou no lugar, parecia não gostar muito dela.
— Esse é mesmo o seu nome? Kasey? — Brenda lhe perguntou um dia, enquanto Kasey
limpava uma mesa.
— É sim. — Ela não ergueu o olhar, só continuou colocando os pratos na bandeja.
— Eu tava me perguntando sobre isso porque você não deu nem o seu sobrenome pro
Jimmy. Ele pode não ter bom senso, mas eu tenho.
— Isso é um fato? — disse Kasey, colocando uma série de talheres na bandeja em meio a
um tinido.
— Você me parece estranha — disse Brenda, olhando para ela com os olhos semicerrados.
— Como se estivesse escondendo alguma coisa.
— Todo mundo esconde alguma coisa — disse Kasey com leveza, erguendo a bandeja
pesada. — Nem que seja só a calcinha velha e esburacada que veste embaixo das roupas.
Ela levou a bandeja cheia de volta para a cozinha. Não tinha como Brenda descobrir sobre o
passado de Kasey como ladra. Ela felizmente não tinha antecedentes criminais, já que nunca tinha
sido pega. Ainda assim, Brenda fazia com que Kasey sentisse que estava sendo vigiada e essa era
uma sensação da qual Kasey não gostava.
Uma tarde, quando Kasey estava limpando as mesas, ela viu duas notas de cinco dólares que
foram deixadas embaixo do saleiro e do pimenteiro.
As duas notas a lembraram da nota de vinte que ela havia surrupiado tão facilmente no
Famoso Frango Frito.
Seus dedos coçaram.
Brenda havia saído para uma pausa de cinco minutos e Kasey tinha certeza de que ela não
tinha visto o dinheiro.
Num rápido movimento, ela pegou uma nota de cinco dólares e deixou a outra onde estava.
Não foi exatamente um roubo, Kasey decidiu. Só estava dividindo a gorjeta meio a meio
entre a pessoa que serviu o cliente e a pessoa que limpou a mesa dele. Além disso, limpar era mais
difícil. Os clientes eram muito bagunceiros. Dividir a gorjeta era perfeitamente justo.
Kasey prometeu a si mesma que não tornaria surrupiar gorjetas um hábito. E ela não o fez —
não de verdade. Só roubava quando Brenda estava de pausa ou não estava olhando e nunca pegava a
gorjeta toda. Se um cliente deixasse três dólares, Kasey pegava um. Se deixasse sete, Kasey pegava
dois. Não era muito, mas ajudava com as pequenas coisas — colocar uma cesta de roupa para lavar
na lavanderia do hotel, comprar salgadinhos e refrigerante para poder beliscar enquanto estivesse
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assistindo TV. Além disso, Brenda sempre era má com ela. Pegar um pouco da sua gorjeta era como
receber um adicional por insalubridade.

Naquele dia, Kasey estava particularmente com fome quando foi para o trabalho. Ignorou as
folhas de outono que espiralaram perto dela e deixou os óculos no bolso de sua jaqueta. Se forçou a
não pensar em Ballora, mas, em vez disso, pensar na comida. Normalmente, pegava sua refeição
gratuita do turno na hora do almoço, mas pensou que hoje, seria melhor pedir um café da manhã. O
Café da Manhã Especial Royal, decidiu. Três panquecas de leite com manteiga, dois ovos para
acompanhar, bacon e batatas fritas caseiras. Estava indo mais cedo naquela manhã, para que tivesse
tempo para comer antes que os primeiros clientes chegassem.
Quando entrou no restaurante, Jimmy e Brenda estavam sentados juntos numa das mesas,
como se estivessem esperando por ela. Eles não pareciam felizes.
— Kasey, que bom que você chegou cedo hoje — disse Jimmy, gesticulando para que ela se
sentasse de frente para eles. — Precisamos conversar.
Pela experiência de Kasey, toda vez que alguém dizia “precisamos conversar”, as palavras
que vinham depois não eram boas. Ninguém nunca dizia “precisamos conversar. O que você acha
de um aumento e de um prato cheio de biscoitos quentinhos?”.
Sentindo como se alguma coisa dentro de si estivesse afundando, Kasey se sentou à mesa.
Jimmy juntou as mãos diante de si.
— A Brenda me disse que, desde que você começou a trabalhar aqui, ela tem recebido muito
menos dinheiro de gorjeta. Você sabe alguma coisa a respeito disso?
A fome no estômago de Kasey foi substituída por medo.
— Como é que eu vou saber quanto que a Brenda ganha de gorjeta? — perguntou.
— Bom — disse Jimmy. — Os clientes deixam as gorjetas na mesa e às vezes o dinheiro
ainda está na mesa quando você limpa, então...
— Eu sei que você tem roubado as minhas gorjetas da mesa! — Brenda interrompeu. Seu
rosto estava vermelho de raiva. — Não todo o dinheiro, mas o suficiente pra você achar que eu não
ia notar. Mas eu notei! Eu conheço os meus clientes de sempre. Sei o que pedem e sei quanto dão de
gorjeta.
Kasey se lembrou da primeira regra do Covil dos Ladrões: Se estiver sob suspeita ou for
pego, negue, negue, negue.
— Olha, Branda, eu sei que você não gostou de mim desde a primeira vez que eu entrei por
aquela porta. E tá tudo bem. Você não tem que gostar de mim. Mas também não quer dizer que
você tem o direito de me acusar de coisas das quais eu não faço ideia.
— Viu só? — Brenda cutucou Jimmy com o cotovelo. — Toda suspeita, que nem eu disse.
Não vai demitir ela?
Jimmy fechou os olhos e massageou as têmporas como se tivesse a pior dor de cabeça do
mundo. Ele ficou quieto por tanto tempo que Kasey finalmente quebrou o silêncio e disse:
— Você vai me demitir?
Jimmy abriu os olhos.
— Não vou te demitir. Vou te vigiar. Se o que a Brenda está dizendo for mesmo verdade,
pare agora, ou vai ser demitida. Agora volte ao trabalho.
— Sim, senhor.
— “Pare agora”? — disse Brenda. — É só isso?
— Como eu disse, vou vigiar ela — disse Jimmy, e então olhou para a porta. — Lá vem o
pessoal do primeiro horário. É melhor você também voltar ao trabalho.

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No caminho para casa, Kasey passou por uma área gramada onde as folhas do outono se
ergueram e rodopiaram num círculo. Tá bom, ela disse a si mesma e então colocou os óculos. Lá
estava Ballora, rodopiando mais perto que nunca. Claramente, não havia como escapar dela.
A tontura tomou conta de Kasey.
— Por quê? — gritou. — Por que você fica me seguindo? — Várias pessoas se viraram para
olhar para ela, como se fosse louca. Será que estava louca? Já nem sabia mais.
Naquela noite, Kasey sonhou que estava sentada num banco de veludo vermelho em um
lindo teatro com um teto dourado abobadado. Fora Kasey, o teatro estava completamente vazio. As
luzes se apagaram, lançando a sala em meio à escuridão e uma música orquestrada começou a tocar.
As luzes se acenderam no palco se acenderam e Ballora começou a dançar na ponta do pé.
Estava dançando do lado esquerdo do palco e uma enorme faixa de cetim roxa e dourada se
desenrolou do teto. Tinha a palavra “MENTIROSA” estampada com letras extravagantes. Ballora
pôs as mãos nas bochechas, como se assustada, e então levantou os braços para dar uma grande
pirueta. Ela dançou para o lado direito do palco, onde outra faixa roxa e dourada de desenrolou.
Essa tinha estampada a palavra “LADRA”. Ballora pôs as mãos nas bochechas novamente e então
foi dançando até o meio do palco, onde girou e olhou diretamente para Kasey. Apontou para ela e
uma última faixa se abriu no meio do palco. Esta dizia “VOCÊ”.
Kasey acordou ofegante, suando frio. Ela se levantou, colocou umas roupas no corpo, abriu
as gavetas do armário com tudo e enfiou o resto de suas roupas na mochila, junto com a lata de café
com o dinheiro que tinha guardado trabalhando no Royal Café. Não podia voltar para lá. Estavam
de olho nela. Jogou algumas notas na mesa de cabeceira para pagar pelo resto do aluguel e então
saiu em direção à estação de ônibus.
O ar fresco a acalmou um pouco. Ela enfiou as mãos nos bolsos. Lá estavam os óculos.
Decidiu dar uma última olhada. Dessa vez, ia mesmo deixar Ballora para trás. Com a mão trêmula,
ela os pegou e colocou no rosto.
Ballora estava dançando a pouquíssimos metros de distância dela. Kasey podia ver cada
articulação, cada pequena falha na pintura. Se andasse vinte passos, as duas estariam perto o
suficiente para se tocarem. Kasey estremeceu e tirou os óculos.
Tá bom, já entendi, pensou. Eu não recomecei de verdade. Eu roubei e menti sobre isso.
Mas se eu puder fugir, — fugir dela, — eu vou mesmo recomeçar. Vou ser uma cidadã modelo.
O próximo ônibus saindo da cidade ia para Nashville. Nashville, pensou Kasey. Por que
não? Uma nova cidade, um novo emprego, um novo começo. De verdade dessa vez. Quando se
sentou no ônibus, Kasey afundou em meio a um sono sem sonhos.

O Hotel Cidade da Música, onde Kasey alugou um quarto, tinha o mesmo revestimento
barato e carpete manchado do hotel em Memphis, mas custava cinco dólares a mais por noite.
Deitada no colchão irregular, vendo as vagas de emprego no jornal, Kasey disse a si mesma que
precisava fazer uma vida de verdade. Precisava viver em vez de só sobreviver. Precisava de um
emprego que pudesse lhe dar algum tipo de futuro. Precisava fazer amigos, guardar um pouco de
dinheiro e arranjar aquele apartamentinho que sonhava quando criança. Talvez pudesse voltar a
estudar à noite e conseguir o seu diploma. E podia pegar um cachorro. Ainda queria um cachorro.
Enquanto passava os olhos pelos anúncios, um lhe chamou a atenção:

NÃO PRECISA DE EXPERIÊNCIA


OPORTUNIDADE DE CRESCIMENTO
Atender ligações para uma grande empresa de varejo
Necessário ter boa comunicação
Ser capaz de trabalhar em um ambiente agitado e acelerado
Salário inicial de $12/hora, com aumentos com base em mérito
Entrevistas de segunda à sexta, das 9h às 14h
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Parecia melhor que lavar pratos. Mas Kasey não tinha nada para vestir para uma entrevista
de emprego. Ela se lembrou de uma aula de comunicação de negócios que teve no ensino médio. O
livro tinha um capítulo inteiro que falava sobre como se vestir e se apresentar para uma entrevista
de emprego. Calças jeans desbotadas e rasgadas e botas remendadas com fita certamente não
estavam na lista de trajes aceitáveis.
Kasey pegou a lata de café de onde a havia escondido na gaveta do armário. Jogou todo o
seu dinheiro na cama e contou. US$ 229,76. Quando separou o que precisaria para pagar o quarto e
algumas poucas compras, lhe restaram US$ 44,76. Ela com certeza conseguia comprar alguma coisa
para vestir com isso.
Ela saiu a pé em busca de uma loja. Imaginou as lojas de roubas boas não ficariam daquele
lado da cidade, com hotéis baratos, lojas de penhores e agências de empréstimo. Ela não queria
gastar seu dinheiro já escasso num ônibus para ir até o shopping. Além disso, não conseguiria pagar
por nada em uma dessas lojas mais bacanas de toda forma.
Após uma hora andando, seus pés doendo em suas botas surradas, ela encontrou uma loja
chamada Moda Única. Na janela, manequins brancos, carecas e sem rostos posavam com vestidos
coloridos. Imaginou que uma loja naquele bairro certamente não seria muito careira.
Kasey abriu a porta avançou um pequeno passo quando um sino tocou. Ela passou por um
espelho que ocupava toda a altura da parede e se viu da forma como outras pessoas deviam vê-la:
suas roupas velhas, folgadas e com um péssimo caimento, seu rosto cansado, parecendo muito mais
velho que sua idade de fato. Aquela loja com certeza não parecia um lugar para ela, com suas luzes
brilhantes e prateleiras organizadas, cheias de vestidos, blusas e saias. Talvez devesse ir embora.
— Me avise se eu puder ajudar com alguma coisa, querida — disse a mulher atrás do balcão.
Tinha mais ou menos a idade da mãe de Kasey e usava um vestido amarelo-canário, um cachecol
colorido e uma maquiagem perfeitamente aplicada no rosto.
Kasey se perguntou se algum dia pareceria tão estruturada.
— Obrigada — disse.
Kasey deu uma olhada pelas prateleiras de roupas, sem saber o que seria o melhor para uma
entrevista de emprego, sem saber sequer qual tamanho de roupa usava. Finalmente, encontrou um
vestido carmesim com flores cor de creme estampadas. Se lembrava de uma vez na escola quando
um garoto bonitinho lhe disse que vermelho era a sua cor. Sabia que ia fica bem nela.
A vendedora que estava no caixa apareceu ao lado dela, como se num passe de mágica.
— Quer experimentar esse, querida?
Kasey assentiu.
— O problema é que eu não uso um vestido comprido há tanto tempo que não sei nem que
tamanho eu visto.
A mulher a olhou de cima a baixo.
— Bom, você é bem piquitucha. Eu tentaria um quarenta. — Ela sorriu. — Faz tempo que
eu não uso quarenta, uns três filhos atrás! Aposto que você não tem crianças, não é verdade?
— Não, senhora, ainda não. — Kasey pegou o vestido e tentou imaginar um futuro com um
emprego estável, um lugar confortável para morar, talvez até um marido e filhos. Será que uma vida
assim seria possível para alguém como ela? Era difícil sequer imaginar como seria.
— Os provadores ficam ali — disse a vendedora, apontando para um canto da loja. — Só
dar um grito se precisar de alguma coisa.
— Obrigada.
Kasey se trancou em uma das cabines apertadas e tirou suas botas, a jaqueta, as calças e a
camiseta. Colocou o vestido por cima da cabeça e se olhou no espelho. A vendedora estava certa.
Kasey vestia quarenta. O vestido coube perfeitamente — nem muito frouxo, nem muito apertado —
e a estampa carmesim e a cor de creme realçavam seu tom de pele. Estava com uma aparência
respeitável. Como uma pessoa normal indo para uma entrevista de emprego normal.
Mas ela tinha esquecido uma coisa. Parada na frente do espelho, Kasey olhou para os seus
pés descalços, o que certamente não seria aceitável num emprego. Acontece que usar botas surradas

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e remendadas com fita junto com seu vestido novo e bonito também não seria. Tinha esquecido que
precisava de sapatos e sapatos eram caros.
Sentindo-se desencorajada, ela tirou o vestido e colocou de volta seus trapos velhos. Saiu do
provador carregando o vestido consigo. Havia uma pequena seção de sapatos nos fundos da loja.
Imaginou que podia ao menos dar uma olhada para ver quanto custava um par. Tinha umas opções
até que decentes do seu tamanho, beges e sem salto, que saíam na promoção por US$ 21,97, mas ela
não conseguiria pagar pelos sapatos e também pelo vestido, mesmo com desconto no preço.
Desesperada e em pânico, Kasey desviou o olhar pela loja. Não havia nenhuma câmera de
segurança à vista e a vendedora estava ocupada ajudando outra cliente, uma senhora idosa provando
um blazer cor-de-rosa.
Seria a última vez, Kasey prometeu a si mesma. Só estava fazendo isso para que pudesse ir à
entrevista de emprego. Ela enrolou o vestido até ficar do menor tamanho possível e o enfiou em sua
mochila. Ela respirou fundo, pegou a caixa de sapatos e foi para o caixa. Quando a vendedora foi
falar com ela, disse:
— Decidiu não levar o vestido?
— Só isso hoje — disse Kasey, entregando para a vendedora uma nota de vinte e uma de
dez. Pelo menos estava pagando pelos sapatos e não os roubando também, pensou Kasey. Além do
mais, seria difícil encaixá-los na mochila.
A vendedora deu o troco de Kasey, colocou a caixa de sapatos em uma sacola e a entregou
para ela com um sorriso no rosto.
— Obrigada, querida. Espero que volte de novo em breve.
Quando Kasey chegou à porta da frente, um terrível som retumbante tomou conta da loja. O
estômago de Kasey deu um nó de medo. O vestido devia ter algum tipo de dispositivo antifurto que
ativara o alarme. Pega. Ela nunca tinha sido pega antes.
— Espere só um segundo, querida — disse a vendedora. — Acho que não devo ter passado
os sapatos direito.
Kasey estava prestes a sair correndo, mas, logo em frente à porta da loja, centenas de folhas
começaram a espiralar furiosamente, como se um minitornado tivesse se formado. Kasey não
precisava colocar os óculos para saber que Ballora estava bem no meio da tempestade. Seu coração
martelou dentro do peito.
Kasey sabia que se saísse correndo, daria de cara com Ballora.
Estava encurralada. De um jeito ou de outro, tinha sido pega. Se ficasse na loja, pelo menos
tinha uma ideia de quais seriam as consequências que teria que enfrentar. Mas caso se entregasse a
Ballora, não tinha noção do que aconteceria. Ficou imaginando as unhas compridas e afiadas de
Ballora. Seus dentes.
O alarme apitando fazia seus ouvidos doerem, o que tornava impossível pensar com clareza.
— Algum problema, Helen? — disse uma outra mulher muito bem-vestida, provavelmente a
gerente, emergindo dos fundos da loja.
Em segundos, a gerente e a vendedora estavam ao lado de Kasey.
— Deixe-me dar uma olhadinha rápida na sua sacola — disse a vendedora.
Kasey a entregou para a mulher, esperando que não notassem o quanto ela estava tremendo.
A vendedora mostrou a nota para a gerente.
— Viu? Ela pagou pela compra.
A gerente olhava para Kasey como se pudesse ver cada delito que ela já tivesse cometido.
— Acho que é melhor darmos uma olhada também na mochila. — Ela se virou para Kasey.
— Senhorita, precisamos que abra a sua mochila e nos deixe ver dentro. Se estiver tudo certo, estará
livre para ir com nossas sinceras desculpas pelo inconveniente.
Kasey olhou para o lado de fora. As folhas estavam espiralando mais perto e com ainda mais
força, batendo no vidro da porta.
Ela engoliu em seco. Não havia escolha. Kasey abriu a mochila. O vestido carmesim enfiado
lá dentro tinha uma cor vibrante como sangue.
— É o vestido que ela provou! — disse a vendedora. Falava como se o roubo de Kasey fosse
uma traição pessoal.
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A gerente agarrou Kasey pelo braço.
— Bom, então é isso — disse. — Não vejo outra escolha senão chamar a polícia.
Kasey olhou para as folhas espiralando lá fora e então de volta para os rostos severos das
mulheres. Seus olhos se encheram de lágrimas, o que era estranho, porque Kasey não conseguia se
lembrar de qual tinha sido a última vez que chorara. Mas agora estava chorando por todas as coisas
que tinha perdido, por todas as coisas ruins que tinha feito e por todas as coisas boas que nunca
chegou a fazer.
— Por favor — disse Kasey aos soluços. — Não chama a polícia. Eu... eu preciso do vestido
e dos sapatos para uma entrevista de emprego, mas não tinha dinheiro o suficiente para os dois.
— Então achou que roubar o vestido era uma boa solução para esse problema? — A gerente
ainda estava segurando o braço de Kasey.
— Eu sabia que não era uma boa solução — disse Kasey, em meio às lágrimas. — Foi só a
única solução que consegui pensar. Eu sinto muito. — De onde vinham todas aquelas lágrimas? Ela
parecia uma cachoeira humana.
— Eu tenho uma solução. — Veio uma voz de trás delas. Era aquela senhora idosa que a
vendedora estava ajudando mais cedo. Seu cabelo era muito bem-arrumado e ela estava usando um
terninho cor de creme bastante elegante. — Eu vou comprar o vestido para a jovenzinha.
— Mas Sra. Templeton, não podemos deixar que faça isso — disse a gerente.
— É claro que podem — disse a Sra. Templeton. — Eu gasto muito dinheiro nessa loja. Sou
uma boa cliente e o cliente sempre tem razão. — Ela abriu um sorriso para a gerente e a vendedora.
— Não é verdade?
— É verdade — disse a gerente, mas soou relutante.
— Bom. — A Sra. Templeton abriu a bolsa e tirou sua carteira de dentro. — Agora não tem
porque chamar a polícia e essa jovenzinha pode ir para a entrevista de emprego.
— E se não houver entrevista nenhuma? — disse a gerente. — E se ela estiver mentindo?
A Sra. Templeton olhou Kasey de cima a baixo.
— Bom, é um risco que estou disposta a assumir. Mas acho que ela está dizendo a verdade.
Tem um rosto honesto. Só estava em uma situação de desespero e não tomou a melhor decisão.
— Obrigada — disse Kasey, ainda entre lágrimas. — Eu vou pagar de volta para a senhora
quando puder.
— Besteira. — A Sra. Templeton prontamente recusou a oferta de Kasey. — Temos que
ajudar as pessoas quando elas precisam.
Kasey saiu da loja em meio às folhas espiralando.
Enquanto descia pela rua, ainda estava chorando e atraindo olhares preocupados dos
transeuntes. Não sabia como explicar, mas sentia que estava mudando, como se alguma coisa dura
dentro dele estivesse amolecendo e se quebrando.
Ela parou no parque para descansar por alguns minutos. Estava cansada de tanto andar, de
todo o estresse e medo. Se sentou num banco e levou a mão ao bolso para pegar os óculos antes
mesmo de perceber o que estava fazendo. Teria ela despistado Ballora depois que a mulher na loja
consertou as coisas?
Não. Ela estava bem ali.
Ballora estava bem na sua frente, girando, a pouco mais que um braço de distância. Ela
pareceu olhar para Kasey com seus olhos azuis vazios e então girou, girou e girou, criando uma
brisa que Kasey pôde sentir no rosto. Estava perto o suficiente para que pudesse tocá-la.
— Por quê? — gritou Kasey. — Por que não consigo me livrar de você? — Ela enfiou os
óculos no bolso e correu. Correu de Ballora, mesmo sabendo em seu coração que Ballora estava
bem ali com ela. Ela correu até o Hotel Cidade da Música e trancou a porta atrás de si, ofegante.
As palavras da senhora na estação de ônibus subitamente lhe voltaram à cabeça: “Às vezes,
se você tenta fugir dos seus problemas, esses problemas só acabam te seguindo”.
De repente, um arranhão. O som estava vindo da janela. Kasey abriu a cortina e não viu
nada. Então colocou os óculos.
Ballora estava encostada na janela. Seu rosto, bonito de longe, era aterrorizante de perto,
dividido no meio, com uma boca vermelha aberta e olhos brilhantes, olhos que Kasey achava que
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podiam ver dentro de sua alma. As longas unhas pintadas de azul de Ballora arranharam o vidro em
meio a um terrível ruído metálico. Kasey se afastou da janela.
— Tá bom, Ballora — disse Kasey. — Por favor. Só me deixa ir nessa entrevista de
emprego primeiro. Depois eu sei o que tenho que fazer.
Ballora não disse nada, só a fitou com seus olhos azuis brilhantes.
Kasey se sentou na cama e revirou sua mochila até achar o que estava procurando: a carteira
de motorista da mulher cuja bolsa havia roubado na frente do Circus Baby’s Pizza World.

Sarah Avery. Esse era o nome na carteira de motorista. E aquele, na frente do qual Kasey
estava parada com seu novo vestido carmesim e sapatos beges sem salto, era o endereço de Sarah
Avery. Era um sobrado suburbano, não muito chique, mas muito melhor que qualquer lugar onde
Kasey já tivesse morado antes.
Não tinha sido fácil chegar ali sem comprar uma passagem de ônibus, mas Kasey finalmente
encontrou um caminhoneiro que fazia frete de longas distâncias indo para aqueles lados e que
estava disposto a lhe dar uma carona. Kasey tinha chegado a colocar os óculos uma vez durante a
viagem e viu o rosto de Ballora encostado na janela do passageiro, ainda a observando.
Kasey continuou parada na calçada na frente da casa por mais alguns momentos, juntando a
coragem para ir até lá e tocar a campainha. Enquanto isso, as folhas do outono espiralavam à sua
volta. Ela não colocou os óculos, mas sentia Ballora a seu lado, dividindo com ela o espaço no olho
do pequeno tornado. Ballora estava perto o suficiente para tocá-la, esperando que Kasey perdesse a
cabeça.
Kasey respirou fundo, caminhou até a porta e tocou a campainha. As folhas passaram por ela
em meio a um sopro que fez um grande whoosh, e Kasey sentiu uma súbita e estranha sensação de
calma e paz.
Uma pequena mulher de cabelos castanhos abriu a porta. Estava usando calças de corrida e a
camiseta de uma maratona de 5km para juntar fundos para a caridade.
— Olá? — disse ela, parecendo um pouco confusa.
— Oi. — A voz de Kasey soou trêmula. — Você não me conhece e isso é bem
constrangedor. Hã... você se lembra daquela vez alguns meses atrás quando a sua bolsa foi roubada
na frente do Circus Baby’s Pizza World?
— Claro. Foi terrível. Ninguém se esquece de algo assim. — Ela franziu o cenho e olhou
para Kasey. — Você é... da polícia?
Ela estava tão enganada que Kasey não conseguiu segurar um sorriso.
— Não, na verdade sou a ladra que levou a sua bolsa. Ex-ladra, digo.
A mulher ficou boquiaberta.
— Você? Mas você parece tão simpática... Por que veio aqui?
— Vim aqui porque queria te dar isso. — Ela tirou a carteira de Sarah de sua mochila. —
Tenho certeza de que já tem uma carteira de motorista nova a essa altura, mas a sua antiga está
dentro. Tem vinte dólares aí também, minha primeira parcela para pagar por tudo que eu tirei de
você. Eu tenho um emprego agora. Vou começar na segunda. Te mando mais dinheiro depois do
meu primeiro pagamento.
Sarah pegou a carteira.
— Isso é incrível. O que a fez decidir fazer isso?
Kasey pensou em Ballora girando sem parar.
— Acho que alguém finalmente me assustou até que eu resolvesse fazer a coisa certa. Eu
mudei. Quer dizer, ainda estou mudando. E queria dizer que sinto muito e perguntar se você pode
me perdoar.
— É claro que posso — disse Sarah. — Poucas pessoas admitem que fizeram algo errado. É
reconfortante receber um pedido de desculpas tão sincero. Por sinal, eu acabei de fazer um chá.
Não gostaria de entrar para tomar uma xícara comigo?
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— Eu? — disse Kasey, como se houvesse outra pessoa ali com quem Sarah podia estar
falando. — Não tem medo de que eu roube a sua casa ou coisa do tipo?
— Na verdade, não. Entre.
Sarah segurou a porta aberta e Kasey então entrou na casa brilhante e iluminada. Um grande
cachorro caramelo a recebeu, balançando o rabo.
Na cozinha, a garotinha que Kasey se lembrava daquela noite estava sentada na mesa
pintando um desenho com giz de cera. Ela olhou primeiro para Kasey e depois para sua mãe.
— Mamãe, a gente conhece essa moça? — perguntou.
— Não, querida, mas vamos conhecê-la — disse Sarah, colocando água quente nas canecas
para o chá.
Kasey sorriu. De certa forma, sentia que também estava só começando a se conhecer.
— Meu nome é Kasey — ela disse para a garotinha.
— Meu nome é Isabella — respondeu ela. Seus olhos eram grandes e azuis, mas eram
alegres e vibrantes, não vazios como os de Ballora.
— Isabella, acho que eu tenho algo que pertence a você — disse Kasey.
Isabella pulou da cadeira.
— O que é?
Kasey levou a mão à mochila, tirou os óculos de papelão e os entregou a Isabella.
Os grandes olhos azuis de Isabella ficaram ainda maiores.
— Meus óculos da Ballora! São os meus óculos da Ballora que furam roubados, mamãe!
Sarah colocou duas canecas de chá e um copo de suco na mesa.
— “Foram” roubados, não “furam”. Mas é verdade. Agradeça a Kasey por devolvê-los.
— Obrigada por devolver os meus óculos, Kasey — disse Isabella, sorrindo para ela.
Kasey também lhe abriu um sorriso.
— De nada. — Kasey sabia que não precisava mais deles. Além disso, eles sempre foram
mesmo de Isabella.
Isabella colocou os óculos e, surpresa, perdeu o fôlego.
— Olha ela! — disse Isabella.
A garotinha ficou parada por um momento, os óculos no rosto, sua boca escancarada de
admiração. E então, começou a dançar.

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S
usie ouvia o som do cascalho crepitando sob as rodas da velha minivan da família enquanto
sua mãe manobrava para passar por Oliver, o grande carvalho que frente da casa. Foi Susie
quem havia dado o nome de Oliver. Sua irmã, Samantha, achava que dar nome para uma
árvore era estúpido. Seus pais disseram que não era uma coisa que normalmente se fazia,
mas isso não significava que ela não podia. Então ela o fez.
Oliver era bem, bem grande. O pai de Susie dizia que Oliver era mais velho que a casa, e
isso era muito tempo. A tatara-tatara-tataravó de Susie havia nascido nessa casa já fazia mais de 150
anos, e Oliver já estava lá.
— Assim que descarregarmos as compras, — disse a mãe de Susie — eu vou fazer o jantar.
— Ela falava devagar, com umas pausas estranhas entre as palavras. Susie achava que era como se
alguém estivesse tentando impedi-la de falar, por mais que sua mãe estivesse dando tudo de si para
falar mesmo assim.
Susie pensava nas vozes como cores. A de sua mãe costumava ser laranja claro. Agora era
um marrom desbotado. E tem sido essa nova cor há muito tempo. Susie sentia falta da cor antiga.
— Que tal espaguete? — A mãe de Susie perguntou no mesmo tom de voz perturbador.
Susie não respondeu à pergunta porque não se importava com o jantar, e sabia que Samantha
sim. Ela se importava com tudo — gostava de ser a chefe.
— Acho que podia ser macarrão de parafuso — disse Samantha.
Susie sorriu. Viu só?
A voz de Samantha também tinha mudado de cor. Ela nunca foi muito forte — costumava
ser um azul pálido, mas agora estava cinza.
Susie se virou e pressionou o nariz contra a janela da minivan para que pudesse ver Oliver
mais claramente. Ela franziu o cenho. Oliver parecia triste, mais que o normal para essa época do
ano. Espalhadas ao redor de seu tronco grosso e rugoso, folhas amarelas e vermelhas esvoaçavam
sobre suas raízes expostas com a brisa do entardecer. Mais de metade dos galhos de Oliver estavam
secos, incluindo o galho grosso que sustentava o balanço de pneu de Susie. Os outros galhos tinham
folhas de mesma cor das que estavam no chão.
Oliver sempre perdia suas folhas no outono. Três anos antes, quando Susie tinha quatro anos
e Samantha três, Susie ficou muito triste com as folhas caindo do carvalho. Disse para sua mãe que
a árvore estava chorando. E se ela estava chorando, estava se sentindo mal, e se estava sentindo,
precisava de um nome. Foi quando lhe deu o nome de Oliver. Samantha, mesmo sendo um ano mais
nova, disse que dar nome a uma árvore era “frívolo”. Frívolo era uma palavra que tinha aprendido
de Jeanie, a madrinha delas. Samantha gostava de aprender palavras. Gostava de aprender, ponto.
Não gostava de coisas frívolas do jeito que Susie gostava.
A mãe de Susie explicou que Oliver não estava chorando quando perdia as folhas. Estava se
preparando para o inverno. Precisava se desfazer de suas folhas para manter seu tronco alimentado
pelos meses mais frios. E depois que passassem, novas folhas cresceriam. “Ele precisa se desfazer
delas antes que possam crescer de novo”, ela disse. “Todos nós temos que fazer isso às vezes”.
Susie meio que entendeu o que ela queria dizer, mas ainda achava que Oliver estava triste. A
única coisa que a deixava bem com relação às folhas caídas eram suas belas cores. Normalmente, as
folhas que caíam de Oliver eram de um amarelo dourado e um vermelho forte.
Enquanto a mãe de Susie estacionava a minivan do lado da casa, Susie se virou para olhar de
volta para Oliver. Suas folhas pareciam diferentes esse ano. Mais pálidas e secas.
Susie imaginou se isso não tinha algo a ver com os duendes que moravam no tronco. Ela riu.
Sabia que Oliver não tinha duendes no tronco — só estava sendo boba. Mas uma vez ela disse para
Samantha que ele tinha, só para perturbá-la.
Assim que a minivan parou junto às escadas à esquerda da varanda, Samantha soltou o cinto
de segurança e abriu a porta com um empurrão. Samantha sempre estava com pressa.
A mãe de Susie não se mexeu, mesmo depois de desligar o motor. Ela vinha fazendo muito
isso, Susie notou. Sua mãe ficava meio que travada, como um brinquedo de corda que não tinha
recebido corda o suficiente. Ela simplesmente parava enquanto estava fazendo alguma coisa e aí
ficava encarando o nada. Isso assustava Susie, porque ela não tinha certeza se sua mãe ainda estava

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lá. Parecia que sim, mas era como se tivesse deixado seu corpo para trás, como um marca-página
delimitando seu lugar enquanto seus pensamentos levavam o resto dela para algum outro canto.
O motor do carro engasgou um pouco antes de se silenciar. Susie sentiu o cheiro das cebolas
em uma das sacolas nos fundos da minivan. Sentiu outro cheiro também. Não, não o cheiro. Não foi
o seu olfato que a avisou que algo estava no ar. Era... o quê? Seus outros sentidos? Que sentidos?
Jeanie uma vez tinha dito a Susie que ela era especial, que Susie tinha uma habilidade que
muitos outros não tinham. Ela era “conectada”, Jeanie disse. Susie não fazia ideia do que isso queria
dizer, mas gostava como soava. Jeanie disse que esse era o motivo pelo qual Susie sentia coisas que
outras pessoas não sentiam. Agora, Susie sentia que alguma coisa estava errada. Essa alguma coisa
era como um cheiro, como o cheiro de algo... podre? Estragado? Susie não tinha certeza.
Susie quis dizer algo para fazer sua mãe se mexer de novo, mas então notou Samantha de pé
do lado da minivan, olhando pela janela de Susie. Samantha estava com aquele olhar no rosto, o
olhar que vinha fazendo bastante ultimamente. Susie não entendia aquele olhar. Era parte irritado,
parte triste, e parte assustado.
A mãe de Susie finalmente se mexeu. Suspirando, ela balançou a cabeça e tirou as chaves do
carro. Pegou sua bolsa e abriu a porta.
— Temos que levar essas compras para dentro. Pode chover.
Susie olhou pelo retrovisor para as nuvens cinzas sobre o telhado verde da velha casa. As
nuvens estavam carregadas e escuras.

A grande casa tinha bastante espaço, então Susie e Samantha tinham cada uma o seu próprio
quarto. Susie, no entanto, gostava de ficar no quarto de Samantha. Achava que Samantha preferia
que não fizesse isso, mas por mais mandona que fosse, Samantha não era má. Ela e Susie gostavam
de ver as pessoas felizes. Então, como Susie gostar de brincar no quarto de Samantha, ela deixava.
Por outro lado, Samantha não era tão boa em compartilhar coisas. Como brinquedos. Estava
sempre insistindo que ela e Susie brincassem com seus próprios brinquedos.
Susie sempre desejava que ela e Samantha pudessem fazer coisas juntas, não só perto uma
da outra. Quando Susie ganhou seu kit de cozinha no Natal alguns anos antes, aquele com todo tipo
de comidas de plástico divertidas, todos aqueles potes e panelas e o avental rosa choque, ela queria
brincar de restaurante com Samantha. Mas Samantha não quis. Em vez disso, ela insistiu em brincar
com seu próprio kit de construção. Mesmo que ambas estivessem brincando de boneca, Samantha
queria manter as bonecas separadas.
Como agora.
Susie se sentou no grande tapete azul no chão junto à grande cama de Samantha. O tapete
combinava com as cortinas texturizadas na janela que dava vista para Oliver. Susie olhou para ele.
Parecia ter soltado mais algumas folhas. As que restavam estavam fragilmente penduradas sob a luz
silenciosa e acinzentada do crepúsculo.
Na frente dela, as bonecas de Susie estavam sentadas em blocos formando um semicírculo.
Era um coral e ela era quem ia dirigi-las, mas antes precisava se assegurar de que estavam todas em
seus lugares. Ela ia mudando as bonecas de lugar, decidindo quem ia cantar cada parte da canção,
cantarolando enquanto o fazia. Ela normalmente não cantava — mas sua mãe sim. Mas Susie não a
ouvia cantar já fazia um bom tempo.
Do lado oposto do tapete, Samantha organizava suas bonecas na frente de blocos. Os blocos
eram “postos de trabalho”, Samantha disse. Susie não sabia se estavam numa escola ou no trabalho.
De toda forma, era bem claro que as bonecas de Samantha não estavam se divertindo tanto quanto
as de Susie. Será que Samantha também sabia disso? Talvez fosse por isso que continuava olhando
para os blocos e bonecas de Susie.
Susie cruzou as pernas e olhou em volta. O quarto de Samantha era tão bem-organizado,
com cestas de lona azul-claras empilhadas impecavelmente em prateleiras brancas, uma grande
escrivaninha branca com um abajur de metal brilhante, a cama grande com uma cabeceira de metal
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e uma fronha xadrez azul e branca perfeitamente rendada, duas mesas de cabeceira organizadas com
seus pequenos abajures azuis e um assento de janela ocupado por uma simples e fina almofada azul.
O quarto de Susie, que ela só podia ver por uma porta anexa, era coberto por cores e caos. Também
tinha um assento de janela, macio, afofado e coberto de veludo roxo. Tinha várias almofadas de flor
empilhadas em cima. Suas prateleiras roxas não tinham cestas. Susie odiava cestas. Gostava de ver
seus brinquedos, livros e bichinhos de pelúcia porque eles a faziam feliz. Todos ficavam a mostra
nas prateleiras, como se estivessem dando uma grande festa.
Samantha olhou para as bonecas de Susie de novo. Pressionou seus lábios tão forte que fez a
pele ao redor da boca enrugar. A expressão a fazia parecer um cão pequinês raivoso. Um daqueles
cães costumava morar na casa ao lado, e na primeira vez que Susie o viu, deu risada porque ele a
lembrava de Samantha.
Susie imaginou se também já tinha parecido um cachorro. Achava que não. Mesmo que ela
e Samantha tivessem cabelos bem semelhantes e praticamente os mesmos olhos, eles não pareciam
os mesmos nas duas meninas. O cabelo castanho-claro de Susie era escorrido nas laterais do rosto,
já o de Samantha era amarrado em um rabo de cavalo. Susie parecia selvagem e levada, Samantha
parecia uma boa menina. Os olhos castanhos de Susie normalmente eram bem abertos, enquanto os
de Samantha eram apertados na maior parte do tempo, então Susie parecia impulsiva e Samantha
cautelosa. Susie tinha um nariz e boca menores, e geralmente era chamada de fofa. Os de Samantha
eram maiores, como os de seu pai, e Susie uma vez ouviu de sua avó que Samantha “ia crescer e se
tornar uma linda mulher”.
Samantha olhou novamente para as bonecas de Susie antes de reorganizar suas bonecas em
seus “postos de trabalho”. Pobrezinhas. Quando Samantha terminasse de brincar com elas, teriam
que voltar para suas cestas.
— As suas bonecas querem entrar pro meu coral? — perguntou Susie.
Samantha não respondeu.
Susie fungou e enrugou o nariz. O ar cheirava a molho de tomate e pão de alho. Também
tinha aquele outro cheiro, o que ela não entendia.
Bom, tudo bem. Ela não precisava que as bonecas de Samantha entrassem no coral. Fazendo
um ajuste final, Susie pegou uma régua e bateu de leve no bloco que tinha posicionado na frente de
duas de suas bonecas. Então começou a balançar a régua de um lado para o outro como tinha visto
maestros fazendo.
Antes que Susie fizesse três gestos, Samantha subitamente se levantou e chutou as bonecas
de Susie de seus blocos. Depois também chutou os blocos. Todos os blocos e bonecas tombaram no
tapete felpudo e foram rolando até o chão de madeira adiante. Susie estremeceu. Agora teria que
montar um hospital com os blocos e tratar suas bonecas.
Samantha encarou Susie antes de sair correndo do quarto. Susie chegou a pensar em gritar
com ela, mas brigar com Samantha nunca dava em nada. Ela aprendeu que era melhor apenas ficar
quieta e deixar tudo como estava.
Mesmo assim...
A mãe de Susie apareceu na porta. Alta e magra com cabelo castanho-escuro, ela parecia ser
uma aspirante a modelo. Susie se lembrava de quando o cabelo de sua mãe costumava ser lustroso e
esvoaçante, de quando seus olhos grandes estavam sempre enfeitados com longos cílios postiços e
sua boca larga estava sempre pintada com um batom vermelho ousado. Agora, sua mãe não usava
maquiagem e parecia cansada. Vestindo um jeans desbotado e uma camiseta azul amarrotada, a mãe
de Susie olhou para os brinquedos no tapete.
Susie se levantou e foi até ela.
— Mãe?
Sua mãe continuou olhando para os brinquedos.
— Você tá bem?
Lágrimas encheram os olhos de sua mãe e Susie sentiu como se alguém estivesse apertando
o seu coração.
— Eu sinto que tem algo errado — ela disse para a mãe. — Alguma coisa ruim aconteceu,
mas eu não sei o que é.
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Susie queria muito que sua mãe lhe dissesse que estava tudo bem, mas ela apenas cobriu a
boca com a mão e deixou as lágrimas caírem dos olhos. Susie sabia que sua mãe não iria responder
agora. Ela não gostava de falar enquanto chorava. Nunca tinha gostado. E as lágrimas já não eram a
resposta de toda forma?
Depois do jantar, sua mãe costumava subir até o terceiro andar para trabalhar. Ela tinha um
grande ateliê lá em cima porque era costureira, fazendo grandes colchas modernas e fronhas que,
por algum motivo, as pessoas nunca usavam nas camas. Os lençóis de sua mãe eram pendurados nas
paredes, o que Susie achava estranho, mas sua mãe gostava de fazê-los e, de acordo com ela, os
lençóis bonitos “pagavam as contas”.
O que era bom, porque seu pai não estava mais lá. Susie não entendia por que ele tinha ido
embora. Mas ele se foi. Será que essa era a coisa ruim?
Susie envolveu os braços nos joelhos. Não. Ela achava que não. Achava que era algo a mais.
Pensou se devia tentar abraçar sua mãe. Provavelmente não. Sua mãe não gostava de ser
abraçada quando chorava.
Susie só ficou ali parada, esperando que sua mãe parasse de chorar para poderem conversar.
Mas sua mãe não parou. Ela só se afastou da porta e foi andando pelo corredor silencioso.

Samantha estava no quintal, andando de um lado para o outro e soprando bolhas. Qualquer
um que a visse acharia que estava se divertindo, mas Susie sabia que Samantha não soprava bolhas
por diversão. Fazia isso para estudar as correntes de ar. E Susie também já sabia o que esperar se
perguntasse se podia soprar bolhas com ela. Samantha diria que não — estragaria sua “pesquisa”.
Mas Susie queria ficar perto da irmã, então foi até Oliver, deu uns tapinhas em seu tronco
áspero e úmido, e se enfiou no balanço de pneu desbotado. Empurrando-se do chão, ela começou a
se balançar e então jogou a cabeça para trás para ver o céu nublado enquanto o balanço girava num
círculo preguiçoso.
O ar da tarde estava frio, mas não tão frio, e tinha aquele cheiro de outono que Susie ouvia
os outros descreverem como fresco. Ela não sabia qual era o cheiro de “fresco”. Achava que o ar do
outono tinha um cheiro duplo — azedo e almiscarado ao mesmo tempo. E claro, o cheiro do outono
em volta da sua casa tinha ainda aquele outro cheiro que ela não gostava.
Susie fechou os olhos e continuou se balançando. Ouvia Samantha andando pelo quintal —
as folhas secas de Oliver quebrando sob seus pés.
E então Susie ouviu vozes. Ela abriu os olhos e se virou para ver a calçada.
Há muito tempo, a casa era um celeiro no meio de muita terra. Mas com o passar dos anos e
todas aquelas tataravós crescendo de menininhas para senhoras de idade, a família teve que vender
parte da terra — foi o que a mãe de Susie disse. Eventualmente, a avó de Susie vendeu o que restou
da terra, para alguém chamado “desenvolvedor”, e o desenvolvedor fez uma grande subdivisão ao
redor da casa. As novas casas foram construídas para se parecerem com o velho celeiro — a mãe de
Susie disse que eram todas Vitorianas. Mas as novas casas não tinham a personalidade da antiga. As
novas eram todas de cores sérias como cinza, bronze e creme. A casa de Susie tinha muitas cores
divertidas. A maior parte era amarela, mas os acabamentos — e tinham muitos deles — eram roxos,
azuis, rosa, cinza, laranja e brancos. Susie os chamava de “pão de mel”, o que não fazia sentido para
Susie porque os acabamentos não eram feitos de doce... embora Susie desejasse que fossem. Susie
sempre achava que que sua casa parecia estar vestida para sair enquanto o resto das casas sempre
vestiam roupas de trabalho.
A calçada na frente das casas era longa e mais grudada na casa deles do que a mãe de Susie
gostaria. Susie não ligava. Ela gostava de ver pessoas passando, principalmente do balanço de pneu.
Um grande muro de arbustos na frente do quintal bloqueava a visão da parte de baixo do tronco de
baixo de Oliver e do balanço de pneu. Susie gostava de ficar lá e brincar de “espiã”, observando as
pessoas pelos arbustos sem que elas percebessem que estava lá.

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Um Passo Mais Perto
O grupo passando por lá agora tinha cinco crianças. Ela tinha quase certeza que eram todas
da turma de Samantha. Três das crianças, todas meninas, estavam de bicicleta. A quarta criança, um
menino alto, estava fazendo manobras com um skate, e o último, um menino menor, estava num
patinete. Ele não parecia saber exatamente como usar.
— Vem logo, Drew! — uma das meninas gritou para o menino pequeno. Ele era loiro, com
o cabelo todo bagunçado.
— É! — disse outra menina. Ambas as meninas tinham os cabelos escuros e vestiam calças
jeans e casacos azuis. — Esse lugar dá medo.
Susie desacelerou o balanço e ouviu as crianças. Medo? Elas também sentiam aquela coisa
que Susie não entendia?
— Ei, professora! — gritou a terceira menina. Essa tinha cabelos ruivos e sua jaqueta de
couro preta aberta mostrava uma blusa cor-de-rosa claro por baixo.
Susie sabia que a “professora” era Samantha. Mesmo que a palavra não tivesse sido dita em
tom de sarcasmo, Susie sabia que era para ser um insulto. Desde que Samantha começou o ensino
fundamental, seus colegas da escola tiravam sarro dela por ser séria demais. Susie odiava que as
crianças fizessem isso, e na primeira vez que aconteceu, ela tentou defender Samantha.
— Qual o problema em ser inteligente? — ela havia gritado para as crianças provocando sua
irmã. — Vocês só têm inveja que ela sabe mais do que vocês!
Susie achou que Samantha ia gostar da ajuda, mas ela ficou triste.
— Não preciso que você cuide de mim — ela disse para Susie. — Eu tenho que aprender a
me virar sozinha.
Susie sabia que Samantha tinha aprendido essa expressão com sua avó, mas não discutiu. E
nunca mais tentou impedir a provocação das crianças. Então não disse nada agora quando uma das
meninas gritou:
— Esquisitona!
— Vem logo, Drew — disse o menino de skate ao menino de patinete.
— Eu odeio passar por essa casa — disse a menina da jaqueta de couro.
— É — concordou uma das outras meninas, arrepiada.
A terceira menina disse:
— Eu costumava brincar com elas quando tava no jardim de infância. Ela era sempre séria.
— A menina apontou para Samantha. — Mas pelo menos ela conversava. Agora é como se... — Ela
deu de ombros. — Sei lá.
As crianças passaram pela casa, mas Susie se virou para observá-las, e continuou escutando:
— Vocês não podem julgar ela — disse o menino menor.
— Anda logo, Drew — disse a menina da jaqueta de couro. — Só vamos embora, tá?

Quando a noite veio, ela caiu sobre a casa como se alguém no céu de repente tivesse jogado
uma coberta preta por cima de tudo. As meninas se prepararam para dormir como sempre, e como
sempre, Samantha não se incomodou quando Susie foi para sua cama. Ela sabia que Susie odiava
dormir sozinha.
Mesmo assim, Samantha sempre dormia de costas para Susie, e sempre dormia o mais longe
dela possível, especialmente agora. Susie dormia virada para a janela. Mesmo que a janela tivesse
uma cortina, ela nunca estava fechada. Sua mãe dizia que a casa deveria ter sempre o máximo de
luz possível — fosse a luz do sol ou da lua. Susie gostava de ficar acordada e olhar como a luz da
lua trazia vida para as coisas no quarto. O brilho sinistro projetava sombras nas cestas de Samantha,
fazendo com que parecessem bocas gigantes tentando engolir a lua. Ela também gostava de olhar
para as estrelas e dar-lhes nomes.
Hoje, as estrelas estavam escondidas e apenas um pequeno filete da luz da lua conseguia
atravessar as nuvens. A única luz que entrava no quarto era das lâmpadas da varanda pelas portas da
frente e dos fundos.
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Um Passo Mais Perto
O quarto estava frio, e ele incomodava mais Samantha do que Susie. Então as duas meninas
se cobriam embaixo de duas cobertas grossas e macias. Susie tirou as cobertas de cima de seu rosto.
— Tá acordada? — Susie perguntou para a irmã. Manteve a voz um sussurro.
Samantha não respondeu. Isso não era incomum. Ela não gostava de falar à noite.
Mas isso não deteve Susie:
— Eu não paro de ter uma sensação ruim, como se tivesse alguma coisa errada — sussurrou
Susie. Ela não esperou uma resposta: — O mundo está com um cheiro esquisito. — disse para a
irmã. Ela torceu a boca, tentando descrever o cheiro: — Me lembra um pouco de quando a gente
deixa sobras numa vasilha por tempo demais e aí a mãe manda a gente limpar tudo e temos que
tampar o nariz e falar desse jeito. — Ela segurou o nariz e falou no tom engraçado que resultou. Ela
riu de si mesma.
Samantha permaneceu em silêncio. Nunca achou as vozes engraçadas que Susie fazia tão
engraçadas assim. Talvez estivesse mesmo dormindo. Susie se manteve parada para que as cobertas
azuis macias de Samantha não fizessem aquele barulho que faziam quando você se mexia na cama.
Ela focou na respiração de Samantha. Era profunda e rítmica.
Susie juntou as pernas com mais força e descansou a cabeça mais fundo no travesseiro.
— E as folhas do Oliver não estão da cor certa. Não estão tão fortes.
Samantha respirou — inalou e exalou.
— E a mãe tá agindo estranho, sabe?
Samantha não respondeu.
Susie suspirou. Ela fechou os olhos e tentou dormir.

Tum.
Os olhos de Susie se abriram.
Ela tinha dormido? Tinha sonhado com o som abafado que ela acabara de ouvir?
Ficou deitada perfeitamente imóvel, ouvindo.
Tum... tum... tum.
Não, ela não tinha sonhado. Alguém... ou alguma coisa... estava andando na varanda. O som
era de um pé grande batendo nas tábuas do piso de madeira.
Susie se sentou, agarrando as colchas e as cobertas brancas e macias de Samantha. Inclinou
a cabeça para escutar melhor. Foi quando ouviu os taps entre os tums.
Tum... tap... tum... tap... tum.
Susie não se mexeu, mas Samantha se sentou de súbito. Ela imediatamente jogou as pernas
para o lado da cama, mas não levantou. Só ficou sentada ali com as costas retas.
— Você também ouviu — sussurrou Susie.
Samantha não respondeu, então Susie decidiu fazer algo ela mesma. Ela se forçou a sair das
cobertas e moveu as pernas para fora da cama. Ignorou o ar frio em seus tornozelos e foi andando
devagar, saindo do quarto e descendo a escada até a cozinha.
Susie parou perto da mesa e olhou para o brilho amarelo pálido que entrava pela janela da
cozinha. Ele irradiava da lâmpada da varanda sobre a porta dos fundos.
O relógio digital em cima do fogão brilhava vermelho na sala escura: 23:50. A geladeira
zumbiu. A torneira pingou. Já estava pingando há um bom tempo, Susie sabia — um pingo a cada
dez segundos. Ela esperou dois pingos enquanto ouvia a sequência contínua de tums-taps do lado de
fora na varanda. Quando o volume dos sons diminuiu o bastante para fazê-la acreditar que seja lá o
que estivesse fazendo o barulho já estava do lado oposto da casa, Susie foi até a porta dos fundos,
respirou fundo, e a abriu.
E então Samantha segurou Susie pelo ombro e bateu a porta com tudo.
Susie se virou para a irmã.
Os olhos de Samantha estavam arregalados. Os lábios comprimidos. E pela primeira vez
desde a hora em que disse boa noite para sua mãe, Samantha falou:
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Um Passo Mais Perto
— Não tem nada lá fora. Volta pra cama.
Ela se virou e marchou para fora da cozinha, deixando bem claro que Susie devia segui-la.

A voz de Jeanie era tão calorosa e forte que, mesmo que falando no telefone, parecia que ela
estava na mesma sala.
— Você é mais que a mãe da Susie, Patrícia — disse.
Patrícia segurava o celular no ouvido com uma mão enquanto usava a outra para escovar os
cabelos fracos. Estava sentada na borda de sua cama king size, a cama que era grande demais para
ela sozinha. Mas que era pequena demais para ela e seu marido. E por isso ele teve que ir embora...
para que parassem de invadir o espaço um do outro. Embora o motivo de precisarem de todo esse
espaço nunca tenha sido claro pra ela.
— E mais que a mãe da Samantha — Jeanie continuou. — Você é você, e vai se encontrar
de novo. Alguma hora.
Patrícia suspirou.
— A Samantha não quer conversar comigo, só quando quer me mandar fazer alguma coisa.
— Ela é toda empoderada. — Jeanie deu uma risada.
Patrícia não sabia se devia rir ou chorar disso. A ideia de sua filha de oito anos agir como
uma mulher feita era engraçada. Mas a ideia de sua filha ser forçada a ser uma mulher em miniatura
não era nada engraçada.
— Vai melhorar — disse Jeanie. — Sempre melhora.
Patrícia assentiu mesmo que Jeanie não pudesse vê-la. Jeanie ia saber que tinha assentido.
Patrícia e Jeanie eram amigas desde que tinham a idade de Samantha. Juntas, elas passaram
pelo ensino fundamental, pelo ensino médio e pela faculdade, ambas tendo cursado artes. Quando
Patrícia se casou com Hayden, Jeanie foi sua dama de honra, e quando Patrícia teve suas meninas,
Jeanie foi sua madrinha. Jeanie era como a irmã que Patrícia nunca teve.
— Eu não sei se estou fazendo isso do jeito certo — disse Patrícia.
— Não existe jeito certo — respondeu Jeanie.
De alguma forma, isso só deixava tudo mais difícil.
— Eu queria que... — Ela parou e ficou imóvel.
O que ela tinha acabado de ouvir? Tinha vindo de dentro ou de fora?
— Você está aí? — perguntou Jeanie.
Patrícia ficou em silêncio, escutando.
— Patrícia?
Patrícia sacudiu a cabeça. Estava imaginando coisas. Ela soltou o ar.
— Estou aqui.

Susie tinha seguido sua irmã de volta até a cama, mas agora estava saindo na surdina. Dessa
vez, parou por um segundo na frente do quarto de sua mãe. Ela provavelmente estava no telefone
com Jeanie. Elas conversavam quase todo dia, pessoalmente ou pelo telefone. Se Jeanie estivesse na
cidade, passaria na casa, mas ela viajava muito por causa do trabalho. Seu trabalho era comprar
peças de arte para outras pessoas. Susie achava que parecia um trabalho bem legal.
Susie passou pelo corredor à espreita, esperando ouvir sua mãe rir. Mas a risada não veio.
Em vez disso, os passos voltaram a ecoar: Tum... tap... tum... tap.
Susie se endireitou e virou em direção ao topo da escada. Descendo devagar, parando a casa
passo, Susie olhou por cima do corrimão de carvalho encerado para a janela de vidro da frente da
casa. Cortinas finas borravam a cerca da varanda e, mais à frente, a silhueta sólida de Oliver — ele
ficava imóvel como um guarda incansável no meio do quintal. Mas o que as cortinas não ocultaram
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Um Passo Mais Perto
foi o vulto que Susie viu passando do outro lado das janelas, na varanda. O vulto era grande demais
para se esconder. Só o que as cortinas faziam era distorcê-lo e disfarçar o que era.
O vulto se movia devagar, deliberadamente, cambaleando em sincronia com o som de seus
passos: tum... tap... tum... tap. Enquanto se movia, sua cabeça sacudia. A cada poucos passos, Susie
podia ver o reflexo dos olhos vidrados que vasculhavam o interior da casa. Toda vez que os olhos
olhavam em sua direção, Susie virava pedra, querendo desaparecer em meio ao cenário.
Mesmo querendo se esconder, Susie não voltou para a cama. Ela não podia. Sabia disso.
Ela continuou descendo a escada, dando um passo a cada seis dos que ouvia na varanda.
Quando chegou ao primeiro andar, a figura estava passando pela última das janelas altas do lado
esquerdo da casa. Susie passou por ela na ponta dos pés.
Adentrando o que costumava ser o escritório de seu pai, Susie viu o vulto passar pela janela
do escritório e seguir em direção ao lado da cozinha da casa. Hesitando apenas por um momento na
sala vazia cheia de estantes empoeiradas, Susie se afastou do batente da porta e foi para a cozinha
pela segunda vez naquela noite.
Ela se agachou atrás da mesa de jantar enquanto o vulto passava pela luz amarela do lado de
fora da janela da cozinha. Quando saiu dali, voltando em direção à frente da casa, Susie se ergueu.
Ela cerrou os punhos antes de soltá-los. E foi para a porta da frente.
A porta da frente era tão velha quanto a casa. Feita de madeira grossa e pintada tantas vezes
que sempre emperrava quando tentavam abri-la, a porta de madeira entalhada lembrava Susie que o
tempo não podia ser parado, não importava o quanto você quisesse.
Os passos pararam.
Susie escutou. Não ouviu mais nada.
Levou a mão até a maçaneta da porta e então a abriu.
Foi abrindo aos poucos. Dois centímetros. Quinze centímetros. Trinta centímetros. Ela parou
e respirou fundo, depois passou pelo vão da porta e olhou para cima.
Ela esperou. Como sempre fazia. Toda noite. Assustadora. Familiar. Persistente.
Susie não se encolheu, não tremeu e nem recuou num pulo, mesmo que fosse justificável
que fizesse qualquer uma dessas coisas. Em vez disso, ela disse:
— Já é hora de voltar?
Chica estendeu sua mão amarela. Seu bico não se moveu.
Susie sabia que Chica não iria responder, porque Chica não falava com ela.
Susie se virou de costas para a galinha animatrônica de tamanho adulto parada diante de si.
Ela olhou de volta para o alto da escada. Ansiando.
Mas ansiar não resolveria nada.
Susie olhou novamente para a galinha animatrônica. Ignorando a boca de metal aberta com
todos os dentes, Susie focou no corpo de um amarelo vibrante e o grande babador branco em volta
do pescoço de Chica, que dizia “Vamos Comer!”. Então olhou para o cupcake que Chica segurava.
Susie achava o cupcake mais assustador que Chica. Tinha olhos e dois dentes de coelho, além de
uma vela bem no meio. Susie não sabia para que era a vela. Um dia? Um ano? Uma criança?
Deixando que Chica pegasse sua mão, Susie saiu de sua casa. Cada passo a fazendo sentir-se
menos como ela mesma. Quando passou pelas folhas ainda caindo de Oliver, ela se perdeu.

Patrícia olhou pela porta aberta para o carvalho que continuava derrubando suas folhas pelo
quintal. Tinha a sensação de que havia perdido algo importante. Minutos antes, tinha ouvido aquele
barulho de novo. Dessa vez, não conseguiu se convencer de que era coisa da sua cabeça.
Ela saiu do quarto e atravessou o corredor. Quando olhou escada abaixo, a porta da frente
estava aberta. Com o coração acelerado, ela correu para o quarto de Samantha e espiou lá dentro.
Um olhar já fez seu coração desacelerar. Tudo bem. Seu pior pesadelo não estava acontecendo.
Mas por que a porta estava aberta? Pegando um par de agulhas de tricô e segurando-as na
sua frente como uma faca, ela andou pela casa atrás de um intruso. Mas não tinha nada.
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Um Passo Mais Perto
Patrícia fechou a porta, girou a tranca e pressionou as mãos contra a porta, empurrando com
toda a força, como se pudesse afastar a realidade, talvez moldá-la de alguma outra forma.
Puxando as mãos de volta abruptamente, ela prendeu a respiração. Tinha algo que não havia
considerado. E se alguém tivesse entrado pela porta ainda aberta enquanto ela vasculhava a casa?
Ela se virou e subiu correndo a escada até o quarto de Samantha.
Ela quase caiu de alívio. Estava tudo bem.
Samantha estava acordada. Estava sentada na cama, as cobertas lhe cobrindo até o pescoço,
de punhos cerrados e as juntas dos dedos brancas. As lágrimas faziam seus olhos cintilarem sob a
luz fraca do abajur na cômoda ao lado.
Patrícia se sentou ao lado de sua filha. Quis dar um abraço bem apertado em Samantha, um
abraço de nunca-vou-te-abandonar. Mas Samantha não ia gostar disso. Só o que ela tolerava era um
toque de leve. Então Patrícia colocou a mão levemente sobre o ombro de Samantha antes de dizer:
— Eu sei que sente falta dela. Eu também sinto.
Samantha piscou e duas lágrimas lhe fugiram os olhos, serpenteando por suas bochechas.
Ela não se deu ao trabalho de enxugá-las.
Patrícia ficou sentada ao lado de Samantha por um bom tempo, mas nem a mãe e nem filha
falaram novamente. Por fim, Patrícia se levantou, deu um beijo na cabeça da filha e voltou para sua
cama enorme.

Samantha esperou até sua mãe sair para se mexer. Ela se deitou virada para cima, vendo a
luz e a sombra brincando de gato e rato no teto.
Se Susie estivesse aqui, inventaria uma história sobre as sombras e a luz, sobre elas lutarem
uma contra a outra ou dançarem ou algo do tipo. Ela sempre inventava coisas.
Susie puxou isso do pai delas. Mesmo que sua mãe fosse a artista e seu pai fosse quem ia
trabalhar de terno e gravata para fazer “negócios” que nem Samantha e nem Susie entendiam, ele
era quem amava histórias. No tempo livre, estava sempre lendo um livro ou assistindo a um filme.
Também inventava boas histórias. Quando estava em casa, as meninas sempre ouviam uma história
original sua na hora de dormir. Sua mãe delas nunca tentava inventar uma história. “Vou ler uma
história para vocês em vez disso”, ela dizia quando o pai delas estava fora da cidade. Agora ela não
dizia “em vez disso”. Só perguntava qual livro devia ler hoje.
Uma das histórias que seu pai inventou era sobre um menininho que tinha um esconderijo
num quarto secreto em sua casa. Daquele quarto, ele conseguia resolver todos os seus problemas,
não importava quais fossem. Ele contava centenas dessas histórias, cada vez inventando um novo
problema para o menino resolver.
Susie estava convencida de que essas histórias queriam dizer que havia um quarto escondido
em casa. Ela sempre perguntava ao pai sobre isso. A resposta dele era sempre a mesma: ele fingia
fechar um zíper na boca e jogar fora uma chave invisível.
Susie achava que o caminho para o quarto secreto ficava no escritório do pai nos fundos da
casa. Samantha achava que era só uma história, e se sentia satisfeita com o fato de o escritório estar
sempre trancado, já que assim Susie não a arrastava para se meterem em confusão procurando pelo
quarto secreto.
Agora o escritório não ficava mais trancado, porque seu pai se fora. Mas Susie não falava
mais sobre procurar um quarto secreto.
Samantha pressionou os lábios, enojada de si mesma por pensar em Susie e naquele quarto
secreto idiota. Então pensou nos sons que tinha ouvido à noite. Tentou se convencer de que os havia
imaginado. Tinha que ser verdade porque, quando ela olhou para fora, não tinha visto nada.
Mas sozinha agora no silêncio, bem no meio da noite, e não conseguia se convencer de que
os havia inventado.
Tinha certeza que algo estivera lá fora.
Mas o quê?
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Um Passo Mais Perto
E por quê?

No ar fresco do fim da manhã, Patrícia e Jeanie estavam sentadas lado a lado na cadeira de
balanço com almofadas de flores amarelas na varanda. Patrícia sabia bem que, para qualquer um
que passasse por lá, ela e Jeanie eram parte de uma cena idílica: ambas as mulheres, usando chapéus
de palha de abas largas para cobrir os rostos do sol que raiava na varanda, tomavam um chá para
afastar o frio do outono. Provavelmente pareciam tão relaxadas quanto poderiam estar. Mas não
estavam. Ou pelo menos Patrícia não estava.
Patrícia avaliou a amiga. Jeanie era quase sempre o perfeito oposto dela em tamanho e cor.
Enquanto Patrícia era alta e magra com os cabelos escuros, Jeanie era pequena e cheia com cabelos
loiros. Apesar dessas diferenças, as duas mulheres costumavam ter uma qualidade em comum —
ambas sorriam e riam com facilidade. Agora, Patrícia não conseguia mais fazer isso.
Patrícia respirou fundo.
— Será que eu devia levar a Samantha a um psicólogo diferente? — Ela se arrepiou diante
da forma como sua voz pareceu cortar o ar. — A Rhonda é legal e a Samantha gosta dela, eu acho...
francamente, é difícil ter certeza. — Ela espantou uma mosca. — Mas eu conversei com a Rhonda
semana passada e ela disse que a Samantha estava presa. Ela claramente está guardando algo para si
mesma, mas nada do que Rhonda está fazendo a faz falar.
— A Samantha sempre fez as coisas do jeito dela — salientou Jeanie. Ela riu. — Aquela
criança tem opinião pra tudo.
Patrícia tentou sorrir, mas só chegou na metade do caminho.
— Lembra de quando ela discutiu sem dó com a Susie sobre dar nome praquela árvore? —
Jeanie apontou para o carvalho ancião. — Qual o nome dele?
— Oliver. — Patrícia começou a chorar.
Jeanie abaixou seu chá e segurou a mão de Patrícia.
— Sinto muito. Isso foi insensível.
Patrícia enxugou os olhos e balançou a cabeça.
— Já passou um ano. Eu devia...
— Não existe “devia” quando se perde uma criança. Não foi o que o seu psicólogo disse?
Patrícia assentiu.
— Não existe um manual.
Elas foram bebericando o chá em silêncio por vários minutos. Patrícia viu Oliver soltar mais
uma dúzia de folhas. A brisa persistente da noite anterior tinha derrubado centenas das folhas que
ainda restavam em Oliver. Não sobravam muitas em seus galhos nodosos. Muito em breve, ele
precisaria de seu cachecol.
Jeanie deu uns tapinhas no joelho de Patrícia.
— Você está pensando no cachecol do Oliver.
Literalmente machucava Patrícia pensar em como Susie com seus quatro anos correu para
dentro de casa depois que Oliver derrubou sua última folha naquele primeiro ano, quando ela lhe
deu seu nome. Quando voltou, estava segurando um dos cachecóis que Jeanie havia costurado.
Patrícia olhou para Oliver e sentiu que podia ver a cena de três anos atrás acontecendo agora
bem na sua frente. A cena era um pouco vaga em algumas partes, mas tirando isso, era quase real.
Com seus pequenos braços cruzados, franzindo suas sobrancelhas, Susie disse: “Ele vai ficar
com frio sem suas folhas”. Estava vestindo uma jaqueta laranja forte.
Quando Susie descobriu que o cachecol não era grande o suficiente para Oliver, ficou com o
coração partido... até Patrícia sugerir que Susie devia pedir para sua madrinha tricotar um cachecol
especialmente para Oliver. Agora Jeanie tricotava um novo cachecol para Oliver todo ano.
— Eu já tricotei — murmurou Jeanie.
Lágrimas escorreram pelas bochechas de Patrícia. Ficou surpresa quando viu que ainda tinha
lágrimas para chorar.
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Um Passo Mais Perto
— Ela estava sempre antropomorfizando as coisas — disse Patrícia. — E eu nunca vi um
problema nisso.
— Não tinha problema nisso. Ela era uma criança empática com uma imaginação vívida.
— E foi por isso que ela foi atraída tão facilmente... — Patrícia não reconheceu a própria
voz. Normalmente suave, agora estava tão rígida quanto o tronco de Oliver. — Eu devia ter
desencorajado as fantasias dela. Devia...
— Para! — Jeanie se virou para que pudesse encarar Patrícia de frente. — Nem todas as
crianças assassinadas eram como a Susie. Você não sabe se seria diferente se ela fosse como outras
crianças. Você não pode ficar procurando motivos para se culpar.
Patrícia olhou para baixo.
— Eu odiava aquele lugar — sussurrou. — Ele sempre pareceu assustador para mim. Mas a
Susie amava.
Jeanie franziu o cenho.
— Tem certeza que quer passar por isso de novo?
— Eu preciso...
— Não, não precisa.
— Sim, preciso. Não posso só esquecer.
— Por que não? Como é que você vai ajudar a Susie se torturando com esses detalhes de
novo e de novo?
Patrícia queria gritar para Jeanie calar a boca, mas não tinha a energia para isso.
Jeanie segurou ambas as mãos de Patrícia.
— Sua filha foi assassinada por um assassino em série. Ela foi atraída para a morte em um
lugar onde devia estar segura. Pronto. Desenterramos isso de novo. Satisfeita?
Patrícia arrancou as mãos de volta e começou a se levantar. Jeanie agarrou seu braço e a
segurou com força no lugar, praticamente pinçando a pele de Patrícia.
— Não fuja! — gritou Jeanie. Então abaixou o tom da voz, ainda firme, mas com vergonha
do sermão: — Você não pode simplesmente desenterrar o passado e depois fugir dele. Se quer
insistir em trazê-lo à tona só para se torturar o tempo todo, pelo menos encare ele de frente. Se não,
vai continuar fugindo pelo resto da vida e nunca vai conseguir deixar a Susie partir.
Um carro cruzou a estrada com tudo, o motor acelerando. O cheiro do escapamento soprou
até a varanda. Alguma coisa no odor apagou a raiva de Patrícia.
— Ela estava usando o suéter favorito dela, o que você tricotou.
— Magenta com listras cor-de-rosa — disse Jeanie.
— Ela queria lantejoulas — disse Patrícia.
— E você não me deixou colocar nenhuma no suéter.
— Aí você colocou pedrinhas de brilhante nos jeans dela.
Jeanie riu.
— Você ficou bem brava comigo.
Patrícia enxugou os olhos.
— Coisa idiota para ficar brava.
Jeanie apertou gentilmente o ombro de Patrícia e então a soltou. Uma brisa vinda do quintal
soprou pela varanda e Patrícia estremeceu.

Susie viu Samantha apoiando um ancinho e uma pá em Oliver.


— Não é culpa dele — disse Susie. — Ele não pode impedir que as folhas caiam no chão
quando começa a soltar elas.
Samantha suspirou. Susie tentou não se irritar.
— Eu disse que eu ia fazer isso — ela lembrou a Samantha.
Logo depois que elas chegaram em casa aquela tarde, sua mãe disse:
— Você podia juntar as folhas antes do jantar.
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Um Passo Mais Perto
Deixa que eu junto — dissera Susie. Mas antes que pudesse pegar o ancinho, Samantha o
pegou e agora não queria soltar. Ela preferia fazer “direito” mesmo não gostando de fazer do que
deixar que alguém fizesse “errado”.
Tudo bem. Deixa a Samantha limpar. Susie ia brincar com Oliver.
Ouvindo o ancinho raspando e roçando, Susie foi até o lado de trás de seu tronco, longe da
estrada, e o abraçou. Oliver cheirava a fumaça e umidade. Recostando a lateral do rosto no tronco,
ela escutou. Às vezes, quando escutava com muita atenção, tinha certeza que o ouvia respirando.
— Oi, Samantha!
O cumprimento tinha vindo da calçada. Susie deu uma olhada de trás de Oliver para ver
quem estava chamando sua irmã. Era Drew, o garoto do patinete e de cabelos loiros bagunçados.
Hoje ele estava sozinho.
Se segurando em seu patinete, Drew olhou pelo quintal. Samantha o encarava como se fosse
um touro pronto para atacá-la. Drew acenou para ela.
— Eu te vejo muito na escola e pensei em te dar um oi. Meu nome é Drew.
Samantha olhou em volta como se estivesse suspeitando de uma armadilha. Susie queria ir
até ela e encorajá-la a conversar com o menino, mas Samantha odiaria isso. Então Susie se manteve
escondida e observando.
Drew coçou o nariz e seu patinete caiu. Ele se abaixou para levantá-lo.
— Oi — disse Samantha.
Drew se endireitou e abriu um sorriso.
Samantha segurava o ancinho como uma arma. Susie não achou aquilo muito amigável.
— Vai até ele — Susie cochichou para a irmã.
Samantha a ignorou. Susie sabia que ouvir a conversa dos outros era “rude”, de acordo com
sua mãe. Então correu até o outro lado do quintal e começou a conversar com as plantas enlameadas
nos vasinhos de flor. Será que elas iriam conta-la por que sua mãe estava as ignorando?

Samantha queria que o menino fosse embora. Mas também esperava que ele ficasse. Ele era
bonitinho. Mas ele estava sendo legal com ela ou só estava implicando?
Drew se aproximou e ficou bem na beira da calçada.
— Eu... sinto muito pelo que aconteceu com a sua irmã.
Samantha abaixou o olhar, mas ainda conseguiu murmurar:
— Obrigada. — Ela deu um passo tentador em direção à calçada.
Drew olhou para Samantha. Então ergueu o olhar para a casa. Ele abaixou a voz:
— Você ainda vê ela?
Samantha ficou imóvel. Sentiu o sangue fluir em seu rosto e apertou o ancinho tão forte que
machucou sua mão.
Drew deixou seu patinete no chão e deu alguns passos quintal adentro. Então abriu a boca e
as palavras saiam tão rápido que tombavam uma por cima da outra:
— Eu não tô tentando te chatear e eu não tô tirando sarro. Sério mesmo. É que eu acredito
em fantasmas e acho que as pessoas que morrem ainda podem ficar por aí se quiserem. Eu tinha um
tio que morreu, e eu vi ele na noite que ele morreu, e aí ele voltou uns anos depois disso. Ele estava
esperando o meu pai perdoá-lo ou algo assim. Eu acho que fantasmas continuam por aqui quando
querem alguma coisa, sabe? Então eu só tava perguntando, não queria te deixar triste.
— O jantar fica pronto em cinco minutos — a mãe de Samantha gritou da varanda. Ela não
percebeu Drew ali.
Samantha não fazia ideia do que dizer para ele, então só disse um “tá bom” e se virou para ir
para dentro.
— Tchau! — exclamou Drew.

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Um Passo Mais Perto
Samantha não conseguia dormir porque não parava de pensar em Drew. No que ele tinha
dito. Pensar em Drew até que era legal. Pensar nas coisas que ele disse não era.
Suas palavras martelavam na cabeça dela. “Fantasmas continuam por aqui quando querem
alguma coisa”.
Um ruído seco veio do primeiro andar. Samantha se sentou na cama. Sabia exatamente o
que era aquele som.
Ela devia ir lá embaixo? Ou esperar?
Os tremores que sempre começavam com aquele som subiram de seus pés até as pernas.
Ignorando-os, ela saiu da cama e atravessou silenciosamente o quarto até sair no corredor. Não
ouviu nenhum som vindo do quarto de sua mãe. Nada no primeiro andar também agora. Mas que
corrente de ar frio era aquela que estava sentindo?
Samantha trincou os dentes e desceu a escada. Já lá embaixo, ela parou por um momento
antes de continuar na ponta dos pés até a sala de jantar, onde deu uma olhada na cozinha.
Assim como esperava, a porta dos fundos estava aberta. E agora ela conseguia ouvir o outro
barulho, vindo da varanda: tum... tap... tum... tap.
Em meio a um gemido, ela ignorou seu medo. Ela correu pela cozinha, empurrou a porta dos
fundos e a trancou. Então correu o mais rápido que pôde de volta até sua cama.
Chegando lá, tentou se convencer de que era tudo invenção sua.

Ao longo de todos os meses em que a vinha visitando, Rhonda nunca tinha dado as costas
para Samantha. Isso era algum tipo de teste?
Samantha franziu o cenho e tentou descobrir o que estava acontecendo. Ela olhou ao redor
da sala. Era simples e organizada, o tipo de sala que Samantha gostava. Só o que tinha nela era um
tapete bege grosso, a cadeira de escutar de Rhonda — felpuda e de cor creme com um assento baixo
e braços grandes — um sofá listrado bege e branco e uma mesa de tamanho infantil perto de um baú
cheio de brinquedos. A sala era interessante para Samantha porque se estendia para fora da casa,
como uma caixa pairando a sessenta centímetros do chão. Três dos lados da caixa eram de vidro.
Um longo suspiro de Rhonda fez Samantha piscar, diante do que ela finalmente virou para
voltar a encará-la.
— Desculpa — disse Rhonda. — Estava tentando achar uma resposta.
A dobra entre suas sobrancelhas pretas e grossas era incomum. Rhonda não era de franzir o
cenho. Na maior parte do tempo, ela sorria até demais na opinião de Samantha. Não era normal,
especialmente para alguém que ouvia os problemas de outras pessoas o dia todo.
— Eu gosto de achar respostas. — disse Samantha.
— Eu sei que gosta. — Rhonda jogou seus longos cabelos preto para trás.
Samantha olhou para os grandes olhos castanhos de Rhonda.
— Para que você estava tentando achar uma resposta? — perguntou ela.
— Para como impedir sua mãe de te mandar para outra pessoa.
Samantha levantou a cabeça.
— Por que minha mãe quer me mandar para outro lugar?
— Porque você não está tendo progresso comigo.
— E o que isso quer dizer?
Rhonda se inclinou em sua direção.
— Samantha, eu sei que tem algo preso na sua cabeça. Um pensamento. Uma crença. Algo
que você continua pensando está preso aí, no seu cérebro, e você não está deixando sair.
Rhonda estava certa, mas Samantha não disse isso.

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Um Passo Mais Perto
Samantha olhou para seus sapatos azul-marinho amarrados com todo o cuidado. Ela gostava
das coisas em seus lugares. Não gostava de bagunça.
Mudar era uma bagunça. A terapia também era. Antes de começar a visitar Rhonda, sua mãe
a havia levado para duas outras pessoas que “estavam lá para ajudá-la”. Ambas queriam que ela
brincasse com uma pilha de brinquedos bagunçada em uma sala bagunçada. Ela implorava para que
sua mãe não a levasse de volta para lá.
Finalmente, sua mãe lhe trouxe aqui. Ela não amava, mas também não odiava. Rhonda era
diferente. A sala era diferente. Samantha não tinha problemas com nenhuma das duas.
— Nós brigamos — disse. Tinha que contar para Rhonda o que estava preso para que sua
mãe não a levasse a outro lugar.
— Você e a Susie?
Samantha assentiu.
— Certo. — Rhonda escreveu em seu bloco de notas. Isso costumava confundir Samantha, o
jeito como ela escrevia as coisas, mas ela se acostumou.
— Era sobre a Gretchen.
— Quem é Gretchen?
— A boneca que a minha mãe disse que tínhamos que dividir.
— E de quem era a boneca?
— A mãe deu para nós duas, juntas. — Samantha revirou os olhos. — Eu odiei isso. Queria
que ela fosse minha. Eu não pego as coisas da Susie, então eu devia ter minhas próprias coisas.
— Certo.
— Mas a mãe disse que a gente tinha que dividir.
Rhonda assentiu.
— Então eu tentei explicar pra Susie que cada uma de nós ia ficar com a Gretchen por um
certo tempo. Quando a Gretchen ficasse comigo, ela ia estudar.
Rhonda sorriu e assentiu de novo.
— A Susie não gostou disso. Disse que a Gretchen não gostava de estudar. Que a Gretchen
gostava de ir ao zoológico. Ela queria que a Gretchen brincasse com os bichinhos de pelúcia dela o
tempo todo. Disse que se a Gretchen tivesse que estudar, ela ficaria triste.
Samantha parou e se lembrou de Susie em seu quarto, as mãos na cintura, e com o lábio de
baixo projetado para frente. Quando Samantha insistiu que Gretchen precisava estudar, Susie fez
birra. Ela gritou: “Mas ela vai odiar isso!”
— E então o que aconteceu? — perguntou Rhonda.
Samantha balançou as pernas.
— Quando eu tentei colocar a Gretchen na frente de um livro, a Susie agarrou ela e saiu
correndo. Ela...
— Ela o quê?
Samantha contou sua respiração do jeito que Rhonda a havia ensinado. Isso devia ajudá-la a
ignorar a sensação de que tinha insetos subindo em suas pernas.
Um.
Dois.
Três.
Quatro.
Na quarto expiração, Samantha disse:
— Ela correu e escondeu a Gretchen. Depois voltou e me contou o que tinha feito fez. Eu
disse a ela que ia encontrar a Gretchen e a Susie ficou triste de novo. Antes... daquela noite... ela me
disse que ia achar um esconderijo melhor para a Gretchen e que eu nunca iria encontrar ela agora.
— Samantha fechou as mãos e as manteve na frente do rosto. Então disse: — Acho que ela estava
pensando em onde esconder a Gretchen, e por isso ela foi levada. Achou que seja lá quem a pegou
pudesse ajudá-la a esconder aquela boneca idiota.
Rhonda respirou fundo.
— Obrigada por me contar isso.
— Não estou mais presa?
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Um Passo Mais Perto
— Acho que não.
Samantha acenou uma vez com a cabeça. Bom.
— Onde está a boneca agora? — perguntou Rhonda.
— Eu não encontrei.

Susie achou que Samantha estava estranhamente tagarela hoje. Ela não tinha calado a boca
desde quando sua mãe tinha ido busca-la na casa engraçada de vidro que Samantha visitava três
vezes por semana. Mesmo que Samantha estivesse falando sobre coisas chatas, sobre multiplicar e
dividir por cinco, sua mãe não parecia achar um problema ouvir tudo. Ela continuou assentindo
enquanto dirigia. Mas não estava sorrindo. Samantha também não. Samantha estava tão rígida que
parecia um robô. Também soava como um robô. Era estranho. Estava falando como se precisasse
falar ou algo ruim aconteceria.
Mas se ela tinha que falar, não podia falar de algo bom?
— Que tal a gente falar de coisas fofas? — perguntou Susie.
Samantha e sua mãe não deviam tê-la escutado porque Samantha ainda continuou falando de
números e matemática. Susie suspirou.
De que adiantava sair com elas se iriam ignorá-la?
Susie virou e olhou para a orelha direita de Samantha. As orelhas de Samantha não tinham
furos como as de Susie. Susie gostava de usar brincos coloridos. Samantha se recusava a furar suas
orelhas porque não queria ter buracos nelas. Susie pensou: Se eu soprar forte o suficiente, será que
consigo tirar todas as palavras chatas da cabeça dela?
Virando, Susie soprou o mais forte que pôde na orelha de Samantha.
Samantha parou de falar.
Ha! Susie sorriu.
— Já acabou a sua história? — A mãe de Susie perguntou para Samantha.
Samantha não respondeu. Apenas continuou perfeitamente sentada em seu lugar.
Susie não tinha certeza se o silêncio era melhor que a faladeira sem fim. Não era um silêncio
confortável e suave, como um ursinho de pelúcia macio. Era um silêncio cortante, como a ponta
afiada de algo metálico espetando sua pele. O silêncio machucava seus ouvidos... e seu coração.
Susie começou a cantar para abafar o silêncio. Ninguém cantou com ela, mas Susie não se
importou. Ela cantou até sua mãe fazer a curva na rua de casa. Susie então parou e esperou ansiosa
para avistar a casa e dar uma olhada em Oliver.
A mãe de Susie freou e esperou um carro passar antes de virar no estacionamento de casa. O
farol do carro fez seu click-tick enquanto a mãe de Susie manobrava. Susie imitou o som. Ninguém
pediu para ela parar.
Oliver tinha perdido ainda mais folhas. Só lhe restavam algumas poucas. Será que durariam
o suficiente?

Susie estava sentada na beira da cama de Samantha, vendo a irmã ler um livro. Samantha
parecia tensa. Ela segurava o livro bem apertado e levava um bom tempo para virar as páginas.
— Eu tenho uma confissão — disse Susie.
Samantha não olhou.
— Eu sinto falta de vocês quando nós estamos separadas — prosseguiu. — E sei que vocês
também sentem minha falta.
Samantha virou uma página. Sua mão tremeu.
— E eu sinto falta da Gretchen. Você sente falta dela?
Samantha continuou lendo.
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Um Passo Mais Perto
Susie não gostava quando Samantha a ignorava, mas isso não a fez ficar quieta:
— Não sei por quê, mas não me lembro onde escondi a Gretchen. — Susie mordeu a ponta
do dedo. — Não acho que...
Ela parou de falar. Não estava funcionando. Samantha não ia ajudá-la.
Por que Susie não conseguia se lembrar de onde escondera Gretchen? Ela se lembrava de
como estava brava e triste com que Samantha por querer fazer Gretchen estudar. Gretchen era uma
boneca sensível. Com sardas e cabelos loiros cacheados, o rosto redondo e macio de Gretchen tinha
um sorriso tímido estampado nele, o tipo de sorriso que fazia Susie pensar que se assustava com
qualquer coisinha. Quando Susie escondeu Gretchen, ela estava usando um vestido de bolinhas rosa
e roxo que Jeanie tinha feito. O vestido era para ser alegre. Para ajudar Gretchen a ficar mais feliz.
Mas aí Samantha queria pressionar Gretchen para “aprender coisas”. Nem aquelas bolinhas
conseguiriam ganhar disso.
Susie sabia que Gretchen ainda precisava ficar com ela. Susie era a única pessoa que a
entendia. Ela sabia como era querer ser feliz e brincar em um mundo que queria te fazia estudar e
melhorar em outras coisas. Ela não podia deixar Gretchen sozinha, perdida num canto esquecido.
Só queria que Samantha a escutasse. Susie levou a mão até o livro que Samantha estava segurando e
a sacudiu na frente dele.
O rosto de Samantha ficou pálido e ela ficou completamente imóvel. No que ela estava
pensando? Susie se perguntou. Ela poderia perguntar, mas sabia que Samantha não ia responder. Às
vezes, Samantha agia desse jeito e outras vezes ela agia normal.
Sua avó costumava dizer: “Ah, essa Samantha, ela é uma menina difícil de ler. Mas a Susie
é um livro aberto”. Se Susie era um livro aberto, então por que Samantha não conseguia entender o
que Susie estava tentando dizer?
Como Susie podia fazer Samantha entender?
Samantha saiu da cama e colocou seu livro organizadamente no canto da mesa. Sentando-se
em sua cadeira branca de costas retas, ela abriu uma gaveta e pegou uma cartolina e giz de cera.
Era isso! Talvez Susie pudesse fazer um desenho. Samantha o veria e então se lembraria de
Gretchen. Ou talvez se Susie fizesse um desenho, ela se lembraria de onde escondeu Gretchen.
Susie olhou para a cartolina e o giz de cera. Será que Samantha iria dividir?
— Samantha, pode vir aqui, por favor? — Sua mãe chamou.
Perfeito. Susie esperou Samantha sair do quarto e então roubou um pedaço da cartolina cor-
de-rosa e um giz de cera roxo que mal tinha sido usado. Ela se deitou esticada no grande tapete azul
de Samantha. Com a língua firme entre os lábios, Susie começou a desenhar. Precisou de toda a sua
concentração para fazer o desenho aparecer na folha, mas conseguiu.
Desenhar era tudo o que ela podia fazer. Se escrevesse um bilhete, Samantha não ia ler.
— Não fique desenhando muito — a mãe de Susie disse no corredor. — Já, já eu vou te
colocar pra dormir.
Susie ouviu os passos de Samantha vindo. Ela se apressou para terminar o desenho. Quando
acabou, o deixou no chão e voltou para o assento da janela.
Encolhendo-se numa bolinha pequena, Susie olhou pela janela. Não conseguia ver Oliver
porque a janela refletia o quarto claro de Samantha. Mas podia ver algumas folhas encostadas no
vidro. Olhando mais de perto, notou que eram de Hera, a videira que crescia pela trepadeira em
cima do telhado da varanda.
Susie sorriu. Ela se lembrou de quando seu pai havia colocado aquela trepadeira na casa. A
hera de sua mãe, que Susie deu o nome de Hera, claro, tinha crescido pelos cantos da varanda, e sua
mãe queria cortá-la. Susie achou que isso seria triste.
— Não dá pra deixar a Hera crescer mais? — ela perguntou na ocasião.
Sua mãe disse:
— Bom, se a gente tivesse uma trepadeira...
Agora parecia que Hera já tinha chegado no alto da trepadeira e estava tentando chegar até o
quarto de Samantha. Será que Hera teria mais sorte tentando fazer Samantha falar?

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Um Passo Mais Perto
Samantha entrou correndo no quarto e foi até sua mesa. Se quisesse terminar seu desenho
ainda hoje, tinha que se apressar.
Antes de chegar à mesa, no entanto, Samantha notou algo no chão. Não devia ter nada além
do tapete ali. Mas havia um pedaço de cartolina rosa. Ele não estava lá quando ela saiu do quarto.
Tinha certeza disso.
Sua mãe estava no primeiro andar com ela o tempo todo. Não tinha mais ninguém na casa.
Isso quer dizer que...
Samantha não queria olhar. Se olhasse...
Não tendo mais pressa para desenhar, Samantha ficou olhando para a cartolina rosa por um
bom tempo. Finalmente, ela se convenceu que pegá-lo era melhor que deixar jogado ali. Enquanto
estivesse no chão, Samantha ia pensar em mil e um motivos assustadores para ele estar ali. Se ela o
pegasse, saberia o que era exatamente.
Susie sempre achou que Samantha não tinha muita imaginação. Mas isso não era verdade. O
problema era que Samantha tinha imaginação até demais. Tanta imaginação que podia se assustar
feio com um simples pensamento ou dois.
Dando passos lentos e silenciosos, Samantha seguiu em direção ao tapete. Ela não tirou os
olhos do papel enquanto andava. Não sabia por quê. Achava que ele ia sair voando do chão e atacá-
la? E fazer o quê? Cortar seus dedos?
Samantha tinha se cortado com papel assim quando era pequena. Susie chorou quando viu o
sangue. Samantha não. Sim, doeu um pouco, mas ela achou mais interessante que doloroso. Como
podia uma coisa tão frágil como papel te cortar?
Quando Samantha pegou o papel, ela viu linhas roxas onduladas. Mas enquanto examinava
o papel e as linhas roxas, eles começaram a criar formas que faziam algum sentido.
O desenho tinha três partes, como os quadros das tirinhas de um jornal.
A primeira parte, na esquerda da folha, tinha o desenho de duas garotinhas. Uma delas tinha
um rabo de cavalo e a outra tinha o cabelo todo bagunçado na frente do rosto. A menina do cabelo
bagunçado segurava o que parecia um espelho na mão. Ela estendia o espelho para o que parecia ser
um bebê flutuando no ar. A outra mão estava segurada pela menina com rabo de cavalo. Entre o
bebê e a menina havia uma galinha grande com dentes afiados e as mãos erguidas. Hein?
A segunda parte do desenho, que estava separada da primeira por uma linha reta, mostrava a
lua sobre uma casa que parecia um pouco a de Samantha. A menina de cabelo bagunçado estava se
afastando da casa, segurando a mão da mesma galinha gigante de antes. À direita desse segundo
desenho, outra linha reta o separava do terceiro. Esse também tinha a lua, a casa e a menina indo
embora com a galinha. Mas depois do terceiro desenho tinha uma linha escura e forte. Samantha
conseguia ver onde o giz de cera havia rabiscado de novo e de novo para fazer uma forma grossa e
forte que Samantha não entendia o que era.
Franzindo o cenho, ela fitou o desenho. Será que ela o havia feito e depois esqueceu?
Como se ela fosse acreditar nisso.

— Queria que você conversasse comigo — sussurrou Susie. — Eu sinto falta de quando a
gente conversava. Sei que você acha que eu falo demais, mas você ainda me ouvia. Eu queria muito
que alguém me ouvisse.
Estava se sentindo tão frustrada. Isso a lembrava de charadas. Uma vez, ela brincou disso no
aniversário de sua amiga, Chloe. Susie gostava de todos os tipos de jogos, mas charadas não eram
tão divertidas quanto queria que fossem. Ela achou que estava sendo tão clara com suas mímicas,
mas ninguém adivinhava o que estava tentando fazer que vissem. Ninguém conseguia acertar. Mais
tarde, quando contou sobre isso para sua mãe, ela disse:
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Um Passo Mais Perto
— Você não pensa igual às outras pessoas. Isso é bom. Você é muito criativa.
Não o suficiente, Susie pensou enquanto olhava para o desenho que tinha deixado no tapete.
O que mais podia fazer?
Pulando do assento da janela, Susie correu até a mesa de Samantha. Percebeu que Samantha
tinha erguido o olhar do desenho rosa e roxo quando saiu correndo de lá, mas não se deu ao trabalho
de dizer nada. Quando Samantha agia assim, não tinha por quê.
Além do mais, Susie queria desenhar outra coisa.
Na mesa de Samantha, Susie pegou um pedaço de cartolina amarela e o giz de cera preto.
Ela se sentou na cadeira da mesa de Samantha e recomeçou.

Samantha sentiu o ar mudar, mas não queria pensar no motivo. Ela também sabia, de alguma
forma, que não podia se virar.
Samantha cobriu a boca com a mão para não rir. Samantha não era muito de rir. Bem, às
vezes seu pai conseguia fazê-la rir fazendo cosquinhas. Mas não era uma risada dessas. Essa vinha
de algum lugar apavorado dentro dela, um lugar onde ela era “histérica”. Essa era uma palavra que
seu pai costumava usar para descrever sua mãe antes dele abandoná-las.
Samantha não queria ser histérica.
Ela contou a respiração como fizera na terapia:
Um.
Dois.
Três.
Quatro.
O ar no quarto de Samantha tinha ficado carregado e espesso, como melado. Samantha não
sabia exatamente o que fazia ar parecer melado, mas não parecia certo respirar um ar daqueles. Ela
tinha que sair dali.
Deixando o desenho onde o encontrou, ela saiu correndo do quarto. Mas na porta, ela parou.
Tinha algo em cima da mesa.
Outro desenho.
Samantha estremeceu e se encolheu, mas ela não conseguiu desviar o olhar.
Assim como o primeiro desenho, esse tinha três partes. Na primeira, aquela mesma menina
de cabelo bagunçado estava saindo pela porta da frente da mesma casa. O prateado da lua era bem
fininho, parecida com a lua que Samantha tinha visto na noite anterior. Na segunda parte, a mesma
menina estava saindo pela mesma porta, mas a lua tinha um contorno maior. E então, no terceira
parte, a menina nem estava mais lá. Esse quadro só mostrava a porta da casa e uma lua ainda maior.
— Já está pronta pra dormir? — disse a mãe de Samantha.
Ignorando o ar estranho do quarto, Samantha juntou os desenhos e os enfiou embaixo das
cobertas. Ela os olharia depois, com a lanterna.

Susie normalmente esperaria até depois que sua mãe saísse para se enfiar na cama com sua
irmã, mas hoje foi diferente. Ela não queria passar nem um segundo longe dela.
Enrolando-se na cama de Samantha do lado da janela, Susie observou enquanto sua irmã
fazia seu ritual engraçado antes de dormir. Primeiro, Samantha se sentava em sua mesa e escrevia
um parágrafo, pelo menos um parágrafo, em seu diário. Depois atravessava o corredor para ir ao
banheiro e escovar os dentes. Depois tinha que fazer xixi e então beber meio copo de água. “Isso só
vai fazer você precisar fazer xixi de novo”, Susie tinha dito para a irmã outra noite. Samantha só
mostrou a língua para ela.

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Um Passo Mais Perto
Depois da água, Samantha tocava os dedos do pé quatro vezes e escovava o cabelo com todo
o cuidado cinquenta vezes. Então ia até sua cesta de bonecas e dizia boa noite para elas. Depois
enfim ia para cama.
Nenhuma dessas coisas eram engraçadas por si só, mas o jeito que Samantha as fazia toda
noite, na mesma ordem, era engraçado. Pelo menos para Susie.
Naquela noite, a rotina foi um pouco diferente porque Samantha pegou sua pequena lanterna
na gaveta da cômoda. Quando Samantha foi para baixo das cobertas, ela enfiou a lanterna ali junto
com os desenhos que tinha colocado antes, amassando-os no processo. Susie os ouviu farfalhando
enquanto Samantha os empurrava ainda mais para baixo e então se arrumava mais ou menos como
uma princesa adormecida. Finalmente, ela disse:
— Tô pronta, mãe.
Susie analisou o rosto de Samantha enquanto as duas esperavam sua mãe vir para o quarto.
Samantha tinha um pequeno sinal no nariz um pouco acima da ponta. Susie gostava daquele sinal.
Susie não tinha um e achava que sinais deixavam narizes interessantes. Também gostava da cicatriz
pequena em formato de visto embaixo do olho direito de Samantha. Susie tinha uma cicatriz, mas a
dela estava escondida embaixo do cabelo no alto de sua testa.
Susie ganhou a cicatriz porque estava fazendo algo que não devia. Samantha ganhou a sua
porque Susie estava fazendo algo que ela não devia.
Susie amava subir nas coisas quando era pequena. Uma das coisas que ela mais gostava de
fazer era subir na cerca da varanda e tentar dar a volta na casa toda ali em cima. Ela era boa em se
equilibrar na cerca, mas se pendurar nas colunas que a sustentavam era difícil porque seus braços
eram curtos demais para se fecharem ao redor delas. Ela caía muito, normalmente pousando sobre
os canteiros de flores de sua mãe e se metendo em encrenca. Sua mãe levava as flores muito a sério.
Um dia, quando Susie estava se limpando depois da última queda, Samantha disse:
— Tem um jeito melhor de passar pelas colunas.
— Quem disse?
— Eu.
— Como você sabe?
— Sabendo. E eu também sei como fazer.
— Tá, então me mostra — disse Susie.
— Não. A mãe disse pra não subir lá em cima.
— Oras, então por que disse isso?
— Porque tem um jeito melhor.
— Mas se você não vai me mostrar, quem se importa se tem um jeito melhor? Você só tá é
bancando a sabichona.
— Tô não.
— Tá sim.
As meninas estavam perto das begônias amarelas do lado da casa. Com as mãos na cintura,
elas encaravam uma a outra, praticamente cara a cara. Mesmo que Susie fosse um ano mais velha,
ela não era maior que a irmã.
— Eu acho que você tá mentindo sobre ter um jeito melhor — disse Susie.
— Eu não tô mentindo.
— Tá sim.
— Tô não.
Agora elas já estavam gritando.
— Sobre o que as duas estão brigando? — gritou sua mãe. Ela estava dentro da casa lavando
a roupa, e Susie queria que ela ficasse lá para elas continuarem brincando.
Susie foi até Samantha até que seus narizes encostaram, e sussurrou:
— Tá sim.
Samantha fez sua cara de cão pequinês e disse:
— Tá. — Ela então marchou ao redor de Susie e subiu na cerca perto de uma das colunas.
Susie ficou boquiaberta.
Samantha virou de costas para a coluna.
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Um Passo Mais Perto
— Viu, você tem que passar por elas de costas, não de frente. Desse jeito o peso do seu
bumbum não te empurra da cerca.
Samantha começou a demonstrar, mas seu pé escorregou. Ela perdeu o equilíbrio e caiu da
cerca em cima do canteiro de flores. Susie tinha caído lá antes e só se sujou, mas de alguma forma
Samantha conseguiu bater o rosto na ponta de um dos suportes segurando os clematis de sua mãe.
Samantha ficou brava com Susie por dias depois disso, não só pelos pontos que ela teve que
levar, mas por ter se encrencado tanto quanto ela por ter subido nas grades.
— Foi ideia dela! — Samantha gritou, apontando pra Susie.
— Não se faça de boba — sua mãe dissera para Samantha na ocasião. — Você não faz nada
a menos que queira fazer.
Ela estava certa com relação a isso.
Assim como agora.
— Não essa história — Samantha disse para sua mãe. — Quero que você leia aquela sobre o
fantasma feliz.
Susie sorriu. Essa tinha se tornado a história favorita de Samantha ultimamente.
A mãe de Susie pareceu querer contrariá-la, mas então suspirou e pegou o livro no topo da
pilha bem-organizada na cômoda de Samantha. A mãe de Susie se sentou na beira da cama.
Susie queria poder fazer alguma coisa por sua mãe. Ela parecia tão pálida... não, mais que
pálida. Parecia que sua pele estava ficando invisível. Susie podia ver as veias de sua mãe passando
por sua cabeça, suas mãos e seus braços. Pareciam minhocas azuis. A primeira vez que Susie viu
veias assim tinha sido numa velha senhora e ela de fato achou que fossem minhocas, e deu um grito.
Sua mãe então lhe explicou o que eram aquelas linhas azuis irregulares.
— Em uma grande e velha casa no topo de uma grande e velha montanha, o grande e velho
fantasma flutuava pelo corredor. — A mãe de Susie começou a ler.
Susie afofou o travesseiro embaixo da cabeça e chegou mais perto de Samantha. Samantha
prendeu a respiração e virou pedra, como se uma bruxa malvada de repente a tivesse congelado.
Susie fungou e se afastou. Por que Samantha estava tão brava com ela?
— O grande e velho fantasma na grande e velha casa não era um fantasma bonito — a mãe
de Susie seguiu com a leitura. — Mas era um fantasma feliz. Um fantasma muito, muito feliz.
Susie notou que os olhos de sua mãe estavam brilhantes e molhados. Susie também notou
que a voz de sua mãe parecia engasgada e entrecortada.
— Continua — disse Samantha.
A mãe das meninas suspirou de novo.
Ela voltou para a história familiar do fantasma que era feliz porque podia passar a eternidade
com sua família... até que descobriu que não passaria a eternidade com eles porque eles estavam se
mudando. Essa parte sempre deixava Susie tão triste quanto o próprio fantasma da história. Ela não
conseguia se imaginar se mudando dessa casa. Quem cuidaria do Oliver?
A mãe de Susie leu depressa, até chegar à parte em que o fantasma descobria que, se ele
saísse da casa e fosse para um lugar especial com uma luz brilhante onde os fantasmas realmente
felizes ficavam, o fantasma nunca se separaria da sua família, não importa aonde eles fossem. Ela
desacelerou nessa parte e pigarreou bastante.
Susie achou que seria muito legal estar em um lugar onde você nunca se separaria da sua
família. Ela amava estar com sua mãe e Samantha. Samantha até podia ser chata às vezes, mas ela
era a irmã de Susie.
Quando a história acabou, a mãe de Susie se levantou, hesitou, e andou até a porta.
— Durma bem — disse.
Susie queria que sua mãe lhes desse um abraço e um beijo de boa noite como costumava
fazer. Mas Samantha tinha decidido que elas eram velhas demais para isso e não deixava mais que
sua mãe fizesse isso. Aparentemente, sua mãe achava que Susie concordava com Samantha — mas
não concordava.
Assim que sua mãe apagou a luz, Samantha se encolheu em seu lado da cama.
— Boa noite, Samantha — disse Susie, mas sua irmã não respondeu.

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Um Passo Mais Perto
Susie deu de ombros e se encolheu numa bola virada para a janela. Ela olhou para a forma
fina e curva da lua que entrava no quarto. Sua luz não era brilhante o bastante para ver direito, mas
era o suficiente para criar muitas sombras engraçadas. Duas das sombras pareciam hipopótamos
dançando e três delas se combinavam para fazer o que parecia um palhaço andando a cavalo. Uma
delas parecia um pouco com...
Susie fechou os olhos. Ela ouviu Samantha respirar e se perguntou se sua irmã entendera os
desenhos. Samantha não tinha dito nada antes de enfiá-los embaixo das cobertas. Por que será que
os havia colocado lá?
Do lado de fora, um forte baque soou na varanda.
Mas já? Susie ainda não queria ir embora. Queria que Samantha desse mais uma olhada nos
desenhos. Ela tinha que entendê-los!
O baque foi seguido por um chiado fraco — o som da cadeira de balanço da varanda se
mexendo. O baque então se tornou o padrão de passos com o qual Susie já estava bem acostumada:
Tum... tap... tum... tap.
Por que esse som lhe fazia subir um calafrio pela pele?
Por que ela sentia que devia saber o que estava lá fora? Por que sentia que tinha que saber?
Susie saiu das cobertas e desceu da cama como se algo a estivesse tirando de sua segurança.
Era como um daqueles raios tratores que ela tinha visto nos filmes de espaço que seu pai gostava de
assistir. Ela não tinha controle. Queria ficar em sua cama quente e confortável. Mas em vez disso,
saiu do quarto e desceu a escada.
No final da escada, ela escutou os passos e viu uma grande sombra passar pela janela da sala
de jantar. Quando passou, ela correu pela cozinha e abriu a porta dos fundos.
Ela esperou.
Às vezes, Samantha vinha, batia a porta e elas voltavam para cama. Mas não hoje.
Hoje, Susie só ficou lá... ouvindo os passos chegando mais e mais perto. No último minuto,
antes dos passos fazerem a curva na casa, ela fechou a porta da cozinha. Tentou voltar para cima,
mas não conseguiu. Em vez disso, seus pés a levaram para o salão de entrada.
A casa tinha uma entrada bem grande, uma área “formal”, como dizia sua mãe. Ela disse a
Susie que, antigamente, tinha uma mesa redonda no meio do salão. A mesa sempre tinha um vaso
cheio de flores do jardim, mas a mãe de Susie tirou a mesa de lá porque, quando Susie começou a
andar e então a correr, ela sempre trombava na mesa e derrubava o vaso. “Ela quebrou sete vasos
antes de eu desistir”, a mãe de Susie gostava de contar para as visitas. Ela nunca dizia isso como se
estivesse brava. Parecia deixá-la feliz por algum motivo.
Agora o grande salão de entrada tinha apenas um tapete trançado marrom e azul-marinho.
Susie foi até o meio do tapete e esperou. Quando as sombras se moveram lá fora e o vulto rondando
a casa se aproximou da porta da frente, Susie deu um passo adiante e a abriu.
Assim como Susie já estava esperando, Chica estava do lado de fora, alta e rígida. A luz da
varanda brincava com o corpo amarelo de Chica, fazendo parecer que o animatrônico estava
respirando. Susie olhou para os olhos roxos rosados de Chica. As sobrancelhas grandes e pretas de
Chica tinham se mexido?
Susie olhou para baixo só por um instante. Os pés de Chica estavam plantados no tapete de
BEM-VINDO, com um pé ao lado do B e o outro ao lado do D. Como sempre, Susie hesitou. Mas
então fez o que tinha que fazer. Ela estendeu sua mão e deixou Chica envolver seus dedos firmes e
frios sobre os dela.
Chica se virou e andou em direção aos degraus que levavam ao quintal coberto de folhas.
Susie não tinha escolha a não ser ir junto. Agora os leves taps de seus próprios passos se juntaram
aos de Chica. E as folhas sob seus pés foram sendo esmagadas enquanto as duas deixavam a casa de
Susie para trás.

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Um Passo Mais Perto
Em uma quietude absolutamente silenciosa, Samantha escutava para ter certeza de que sua
mãe estava em seu quarto. Precisava prestar muita atenção porque as paredes grossas barravam sons
baixos. Eventualmente, no entanto, ela ouviu um rangido que reconheceu como a cama de sua mãe.
Esperou alguns minutos mais antes de ligar a lanterna embaixo das cobertas e pegar os desenhos.
Samantha quase não precisou vê-los. Estivera com eles na cabeça desde o momento em que
apareceram. Naquele instante, se deixou admitir que sabia que o primeiro desenho mostrava ela e
Susie. Mas o que isso significava?
Levantando a coberta e o lençol, Susie apontou a lanterna para o desenho das garotinhas. A
princípio, Samantha achou que a menina de cabelo bagunçado, Susie, estava segurando um espelho,
mas logo percebeu que era uma lupa. Parecia a que seu pai tinha na gaveta da mesa no escritório,
aquela que ele deixava as meninas usarem às vezes para verem as coisas mais de perto. Samantha
nunca se esqueceu de quando viu o tronco de madeira de Oliver de perto. Era como ver um mundo
totalmente diferente. Susie podia dar nomes para as coisas tanto quanto quisesse, mas Samantha
preferia estudá-las. Era para isso que ela usava a lupa — para estudar de perto. Susie, no entanto, a
usava para caçar.
Depois que Susie usou a lupa para ver uma centopeia de perto, decidiu usá-la para encontrar
insetos “pequetuchinhos” na terra. Ela tinha certeza de que encontraria algo que nunca tinha visto
antes. Quando Samantha usou a lupa para olhar o tronco de Oliver, Susie a pegou e apontou para
diferentes partes do tronco. “Talvez a gente encontre uns duendes”, ela disse na ocasião.
Tá, se Susie estava segurando uma lupa, então estava procurando alguma coisa.
Mas o quê? O bebê flutuando?
Ah. Não, não um bebê. A coisa flutuando era uma boneca.
Samantha franziu o cenho. Se Susie estava procurando uma boneca, só tinha uma boneca
desaparecida.
Tinha que ser a Gretchen. Então Susie a queria de volta.
Mas e a galinha? O que era aquilo? Samantha não entendeu a galinha dentuça.
E o que o outro desenho significava?
Samantha apontou a lanterna para o segundo desenho. Era como ela lembrava: três quadros
com a menina de cabelo bagunçado se afastando de uma porta nos dois primeiros, apenas a porta no
terceiro e luas que pareciam aumentar a cada quadro. O que isso significava?
E se as luas aumentando queriam dizer que cada quadro era um dia diferente? Como hoje, a
noite de amanhã, e a noite seguinte.
Samantha pensou em sua irmã, na boneca e nas luas.
Ela entendeu! Desligando a lanterna, ela pensou consigo mesma: A Susie só vai ficar aqui
por mais duas noites.
Ela tinha certeza de que estava certa. Mas a galinha...
— Por que essa galinha tá aí? — sussurrou.
Susie, é claro, não respondeu, porque tinha ido embora.

O despertador de Samantha a acordou antes do nascer do sol. Felizmente, ela não dormia
pesado, então não precisava de muito volume para ela escutar, e ela tinha certeza de que isso não
perturbaria sua mãe. Sua mãe tinha problemas para dormir, mas assim que pegava no sono, tinha
tantos problemas quanto para acordar. Samantha ouvira sua mãe contar para Jeanie que só dormia
com a ajuda de remédios. Os remédios pareciam fazer as manhãs serem muito difíceis e Samantha
aprendeu a não falar com sua mãe antes da escola.
Uma vez, Samantha esqueceu uma parte de um trabalho da escola. Ela e sua mãe já estavam
correndo porque sua mãe tinha dormido demais. Elas finalmente saíram da casa correndo e foram
até o carro, e sua mãe só dirigiu até esquina de casa quando Samantha se deu conta do que tinha
esquecido no quarto.
— Eu tenho que voltar — disse.
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Um Passo Mais Perto
Sua mãe pisou tão forte no freio que a cabeça de Samantha balançou para frente e para trás.
Ela achou que sua mãe fosse dirigir depressa de volta para casa. Em vez disso, sua mãe se inclinou
e bateu com a cabeça várias vezes no volante. Ela sussurrou algo repetidamente enquanto fazia isso.
Samantha achou que parecia ser “eu não consigo”.
Agora Samantha ficava no escuro, segurando seu despertador por vários minutos. Ela não
gostava de acordar cedo. Susie era quem sempre queria sair da cama e começar a brincar antes do
sol nascer. Susie era como seu pai, que dizia que a melhor parte do dia era logo antes de amanhecer,
quando tudo ficava em “estado de possibilidade”.
— Cheire esse ar — ele dizia a Samantha nas poucas manhãs em que conseguia fazer com
que ela acordasse mais cedo. — Olha aquela luz rosa.
— É tão bonita — dizia Susie.
Não bonita o suficiente pra acordar cedo por ela, Samantha pensou na ocasião.
Nessa manhã, no entanto, não tinha sido o cheiro ou a cor que fizeram Samantha sair da
cama. Foi o que ela precisava fazer.
Ela só tinha mais dois dias para encontrar Gretchen. Não sabia o que aconteceria se não a
encontrasse. Não entendia como uma boneca desaparecida podia ser tão importante para sua irmã
falecida. Susie era um fantasma... não era? Por que um fantasma iria querer algo como uma boneca?
Mas isso não importava.
Susie a queria, e depois do que aconteceu, ela merecia ter o que queria.
Samantha jogou as cobertas para o lado. O ar frio bateu em suas pernas descobertas e sentiu
um forte arrepio na pele. Ela ignorou o desejo de voltar para a cama. Em vez disso, se levantou,
deixando o tecido grosso e macio de seu pijama barrar um pouco do ar frio. Ela calçou os mocassins
de couro que Jeanie tinha lhe dado (Samantha não gostava de pantufas peludas de animais como
Susie), pegou as roupas que tinha deixado arrumadas à noite e foi até o banheiro na ponta dos pés.
Grata pelo pequeno aquecedor que ficava num banquinho robusto junto à porta do banheiro,
Samantha o ligou e ficou na frente dele por alguns minutos para se esquentar. Então fez uma versão
curta de sua rotina matinal antes de se vestir.
Depois que percebeu o que os desenhos de Susie queriam dizer, Samantha tentou se manter
o mais acordada possível até os remédios de sua mãe fazerem efeito para que pudesse começar a
procurar por Gretchen. Mas ela continuava ouvindo o insistente rangido da cama de sua mãe, o que
queria dizer que ela ainda não estava dormindo profundamente. Os olhos de Samantha começaram a
fechar, então ela configurou seu despertador para a manhã.
Quando terminou de se arrumar no banheiro, Samantha desligou o aquecedor e abriu a porta.
Indo até o corredor, ela parou no tapete verde-escuro e começou a pensar sobre onde Susie podia ter
escondido Gretchen.
Samantha olhou para a porta fechada do quarto de Susie. Ela balançou a cabeça. A boneca
não estaria lá. Quando Samantha e Susie brigaram sobre Gretchen, Susie estava tão triste quanto
possível. Ela não ia deixar a boneca em seu quarto, onde Samantha facilmente a acharia. E mesmo
que estivesse lá, seria o último lugar onde Samantha olharia. Ela não ia ao quarto de Susie desde
aquela noite horrível quando...
Samantha atravessou o corredor em direção à escada. Se ia procurar a boneca, ela o faria de
um jeito organizado. Fazia sentido começar pelo andar de baixo da casa e ir subindo. Além do mais,
no primeiro andar teria menos chance de acordar sua mãe.
O brilho pálido e amarelo da lâmpada da varanda chegava na escada pelo vidro de chumbo
da janela da porta da frente. A luz era como uma mancha estranha.
— Como vidro pode ser de chumbo? — Susie perguntou quando seu pai lhes contou como
se chamava o vidro da janela.
Samantha sorriu agora enquanto descia a escada. Susie sempre fazia esse tipo de pergunta.
Samantha nunca tinha certeza se Susie estava sendo engraçada ou pateta.
Chegando ao primeiro andar, Samantha olhou para os dois lados. Podia ir ou para a sala de
jantar ou para a sala de estar. Além da cozinha, os únicos outros cômodos no andar de baixo eram
um pequeno banheiro e o escritório de seu pai. Ela duvidava que a boneca estaria em qualquer um
desses lugares porque não tinha nenhum esconderijo neles.
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Um Passo Mais Perto
Ela começou pela sala de jantar. O lugar era pelo menos o dobro do tamanho de qualquer
outra sala de jantar que Samantha já tinha visto na TV. Não podia compará-la com as salas de jantar
das outras pessoas porque nunca tinha visto nenhuma outra. Ela não tinha amigos. E quando Susie
estava viva, Samantha às vezes era convidada para as festas que Susie ia, mas parou depois de ir
depois de ter ido em algumas. Eram chatas e idiotas, e as crianças sempre a tratavam mal.
Samantha esfregou a testa para afastar as lembranças. Então apertou o interruptor na parede
para fazer descer o lustre em cima da mesa. O lustre era uma grande roda de metal com velas falsas
nos aros. Jeanie dizia que o lustre era “estilo fazenda”, o que fazia sentido.
— Por que ele é chamado de lustre? — Susie perguntou quando elas eram pequenas. — Ele
nem lustra nada.
Samantha foi até a cristaleira alta e entalhada atrás de um dos lados da mesa de jantar longa
e escura. Ela abriu as portas de baixo e deu uma olhada. A cristaleira estava cheia de pratos e copos
de vidro e porcelana que sua família nunca tinha usado. Ela olhou atrás da pilha de utensílios. Nem
sinal da Gretchen.
Indo até o longo e baixo armário nos fundos da sala, — o “aparador”, como dizia Jeanie —
Samantha abriu todas os compartimentos e encontrou várias travessas e vasos. Nada de Gretchen.
Ela foi até a frente da sala e abriu a tampa do assento da janela. Estava com pilhas de panos
de mesa e guardanapos. Só para ter certeza, ela revirou e vasculhou as pilhas. Sem boneca.
Em seguida, ela foi para a sala de estar. Lá fora, na rua, ouviu o rugido do caminhão de lixo
esvaziando as lixeiras na frente de todas as casas. Ela mordeu o lábio. Será que o caminhão de lixo
acordaria sua mãe? Era melhor se apressar.
A sala de estar era grande e cheia de móveis bufantes e confortáveis. Pena que dificilmente
eram usados. Samantha olhou com anseio para o grande sofá xadrez que ficava na frente da lareira
de pedra em um dos cantos da sala. Duas namoradeiras bordô sólidas ficavam juntas ao sofá para
fazer uma forma de U. Preenchido nos cantos por mesinhas de carvalho robustas e concentrado em
volta de um poltrona quadrada e verde, esse era o lugar onde a família costumava se reunir para
jogar na frente da lareira.
No outro lado da sala ficava outro sofá grande e algumas poltronas reclináveis na frente de
uma TV de tela plana. Às vezes, sua mãe deixava Samantha assistir aquela TV, mas na maior parte
do tempo, ela devia assistir desenhos no computador em seu quarto.
Nos cantos da sala, estantes e armários de carvalho sob medida estavam cheios de livros e
quadros com fotos da família. Samantha se lembrou de como Susie se sentia sobre essas estantes e
alguns dos outros móveis.
— Carvalho?! — Susie disse um dia quando tinha seis anos. — Carvalho, igual ao Oliver?
— Móveis são feitos de madeira — dissera seu pai — E madeira vem de árvores.
— Então eles matam árvores pra fazer os móveis? — chiou Susie.
Seus pais tentaram por quase meia hora convencê-la de que árvores não sentiam dor quando
eram cortadas. Mas não conseguiram. Susie estava certa de que as árvores se machucavam.
Samantha começou procurando em todos os armários, primeiro no canto da frente e depois
seguindo em sentido horário. Quando não encontrou nada, procurou atrás de todos os livros nas
estantes. Mas só alcançava as três prateleiras de baixo.
Ela foi até a despensa da cozinha e pegou a escada dobrável que ficava lá. Contrariando seu
plano organizado, ela procurou na despensa enquanto estava lá. Encontrou provas de que alguém
além dela estivera escondendo doces: um pacote velho de marshmallows, dois pacotes de cookies
com gotas de chocolate pela metade, uma caixa ainda fechada de rosquinhas clássicas com data de
validade de um ano atrás e uma lata de metal com doces caramelizados que estavam todos grudados
juntos. Mas não encontrou Gretchen.
Levando a escada para a sala de estar, ela subiu e desceu quatorze vezes procurando atrás de
livros e quadros. Não encontrou nada além de muita poeira, o que a deixou triste, porque sua mãe
costumava querer que a casa ficasse sempre “nos trinques”. Ela lembrava como a casa costumava
cheirar a limão do spray que sua mãe usava quando fazia faxina. Agora, o cheiro era só de poeira.

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Um Passo Mais Perto
Após vasculhar cada um dos possíveis esconderijos da sala de estar, Samantha olhou para o
grande relógio de pêndulo no fim do corredor. Ela tinha que se arrumar para a escola logo e tinha
que acordar sua mãe.
Antes de levar a escada de volta para a cozinha, ela deu uma espiada no escritório. O único
esconderijo em potencial que conseguia ver era a mesa vazia de seu pai. Ela correu até lá e abriu
todas as gavetas e olhou no cubículo onde costumava ficar ao lado dos joelhos de seu pai quando
era bem pequena. Nada.
Não tinha nada para ver na sala inteira — apenas a mesa e as estantes vazias. A única outra
coisa que Samantha viu enquanto saía da sala foi um pedaço estranho de carpete preso embaixo da
quina de uma das estantes.
Arriscando uma busca na cozinha antes de acordar sua mãe, Samantha abriu os armários e as
gavetas um por um, colocando a mão atrás dos pratos, potes e panelas, travessas, bacias e utensílios.
Gretchen continuou escondida.

Samantha sentiu a presença de Susie assim que entrou na minivan depois da escola naquele
dia. Como Susie fazia isso? Samantha tinha certeza que Susie não estava por perto naquela manhã e
sabia que Susie nunca esteve na escola.
Samantha ignorou a presença insistente da irmã e olhou para o cabelo bagunçado de sua
mãe. Será que ela sabia que Susie estava ali?
Samantha pensou se ela devia perguntar.
Talvez não enquanto ela estivesse dirigindo.
Quando sua mãe estacionou o carro, Samantha se virou para olhar para Oliver, quase como
se alguém a estivesse fazendo olhar. Normalmente, ela ignorava Oliver. Será que era Susie fazendo
ela olhar? Como?
Oliver tinha só mais algumas folhas sobrando. Talvez devesse sair para contá-las antes do
jantar. Não. Tinha que continuar procurando por Gretchen.
— Que tal uma feijoada no jantar? — perguntou sua mãe.
Algo que parecia uma onda fluiu por Samantha. A onda era escura e meio oleosa. Ela queria
se prender a Samantha da mesma forma que a tristeza se prendera a ela desde que Susie se foi.
Imaginou que a onda fosse uma emoção. Mas era dela ou de Susie?
Susie amava feijoada. Ela estava triste por não poder comer? Tinha comida no lugar para
onde ela foi quando morreu?
— Pode ser feijoada sim — disse Samantha. — Podemos colocar abacaxi também?
Em sua mente, ela viu Susie fazer uma cara de nojo. Susie tinha colocado aquela imagem lá?
Samantha sempre gostou de feijão com abacaxi, mas Susie achava isso nojento.
A mãe delas abriu um meio sorriso para Samantha.
— Claro.

Susie seguiu Samantha correndo de uma sala até a outra procurando por Gretchen. Samantha
esteve em busca de Gretchen desde a hora em que chegaram em casa. Os desenhos de Susie tinham
funcionado!
Infelizmente, Samantha não estava tendo sorte. Em partes porque ela estava procurando em
lugares idiotas. Por exemplo, Samantha tinha tentado achar Gretchen no buraco do tronco de Oliver.
Apontando a lanterna no buraco e murmurando alguma coisa sobre duendes, Samantha prendeu a
respiração e esticou a mão dentro do tronco. Susie ficou rindo o tempo todo. Samantha tinha mesmo
acreditado nela quando falou dos duendes!

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Um Passo Mais Perto
Elas agora estavam dentro da casa procurando por todo e qualquer canto. O som de água e
do tilintar de panelas e talheres deixava claro que sua mãe ainda estava na cozinha. Obviamente,
Samantha estava tentando procurar no andar de cima enquanto sua mãe terminava o jantar.
Ela começou no ateliê da mãe.
— Eu nunca esconderia a Gretchen aqui. — Susie disse para Samantha quando ela abriu a
porta do ateliê. Samantha não deu atenção para Susie.
Isso não era surpresa — Samantha estava sendo teimosa.
Mas por que Susie não se lembrava de onde colocou a boneca? Ela sabia onde tinha deixado
na primeira vez que a escondeu. Tinha sido em seu quarto, embaixo da cama, o que ela sabia que
era um lugar nada original para um esconderijo. Algumas horas depois, ela a trocou de lugar. Mas
para onde tinha trocado?
Susie ficou na porta do ateliê da mãe enquanto Samantha vasculhava o lugar, procurando
entre pilhas de tecidos nas estantes amarelo-claro, em montes de fios enrolados amontoados em
grandes caixas de palha embaixo de uma fileira de janelas e em cestas de lona com lã ao lado do
tear de sua mãe. Susie achou tudo isso bem corajoso porque uma das regras da casa era que entrar
no ateliê era proibido. Samantha até abriu a porta do depósito nos fundos do ateliê. Quando entrou
lá para procurar, Susie não a seguiu.
Susie adorava brincar e se soltar, mas não era corajosa — ou doida — a esse ponto. O
depósito tinha os trabalhos concluídos de sua mãe, as coisas que ela vendia para ganhar dinheiro.
Elas nunca podiam mexer neles. Uma vez, quando Susie tinha cinco anos, sua mãe deixara uma de
suas “tapeçarias” na mesa da sala de jantar porque alguém estava vindo buscar. Curiosa, Susie foi
até a sala de jantar, subiu na cadeira, e olhou a tapeçaria. Era coberta de tufos macios de um tecido
redondo e suave que ela achou lindos. Ela tinha que tocar. Esquecendo que tinha acabado de comer
cookies com gotas de chocolate, Susie passou os dedos melados por todos os tufos pêssego-claro.
Quando viu as manchas do chocolate, ela tentou limpá-las, o que só as espalhou ainda mais. Isso a
fez chorar e a assustou o suficiente para fazê-la sair correndo da sala. Na pressa, ela acabou batendo
numa cadeira e caindo. Tentando se segurar, ela puxou a tapeçaria e ainda bateu a cabeça na mesa,
o que a fez gritar. Quando sua mãe correu para a sala, Susie estava no chão com a tapeçaria suja de
chocolate na mão e sangrando em outra parte da tapeçaria por causa de um corte na testa.
Sua mãe ficou tão brava. Isso assustou Susie. Assustou tanto que ela nunca mais chegou
perto de um dos trabalhos de sua mãe. Gretchen com certeza não estava no ateliê de sua mãe. Mas
Susie só podia esperar que Samantha descobrisse isso por si só.
Quando descobriu, Samantha foi para o quarto da mãe. Primeiro, ela parou no corredor para
escutar. Mais sons da cozinha encorajaram Samantha a entrar.
— Gretchen não está aqui. — Susie disse quando Samantha se abaixou para olhar embaixo
da cama de sua mãe. O cobertor azul-escuro cobriu a cabeça de Samantha como um cachecol.
Samantha se levantou do chão, inclinando a cabeça para ouvir por um segundo, e então foi
até o armário da mãe. Samantha começou a revirar os cabides de roupa, abrindo e fechando caixas
de sapatos.
— Você não acha que se estivesse aqui você já teria achado? — disse Susie.
Samantha não respondeu. Ela olhou para as prateleiras em cima das roupas penduradas.
— Você subiria pelo cabideiro — murmurou Samantha.
Susie sorriu.
— É, eu subiria.
Samantha deu meia-volta, franzindo o cenho. Vendo a banqueta nos pés da cama da mãe, ela
a arrastou até o armário.
Susie se sentia mal só por ficar ali olhando. Mas Samantha estava perdendo tempo.
Samantha subiu na banqueta. Mesmo na ponta dos pés, ela tinha que se esticar para olhar as
prateleiras de cima do armário da mãe.
Terminando de procurar no armário, ela foi até a cômoda de sua mãe. Susie roía a ponta do
polegar. Tinha certeza de que Samantha levaria uma bronca pelo o que estava fazendo. Samantha
também sabia disso, mas não deixaria que isso a detivesse. Samantha procurou em meio a todas as
calcinhas, meias e cachecóis de sua mãe.
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Um Passo Mais Perto
— Samantha!
— O quê? — gritou Samantha, batendo a última gaveta da cômoda com força.
— Jantar em cinco minutos.
— Tá bom!
Samantha correu até a mesa de cabeceira de sua mãe e procurou e depois fez o mesmo com
a de seu pai. A dele estava vazia. A de sua mãe estava cheia de livros, tecidos e remédios. Gretchen
não estava escondida no meio deles.
— Eu avisei. — Susie disse ao seguir Samantha pelo quarto da mãe. Sabia que ela estava
agindo igual a um bebezão irritante, mas não tinha o que fazer a respeito. Ela quase podia escutar
uma contagem regressiva em sua cabeça.

— A Samantha tem mexido nas minhas coisas — Patrícia contou para Jeanie no telefone.
Descobrindo que seus materiais foram vasculhados, Patrícia resolveu ligar para sua amiga
em vez de brigar com a filha.
— Que coisas?
— Até onde eu sei, todas — disse Patrícia. Ela pressionou três dedos nas têmporas. — A
Samantha é melhor que isso.
— Exatamente. Então ela deve ter um bom motivo — disse Jeanie.
— Qual motivo ela poderia ter para isso?
— Eu não sei, mas sei que ela deve ter tido um. Nada sumido ou quebrado?
— Não que eu saiba.
— Então esquece isso.
— Mas...
— É sério, Patrícia. Tá na hora de esquecer tudo isso.

Chica chegou à meia-noite. Como sempre, Susie se sentiu puxada da cama de Samantha.
Como sempre, se sentiu compelida a vagar pela casa e observar a forma redonda e sombria de Chica
fora da casa. Como sempre, abriu a porta dos fundos, fechou, e foi até a frente da casa.
Como sempre, se perguntou por que tinha que fazer o que tinha que fazer. Por que tinha que
deixar sua família?
Susie abriu a porta da frente e a brisa da noite soprou algumas das folhas de Oliver até os
pés de Chica e para dentro da casa. A noite estava mais clara que as outras porque a lua estava mais
cheia. As nuvens também não estavam lá. O céu estava tão cheio de estrelas que lembrava Susie do
açúcar de confeiteiro que sua mãe costumava colocar nos biscoitos de chocolate na época de Natal.
Em alguns lugares, as estrelas se borravam em uma expansão de uma luz branca brilhante.
Susie esperava Chica pegar sua mão, como sempre. Em vez disso, Chica ergueu uma mão e
moveu Susie para o lado. Então Chica entrou na casa.

Um pesadelo acordou Samantha. Seus olhos se abriram e ela apertou as cobertas, escutando
seu coração bater com força.
Foi só um sonho, disse a si mesma. Ela sentiu seu coração começar a desacelerar.
Então acelerou de novo e Samantha se sentou.
Não tinha sido só um sonho!
— Chica... — murmurou.
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Um Passo Mais Perto
Seu sonho lhe havia contado mais sobre a galinha no desenho de Susie. A galinha era Chica.
Chica estava perseguindo Samantha no sonho. Samantha estava tentando mover uma prateleira no
escritório de seu pai e Chica estava a perseguindo.
Samantha arquejou. O escritório de seu pai! Era lá onde...
Samantha congelou quando ouviu os sons.
Tum... tap... tum... tap.
Samantha começou a tremer.
Esses eram os sons. Os mesmos sons que Samantha tinha ouvido tantas vezes nos últimos
meses, os sons que tentou se convencer de que eram só sua imaginação.
Ela não os havia imaginado. Eram esses os sons. Mas não eram exatamente iguais.
Esses estavam mais perto. Muito perto.
Samantha sempre achou que os sons que ela ouvia vinham de fora da casa. Agora estavam
dentro, e se aproximando.

Quando Chica começou a subir a escada, Susie tentou ir atrás dela. Mas não conseguiu. Era
como se estivesse grudada na porta da frente, presa por correntes invisíveis.
— Chica, para! — gritou.
Chica não parou. Continuou subindo lenta, mas constantemente a escada.
Estava indo atrás de Samantha, Susie tinha certeza. Susie fez força para se soltar do que a
estava mantendo no lugar. Tentava e tentava se mexer. Então começou a chorar e fez a única coisa
que podia fazer para ajudar a irmã:
— Samantha! — berrou. — Corre!

Samantha saltou da cama correndo e foi até a porta do quarto. Ela conseguiria chegar até o
quarto da mãe antes que seja lá o que estivesse subindo as escadas chegasse ao topo?
Abrindo uma fresta na porta, ela olhou para a escada. Não. Era tarde demais. Uma galinha
amarela de tamanho adulto com dentes horríveis e afiados estava a um passo do topo, a apenas
alguns metros da porta de Samantha.
Ela bateu a porta e olhou ao redor do quarto. Enquanto os passos vinham se aproximando,
ela se escondeu embaixo da cama. Quando a porta começou a abrir, Samantha endureceu e segurou
a respiração enquanto os pés metálicos e laranjas atravessavam o chão de madeira.
Não podia ser real. Mas era.
Tremendo, Samantha viu os pés darem a volta por sua cama. Ela não conseguia mais segurar
a respiração, então deixou entrar cuidadosamente um pouquinho de ar.
Os pés pararam.
Deram meia-volta.
Começaram a voltar ao redor da cama. E então pararam.
Samantha ouviu um chiado aterrorizante e, de repente, o cobertor pendurado de um lado da
cama se ergueu. Um rosto amarelo com olhos roxos e dentes mortais olhou para Samantha.
Samantha se contorceu para se afastar do rosto, se espremendo em direção ao lado oposto da
cama. Quando saiu de baixo da cama, deu uma olhada por cima do ombro, pensando se conseguia
passar pela galinha e fugir do quarto antes que ela se levantasse...
Não. Ela já estava de pé, encarando-a.
Samantha correu até a janela. Tentou não dar atenção ao tum... tap... tum... tap enquanto se
atrapalhava para abrir a trava da janela.
Tremores como asas de borboleta agitavam suas escápulas. Ela os ignorou. Os passos foram
abafados enquanto atravessavam o tapete. Ela só tinha mais alguns segundos.
86 | F i v e N i g h t s a t F r e d d y ’ s : F a z b e a r d o T e r r o r # 4
Um Passo Mais Perto
Engatinhando pela janela, Samantha agarrou as grades em diamante da trepadeira e então
balançou as pernas para fora. O barulho de tecido se rasgando a fez ela olhar de volta pela janela. A
galinha estava bem ali! Estava segurando um pedaço de seu pijama azul-claro na mão.
Samantha choramingou e desceu pela trepadeira. Mantendo os olhos nas videiras agarradas
à trepadeira, ela desceu o mais rápido que pôde. Só estava de meias, então sentiu a madeira afiada
contra as solas dos pés, mas não ligou.
Também não olhou para cima. Não queria saber se estava sendo seguida.
Quando seus pés encontraram uma superfície dura e sólida, ela sabia que tinha chegado no
telhado da varanda. Então olhou para cima.
Não havia nada descendo pela trepadeira atrás dela. Bom.
Mas não tão bom. Se não fosse rápida o suficiente, Chica poderia dar a volta pela casa e a
pegaria quando chegasse à varanda.
Chica.
A mente de Samantha finalmente lhe forçou a ver o que não queria enxergar. A galinha na
casa era Chica. Em seu desenho, Susie estava tentando dizer que Chica não queria que ela ficasse
com Gretchen.
Por quê?
Samantha não sabia. Mas sabia que estava certa.
Chica estava atrás dela porque ela estava procurando Gretchen.
Samantha trincou os dentes enquanto se inclinava na beira do telhado da varanda para que
pudesse se agarrar a uma das colunas. Será que se agarraria bem o suficiente para descer as pernas
até o corrimão?
Ela precisava. Por Susie.
Samantha iria descer e voltaria para dentro da casa. E depois encontraria Gretchen... porque
graças a seu sonho, ela sabia onde procurar.
Mas ela conseguia chegar lá antes de Chica?

Susie não sabia há quanto tempo estava presa na porta da frente ouvindo os passos de Chica
no andar de cima. Também ouviu vários outros barulhos, mas não chegou a ouvir Samantha gritar.
Esperava que fosse um bom sinal, mas não tinha certeza se era.
Achou que ficaria na porta para sempre. O tempo continuou passando e passando.
E então viu Chica no alto da escada. Estava descendo de volta para o primeiro andar. E não
estava com Samantha. Se pudesse se mexer, Susie teria caído no chão de alívio. Em vez disso, tudo
o que pôde fazer foi ver enquanto Chica descia a escada.
E então, de repente, Samantha apareceu do lado de fora!
Com o rosto branco, olhos arregalados e cabelo embaraçado, ela passou correndo por Susie.
Samantha estava de cabeça baixa, os olhos voltados para os pés. Ela não olhou para Susie.
Não olhou nem para Chica na escada.
Susie viu Samantha correr com tudo até a sala de jantar e desaparecer em direção à cozinha.
Aonde Samantha estava indo?

Samantha não sabia por que não tinha pensado nisso antes. Talvez fosse porque, mesmo que
ainda pensasse nele, ela queria muito esquecer seu pai. Já era ruim o suficiente que Susie tivesse
sido tirada deles. Pelo menos Susie não se foi de propósito. Ela não queria ter ido. Ela foi levada,
foi assassinada. Essa, Samantha pensou, é uma boa desculpa para deixar a família.
Seu pai, no entanto, não precisava ter ido embora. Ele foi embora porque era “demais para
aguentar”. Foi isso o que ele disse. “É demais para aguentar”.
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Um Passo Mais Perto
— Mas é por isso que precisamos de você, papai — ela lhe disse na ocasião.
Ele só pressionou os lábios — algo que Samantha pegara dele — e disse que precisava ir.
Era por isso que Samantha estava por conta própria agora. Seu pai se foi. Sua mãe tinha que
tomar remédios para dormir. Sua irmã estava morta. Se Samantha quisesse sobreviver, precisava
salvar a si mesma.
Mesmo que Samantha não tivesse olhado para o alto da escada, ela sabia que Chica estava
lá. Por isso ela correu para a cozinha. Não sabia quão esperta Chica era, mas achou que valia a pena
tentar enganá-la. Ela queria que Chica a seguisse até a cozinha e a procurasse lá. Se estivesse certa,
isso a daria tempo suficiente.
Quando chegou à cozinha, Samantha acendeu a luz. E então disparou pela porta dos fundos
e correu pelo corredor que dava no escritório de seu pai.
No escritório, ela deixou a luz apagada. Sabia para onde estava indo.
Ela correu até a estante com o pedaço de carpete. Segurou a ponta da prateleira na altura de
seu peito e a puxou. Ela não se mexeu. Ela se inclinou e puxou a de baixo. Nenhum movimento. A
de cima. Presa. Esticando-se, ela puxou a mais acima. Ainda nada.
Tem que ser! Frustrada, ela chutou a estante do lado do pequeno pedaço de carpete.
E a estante se desprendeu da parede, se abrindo na sala. Susie estava certa. Tinha uma sala
escondida o tempo todo. Samantha não esperou a porta/estante se abrir por inteiro. Ela se esgueirou
pela abertura e procurou um interruptor. Encontrou um bem do lado da abertura. Acendendo a luz,
ela ficou parada e escutou.
Podia ouvir os passos de Chica na cozinha. Bom. Tinha funcionado.
Ela olhou em volta. A sala estava cheia de coisas estranhas — folhas secas, pedras, um copo
quebrado, brinquedos velhos, pilhas de papéis e livros. Samantha não sabia se estava olhando para o
esconderijo de tesouros de Susie ou de seu pai. Não importava. Só importava que Gretchen, com
seu cabelo encaracolado coberto de poeira, mas seu vestido de bolinhas brilhando como no dia em
que desapareceu, estava sentada no topo de uma das pilhas de livros.
Samantha pegou a boneca e saiu correndo do escritório de seu pai. Quando chegou à porta,
olhou para a direita. Chica estava vindo pelo corredor — e estava apenas a alguns metros dela.
Samantha fugiu pela sala de estar e saiu pela porta da frente. Ofegante, ela olhou para o
quintal. Estava vazio, é claro.
Ela sabia onde Susie estava e sabia onde Chica estava.
Apenas Oliver estava no jardim — Oliver e sua última folha amarelada. Samantha correu até
ele e se escondeu atrás de seu tronco gigante e sólido.

Susie viu Samantha se esconder atrás de Oliver e depois se virou e esperou Chica chegar no
salão de entrada. O que Chica ia fazer? Como Susie podia manter Chica longe de Samantha?
No fim, ela não precisou. Quando chegou a Susie, Chica parou.
Chica estendeu a mão. Susie estendeu a mão e a levou até a de Chica, mesmo que essa fosse
a última coisa que queria fazer. Ela sentiu o metal do animatrônico tocar seus dedos.
— Mas eu não estou pronta! — Susie disse para Chica.
Chica abaixou o olhar e seus dentes brilharam sob a luz do luar. Susie recuou um passo. Os
dedos de Chica apertaram os de Susie com força e ela não conseguiu se soltar. Quando Chica se
virou, Susie se sentiu sendo arrastada de casa.
Ela sabia que tinha que parar de resistir. Tinha que ir junto.
Então ela parou de lutar e começou a andar calmamente ao lado de Chica.

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Um Passo Mais Perto
Samantha viu Chica pegar a mão de sua irmã e a viu junto com Chica cruzando a varanda e
descendo os degraus em direção à Oliver.
Samantha ficou tensa. O que devia fazer? O que podia fazer?
Antes que pudesse decidir, Chica e Susie haviam desaparecido.
Sem pensar, Samantha gritou:
— Espera!
Susie ouviu o grito de sua irmã. Chica não parou, mas Susie sim. Por mais determinada que
Chica estivesse a continuar andando, algo igualmente forte estava a fazendo voltar. Pega no meio
disso, Susie mais uma vez não conseguiu se mexer.
— Susie! — Samantha gritou o nome de sua irmã.
— Eu preciso voltar — disse Susie. — Preciso.
Ela esperou, segurando a respiração. Então sentiu alguma coisa mudar no ar à sua volta.
Chica soltou sua mão.

Samantha saiu de trás de Oliver e ficou parada ao lado dele, Gretchen balançando em sua
mão direita. Lágrimas preenchiam seus olhos.
Tinha chegado tarde demais.
Não. O que era aquilo?
As folhas perto do tronco de Oliver se ergueram espiralando do chão e então se afastaram de
Oliver. O vento daquela noite até estava forte, mas não estava soprando em círculos. Também não
estava soprando na direção contrária a Oliver, e sim na direção dele.
Samantha olhou novamente para a única folha que lhe restava.
E foi então que Susie subitamente apareceu na frente de Oliver. Ela parecia a mesma do dia
em que foi sequestrada. Estava até com as mesmas roupas — seu suéter listrado rosa e roxo e os
jeans que Jeanie havia decorado com pedrinhas de brilhante.
Samantha olhou para a irmã. E então estendeu Gretchen.
Susie abriu a boca como se quisesse dizer alguma coisa. Mas então apenas pegou a boneca
rechonchuda e a apertou em seu peito.
— Eu senti tanto a sua falta — disse Samantha.
Susie assentiu. Ela se aproximou e Samantha sequer hesitou. Ela aceitou o abraço oferecido.
Susie se sentiu tão sólida quanto no tempo em que estava viva. Talvez ainda mais. Samantha
não era de abraçar. Ela normalmente só abraçava Susie de leve quando Susie insistia em lhe dar um
abraço. Agora ela abraçou Susie com toda a força.
— Eu te amo — sussurrou.
Ela sentiu uma onda de emoção fluir por seu corpo, como a que tinha sentido no carro. Mas
essa não era escura e oleosa. Essa era clara, quente e efervescente. Samantha tinha certeza que essa
era uma onda de amor.
Susie a soltou e Samantha enxugou as lágrimas que lhe escorriam pelas bochechas. Susie
sorriu e se virou para Chica. Samantha viu Chica pegar a mão de sua irmã. Então a viu levar Susie e
Gretchen embora.
Elas desapareceram quando Oliver deixou sua última folha cair.
— Tchau — sussurrou Samantha. Ela sentiu a despedida. E sentiu a promessa de algo novo.
Susie estava indo embora, sim. Mas isso não era um fim.
Samantha sabia que era um começo. Assim como na história do fantasma feliz, Susie estava
indo para um lugar onde poderia estar com sua família para sempre.

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J
ake abaixou o olhar em direção a ele mesmo e tentou se acostumar com o fato de que “ele
mesmo” não era nada como o ele mesmo com o qual estava acostumado a ser antes.
Até onde conseguia se lembrar, ele era um garotinho. Já não era um garoto há algum
tempo... não sabia quanto tempo.
Então não era totalmente estranho que ele não estivesse mais no corpo de um garotinho. Mas
ainda era muito estranho que estivesse em uma coisa que não estava viva. Também era estranho que
não conseguisse se lembrar exatamente quem ele era quando era um garotinho. Tinha lembranças
vagas, mas não faziam sentido. Por exemplo, ele se lembrava de pensar que seria divertido voltar à
vida como um cachorrinho ou gatinho. Mas por que ele pensaria isso?
Agora cá estava ele dentro de uma coisa de metal. Não sabia o bastante sobre qualquer coisa
para entender o que era aquela coisa. Mas ele sabia que não estava sozinho. Estava compartilhando
aquele espaço estranho.
Foi como acordar na casa de outra família.
— Olá? — disse Jake.
— Quem está falando? — perguntou a voz de uma criança. A voz parecia um pouco com a
de um menino que Jake conhecia na escola, um garoto que estava sempre arranjando briga com o
professor e se metendo em encrenca.
— Ah, oi — disse Jake. — Eu sou o Jake. Quem é você?
— Quê que você quer?
— Hã, eu só tava sendo amigável.
Jake se lembrou de ter aprendido que o melhor jeito de lidar com garotos assim era deixá-los
serem tão durões quanto quisessem.
— Desculpa. Meu nome é Andrew. — A voz do garoto soava áspera. Ele não parecia estar
dizendo seu nome. Parecia estar lançando um desafio.
— Oi, Andrew — disse Jake.
— Por que eu não consigo ver nada? — disse Andrew, como se exigindo uma resposta.
— Você não consegue ver o caminhão? — perguntou Jake.
— Se eu conseguisse ver o caminhão, você acha que eu diria que não consigo ver nada? —
Jake achou que Andrew parecia zangado. Muito zangado.
— Desculpa — disse Jake. — Hm, então, nós estamos atrás do que eu acho que pode ser um
caminhão de lixo? Estamos com um monte de lixo.
— Mas é claro — disse Andrew.
— Por quê? — perguntou Jake.
— É a história da minha vida.
— Como assim?
Andrew ignorou a pergunta.
— Como é que você pode ver e eu não? — Pela forma como estava falando, ele parecia a
ponde de dar um chilique.
— Eu sinto muito, de verdade. Mas não tenho certeza — disse Jake. — Quer dizer, eu sei
que estamos em algum tipo de metal, sei lá, algum tipo de entidade ou algo assim? Eu consigo ver o
que tem em volta, mas não sei como cheguei aqui, então também não sei como você chegou aqui. E
com certeza não sei por que eu consigo ver e você não. Mas talvez eu possa te ajudar a ver. Você
sabe como chegou aqui?
Andrew ficou em silêncio por um minuto. Jake esperou.
— Bom, pode ter algo a ver com a coisa onde eu estava?
— Que coisa? — perguntou Jake.
— E isso é da sua conta? — rosnou Andrew.
Jake suspirou.
— Não é. Só pensei que seria legal a gente ser amigo, e amigos se conhecem. Então eu só
queria saber o que você quis dizer com estar em “uma coisa”.
O caminhão parou e houve silêncio.
— Faz muito tempo que eu não tenho um amigo — disse Andrew. Seu tom era defensivo,
como se estivesse desafiando Jake a zombar dele.
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— Sinto muito — disse Jake. Suas memórias podiam ser desconexas e confusas, mas ele se
lembrava que tinha amigos. — Isso é horrível.
Jake queria saber mais, mas sabia que não devia continuar fazendo perguntas.
A traseira do caminhão se abriu e um sujeito de macacão começou a descarregar todo o lixo.
— Eu poderia ser seu amigo — disse Jake.
— Por que você quer ser meu amigo?
— Eu só gosto de fazer amigos — disse Jake.
— E como a gente faz isso?
— Faz o quê?
— Vira amigo! — Andrew soltou um bufo exasperado. — Nossa, como você é burro.
Jake sentiu como se estivesse fazendo o primeiro contato com uma nova espécie, como nos
filmes de ficção científica que ele se lembrava de ter assistido.
— A gente fala um com o outro, conta coisas um pro outro e descobre um sobre o outro, e aí
a gente vira amigo — disse Jake. Imaginou que isso resumia bem a ideia.
— Que tipo de coisas? — perguntou Andrew.
— O que você quiser. — Jake queria perguntar novamente o que Andrew queria dizer com
estar em “uma coisa”, mas esperou.
Andrew ficou em silêncio por alguns segundos.
— Você já ficou com tanta raiva que só queria que todo mundo soubesse?
Jake pensou sobre isso e se lembrou de uma vez em que ficou muito bravo porque teve que
sair da escola. Mas por quê? Não importava.
— Eu já fiquei com muita raiva, — disse — mas acho que não precisava que todo mundo
soubesse. Mas eu tinha alguém com quem conversar. E você?
— Não.
Jake não sabia o que dizer, então ficou quieto.
— Você quis se vingar da pessoa com quem estava com raiva? — perguntou Andrew.
— Acho que não foi bem uma pessoa. Acho que tinha a ver com estar doente ou algo assim.
Minhas memórias estão meio confusas.
— Confusas. Sim. As minhas também — disse Andrew. — Mas eu me lembro de querer me
vingar de alguém que me machucou. Acho que me apeguei a ele. Entrei na alma dele, me certifiquei
de que ele não poderia seguir em frente mesmo quando devia ter morrido. Lembro que queria que
ele sofresse do jeito que me fez sofrer. Mas não me lembro o que ele fez. Só sei que aguentei, não
importava o que fizessem com ele e tentassem salvá-lo. Eu queria que ele se machucasse!
A certa altura, Jake não conseguiu mais se conter. Ele deixou escapar:
— É terrível que você se sinta tão mal.
— Cala a boca. Só cala a boca — gritou Andrew. — Não preciso da sua simpatia idiota!
— Desculpa.
Vários segundos se passaram. Então Andrew teve mais a dizer:
— Lembro que tentaram matá-lo. Mas eu não ia deixá-lo partir até que eu estivesse pronto.
É estranho. Lembro de estar com tanta raiva e determinação, mas não sei por quê.
Jake sentia doer por estar tão perto de tanto ódio. Mas ele não teria ido embora se pudesse.
Andrew precisava dele.
— Você ainda está aí? — Andrew perguntou a Jake.
— Sim. Estou ouvindo. Você me disse para calar a boca.
Andrew riu.
— Sim, eu disse, né?
Jake estava quieto. Então ele disse:
— E onde está a pessoa agora, essa de quem você tem tanta raiva?
— Não tenho muita certeza. Sei que eu estava nele quando chegamos num lugar grande com
muitas coisas legais. Só o que consigo lembrar depois disso é de querer estar em todos os lugares.
Lembro de estar em todos os lugares, em tudo quanto é tipo de coisa. E me lembro de um cachorro
animatrônico, o Fetch. Ele quebrou numa tempestade. Brinquedo tosco. Não tinha sido bem feito.

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— Andrew soprou com a língua entre os lábios. Então suspirou. — Então acho que eu estava no
Fetch, mais ou menos. Acho que foi assim que cheguei aqui. Não sei por que acho isso. Eu só acho.
Jake ficou em silêncio. Ainda estava observando o homem descarregar o caminhão.
— Você pode falar agora — disse Andrew.
— Eu não sei o que dizer — disse Jake. — Eu me sinto mal por você ter passado por algo
tão ruim assim.
O homem pegou o contêiner de Jake e Andrew. Jake estava se perguntando o que fazer com
o homem. Pensou que movimentar a coisa na qual eles estavam assustaria o homem. Mas agora ele
não tinha escolha. Não queria que o homem jogasse Andrew e ele fora.
Então Jake se mexeu, o que significava que a coisa em que eles estavam se mexeu. Jake viu
o homem olhar assustado. Querendo confortar o homem, Jake estendeu a mão para tocar seu rosto.
O homem gritou e levou as mãos à cabeça. Desmoronando no cascalho atrás do caminhão, o
corpo do homem começou a murchar como se fosse uma esponja sendo espremida por uma mão
invisível. Enquanto seu corpo parecia ser sugado por si mesmo, seus olhos caíram para dentro,
desaparecendo por completo. E listras pretas se formaram nas bochechas do homem.
— O que aconteceu aqui? — gritou Jake. Ele saltou do caminhão e olhou para o corpo do
sujeito careca.
— Eu não consigo ver, idiota — disparou Andrew. — Do que você tá falando?
— Eu só pensei em tocar no rosto de um cara e ele morreu! Por que ele morreu?! — Jake
percebeu que estava gritando, mas não conseguiu se conter.
— Por que você tá perguntando pra mim? — Andrew parecia estar na defensiva de novo.
— O outro cara também morreu. Acabei de me lembrar — disse Jake.
— Provavelmente sou eu — disse Andrew.
— Poderia ser Fetch, o cachorro? — Jake perguntou.
— Nah, sou eu, certeza.
— Você quer matar pessoas?
— Não!
— Então por quê...?
— Eu só quero assustar as pessoas, tá? Tipo, você sabe, dar um choque no circuito delas.
— O choque tá matando eles!
— Bom, não era isso que eu queria.
— Tá. — Jake parou para pensar por um segundo. — Então, se o que você tá fazendo não é
o que você quer, talvez ele esteja fazendo algo que outra pessoa quer. Talvez tenha mais alguma
coisa aqui com a gente.
— Nessa coisa, você quer dizer?
— Sim. Como alguém pegando carona ou uma pulga num cachorro.
— Besteira — disse Andrew.
— Você pegou carona com o homem que te matou. Por que outra pessoa não poderia pegar
carona com a gente?
Andrew ficou em silêncio por um segundo e então disse:
— Parece besteira pra mim.
— A questão é — disse Jake — que se você fez isso de alguma forma, o que quer que esteja
levando você a fazer isso pode estar em tudo em que você se meteu.
— Eu os infectei. Agora eu me lembro agora.
— O quê?
— Eu infectei tudo em que joguei a minha raiva.
— Tá. Então tudo que você infectou pode machucar as pessoas. Pessoas inocentes.
— Ei, eu não sou assim. Eu só queria machucar o cara mau.
— Mas você disse que infectou coisas com a sua raiva, não foi? Você não achou que isso
iria machucar as pessoas?
— Cala a boca.
— Tá, vou calar a boca. Mas vamos encontrar todas as coisas que você infectou.
— Como você vai fazer isso?
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— Você não vai me ajudar?
— Por que eu deveria?
Jake pensou por um segundo e então tentou uma coisa.
Não tinha certeza se ia conseguir. Mas...
Sim, ele conseguiu! Jake conseguia sentir os pensamentos de Andrew. Ele poderia encontrar
as coisas que Andrew infectou, mesmo sem a ajuda de Andrew.

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