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.— Colegio Debates Dirigida por J. Ouinsbure julio cortazar VALISE DE CRONOPIO ipe de realizagéo: Tradugio: Davi Arsiguect ‘RiteEnare Burboss, Organizagio de Haroldo de Cx Aleman Je Revsior Amiton Monteiro de Ol EGE asia Gomes, Machado: Capa: Moysés | Z9 EDITORA PERSPECTIVA 6. ALGUNS ASPECTOS DO CONTO Eneontro-me hoje, diante dos senhores, numa si- tuagio bastante paradoxal. Um contista argentino se dispde a trocar ‘conto sem que seus ‘conhegam coi que jé sio ser excepcionalmente, as mos de leitores € tao entusiastas como os senhores. O 6 tanto que os senhores nao tenham tido oportunidade de julgar meus contos, mas, sim, que eu me sinta um pouco como um fantasma que Ihes vem falar sem essa 147 relativa tranqillidade que sempre 4 sabermo-nos pre- cedidos pela tarefa cumprida ao longo dos anos. Eo fato de ime sentir como um fantasma deve ser jé per- cepiivel em mim, porque hé alguns dias uma senhora argentina me assegurou no hotel Riviera que eu nio era Julio Cortézar, ¢ diante de minha estupefacdo agregou que 0 auténtico Julio Cortézar um seahor de cabelos brancos, muito amigo de um parente dela, que nunca arredou pé de Buenos Aires. Como ja faz doze anos que resido em Paris, os senhores compreen- derdo que minha qualidade espectral se tenha intensifi- cado notavelmente depois desta rev. eu desaparecer na metade de um: preenderei demais; © no minimo hando, Afirma-se que o desejo mais ardente de um fan- tasma é recobrar pelo menos um sinal de corporeidade, algo tangfvel que o devolva de carne ¢ oss0. Para co: izer em poucas pal vras qual 6 & direglo © 0 sentido dos meus contos. Nio © fago por mero prazer informativo, porque nenhuma reseaha tedrica pode substituir a obra em si; minhas raz6es so mais importantes do que essa. Uma vez que me vou ocupar de alguns aspectos do conto como gé- neto literério, © € posstvel que algumas das minhas idéins suppreendam ou choquem quem as escutr, pa- rece-me de uma elementar honradez. definir 0 tipo de narragdo que me interes inalando minha especi: ‘maneita de entender 0 >. Quase todos os cont que escrevi pertencem ao género chamado fantéstico or falta de nome melhor, e se opéem otimismo filoséfico e 6 dentro de um mundi jas, No meu caso, a suspeita ecreta e menos comunicével, a fecunda descoberta de Alfred Jarry, para quem 0 verdadeiro estudo da no residia nas exeogdes a essas leis, foram alguns orientadores da minha busea pessoal de uma 148 & margem de todo realismo demasiado ingénuo, Por isso, se nas idéias que seguem, os senhores encontra- rem uma predilegio por tudo. 0 que no,conto € excep- rate dos temas ou mesmo das formas jo que esta apresesfacio de minha propria maneira de entender o mundo explicaré minha tomada de posigéo © meu enfoque do problema. Eqn Sltimo caso se poder dizer que s falei do conto tal cional, qu: qual eu o pratico. E, contudo, nio ereio que seja assim. Tenho a certeza de que existem certas constant tos. aplicam a todos 0: contos, . ticos ou humoristicos. E penso que | mostrar aqui esses elementos inva- um bom conto & atmosfera peculiar de obra de arte. qualquer modo, enquanto os criticos continuam acumu- Jando teorias € mantendo exasperadas polémicas acerca do romance, quase ninguém se interessa pela problemé- tica do conto. Viver como contista num pais onde esta forma expressiva ¢ um produto quase exético, obriga forgosamente a buscar em outras literaturas o alimento que ali falta, Pouco a pouco, em textos originais ou mediante tradugoes, vamos acumulando quase que ran- corosamente uma enorme quantidade de contos do ppassado e do presente, ¢ chega o dia em que podemos fazer um balango, tentar uma aproximacio apreciadora @ esse género de'téo finigio, to esquivo nos seus milltiplos e antagénicos aspectos, e, em éltima para si mesmo, caracol 80 da poesia em outra ‘no caminho que todo escritor deve fazer em algum momento do seu trabalho, falar do especial para nés, uma vez que ‘mais tivera em outros paises latinos como a ou a Espanha, Entre nés, como € natural nas literaturas jovens, a criagio espontinea precede quase sempre 0 149 exame eritico, e € bom que seja assim. Ninguém pode pretender que s6 se devam escrever contos ap6s serem ‘ aie 0 classificével; em seg BA, 05 tedricos © os exiticos nao tém por que serem os préprios contistas, € natural que aqueles 56 entrem em cena quando exista ja um acervo, uma boa quantidade de literatura que desenvolvimento e m muito entre $e s vezes de maneira qua esse panorama sem coeréncia st teriria, ela podera contribuir de valores para essa anto- la confusio, Enquanto os arefa, jd 6 tempo de se fa- a, 2 190 que a conceptualizacio Ihe quer ncerré-la numa categoria.,Mas se nfo tivermos uma idéia viva do que ¢ o contowteremos perdido tempo, porque um conto, em iltima andlise, se move nesse plano do homem onde a vida e a expressio eser at vida travam uma batalha fraternal, se me iado dessa batalha é 0 0 fa ao mesmo tempo que uma vic izada, algo assim como um tremor de gua dentro de um uma fugacidade numa per- manéncia. $6 com e pode transmitir essa. al- ‘quimia secreta que explica a profunda ressondncia que um grande conto tem em nés, ¢ que explica também por que hi to poucos contos verdadeiramente grandes, Para se entender o carter peculiar do conto, cos- tuma-se comparé-lo com 0 romance, género muito mai Popular, sobre o qual abundam as preceptisticas. Assi nala-se, por exemplo, que o romance © romance propriamente dito, Nesse sentido, © 0 conto se deixam comparar analogicamente com o cinema e a fotografia, na medida em que um filme em principio uma “ordem aberta”, romanesca, to que uma fotografia bem realizada pressupde uma ta limitago prévia, imposta em parte pelo reduzido campo que cimara abrange ¢ pela ; Sempre me surpreendeu que se expressasse poderia fazé-lo um contista em muitos aspectos. Foto; Bresson ou de um Bi aparente paradoxo: o de recortar um fragmento da rea~ lidade, fixando-the determinados limites, mas de tal ‘como uma explosio que idade muito mais ampla, que transcende espiritual- ingido pela camara. Enquanto no jam 08, que nio 86 valham por si mesmos, mas também sejam Capazes de atuar no espectador ou no leitor como uma ist -csfh_H,_ espécie de abertura, de fermento que projete & inteli- géncia e a sensibilidade em diregao a algo que vai ou literério contido na foto argentino, muito amigo de combate que se trava entre for, 0 romance ganha sem- que 0 conto deve ganhar por | Pre por pontos, enquanto knock-out. E verdade, na 108 no leitor, enquan-_ , mordente, sem trégua| ieiras frascs. Nao se entenda isto demasia- » Porque o bom contista é um boxeador Po € 0 espago do conto tém de est sados, submetidos a um: mal para provocar essa antes. Basta perguntar ruim. Nao € ruim pelo tema, porque em literatura no ‘4 temas bons nem temas ruins, hé somente um trata. ‘mento bom ou ruim do tema. Também néo é ruim por- {que os personagens caregam de @ que até uma Pedra é interessante quando del James ou um Franz Kafka. Um io sem essa tenso que se deve m: primeiras palavras ou desde as sim podemos adiantar jé que as nocGes de si de intensidade e de tensio hio de nos per 82 ver, aproximarmo-nos melhor da propr 10 espiritual & for- que me referia 152 io que possua essa misteriosa propriedade de irra- diar alguma coisa para além dele mesmo, de modo que tum vulgar epissdio doméstico, como o¢orre em tantas admiraveis narrativas de uma’ Katherjne Mansfield ou de um Sherwood Anderson, se converta no resumo im- placdvel de uma certa condigéo hum candente de uma ordem social ou hist € significative quando quebra seus préprios limites com essa explosio de energia espiritual que ilumina brusca- mente algo que vai muito além da pequena ¢ as vezes tristemente cotidiano, vezes conformista ou inutilmente re- ivas € quase 0 que, enfadonhas tertlias que deviamos mais velhos, escutévamos nossas lian que vai muito além do argumento. Os senhores jé tera ido que essa signif ister que ja ferem apenas ao tema, mas ao tratamento lite- esse tema, a técnica empregada para desenvol- E € aqui que, bruscamente, se produz a distingao entre 0 bom e o mau contista. Por iso teremos de nos eter com todo 0 cuidado possivel para tratar de entender um pouco mais essa estranha la que 6 um conto bem realizado, © ver por que esté vivo enquanto outros que, aparentementer a nfo passam de tinta sobre o papel, alimento para o esquecimento Vejamos a questio do Angulo do contista e, neste oriamente, da minha prépria versio do as. ontista é um homem que de repente, rodea- 153 do pela imensa algaravia do mundo, comprometido em ‘maior ou menor grau com a realidade hist6rica que 0 de minha yontade, por cima ou por baixo de minha consciéncia, como'se cu no fosse mais que um meio pelo qual passava © se manifestava uma forga alheia, ‘Mas isto, que pode depender do temperamento de cada fato essencial: num momento dado fentado ou escolhido voluntariamente, imposto a partir de um plano onde nada € definivel. Hé tema, repito, ¢ esse tema vai se tornar conto, Antes que isto ocorra, que podemos dizer do tema em si? Por que este tema e nio outro? Que razbes levam, consciente ou inconscientemente, 0 con- _ista_a escolher um determinado tema? farece-me que o tema do qual sairé um bom conto um bom tema como um sol, um do qual gira um sistema planetério de vezes nao se tinha conse astrénomo de palavras, nos 4 ya ent, para sermos mais m ya mesmo tempo um bom tema tem algo de ia atémico, de niclec em torno do qual giram os ms; € tudo isso, afinal, nao é jf como uma propo- sigdo de vide, uma dindmica que 1n6s mesmos e a entrarmos num sis tado qual ser a tos inesqueciveis, Na ocasido os lemos junto com muitos outros que in- elusive podiam ser dos mesmos autores, E eis que 08 158 anos se passaram e vivemos © esquecemos tanto; mas cesses pequenos, insignficantes contos, esses grios de areia no imenso mar da literatura continuam af, palpi- tando em nés. Nao 6 verdade que cada’ um tem sua poderia continuar terdo edvertido que nem todos estes contos so obrigatoriamente antol6gicos. Por ‘que perduram na meméria? Pensem nos contos que no uderam esquecer e verdo que todos eles tém a mesma caracteristica:(Sao aglutinantes de uma realidade i tamente mais vasta que a do seu mero argume {sso influiram em nés com uma forga que nos peitar da modéstia do seu contetido aparente, dade do seu textoJE esse homem, que num determinado momento escolhe'um tema & faz com ele um conto, ser tum grande contista se sua escolha contiver — as vezes sem que ele o saiba conscientemente — abertura do pequeno para o grande, d cireunscrito para a esséncia mesma da condig: na. Todo conto perdurével & como a semente onde dor- ‘me a Grvore gigantesca, Essa drvore crescerd em nés, inscreverd seu nome em nossa meméria, Entretanto, € preciso aclarar melhor esta nogao de temas significativos. [Um mesmo tema pode ser profundamente cativo para um escritor, ¢ anédino para outr que nfo hé ignificativos ou abso- Tutamente insignificantes. O que ha é uma alianga mis- teriosa e complexas entre certo escri num momento dado, assim como a derd logo entre certos contos e certos quando dizemos que um tema 6 si ‘caso dos contos de Tchecov, est - terminada em certa medida’ por algo que esté fora do 155 eS tema em si, por algo que esté antes ¢ depois do tema, que estd antes 6 0 escritor, com a sua carga de valores ‘humanos ¢ literérios, com a sua vontade de fazer uma estrutura-o em forma de conto, projetando- termo em diteglo a algo que excede o proprio conto. Aqui me parece oportuno mencionar um fato que me ‘ocorre com freqliéncia e que outros contistas amigos conhecem to bem quanto eu. B comum que, no curso de uma conversa, alguém conte um episédio divertido ‘ou comovente ou estranho e que, ditigindo-se logo a0 contista presente, the diga: “Ai tem vocé um tema for- resentearam assim com uma porgio de temas ¢ sempre espondo amavelmente: “Muito obrigado erevi um conto com qualquer deles. Contudo, uma amiga me contou distraidamente as aven tuma criada sua em Paris. Enquanto ouvia a senti que isso podia chegar a ser um esses episddios niio cram mais que hist6rias curio para mim, bruscamente, se impregnavam de um sen gue ia muito além do seu simples e até vulgar contetdo. Por isso, toda vez que me perguntam: “C - guir entre um tema insignificante — por mai ‘ou emocionante que possa ser — ¢ outro significativo?, Fespondo que 0 escritor é 0 prim frer esse efeito indefinivel mas avassalador de certos temas, e que pre- cisamente por isso é um escritor. Assim como para Mar- cel Proust o sabor de uma madeleine mothada no ché abria subitamente um imenso Ieque de recordagdes apa- rentemente esquecidas, de modo andlogo o escritor eage diante de certos temas, da mesma forma conto, mais tarde, faré reagir 0 leitor. Todo conto é assim predeterminado pela aura, pela fascinagio irre- sistivel que o tema cria no seu criado ue esco- , Valendo-se dessas sutis antenas capazes de the permitir reconhecer os elementos que logo have- io de se converter em obra de arte. O contista esté diante do seu tema; diante desse embrifio que ja € vida 456 mas que néo adquiriu ainda sua forma definitiva, Para ele esse tema tem sentido, tem tudo se reduzisse a isso, de pouco ‘iltimo termo do processo, como juiz implacavel, esta esperando 0 leitor, o elo final do protesso criador, 0 cumprimento ou 0 fracasso do ciclo, E € entio que 0 ‘conto tem de nascer ponte, tem d que thes bastard 2 que 0s comoveu, para comover por seu es. Incorrom na. ingenuidade daquele que acha belissimo o proprio filho ¢ da por certo que © outros o julguem igualmente belo. Com o tem ‘com os fracassos, 0 contista, capaz de superar essa meira etapa ingénua, aprende que em literatura néo 0as intengdes. Descobre que para voltar a criar essa comogio que levou a ele proprio a escre- ue isola 0 leitor de tudo 0 que'o rodeis, para depois, er. minado 0 conto, voltar a pé-lo em contacto com ¢ am biente de uma maneira nova, enriquecida, mais pro- funda e mais bela. E 0 tinico modo de se poder conse- seqiiest permite © mesmo exige.JNenhum dos senhores teré es- quecido “O Tonel de Amontillado”, de Edgar Poe. O extraordinério deste conto & a brusce rentincia a toda descrigéo de ambiente. Na terceira ou quarta frase esta- mos no cora¢o do drama, assistindo a0 cumprimento implacével de uma vinganga. “Os Asiassinos", de He- 157 mingway, € outro exemplo de intensidade obtida me- diante a eliminago de tudo 0 que nfo convirja essen- cialmente para 0 drama. Mas pensemos agora nos con- tos de Joseph Conrad, de D. H. Lawrence, de Katka, ‘Neles, com modalidades tipicas de cada um, a intensi- tensfio. £ uma intensidade que se exerce na maneira pela qual o autor nos vai aproximando lentamente do {que conta. Ainda estamos muito longe de saber o que vai retanto, no nos podemos sub- “O Tonel de Amon- trair & sua atmoste tillado” ¢ de “Os nos”, os fatos, despojados de toda preparacao, saltam sobre nés ¢ nos agarram; em. troca, numa narrativa demorada e caudalosa de Henry James — ‘“A Lio do Mestre”, por exemplo — sente-se de imediato que 0s fatos em si carecem de importincia, aque tudo esté nas forgas que os desencadearam, na ‘malha sutil que os precedeu e 08 acompanha, Mas tanto a intensidade da agio como a tensto interna da narra- tiva sio 0 produto do que antes chamei 0 oficio de escritor, e € aqui que nos vamos aproximando do final deste passeio pelo conto. Em meu pais, © agora em Cuba, tenho podido ler contos dos mais variados auto- res: maduros ou jovens, da cidade ¢ do campo, dedica- dos a literatura por raz6es estéticas ow por imperativos sociais do momento, comprometidos ou nfio compro- metidos. Pois bem, embora soe a trufsmo, tanto na ‘Argentina como aqui os bons contos tém sido eseritos pelos que dominam o oficio no sentido jé indicado. Um exemplo argentino esclarecerd melhor isto, Em nossas provincias centrais e do Norte existe uma Tonga tradigio de contos orais, que os guiichos se trans- mitem de noite & roda do fogo, que 08 pais continuam ‘contando aos filhos, ¢ que de repente passam pela pena tismo do homem do campo; alguns se elevam mesmo & dimenséo trégica ou postica. Quando os ouvimos da bboca de um velho gaicho, entre um mate e outro, sen- timos como que uma anulagio do tempo, pensamos ‘que também 0s aedos gregos contavam assim as faga- 158 lessa soma de tradig6es orais, em mew pais surge um senhor para quem a cultura das cidades é um signd' de decadéncia, contos populares € cultivada em Cuba; oxalé niio seja, porque em meu pais ndo deu mais que indigesto ‘mes que nao interessam nem aos homens do campo, que preferem continuar ouvindo os contos entre dois tragos, nem aos leitores da cidade, que estario em franca deca déncia, mas no deixaram de ler bem lidos os clissicos do género. Em compensagio — e refiro-me também & Argentina — tivemos escritores como um Roberto J. esse material e tornd-lo obra de arte. Mas Quiroga, Giii- raldes © Lynch conheciam a fundo 0 ofcio de escrito, isto 6, 86 aceitavam temas significativos, enriquecedores, assim como Homero teve de por de lado uma porgio de epissdios bélicos € mégicos para nflo deixar seno aque- les que chegaram até nds gragas & enorme forca mitica, A ressonfincia de arquétipos mentais, de horménios psi- quicos como Ortega y Gasset chamava 0s mitos. Quiro- € projesdo em pro- as. Escreviam tensa- mente, mostravam intensamente.{Néo hé outro modo para que um conto seja eficaz, {aga alvo no leitor e crave fem sua meméria] 159 © exemplo que acabo de dar pode ser de interesse para Cuba. E evidente que as possibilidades que a Re- volugio oferece a um contista sfo quase infin cidade, 0 campo, a Iuta, o trabalho, os diferentes psicolégicos, os conflitos de ideologia, de caréter; ¢ tudo isso como que exacerbado pelo ‘como nunca puderam fazer antes. Mas tudo isso como ha de ser traduzido em grandes contos, em ontos que cheguem ao leitor com a forga ¢ a eficécia necesséria? E aqui que eu gostaria de aplicar tamente 0 que venho dizendo num trato, O entusiasmo e a boa vontade 6, na admiragio coletiva, na meméria de um povo) a grandeza desta Revolugo em marcha, Aqui, mais que em nenhuma outra parte, se requer hoje uma fusio total dessas di do escritor lucidamente seguro do seu oficio. Nesse sen- tido no hé engano poss habil qi 0s seus ram de uma pro- , sua obra ndo iré além do mero exercicio esiético, Mas 0 contrério serd ainda pior, porque de nada valem o fervor, a vontade de comunicar a men- sagem, se se carecer dos instrumentos expressivos, esti Wstieos, que tornam possfvel essa comunicagio. Neste ‘momento estamos tocando 0 ponto crucial da questio, Creio, © digo-o apés ter pesado longamente todos 0s elementos que entram em jogo, que escrever para uma revolugio, que escrever revolucionariamente, mio sig- nifica, ‘como eréem muitos, escrever obrigatoriamente acerca da propria revolugtio. Jogando um pouco com as palavras, Emmanuel Carballo dizia aqui hé alguns dias que em Cuba seria mais revolucionfrio escrever do que contos sobre temas revolucio- frase € exagerada, mas produz uma reveladora(Quanto 2 mim, creio que aquele em qi ia do 160 ‘mos, aplicando-a a0 que rivel frase de Hamlet a Hor sas no céu ¢ na terra do que supéi E pensemos que nio se julga ut tema de seus contos ou de seus romances, mas, sim, por sua presenga viva no seio da coletividade, pelo f que 0 compromisso total da sua pessoa é'uma gar insofismével da verdade e da ne por mais alheia que esta possa cunstincias do momento. Essa ot volugao por nao ser acessivel a todo 0 mun trério, prova que existe um vast potencial que, num certo sentido, Separados que o escritor das metas finais da revelugéo, dessas metas de cultura, de liberdade, de pleno gozo de condiso humana que os cubanos se fixaram para admi- ragio de todos os que os amam io para fazé-lo senfio a incapacidade para compreender uma li- edem cl ivam conto mais dificil e complexo, mas que 0 obrigaré a sair por um momento do seu do circundante e the mostraré outa coi for, mas outra coisa, algo diferente. Nao tem sentido falar de temas populares a si populares 86 sero bons se se outro conto, a essa exigente que procuramos mostrar na primeira parte desta pa- lestra. Faz anos tive a prova desta afirmagio na Ar- E estou seguro de que 0 conto nna lembranca desses gatichos conto pretensamente popular, ¢om 0 vocabulirio, as. aparentes is © 08 interesses patristicos de- -omo 0 escritor que o fabri- gente simples. provoca dificil © sutl, se © niio pode ue provocam as tragédias gregas ou as de Shakespeare, 162 |g me ec © imteresse apaixonado que despertam muitos contos ¢ romances nada simples nem acessiveis, deveria fazer os partidérios da mal chamada “a suspeit ver fitas de cowboys. O que é preciso fazer 6 educé-lo, isso € numa primeira etapa tarefa pedagégica ¢ nic literéria. Para mim foi uma experiéncia reconfortante ver como em Cuba os escritores que mais admiro par. ticipam da revolugio, dando o melhor de si mesmos, sem sacrificarem uma parte das suas possibilidades em aras de uma pretensa arte popular que néo serd itil a ninguém, Um dia Cuba contaré com um acervo de 163

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